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Document 52015AE3697

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Legislar melhor para obter melhores resultados — agenda da UE» [COM(2015) 215 final]

OJ C 13, 15.1.2016, p. 192–200 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

15.1.2016   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 13/192


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Legislar melhor para obter melhores resultados — agenda da UE»

[COM(2015) 215 final]

(2016/C 013/28)

Relator:

Bernd DITTMANN

Em 1 de junho de 2015, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Legislar melhor para obter melhores resultados — agenda da UE

[COM(2015) 215 final].

O Subcomité para Legislar Melhor, criado nos termos do artigo 19.o do Regimento e incumbido da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 2 de setembro de 2015, por unanimidade.

Na 510.a reunião plenária de 16 e 17 de setembro de 2015 (sessão de 16 de setembro), o Comité Económico e Social Europeu adotou, por 174 votos a favor, 3 votos contra e 9 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

Legislar melhor e de forma inteligente constitui uma tarefa comum de todas as instituições europeias e dos Estados-Membros, tendo como principal objetivo aumentar a qualidade da legislação europeia em benefício dos cidadãos, das empresas, dos consumidores e dos trabalhadores. A melhoria da legislação não substitui, contudo, as decisões políticas. Trata-se de um processo em contínuo desenvolvimento. Assim, apesar de terem já sido possíveis avanços consideráveis, existe ainda uma grande margem para melhorias.

1.2.

Há muito que o CESE consagra grande atenção ao tema «Legislar melhor», como o atesta a compilação dos seus principais pareceres sobre o assunto (1). Assim, o Comité assume uma responsabilidade especial pelo apoio e aceitação do direito europeu e da melhoria da legislação por parte da sociedade civil.

1.3.

O CESE constata que a agenda «Legislar melhor» não leva devidamente em conta o papel e a função do Comité que lhe foram conferidos pelos Tratados da UE e pelos acordos de cooperação com a Comissão Europeia e com o Parlamento Europeu (PE). Por conseguinte, apela a que os órgãos consultivos da UE sejam incluídos no acordo interinstitucional.

1.4.

O CESE preconiza a plena implicação dos interessados através de consultas durante todo o ciclo de vida de uma iniciativa política e remete, a este respeito, para o seu parecer sobre a avaliação das orientações relativas às consultas. Realça ainda que a seleção correta dos grupos-alvo e a garantia de que as partes consultadas são representativas constituem aspetos essenciais da melhoria da legislação que devem ser aperfeiçoados.

1.5.

O CESE considera essencial assegurar um máximo de independência, imparcialidade e transparência na seleção dos peritos para o Comité de Controlo da Regulamentação, para a plataforma REFIT e para todos os outros órgãos, bem como para as audições, ateliês e outros eventos.

1.6.

O CESE apela à inclusão da autorregulação e corregulação no acordo institucional, que devem ser ponderadas em pé de igualdade com as medidas regulamentares na resolução de questões políticas.

1.7.

O CESE apela a que os trílogos informais sejam aplicados apenas em determinadas situações de emergência e que a maioria da legislação seja adotada segundo o processo legislativo normal.

1.8.

O CESE exorta a Comissão a centrar-se mais nas lacunas ao nível da transposição e aplicação da legislação da UE pelos Estados-Membros e a fazer uso de regulamentos em vez de diretivas.

2.   A agenda «Legislar melhor» — uma avaliação geral

2.1.

O CESE considera que as medidas e os instrumentos da agenda «Legislar melhor» devem contribuir para uma melhoria da qualidade e da eficácia dos atos jurídicos europeus e para a adoção de regras simples, compreensíveis e coerentes, que ajudem a atingir os objetivos enunciados nos Tratados da UE, sobretudo o reforço e conclusão do mercado interno europeu, e que representem uma mais-valia para os cidadãos, as empresas, os consumidores e os trabalhadores na Europa.

2.2.

A Europa constitui um espaço jurídico comum que tem por obrigação garantir um quadro jurídico válido, fiável e aplicável. O conceito de «legislar melhor», que se foca não só em medidas ex ante ao nível da UE mas também na transposição e aplicação coerentes da legislação europeia pelos Estados-Membros, prevendo a aplicação de medidas de melhoria da legislação ao longo de todo o ciclo de vida (2) de um ato jurídico, constitui um contributo valioso para a integração europeia e para os cidadãos, se não se limitar à introdução de novos procedimentos e instrumentos tecnocráticos e se todas as instituições europeias e Estados-Membros se empenharem na criação de uma cultura da boa legislação.

2.3.

A Comissão apresenta a sua comunicação e a respetiva documentação como um novo ponto de partida. As propostas apresentadas são sem dúvida ambiciosas, mas o Comité não pode deixar de notar que a melhoria da legislação não constitui nenhuma novidade, sendo debatida e trabalhada há muitos anos. As melhorias assim conseguidas contribuíram para que a legislação europeia seja fundamentalmente de elevada qualidade, em benefício dos cidadãos, das empresas, dos consumidores e dos trabalhadores europeus. O CESE considera que, em comparação com os legisladores nacionais ou com o nível internacional, os mecanismos e procedimentos adotados ao nível da UE asseguram eficazmente um elevado nível de qualidade da regulamentação (3). No entanto, como se pretende demonstrar através do presente parecer, continua a existir margem para melhorias. O CESE reconhece, todavia, que, graças à agenda «Legislar melhor», já se registaram avanços consideráveis.

2.4.

Perante o aumento das críticas que se erguem contra o conceito de «legislar melhor», o CESE sublinha que, na sua opinião, esse conceito não significa «mais» ou «menos» legislação da UE, nem se trata de desregulamentar ou de deixar de conceder prioridade a determinados domínios de intervenção, comprometendo assim os valores da UE, como a proteção social e ambiental e os direitos fundamentais (4). Legislar melhor é em primeiro lugar um instrumento através do qual se pretende garantir que os objetivos políticos são atingidos, numa base fundamentada e orientada pelos valores da União, sem reduzir os direitos ambientais e dos consumidores nem as normas sociais e sem que a criação de novos órgãos provoque uma transferência de poderes na esfera institucional. A agenda «Legislar melhor» não pode nem deve substituir as decisões políticas.

2.5.

O CESE tem uma intervenção ativa no domínio da elaboração e aplicação democráticas da legislação da UE. O CESE presta há anos um amplo contributo para a melhoria da legislação, tendo elaborado uma série de pareceres com recomendações concretas para o desenvolvimento deste conceito. Está disponível uma compilação das referidas recomendações (5), a qual deverá funcionar como estímulo e fonte de inspiração para um maior aperfeiçoamento da agenda «Legislar melhor». Isto significa que o CESE tem uma responsabilidade especial por apoiar os objetivos da melhoria da legislação e por garantir a sua aceitação pela sociedade civil. Neste momento, o Comité está igualmente pronto a contribuir para uma melhoria da legislação que seja transparente, democrática e coerente.

2.6.

O CESE lamenta que a comunicação da Comissão e todo o pacote «Legislar melhor» não admitam plenamente o papel, funções e representatividade que os Tratados conferem ao Comité, desperdiçando a oportunidade para tirar partido da experiência e da competência dos seus membros e fazer justiça à missão de que foi investido. A participação do CESE na atual agenda «Legislar melhor» ocorre exclusivamente no âmbito da plataforma REFIT (fase ex post) e não reflete devidamente as funções e as responsabilidades do Comité no domínio do reforço da legitimidade democrática e da eficácia das instituições.

2.7.

O CESE pede pois para ser tido em conta de forma adequada no âmbito da agenda «Legislar melhor». O presente parecer contém propostas sobre como e em que pontos o Comité deve ser envolvido.

3.   Acordo interinstitucional — rumo a uma cultura comum de melhor legislação

3.1.

A comunicação da Comissão incide, entre outras questões, nas medidas previstas no acordo interinstitucional. Para o CESE, a proposta de um acordo interinstitucional é um dos elementos centrais da agenda «Legislar melhor». Há que apoiar a Comissão para que desenvolva permanentemente os objetivos desta agenda, com a participação de toda a sociedade civil. Para isso, terá que contar, especialmente, com o apoio dos órgãos legislativos, a saber, o Conselho e o PE. A proposta de um acordo interinstitucional é ambiciosa e só poderá ter sucesso se houver um compromisso claro de todas as instituições para com os objetivos e conteúdos de uma agenda «Legislar melhor», bem como uma aplicação consequente das propostas constantes do acordo interinstitucional, à luz dos Tratados da UE. Um fracasso das negociações significaria um enorme retrocesso, podendo mesmo ficar-se aquém dos compromissos do acordo interinstitucional de 2003.

3.2.

Apesar do reconhecimento do papel e da importância do CESE pelo PE (6), em nenhum ponto do acordo interinstitucional se refere o CESE ou o CR, nem o papel e as funções que lhes são conferidos pelos Tratados, o que é inaceitável.

3.3.

Desde que o CESE seja consultado atempadamente pela Comissão, estará pronto a apoiar as instituições da UE nas medidas de melhoria da legislação, a desenvolver novas ideias, a tomar uma posição exaustiva sobre os projetos que recaiam sobre a sua esfera de responsabilidades, a garantir a elevada qualidade desses projetos e, se necessário, a acompanhar as iniciativas da UE ou, em determinados casos, a funcionar como instância de teste para as iniciativas planeadas.

3.4.

O CESE apela, por conseguinte, para uma inclusão no acordo interinstitucional de ambos os órgãos consultivos da UE relativamente às medidas da agenda «Legislar melhor» que também sejam da sua responsabilidade, segundo os Tratados da UE e os acordos de cooperação com a Comissão e o PE.

3.5.

A avaliação dos conteúdos materiais concretos do acordo interinstitucional ocorrerá através de um parecer de iniciativa, após a sua adoção pelo Conselho e pelo PE.

4.   Avaliação da comunicação sobre a agenda «Legislar melhor»

4.1.    Alteração no modo de funcionamento ao nível europeu

4.1.1.

Com a sua nova organização interna, a articulação das suas medidas com as orientações políticas, a elaboração de um programa de trabalho coerente ao nível europeu e o reforço da interação com as instituições, a Comissão pretende conseguir uma melhor regulamentação e melhores resultados.

4.1.2.

O CESE congratula-se com o facto de a Comissão ter iniciado um intercâmbio estruturado com o Conselho e o PE para o programa de trabalho anual e o planeamento programático plurianual, e por a Comissão se aconselhar com o CESE antes de publicar o programa de trabalho anual, nos termos do acordo de cooperação. O referido intercâmbio deve abranger todo o ciclo de planeamento do programa e desenvolver sinergias através de um diálogo regular do CESE com o PE, a Comissão e o Conselho, com vista a permitir acompanhar as medidas do programa de trabalho mesmo após a sua adoção e a melhorar a colaboração geral. O CESE sugere que o planeamento de novas iniciativas e prioridades decorra no quadro das estratégias e planos de integração existentes (nomeadamente a Estratégia Europa 2020, o programa de crescimento anual e o Semestre Europeu/recomendações específicas por país) e inclua informações pormenorizadas sobre o modo como as medidas planeadas se encaixam nas estratégias existentes e refletem os objetivos das mesmas. Evita-se, deste modo, que certas áreas políticas e objetivos de estratégias já existentes se sobreponham ou sejam subordinados.

4.2.    Melhores consultas, mais abertura e transparência

4.2.1.

A Comissão prevê a participação das partes interessadas através de consultas durante todo o ciclo de vida de uma iniciativa política. As partes interessadas devem ser consultadas sobre os roteiros, avaliações de impacto na fase inicial, atos jurídicos emanados do colégio dos comissários, avaliações ex post e balanços de qualidade, bem como sobre os projetos de atos delegados e atos de execução. Além disso, deve melhorar-se a fundamentação dos atos jurídicos.

4.2.2.

O CESE acolhe favoravelmente o objetivo de conseguir uma maior transparência e um reforço da participação dos interessados ao longo de todo o ciclo de vida de um ato jurídico. O CESE sempre destacou a importância de consultar intensivamente as partes interessadas (7), pois uma consulta ampla pode contribuir para a qualidade e a adequação da legislação, na medida em que permite encontrar um meio-termo entre a consecução dos objetivos políticos, por um lado, e a garantia da simplificação administrativa, por outro. A realização de uma consulta mais adequada aumentará a sensibilização e melhorará a implementação (8).

4.2.3.

Em julho de 2015, num parecer sobre a avaliação da consulta das partes interessadas (9), o CESE apresentou propostas de aperfeiçoamento das possibilidades de consulta a que se faz plena referência no âmbito do presente parecer. Neste contexto, o CESE reconhece que as orientações contêm, em geral, disposições úteis para a realização de consultas valiosas do ponto de vista qualitativo. No entanto, e tal como demonstra claramente o parecer acima citado, existem ainda numerosos casos (inclusivamente atuais) em que as novas orientações não são aplicadas de forma coerente pelos serviços responsáveis da Comissão. O CESE exorta, por conseguinte, à aplicação obrigatória das orientações nos serviços da Comissão, enquanto normas de qualidade para a consulta das partes interessadas.

4.2.4.

É essencial definir claramente o grupo-alvo de uma consulta, a fim de obter as informações necessárias. O CESE poderia, no âmbito das suas competências e em colaboração estreita com todas as organizações pertinentes e com a Comissão, ajudar a identificar as organizações representativas dos grupos-alvo (10). Através do reforço dos mecanismos de consulta das partes interessadas, o CESE considera necessário garantir a transparência na seleção dos peritos chamados a integrar os órgãos ou a participar em conferências e seminários, etc. Há também que dar mais atenção à representatividade dos interessados e prever, na avaliação dos resultados, uma ponderação qualitativa e quantitativa, consoante determinada reação provenha de um indivíduo ou de uma organização representativa da sociedade civil, devendo ser atribuída uma importância relativamente mais elevada aos contributos provenientes de uma organização.

4.2.5.

A qualidade das perguntas (amiúde formuladas em termos que condicionam o teor das respostas), a sua escolha e os mecanismos de auscultação deixam frequentemente muito a desejar (11). Neste contexto, o CESE tem apresentado propostas abrangentes sobre como eliminar estas deficiências (12). Assim, na elaboração de questionários para consultas, o Comité poderia intervir ao nível das perguntas, contribuindo com questões ou funcionando regularmente como «instância de teste», com vista a verificar se as perguntas são pertinentes. A análise e o controlo das consultas e a criação de um observatório correspondente por parte do CESE (13) poderiam constituir um contributo adequado para a melhoria da qualidade das consultas.

4.2.6.

É igualmente importante definir adequadamente os prazos de consulta, que não devem prolongar desnecessariamente o processo de regulamentação, se bem que, por outro lado, prazos de quatro, oito ou 12 semanas possam ser demasiado curtos para a obtenção de respostas construtivas no caso de consultas sobre iniciativas relativamente complexas ou muito técnicas. O planeamento estruturado e constantemente atualizado da consulta (nos roteiros da Comissão) e a divulgação dos seus objetivos, incluindo uma indicação fiável do tempo, podem ajudar as partes interessadas a preparar a sua participação.

4.2.7.

A fim de aumentar a transparência e a clareza para as partes interessadas, o CESE propõe que, no sítio web central da Comissão sobre as consultas (14), sejam enumeradas e publicadas de forma clara e unívoca todas as consultas em curso de instituições da UE, de agências europeias e de instituições a jusante (15), assim como todas as consultas relativas a atos delegados ou de execução. Preconiza ainda que estas consultas sejam divulgadas em toda a Europa através de uma estratégia de comunicação abrangente.

4.2.8.

É particularmente de louvar a consulta relativa aos atos delegados (artigo 290.o do TFUE) e aos atos de execução (artigo 291.o do TFUE). A falta de transparência, a insegurança jurídica evidente e a escassez de controlo político do anterior sistema de consultas relativas a atos jurídicos subordinados são justamente motivo de críticas frequentes (16). O CESE insta à criação de um registo próprio de atos delegados correspondente ao registo de comitologia. O recurso a atos delegados e a atos de execução deve ser severamente limitado e devidamente fundamentado. As medidas a jusante devem nortear-se de forma coerente pelo ato legislativo de base. As decisões políticas não podem ser prejudicadas ao nível dos atos delegados e dos atos de execução.

4.2.9.

Além disso, deve assegurar-se de que não ocorre nenhuma duplicação de consultas ou conteúdos de atos delegados ou de execução com consultas relativas a orientações de agências da UE ou respetivos conteúdos.

4.2.10.

Há que fazer uma distinção de princípio entre as consultas dos parceiros sociais — segundo os procedimentos de diálogo social dispostos nos Tratados (artigos 154.o e 155.o do TFUE) — e as consultas públicas de todos os intervenientes pertinentes da sociedade civil (nos termos do artigo 11.o, n.o 3, do TUE). Cada tipo de consulta tem uma função específica e uma legitimidade diferente.

4.2.11.

Embora os conteúdos das ferramentas para legislar melhor refiram que as consultas dos parceiros sociais não estão sujeitas ao padrão mínimo aplicável às consultas, mas sim às disposições aplicáveis às consultas públicas, o CESE não se abstém de salientar que a comunicação em apreço não pode, de modo algum, ser usada como pretexto para submeter as consultas dos parceiros sociais europeus ou os resultados das negociações a controlos ex ante ou ex post por meio de consultas públicas. O diálogo social constitui um procedimento especial previsto no TFUE (17) que tem de ser respeitado. As consultas públicas não podem, por conseguinte, substituir as consultas dos parceiros sociais (18). Importa assegurar que os resultados de acordos entre os parceiros sociais são efetivamente postos em prática, nos termos do disposto no artigo 155.o do TFUE (19).

4.3.    Instrumentos melhorados para melhores soluções

4.3.1.

No futuro, ao elaborar novas medidas, a Comissão deverá aplicar as novas orientações integradas relativas a legislar melhor (20), comprometer-se a examinar igualmente as possibilidades não legislativas, como a corregulação e a autorregulação, e prestar especial atenção ao princípio «pensar primeiro em pequena escala», ao teste PME e à possibilidade de isentar as microempresas de determinados requisitos europeus.

4.3.2.

O CESE congratula-se com o facto de as orientações para legislar melhor terem sido clarificadas, revistas e completadas numa versão consolidada, através de um conjunto de ferramentas aprofundado. Na opinião do Comité, estes instrumentos podem contribuir em muito para melhorar a legislação e assegurar um apoio amplo e uma aplicação coerente ao nível da Comissão, graças à sua apresentação harmonizada num documento. O Secretariado-Geral deve velar pela sua observância em todos os serviços da Comissão.

4.3.3.

A Comissão salienta que as orientações para legislar melhor garantirão «que a preservação da competitividade e do desenvolvimento sustentável da UE continua a ser uma prioridade em tudo aquilo que fazemos» (21). Neste aspeto, a ação da UE deve manter uma relação equilibrada entre os objetivos fundamentais da UE e a necessidade de promover a competitividade. Por seu lado, o CESE apela para que todas as propostas legislativas e não legislativas sejam submetidas a um exame efetivo e coerente, em consonância com os objetivos enunciados no artigo 3.o do TUE, e insta a que se realize regularmente uma avaliação da competitividade.

4.3.4.

O CESE sempre alertou para a necessidade de tornar os procedimentos mais transparentes, levando em conta de forma abrangente e mais equilibrada as considerações económicas, sociais, ambientais e relativas aos consumidores (22), aspetos que cumpre examinar sistematicamente em cada avaliação de impacto. O CESE pode, no âmbito das suas competências, contribuir para uma avaliação equilibrada destes instrumentos e procedimentos.

4.3.5.

A legislação deve, em princípio, ser elaborada por forma a poder ser aplicada do mesmo modo a todas as empresas. É de louvar o renovado empenho da Comissão em relação ao princípio «pensar primeiro em pequena escala» e a atenção consagrada aos interesses das PME (incluindo as microempresas).

4.3.6.

É incontestável a necessidade de regulamentação pela via legislativa para as empresas de todas as dimensões, mas, no caso das pequenas empresas e, especialmente das microempresas, esta regulamentação dificulta muitas vezes a sua constituição e gestão. O CESE salienta que as microempresas não devem beneficiar de uma isenção geral. Preferível seria, no caso de propostas legislativas, definir para cada caso individual a abordagem mais justa, com base numa cuidadosa avaliação de impacto (23). Neste processo, há que ter em conta os interesses das microempresas e não impor limites aos direitos dos trabalhadores e dos consumidores.

4.3.7.

O CESE congratula-se com a transformação do Comité das Avaliações de Impacto num Comité de Controlo da Regulamentação e insta a que se garanta, tanto quanto possível, a transparência, imparcialidade e independência dos peritos. A admissão de peritos externos é um passo na direção certa, uma vez que permite, por um lado, garantir uma maior imparcialidade do órgão, e, por outro, aumentar, presumivelmente, a coerência e as sinergias nas avaliações de impacto, em virtude do alargamento do âmbito de ação, que passa a estender-se também a avaliações e balanços de qualidade. Em todo o caso, o objetivo deve continuar a ser a criação de um órgão de avaliação de impacto único e independente, que sirva todos os organismos da UE e promova o intercâmbio com os órgãos consultivos já instituídos, nomeadamente o CESE e o CR. Esse órgão independente deve recorrer a peritos externos, ser presidido por um elemento externo e analisar as propostas da Comissão (24). A Comissão deve tornar claro que o seu objetivo é um órgão independente externo e que a composição atual deve ser encarada apenas como mais um passo intermédio nessa direção. Seria deste modo possível garantir a transparência e a especialização e evitar que a legislação da UE seja guiada por interesses de ordem vária.

4.3.8.

O CESE assinalou em estudos (25) e pareceres (26) a importância da autorregulação e da corregulação e das suas particularidades como um caso de «subsidiariedade horizontal» (27). O Acordo interinstitucional «Legislar melhor» de 2003 inclui um capítulo dedicado a esta questão. O CESE considera que, em alguns casos, a autorregulação e/ou a corregulação podem constituir um instrumento de prevenção eficaz ou complementar útil à ação legislativa, desde que devidamente enquadrados no contexto de um amplo sistema legislativo que seja claro, bem definido e pautado, entre outros, por princípios de transparência, independência, eficácia e responsabilidade (28).

4.3.9.

Há que assegurar um aumento da transparência através de medidas de melhoria da legislação, sobretudo tendo em conta o aumento massivo do recurso a trílogos informais (29). Este objetivo pode ser conseguido através da publicação dos resultados de cada reunião tripartida e de cada trílogo, antes da sua adoção pelo Conselho e pelo PE. Embora se reconheça que o recurso aos trílogos acelera o processo legislativo, ele é também responsável pelo principal problema da prática legislativa atual: a tendência crescente para os Estados-Membros no Conselho estabelecerem «grelhas de negociação» abarcando diferentes atos jurídicos, a fim de conseguirem maiorias para determinadas diretivas. Esta situação decorre frequentemente sem a mínima transparência e sob enorme pressão temporal, sem uma participação satisfatória dos peritos dos Estados-Membros, do PE e da Comissão, e sem uma análise suficiente dos efeitos dos principais aspetos das referidas grelhas de negociação. Esta situação afeta a qualidade e a transparência da legislação.

4.3.10.

Por conseguinte, há que garantir, no âmbito dos procedimentos para legislar melhor, que os trílogos informais são utilizados apenas em casos urgentes especiais e que a esmagadora maioria da legislação é elaborada segundo o processo legislativo normal. Só assim será possível garantir a total legitimidade e participação democráticas.

4.4.    Reforço da avaliação ex post, programa REFIT e plataforma REFIT

4.4.1.

A Comissão propõe ainda que se dedique uma atenção reforçada à avaliação, que os atos legislativos sejam avaliados ao longo de todo o ciclo de vida, que o programa REFIT seja mais orientado para os objetivos e incorporado no programa de trabalho e que se realizem balanços de qualidade (fitness checks). Há que melhorar a implementação dos atos jurídicos e criar uma plataforma REFIT, na qual o CESE também tenha assento.

4.4.2.

O CESE saúda a proposta da Comissão de dar especial importância à avaliação e de associar ao processo os outros órgãos da UE e a sociedade civil. As avaliações ex post, em que os objetivos declarados são comparados com os resultados conseguidos, constituem importantes instrumentos de análise, sobretudo visto que, segundo o modelo do ciclo de vida de um ato jurídico, as conclusões tiradas desse exercício podem ser diretamente aproveitadas para uma eventual avaliação de impacto com vista à revisão do ato jurídico. O CESE congratula-se com o facto de os representantes da sociedade civil organizada, das empresas, dos trabalhadores e dos consumidores — que são, regra geral, os destinatários dos atos jurídicos — poderem participar neste processo através de consultas públicas bem direcionadas. Além disso, refere que as avaliações só devem ter início depois de o ato jurídico ter sido implementado durante um período de tempo adequado, para que se possa recolher e levantar dados e informações pertinentes sobre os efeitos do ato em causa (30).

4.4.3.

A participação do CESE neste processo é essencial. Os acordos de cooperação com a Comissão e o PE preveem uma participação do CESE que, além do mais, pode gerar sinergias na cooperação com o PE. O modelo de ciclo de vida de um ato jurídico asseguraria que os pontos de vista do CESE seriam tidos em conta numa fase precoce do processo. Se necessário, o CESE poderia também proceder às suas próprias avaliações e apresentar os resultados na plataforma REFIT juntamente com outras partes interessadas e com os Estados-Membros e a Comissão, melhorando assim a sua cooperação com as instituições e promovendo as avaliações do programa REFIT. A inclusão do programa REFIT no próximo programa de trabalho anual da Comissão permitiria ao CESE contribuir mais uma vez para a programação.

4.4.4.

O CESE saúda os esforços da Comissão no sentido de melhorar os procedimentos e os instrumentos do programa REFIT, remetendo, neste contexto, para pareceres anteriores (31).

4.4.5.

A revogação de certos atos jurídicos obsoletos pela Comissão é uma prática que deve ser prosseguida. O Comité apoia, de um modo geral, a realização de balanços de qualidade (32). A Comissão deve apresentar e publicar numa página web, de forma transparente, todos os balanços de qualidade realizados, em curso e programados.

4.4.6.

O CESE acolhe favoravelmente a criação de uma plataforma REFIT, na qual o Comité participe, que deverá recolher e analisar propostas de simplificação administrativa resultantes de legislação da União e da respetiva transposição e aplicação nos Estados-Membros. O CESE apela para que o grupo de interessados tenha uma composição equilibrada, pois isso será determinante para o seu êxito. O Comité é representado nesse grupo por um perito de alto nível. A Comissão deve, em todo o caso, esclarecer de que modo o mandato representativo do CESE e do CR se relaciona com a plataforma REFIT. O papel institucional especial do CESE e do CR deve ser tido em conta, em comparação com o de outras partes interessadas. Na generalidade, o CESE congratula-se com a participação dos Estados-Membros neste órgão, que deveria permitir encetar a qualquer altura um intercâmbio com os representantes dos Estados-Membros. O PE deve ser periodicamente informado sobre o trabalho da plataforma REFIT e deve poder participar na sua reunião anual.

4.4.7.

Na opinião do CESE, um dos principais pontos fracos da agenda europeia «Legislar melhor» reside no insuficiente envolvimento dos Estados-Membros. Este facto é problemático não apenas para os Estados-Membros mas também para a UE, pelo que não é de admirar que os Estados-Membros, na ausência de medidas e planos de transposição cuidadosos e baseados em dados concretos, assim como de medidas para uma efetiva aplicação do direito da UE, procedam por vezes à sua aplicação de forma hesitante, com atrasos e incorreta, ou que nem sequer cheguem a transpor essa legislação.

4.4.8.

É de lamentar que a comunicação da Comissão não se debruce sobre esta questão nem apresente propostas sobre possíveis formas de prestar auxílio. Assim se explica que, em 2013, tenham ainda sido instaurados 1 300 procedimentos de infração contra os Estados-Membros. Atualmente são menos problemáticos os procedimentos de infração motivados por atrasos na aplicação da legislação (em finais de 2013 estavam pendentes 390 processos). O que se verifica é que, tal como em 2012, a maior parte dos casos de incumprimento (62 % de todos os casos) resulta sobretudo do desrespeito das normas da UE em matéria de ambiente, fiscalidade, trânsito, mercado interno e serviços (33).

4.4.9.

Neste contexto, uma possibilidade seria a Comissão empenhar-se mais na informação ao público, uma vez que, no fim de contas, os governos dos Estados-Membros que transpõem a legislação de forma incorreta, com atraso, ou que não a transpõem de todo são os mesmos que aprovaram no Conselho essa mesma legislação. Assim, são eles os responsáveis pela implementação geralmente insuficiente do acervo da UE, a qual é constatada todos os anos nos relatórios sobre a aplicação do direito comunitário. A Comissão deve, além disso, verificar sistematicamente quais as medidas indispensáveis para uma alteração fundamental da situação atual, levando em conta as propostas anteriores do CESE (34).

4.4.10.

Nos casos em que há necessidade de regulamentação, deve verificar-se caso a caso, e consoante o teor e o contexto da regulamentação em causa, se é mais adequado adotar diretivas ou regulamentos. Para evitar, por exemplo, medidas de transposição divergentes ou sobrerregulamentação (gold plating) (35), há que recorrer preferencialmente a regulamentos, em vez de diretivas (36), já que tal garantiria maior clareza e segurança jurídicas.

4.4.11.

A transposição do direito da UE para os Estados-Membros e a sua implementação a nível nacional são, além disso, indicadores importantes para a posterior avaliação da legislação pelos governos nacionais. A obrigação da Comissão de elaborar «planos de implementação» para as diretivas importantes (37), com o objetivo de facilitar a transposição para os Estados-Membros através de medidas de apoio da Comissão, é um dos aspetos louváveis do novo pacote «Legislar melhor». Inclui-se aqui a possibilidade de a Comissão solicitar aos Estados-Membros documentos que clarifiquem a estratégia de transposição nacional e que efetuem um teste de conformidade em duas etapas. Na opinião do CESE, este é decididamente um passo na direção certa, mas só a prática dirá até que ponto é que estas medidas serão eficazes.

Bruxelas, 16 de setembro de 2015.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Henri MALOSSE


(1)  http://www.eesc.europa.eu/?i=portal.en.int-opinions&itemCode=36193

(2)  Neste contexto, o ciclo de vida compreende a apresentação de uma proposta ao nível da Comissão, desde a fase de preparação, passando pela fase de conceção, adoção do projeto pela Comissão, procedimento legislativo, entrada em vigor do ato jurídico, transposição, aplicação pelos Estados-Membros, avaliação pela Comissão, escrutínio ao abrigo do programa REFIT e, se for o caso, atualização, revisão, anulação e reformulação de um projeto.

(3)  Relatório de 2010 do Tribunal de Contas Europeu: «Commission’s system represents EU and international best practice in terms of its transparency and its comprehensiveness» [O sistema da Comissão constitui uma boa prática a nível da UE e internacional por ser transparente e exaustivo].

(4)  COM(2015) 215 final.

(5)  http://www.eesc.europa.eu/?i=portal.en.int-opinions&itemCode=36193

(6)  Relatório sobre o programa para a adequação e a eficácia da regulamentação (REFIT): situação atual e perspetivas [2014/2150 (INI)]; relatora: Sylvia-Yvonne Kaufmann, n.o 19.

(7)  JO C 48 de 15.2.2011, p. 48.

(8)  Ver nota 8.

(9)  Ver nota 8.

(10)  Ver nota 8.

(11)  Ver nota 8.

(12)  Ver nota 8.

(13)  Ver nota 8.

(14)  Sobretudo, por exemplo, as autoridades europeias de supervisão, como a EIOPA, a ESMA e a EBA.

(15)  http://ec.europa.eu/yourvoice/consultations/index_pt.htm

(16)  Parecer do CESE sobre os «Atos delegados» (ver página 145 do presente Jornal Oficial).

(17)  Artigos 154.o, n.os 2 e 3 do TFUE.

(18)  É esse igualmente o teor do relatório da Comissão dos Assuntos Jurídicos do PE sobre o programa para a adequação e a eficácia da regulamentação (REFIT): situação atual e perspetivas [2014/2150(INI)], n.o 10.

(19)  Exemplo negativo: Acordo relativo aos cabeleireiros.

(20)  SWD(2015) 111.

(21)  COM(2015) 215 final, ponto 3.1.

(22)  JO C 230 de 14.7.2015, p. 66.

(23)  JO C 327 de 12.11.2013, p. 33.

(24)  Ver nota 23.

(25)  http://www.eesc.europa.eu/?i=portal.en.int-opinions.32948

(26)  JO C 291 de 4.9.2015, p. 29.

(27)  Ver nota 23.

(28)  JO C 230 de 14.7.2015, p. 66, ponto 5.10.

(29)  Este procedimento foi utilizado em 80 % da legislação na última legislatura do PE.

(30)  Ver nota 22.

(31)  Ver nota 22.

(32)  Ver nota 23.

(33)  31.o relatório anual sobre o controlo da aplicação do direito da UE (2013), COM(2014) 612 final.

(34)  Ver nota 22.

(35)  O CESE está a concluir um estudo que analisa esta questão em profundidade.

(36)  Em comparação com a legislatura de 2000-2004, na qual se recorreu mais a diretivas do que a regulamentos (155 regulamentos contra 191 diretivas), a última legislatura (2010-2014) revelou uma nítida tendência para recorrer mais a regulamentos (383) em detrimento das diretivas (136).

(37)  Better Regulation Guidelines [Orientações para Legislar Melhor] [SWD(2015) 111 final], capítulo IV: http://ec.europa.eu/smart-regulation/guidelines/docs/swd_br_guidelines_en.pdf


ANEXO

Texto de um projeto de parecer do Comité que foi rejeitado mediante uma proposta de alteração aprovada pela Assembleia Plenária:

Ponto 4.3.10

Por esta razão, o CESE toma nota da iniciativa (que já fazia parte do acordo interinstitucional de 2003) de submeter as propostas de alteração pertinentes, sobretudo do Conselho e do PE, a uma avaliação de impacto, por forma a melhorar decisivamente a qualidade da legislação. Ao mesmo tempo, lamenta que a comunicação da Comissão não aborde devidamente esta questão. Por conseguinte, há que garantir, no âmbito dos procedimentos para legislar melhor, que os trílogos informais são utilizados apenas em casos urgentes especiais e que a esmagadora maioria da legislação é elaborada segundo o processo legislativo normal. Só assim será possível garantir a total legitimidade e participação democráticas.

Resultado da votação: 106 votos contra, 59 votos a favor e 19 abstenções.


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