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Document 52010AE0993

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à iniciativa de cidadania» [COM(2010) 119 final — 2010/0074 (COD)]

JO C 44 de 11.2.2011, p. 182–185 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

11.2.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 44/182


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à iniciativa de cidadania»

[COM(2010) 119 final — 2010/0074 (COD)]

2011/C 44/34

Relatora-geral: Anne-Marie SIGMUND

Em 27 de Abril de 2010 e em 19 de Maio de 2010, o Conselho e o Parlamento Europeu, respectivamente, decidiram, em conformidade com o artigo 304.o, n.o 1, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à iniciativa de cidadania

COM(2010) 119 final — 2010/0074 (COD).

Dada a urgência dos trabalhos, o Comité Económico e Social Europeu, na 464.a reunião plenária de 14 e 15 de Julho de 2010 (sessão de 14 de Julho), designou relatora-geral Anne-Marie SIGMUND e adoptou por 155 votos a favor e 4 votos contra, o presente parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1   O CESE saúda os princípios essenciais da proposta da Comissão, muito especialmente a abordagem em três etapas: registo formal, verificação de admissibilidade e avaliação política.

1.2   O CESE vê o seu papel dividido em duas fases: em primeiro lugar, facilitar iniciativas de cidadania embrionárias permitindo a sua articulação, facilitando contactos entre elas, etc. e, em segundo lugar, garantir o acompanhamento institucional secundando a avaliação pela Comissão de uma iniciativa bem-sucedida com a elaboração de um parecer, a organização de audições, etc. Além disso, o CESE também participará nas campanhas de informação.

1.3   O CESE propõe, contudo, algumas melhorias:

mencionar explicitamente os valores da União como motivo de recusa de um registo;

prescindir de vários números de identificação pessoal na assinatura de uma iniciativa;

tomar o local de residência como critério de classificação dos signatários;

prolongar para 18 meses o prazo máximo para a recolha de assinaturas;

desenvolver software livre (open source) para a recolha de assinaturas em linha;

reduzir o número mínimo de Estados-Membros de 1/3 para 1/4;

reduzir o quórum necessário para a verificação de admissibilidade a 50 000 signatários;

rever o regulamento ao fim de três anos;

criar uma cooperação interinstitucional.

2.   Introdução

2.1   O CESE acolhe com agrado os princípios essenciais da proposta de regulamento da Comissão relativo à iniciativa de cidadania. O presente parecer completa o adoptado em 17 de Março de 2010 sobre a «Aplicação do Tratado de Lisboa: Democracia participativa e a iniciativa de cidadania (art. 11.o (1) e trata apenas os pontos que o CESE considera valer a pena melhorar.

2.2   O CESE chama sobretudo a atenção para a exposição de motivos da Convenção Europeia que declarou explicitamente pretender criar para os cidadãos, no âmbito da «vida democrática da União», um instrumento de definição da agenda política equiparável àquele de que dispõem o Parlamento e o Conselho.

3.   Propostas de alteração da proposta de regulamento

3.1   Registo de uma proposta de iniciativa de cidadania (artigo 4.o)

3.1.1   Abordagem em três etapas

O CESE congratula-se igualmente com a abordagem em três etapas preconizada pela Comissão

registo formal de uma iniciativa

verificação legal de admissibilidade após conseguido o quórum estabelecido

avaliação política de iniciativas bem sucedidas.

A verificação de admissibilidade proposta por várias partes imediatamente aquando do registo não parece ter muito sentido porque desse modo seria adiado ou impedido o arranque de certas iniciativas. Também não se poderá criticar ou mesmo censurar a Comissão por ter realizado uma avaliação ex ante.

O CESE sublinha neste contexto que a iniciativa de cidadania é não só um elemento transeuropeu inovador de democracia directa, mas representa também um canal de comunicação fundamental para dinamizar o debate político europeu. Só assim será possível alimentar o discurso europeu com várias propostas e ideias que, de outro modo, jamais alcançariam a fase de recolha de assinaturas, o que tem em si já muito valor.

3.1.2   Informações a fornecer

O CESE subscreve a proposta da Comissão relativamente às informações exigidas (Anexo II), visto isso contribuir para o máximo de transparência e, por conseguinte, para a aceitação das iniciativas propostas. Contudo, a menção da base jurídica deveria ficar ao critério dos organizadores, em vez de ser obrigatória.

3.1.3   Registo formal

O CESE considera que os critérios designados no projecto para fundamentar a de recusa de um registo («em termos razoáveis», «carácter abusivo» ou «ausência de um conteúdo sério») não têm valor judicial. Além disso, estes conceitos dão margem às mais variadas interpretações.

O CESE propõe, por isso, que o registo formal seja avaliado pela via administrativa apenas se a proposta de iniciativa

tiver em conta a «unidade da matéria», ou seja, não procure agrupar diferentes reivindicações num só documento,

não contiver qualquer formulação difamante de indivíduos ou grupos,

desrespeitar a Carta dos Direitos Fundamentais ou for «manifestamente contrária aos valores da União» (artigo 2.o do TUE).

3.1.4   Meios de recurso

Em geral, o direito dos cidadãos a uma «boa administração» (artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais) terá de ser obviamente garantido. No caso de um registo ser recusado, os organizadores poderiam, neste contexto, apelar para o Mediador Europeu e interpor naturalmente, em última instância, recurso. O CESE é de opinião que, no interesse da transparência, este facto deveria ser mencionado expressamente, pelo menos, na exposição de motivos.

3.1.5   Controlo da subsidiariedade

O CESE considera supérflua a ligação com o princípio da subsidiariedade reivindicada por várias partes. A Comissão procederá de qualquer modo a este controlo se decidir apresentar uma proposta legislativa em reacção a uma iniciativa de cidadania.

3.2   Recolha de declarações de apoio (artigo 5.o)

3.2.1   Números de identificação pessoal

Na opinião do CESE, é desproporcional o número de dados pessoais pedidos no formulário proposto (Anexo III), para além de dificultar seguramente a disponibilidade dos cidadãos para assinar uma proposta de iniciativa. O CESE manifesta-se, por conseguinte, contrário à obrigação de indicar um número de identificação pessoal. É improvável que um transeunte que se deixou convencer a aderir a uma proposta de iniciativa esteja disposto a mostrar um documento de identidade ou saiba de cor o seu número de identificação pessoal. O CESE chama igualmente a atenção para o parecer negativo da Autoridade Europeia para a Protecção de Dados (2) a este respeito.

Uma vez que nem todos os Estados-Membros exigem ou conhecem este número de identificação pessoal e são exigidos os mais variados documentos de identidade, consoante o Estado-Membro (3), essa obrigação levaria a uma manta de retalhos de dados diversos e tornaria impossível a igualdade de condições na recolha de assinaturas. O princípio da igualdade de tratamento dos cidadãos europeus estaria a ser violado quando o objectivo deverá ser adoptar um procedimento uniforme.

O CESE entende, por conseguinte, que para a verificação da identidade deveria bastar indicar o nome, a morada, a data de nascimento e a nacionalidade. Juntar-se-ia a isso uma declaração de honra do signatário para atestar que assinou a iniciativa apenas uma vez.

3.2.2   Princípio da residência

Segundo o princípio da residência, os cidadãos da UE deveriam ser por via de regra imputados ao Estado em que residem, independentemente da nacionalidade. Um cidadão da UE que vive num Estado-Membro que não é o seu conta para o país que indica como seu local de residência, mas se tiver residência num país terceiro conta para o Estado-Membro do qual declarou ter nacionalidade.

3.2.3   Prazo máximo para a recolha de assinaturas

Na opinião do CESE, o prazo exigido pela Comissão de doze meses é demasiado curto para levar a bom termo uma iniciativa à escala europeia. Insiste, portanto, na sua sugestão de dezoito meses.

3.3   Sistemas de recolha em linha (artigo 6.o)

O CESE regozija-se com a possibilidade de recolha de assinaturas em linha e partilha da opinião da Comissão de que para assegurá-la serão necessários preparativos muito cuidadosos. Como, até à data, não havia à escala mundial nenhum sistema equiparável para a recolha de assinaturas nos processos de apresentação de iniciativas (distinto das petições de massa que são juridicamente muito menos vinculativas), o CESE vê por bem verificar os seguintes aspectos:

A Comissão tem de promover o desenvolvimento e a disponibilidade de software livre (open source) para iniciativas em linha.

Os promotores das iniciativas têm de tratar da certificação deste software no Estado-Membro onde os dados transmitidos são memorizados graças ao sistema de recolha em linha.

Outras características electrónicas de identificação, por exemplo através de uma mensagem electrónica de confirmação, devem poder constituir um sistema de verificação perfeito.

Clicando num quadrado para o efeito, o signatário confirmaria que é única a assinatura aposta.

3.4   Número mínimo de signatários por Estado-Membro (artigo 7.o)

3.4.1   Número de Estados-Membros

O CESE mantém a sua sugestão de um 1/4 dos Estados-Membros. Para haver equivalência entre o Parlamento e os cidadãos, aplica-se aqui o mesmo princípio observado na criação de partidos políticos (4). Não está certo que uma iniciativa europeia de cidadania tenha de enfrentar maiores obstáculos do que o registo de um partido europeu.

3.4.2   Número de signatários por Estado-Membro

O CESE acolhe favoravelmente o sistema proposto de um número mínimo de signatários (anexo I) degressivamente proporcional à dimensão de cada Estado-Membro. De acordo com o princípio da residência (ver ponto 3.2.2), quem possui duas nacionalidades ou os cidadãos da UE que vivem noutros Estados-Membros deveriam ser contados pelo local de residência que indicarem. Os casos de eventual duplicação de assinatura deveriam, na prática, ser mantidos dentro de limites muito estritos para não se pôr em causa o instrumento na sua íntegra.

3.5   Decisão sobre a admissibilidade de uma proposta de iniciativa de cidadania (artigo 8.o)

3.5.1   Número de assinaturas exigidas

O CESE apoia a abordagem em três etapas da Comissão. Considera, todavia, demasiado elevado o número indicado pela Comissão de 300 000 assinaturas para a verificação de admissibilidade. Isso acarretaria para os organizadores um aumento considerável de tarefas. Além disso, seria muito frustrante para os signatários receber a comunicação de que a iniciativa não é admissível.

O controlo da admissibilidade deveria ser possível a partir de 50 000 assinaturas de cidadãos de três Estados-Membros (e sem verificação) e a decisão deveria ser tomada, no máximo, dentro de dois meses. Durante este período os organizadores poderiam prosseguir a sua recolha.

3.6   Verificação e atestação das declarações de apoio pelos Estados-Membros (artigo 9.o)

O CESE subscreve a admissibilidade de amostras aleatórias em caso de avaliação.

3.7   Apresentação de uma iniciativa de cidadania à Comissão (artigo 10.o)

Para garantir a maior transparência possível, cada signatário deveria poder informar-se sobre quem, a nível organizativo e financeiro, se encontra atrás de uma iniciativa. O CESE reitera, por isso, a sua reivindicação de que o organizador, na entrega das assinaturas, forneça informações também sobre as formas de financiamento e de apoio a uma iniciativa de cidadania.

3.8   Análise de uma iniciativa de cidadania pela Comissão (artigo 11.o)

3.8.1   Equiparação ao procedimento adoptado nas iniciativas do Parlamento ou do Conselho

O CESE reivindica que as iniciativas de cidadania da Comissão sejam tratadas da mesma forma que as iniciativas propostas pelo Parlamento e pelo Conselho, nos termos do artigo 225.o do TFUE, e tenham, por conseguinte, o mesmo valor.

3.8.2   Direito a uma audição pública

Sendo uma iniciativa de cidadania da UE também um canal de comunicação que poderá estimular o diálogo entre os cidadãos e a Comissão da UE, haverá que organizar uma audição pública após a sua apresentação. O CESE está disposto a dar o seu contributo neste contexto, incumbindo-se, por exemplo, da organização desta audição e transformando assim em realidade a sua função de ponte entre a UE e os cidadãos.

3.8.3   Informação das instituições consultivas

A comunicação da Comissão relativa ao seu procedimento ulterior deveria ser igualmente dirigida ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões.

3.9   Cláusula de revisão (artigo 21.o)

Como não há experiência prévia com este novo instrumento transnacional, o CESE recomenda que este regulamento seja revisto logo ao fim de três anos. Chegado este momento, o CESE deveria também ser consultado pela Comissão.

3.10   Entrada em vigor do regulamento (artigo 22.o)

O CESE concorda com os prazos propostos pela Comissão para a entrada em vigor do regulamento, mesmo, por exemplo, ainda antes de serem determinados todos os detalhes da recolha de assinaturas em linha. Como são assaz elevadas as expectativas depositadas pelos cidadãos neste este instrumento, o regulamento deveria entrar em vigor o mais brevemente possível.

3.11   Outras questões pendentes

3.11.1   Apoio financeiro

O CESE reitera o seu pedido no sentido de a Comissão conferir um certo apoio financeiro a uma iniciativa de cidadania que tenha superado as 50 000 assinaturas.

3.11.2   Tradução

No entender do CESE, os serviços da Comissão deveriam traduzir em todas as línguas oficiais da UE, logo aquando do registo de uma iniciativa, a breve síntese dos objectivos da proposta (segundo o anexo II de apenas 800 caracteres).

Após a entrega das 50 000 assinaturas e a autorização formal, a Comissão deveria comprometer-se a traduzir o texto completo da iniciativa registada em todas as línguas oficiais da UE.

4.   Propostas específicas do CESE

O CESE remete para as propostas formuladas no seu parecer supramencionado de 17 de Março de 2010 que serão a seguir mais especificadas.

4.1

Comunicação e informação

O CESE realça a necessidade de organizar uma campanha de informação exaustiva logo que o regulamento entrar em vigor. As instituições da UE deveriam colaborar e coordenar as suas actividades neste contexto. O CESE está já a preparar um folheto informativo para esclarecer e ilustrar aos cidadãos e às organizações da sociedade civil as novas possibilidades oferecidas pelas iniciativas de cidadania, mas tratando igualmente das consultas e do diálogo civil. Além disso, o CESE tenciona realizar uma conferência das partes interessadas logo que o regulamento seja adoptado. Poder-se-ia realizar outras iniciativas, dirigidas, por exemplo, às escolas, para sensibilizar justamente as gerações mais jovens.

4.2

Cooperação interinstitucional

É importante assegurar uma concertação e coordenação estreita entre o pessoal das instituições e dos órgãos consultivos da UE encarregado da iniciativa de cidadania, a fim de atender eficazmente às necessidades de informação dos cidadãos. Este efeito sinérgico - desde que sejam respeitadas as competências de cada um - é necessário para que a direito de iniciativa de cidadania se torne um instrumento útil ao serviço de um modelo europeu de democracia moderna.

4.3

Participação do CESE

O CESE vê o seu papel dividido em duas fases distintas:

4.3.1

Primeira fase: o CESE como facilitador

Na fase de preparação ou enquanto a iniciativa está em curso, o CESE está disposto a desempenhar o papel de plataforma para facilitar o diálogo e a informação, procurando articular em rede e pôr eventualmente em contacto as iniciativas de cidadania, o que não o vincula necessariamente ao conteúdo da iniciativa.

4.3.2

Segunda fase: O CESE como acompanhante institucional

No desempenho da sua função principal – reacção às consultas da Comissão, do Parlamento e do Conselho – o CESE poderia ser nesta fase acompanhar institucionalmente uma iniciativa de cidadania. Oferece-se, neste contexto, para ajudar a Comissão, no âmbito da sua consulta interna, a formar a sua opinião sobre uma iniciativa bem sucedida através de um parecer. Disponibiliza-se igualmente para colocar à disposição a sua infra-estrutura para a organização de audições sobre a iniciativa em causa.

4.3.3

Reforços das estruturas existentes

As propostas do presente parecer e do parecer de 17 de Março de 2010 do CESE requerem eventualmente um reforço das estruturas existentes no Comité e podem tornar necessários recursos suplementares que garantam uma resposta adequada a este novo desafio.

Bruxelas, 14 de Julho de 2010

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Mario SEPI


(1)  A publicar no JO.

(2)  Parecer de 21 de Abril de 2010 sobre a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à iniciativa de cidadania (Fonte: http://www.edps.europa.eu/EDPSWEB/)

(3)  Orientação geral para uma proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à iniciativa de cidadania (10626/2/10 REV 2).

(4)  Regulamento (CE) n.o 2004/2003 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de Novembro de 2003, relativo ao estatuto e ao financiamento dos partidos políticos a nível europeu (JO L 297 de 15.11.2003).


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