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Document 52006IE1155

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Turismo Social na Europa

JO C 318 de 23.12.2006, p. 67–77 (ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, NL, PL, PT, SK, SL, FI, SV)

23.12.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 318/67


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Turismo Social na Europa»

(2006/C 318/12)

Em 19 de Janeiro de 2006, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 29.o do Regimento, elaborar parecer sobre: «Turismo Social na Europa».

A Secção Especializada de Mercado Único, Produção e Consumo incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, emitiu parecer em 26 de Julho de 2006 (relator: MENDOZA CASTRO).

Na 429a reunião plenária de 13 e 14 de Setembro de 2006 (sessão de 14 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu aprovou o presente parecer, por 138 votos a favor, 2 votos contra e 4 abstenções.

A.   PRIMEIRA PARTE: ANÁLISE DA SITUAÇÃO ACTUAL

1.   Introdução

1.1

Na sequência dos vários pareceres que tem vindo a elaborar como contributo para a configuração de uma política turística europeia, o Comité Económico e Social Europeu viu por bem elaborar um parecer sobre o chamado «Turismo Social», analisando as suas origens, a sua presença e situação actual na Europa, as várias experiências dos Estados-Membros e os valores que lhe subjazem. O seu propósito é essencialmente fazer recomendações às várias instituições públicas ou privadas para uma maior eficácia, universalização e melhoria do Turismo Social Europeu. O propósito do presente parecer é, além disso, contribuir para o debate em curso sobre a Política de Turismo Europeia através da análise do Turismo Social enquanto parte integrante do Modelo Turístico Europeu.

1.2

O turismo na Europa: situação actual e desafios futuros. A situação actual do turismo tem vindo a ser analisada em vários estudos, relatórios e pareceres, com base em pontos de vista muito diversos: económicos, sociais e ambientais; a sua grande importância para a actividade económica na Europa, em geral, e para os diversos países, em particular; o seu valioso contributo para a riqueza e o emprego na Europa. Todas estes factores conjugados oferecem uma imagem marcada por grandes potencialidades, estabilidade e crescimento. Por outro lado, tem havido sempre a preocupação de considerar as diversas realidades e as ameaças internas e externas a curto, médio e longo prazo que podem derivar do turismo. Estas devem-se, por exemplo, ao seu carácter sazonal, à utilização por vezes abusiva dos recursos naturais, à escassa valorização do património cultural e do ambiente local e à apreensão causada pelo terrorismo que condiciona a segurança das populações e dos turistas. Os factos apontados obrigam-nos a estar preparados para enfrentar desafios muito consideráveis, se desejamos realmente que a actividade turística siga a senda do desenvolvimento sustentável. Estes desafios significam que é preciso garantir efectivamente o acesso de todos os cidadãos ao turismo, contribuir de forma palpável para o desenvolvimento dos muitos países do mundo não desenvolvido, garantir a sustentabilidade ambiental, respeitar o Código Ético do Turismo, salvaguardar a estabilidade e a qualidade do emprego e contribuir para a paz mundial. Ao fazer face a todos estes desafios e a outros mais, a indústria turística, que tem uma importância tão estratégica para a Europa, poderá dar o seu contributo específico para melhorar a qualidade de vida de todos os cidadãos.

1.3

A política turística na União Europeia. O Comité Económico e Social Europeu aprovou em 6 de Abril de 2005 um parecer sobre « A política de turismo na União Europeia alargada » que analisava com minúcia a actual política turística, à luz do Tratado Constitucional, e ainda as consequências do alargamento presente e futuro. Nesse parecer o papel do turismo era considerado positivo para as acções de apoio, coordenação e complemento das restantes políticas comunitárias. Assim, por exemplo, concluía-se que o turismo tem influência nas políticas de emprego e social, na melhoria da qualidade de vida, na investigação e no desenvolvimento tecnológico, na protecção dos consumidores, na política do ambiente e em muitas outras políticas. Convém salientar que o presente parecer procurava concretizar e analisar o contributo do Turismo Social para as políticas de emprego e social. O CESE tem tentado promover com os seus vários pareceres sobre o turismo a definição de políticas europeias que confluam num Modelo Turístico Europeu, assente não necessariamente em normas mas sim em valores. O Turismo Social e os valores que lhe são intrínsecos poderão ser uma componente essencial desse modelo e contribuir para a sua implantação e difusão.

1.4

O desafio da Agenda de Lisboa e o Turismo Social. Importa destacar o desafio colocado pela Agenda de Lisboa no âmbito do Turismo, mais concretamente do Turismo Social. Se o objectivo estratégico da Agenda é tornar a Europa « na economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos, e com maior coesão social », teremos de analisar se o Turismo Social poderá contribuir eficaz e positivamente para alcançar esse objectivo, como o fará e como poderá reforçar esse seu contributo. Diga-se desde já que já existe na realidade um tal contributo, como veremos mais adiante neste parecer, só que poderá ser reforçado graças às medidas a seguir enunciadas que deverão ser adoptadas pelos agentes do Turismo Social.

1.5

Antecedentes do presente parecer. Os antecedentes deste parecer são muito variados: teóricos, em forma de estudos, relatórios, jornadas, e práticos, com base nas diversas iniciativas e realidades do Turismo Social na Europa. São numerosos os contributos de várias instituições públicas e privadas, mas, no caso específico do CESE, merecem ênfase o parecer aprovado em 29 de Outubro de 2003 intitulado « Para um turismo acessível a todas as pessoas e socialmente sustentável », que já incluía o Turismo Social como uma das cem iniciativas (ponto 5.5.2), e o parecer aprovado em 6 de Abril de 2005 intitulado « A política de turismo na União Europeia alargada », que referia o Projecto de Turismo Social Europeu como possível projecto-piloto de cooperação institucional europeia.

2.   O conceito de Turismo Social

2.1

O direito ao turismo como fundamento do Turismo Social. Todos os cidadãos têm direito ao descanso diário, semanal ou anual, a um período de ócio que lhes permita desenvolver plenamente as várias facetas da sua personalidade e a sua integração social. E, no fim de contas, todos os cidadãos têm o direito de fazer jus na prática ao seu direito de desenvolver-se como pessoas. O direito ao turismo é, sem sombra de dúvida, a expressão concreta desse direito geral e a razão de ser do Turismo reside justamente no desejo de torná-lo universal e acessível a todos. O Turismo Social não é, por conseguinte, uma actividade marginal nem estranha ao conjunto das actividades gerais do turismo — uma indústria mundial muito poderosa — na Europa, em geral, e nos vários Estados-Membros, em particular. É, antes, uma forma de concretizar esse direito universal de fazer turismo, de viajar, de conhecer outras regiões e países que está na base da actividade turística. Merece aqui destaque especial o facto de este direito estar consagrado no artigo 7.o do Código Ético Mundial do Turismo, aprovado na Organização Mundial de Turismo (OMT), em Santiago do Chile, em 1 de Outubro de 1999, e perfilhado pelas Nações Unidas em 21 de Dezembro de 2001.

2.2

Definição de Turismo Social. Dada a variedade de concepções sobre a essência do Turismo Social, não é fácil definir este conceito, já que as instituições que têm abordado o tema usam fórmulas bem distintas como: identificação do conteúdo, dos resultados esperados, do conjunto de intenções, ideias e convicções. Mas todas elas tomam por base a mesma realidade: todos os cidadãos, incluindo os menos favorecidos, precisam e têm direito ao descanso, ao lazer e a um período reparador da sua actividade profissional, com uma frequência diária, semanal e anual. Assim, para o Instituto Internacional de Turismo Social (BITS) é «o conjunto de relações e de fenómenos resultantes da participação no turismo das camadas sociais com rendimentos modestos, participação que se torna possível ou é facilitada por medidas de carácter social bem definidas». Actualmente, o BITS está a rever esta definição ampliando-a a actividades de turismo que contribuem para o desenvolvimento e a solidariedade.

2.2.1

Para a Comissão Europeia (1) «O Turismo Social é organizado nalguns países por associações, cooperativas e sindicatos e tem por finalidade tornar as viagens realmente acessíveis ao maior número possível de pessoas e, especialmente, às camadas mais desfavorecidas da população». Esta definição, que remonta já há alguns anos, está a ser revista após as reuniões técnicas realizadas nos últimos anos. Parece-nos que nenhuma das definições é suficientemente exacta, mas como sucede frequentemente no âmbito das ciências sociais, ela não é tão importante como a identificação das suas manifestações concretas.

2.2.2

Por isso e não tendo a intenção de definir exactamente Turismo Social, mas partindo da premissa de que o turismo é um direito geral que é preciso tornar acessível a todos, pode-se falar de uma actividade de Turismo Social sempre que se cumprirem as três condições seguintes:

que se detecte uma situação real de incapacidade total ou parcial para exercer plenamente o direito ao turismo; tal pode resultar tanto da falta de condições económicas, de uma deficiência física ou mental, de condições de isolamento pessoal ou familiar, de mobilidade reduzida, de dificuldades geográficas e de causas muito várias que representem, em última instância, um obstáculo real;

que alguém, seja uma instância pública ou privada, uma empresa, um sindicato ou simplesmente um grupo organizado de pessoas, entre em acção para vencer ou reduzir o obstáculo que impede um indivíduo de exercer o seu direito ao turismo;

que essa acção seja realmente eficaz e permita a um grupo de pessoas fazer turismo de uma forma que respeite valores tais como a sustentabilidade, a acessibilidade e a solidariedade.

2.2.3

Por último, assim como o turismo, na sua acepção comum, é uma actividade que envolve vários sectores, ramos de actividade e áreas de desenvolvimento, também o Turismo Social congrega um conjunto de iniciativas que permitem às pessoas com dificuldades especiais fazer turismo, produzindo, simultaneamente, benefícios sociais e económicos para vários sectores, actividades, grupos e áreas.

2.3

História do Turismo Social

Não se sabe muito bem quando surgiram as primeiras actividades de Turismo Social tal como são entendidas nos nossos dias. Talvez tenham a sua origem em organizações especializadas na realização de férias baseadas no exercício físico na montanha, que tiveram a sua aparição no início do século XX, bem como nas colónias de férias destinadas às crianças de famílias desfavorecidas surgidas na Suíça e na França.

Os poderes públicos começaram a intervir nas primeiras formas do Turismo Social depois da Segunda Guerra Mundial. Esta intervenção estava ligada aos movimentos operários, havendo alguns países europeus (França, Itália, Portugal e Espanha) que organizavam actividades de Turismo Social, ao passo que outros (Reino Unido e Países Baixos) optaram por uma posição não intervencionista.

Só a partir dos anos cinquenta e sessenta do século XX é que são visíveis esforços para promover realmente a implantação do Turismo Social e se depara com um surto de organizações com vocação associativa, coordenadora e organizadora, nomeadamente o BITS, com sede em Bruxelas, que ainda hoje é símbolo de uma ampla actividade promotora e representativa.

2.4

Bases do Turismo Social. O Turismo Social assenta, segundo o BITS, em cinco critérios de valor:

2.4.1

O direito da maioria dos cidadãos a desfrutar do turismo. É, porventura, a vontade de transformar em realidade este direito que melhor justifica e fundamenta as várias iniciativas do Turismo Social. O número de pessoas que desfruta de um período de férias cresceu consideravelmente nos últimos tempos em resultado da socialização do turismo, mas há ainda muitos grupos que, por motivos vários, ainda não têm acesso a férias. A falta de recursos económicos é, provavelmente, o factor principal a impedir a universalização deste direito. Mas não é realista esperar nem exigir dos poderes públicos que disponibilizem fundos para garantir o direito a fazer turismo e a gozar férias. A resposta dos vários países é muito diferente: enquanto uns se guiam por critérios sociais, outros são muito menos assertivos perante uma realidade que impede que todos possam gozar férias. Importa salientar que, de modo algum, se pode ou deve identificar o Turismo Social com turismo de qualidade inferior ou de segunda categoria. Antes pelo contrário, é imperioso que as suas actividades se caracterizem por grande esmero na qualidade global, tanto das instalações como dos serviços prestados.

2.4.2

O contributo do Turismo Social para a socialização. O turismo é um poderoso instrumento de socialização, já que promove o contacto com outras realidades culturais e geográficas e outros usos e costumes. Sem viagens e sem férias as pessoas jamais se encontrariam, dialogariam e se reconheceriam como iguais no essencial, não obstante as diferenças culturais. Esse intercâmbio cultural, esse desfrutar dos tempos livres contribui para o desenvolvimento pessoal, tanto dos turistas como das comunidades que os acolhem. O seu valor é ainda mais fundamental para os jovens, já que lhes proporciona uma formação intelectual e uma visão mais rica do mundo. No caso da União Europeia, o Turismo Social pode ser um contributo muito valioso para a criação de uma Europa dos Cidadãos. Convém frisar que está generalizada a opinião de que os circuitos do Turismo Social não devem, por um lado, diferir dos circuitos gerais do turismo, mas devem, por outro, estar ao serviço da integração social. Cabe aos vários grupos de Turismo Social procurar encontrar nos circuitos turísticos gerais as condições adequadas para desfrutar das suas férias e não inversamente. É evidente que isso pressupõe um esforço não só ao nível das condições materiais mas também do tipo de serviço e, por conseguinte, da formação especializada a ministrar aos profissionais do sector.

2.4.3

A criação no território de estruturas de turismo sustentável. Na realidade, as infra-estruturas das zonas e destinos turísticos nem sempre podem ser qualificadas como sustentáveis, sobretudo pelo facto de o turismo se ter desenvolvido muitas vezes segundo critérios de rentabilidade a curto prazo, com utilização abusiva dos recursos naturais e ocupação das zonas mais atraentes, geralmente na costa e na montanha. O Turismo Social, com uma visão mais centrada nas condições sociais que nos aspectos económicos, poderá contribuir para a construção ou recuperação dos destinos turísticos segundo critérios de sustentabilidade económica, social e ambiental. A forma como serão geridas as várias manifestações do Turismo Social é essencial para garantir a eficácia deste seu contributo. Se a sustentabilidade é, fundamentalmente, o equilíbrio entre as várias facetas da actividade humana, o Turismo Social é um instrumento de desenvolvimento sustentável para muitos dos países actualmente menos desenvolvidos que vêem no turismo uma fonte de actividade económica capaz de libertá-los da pobreza.

2.4.4

O contributo para o emprego e o desenvolvimento económico. O turismo é, e será decerto também futuramente, a indústria mais poderosa à escala mundial, uma das actividades que mais contribuirá para o emprego, o desenvolvimento, a prosperidade e a qualidade de vida da população dos destinos turísticos. Embora o Turismo Social seja parte deste potencial económico, ainda não está plenamente ciente do seu poder, da sua importância económica nem, com efeito, da sua capacidade de impor a sustentabilidade na escolha dos seus destinos. As empresas e os organismos que gerem o Turismo Social deverão, por conseguinte, favorecer critérios não exclusivamente económicos no exercício das suas actividades. Um critério a adoptar seria a criação de emprego, de emprego estável e de qualidade, absolutamente essencial para o desenvolvimento sustentável de um destino turístico. Em especial, o contributo do Turismo Social (seja ele grande ou pequeno) no combate à sazonalidade é um critério básico de actuação para garantir a qualidade e a estabilidade do emprego, pelo que deve fazer parte integrante do Modelo de Turismo Europeu. As parcerias público-privadas na gestão do Turismo Social poderão ser um instrumento muito útil e um indicador do cumprimento desse critério.

2.4.5

O contributo do Turismo Social para o desenvolvimento mundial. Já se referiu anteriormente que o turismo e, em particular, o Turismo Social pode significar para muitos povos uma saída para o subdesenvolvimento ou para uma situação de crise industrial e de abandono da actividade mineira, industrial ou agrícola. Há uma total coincidência de critérios entre as premissas a que deve obedecer o Turismo Social e as condições necessárias para uma determinada zona e os seus habitantes encontrarem na actividade turística o motor do seu desenvolvimento. A partir do momento em que as populações possam retirar desta actividade o seu sustento, haverá um reforço da economia local e um maior enraizamento social. Tal como sugeriram numerosos organismos internacionais, a actividade turística é um bom antídoto contra as guerras e desastres de todos os tipos. Turismo significa acolhimento, intercâmbio, valorização das condições locais, amizade e comunicação entre as pessoas, em total oposição à guerra que significa agressão, invasão e destruição da Natureza. Se é verdade que apenas se ama o que se conhece, o turismo é o instrumento ideal de aproximação, de conhecimento dos povos e, por conseguinte, um instrumento de paz, de concórdia e de desenvolvimento. O Turismo Social, mais concretamente, pode e deve reafirmar a sua posição e contribuir para a criação em todo o mundo de condições de igualdade, de justiça, de democracia e de bem-estar para o desenvolvimento solidário de todos os povos do mundo.

2.5

Princípios e condições do Turismo Social e sua gestão. É essencial analisar os elementos e os critérios que caracterizam as actividades do Turismo Social e a sua forma de gestão para demarcar os seus traços distintivos dos aspectos que não podem ser rotulados de «sociais». De acordo com o BITS, eis alguns dos critérios que qualificam o conceito geral de turismo:

ter como princípio orientador fundamental o maior acesso à actividade turística de todos os grupos que lutam com certas dificuldades para fazer turismo ou de alguns deles;

estar aberto a muitos e diversos grupos e tipos de utentes; estar também aberto a diversas fórmulas de gestão e a diversos agentes activos no Turismo Social;

definir correctamente os grupos a que se dirigem as suas actividades: classes sociais, diversas faixas etárias, pessoas com deficiência, sempre no respeito do critério de não discriminação em razão de raça, cultura ou situação social;

integrar acções e objectivos de carácter humanista, pedagógico, cultural e de desenvolvimento pessoal, em geral;

ser transparente no regime económico da actividade em que os seus lucros se limitem ao necessário para o cumprimento dos objectivos sociais;

conferir ao produto turístico um valor acrescentado não monetário;

manifestar uma vontade inequívoca de integrar a actividade turística na zona de destino de uma forma sustentável;

garantir uma gestão dos recursos humanos que os valorize e os integre e dê ênfase à qualidade do emprego do pessoal das organizações que se dedicam ao Turismo Social.

Estes e outros critérios análogos poderão servir de fio condutor à actuação dos gestores do Turismo Social e à definição desta actividade.

2.6

A rentabilidade das empresas e o Turismo Social. O Turismo Social tem de ser e é uma actividade económica (embora não exclusivamente) e deve reger-se, como tal, pelos princípios básicos de rentabilidade dos investimentos e dos lucros necessários para perseguir e alcançar os objectivos fundamentais. Apenas empresas competitivas e rentáveis, no sentido lato, poderão desenvolver actividades de qualidade, seguras e com garantias para os consumidores. A actual diversidade do Turismo Social é prova de que as empresas e as organizações que se dedicam a essa actividade o fazem com rentabilidade, já que têm uma estrutura consolidada, um mercado adequado e preços adaptados a esse mercado. Convém referir especialmente os empregos criados pelas organizações do Turismo Social o ano inteiro e nos períodos de quebra de actividade, o que resolve o problema de desemprego dos trabalhadores afectados.

2.7

Rentabilidade social do turismo. Mas se o Turismo Social é uma actividade económica, também é uma actividade social com benefícios neste âmbito. O utente pode desfrutar das suas férias, os trabalhadores de turismo lucram com os empregos criados e a sociedade, no seu todo, usufrui benefícios sociais. No caso da UE, o Turismo Social tem tido e continuará a ter um impacto crescente na construção da Europa dos Cidadãos. Viagens na Europa do maior número possível de cidadãos traduzir-se-ão, sem dúvida, em mais conhecimento, mais compreensão e mais tolerância.

2.8

Diversas concepções e visões do Turismo Social na Europa. O Turismo Social tem hoje significados diferentes nos vários Estados-Membros com programas específicos neste âmbito, mas há três elementos em comum:

a capacidade real de dispor de tempo livre para fazer férias,

a capacidade monetária para poder deslocar-se e viajar,

a existência de um canal, de uma estrutura ou de um instrumento que permita exercer estes direitos.

2.8.1

Assim, entende-se por Turismo Social o conjunto de viagens e actividades organizadas por sindicatos, o turismo familiar, o turismo de inspiração religiosa, o organizado pelas empresas para os seus trabalhadores ou por instituições públicas, o programado especificamente para pessoas com deficiência, jovens ou cidadãos idosos com baixos rendimentos, e muitas outras realidades.

2.9

Os organismos do Turismo Social. Em toda a Europa, são vários os organismos que intervêm no Turismo Social e na sua gestão, destacando-se:

as federações ou consórcios nacionais,

os estabelecimentos públicos vocacionados para o Turismo Social ou com actividades exclusivas neste contexto,

as associações de Turismo Social, desportivas, culturais,

os organismos de cooperação,

os sindicatos e

os organismos de gestão mista ou paritária.

3.   Os agentes que intervêm no Turismo Social e seu papel

3.1

As instituições europeias. É crescente o interesse demonstrado pelas várias instituições europeias pelas actividades do Turismo Social, manifesto nos diversos estudos, pareceres, relatórios e conferências realizados, promovidos e coordenados quer pelo Parlamento quer pela Comissão e o CESE. A sua actividade incide essencialmente na obtenção, catalogação e difusão do amplo leque de experiências dos vários países europeus. A Comissão, em particular, dedica-se a promover novas experiências dentro de cada país e a estabelecer contactos com os responsáveis dos países que manifestarem o desejo de participar em experiências transnacionais. Actualmente, o papel da Comissão não parece incluir a coordenação geral das experiências do Turismo Social ao nível comunitário. É digno de nota, neste contexto, o inquérito realizado pela Unidade de Turismo da Direcção-Geral «Empresas» sobre a participação dos cidadãos em actividades de lazer, que procurava apurar os motivos pelos quais cerca de 40 % deles não fazem turismo. Mas não se vê por que razão a Comissão não venha a assumir futuramente o papel de coordenador e de integrador de uma plataforma de Turismo Social à escala europeia, até porque isso não implicará forçosamente a afectação pelas instituições europeias de recursos financeiros para o desenvolvimento dessa plataforma comum e do seu carácter transnacional.

3.2

Os governos dos Estados-Membros. Tal como se referiu anteriormente, o envolvimento dos governos dos Estados-Membros nas actividades de Turismo Social é muito variável, em função do seu grau de intervenção e de razões históricas, ideológicas e sociais. Há países onde são o governo ou o Estado, as regiões ou as administrações locais que respondem por um volume substancial de ajudas financeiras. Estas ajudas têm frequentemente por alvo determinados grupos: jovens, idosos, pessoas com deficiência, pessoas carenciadas, etc. Actualmente, os governos procuram ultrapassar, mediante vários tipos de intercâmbio transnacional, os limites nacionais dos seus programas de Turismo Social.

3.3

Os empresários. Por um lado, é importante considerar a existência de iniciativas tais como os «cheques de férias», em que os empresários contribuem financeiramente para as férias do seu pessoal. Por outro lado, convém recordar que, como já se disse, o Turismo Social é uma actividade económica de grande relevância e potencial e atrai, como tal, os empresários do sector turístico que vêem nela uma oportunidade para incrementarem as suas actividades de prestação de serviços ou de mediação. Vale a pena citar o caso da empresa espanhola Mundo Senior, que reúne várias empresas turísticas unidas originalmente para gerir o programa de Turismo Social do Ministério do Trabalho e da Segurança Social e que expandiram o seu âmbito social e a sua actividade com a oferta de produtos de turismo especializados para idosos. É evidente que a condição da competitividade não está em oposição ao carácter social da actividade. No futuro, serão necessárias parcerias público-privadas para desenvolver programas de Turismo Social rentáveis, tanto dentro de cada um dos Estados-Membros como entre países diferentes.

3.4

Os trabalhadores. Desde o momento em que surgiu o Turismo Social que os sindicatos, enquanto organizações de defesa dos direitos dos trabalhadores, têm uma forte presença na actividade turística como forma de obter benefícios para os seus sócios. Esta presença é visível tanto no suporte proporcionado pelas infra-estruturas materiais, cidades de férias, residências, etc. como em simples serviços especializados. As experiências diferem de país para país, mas quase em todos eles há formas de actividade de Turismo Social de raiz sindical. Merecem referência especial as organizações sindicais dos países que aderiram recentemente à União Europeia e que buscam um modelo válido para o Turismo Social e estabelecer relações com organismos mais experientes. Refira-se igualmente, neste contexto, o interessante estudo realizado pelo BITS, em Maio de 2005, sobre as actividades de vários sindicatos dirigidas aos trabalhadores, enumerando uma a uma as actividades actualmente existentes nos 25 países da UE. Trata-se, com efeito, de um instrumento muito útil para conhecer e analisar a situação actual.

3.5

As associações especializadas. Entre estas associações encontram-se as cooperativas de consumo que em alguns países (Itália e Reino Unido) dispõem de amplas redes de agências para canalizar as actividades de Turismo Social. São dignas de nota as organizações juvenis e as ambientais com actividades nesse âmbito. Neste capítulo são igualmente de referir os organismos de carácter associativo das próprias organizações de turismo social, como é o caso do BITS que tem uma missão de apoio, de coordenação e de incentivo de importância vital.

3.6

Os grupos implicados directa e indirectamente enquanto sujeitos do Turismo Social. É evidente que os utentes são os verdadeiros protagonistas dos vários programas e actividades de Turismo Social. São eles os primeiros a beneficiar de diversas vantagens económicas que lhes permitem desfrutar dos seus tempos livres e das suas férias, tendo a oportunidade de praticar as actividades desportivas e culturais favoritas. São, além disso, beneficiários de um turismo respeitador dos recursos territoriais, patrimoniais e ambientais, bem como dos contactos com os habitantes dos destinos turísticos. Estas actividades contribuem, no seu conjunto, para o conhecimento mútuo, para o relaxamento e o equilíbrio pessoal. As comunidades locais que acolhem os utentes do Turismo Social também retiram benefícios desta situação que se traduzem em empregos, actividade económica e desenvolvimento.

4.   Situação actual do Turismo Social na Europa.

4.1

Aspectos teóricos, regulamentares e programáticos. Na Europa de hoje, o Turismo Social não dispõe de um quadro teórico, regulamentar e programático muito extenso, não obstante os estudos e as investigações relativamente abundantes que têm procurado inventariar e analisar comparativamente as suas várias manifestações na Europa. Algumas delas inserem-se no capítulo D do presente parecer a título de referências documentais e técnicas.

4.2

Diversas experiências concretas na Europa. Tal como referimos antes, no estudo realizado pelo grupo de trabalho durante a audição que teve lugar em Barcelona, nos dias 4 e 5 de Maio de 2006, as experiências divulgadas na conferência sob a égide do BITS e da Comissão intitulada «Turismo para Todos» permitiram detectar e conhecer numerosas práticas na Europa que se pode classificar de bem sucedidas. Não é intenção do presente parecer estudar minuciosamente estas experiências, mas talvez fosse oportuno citar as mais importantes por contribuírem para avaliar o Turismo Social de uma forma muito positiva e servirem para nortear os esforços de outros agentes ou dos Estados ou âmbitos territoriais que não disponham, por vários motivos, de programas desta natureza.

4.2.1

A Agência Nacional dos Cheques de Férias (ANCV) que desenvolve em França uma actividade económica muito importante com um volume de negócios calculado em 1.000 milhões de euros, no ano de 2005. Trata-se de um estabelecimento público de carácter industrial e comercial, criado em 1982, que conta já com mais de 23 anos de actividade e continua a ser um instrumento útil para as políticas sociais no âmbito do turismo.

4.2.1.1

Os seus objectivos articulam-se em torno dos três eixos seguintes:

favorecer a saída real de férias ao maior número possível de pessoas e, especialmente, às que têm rendimentos mais modestos;

oferecer liberdade de utilização graças a uma ampla rede de profissionais do turismo capaz de responder com qualidade a todos as solicitações;

colaborar no desenvolvimento turístico, participando na melhor distribuição territorial da actividade turística.

4.2.1.2

Convém referir que os cheques de férias são distribuídos anualmente por cerca de 2,5 milhões de pessoas e contemplam um total de 7 milhões de viajantes. São mais de 21.000 os organismos filiados que participam no seu financiamento e é de 135.000 o número de profissionais do sector de turismo e lazer implicados na prestação dos serviços que lhe são inerentes.

4.2.1.3

O programa permite, além disso, facilitar a saída de férias de grupos especialmente desfavorecidos, grupos de pessoas com deficiência, jovens, etc., graças a bolsas de viagem num valor total que ronda os 4,5 milhões de euros. Também são fundamentais os investimentos da Agência na modernização das instalações de Turismo Social.

4.2.1.4

Tudo indica que, no seu conjunto, o programa tem a sua continuidade e a sua rentabilidade asseguradas. Sem dúvida que os estudos económicos realizados confirmam que é real a recuperação financeira através da actividade económica.

4.2.1.5

Os objectivos da Agência para os próximos anos são continuar a expandir e a difundir os seus serviços pelos utentes e profissionais de turismo. Talvez estes objectivos pudessem incluir a dimensão transnacional do programa mediante concertação com outros países da Europa. Não há dúvida que os benefícios retirados desta internacionalização seriam recíprocos, modelares e de grande importância económica e social.

4.2.2

O Programa de Turismo Social do IMSERSO (Instituto de Migrações e Serviços Sociais) da Espanha tem objectivos idênticos mas é diferente na sua abordagem e nos instrumentos utilizados. Concretamente, há mais de um milhão de pessoas, especialmente idosos, que beneficiam anualmente de viagens organizadas, em grupo, durante a época baixa. O Estado espanhol investe anualmente neste programa 75 milhões de euros, mas mediante diversos mecanismos fiscais (IVA, IAE (Imposto de Actividades Económicas), lucros das empresas e rendimentos de pessoas físicas). Por outro lado, graças às maiores receitas arrecadadas em consequência das quotizações para a segurança social e das poupanças nos subsídios de desemprego, esse programa gera receitas que rondam os 125 milhões de euros e é, por isso, muito rentável economicamente.

4.2.2.1

É evidente a rentabilidade do programa, já que, por um lado, permitiu a amplas camadas da população idosa viajar pela primeira vez, conhecer outras cidades e outras realidades, expandir as suas relações sociais em pé de igualdade, melhorar o seu estado físico, tudo segundo parâmetros razoáveis de qualidade e de aceitação por parte dos utentes e possibilitou, por outro lado, a recuperação dos custos numa relação de 1,7 euros por cada euro investido.

4.2.2.2

É digno de nota o impacto deste programa sobre o emprego, avaliado em 100.000 trabalhadores directos que não são atirados para o desemprego quando chega a época baixa, uma vez que tanto hotéis como outros estabelecimentos se mantêm abertos todo o ano.

4.2.2.3

O programa cresce e evolui continuamente em busca de novas fórmulas de Turismo Social com maior valor em termos sociais, de cultura e de saúde, como é o caso das estadias em termas, que têm tido grande êxito, ou de circuitos e acontecimentos culturais.

4.2.2.4

Tal como sucede na França, as possibilidades de crescimento do programa são múltiplas, não só dentro do país como internacionalmente. Actualmente, o IMSERSO espanhol está a negociar com o seu homólogo português o intercâmbio de turistas e tenciona fazer o mesmo com a França, o que pode transformá-lo num modelo exportável precioso para o resto da Europa.

4.2.3

Outras experiências: Para além destes dois importantes programas de Turismo Social na Europa, convém referir outros exemplos positivos, talvez mais limitados, mais segmentados e dirigidos a utentes mais específicos, mas nem por isso menos valiosos. É o caso, analisado na audição de Barcelona, da Plataforma Representativa Estatal de Deficientes Físicos (PREDIF), que se dirige a um grupo muito concreto mas que gere com bastante eficácia um programa de férias específico.

4.2.3.1

De outra óptica muito interessante, convém citar a experiência partilhada por três organizações, uma do Reino Unido, Family Holiday Association, outra da Bélgica, Toerisme Vlaanderen e outra ainda da França, Vacances Ouvertes, que se coordenam entre si para concretizar o «Turismo para Todos» nos três países.

4.2.3.2

Há em diversos países europeus também actividades de Turismo Social, como, por exemplo, em Portugal, Polónia e Hungria, com um papel essencial dos sindicatos, e em Itália o programa promovido pelas cooperativas de consumo. Pode-se afirmar, por último, que a variedade de experiências, o número de utentes e a sua diversidade se estão a consolidar e a ampliar em todos os países da Europa.

4.2.3.3

Constata-se, analogamente, que algumas regiões e alguns municípios estão a desenvolver, de uma forma ou de outra, experiências de Turismo Social, como é o caso da Comunidad Autónoma de las Islas Baleares com o seu Plano OCI 60.

4.2.3.4

Ao nível regional, o governo da Andaluzia (Espanha) lançou o programa de Residencias de Tiempo Libre, sendo de referir, também como iniciativa andaluza, o programa «Conoce tu Costa» — um exemplo de cooperação entre a administração regional e as câmaras municipais para favorecer o turismo de pessoas idosas na Comunidade Autónoma.

4.2.3.5

O Turismo Social está igualmente presente no portal da União Europeia www.visiteurope.com, como local de consulta sobre todos os tipos de actividade turística europeia, e obviamente do Turismo Social.

4.3

Avaliação global do Turismo Social. São numerosos os trunfos do Turismo Social para a sociedade europeia. Eis alguns deles:

Satisfação dos utentes, não só pela actividade directa de férias, em si, como pelo carácter «especial» desta actividade de lazer;

A dimensão e os valores humanos da actividade;

O melhor equilíbrio e o desenvolvimento pessoal dos utentes e da comunidade de acolhimento;

A rentabilidade e os benefícios económicos da indústria turística, em especial graças ao prolongamento da época alta;

Os benefícios derivados da criação de empregos estáveis e de qualidade durante todo o ano;

A manutenção de condições de sustentabilidade nos zonas de destino;

A valorização do ambiente local e dos seus recursos naturais, sociais, culturais e patrimoniais;

A promoção do conhecimento e do intercâmbio entre os diversos Estados-Membros.

4.3.1

Estes trunfos, em conjugação com os casos actuais de sucesso do Turismo Social, com as perspectivas de crescimento da actividade e com a investigação e a implantação de novos produtos, dá uma nota global muito positiva ao Turismo Social na Europa em todos os seus aspectos.

4.3.2

Com uma avaliação tão positiva é grande a tentação de classificar de «milagre» o Turismo Social, já que todos os agentes e todos os utentes envolvidos retiram benefícios vários: sociais, de saúde, de emprego, de cidadania europeia… Também não há ninguém que saia prejudicado por esta actividade… Em suma, dificilmente se encontrará uma actividade humana e económica com um reconhecimento e um apoio tão unânimes.

4.3.3

Com tal perspectiva, é inteiramente lógico o presente parecer recomendar vivamente propostas e fórmulas susceptíveis, por um lado, de consolidar e melhorar os programas existentes e, por outro, de estender os seus efeitos benéficos a camadas mais amplas da população.

B.   SEGUNDA PARTE: PROPOSTAS

5.   Para um projecto europeu de Turismo Social

5.1

Premissas. Nos pontos anteriores ficou claro que, independentemente da definição de Turismo Social e da forma como este é financiado ou gerido, se trata de uma realidade social e económica poderosa, lucrativa e estável que cumpre os seus objectivos com um elevado grau de satisfação por parte dos utentes, contribui para a criação de empregos e para pôr termo ao carácter sazonal da actividade turística. É, com efeito, uma actividade de grande relevância no mundo inteiro e, em especial, na Europa. O objectivo é, por conseguinte, analisar até que ponto os efeitos benéficos do Turismo Social poderão estender-se e propagar-se a todos os indivíduos, às empresas e à sociedade no seu conjunto.

5.1.1

Não é fácil abrigar num só conceito uma actividade de Turismo Social com âmbito europeu. Pode-se falar de plataforma, de projecto, de programa, de iniciativa, que embora não tenham necessariamente o mesmo significado fazem todos eles alusão a uma actividade organizada, com objectivos claros e de cariz supranacional e europeu. Neste parecer, que pretende apenas apresentar uma proposta geral, estas designações são usadas indiferentemente, enquanto se aguarda que a realidade desta futura plataforma sugira o termo mais adequado.

5.1.2

Por outro lado, constata-se que o turismo europeu padece de várias deficiências e vê-se perante certas ameaças a médio prazo:

A situação grave e cada vez mais premente causada pelo carácter sazonal da indústria turística, tanto no Norte da Europa, como no centro e no litoral mediterrânico, onde na época baixa há zonas desertas e faltam infra-estruturas adequadas durante todo o ano;

A subutilização de recursos humanos durante as épocas média e baixa;

O grande aumento da população activa devido à emigração, que obriga a ampliar a actividade económica para manter o nível de vida actual;

As dificuldades da indústria turística em manter preços adequados e uma ocupação média durante todo o ano capazes de assegurar a sua rentabilidade a médio prazo;

A existência de limites objectivos no número de zonas turísticas que podem ser exploradas para o efeito;

O desenvolvimento sustentável da indústria turística exige infalivelmente o aumento do valor acrescentado de cada lugar disponível ao longo do ano, ou incrementando a qualidade e, por conseguinte, o preço, ou aumentando a ocupação média anual através do prolongamento da temporada de abertura dos estabelecimentos turísticos;

A emergência de numerosos destinos turísticos em todo o mundo oferecendo produtos e serviços inovadores e competitivos. Esta nova concorrência deveria representar, antes de mais, um novo estímulo para melhorar a qualidade e a competitividade.

5.1.3

Mas também há elementos que representam reais oportunidades para a viabilidade de uma eventual Plataforma ou Projecto de Turismo Social Europeu:

aumento gradual na Europa, em termos absolutos e relativos, do número de cidadãos não activos mas com pensões de reforma e um nível de vida elevado;

aumento gradual da esperança de vida dos europeus;

aumento da média de tempos livres de que dispõe um indivíduo durante toda a sua vida e, sobretudo, em idade avançada;

custos de transporte mais baratos graças ao grande surto de companhias de baixo custo com repercussões favoráveis à mobilidade e ao turismo;

nível cultural crescente que propicia uma actividade turística responsável e sustentável;

experiências positivas e bem sucedidas em toda a Europa de programas de Turismo Social;

adesão de novos países à União Europeia a qual contribui para dilatar o mercado e as possibilidades e oportunidades de viajar.

5.2

São vários os objectivos a definir na perspectiva de uma eventual Plataforma de Turismo Social Europeu:

generalizar e ampliar os actuais programas e o número de utentes de Turismo Social dos vários países da Europa até conseguir que todos eles disponham de um programa próprio;

consolidar o carácter transnacional dos programas existentes através de acordos de cooperação bilaterais ou multilaterais;

criar condições para a elaboração e o arranque de uma Plataforma de Turismo Social de carácter europeu, em que os beneficiários potenciais são cidadãos europeus que terão a possibilidade de visitar outros países de uma forma acessível e sustentável; neste sentido, seria profícuo conhecer o número de cidadãos europeus que nunca viajaram para outro país da Europa, um grupo certamente bastante numeroso que poderia servir de base ao referido programa;

promover a implantação progressiva de uma actividade de Turismo Social de cariz europeu em que participe o maior número possível de países.

5.3

Agentes e grupos implicados na Plataforma de Turismo Social Europeu. São dignos de nota:

as actuais organizações que gerem programas de Turismo Social em diversos países;

as organizações sindicais e cooperativas interessadas no desenvolvimento do programa;

os empresários do sector turístico no seu sentido mais lato interessados em melhorar a rentabilidade duradoura dos seus estabelecimentos;

os governos nacionais, regionais e locais interessados em intervir no sector e melhorá-lo e preocupados em garantir o desenvolvimento pessoal e social dos seus cidadãos;

a União Europeia e as suas instituições interessadas em ampliar e promover o emprego, a actividade económica e a cidadania europeia; face à dimensão supranacional da Plataforma, as instituições da União Europeia deveriam assumir, além disso, um papel de coordenação e de acompanhamento das condições em que o programa se desenvolve, e liderarem também a sua implantação;

as organizações de turismo Social, especialmente o BITS.

5.4

Elementos essenciais do Turismo Social Europeu. Para que uma plataforma deste tipo seja social e economicamente viável terá de obedecer aos seguintes parâmetros:

dirigir-se aos grupos mais desfavorecidos económica, territorial ou socialmente e, de forma especial, às pessoas com deficiência física ou psíquica ou com dificuldades para viajar decorrentes da realidade geográfica em que vivem, por exemplo, nas zonas insulares da Europa. Isso implica assumir o financiamento parcial, justo e equitativo, independentemente da duração da viagem e da estadia, como forma de compensar essa situação desvantajosa, entendida num sentido muito amplo;

ser, no seu todo, rentável económica e socialmente, a curto, médio e longo prazo, tanto ao nível privado como público;

criar empregos estáveis e de qualidade durante todo o ano; assegurar uma gestão centralizada e o máximo aproveitamento das estadias e estabelecimentos turísticos para conseguir o objectivo do emprego;

desenvolver-se durante em períodos da época baixa;

ser sustentável e garantir o enriquecimento pessoal e social tanto dos beneficiários como das comunidades que os acolhem;

manter um elevado nível de qualidade das prestações adequado aos objectivos almejados;

desenvolver-se em forma de cooperação público-privada.

Uma vez satisfeitas estas condições, o Turismo Social será indubitavelmente um elemento fundamental para integrar o Modelo de Turismo Europeu.

5.5

A cooperação público-privada na Plataforma. A viabilidade do programa será provavelmente muito condicionada — mas também favorecida — por uma efectiva cooperação público-privada na sua concepção, configuração e gestão. Parece ser possível, mesmo não sendo fácil, encontrar na Europa organizações e empresas dispostas a desenvolver esta Plataforma de Turismo Social Europeu.

6.   Efeitos e resultados de uma Plataforma Europeia de Turismo Social

6.1

Crescimento e emprego. Se esta Plataforma for concretizada, nas suas diversas fases, são de esperar fortes repercussões no crescimento e no emprego que contribuirão incontestavelmente para alcançar os objectivos de Lisboa. Por exemplo, a experiência do programa do IMSERSO lançado em Espanha demonstra claramente o impacto positivo do Turismo Social e de como é possível manter e criar empregos durante a época baixa.

6.2

Direito real de acesso ao turismo. Não obstante as estatísticas disponíveis revelarem que, actualmente, cerca de 40 % da população não faz férias, a Plataforma de Turismo Social Europeu poderia almejar e ajudar a reduzir esta percentagem substancialmente, transformar o turismo em realidade universal e ampliar o conhecimento recíproco dos povos da Europa.

6.3

Modelo Turístico Europeu. Nos seus vários pareceres sobre o turismo, o CESE tem-se mostrado confiante em relação à construção de um modelo de turismo europeu não baseado em legislação, mas em valores de aceitação e aplicação gerais. A universalização do turismo — turismo para todos — seria um dos valores a incluir nesse modelo. A Plataforma de Turismo Social Europeu poderia ser muito valiosa para coadjuvar o Modelo Turístico Europeu.

7.   O contributo do turismo e, em especial, do turismo social para a construção de uma identidade e dimensão europeias

7.1

Nos últimos tempos, tem ficado cada vez mais evidente que a construção europeia não é um caminho fácil nem curto, já que são ainda muitas as incertezas e as dificuldades a vencer. O Turismo Social poderia ser um poderoso instrumento de informação, de conhecimento recíproco dos cidadãos, de solidariedade entre os povos e contribuir, assim, para a construção da Europa dos Cidadãos, não com sacrifícios e penosamente, mas mediante o desfrute dos tempos livres, das viagens e das férias. Especialmente os jovens formam um grupo que parece inclinado a aumentar as suas viagens na época alta, justamente um período em que as várias instalações de carácter residencial ligadas ao ensino não estão ocupadas e poderiam acolher temporariamente acções de turismo análogas ao programa ERASMUS.

7.2

Tudo indica que a actividade turística é uma boa forma de construir essa Europa dos Cidadãos, já que os vários grupos implicados e o próprio sector económico de turismo e as comunidades locais poderão fazer coincidir os seus interesses e permitir uma experiência agradável e acessível a todos.

C.   TERCEIRA PARTE: CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

8.   Conclusões

8.1

Uma primeira conclusão geral da análise feita neste parecer sobre a situação actual do Turismo Social na Europa, é que se trata de uma actividade sustentável numa óptica ambiental, económica e social e, além disso, fundamental em cada um destes domínios.

8.2

Os benefícios económicos, sociais, para a saúde e a integração usufruídos por todos os utentes e agentes que intervêm nos programas contam com uma aceitação geral incondicional e representam um notável valor acrescentado.

8.3

Os vários grupos de utentes do Turismo Social e, em especial, as pessoas com deficiência e/ou mobilidade reduzida têm nos programas uma extraordinária componente e um valioso contributo para a sua plena integração como pessoas.

8.4

O Turismo Social na Europa conta com uma grande variedade de agentes, de formas de desenvolvimento, de um público concreto, de instrumentos financeiros, etc. que o enriquecem, o diversificam e o ajudam a evoluir.

8.5

Podemos concluir especialmente que a rentabilidade social do Turismo Social é compatível com a rentabilidade económica e tem nela um efeito positivo.

8.6

É economicamente viável e socialmente oportuno que cada país europeu desenvolva um programa nacional de Turismo Social com diversas abordagens e formas de gestão.

8.7

É economicamente viável e socialmente desejável a criação de uma Plataforma de Turismo Social Europeu.

8.8

Todas as actividades de Turismo Social, ao desenvolver-se, deverão subentender um conjunto de valores de sustentabilidade e de criação de emprego, no espírito da estratégia de Lisboa.

8.9

O Turismo Social poderá ser um instrumento muito valioso para a criação da Europa dos Cidadãos, de todos os cidadãos, sendo aqui de especial importância o papel que os jovens poderão desempenhar nesse processo.

8.10

O Turismo Social é uma actividade que contribui para concretizar alguns dos valores que se inserem perfeitamente no Modelo Turístico Europeu.

8.11

As comunidades locais da Europa inteira poderão beneficiar das actividades de Turismo Social graças ao seu contributo para a preservação do património cultural e local.

8.12

À guisa de conclusão geral, cabe afirmar que a actividade de turismo social é hoje uma actividade generalizada em numerosos países da Europa e que atingiu a sua maturidade, com bons gestores e estruturas organizativas adequadas, estando preparada para dar o salto para a sua universalização e para assumir o carácter transnacional da sua oferta de serviços, o qual implicará objectivos mais exigentes em termos de quantidade e qualidade.

9.   Recomendações

9.1

A recomendação principal aos potenciais utentes dos programas de Turismo Social é, obviamente, incentivá-los a participar numa actividade como é o turismo, a que têm direito como pessoas e à qual não tiveram a possibilidade de aceder devido a uma série de circunstâncias. O Turismo Social promove clara e profundamente a integração, o conhecimento e o desenvolvimento pessoal, pelo que só se pode lucrar com a participação nas actividades organizadas no seu âmbito.

9.2

Importa reconhecer, em primeiro lugar, os benefícios do trabalho dos agentes que participam na gestão dos vários programas de Turismo Social, a sua entrega à missão de que os incumbem as suas organizações e o seu cuidado em prestar aos utentes um serviço acessível mas de grande qualidade. Convém, contudo, instigá-los também a melhorar continuamente a qualidade dos seus produtos e dos seus serviços, a investir na melhoria das infra-estruturas e na inovação de novos produtos, sobretudo os que têm uma dimensão transnacional. A coordenação de programas e a parceria de organismos responsáveis representam um instrumento muito útil para melhorar o intercâmbio de experiências.

9.3

Recomendamos às empresas do sector turístico que participem com entusiasmo nas actividades de Turismo Social. O Turismo Social tem valores compatíveis com uma correcta gestão empresarial, com a competitividade e a rentabilidade, a curto prazo e, em especial, a médio e a longo prazo, assegurando emprego a numerosos trabalhadores o ano inteiro.

9.4

Aconselhamos as instâncias e os governos nacionais, regionais e locais a implantarem programas de Turismo Social, não só pelos seus benefícios sociais mas também económicos. A obtenção de receitas suplementares provenientes de impostos e quotizações, as economias nos gastos associados ao desemprego são indiscutíveis incentivos para prever subvenções justas a grupos menos favorecidos económica, social ou fisicamente, com a certeza da sua recuperação e rentabilidade.

9.5

Convidamos as instituições europeias a terem em conta o Turismo Social e a considerá-lo como uma actividade fundamental capaz de combinar objectivos do âmbito do turismo com a acção social, como uma actividade que merece ser reconhecida e desenvolvida e deverá contar com assistência técnica especializada, apoio e incentivos não necessariamente económicos. Animação, coordenação técnica, disseminação de experiências e ponto de encontro para acordos transnacionais são algumas das funções a assumir sobretudo pela Comissão, através da sua Unidade de Turismo, e a realizar com os seus próprios meios, na perspectiva da criação de uma poderosa Plataforma Europeia de Turismo Social. A liderança da Comissão nestas vertentes da promoção do Turismo Social Europeu seria, sem sombra de dúvida, um instrumento valioso para a consecução dos objectivos estabelecidos e para o seguimento das acções empreendidas.

9.6

Todas as instituições deveriam empenhar-se em intensificar as suas políticas de remoção de todo o tipo de obstáculos, tanto nas infra-estruturas de comunicações como nas de alojamento e de prestação de serviços turísticos. As zonas insulares da Europa são um caso exemplar de como a situação geográfica condiciona fortemente a mobilidade e o acesso ao turismo dos cidadãos.

9.7

Por sua vez, o Parlamento Europeu deveria, dada a sua dimensão política, social e económica, adoptar iniciativas para promover o debate e resoluções que dêem alento a este sector específico.

9.8

O CESE é favorável a que o presente parecer seja conhecido, editado e divulgado como «Declaração de Barcelona sobre o Turismo Social na Europa» represente o seu contributo para o Fórum Europeu de Turismo de 2006 e para o Dia Mundial do Turismo do ano em curso.

D.   QUARTA PARTE: REFERÊNCIAS DOCUMENTAIS E TÉCNICAS

As várias noções de Turismo Social: a evolução da oferta e da procura — Comissão Europeia — Direcção-Geral XXIII — Unidade de Turismo, 1993.

Declaração de Montreal: Para uma visão humanista e social do turismo — BITS, Setembro de 1996.

Código Ético Mundial para o Turismo. OMT, Santiago do Chile, 1 de Outubro de 1999.

Actas do seminário: Ajudas para férias na União Europeia, Parlamento Europeu, Estrasburgo, Março de 2000.

Os conceitos de Turismo para Todos e de Turismo Social na União Europeia — BITS, Seminário de Bruges, Junho de 2001. Junho de 2001.

Relatório sobre os resultados do inquérito: Turismo para todos, Junho de 2001.

Parecer «Para um turismo acessível a todas as pessoas e socialmente sustentável» — CESE, Outubro de 2003.

Estudo sobre o Programa de Férias para Idosos do IMSERSO — Espanha, Maio de 2004.

Fórum Europeu de Turismo Social — BITS, Budapeste, Abril de 2005.

Relatório sobre turismo e desenvolvimento — — Parlamento Europeu A6-0173/2005, Maio de 2005.

Relatório sobre as novas perspectivas e os novos desafios de um turismo europeu sustentável — Parlamento Europeu A6-0235/2005, Julho de 2005.

Turismo acessível para todos — Plano de acção do Comité de Representantes de Pessoas com Deficiência (CERMI), Dezembro de 2005.

Consulta sobre as actividades no âmbito do turismo e férias para os trabalhadores — BITS, Bruxelas, Maio de 2005.

Conferência europeia sobre Turismo Social, crescimento económico e emprego — Govern Balear, Palma de Maiorca, Novembro de 2005.

Conferência Turismo para todos: situação actual e práticas correntes na UE — Comissão Europeia — Direcção-Geral empresas, Unidade de Turismo, Janeiro de 2006.

Congresso Mundial do Turismo Social — «Para um turismo de desenvolvimento e solidariedade», Aubagne (França), Maio de 2006.

Bruxelas, 14 de Setembro de 2006

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  As várias noções de Turismo Social: a evolução da oferta e da procura — Direcção-Geral XXIII — Unidade de turismo, 1993.


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