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Document 52006AE1176

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O aprovisionamento energético da UE: estratégia para uma combinação de energias optimizada

JO C 318 de 23.12.2006, p. 185–194 (ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, NL, PL, PT, SK, SL, FI, SV)

23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/185


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O aprovisionamento energético da UE: estratégia para uma combinação de energias optimizada»

(2006/C 318/31)

Em carta datada de 29 de Agosto de 2005, a Comissão Europeia solicitou ao Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, que elaborasse um parecer sobre: «O aprovisionamento energético da UE: estratégia para uma combinação de energias optimizada».

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação do CESE, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 30 de Maio de 2006, sendo relatora Ulla Birgitta SIRKEINEN.

Na 429a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 13 de Setembro de 2006) o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 162 votos a favor, 27 votos contra e 15 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE considera que a Europa necessita de estabelecer como objectivo estratégico a obtenção de uma combinação de energias diversificada, que corresponda da melhor forma a critérios económicos, de segurança do aprovisionamento e de política climática. Face a estes objectivos, todas as fontes de energia e tecnologias apresentam vantagens e desvantagens, que devem ser levadas em conta de forma aberta e equilibrada.

1.2

A combinação diversificada é necessária:

para obter custos de energia razoáveis, através da concorrência entre combustíveis e da eficiência global dos sistemas energéticos, sobretudo no sector da electricidade. Além disso, as fontes de abastecimento têm de ser diversificadas para garantir a concorrência entre os fornecedores;

para aumentar a segurança do aprovisionamento, mediante a substituição das fontes de energia ao surgirem problemas de fornecimento, e para aumentar o poder de mercado dos consumidores;

para fomentar a solidariedade global no que respeita à utilização dos recursos e aos efeitos ambientais.

1.3

A dependência energética externa da UE não pode ser evitada por enquanto, mas há que contar com problemas políticos, económicos e técnicos, resultantes da dependência elevada e crescente de uma única fonte de abastecimento, sobretudo se esta envolver zonas que não respeitem as mesmas regras do jogo ou que sejam politicamente instáveis, como acontece com o petróleo e o gás natural.

1.4

O carvão e o urânio estão disponíveis no mercado mundial a partir de várias fontes, inclusivamente no interior da UE, e não constituem por isso motivo de preocupação.

1.5

Um maior recurso às fontes de energia renováveis para a produção de electricidade tem potencialidades que é necessário explorar. Porém, mesmo que se cumpra o objectivo proposto pelo Parlamento Europeu de, em 2020, produzir 20 % da electricidade a partir de energias renováveis, não é provável que estas possam substituir inteiramente as fontes de energia tradicionais num futuro próximo.

1.6

A utilização de gás natural aumentou, e continua a aumentar, não só por razões de mercado, mas também por opção política, embora já seja evidente que a manutenção desta tendência é problemática. O gás natural dificilmente poderá continuar a substituir o carvão, por razões de segurança de abastecimento e de custos, nem tão pouco poderá substituir a energia nuclear, devido às emissões. Também já houve quem se manifestasse contra a utilização para fins de produção de energia das limitadas reservas de gás natural, que, à semelhança do petróleo, é uma matéria-prima valiosa para usos industriais com elevado valor acrescentado.

1.7

É necessário dar resposta às preocupações com a segurança nuclear, o desmantelamento de centrais nucleares e o tratamento, ainda por esclarecer na maioria dos Estados-Membros, do combustível irradiado, para se poder prosseguir, ou mesmo aumentar, a utilização desta tecnologia, não obstante o tom crítico do debate público a decorrer em muitos Estados-Membros, tendo em conta as suas vantagens no que respeita às alterações climáticas, à reduzida dependência económica externa e à estabilidade dos custos. De acordo com os cenários, num futuro próximo, presume-se que será praticamente impossível concretizar a eventual substituição da energia nuclear sem aumentar o consumo de combustíveis fósseis.

1.8

O CESE preconiza uma atitude cautelosa face às escolhas futuras. Não é sensato partir do princípio de que o futuro é completamente previsível e de que tudo corre perfeitamente de acordo com os objectivos políticos ou com as expectativas mais positivas. É necessário que as escolhas políticas garantam suficiente aprovisionamento de energia a preços razoáveis, mesmo que a evolução seja menos promissora. Qualquer outra atitude seria de uma grande irresponsabilidade.

1.9

Num futuro próximo, há que manter em aberto todas as opções. Os cenários para a UE a 25 apresentados no capítulo 4 sustentam claramente esta conclusão. Nem num cenário pressupondo os maiores progressos em matéria de eficiência energética e um aumento das energias renováveis a exclusão de uma tecnologia energética deixará de produzir um impacto negativo, seja no ambiente ou na economia.

1.10

A actual combinação de energias na Europa deve ser desenvolvida por estratégias políticas no sentido de contrariar a dependência externa e de dispor de mais fontes de energia que não emitam gases com efeito de estufa. Para tal, convém ter presente o possível investimento em diferentes tecnologias por parte dos decisores do mercado.

1.11

O CESE recomenda o desenvolvimento de uma estratégia que vise obter a melhor combinação de energias possível. Neste contexto, é importante clarificar o papel que cabe à UE, aos Estados-Membros, às autoridades independentes e aos intervenientes no mercado. Dado o elevado grau de interdependência dos Estados-Membros em questões energéticas, uma melhor coordenação da política energética na UE melhoraria a capacidade de reacção aos problemas internos e externos.

A estratégia para obter a melhor combinação de energias possível devia ser composta pelos seguintes elementos:

1.12

A eficiência energética, incluindo a produção combinada de calor e electricidade, é a primeira resposta fundamental aos desafios da política energética. Uma maior eficiência não assegura por si só a combinação equilibrada de energias, mas promove todos os objectivos da política energética: competitividade, segurança do aprovisionamento e luta contra as alterações climáticas.

1.13

As fontes de energia renováveis ainda têm grande potencial de desenvolvimento na UE e carecem de apoio. Algumas tecnologias apenas precisam de melhorar a eficiência para se lançarem no mercado, enquanto outras necessitarão de mais investigação e desenvolvimento a longo prazo. As políticas devem ser formuladas com cuidado, de modo a não contribuírem para a já forte tendência de encarecimento da energia.

1.14

Aumentar prudentemente, após exaustivas avaliações de impacto, a utilização dos biocombustíveis nos transportes, na condição, porém, de começar por velar pela transposição efectiva da directiva vigente sobre a promoção da utilização dos biocombustíveis (1).

1.15

Reforçar a eficiência energética nos transportes através da adopção de uma série de medidas (ver ponto 6.3.1.5).

1.16

É premente reforçar a segurança nuclear e procurar uma solução para o problema do combustível irradiado, que está ainda por resolver na maioria dos países. De notar, porém, que se trata de uma responsabilidade dos operadores, cabendo às autoridades de segurança e aos organismos internacionais competentes tomar providências nesse sentido. No que toca ao transporte do combustível irradiado, é preciso respeitar tanto a regulamentação comunitária como os compromissos internacionais.

1.17

Empreender esforços sérios no domínio das tecnologias limpas do carvão, como, por exemplo, investir na eficiência das centrais eléctricas e em aplicações comerciais para a captação e o armazenamento do CO2, uma medida particularmente importante para os progressos globais.

1.18

Preparar-se para um novo aumento da utilização das reservas de carvão da União Europeia, também em estado líquido ou gasoso. Neste e em outros contextos, haverá que ter em mente que as decisões políticas em matéria de energia têm em geral grande impacto económico, social e ambiental e que quaisquer alterações — e o calendário para as efectuar — assumem dimensões consideráveis.

1.19

Incentivar os investimentos nos terminais para gás natural liquefeito, no intuito de diversificar as fontes de aprovisionamento e de desenvolver instalações de armazenamento e medidas de acondicionamento, o que permitirá reduzir os problemas existentes com a manutenção e o aumento da quota do gás natural na combinação de energias.

1.20

Há que garantir investimentos suficientes na produção e no transporte de energia, quer corrigindo o enquadramento jurídico, quer adoptando medidas financeiras adequadas. Por exemplo, os contratos a longo prazo podem constituir um instrumento útil dentro dos limites fixados para assegurar suficiente concorrência.

1.21

A UE deverá falar a uma só voz e assumir a sua posição como um dos mais fortes intervenientes na cena internacional quando negoceia com os fornecedores de energia, em especial com a Rússia. As reacções e negociações em matéria de abastecimento de energia devem ter em conta as várias facetas das dependências mútuas. A União não pode intervir directamente nos mercados da energia, mas, visto que em muitos dos países fornecedores a energia está nas mãos dos governos, deve apoiar fortemente os interesses dos intervenientes comunitários.

1.22

Ao se analisarem as circunstâncias envolventes das escolhas energéticas, há que analisar também os custos externos e o impacto de eventuais subsídios. Também se deverá avaliar cuidadosamente o impacto das medidas políticas climáticas e ambientais, actuais e futuras, nos outros objectivos de política energética — competitividade e segurança do aprovisionamento —, bem como na diversificação do aprovisionamento.

1.23

É necessário encontrar uma solução global para as políticas climáticas «pós-Quioto», que envolva, pelo menos, os principais produtores de emissões. Caso contrário, embora não se obtenham progressos significativos na atenuação das alterações climáticas, poderá existir o risco de prejudicar a evolução económica e social da UE.

1.24

Aumentar os esforços de I&D e o apoio da UE à I&D no sector da energia, em conformidade com a importância e os consideráveis desafios que a energia representa para a sociedade, e, a curto prazo, orientar os esforços para uma melhor eficiência energética, para o desenvolvimento das tecnologias de energias renováveis ainda distantes do mercado, das tecnologias limpas do carvão e da segurança nuclear. Muitas tecnologias de energias renováveis e de eficiência energética precisarão de recorrer a engenharia inteligente para reduzirem os custos. Para tornar possível a visão de um cenário de aprovisionamento energético que inclua as energias renováveis, a fusão nuclear e o hidrogénio será necessário um grande trabalho de investigação e desenvolvimento a longo prazo. Entretanto, há que incentivar e apoiar também elementos de outras visões promissoras do futuro.

2.   Introdução

2.1

O CESE elaborou desde 2002 vários pareceres exploratórios e de iniciativa sobre diversas fontes e tecnologias energéticas: energia nuclear, energias renováveis, combustíveis fósseis e eficiência energética. O presente parecer baseia-se nos anteriores, sem referir especificamente informações e análises mais pormenorizadas neles contidas.

2.2

É impossível prever com exactidão a evolução do sector da energia. Todas as previsões e simulações têm limitações. Acontecimentos surpreendentes ou acções políticas mais radicais podem alterar tendências. Mas as considerações políticas — e mais ainda as decisões — têm de se basear numa informação completa da situação presente, em previsões e cenários tão exactos quanto possível e na compreensão dos factores que aceleram ou travam a mudança. Esta opção baseia-se essencialmente nos cenários da Agência Internacional da Energia (AIE) e da Comissão Europeia e cobre um período que vai até 2030. A partir daí o quadro é muito menos preciso.

2.3

As escolhas das fontes de energia e das tecnologias energéticas é feita pelos investidores e pode ser influenciada por decisões políticas. A UE não tem poder directo sobre as escolhas das fontes de energia pelos Estados-Membros, mas influencia-as indirectamente através do seu mandato no domínio do ambiente. Os Estados-Membros deviam recorrer tanto quanto possível aos seus próprios recursos. As escolhas dos Estados-Membros influenciam-se mutuamente e mesmo os consumidores de Estados-Membros que não possuam, por exemplo, centrais nucleares ou a carvão partilham um mercado de electricidade que utiliza a energia nuclear e o carvão.

2.4

A nossa pergunta fundamental é: poderemos excluir desde já algum dos sistemas existentes ou futuros, ou alguma das opções possíveis? Por outras palavras, saberemos o suficiente e estaremos suficientemente confiantes para restringirmos as opções de que dispomos para cumprir os objectivos da política energética (isto é: um aprovisionamento de energia suficiente e seguro, preços razoáveis e competitivos, a redução dos efeitos negativos sobre o ambiente e o clima)? Procuraremos responder a esta pergunta e apresentaremos as respectivas conclusões e recomendações.

3.   O mercado mundial de energia e a evolução das emissões de dióxido de carbono

3.1

O futuro da energia mundial terá repercussões para o futuro energético da Europa. Actualmente, o consumo de energia e o crescimento externos são superiores aos internos. Mas a crescente procura de combustíveis fósseis repercute-se obrigatoriamente nos preços e na disponibilidade destes na Europa. As alterações dos preços levam a alterações nas escolhas energéticas, no comportamento dos consumidores (particulares e empresas) e na orientação dada aos esforços de investigação e desenvolvimento. Ora tudo isto afecta a Europa. É por isso que, ao se considerarem as opções europeias, é essencial dispor, como referência, de uma imagem do futuro energético a nível global. Nas suas Perspectivas Energéticas Mundiais de 2004 (World Energy Outlook 2004) a Agência Internacional de Energia (AIE) apresenta a sua visão do futuro energético mundial com dois cenários, mostrando a evolução de 2004 a 2030.

O Cenário de Referência de 2004 tem em conta as políticas e medidas governamentais aprovadas ou adoptadas em meados de 2004. O Cenário Mundial de Políticas Alternativas de 2004 (World Alternative Policy Scenario 04), doravante designado Cenário Alternativo de 2004, prevê como evoluiria o mercado energético global se os países de todo o mundo adoptassem um conjunto de medidas que, ou já estão actualmente a ponderar, ou que é razoável esperar que apliquem no período abrangido pela projecção. Algumas partes do Cenário de Referência de 2004 e do Cenário Alternativo de 2004 foram actualizadas nas Perspectivas Energéticas Mundiais de 2005 da AIE, passando a constituir o Cenário de Referência de 2005 e o Cenário Alternativo de 2005.

3.2

Segundo as projecções do Cenário de Referência de 2005, a procura mundial de energia primária deverá aumentar 52 % no período de 2002 a 2030, devendo-se mais de dois terços deste aumento aos países em desenvolvimento. A taxa anual de crescimento da procura de energia, que foi de 2,1 % nas últimas três décadas, abrandará para 1,6 %. Os sectores dos transportes e da produção de electricidade absorverão uma quota crescente da energia global, e o consumo mundial de electricidade duplicará ao longo desse período.

3.3

No Cenário Alternativo de 2005, a procura mundial de energia seria, neste caso, 10 % inferior à do Cenário de Referência de 2005.

3.4

O consumo de energia nos sectores finais crescerá 1,6 % ao ano até 2030 (Cenário de Referência de 2004). A procura por parte do sector dos transportes será a que crescerá mais rapidamente, com 2,1 % ao ano. O consumo de energia nos sectores da habitação e dos serviços crescerá à taxa média anual de 1,5 %, o mesmo acontecendo com a procura industrial.

3.5

Segundo o Cenário de Referência de 2004, a procura mundial de electricidade duplicará entre 2002 e 2030. O maior aumento sectorial registar-se-á no consumo de electricidade na habitação (119 %), seguido pelo sector dos serviços (97 %) e pela indústria (86 %). São necessárias quase 10.000 novas instalações, equivalentes a cerca de 4.800 gigawatts de nova capacidade, para satisfazer o aumento previsto da procura de electricidade e substituir as infra-estruturas envelhecidas.

3.6

De acordo com o Cenário de Referência de 2005, os combustíveis fósseis continuarão a dominar o consumo mundial de energia, sendo responsáveis por cerca de 83 % do aumento do consumo mundial de energia primária. A percentagem de utilização da energia nuclear baixará de 6,5 % para 4,7 %, esperando-se ao invés que a percentagem das fontes de energia renováveis aumente de 13 % para 14 %.

Comparada com o Cenário de Referência de 2004, a procura de combustíveis fósseis no Cenário Alternativo de 2004 diminui 14 % em 2030, ao passo que o consumo de energia nuclear aumenta 14 % e o das fontes de energia renováveis não hidroeléctricas (excluindo a biomassa) cresce 27 %.

3.7

O petróleo continuará a ser o principal combustível. A procura mundial de petróleo irá crescer 1,4 % ao ano até 2030 (Cenário de Referência de 2005), e a quota do mercado mundial da OPEP aumentará de 39 % em 2004 para 50 % em 2030. O comércio petrolífero inter-regional líquido crescerá para mais do dobro durante esse período, e as exportações do Médio Oriente são as que registarão maior crescimento.

Comparada com o Cenário de Referência de 2004, a procura de energia primária é 11 % menor no Cenário Alternativo de 2004.

3.8

A procura de gás natural crescerá à taxa constante de 2,1 % ao ano e o seu consumo aumentará 75 % entre 2003 e 2030. As fábricas de liquefacção tornar-se-ão um novo mercado importante para o gás natural, permitindo utilizar reservas situadas em locais distantes dos mercados tradicionais. A produção aumentará sobretudo na Rússia e no Médio Oriente.

No Cenário Alternativo de 2004 a procura de gás será 10 % menor.

3.9

O carvão continuará a desempenhar um papel fundamental na combinação de energias à escala mundial, aumentando à taxa média anual de 1,4 % (Cenário de Referência de 2005), sobretudo nos países em desenvolvimento asiáticos. O sector da electricidade será responsável por mais de 95 % desse crescimento. Mais de 40 % das reservas mundiais de carvão, equivalentes a quase 200 anos de produção ao ritmo actual, estão situadas nos países da OCDE.

No Cenário Alternativo, a procura de carvão em 2030 será quase Formula inferior à indicada no Cenário de Referência.

3.10

Segundo o Cenário de Referência de 2005, as emissões mundiais de dióxido de carbono aumentarão 1,6 % ao ano entre 2003 e 2030, devendo-se quase 70 % desse aumento aos países em desenvolvimento. Prevê-se que a produção de electricidade contribua para cerca de metade do aumento das emissões mundiais e que os transportes continuem a constituir a segunda maior fonte de emissões de dióxido de carbono em todo o mundo.

Segundo o Cenário Alternativo de 2005, em 2030 as emissões de dióxido de carbono serão 16 % inferiores às do Cenário de Referência e a taxa de crescimento anual no período da projecção diminuirá para 1,1 %.

4.   Mercado de energia e evolução das emissões de dióxido de carbono na UE

4.1

A Comissão Europeia previu vários cenários sobre o futuro energético da UE, com diferentes suposições. Neste capítulo são apresentados dois deles. O Cenário de Base de 2005 (Baseline 2005) mostra o futuro de acordo com as tendências actuais e as políticas a UE e dos Estados-Membros adoptadas antes do final de 2004. Quanto ao Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004 (The high levels of energy efficiency and renewables 04), visa simular os efeitos sobre os recursos energéticos e o ambiente que poderão produzir rigorosas — e rigorosamente aplicadas — políticas de promoção da eficiência energética e da utilização das energias renováveis, tanto quanto tais medidas poderão ser formuladas. Visto que este último cenário não foi actualizado, só o Cenário de Base de 2005 serve de termo de comparação e os dois cenários não são comparáveis. A Comissão não apresentou cálculos das diferenças de custo entre ambos os cenários.

4.2

No ano 2005 o consumo de energia primária na UE a 25 era composto por 18 % de combustíveis sólidos (principalmente carvão), 37 % de combustíveis líquidos (petróleo), 24 % de gás natural, 14 % de energia nuclear e 7 % de energias renováveis. Na produção de electricidade utilizaram-se 29 % de carvão e lignite, 20 % de gás natural, 31 % de energia nuclear, 15 % de energias renováveis (incluindo grandes centrais hidroeléctricas), e 5 % de produtos petrolíferos.

4.3

Segundo as projecções do Cenário de Base de 2005, a procura de energia primária na UE será 15 % mais elevada em 2030 do que em 2000 (+ 0,5 % ao ano), com um crescimento do PIB de 79 %. O Cenário de Base de 2005 mostra que a dissociação entre a procura de energia e o PIB irá continuar e que a intensidade energética (rácio entre o consumo de energia e o PIB) apresenta uma melhoria de 1,5 % ao ano.

No Cenário «Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis» de 2004, prevê-se que, em 2030, as necessidades de energia sejam 14,1 % inferiores aos níveis do Cenário de Base de 2004, mas ainda ligeiramente superiores ao nível existente em 2000.

4.4

Segundo as projecções do Cenário de Base de 2005, o consumo de energia nos sectores finais deverá crescer 25 % até 2030. Prevê-se que a procura de energia no sector terciário em 2030 seja 49 % superior à de 2000, o que se deve ao aumento da procura de electricidade. Espera-se que a procura de energia na habitação aumente 29 % entre 2000 e 2030. Em 2030, o aumento da procura de energia face 2000 será de 21 % no sector dos transportes e de 19 % na indústria.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, a procura de energia é 10,9 % inferior aos níveis para 2030 que figuram no Cenário de Base de 2004.

4.5

Segundo o Cenário de Base de 2005, a procura de electricidade na UE aumentará 43 % entre 2005 e 2030. O crescimento da procura será especialmente rápido no sector da habitação (62 %), seguido pelo sector terciário (53 %) e pela indústria (26 %).

4.6

Prevê-se que a capacidade de produção de electricidade da UE aumente 51 % entre 2000 e 2030 (Cenário de Base de 2005). Uma percentagem crescente de electricidade será produzida sob a forma combinada de calor e electricidade (até quase 10 pontos percentuais, devendo atingir uma quota de produção combinada de 24 % em 2030). A estrutura da produção de energia alterar-se-á significativamente em favor das energias renováveis e do gás natural, enquanto a energia nuclear e os combustíveis sólidos perderão quotas de mercado.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, prevê-se que a produção global de energia em 2030 seja 16 % inferior aos níveis do Cenário de Base de 2004. Os combustíveis sólidos e a energia nuclear descem em termos absolutos (respectivamente, em 2030, -9,3 % do nível do Cenário de Base de 2004) para valores similares de produção de energia.

4.7

O petróleo permanecerá o combustível mais importante, se bem que o seu consumo não deva exceder o nível actual (Cenário de Base de 2005). Espera-se que a procura de gás natural aumente consideravelmente (38 % até 2030) após o substancial aumento que registou nos anos noventa. A quota de mercado dos combustíveis sólidos deverá diminuir ligeiramente até 2020, mas regressar praticamente ao nível actual em 2030, devido aos elevados preços do petróleo e do gás, bem como ao progressivo abandono da energia nuclear em certos Estados-Membros.

De acordo com o Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, uma menor necessidade de energia, combinada com políticas de promoção das energias renováveis, permitirá reduzir significativamente a procura de combustíveis fósseis. Os combustíveis sólidos são os que apresentarão maior declínio (-37,4 % dos níveis do Cenário de Base de 2004).

4.8

No Cenário de Base de 2005, as energias renováveis apresentam um crescimento, em termos relativos, superior ao dos outros combustíveis (mais do que duplicando em 2030 a sua actual parte de mercado), contribuindo quase tanto quanto o gás natural para o aumento da procura de energia.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, as políticas de promoção das energias renováveis permitirão um forte desenvolvimento destas fontes de energia no sistema energético da UE a 25. O aumento é de 43,3 % acima dos níveis do Cenário de Base de 2004 para 2030.

4.9

No Cenário de Base de 2005, a produção de energia nuclear é em 2030 ligeiramente inferior a 2000 (-11 %), o que se deve, por um lado, às decisões políticas de alguns antigos Estados-Membros de reduzir progressivamente a utilização desta energia e, por outro, às preocupações com a segurança das centrais em alguns dos novos Estados-Membros.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, a quota de mercado da energia nuclear seria 19,9 % inferior à do Cenário de Base de 2004.

4.10

A dependência das importações continuará a crescer, atingindo 65 % em 2030, um aumento superior a 15 pontos percentuais em relação ao nível actual (Cenário de Base de 2005). A mais elevada dependência externa continua a ser a do petróleo, atingindo 94 % em 2030. A dependência das importações de gás natural aumenta dos actuais pouco mais de 50 % para 84 % em 2030. Similarmente, também o abastecimento de combustíveis sólidos se apoiará de forma crescente nas importações, atingindo 59 % em 2030.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, a dependência das importações seria 4 a 6 % inferior à do Cenário de Base de 2004.

4.11

As emissões de dióxido de carbono baixaram entre 1990 e 2000. Hoje em dia voltaram ao nível de 1990 e prevê-se que ao longo dos próximos anos excedam o nível de 1990 em 3 % em 2010 e em 5 % em 2030. A longo prazo, o aumento moderado das emissões de dióxido de carbono reflecte uma evolução lenta no consumo de energia, bem como o papel importante que terão adquirido as fontes de energia isentas de emissões de CO2 e a energia nuclear.

No Cenário«Elevados níveis de eficiência energética e utilização de energias renováveis», de 2004, as emissões de dióxido de carbono são consideravelmente inferiores às da evolução prevista no Cenário de Base de 2004 (isto é, em relação aos níveis deste cenário, -11,9 % em 2010 e -22,5 % em 2030). A diminuição em relação ao ano 2000 seria de quase 10 %.

5.   Desafios políticos

5.1   Evolução dos preços

5.1.1

Os aumentos de preços, que são causados pela procura e globais, não têm — muito embora afectem os consumidores — um impacto forte nas economias nacionais quando geram procura nos países produtores. Mas os aumentos de preços abrangendo toda uma área económica, como acontece actualmente em parte com a electricidade, prejudicam tanto os consumidores como a competitividade. A longo prazo, o aumento dos preços altera a competitividade das diferentes fontes de energia e das respectivas tecnologias, a rendibilidade das medidas de eficiência e os comportamentos em geral.

5.1.2

Os preços do petróleo e dos produtos petrolíferos aumentaram drasticamente nos últimos anos e poderão continuar elevados nos próximos anos devido a várias razões, principalmente:

fortes pressões do lado da procura, devido ao rápido crescimento económico nos países asiáticos,

subinvestimento nas infra-estruturas de abastecimento, e ainda

factores geopolíticos e instabilidade política.

5.1.3

Os preços do gás natural sofreram fortes aumentos em todas as regiões, acompanhando os preços do petróleo. Na Europa os preços do gás estão normalmente indexados aos preços do petróleo. Dado que as reservas europeias estão concentradas na Rússia e na Noruega e não é provável que o gás natural liquefeito se torne competitivo a curto prazo, a relação entre os preços irá permanecer. A concorrência entre tipos de gás poderia exercer alguma pressão para uma descida dos preços, mas esse efeito seria em grande medida anulado pelo aumento dos custos de aprovisionamento.

5.1.4

É provável que os preços do carvão continuem moderados a longo prazo, porque muitos aspectos fundamentais do mercado permanecerão inalterados. São muitos os fornecedores actuais e potenciais, o mercado ainda é bastante competitivo e os preços do carvão manter-se-ão em princípio abaixo dos preços de outras matérias-primas da energia primária.

5.1.5

Presume-se que os custos de capital das energias renováveis continuem a diminuir no futuro. A taxa de diminuição mais rápida verificar-se-á nos custos da energia fotovoltaica, que é presentemente o sistema de produção de energia com maior intensidade de capital. Também se prevêem reduções consideráveis nos custos de capital dos parques eólicos offshore, bem como das tecnologias de utilização da energia térmica solar e da energia das ondas e das marés.

5.1.6

Na UE, os preços da electricidade aumentaram por diversas razões. O aumento dos preços do gás contribui para aumentar o preço da electricidade na maioria das regiões da União, onde o gás é um combustível marginal na produção de electricidade. Em contrapartida, os preços mais elevados da electricidade gerada em centrais a carvão dificilmente podem ser justificados pelo aumento constante das matérias-primas. O equilíbrio cada vez mais comprometido entre a oferta e a procura também começou a reflectir-se nos preços. As empresas de aprovisionamento de energia apontam como um dos motivos do aumento dos preços o comércio de emissões, que as obriga a repercutir os pretensos «custos» dos direitos de emissão nos preços ao consumidor, quando estes lhe são concedidos gratuitamente. As medidas de apoio às fontes de energias renováveis fizeram, em alguns casos, aumentar os preços da electricidade, como o fizeram também impostos e outras taxas. Além disso, a Comissão está presentemente a investigar se a insuficiente concorrência existente no mercado da electricidade afectou negativamente os preços.

5.2   Segurança do aprovisionamento

5.2.1

No seu Livro Verde sobre a segurança do aprovisionamento, a Comissão manifestou grande preocupação com esta questão, pois previa-se que a dependência energética externa da UE aumentaria de 50 % para 70 % em três décadas. No seu parecer sobre o Livro Verde (2), o CESE partilhou vivamente esta preocupação. Actualmente, a questão da segurança do aprovisionamento tornou-se mais premente ainda.

5.2.2

A dependência das importações de petróleo a partir de fontes externas está a aumentar e a concentrar-se cada vez mais no Médio Oriente. A crescente procura de gás natural também aumenta a dependência das fontes externas, concentrando-se na Rússia. O transporte por meio de longos oleodutos e gasodutos, que muitas vezes atravessam regiões politicamente instáveis, constitui uma preocupação adicional.

5.2.3

As falhas nas redes têm chamado a atenção (adicionalmente aos problemas de gestão e regulamentação) para a insuficiência dos investimentos face ao aumento da procura de ligações em rede e às distâncias em causa. A interligação das redes de electricidade e de gás natural em toda a Europa progrediu, mas ainda existem importantes zonas de estrangulamento estrutural entre os Estados-Membros. A regulamentação das redes tem de velar simultaneamente pela segurança, pela qualidade e por suficiente investimento.

5.2.4

Os investimentos em centrais eléctricas e refinarias de petróleo têm sido baixos nas últimas duas décadas. Quanto à electricidade, o período de excesso de capacidade está a terminar e até 2030 são necessários investimentos de 600-750 gigawatts para fazer face ao aumento crescente da procura e substituir as centrais envelhecidas. A necessidade de investir numa maior capacidade de produção, em particular para fazer face aos picos de consumo, poderia ser parcialmente compensada pela interconexão total das redes.

5.2.5

O facto de as políticas comunitárias visarem aumentar a utilização de fontes de energia renováveis constitui uma medida importante para contrariar a crescente dependência externa. Simultaneamente, as emissões de gases com efeito de estufa serão atenuadas e, em alguns casos, a dependência da rede diminuirá. No caso da biomassa e dos biocombustíveis, interessa assegurar a observância de uma utilização optimizada dos solos a longo prazo.

5.2.6

A percentagem de urânio importada de várias fontes pela UE perfaz 95 %. Segundo a Agência Internacional da Energia Atómica (AIEA) e a Agência de Energia Nuclear da OCDE, as fontes de urânio conhecidas à data deverão satisfazer a procura mundial, ao seu nível actual, durante os próximos 50 anos. Além disso, a existência, assinalada por medições geológicas, de outros potenciais depósitos remete para daqui a 280 anos a altura prevista para o esgotamento deste recurso. Até lá, espera-se que novas tecnologias forneçam mais soluções para o aprovisionamento de combustível.

5.3   Alterações climáticas

5.3.1

A UE assumiu a liderança mundial no combate às alterações climáticas. As suas políticas são únicas, bastante avançadas e ambiciosas, em especial o regime de comércio de direitos de emissão e a promoção das energias renováveis. Muitas outras regiões do mundo, incluindo as que produzem maior volume de emissões, não lhe seguiu o exemplo.

5.3.2

Os objectivos de Quioto são modestos face às tendências de aquecimento global, mas, mesmo assim, a maior parte dos Estados-Membros da UE parece ter dificuldade em atingi-los.

5.3.3

Até à data, as reduções das emissões foram, na sua maioria, conseguidas graças à substituição do carvão pelo gás natural na produção de calor e electricidade (no Reino Unido) e ao encerramento ou renovação de antigas unidades de produção na zona oriental da Alemanha. Muitas das actuais e futuras reduções das emissões afiguram-se, porém, mais complexas e dispendiosas.

5.3.4

É necessário encontrar uma solução global para as políticas climáticas «pós-Quioto», que envolva, pelo menos, os principais produtores de emissões. Caso contrário, embora não se obtenham progressos significativos na atenuação das alterações climáticas, poderá existir o risco de prejudicar a evolução económica e social da UE.

6.   Opções futuras

6.1   Visão a longo prazo

6.1.1

Afigura-se, actualmente, que um futuro cenário energético ideal, susceptível de minimizar os impactos ambientais e climáticos e de assegurar suficiente aprovisionamento global, consistiria em utilizar as fontes de energia renováveis para a produção de calor e de diversas cargas de electricidade, em recorrer à fusão nuclear para o abastecimento da energia de base e em encarar o hidrogénio como fonte de energia. Não se prevê, contudo, que esta combinação de energia esteja operacional em 2050, mas, provavelmente, só muito mais tarde. Um cenário alternativo mostraria um elevado grau de eficiência energética, a utilização das energias renováveis com base numa solução técnica para o armazenamento da electricidade — o hidrogénio, por exemplo — e a continuação do uso do carvão, em associação com a captura e o armazenamento do CO2.

6.1.2

A tecnologia de fusão ainda implica grandes desafios e incertezas, sendo necessárias algumas inovações técnicas básicas e, sobretudo, um grande esforço de desenvolvimento, para se poder tornar economicamente viável. Quanto a uma economia do hidrogénio generalizada iria requer dispor de electricidade em abundância. Ora, um hidrogénio dependente de fontes de energia renováveis ou do gás natural não poderá assegurar, pelo menos não por si só, uma economia do hidrogénio suficientemente sólida.

6.1.3

É difícil determinar o potencial global das fontes de energia renováveis, quando se tomam em consideração algumas limitações naturais e económicas. Alguns estudos apontaram para a possibilidade de a Europa atingir uma quota de energias renováveis próxima dos 100 % em 2050, mas nem esta opinião é amplamente partilhada, nem os cenários da Comissão a sustentam: mesmo o cenário alternativo mais optimista de uma utilização intensa das energias renováveis não vai além de uma quota de 15 % em 2030. Até à data, a evolução da utilização de fontes de energia renováveis na UE a 25 tem ficado aquém dos objectivos fixados.

6.2   Eficiência energética

6.2.1

A eficiência energética e a economia de energia são elementos centrais da política energética. Recentemente, num parecer sobre o Livro Verde em matéria de eficiência energética, o CESE apoiou vivamente acções neste domínio e tomou posição sobre grande número de possíveis instrumentos e medidas.

6.2.2

A eficiência energética exerce influência na futura combinação de energias. A diminuição relativa da procura levaria, por acção das forças do mercado, a uma menor utilização da fonte de abastecimento menos económica, ou, mediante eventuais medidas políticas, da fonte de energia menos desejada.

6.2.3

No seu recente Livro Verde sobre a eficiência energética, a Comissão estima em 20 % (1,5 % ao ano) a taxa de redução da procura de energia conseguida com a eficiência energética, o que permitiria regressar ao nível da procura existente em 1990 na UE a 25. Os cenários divulgados pela Comissão não indicam, todavia, tal diminuição em 2030, nem mesmo aquele que pressupõe a adopção de medidas políticas mais enérgicas.

6.2.4

No seu parecer, o CESE apoia firmemente a ideia de que uma maior eficiência energética é uma condição essencial para o desenvolvimento sustentável, a competitividade e a independência económica. A seu ver, ela faz simplesmente sentido do ponto de vista económico, se não for levada longe demais. Procurar aumentar a eficiência energética é uma prática quotidiana das empresas, sendo os acordos voluntários um bom instrumento para o conseguir. Em certos sectores, são necessárias muitas medidas, como a sensibilização e a difusão de conhecimentos, para além de medidas económicas adequadas. O CESE considera, contudo, que os objectivos propostos no Livro Verde são optimistas.

6.2.5

Apesar das medidas de eficiência energética, os cenários sugerem que é pouco provável a procura de energia diminuir antes de 2030 na UE a 25, podendo até estabilizar. Um reforço do investimento na eficiência energética seria, pois, altamente benéfico.

6.3   Opções nos diferentes domínios de utilização

Para analisar as diferentes opções de combinação de energias à luz dos desafios políticos acima referidos, convém examinar separadamente os diversos domínios de utilização da energia primária — transportes, calor e electricidade —, pois a sua interdependência é apenas marginal.

6.3.1   Transportes

6.3.1.1

Os transportes estão quase totalmente dependentes dos combustíveis líquidos, isto é, na prática, dos produtos petrolíferos, e o único substituto actualmente existente é, de certa forma, o transporte ferroviário eléctrico. Uma percentagem pequena, mas crescente, de gás natural é utilizada nos transportes públicos, o que permite alguma diversificação, mas não deixa de colocar questões ligadas ao aumento do consumo de gás.

6.3.1.2

A UE fixou como objectivo substituir até 5,75 % dos combustíveis à base de petróleo por biocombustíveis em 2010, mas devido aos actuais preços elevados do petróleo, já são largamente consideradas taxas de substituição bem mais elevadas. A Comissão apresentou uma comunicação sobre o aumento da utilização dos biocombustíveis em Fevereiro de 2006 (o chamado «Plano de acção “biomassa”»). Ora, quando se planeiam políticas nesse sentido, há muitos factores a ter em conta, como os balanços energéticos líquidos, as políticas comercial, financeira, ambiental e agrícola, e os custos para os consumidores. Outras questões importantes são a manutenção da segurança do aprovisionamento e o impacto nas utilizações alternativas da biomassa.

6.3.1.3

Os automóveis a pilhas de combustível estão em fase de ensaio. Uma questão fundamental é saber qual será o combustível utilizado. De futuro, o hidrogénio poderá ser produzido a partir de fontes de energia renováveis ou do gás natural, bem como a partir da água, por acção da electricidade. Até agora, as pilhas de combustível são muito mais caras do que os motores de combustão.

6.3.1.4

A electricidade pode constituir uma alternativa viável como fonte de energia para os transportes, como, por exemplo, para os veículos híbridos, munidos de uma unidade de alimentação de corrente.

6.3.1.5

Não se vislumbra uma forma rápida de obter um sistema de transportes sem petróleo e, por isso, há que redobrar os esforços para aumentar a eficiência energética nos transportes, através dos seguintes elementos:

melhores tecnologias para motores e combustíveis,

automóveis mais leves, veículos de transporte de mercadorias mais eficientes,

melhores transportes públicos, secundados pela instalação de portagens nos centros das cidades,

transferência máxima do transporte para as vias ferroviárias e fluviais, dado funcionarem de forma eficiente,

combate ao congestionamento do tráfego, por exemplo, através da flexibilização dos horários de trabalho.

As necessidades de transporte podem ser reduzidas através do ordenamento do território e do teletrabalho.

Para uma análise aprofundada das infra-estruturas europeias de transportes e dos desafios que enfrentarão no futuro, aconselha-se a consulta do parecer do CESE intitulado «As infra-estruturas de transportes do futuro: planificação e países limítrofes, mobilidade sustentável, financiamento».

6.3.2   Aquecimento e refrigeração

6.3.2.1

Na Europa utilizam-se predominantemente os combustíveis fósseis no aquecimento — petróleo, gás e carvão —, mas a quota do gás natural está a crescer rapidamente. A electricidade também é bastante utilizada enquanto se popularizam a biomassa no Norte e a energia solar no Sul. Na refrigeração, a electricidade continua a ser a fonte dominante, mas outras opções, como os serviços de distribuição urbana de frio a partir das centrais de produção combinada de calor e electricidade, estão, por exemplo, a ganhar terreno.

6.3.2.2

Na Europa, 40 % da energia é consumida nos edifícios, para aquecer e refrigerar. Segundo os peritos, há grandes possibilidades de melhorar a eficiência energética e poupar energia, tendo a UE tomado já medidas a este respeito.

6.3.2.3

As energias renováveis têm grandes potencialidades neste domínio. A biomassa poderia ser muito mais largamente usada nos sistemas modernos de aquecimento ou refrigeração de áreas ou bairros inteiros, combinada com a produção de electricidade, quando tal fosse aplicável. A energia geotérmica oferece potencialidades quase inexploradas, e o aquecimento solar está surpreendentemente pouco desenvolvido em certos países do Sul.

6.3.2.4

O aquecimento e a refrigeração representam uma utilização muito local da energia, pelo que as medidas para melhorar a eficiência da utilização de energia nos edifícios devem ser tomadas a nível local. A nível da UE, há que adoptar medidas para apoiar o desenvolvimento tecnológico, partilhar conhecimentos e melhores práticas e assegurar um mercado interno funcional para os produtos e serviços conexos.

6.3.3   Electricidade

6.3.3.1

As fontes de produção de electricidade são variadas: carvão, gás, petróleo, energia hidroeléctrica, nuclear e eólica, bem como os combustíveis não fósseis, como a biomassa. As tecnologias fotovoltaica e das marés estão em desenvolvimento.

6.3.3.2

A maioria das centrais eléctricas europeias terá de ser substituída num futuro próximo, tanto as centrais eléctricas mais comuns, baseadas em combustíveis fósseis, como as centrais nucleares. Esta situação oferece uma possibilidade única para se avançar para fontes de energia isentas de emissões de carbono e, ao mesmo tempo, para diminuir a dependência externa.

6.3.3.3

É possível tomar medidas de eficiência energética ao longo de toda a cadeia da electricidade — das tecnologias em matéria de combustíveis e de centrais eléctricas até à concepção eco-eficiente dos produtos que utilizam a electricidade.

6.3.3.4

A opinião geral é, porém, que a procura de electricidade continuará a crescer durante mais algumas décadas, tendo de ser construídas entre 400 e 800 novas centrais eléctricas, equivalentes a 400 gigawatts na UE dos 25.

6.3.3.5

A melhor combinação possível de aprovisionamento energético inclui diversos tipos de capacidade de produção, correspondentes a diferentes procuras. Para fazer face a cargas de base, isto é, a uma procura estável e contínua, a capacidade de produção é melhor assegurada por centrais hidroeléctricas, nucleares ou de combustão, que utilizam combustíveis menos caros, como o carvão. As cargas variáveis — equivalentes à maior parte do consumo — exigem um abastecimento facilmente regulável, como a energia hidroeléctrica ou termoeléctrica. As cargas de pico são preferencialmente fornecidas por centrais com baixos custos de capital, mas normalmente associadas a custos de funcionamento elevados, como as turbinas a gás. A capacidade de produção para fazer face a cargas de base pode igualmente ser empregue para aumentar a energia hidroeléctrica no caso de cargas de pico. A utilização de fontes de energia intermitentes exige um abastecimento auxiliar de fácil regulação.

6.3.3.6

Seriam necessárias redes eléctricas — incluindo interligações —, em número suficiente e suficientemente fiáveis para tornar a utilização das centrais eléctricas mais eficiente e diminuir a necessidade de construir novas centrais. Por outro lado, seria preciso optimizar o sistema de abastecimento, a fim de se evitar recorrer ao transporte de electricidade por longas distâncias, quando se poderiam construir centrais eléctricas onde a procura é maior. Quanto à distribuição da energia produzida, as centrais de produção combinada de calor e electricidade são uma opção a explorar. Por fim, num mercado que funcionasse correctamente, uma boa gestão da procura poderia fazer diminuir a procura de pico.

Bruxelas, 13 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie Sigmund


(1)  Dir. 2003/30/CE, JO L 123, de 17.05.3003.

(2)  «Para uma estratégia europeia de segurança do aprovisionamento energético», JO C 221, de 07.08.2001.


ANEXO

ao parecer do Comité Económico e Social Europeu

As propostas de alteração que se seguem, rejeitadas durante o debate na plenária, obtiveram votos favoráveis de, pelo menos, um quarto dos votos expressos:

Novo ponto 2.2.1

Aditar como segue:

«O CESE nota que os prognósticos citados se podem revelar errados ou ultrapassados pela evolução actual nos mercados de energia e especialmente do preço do petróleo. Isto porque qualquer prognóstico assenta em dados conjunturais e estes alteraram-se decisivamente nos últimos meses. Assim, por exemplo, um estudo encomendado pelo Ministério da Economia alemão  (1) conclui que se se estimar o futuro preço do petróleo em 60 dólares americanos por barril, o consumo de energia diminuirá 17 % até 2030 e passar-se-á a utilizar mais carvão e energias renováveis. Até agoracom um preço do petróleo convencionado de 37 dólares por barriltem-se acreditado num aumento do consumo.»

Justificação

É evidente que as nossas afirmações têm de assentar em prognósticos exactos e a relatora fez bem em citar a Agência Internacional da Energia (AIE) e a Comissão Europeia. Não obstante, o CESE devia pelo menos incluir na reflexão os dados mais recentes, sem que isso signifique alterar as conclusões do seu parecer.

Resultado da votação

Votos a favor: 69

Votos contra: 85

Abstenções: 19

Ponto 2.3

Alterar como segue:

«As escolhas das fontes de energia e das tecnologias energéticas é feita pelos investidores e pode ser influenciada por decisões políticas. A UE não tem poder directo sobre as escolhas das fontes de energia pelos Estados-Membros, mas influencia-as indirectamente através do seu mandato no domínio do ambiente. Os Estados-Membros deviam recorrer tanto quanto possível aos seus próprios recursos. As escolhas dos Estados-Membros influenciam-se mutuamente. e os consumidores de Estados-Membros que não possuam, por exemplo, centrais nucleares ou a carvão dependem de um mercado em que se utiliza a energia nuclear e o carvão para a produção de electricidade »

Justificação

A asserção elidida não é correcta nesta forma. Por um lado, os países que prescindem ou tencionam renunciar às centrais nucleares ou a carvão têm muitas vezes capacidades alternativas suficientes de geração de electricidade. Por exemplo, o facto de a Alemanha se ver obrigada a importar energia nuclear da França ou da República Checa é determinado pelo mercado interno europeu e pelo excedente de capacidade criado deliberadamente em certos países, e não pela necessidade de colmatar uma eventual falta de energia, designadamente, apenas através de centrais nucleares estrangeiras.

Resultado da votação

Votos a favor: 60

Votos contra: 115

Abstenções: 13

Ponto 5.2.6

Aditar texto como segue:

«A percentagem de urânio importada de várias fontes pela UE perfaz 95 %. Segundo a Agência Internacional da Energia Atómica (AIEA) e a Agência de Energia Nuclear da OCDE, as fontes de urânio conhecidas à data deverão satisfazer a procura mundial, ao seu nível actual, durante os próximos 50 anos. Além disso, a existência, assinalada por medições geológicas, de outros potenciais depósitos remete para daqui a 280 anos a altura prevista para o esgotamento deste recurso . No entanto, este período poderá ser reduzido radicalmente se forem concretizados os planos de ampliação das centrais nucleares de certos Estados. Por exemplo, a Índia prevê ampliar o actual parque de centrais nucleares de 3.000 MW para 300.000 MW, o que terá obviamente graves repercussões na disponibilidade mundial de urânio. Espera-se que, mais tarde, novas tecnologias forneçam eventualmente mais soluções para o aprovisionamento de combustível, só que, até à data, estas não foram ainda ensaiadas nem se encontram realmente disponíveis.»

Justificação

Clarificação.

Resultado da votação

Votos a favor: 62

Votos contra: 124

Abstenções: 6

Ponto 6.3.3.2

Alterar como segue:

«A maioria das centrais eléctricas europeias terá de ser substituída num futuro próximo, tanto as centrais eléctricas mais comuns, baseadas em combustíveis fósseis, como as centrais nucleares. Esta situação oferece uma possibilidade única para se avançar para sistemas de produção de electricidade menos nocivos para o ambiente (produção combinada de calor e electricidade, tecnologias limpas de utilização do carvão) fontes de energia isentas de emissões de carbono e, ao mesmo tempo, para diminuir a dependência externa, bem como para melhorar a eficiência da produção de energia.».

Justificação

Evidente. Ver também pontos 1.17 e 1.18, onde também fazemos referência às tecnologias limpas do carvão.

Resultado da votação

Votos a favor: 62

Votos contra: 121

Abstenções: 12


(1)  Elaborado pelo Instituto “Prognos” de Basileia e pelo Instituto “Sewctor da Energia” da Universidade de Colónia.


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