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Document 52010AE0983

    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o tema «O impacto no emprego das mutações industriais decorrentes dos desafios ecológicos, energéticos e climáticos» (parecer exploratório)

    JO C 44 de 11.2.2011, p. 40–46 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    11.2.2011   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 44/40


    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o tema «O impacto no emprego das mutações industriais decorrentes dos desafios ecológicos, energéticos e climáticos» (parecer exploratório)

    2011/C 44/07

    Relator: Valerio SALVATORE

    Co-relator: Enrique CALVET CHAMBÓN

    Em carta datada de 19 de Fevereiro de 2010, Paul MAGNETTE, ministro do Clima e da Energia, solicitou, em nome da Presidência belga, ao Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que elaborasse um parecer exploratório sobre:

    O impacto no emprego das mutações industriais decorrentes dos desafios ecológicos, energéticos e climáticos.

    Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Comissão Consultiva das Mutações Industriais que emitiu parecer em 1 de Julho de 2010.

    Na 464.a reunião plenária de 14 e 15 de Julho de 2010 (sessão de 15 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 89 votos a favor, 2 votos contra e 5 abstenções, o seguinte parecer:

    1.   Conclusões e recomendações

    1.1

    O contexto global no qual se inscreve o pedido da Presidência belga para examinar as mutações industriais em matéria de emprego, resultantes da luta contra o aquecimento global, caracteriza-se por um triplo fracasso ou, para empregar um termo menos brutal, por três cenários negativos no meio de uma crise económica colossal.

    A.

    Na União Europeia, os bons objectivos da Estratégia de Lisboa não foram atingidos.

    B.

    Uma enorme crise atingiu o sector financeiro, devido a uma regulação disfuncional e a uma vigilância insuficiente.

    C.

    Os resultados da cimeira da ONU, em Copenhaga, que deveria permitir chegar um acordo internacional sobre o clima que substituísse o protocolo de Quioto, foram muito insuficientes.

    1.2

    A UE deve, por um lado, contribuir efectivamente para a redução mundial dos gases com efeito de estufa e, por outro, desenvolver a sua economia e o seu mercado de trabalho, a fim de atingir os objectivos de Lisboa no decurso da próxima década, isto é, uma posição competitiva a nível mundial e o fim do desemprego maciço na Europa.

    1.3

    O Comité e, a CCMI, em particular, deram um certo número de contributos relacionados com os desafios em matéria de energia e clima, sustentabilidade, mutações industriais e emprego, Nomeadamente através dos seguintes pareceres: CCMI/002, 024, 027, 029, 045, 052 e 053; ECO/267; NAT/392, 440 e 453; TEN/401. O presente parecer trata o problema seguindo uma lógica horizontal, mas é evidente que são igualmente indispensáveis estudos regionais e sectoriais para concretizar as ideias aqui desenvolvidas, particularmente em matéria de emprego.

    1.4

    A Estratégia 2020 da União Europeia deverá responder ao insucesso que teve a Estratégia de Lisboa. Ela representa, assim, uma nova oportunidade, desde que o papel determinante das PME seja aí reforçado. O CESE propõe reforçar a cooperação económica a nível europeu e promover uma nova concepção comum da noção de competitividade.

    1.5

    A UE necessita de uma governação económica reforçada nas suas instituições, ou seja, de uma reflexão sobre a transferência de soberania para as instituições europeias existentes de determinadas matérias da política económica, a fim de favorecer as mutações industriais que geram uma economia europeia mais ecológica e empregos sustentáveis.

    1.6

    O desenvolvimento demográfico, as dificuldades ambientais em África, na Ásia e na América Latina, a escassez de água potável em muitos países e a luta contra as alterações climáticas são evoluções que favorecem a procura mundial de tecnologias e produtos ecológicos, bem como a criação de empregos sustentáveis. É preciso ter em conta, igualmente, que as reservas conhecidas de matérias-primas utilizadas para gerar energia não são ilimitadas.

    1.7

    Uma estratégia de emprego para uma economia sustentável pode-se basear em conhecimentos teóricos e práticos já bem desenvolvidos nos Estados-Membros. Estes trunfos devem ser promovidos pela UE que precisa de empregos qualificados. É assim que os Estados-Membros devem investir mais nos seus sistemas de educação e de formação contínua e promover, nomeadamente, as ciências, a tecnologia e a engenharia. O CESE julga absolutamente insuficiente o nível actual de investimento público na educação, que se deve enquadrar numa estratégia coerente de aprendizagem ao longo da vida.

    1.8

    A UE e os seus Estados-Membros têm que tomar as medidas necessárias para que as transições industriais não colidam com os seus objectivos de manutenção e criação de emprego.

    1.9

    Uma economia ecológica com um elevado nível de investigação e de aplicação de novos conhecimentos e que vise aumentar a competitividade deveria ter um impacto no mercado de trabalho criando mais empregos qualificados e estáveis e diminuindo o risco de precariedade. Por este motivo, os Estados-Membros devem investir mais nos seus sistemas de educação e de formação contínua.

    1.10

    O sector público desempenha um papel importante no apoio à investigação, bem como na utilização efectiva de novas tecnologias ecológicas e na melhoria das tecnologias ecológicas existentes e eficazes, essencialmente graças aos seus instrumentos fiscais. É por isso que o progresso económico, social e ambiental pressupõe a existência de um sector público saudável e dotado das qualificações adequadas. Enfraquecê-lo através da privatização de todas as actividades económicas nem sempre serviria o interesse geral. O CESE é de opinião que vai ser preciso rever o quadro regulamentar dos mercados liberalizados da energia para salvaguardar o interesse geral.

    1.11

    Os novos empregos serão criados pelo sector privado e, sobretudo, pelas PME. Caberá também ao sector público criar um quadro estável e construtivo a nível europeu, que permita às empresas optimizar a transição para uma economia mais ecológica, com melhor desempenho mais empregos sustentáveis.

    1.12

    O CESE propõe a criação de um fundo europeu específico para apoiar as mutações industriais e, nomeadamente, a investigação, o desenvolvimento e a aplicação das tecnologias ecológicas, sejam elas tecnologias de energias renováveis ou novas tecnologias que permitam reduzir efectivamente as emissões de gases nas indústrias com elevado consumo de energia.

    1.13

    O Comité lembra que a UE precisará de uma base industrial sólida, pois esta é indispensável para atingir os objectivos do emprego sustentável. Muitos empregos, mesmo nos serviços, dependem do sucesso da indústria europeia. Por isso, as mutações industriais variam de sector para sector e de região para região e devem ser realizadas gradualmente, evitando repercussões negativas nos mercados de trabalho e sem comprometer a existência de uma rede industrial indispensável. Não se trata de travar as políticas ambientais, mas sim de as gerir de uma forma socialmente sustentável.

    1.14

    O CESE recomenda que a reforma da Política Agrícola Comum após 2013 tenha em conta a importância da agricultura e contribua para o desenvolvimento das sinergias necessárias com outras políticas comunitárias em matéria de investigação, de novas tecnologias e de modernização industrial.

    1.15

    Os Estados-Membros devem chegar a acordo quanto a um imposto sobre as transacções financeiras. As receitas desse imposto deveriam ser utilizadas para reduzir os défices nos orçamentos públicos dos Estados-Membros, dando-lhes, assim, mais alento para, por exemplo, financiar melhor os seus sistemas educativos.

    1.16

    As mutações industriais para uma economia ecológica exigem uma concepção totalmente nova do crescimento e da competitividade. O CESE já se pronunciou a favor de uma outra abordagem para medir o progresso económico e social. Reafirma a sua convicção de que as mutações industriais e o emprego só serão compatíveis com os objectivos de sustentabilidade se a UE e o resto do mundo conseguirem chegar a acordo sobre um outro conceito de crescimento. A proposta feita pela Comissão sobre a Estratégia 2020 é insuficiente.

    1.17

    O CESE julga que é da responsabilidade das instituições europeias trabalhar no sentido de um «level playing field» (condições iguais para todos) ao nível mundial, que evite deslocalizações (ou mesmo o desmantelamento de sectores inteiros) prejudiciais para o emprego e o ambiente.

    1.18

    Enquanto porta-voz institucional da sociedade civil europeia e fórum importante de um diálogo estruturado, o CESE advoga a participação democrática dos cidadãos europeus no grande debate, que é necessário realizar, sobre mutações industriais, seu impacto nos mercados de trabalho, seu ritmo e suas repercussões sociais globais.

    2.   Âmbito do parecer

    2.1

    A Presidência belga pediu que este documento fosse de natureza política e abrisse novas pistas de reflexão. Segundo os representantes da Presidência, a abordagem deste texto deve ser horizontal e geral e não sectorial. Trata-se de uma estratégia política e não de um estudo. A Presidência belga prevê o exame deste parecer num conselho informal dos ministros da Energia.

    2.2

    Os desafios ecológicos e climáticos são os que se encontram na base das declarações do Conselho Europeu relativas à Cimeira de Copenhaga. O desafio energético tem várias dimensões. O acesso dos europeus aos recursos energéticos deve ser assegurado no quadro de uma política internacional da UE e dos seus Estados-Membros. Este aspecto não é tratado no presente parecer, o qual se debruça sobre os desafios energéticos no quadro das mutações industriais causadas pela luta contra as alterações climáticas, e sobretudo em ligação com os efeitos destas transformações no emprego à escala europeia.

    2.3

    O presente parecer emprega os termos «ecológico/verde» para designar bens ou métodos de produção que se inscrevem numa lógica de sustentabilidade e contribuem, assim, para realizar os objectivos da UE na luta contra o aquecimento global. O CESE defende uma economia europeia mais ecológica e, quanto aos mercados do trabalho, a criação de um máximo de empregos ecológicos, ou seja, empregos (incluindo formações/qualificações) necessários para obter este resultado, que sejam, por um lado, de qualidade no que toca aos seus níveis de qualificação, e, por outro, capazes de garantir a inclusão social (ver parecer TEN/401 sobre o tema «Promover empregos ecológicos sustentáveis para o pacote da UE respeitante à energia e às alterações climáticas», no qual é citada a definição de «empregos ecológicos» proposta pelo director do Departamento de Análise Económica e dos Mercados de Trabalho do BIT, em resposta a uma iniciativa recente da Comissão Europeia). O CESE relembra, neste contexto, o seu parecer de Outubro de 2009 sobre «flexigurança» (1).

    3.   Desafios, resultados e nova oportunidade

    3.1

    Convém relembrar sucintamente o contexto global em que se inscreve o pedido da Presidência belga. Este contexto corresponde a desafios que se resumem a três insucessos que estão interligados.

    Os desafios – o insucesso da Estratégia de Lisboa

    3.2

    A Estratégia de Lisboa, tal como foi oficialmente definida nas Conclusões do Conselho Europeu de Lisboa, de 23 e 24 de Março de 2000, tinha como objectivo fazer da UE a «economia do conhecimento mais competitiva e mais dinâmica do mundo até 2010, capaz de um crescimento económico sustentável acompanhado por uma melhoria quantitativa e qualitativa do emprego e de uma maior coesão social».

    3.3

    No início do ano de 2010, o Comité é obrigado a constatar que, infelizmente, estes objectivos – bem escolhidos e necessários – não foram atingidos. Em matéria de emprego, o balanço é particularmente negativo. A Estratégia de Lisboa previa, nomeadamente, os efeitos positivos que uma economia mais competitiva teria no emprego.

    Os desafios – o insucesso das regras do mercado financeiro

    3.4

    A melhoria da situação económica – a fase de crescimento dos anos 2005 a 2008 – deveu-se a vários factores. Os países europeus virados para a exportação de bens industriais beneficiavam da grande procura dos países asiáticos, principalmente da China. Certos países europeus registavam, por seu turno, um crescimento que, sabemo-lo hoje, era pernicioso, nos sectores da especulação financeira e imobiliária. Ora, os progressos assentavam, por um lado, na procura externa e, por outro, numa forte especulação no sector imobiliário. Tratava-se, portanto, de um crescimento não sustentável na UE. Um crescimento sustentável e mercados de trabalho com bom desempenho precisam tanto da exportação como da procura interna.

    3.5

    A crise financeira mundial pôs termo a qualquer esperança ligada à Estratégia de Lisboa, que registou um fracasso total. O desemprego na Europa está a aumentar e não se vislumbra o fim da crise. A sociedade do conhecimento ainda não é uma realidade, se olharmos para as dificuldades que muitos Estados-Membros experimentam nos seus sistemas educativos e para a parte do PIB, longe dos objectivos de Lisboa em demasiados países, que a investigação da UE representa. A dívida pública, e em certos casos a dívida privada, atingem tal proporção na UE que se teme a falência de certos Estados-Membros. É preciso que a solução para estes problemas, do lado das receitas e das despesas, não impeça a realização dos investimentos importantes.

    Os desafios – o insucesso da Cimeira de Copenhaga

    3.6

    Em 15 e 16 de Junho de 2001, o Conselho Europeu de Gotemburgo tinha acrescentado uma nova dimensão à Estratégia de Lisboa. A estratégia de desenvolvimento sustentável juntou-se à Estratégia de Lisboa. O conjunto preconizava o exame das consequências económicas, sociais e ambientais das políticas europeias, incluindo, sobretudo, a dimensão mundial das alterações climáticas.

    3.7

    Foi à escala mundial que a ONU tentou concluir um acordo em Copenhaga, de 7 a 18 de Dezembro de 2009, a fim de reforçar a luta contra o aquecimento global causado, segundo as análises da maioria dos cientistas, pela emissão de gases com efeito de estufa. Os 192 países que tinham ratificado a «Convenção-quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas» de 1997 tentaram, em vão, renegociar um acordo internacional sobre o clima, que substituísse o protocolo de Quioto em vigor desde 2005.

    3.8

    É evidente que as alterações climáticas e a poluição ambiental, sobretudo nas cidades muito grandes, são um grave problema. Além disso, a evolução demográfica a nível mundial requer respostas urgentes. Nove mil milhões de pessoas só podem sobreviver se os recursos forem utilizados de forma mais sustentável e equitativa. A questão da insuficiência da energia e da sua acessibilidade colocar-se-á cada vez mais se as nossas sociedades não encontrarem respostas inteligentes, antes que seja demasiado tarde. Neste caso, é necessário utilizar as tecnologias e as soluções disponíveis como, por exemplo, as que permitem melhorar o desempenho energético dos edifícios existentes. Além disso, são indispensáveis novas tecnologias, sobretudo para as indústrias de elevado consumo energético, mas é também preciso que surja uma nova consciência dos bens públicos como a água (que é necessário gerir melhor e, especialmente, conservar melhor), devendo o acesso a água fazer parte dos direitos do Homem.

    3.9

    Esta dimensão mundial é considerável, porque dá a oportunidade a uma indústria inovadora na Europa que se caracteriza, já actualmente, por uma elevada competitividade no mercado de bens e serviços ecológicos. Ao defender, sem ingenuidade, esta posição nas suas negociações à escala internacional, a UE pode, ao mesmo tempo, contribuir eficazmente para a redução global dos gases com efeito de estufa e desenvolver a sua economia e o seu mercado de trabalho, com o objectivo de atingir os objectivos de Lisboa.

    Os resultados: os pontos de referência do Comité

    3.10

    Nos últimos anos, o Comité, e, em particular, a CCMI deram um certo número de contributos para os desafios em matéria de energia e clima, sustentabilidade, mutações industriais e emprego. O presente parecer tem em conta esses importantes trabalhos. Os elementos novos que surgem aqui resultam da tomada de consciência que o triplo fracasso (da Estratégia de Lisboa, das regras do mercado financeiro e da conferência de Copenhaga) acima descrito suscitou.

    3.11

    O CESE já sublinhou a necessidade de combinar a competitividade com o desenvolvimento sustentável e a coesão social (2).

    3.12

    O CESE considerou que a estratégia para o emprego «não deve ser dissociada do contexto macroeconómico» (3).

    3.13

    O CESE lembrou que «a hipótese de causas antropógenas das alterações climáticas globais devidas a uma presença acrescida de gases com efeito de estufa na atmosfera foi validada pelas decisões políticas dos Estados afectados e da União Europeia» (4).

    3.14

    A CCMI também invocou o tema do desenvolvimento sustentável e das mutações industriais, com o objectivo de «analisar até que ponto o desenvolvimento sustentável definido no Relatório Brundtland poderá agir como catalisador de mutações industriais» (5). A definição de desenvolvimento sustentável, apresentada em 1987 pela Comissão Mundial sobre Ambiente e Desenvolvimento e constante do Relatório Brundtland, constitui igualmente o fundamento do presente parecer.

    3.15

    O Comité adoptou um parecer em que constata uma «nova revolução industrial, que coloca a qualidade de vida e o ambiente no centro do desenvolvimento» (6).

    3.16

    O CESE sublinhou que uma base industrial sólida é fundamental para o modelo social europeu. Alerta para uma possível deslocalização das indústrias de elevada intensidade energética fora da UE que reduziria de forma significativa a capacidade de atracção das zonas industriais na Europa e originaria perdas em termos de crescimento económico e de emprego (7). Neste contexto, o CESE seguirá com interesse a concretização das iniciativas emblemáticas «Uma Europa eficaz na utilização dos recursos» e «Uma política industrial na era da globalização» da Estratégia UE 2020.

    3.17

    O CESE parte da hipótese de que o produto interno bruto (PIB) é um indicador insuficiente para «definir a linha política a seguir para enfrentar os desafios do século XXI» (8). O Comité adoptou um parecer no qual recomenda à Comissão que se esforce por integrar novas medidas na Estratégia 2020, a fim de «dispor, em 2011, de um quadro que permita elaborar propostas claras para acções comparáveis à escala mundial, com vista à Cimeira Mundial para o Desenvolvimento Sustentável convocada pela ONU para 2012» (9).

    3.18

    Quanto à Estratégia Europa 2020 (10), o Comité apelou a que se privilegie a criação de novos empregos.

    3.19

    O CESE criticou a Comissão por não ter aprofundado a sua análise em torno dos grandes temas do futuro, ou seja, «a passagem a uma economia de baixas emissões de carbono, a protecção da biodiversidade, da água e de outros recursos naturais e a promoção da integração social, assim como o reforço da dimensão internacional do desenvolvimento sustentável» (11). Para atingir os seus objectivos, a estratégia de desenvolvimento sustentável da UE deveria ter uma «estrutura de governação completamente nova» (12). O CESE considerou que seria conveniente medir o progresso do bem-estar humano de uma forma diferente da que tem sido feita até agora.

    3.20

    Por fim, o CESE lembrou que os países industriais mais desenvolvidos deveriam reduzir as suas emissões de gases com efeito da estufa em pelo menos 80 % até 2050.

    Uma nova oportunidade: a Estratégia Europa 2020

    3.21

    A Estratégia UE 2020 deverá encontrar uma resposta para o insucesso da Estratégia de Lisboa. A Comissão Europeia publicou, em 3 de Março de 2010, uma comunicação que esboçava esta nova filosofia para a evolução socioeconómica da UE (COM(2010) 2020). A Comissão declara querer definir uma estratégia para transformar a UE numa «economia inteligente, sustentável e inclusiva, que permita atingir níveis elevados de emprego, de produtividade e de coesão social». O CESE constata que os superlativos utilizados em 2000 para a estratégia precedente foram postos de lado. A UE devia, de acordo com a Comissão, promover uma economia mais ecológica, visando, designadamente, investimentos na investigação e no desenvolvimento de 3 % do PIB, um nível de emprego de cerca de 75 % da população entre os 20 e os 64 anos e, importante no contexto deste parecer, uma redução das emissões de gazes com efeito de estufa de pelo menos 20 % em relação aos valores de referência de 1990. A Comissão deseja que a qualidade da educação seja reforçada, a fim de realizar um crescimento inteligente, baseado numa competitividade melhorada «face aos nossos parceiros comerciais e reforçando a nossa produtividade». A UE deveria manter o seu papel de motor no mercado das tecnologias ecológicas, mas a vantagem destas tecnologias seria «posta em causa por concorrentes poderosos, nomeadamente a China e a América do Norte».

    3.22

    As primeiras reacções revelam uma certa decepção em relação ao que os cidadãos europeus esperavam dos seus governantes e, no atinente às competências e responsabilidades das instituições europeias, da governação europeia. Os representantes de grupos no Parlamento Europeu qualificaram a estratégia da Comissão de pouco ambiciosa e insuficiente para responder aos desafios actuais e futuros.

    3.23

    O CESE julga sobretudo que o papel determinante das PME deve ser muito particularmente reforçado na Estratégia UE 2020, pois são as PME que criam o maior número de empregos na Europa e, indiscutivelmente, são a força motriz das mutações industriais. É por isso que o CESE exorta a Comissão Europeia a intensificar os seus esforços para instaurar um sistema de protecção da propriedade intelectual, destinado sobretudo às PME que, muitas vezes, não dispõem de meios para proteger as suas invenções.

    3.24

    O CESE propõe reforçar a cooperação económica a nível europeu e promover uma nova concepção comum da noção de competitividade. É desta forma que as mutações industriais, já em curso e necessárias para:

    reduzir as emissões de gases com efeito de estufa,

    utilizar melhor os recursos naturais e

    optimizar a eficiência energética,

    podem criar mais empregos de qualidade nos Estados-Membros da UE, desde que se melhorem os sistemas educativos e se aumentem os investimentos na investigação aumentados.

    4.   Como promover as mutações industriais favoráveis aos objectivos climáticos e de emprego a nível da União Europeia?

    4.1

    A UE precisa de uma governação económica reforçada nas suas instituições, ou seja, de uma reflexão sobre a transferência de soberania para as instituições europeias existentes de determinadas matérias da política económica, quer a nível do Conselho Europeu, quer a nível do grupo do Euro. As consequências da crise financeira mostram que é necessário haver mais coordenação para evitar distorções no mercado interno e favorecer as mutações industriais, tornando a economia europeia mais ecológica e criando empregos sustentáveis.

    4.2

    Os empregos sustentáveis têm futuro, porque serão impulsionados pelas evoluções mundiais que se transformarão em desafios a que tanto os Estados-Membros como a UE terão de responder. Estas evoluções são:

    o desenvolvimento demográfico e o desafio de alimentar 9 mil milhões de seres humanos em 2050,

    o aumento das megacidades que causam enormes problemas ambientais, sobretudo na Ásia e na América Latina,

    a escassez de água potável em muitos países em vias de desenvolvimento,

    a luta contra as alterações climáticas e, consequentemente, a redução das emissões e, sobretudo, a utilização inteligente e sustentável da energia, tanto das reservas (em quedar) de energias fósseis, como da produção alternativa de energia.

    4.3

    Ora, estas evoluções indiscutíveis incitam à procura de produtos e tecnologias ambientais e, consequentemente, favorecem uma indústria moderna que promove empregos sustentáveis. Estes últimos serão, ao mesmo tempo, equitativos, produtivos e a garantia de uma transição justa e de uma forte competitividade. Além disso, esta não se inscreverá numa lógica de crescimento económico puramente quantitativa baseada em indústrias de elevado consumo energético, mas sim numa lógica de sustentabilidade. Mais uma vez, é evidente que é necessária uma abordagem estratégica sectorial; são especialmente os sectores industriais e tecnológicos que têm uma base comum, por exemplo, a construção, a biotecnologia e a nanotecnologia, mas também as novas tecnologias verdes, que podem multiplicar o efeito das mutações industriais no sentido de uma economia mais humana e mais ecológica.

    4.4

    Estas mutações industriais contribuem também para a estabilidade das sociedades e a segurança internacional, já que as consequências nocivas da poluição, das alterações climáticas, da escassez de recursos e do aumento da população mundial representam riscos importantes para a paz no século XXI. Os desafios a este nível são tais que as soluções não podem ser encontradas a nível nacional, mas unicamente numa estreita cooperação a nível internacional e na UE. O espaço integrado da UE deverá dotar-se dos meios políticos e legais necessários para poder cumprir esta missão.

    4.5

    Uma estratégia de emprego deste tipo promete ganhos de produtividade e de rentabilidade a médio e longo prazo. Tal estratégia pode-se basear, actualmente, em conhecimentos teóricos e práticos já bem desenvolvidos nos Estados-Membros da UE e num avanço na área das tecnologias ecológicas, no mercado mundial. Estas vantagens devem ser promovidas pela UE através de directrizes, de fundos europeus e, mediante acordo dos parceiros sociais (em particular os acordos nos termos do artigo 155.o do TFUE), de uma legislação europeia que prepare a transição para uma economia sustentável, com um mercado de trabalho que se caracterize por uma taxa de desemprego baixa e por empregos de qualidade. Uma economia ecológica que inclua um elevado nível de investigação e de aplicação de novos conhecimentos teria um impacto positivo no mercado de trabalho criando mais empregos qualificados e estáveis e diminuindo o risco de precariedade.

    4.6

    Estas consequências positivas contribuiriam também para a criação de empregos de qualidade e não tanto para a criação de empregos atípicos, ou mesmo precários, como os que têm vindo a surgir em determinados sectores do mercado de serviços. Tais empregos precários não seriam favoráveis ao reforço da sociedade do conhecimento, sem dúvida uma condição importante para uma economia competitiva e sustentável. Pelo contrário a UE precisa de empregos qualificados. Por este motivo, os Estados-Membros deveriam investir mais nos seus sistemas de educação e de formação contínua. O CESE julga absolutamente insuficiente o nível actual de investimento público na educação, que se deve inscrever numa estratégia coerente de aprendizagem ao longo da vida.

    4.7

    A noção de competitividade deve ser revista a nível europeu. A Comissão não vai suficientemente longe na sua comunicação de 3 de Março de 2010. Os investimentos nas novas tecnologias ambientais, em conjunto com uma utilização mais consequente das tecnologias existentes, exigem, presentemente, um esforço que não vai aumentar, forçosamente, a competitividade de imediato, mas, se for o caso, numa perspectiva a longo prazo.

    4.8

    A UE devia rever a sua concepção do papel que o sector público pode desempenhar nos Estados-Membros para promover novas tecnologias, mutações industriais e criar empregos sustentáveis. O sector público pode ter a capacidade de investir a longo prazo na promoção de novas tecnologias que ainda não são rentáveis, mas promissoras para o futuro, sem descurar a promoção das tecnologias existentes e eficazes. O sector público desempenha um papel importante no apoio à investigação, na utilização efectiva de novas tecnologias ecológicas e na melhoria das tecnologias ecológicas existentes e eficazes, sobretudo graças aos seus instrumentos fiscais. As entidades públicas deveriam começar por assegurar os investimentos mais aptos para reduzir eficazmente o consumo de energia e a produção de gases com efeito de estufa. Neste contexto, os fundos europeus propostos a seguir podem dar o seu contributo.

    4.9

    É por isso que o progresso económico, social e ambiental requer sectores públicos saudáveis e dotados das qualificações adequadas; Enfraquecê-los com a privatização de todas as actividades económicas nem sempre serve o interesse geral. O sector público, sempre que possível em parceria com o sector privado, deve ser capaz de realizar os investimentos necessários nas infra-estruturas públicas ao serviço da indústria e dos cidadãos europeus. Em contrapartida, devem ser evitadas subvenções de que só beneficiariam algumas empresas, a fim de não hipotecar o funcionamento do mercado. Os Estados-Membros devem servir-se, sobretudo, de instrumentos fiscais para promover as mutações industriais ecológicas.

    4.10

    Além disso, o CESE julga que a liberalização dos mercados de energia não contribuiu, até ao momento, para melhorar a qualidade dos serviços nem para baixar os preços. Há aqui um risco muito sério de investimento insuficiente nas redes energéticas. Conseguir, ao mesmo tempo, uma concorrência efectiva no interesse dos cidadãos europeus, a segurança de fornecimento de energia e a realização de objectivos climáticos, pressupõe que se reveja o quadro regulamentar dos mercados liberalizados.

    4.11

    O CESE propõe a criação de um fundo europeu específico para apoiar as mutações industriais e, nomeadamente, a investigação, o desenvolvimento e a aplicação das tecnologias ecológicas, sejam elas tecnologias de energias renováveis ou novas tecnologias que permitam reduzir efectivamente as emissões de gases.

    4.12

    O Comité lembra que a UE terá necessidade de uma base industrial sólida. O CESE sublinha que a importância socioeconómica dos sectores industriais de elevado consumo de energia varia segundo as regiões europeias. Daí que as mutações industriais se devam fazer gradualmente, com transições para evitar repercussões negativas nos mercados de trabalho das regiões afectadas. O abastecimento de energia é uma questão estratégica para o futuro. É preciso investir mais nas novas tecnologias, o que permitirá aumentar efectivamente a produtividade em relação à energia utilizada e, ao mesmo tempo, reduzir as emissões de gases com efeito de estufa. Os empregos nas indústrias de elevado consumo de energia, por seu turno, podem justamente ser assegurados melhorando o consumo de energia destas indústrias.

    4.13

    O CESE recomenda que a reforma da política agrícola comum após 2013, que já foi tratada num parecer de iniciativa muito consensual, tenha por objectivo garantir um desenvolvimento consentâneo com a importância da agricultura para as zonas rurais da UE (elas representam mais de 80 % do seu território) e com os compromissos internacionais que foram assumidos em relação aos países em desenvolvimento. A revisão deverá contribuir para optimizar as sinergias e, ao mesmo tempo, imprimir um impulso às outras políticas europeias no domínio da investigação, das novas tecnologias e da modernização industrial. Isto aplica-se, sobretudo, aos sectores e regiões especialmente afectados pelas actuais mutações, que se caracterizam pela presença de indústrias que consomem muita energia e têm de investir nas novas tecnologias verdes para reduzir as suas emissões, a fim de proteger o emprego.

    4.14

    Os Estados-Membros devem tomar uma decisão concertada quanto a um imposto sobre as transacções financeiras para atenuar os efeitos devastadores da especulação, com o intuito de estabilizar o sector bancário e reforçar a moeda comum na Zona Euro. As receitas desse imposto deveriam ser utilizadas para reduzir os défices nos orçamentos públicos dos Estados-Membros, dando-lhes, assim, mais alento para, por exemplo; financiar melhor os sistemas educativos. Finanças públicas sãs e mercados de trabalho caracterizados por mão-de-obra qualificada constituem os pressupostos de uma transição ecológica da indústria europeia.

    4.15

    Uma revolução industrial deste tipo terá consequências duradouras para toda a sociedade. As mutações industriais para uma economia ecológica precisarão de uma concepção totalmente nova do crescimento. Hoje, o cidadão define-se pela capacidade de consumir. Seremos nós capazes de definir um bem-estar que se caracterize pela saúde física e mental, pelos direitos democráticos e participativos, pela inclusão social – que se traduz essencialmente pela inclusão no mercado de trabalho, desde que os empregos sejam de qualidade – pelo abastecimento energético e o acesso aos bens públicos e aos serviços de interesse geral? Mas isso implica uma outra noção de crescimento, um outro modo de funcionamento da economia, que o PIB não reflecte. O CESE já se pronunciou a favor de uma abordagem nova para medir o progresso económico e social. Reafirma a sua convicção de que as mutações industriais e o emprego só serão compatíveis com os objectivos de sustentabilidade se a UE e o resto mundo conseguirem chegar a acordo sobre um outro conceito de crescimento. A proposta da Comissão sobre a Estratégia 2020 é insuficiente.

    4.16

    O CESE julga que compete às instituições europeias trabalharem no sentido de um «level playing field» (condições iguais para todos) ao nível mundial que evite deslocalizações (ou mesmo o desmantelamento de sectores inteiros) nefastos para o emprego e o ambiente. A Europa deve ser o motor de boas práticas, mas também deve zelar por que elas sejam aplicadas em todo o mundo, dentro de prazos razoáveis, nomeadamente de modo a evitar consequências negativas (incluindo para o ambiente) causadas por uma aplicação limitada à Europa.

    4.17

    O CESE, enquanto porta-voz institucional da sociedade civil europeia e importante fórum do diálogo estruturado, pugna pela participação democrática dos cidadãos europeus nos debates essenciais. A UE precisa de uma estratégia mais coerente e vinculativa do que a que é actualmente conhecida por «UE 2020», ou seja uma estratégia que torne possível uma transição justa, equitativa e sustentável para uma economia «verde» baseada numa concepção completamente nova do crescimento. Esse novo crescimento de que a Europa e o mundo inteiro carecem deverá radicar na sustentabilidade, na qualidade de vida – uma vida participativa e sã.

    Bruxelas, 15 de Julho de 2010

    O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

    Mario SEPI


    (1)  «A flexigurança no âmbito de reestruturações associadas ao desenvolvimento global» (JO C 318 de 23.12.2009, p. 1).

    (2)  JO C 10 de 14.1.2004, p. 105 e JO C 318 de 23.12.2006, p. 1.

    (3)  JO C 65 de 17.3.2006, p. 58.

    (4)  JO C 185 de 8.8.2006, p. 62.

    (5)  JO C 318 de 23.12.2006, p. 1.

    (6)  JO C 120 de 16.5.2008, p. 57.

    (7)  JO C 77 de 31.3.2009, p. 88.

    (8)  JO C 100 de 30.4.2009, p. 53.

    (9)  CESE 647/2010 – INT/453 (ainda não publicado no JO).

    (10)  JO C 128 de 18.5.2010, p. 3 (ECO/267) e JO C 100 de 30.4.2009, p. 65 (CCMI/053).

    (11)  JO C 128 de 18.5.2010, p. 18.

    (12)  Ibidem.


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