Choose the experimental features you want to try

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 52006IE1160

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Responder ao desafio das alterações climáticas — O papel da sociedade civil

JO C 318 de 23.12.2006, p. 102–108 (ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, NL, PL, PT, SK, SL, FI, SV)

23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/102


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Responder ao desafio das alterações climáticas — O papel da sociedade civil»

(2006/C 318/17)

Em 19 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, em conformidade com o disposto no n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar sobre: Responder ao desafio das alterações climáticas — O papel da sociedade civil.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, que emitiu parecer em 11 de Julho de 2006, sendo relator E. EHNMARK.

Na 429.a reunião Plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 59 votos a favor, 1 voto contra e 2 abstenções, o seguinte parecer:

A.   Conclusões

A.1

O processo das alterações climáticas não pode ser parado, pelo menos nos próximos 15 a 20 anos. Nesse sentido, temos de aprender a viver com as alterações climáticas e procurar formas de mitigar os seus efeitos e de nos adaptarmos.

A.2

O debate sobre as alterações climáticas centra-se demasiado no plano geral e em acontecimentos num futuro distante. Há uma necessidade clara de debater a forma como as alterações climáticas afectam — e afectarão — os cidadãos no seu quotidiano. As questões relacionadas com alterações climáticas devem ser reestruturadas por forma a torná-las mais compreensíveis e concretas.

A.3

Os parceiros sociais e a sociedade civil organizada têm um papel essencial na sensibilização dos cidadãos para as alterações climáticas e na promoção do debate a nível local sobre a forma como as comunidades locais podem preparar medidas concretas com vista à adaptação às alterações climáticas.

A.4

As alterações climáticas terão impacto em inúmeros sectores da sociedade. O CESE mencionou alguns exemplos. A conclusão geral é que, juntamente com os parceiros sociais e a sociedade civil organizada, as comunidades locais na UE devem assumir mais responsabilidades na preparação e planeamento das consequências das alterações climáticas.

A.5

O CESE propõe que a sociedade civil organizada e os parceiros sociais lancem em conjunto o Diálogo Público a nível da UE sobre as alterações climáticas, centrado nos efeitos das alterações climáticas no quotidiano. O principal objectivo do Diálogo seria sensibilizar e fazer preparativos ao longo dos próximos 15-20 anos — período durante o qual as alterações climáticas actuais se agravarão, independentemente do que a humanidade fizer agora.

A.6

O CESE propõe que cada Estado-Membro identifique e/ou crie um gabinete de informação e coordenação para as alterações climáticas para promover as relações entre o plano local, regional e nacional.

A.7

O CESE lamenta que as alterações climáticas sejam mais frequentemente debatidas como cenários distantes. Mas, já não se trata sobretudo, ou apenas, de uma questão do futuro distante:

as alterações climáticas afectam-nos aqui e agora.

1.   Introdução

1.1

A existência de alterações climáticas é amplamente reconhecida, a natureza e a dimensão das suas consequências não tanto. Uma razão para tal é a necessidade de mais conhecimento oriundo da investigação e de estudos de cenários. Outra é a natureza das próprias alterações climáticas: trata-se de uma longa alteração, interrompida por acontecimentos trágicos cada vez mais frequentes. Uma terceira razão é o facto de, no debate público, as alterações climáticas serem frequentemente tratadas como uma questão que diz respeito aos outros e não a nós próprios. Uma quarta razão é o facto de se centrar a atenção em cenários distantes que parecem esbater as questões mais concretas do quotidiano.

1.2

A fusão das calotas polares pode ser referido como exemplo. Nos últimos meses, a comunicação social ficou fascinada com os cálculos que indicavam que a fusão das calotas polares poderia provocar a subida do nível dos oceanos em 13 metros (estimativas da Agência Europeia do Ambiente (AEA)). Outro exemplo é a corrente do Golfo: se os mecanismos que controlam a corrente do Golfo forem alterados, as temperaturas no Norte da Europa poderão descer drasticamente. Apesar de serem questões interessantes e importantes, não levam as pessoas a encarar as alterações climáticas de uma forma mais imediata e concreta.

1.3

Importa sublinhar que as alterações climáticas que observamos actualmente e que tentamos controlar são apenas o início de um longo processo. Nos próximos 15 a 20 anos, as alterações climáticas existentes agravar-se-ão, pela simples razão de a humanidade ter produzido — e continuar a produzir — suficiente material prejudicial sob a forma de gases com efeito de estufa. A nossa tarefa é a preparação e adaptação às alterações climáticas. Todavia, o que acontecerá depois dos próximos 15 a 20 anos é também da responsabilidade das gerações actuais, uma vez que as medidas tomadas agora podem ajudar a mitigar as alterações climáticas no futuro distante. O debate no âmbito da CQNUAC (Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas) e do Protocolo de Quioto representam uma oportunidade a não perder para acções após 2012. Se esta oportunidade for desperdiçada o clima continuará a deteriorar-se e será necessária mais acção no sentido de inverter as tendências. Não surpreende que cada vez mais governos considerem as alterações climáticas uma prioridade máxima. Contudo, tal não significa que os governos traduzam as suas prioridades em acções.

1.4

O debate sobre as alterações climáticas é em grande parte dominado pelos governos e pela comunidade científica. As ONG ambientais estão a fazer um óptimo trabalho, mas com recursos reduzidos. Em geral, as grandes organizações, tais como sindicatos e organizações de empregadores, não são, em geral, particularmente activas no debate sobre como responder às alterações climáticas e mitigá-las. A sociedade civil organizada deveria desempenhar um papel de destaque, mas parece relutante em assumi-lo.

1.5

O CESE é da opinião de que a preparação para as alterações climáticas e para o debate sobre a apropriação das alterações climáticas deve ser alargado, por forma a implicar activamente os parceiros sociais e a sociedade civil organizada. As alterações climáticas estão a entrar numa fase na qual a mitigação e a adaptação se tornam questões do quotidiano. Já não é, sobretudo ou apenas, uma questão do futuro distante: afecta-nos aqui e agora. Por conseguinte, é fulcral que os parceiros sociais e a sociedade civil organizada avaliem e reclamem a preparação e debate das alterações climáticas.

1.6

É essencial que o debate actual sobre as alterações climáticas integre melhor as micro-perspectivas com base na situação de cada cidadão e das comunidades locais. Há que analisar a forma como os cidadãos podem mitigar os efeitos das actuais alterações climáticas em termos de custos (custos energéticos), de seguros, ou de preferências dos consumidores, apenas para referir alguns exemplos.

1.7

O objectivo do presente parecer é, essencialmente, examinar o papel dos parceiros sociais e da sociedade civil organizada na análise, planeamento e execução dos passos no sentido de responder aos desafios das alterações climáticas. Centra-se no ponto de vista económico, social e democrático, numa abordagem concreta da base para o topo.

1.8

Centramo-nos nos próximos 15 a 20 anos por se tratar do período durante o qual as alterações climáticas prosseguirão com base no que já foi feito. É indiscutível a necessidade de adaptação imediata aos efeitos iniciais deste processo, mas importa não descurar os efeitos futuros.

1.9

Afirma-se frequentemente que o volume de relatórios e de informação sobre as alterações climáticas é tão grande como a dificuldade de absorção dos cidadãos que procuram respostas para as implicações das alterações climáticas no seu quotidiano. Há muita informação sobre as alterações climáticas, o que representa um desafio de comunicação. Trata-se de uma situação que necessitará de liderança política, uma vez que algumas das medidas inevitáveis implicarão certamente algum desconforto no quotidiano.

1.10

Importa sublinhar que estão em curso estudos frutíferos. O Programa Europeu para as Alterações Climáticas, agora na sua segunda fase, é particularmente importante. O programa formou grupos de trabalho para o comércio de emissões, aprovisionamento energético e procura de energia, transportes, indústria, agricultura e florestas, apenas para mencionar alguns temas. O Segundo Programa para as Alterações Climáticas, lançado pela Comissão Europeia em Outubro de 2005, inclui novos grupos de trabalho sobre adaptação, captura de dióxido de carbono e armazenamento geológico, aviação e uma abordagem integrada das emissões de CO2 de viaturas ligeiras, bem como uma série de grupos incumbidos da revisão da execução de acções anteriores. No conjunto, os Programas para as Alterações Climáticas proporcionam uma análise e informação ricas, assim como a base para várias decisões do Conselho.

1.11

É necessário desenvolver mais o Programa para as Alterações Climáticas? A resposta é afirmativa, uma vez que há necessidade generalizada de mais informação concreta e, em particular, mais exemplos de iniciativas bem sucedidas. Além disso, responder às alterações climáticas requer o envolvimento activo das partes interessadas e, em última análise, dos próprios cidadãos. A Comissão Europeia constatou esta necessidade e lançou uma grande campanha de informação e comunicação. A iniciativa é muito bem-vinda. Todavia, é necessário desenvolver mais esforços que envolvam todos os Estados-Membros, que coordenem as acções a nível comunitário, nacional e local e que, sobretudo, levem as questões às pessoas.

2.   A dimensão dos desafios das alterações climáticas

2.1

As alterações climáticas terão efeitos profundos numa série de sectores nas sociedades modernas. Os efeitos não se limitam às condições metereológicas extremas. Uma lista não exaustiva de zonas de impacto inclui inundações, incêndios florestais, danificação de infra-estruturas, reestruturação da agricultura, problemas de qualidade do ar (em particular nas zonas metropolitanas), problemas de aprovisionamento energético, limitações na utilização de água e impacto na indústria (em particular na indústria transformadora). A esta lista podemos acrescentar o planeamento urbano e a introdução de novas soluções arquitectónicas para poupança de energia.

2.2

O facto de as alterações climáticas afectarem um leque tão vasto de sectores transversais está a ser gradualmente compreendido. O apoio público que terá de haver para as acções necessárias lá vai surgindo lentamente.

2.3

Combater as alterações climáticas através de acções específicas terá muitas vezes efeitos claros e por vezes desagradáveis no quotidiano dos cidadãos.

2.4

O paralelismo com o debate em curso sobre a estratégia da UE para o desenvolvimento sustentável é óbvio. Desde a primeira fase deste debate, ficou claro que o público não estava sensibilizado para o que seria necessário para melhorar as perspectivas do desenvolvimento sustentável tanto na União Europeia como mundialmente. Os desafios que se avizinham no domínio do desenvolvimento sustentável foram referidos como desafios que levariam a alterações radicais no funcionamento das nossas sociedades (1).

2.5

A luta contra as alterações climáticas é, obviamente, parte integrante dos esforços para alcançar um desenvolvimento sustentável. A luta contra as alterações climáticas deve ser, tal como todos os esforços no sentido do desenvolvimento sustentável, concreta e realista.

2.6

A Estratégia de Lisboa é muitas vezes referida como a concretização da visão do desenvolvimento sustentável, numa fase inicial de 10 anos. A Estratégia de Lisboa centra a sua atenção nos pilares económico, social e ambiental. Esquece-se muitas vezes que, desde o início, a Estratégia de Lisboa também definia grandes ambições no que toca ao ambiente, alterações climáticas e desenvolvimento sustentável em geral. Por conseguinte, as medidas contra as alterações climáticas não podem ser debatidas como um assunto isolado. As alterações climáticas desempenham um papel-chave na visão mais ampla e estão fortemente relacionadas com a necessidade geral de acção.

2.7

Uma observação recorrente em relação à Estratégia de Lisboa é o facto de os Estados-Membros e respectivos governos não darem prioridade suficiente a acções e investimentos acordados. Pode argumentar-se que os efeitos da Estratégia de Lisboa nos cidadãos não são muito directos nem tangíveis. Contudo, os efeitos das alterações climáticas (as catástrofes naturais, por exemplo) são muitas vezes bastante tangíveis. Os cidadãos terão de fazer os preparativos adequados para mitigar estes efeitos.

2.8

As alterações climáticas são frequentemente identificadas apenas em termos de prejuízos financeiros, o que não representa a totalidade da questão. A dimensão social das alterações climáticas deve ser plenamente reconhecida. Não se trata apenas de os cidadãos perderem as suas casas ou locais de trabalho, é também uma questão de aumento dos custos de energia, lazer e férias. Está igualmente relacionada com a motivação dos cidadãos para alterar os seus hábitos de consumo. Entre muitos outros aspectos, há o risco de a adaptação às alterações climáticas provocar novos desequilíbrios socioeconómicos, com efeitos negativos para os cidadãos em regiões longínquas ou de baixo rendimento disponível.

2.9

O CESE sublinha a importância da coesão social na luta contra as alterações climáticas. O recurso recorrente a factores económicos com vista a persuadir os cidadãos deve ser equilibrado com os possíveis efeitos sociais negativos. Outros instrumentos de resposta às alterações climáticas devem ser equilibrados com os efeitos na coesão social. Sublinha-se assim a importância da implicação da sociedade civil organizada em todo o processo de luta contra as alterações climáticas.

2.10

Há que prosseguir a análise das consequências das alterações climáticas na vida profissional. Estas consequências incluem não apenas a transição para métodos de produção que poupam energia e que economizam os recursos naturais, mas também a deslocalização de unidades de produção de acordo com a disponibilidade de recursos de energia renovável baratos. Para os trabalhadores, a transição para novos métodos de produção e novas áreas de serviço porá em evidência novas necessidades de mais conhecimento especializado e formação ao longo da vida. O diálogo social, em particular na UE, deveria assinalar o impacto social das alterações climáticas, sobretudo os seus efeitos na vida profissional. Os parceiros sociais a nível da UE deveriam dar prioridade à questão das alterações climáticas. Neste contexto, é importante sublinhar que atenuar as alterações climáticas não acarreta em si riscos de desemprego. Pelo contrário, os efeitos das alterações climáticas podem proporcionar novas oportunidades de emprego (ver 2.13).

2.11

Os consumidores sentirão em breve os efeitos das alterações climáticas, uma vez que estas levarão a mutações nos padrões de consumo, tanto na alimentação como nos transportes, habitação ou férias. Contudo, os consumidores são também potenciais responsáveis pela mitigação dos efeitos das alterações climáticas, bem como por uma base de acção a longo prazo com vista a travar as alterações climáticas. A melhor forma de conseguir padrões de produção sustentáveis é, sem dúvida, através de um movimento de consumidores vigoroso e reconhecido, com capacidade para chegar aos cidadãos. Os consumidores deveriam ser reconhecidos como actores-chaves que são — ou poderiam ser — na mitigação do impacto das alterações climáticas em cada cidadão.

2.12

A dimensão global das alterações climáticas é reconhecida em catástrofes relacionadas com o clima em outros países, provocando prejuízos avultados em vidas humanas e bens materiais. Como resultado das alterações climáticas, as doenças tropicais podem alastrar a novas zonas, contribuindo para os desafios que se aproximam. As alterações climáticas serão um teste à solidariedade entre povos e nações. Os países industrializados terão de reforçar a sua capacidade de prestar apoio e ajuda. Deve recordar-se que, sobretudo nos países em desenvolvimento, são muitas vezes os mais pobres que têm de suportar o peso das alterações climáticas. A dimensão social global das alterações climáticas é fulcral; trata-se de um domínio onde muito pode ser feito com vista à resolução de problemas que, de outra forma, poderiam facilmente multiplicar-se.

2.13

As alterações climáticas são frequentemente debatidas em termos de ameaças e fraquezas. Contudo, as acções com vista a mitigar as alterações climáticas devem ser vistas como uma oportunidade positiva. Com o aumento rápido da necessidade de produção e transporte que poupe energia, surgiu um novo domínio para investigação, desenvolvimento de novas tecnologias e marketing de novos produtos. Esta deveria ser uma parte importante da resposta da UE aos desafios das alterações climáticas. No quadro da iniciativa da Comissão para uma política industrial integrada, o apoio e a preparação do desenvolvimento de tecnologias respeitadoras do ambiente deveria ser uma prioridade absoluta. As PME podem desempenhar um papel muito importante nesta questão.

2.14

Responder às alterações climáticas e mitigá-las pode levantar questões inesperadas. Por exemplo, a produção de etanol a partir de produtos agrícolas está a tornar-se um sucesso em alguns países. Por conseguinte, o uso do produto de algumas colheitas, tais como o milho, está cada vez mais associado à produção de etanol. Contudo, o produto das mesmas colheitas é fulcral no apoio alimentar a regiões que sofrem de fome nos países em desenvolvimento. Este exemplo ilustra a importância de evitar soluções com uma só finalidade.

2.15

A dimensão do desafio que se aproxima pode ser ilustrada pela seguinte citação: «A ciência afirma-nos que, para restringir os danos, temos de procurar limitar o aumento da temperatura média global futura a 2.oC acima dos níveis pré-industriais. O objectivo dos 2.oC implica que são necessárias políticas para adaptar e mitigar as alterações climáticas. Não obstante a aplicação de políticas já aprovadas, é provável que as emissões globais aumentem nas duas próximas décadas, afigurando-se necessárias reduções globais das emissões, até 2050, de 15 % no mínimo relativamente aos níveis de 1990, o que exigirá esforços significativos.» (Comunicação da Comissão «Ganhar a batalha contra as alterações climáticas globais») (2). A última parte da citação pode ser considerada aquém da realidade. Todavia, ilustra a importância de relacionar os cidadãos com o processo a nível regional e local.

3.   Dez sectores para a participação da sociedade civil

3.1

O planeamento urbano e comunitário local é um sector onde as vantagens podem ser consideráveis no que toca à mitigação das alterações climáticas e poupança de energia. Um bom planeamento urbano deve incluir soluções respeitadoras do clima, tanto para a habitação como para os transportes. Estudos elaborados confirmaram já efeitos muito positivos no plano energético em função do posicionamento dos edifícios na paisagem ou na comunidade (3). As soluções arquitectónicas são importantes não apenas para que se tire o máximo partido da energia solar mas também para o isolamento dos edifícios. Outro aspecto a considerar é, obviamente, a importância das referidas soluções na formação de subúrbios, zonas metropolitanas e localidades que funcionem correctamente do ponto de vista social. É essencial que os parceiros sociais e a sociedade civil organizada estejam envolvidos desde o início no planeamento urbano e comunitário local.

3.1.1

A Comissão Europeia deveria lançar consultas com o poder regional e local, bem como com outras partes interessadas sobre orientações para o planeamento urbano tendo em conta as alterações climáticas em agravamento. O CESE propõe que a Comissão produza material informativo básico para o planeamento urbano, a par de orientações sobre soluções bem sucedidas.

3.2

A luta contra as alterações climáticas chamará a atenção para a necessidade de modernização e isolamento dos edifícios novos e dos já existentes, a par da aplicação de todas as técnicas e materiais relevantes para a poupança de energia. Os materiais de construção, sobretudo os específicos para o isolamento do calor, são um domínio que requer mais iniciativas. Não se trata apenas de tornar os sistemas de aquecimento mais eficientes, é também uma questão de isolar melhor as casas das temperaturas exteriores elevadas mas também das baixas. A experiência do Verão quente na Europa há alguns anos não deve ser esquecida. Poderia haver medidas fiscais para incentivar utilizadores privados a isolar novamente casas e apartamentos. O CESE recomenda a criação de um sistema de certificados de desempenho energético como forma de prestar aos consumidores informação sobre os custos energéticos de habitar uma determinada casa ou apartamento.

3.3

O transporte rodoviário está a aumentar rapidamente na UE. Os sistemas ferroviários têm dificuldades em competir com as vantagens do transporte rodoviário no que toca à rapidez da entrega porta-a-porta. Esta tendência é insustentável, tanto no que toca às emissões de CO2 como aos preços do combustível a aumentar. Para que a luta contra as alterações climáticas seja bem sucedida, há que dissociar o crescimento do PIB do crescimento do transporte rodoviário. Os passos práticos para alcançar esta meta ainda terão de ser definidos. Um sistema rápido de transporte ferroviário de mercadorias seria a resposta lógica, em particular na União alargada. O aumento do transporte ferroviário de mercadorias implicaria investimentos muito avultados. Em certa medida, os preços podem incentivar o transporte ferroviário de mercadorias. Para os consumidores, a rapidez da distribuição de produtos alimentares é essencial. Para a indústria é essencial que as entregas tenham lugar sem problemas e que sejam eficazes e pontuais. Por um lado, o congestionamento das auto-estradas é um poluente substancial e as frotas de camiões antigas aumentam ainda mais a poluição. Não há uma solução simples para a questão dos transportes no quadro mais vasto das alterações climáticas. É necessária uma estratégia com base em acções múltiplas, que inclua medidas de apoio a opções ferroviárias, mais investigação e trabalho de desenvolvimento, nomeadamente no sentido de desenvolver motores de camiões respeitadores do ambiente e que funcionem com combustíveis alternativos. Será importante para os consumidores conhecer o custo real do transporte de um determinado produto.

3.4

O sector das viagens e do lazer terá de fazer face a preços da energia cada vez mais altos — o que terá impacto tanto no transporte rodoviário como no aéreo. O preço do petróleo aumentou rapidamente nos últimos anos e representa presentemente um argumento muito convincente para os consumidores optarem por novas soluções. O aumento rápido do interesse em comprar viaturas pequenas e mais eficientes do ponto de vista energético é um sinal altamente promissor. Na realidade, este é um dos casos mais claros de situação vantajosa na luta contra as alterações climáticas: viaturas mais pequenas e menos poluentes e um grande mercado mundial potencial para esse tipo de viaturas e soluções. Os incentivos fiscais para a utilização de combustíveis alternativos também está a dar resultados promissores, como se pode constatar em alguns países.

3.5

Neste contexto, o volume de trânsito das pessoas que se deslocam diariamente de e para as zonas metropolitanas para trabalhar carece de uma atenção especial. O rápido crescimento das zonas metropolitanas, na UE e em outras partes do mundo, torna urgente a necessidade de tentar novas abordagens às deslocações diárias para trabalhar, bem como ao transporte de mercadorias. Em geral, as experiências com tarifas especiais para entrar no centro das cidades de viatura revelaram-se positivas, quando combinadas com grandes investimentos em transportes públicos rápidos e convenientes. A tomada de medidas contra a utilização das viaturas sem oferecer em troca algo semelhante geraria protestos públicos. Os cidadãos lutarão pelo direito de utilizarem viaturas ligeiras para transporte se as alternativas não forem adequadas. A sociedade civil organizada tem um papel crucial neste domínio.

3.6

Os referidos desafios são também parte da questão mais vasta da redução da importação e do uso de combustíveis fósseis na União Europeia. As incertezas no assegurar do aprovisionamento de combustíveis fósseis no Inverno de 2005-2006 aumentaram a urgência de novas soluções. Alguns Estados-Membros estão a lançar programas ambiciosos de redução drástica do uso de combustíveis fósseis e procuram mais alternativas renováveis, a par de novas políticas de promoção do uso de soluções eficientes do ponto de vista energético. Em alguns países, como a Suécia, os governos lançaram estudos sobre como reduzir drasticamente a importação e uso de combustíveis fósseis. A Comissão Europeia deveria lançar consultas com as partes interessadas e os governos dos Estados-Membros sobre os esforços no sentido de reduzir drasticamente as importações de combustíveis fósseis da UE. No final da década, todos os Estados-Membros deverão ter lançado iniciativas para identificar formas de conseguir reduzir consideravelmente a importação de combustíveis fósseis. Este passo poderia ser um grande contributo para o próximo programa de Quioto e para impedir as alterações climáticas a longo prazo. Constituiria, também, uma grande oportunidade tecnológica e industrial para a UE e traria grandes vantagens para a sociedade civil organizada.

3.7

A agricultura — e, por conseguinte, o preço dos alimentos — será directamente afectado pelas alterações climáticas e pelos efeitos decorrentes no preço da energia. A desertificação no sul da UE carecerá de medidas especiais de apoio, em conformidade com a solidariedade prevista pela PAC. A Comissão deveria iniciar estudos sobre os efeitos das alterações climáticas na agricultura da UE, com base em relatórios e análises nacionais. É essencial sublinhar a importância da investigação na prossecução da redução do uso de factores de produção em práticas agrícolas e do desenvolvimento de substitutos para derivados do petróleo à base de matéria-prima agrícola. O papel da agricultura na diversificação do aprovisionamento energético pode tornar-se cada vez mais importante. Por último, seria apropriado incentivar os agricultores a produzir a sua própria energia.

3.8

Os desafios para a indústria constituem outro domínio onde é essencial planeamento e adaptação. Não se trata apenas de uma questão para a indústria nas zonas de planície, onde as inundações podem ser, ou serão, um grande problema. Para a indústria, são essenciais soluções suaves e eficazes para as necessidades de transporte de mercadorias. As alterações climáticas poderão limitar a disponibilidade de matérias-primas. O aprovisionamento energético — a preços razoáveis — é essencial. As alterações climáticas também oferecem novas oportunidades à indústria. O mercado mundial de tecnologias de poupança de energia será muito vasto. As empresas com capacidade de investimento suficiente no desenvolvimento destas tecnologias podem ter pela frente futuro auspicioso.

3.9

As questões relacionadas com o local de trabalho são outro sector onde o planeamento para a adaptação é importante. Com o surgir de novas tecnologias de poupança de energia e de produção de bens com recurso a essas tecnologias, haverá uma procura de reforço adicional de competências. Algumas novas tecnologias para continuação da expansão limitarão consideravelmente os trabalhadores, por exemplo, na aplicação de nanotecnologias. As questões relacionadas com os desafios do local de trabalho são agravadas pelo aumento dos preços da energia. Haverá cada vez mais interesse nas oportunidades do trabalho a partir de casa — o que requer melhores técnicas TIC, incluindo a possibilidade de banda larga.

3.10

A gestão de catástrofes é outro domínio importante no contexto das alterações climáticas. As catástrofes relacionadas com o clima são cada vez mais frequentes e têm consequências mais amplas. Deveria ser criado na UE um órgão de resposta às catástrofes apto a prestar assistência atempada e imediata. Estas unidades já existem em alguns Estados-Membros. Há que criar órgãos semelhantes em todos os Estados-Membros, bem como uma certa coordenação e cooperação. Desta forma a UE teria capacidade de assistir as vítimas de catástrofes relacionadas com o clima não apenas na UE mas também em outras partes do mundo.

3.11

As catástrofes provocadas por condições climáticas extremas exigem grandes esforços financeiros, sobretudo das companhias de seguros. A frequência das catástrofes causará dificuldades ao sector dos seguros, com impacto nos custos dos seguros para os cidadãos. A Comissão Europeia deveria elaborar um estudo sobre estas questões com vista a salvaguardar o funcionamento sustentável do sistema de seguros.

4.   Adaptação e mitigação — mas como e por quem?

4.1

Informar o público das alterações climáticas e suas consequências será uma tarefa imensa. É importante que se adopte uma abordagem equilibrada e pragmática no sentido da sensibilização. Não se trata de assustar os cidadãos, mas sim de concentrar os esforços no trabalho prático que se perspectiva com vista a proporcionar a todos os cidadãos uma qualidade de vida sustentável.

4.2

O CESE propõe que os Estados-Membros criem gabinetes de contacto, informação e coordenação com capacidade para serviços de aconselhamento e elaboração de estudos sobre a adaptação e a mitigação das alterações climáticas. O intercâmbio de experiências com outros Estados-Membros e a transmissão dessa informação à sociedade civil e aos municípios deve ser uma parte importante do trabalho. O contacto com as comunidades locais, os parceiros sociais e a sociedade civil organizada será particularmente importante, bem como o contacto com a indústria e empresas.

4.3

O CESE propõe o lançamento de um Diálogo sobre as Alterações Climáticas e formas de combater a contínua deterioração do clima, bem como medidas no sentido da adaptação às alterações que já estão a ocorrer. Este Diálogo deveria ser apoiado pelas instituições da União Europeia mas a responsabilidade pelo trabalho prático deveria ser dos municípios, institutos de educação, sindicatos e organizações de empregadores, agricultores e consumidores e outros. O CESE está disposto a tomar parte activa no Diálogo e funcionar como centro de coordenação do intercâmbio e da avaliação.

4.4

O CESE manifesta satisfação pelo lançamento pela Comissão Europeia de um programa comunitário de informação e comunicação de grande alcance sobre as alterações climáticas. Será um grande contributo para a sensibilização para aquele problema. Os destinatários da proposta do CESE referente ao Diálogo sobre as Alterações Climáticas são as comunidades locais, regiões e países, com ênfase especial nos parceiros sociais e na sociedade civil organizada. Os dois programas complementar-se-iam de forma construtiva.

4.5

Uma parte essencial do Diálogo sobre as Alterações Climáticas seria a circulação de informação sobre exemplos de boas práticas, por exemplo, de países que elaborem planos de redução da dependência de combustíveis fósseis. Outro tipo de exemplo poderiam ser soluções metropolitanas para redução do uso de viaturas em deslocações pendulares para o centro das cidades (Londres e Estocolmo são apenas dois exemplos).

4.6

O Diálogo deveria ter início no Inverno de 2006-2007. Não necessita de um prazo para o seu termo. Deveria estar intimamente relacionado com os esforços para comunicar uma visão do desenvolvimento sustentável. As questões relacionadas com as alterações climáticas proporcionarão uma oportunidade para tornar o desenvolvimento sustentável um tema mais visível.

4.7

O diálogo com os cidadãos sobre as alterações climáticas não será possível sem a participação clara e contínua das partes interessadas a nível local e regional. Deveria ser disponibilizado apoio financeiro para planeamento e troca de experiências. Obviamente será necessário tempo para desenvolver capacidades nas comunidades, na sociedade civil organizada e entre os parceiros sociais.

4.8

Em 2012 terá lugar o seguimento da conferência das Nações Unidas sobre o desenvolvimento sustentável que teve lugar em 1992, no Rio de Janeiro, e em 2002, em Joanesburgo. O CESE recomenda vivamente que a próxima conferência, em 2012, centre as atenções em particular nas alterações climáticas e respectivo impacto mundial. A cooperação desenvolvida entre o CESE e a OIT e entre o CESE e o Conselho Económico e Social das Nações Unidas proporcionará oportunidades de estudos conjuntos sobre os efeitos das alterações climáticas a nível mundial. A cooperação ajudará igualmente a chamar a atenção para a forma como os parceiros sociais e a sociedade civil organizada podem ser partes activas na luta contra as alterações climáticas.

5.   Instrumentos de sensibilização e apoio

5.1

Promover a sensibilização para as alterações climáticas e suas consequências deveria começar por ser da responsabilidade do poder local, regional e nacional, com um apoio e iniciativas ao nível da UE. O objectivo deveria ser o recurso a uma abordagem ascendente que convide os cidadãos a proporem as soluções que preferem e não respostas já preparadas.

5.2

Entre as organizações da sociedade civil, as organizações dos consumidores serão particularmente importantes na mobilização dos consumidores e na promoção de um envolvimento dedicado. Os consumidores exercem — ou podem exercer — uma pressão considerável sobre o mercado através dos serviços e bens que consomem. Para os movimentos de consumidores europeus será um verdadeiro desafio.

5.3

Os parceiros sociais serão particularmente responsáveis pela análise do impacto das alterações climáticas na vida laboral e por propor uma mitigação relevante ou estratégias de adaptação. A dimensão social da luta contra as alterações climáticas é parte fundamental de todos os esforços.

5.4

Vencer a luta contra as alterações climáticas não será possível sem o apoio activo e a cooperação da indústria e das empresas. A indústria pode desempenhar um papel-chave na integração das alterações climáticas no planeamento, produção, comercialização e avaliação. As indústrias podem beneficiar da integração nos seus relatórios anuais de mais informação sobre o seu trabalho no domínio das alterações climáticas. O envolvimento activo nas questões relacionadas com as alterações climáticas pode revelar-se um conceito vencedor de comercialização.

5.5

Nos debates sobre os efeitos das alterações climáticas, muitos observadores manifestam o seu apoio a várias formas de incentivos fiscais ou financeiros. Não há dúvida de que estes podem produzir resultados claros. Contudo, deveriam ser aplicados com alguma precaução. Por exemplo, os impostos sobre o combustível para automóveis terão um impacto social negativo nas zonas com fraca densidade populacional. A cobrança de «taxas» nos veículos que entram no centro das cidades está a ter um impacto positivo na situação do tráfego em geral, mas esse sistema tem de ser acompanhado de novos investimentos em transportes públicos. De outro modo, esta cobrança provocará novos desequilíbrios socioeconómicos: quem puder suportar o custo continuará a utilizar os seus veículos, quem não puder terá de recorrer a um sistema de transportes públicos que pode ser ou não realmente eficiente.

5.6

Outro instrumento importante para a sensibilização seria a introdução de processos de gestão ambiental, tais como o Sistema de Ecogestão e Auditoria (EMAS), um sistema voluntário criado no âmbito do Regulamento do Conselho Europeu 761/01. O objectivo do EMAS é reconhecer e recompensar as organizações que vão além do cumprimento dos requisitos legais mínimos e que aperfeiçoam continuamente o seu desempenho ambiental.

5.7

Ao utilizar o EMAS, as organizações e instituições individuais exploram formas concretas de medir e reduzir o impacto ambiental de várias actividades, como, por exemplo, a utilização de energia e materiais e as deslocações em viatura, comboio ou avião. O Comité Económico e Social Europeu podia considerar a introdução do sistema EMAS e em particular explorar a possibilidade de calcular as emissões causadas pelas deslocações para as reuniões, introduzindo em seguida medidas compensatórias (ver anexo com cálculos preliminares).

5.8

Outra proposta em debate é o cálculo dos custos de transporte como parte do preço total de um produto. Os consumidores obteriam desta forma mais informação básica ao optar entre produtos alternativos.

6.   Um desafio para a sociedade civil

6.1

A sociedade civil organizada a nível europeu tem trabalhado as questões do desenvolvimento sustentável desde as conferências mundiais do Rio de Janeiro e de Joanesburgo.

6.2

A sociedade civil organizada tem uma oportunidade única para desempenhar um papel importante no Diálogo Europeu sobre as Alterações Climáticas. O contributo da sociedade civil poderia centrar-se essencialmente em 5 domínios:

Participar activamente na sensibilização para as alterações climáticas e os seus efeitos.

Mobilizar os consumidores e outros grupos vitais para a adopção de preferências de consumo claras que tenham em conta o impacto nas alterações climáticas.

Iniciar, influenciar e apoiar novos programas de planeamento urbano, incluindo habitação, transportes e deslocações pendulares.

Servir de intermediário entre os cidadãos e os governos em questões de mitigação das alterações climáticas e, numa perspectiva mais a longo prazo, travar o processo em curso.

Cooperar com a sociedade civil em outros países e regiões com vista a agir construtivamente no sentido de mitigar os efeitos das alterações climáticas.

6.3

Em conformidade com as declarações do Conselho Europeu, o CESE estabeleceu uma rede interactiva com todos os Conselhos Económicos e Sociais nos Estados-Membros da UE. A rede centra-se sobretudo na Estratégia de Lisboa.

6.4

O CESE está disposto a considerar a expansão da rede com vista a incluir questões relacionadas com as alterações climáticas e as respostas da Europa aos efeitos dessas alterações.

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  Ver declaração de Rocard no Fórum CESE das Partes Interessadas em Abril de 2001.

(2)  COM(2005) 35 final, p. 9.

(3)  p. ex., o projecto de construção de habitações em Freiburg.


Top