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Document 52010AE1376

    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à protecção das vítimas e que revoga a Decisão-Quadro 2002/629/JAI [COM(2010) 95 final — 2010/0065 (COD)]

    JO C 51 de 17.2.2011, p. 50–54 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    17.2.2011   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 51/50


    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à protecção das vítimas e que revoga a Decisão-Quadro 2002/629/JAI

    [COM(2010) 95 final — 2010/0065 (COD)]

    2011/C 51/10

    Relator: Ionuț SIBIAN

    Em 22 de Julho de 2010, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

    Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à prevenção e luta contra o tráfico de seres humanos e à protecção das vítimas e que revoga a Decisão-Quadro 2002/629/JAI

    COM(2010) 95 final – 2010/0065 (COD).

    Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, que emitiu parecer em 2 de Setembro de 2010.

    Dada a renovação do Comité, a Assembleia decidiu votar o presente parecer na plenária de Outubro e designou Ionuț SIBIAN relator-geral ao abrigo do artigo 20.o do Regimento.

    Na 466.a reunião plenária de 21 de Outubro de 2010, o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por unanimidade, o seguinte parecer:

    1.   Conclusões e recomendações

    1.1

    O CESE apoia o empenho da UE na prevenção e na luta contra do tráfico de seres humanos, assim como na protecção dos direitos das vítimas de tráfico. Congratula-se também com a abordagem global e integrada da directiva proposta.

    1.2

    O tráfico de seres humanos é uma violação séria dos direitos humanos, um crime com várias facetas que têm, todas elas, de ser tidas em consideração. A definição proposta pela directiva abrange vários tipos de vítimas e de exploração, nomeadamente a mendicidade forçada e a exploração de actividades criminosas, que são dois novos domínios abrangidos por este acto legislativo. A definição cobre igualmente o tráfico para efeitos de remoção de órgãos, que constitui uma violação extremamente grave da integridade física e dos direitos humanos. O CESE apoia fortemente esta definição abrangente das infracções relacionadas com o tráfico de seres humanos.

    1.3

    O CESE concorda com a opinião de que as sanções penais para as infracções ligadas ao tráfico devem ser proporcionais à extrema gravidade destes crimes. Assim, recomenda a instauração de penas e sanções mais pesadas, aliadas à confiscação dos bens obtidos graças a actividades ilegais. As investigações financeiras têm de fazer parte das investigações sobre o tráfico de seres humanos. É imperativo harmonizar as penas e sanções entre os Estados-Membros.

    1.4

    Para além da instauração de sanções para os criminosos, outro aspecto da maior importância na luta contra esta enorme violação dos direitos humanos é garantir que as penas são cumpridas logo que proferidas pelo tribunal. O CESE recomenda que nos casos de tráfico de seres humanos não seja possivel comutar a pena ou libertar as pessoas antes de cumprido integralmente o período de prisão fixado na sentença.

    1.5

    O CESE corrobora a opinião de que as vítimas de tráfico estão numa situação vulnerável e devem ser protegidas no decurso do processo judicial contra a vitimização secundária e os traumas adicionais. O CESE recomenda que o artigo 7.o da directiva, que actualmente afirma que «os Estados-Membros devem, de acordo com os princípios de base do seu sistema jurídico, prever a possibilidade de não instaurar processos penais nem aplicar sanções às vítimas […]», seja reformulado, substituindo a palavra «possibilidade» por um termo mais forte, de forma a que a não-instauração de processo penal ou não-aplicação de sanções à vítima se torne a regra e não a excepção.

    1.6

    Tendo em conta a situação especial das vítimas de tráfico, o CESE propõe que lhes seja garantido apoio jurídico gratuito de qualidade a partir do momento em que elas tenham sido reconhecidas como tal.

    1.7

    No caso de menores, a assistência e o apoio deveriam consistir essencialmente no reagrupamento das crianças com as suas famílias, se estas últimas não estiveram envolvidas no tráfico.

    1.8

    Para conseguir a plena integração das vítimas e evitar que elas voltem a ser objecto de tráfico, deveria ser-lhes dado um período de reflexão (1) durante o qual, para além de assistência médica, lhes seria ministrada educação e formação profissional.

    1.9

    O princípio da não-repulsão tem também de ser aplicado no caso do tráfico de seres humanos, evitando que as vítimas sejam repatriadas para o país de origem, se tal constituir uma ameaça à sua vida ou à liberdade.

    1.10

    O CESE partilha da opinião de que de entre as medidas e decisões a tomar em matéria de tráfico de seres humanos se deveria incluir a prevenção. Neste contexto, é necessário um conhecimento e uma análise aprofundados das causas primárias do tráfico, a fim de se poder lutar contra esses factores de forma eficaz e reduzir, assim, a incidência do tráfico de seres humanos.

    1.11

    O tráfico de seres humanos é um problema simultaneamente mundial e local. O CESE crê que as políticas repressivas – acção policial e judicial – só serão eficazes se houver uma vasta cooperação entre ONG, associações patronais, o sector privado, sindicatos e todos os níveis de governo. Tem de ser criado um contexto hostil para os traficantes de seres humanos.

    1.12

    A sociedade civil também desempenha um papel central nos esforços de luta contra o tráfico. O CESE acolhe positivamente o facto de a directiva prever a cooperação com organizações da sociedade civil. É crucial que estas organizações sejam envolvidas em cada fase do processo, desde a identificação das vítimas até à prestação de assistência. As organizações da sociedade civil podem desempenhar um papel-chave na reintegração social de potenciais vítimas e, por conseguinte, produzir um efeito preventivo indirecto e contribuir para a prevenção da vitimização secundária e do envolvimento no tráfico de seres humanos.

    1.13

    O CESE concorda em que há falta de dados comparáveis no que diz respeito ao tráfico de seres humanos. Por conseguinte, é necessário recolher dados de qualidade sobre este fenómeno de forma harmonizada nos Estados-Membros da UE, criando, para o efeito, relatores nacionais.

    1.14

    A designação de relatores nacionais nesta matéria deveria tornar-se sistemática, e a sua tarefa claramente definida. De acordo com a directiva, os Estados-Membros têm direito a estabelecer relatores nacionais ou mecanismos equivalentes. O CESE considera que se deveria mencionar apenas um tipo de instituição e que esse órgão nacional deveria coordenar as políticas e as acções a nível regional e com os outros Estados-Membros, para evitar grandes discrepâncias entre os países da UE.

    1.15

    O CESE anseia por ver acções consistentes, satisfatórias e decisivas como resultado do acordo alcançado pelos Estados-Membros, relativo à designação de um coordenador europeu para a luta contra o tráfico de seres humanos a nível da UE.

    2.   Proposta da Comissão

    A proposta de directiva em apreço baseia-se na Convenção do Conselho da Europa e adopta a mesma abordagem global, que inclui a prevenção, a repressão, a protecção e o acompanhamento das vítimas. Além disso, a proposta comporta os seguintes elementos principais com valor acrescentado:

    Medidas para tornar as penas proporcionais à gravidade dos crimes;

    Uma norma de competência extraterritorial mais abrangente e vinculativa, que obriga os Estados-Membros a introduzirem uma acção judicial contra os nacionais e os residentes habituais que cometeram o crime de tráfico fora do território do Estado-Membro;

    Alargamento do âmbito da disposição relativa à não-aplicação de sanções às vítimas pela sua participação em actividades ilegais, independentemente dos meios ilícitos que tenham sido utilizados pelos traficantes, de acordo com o Protocolo de Palermo;

    Nível mais elevado de assistência às vítimas, em especial no que diz respeito ao tratamento médico, assim como medidas de protecção;

    Protecção assegurada no país de origem se as vítimas forem enviadas para lá;

    Medidas de protecção especiais para crianças, mulheres e outros grupos vulneráveis vítimas do tráfico de seres humanos;

    Além disso, a integração de disposições de teor semelhante no acervo da UE mostra as vantagens decorrentes da existência de obrigações mais fortes na ordem jurídica da UE, nomeadamente a imediata entrada em vigor das medidas e o acompanhamento da sua aplicação.

    3.   Observações na especialidade

    3.1

    O CESE apoia o empenhamento da UE em prevenir e combater o tráfico de seres humanos e proteger os direitos das pessoas objecto de tráfico. O objectivo da proposta de directiva é estabelecer regras mínimas para as sanções a aplicar a crimes de tráfico de seres humanos e intensificar os esforços para impedir este fenómeno e proteger as suas vítimas.

    3.2

    O CESE acolhe favoravelmente a abordagem global e integrada da directiva. Dado que o tráfico de seres humanos é uma forma de escravatura moderna e um negócio altamente rentável para a criminalidade organizada, que está em expansão na Europa (segundo os dados da avaliação efectuada pela Europol em 2009), é fundamental que a UE adopte uma abordagem global neste domínio centrada nos direitos humanos e colocando a tónica nas relações externas, políticas de regresso e reintegração, questões sociais, inclusão social, migração e asilo.

    3.3

    O CESE nota que a directiva tem em conta a evolução recente no fenómeno do tráfico de seres humanos e, por conseguinte, a definição do tráfico de seres humanos está em conformidade com as normas acordadas a nível internacional, tais como as definidas no Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas relativo à Prevenção, à Repressão e à Punição do Tráfico de Pessoas, em especial de Mulheres e Crianças, em complemento à Convenção das Nações Unidas contra a Criminalidade Organizada Transnacional e a Convenção do Conselho da Europa relativa à Luta contra o Tráfico de Seres Humanos.

    3.4

    O preâmbulo da proposta de directiva contém especificações claras relativas à definição do termo «pessoas particularmente vulneráveis». Uma vez que as crianças são mais vulneráveis e correm maior risco de se tornarem vítimas de tráfico, deveria ser dada especial atenção a esta categoria de vítimas. O CESE considera que, em primeiro lugar, devem ser salvaguardados os interesses da criança, tal como estipulado na Convenção da ONU sobre os Direitos da Criança e a Carta dos Direitos Fundamentais da UE.

    3.5

    Não obstante, é importante que a definição de tráfico de seres humanos abranja todos os tipos de vítimas, incluindo mulheres e homens, reconhecendo a possibilidade de estarem numa posição de vulnerabilidade.

    3.6

    Todas as facetas deste crime são tidas em consideração. A definição de tráfico de seres humanos abrange vários tipos de vítimas e de exploração, nomeadamente a mendicidade forçada e a exploração de actividades criminosas, que são dois novos domínios abrangidos pela directiva proposta. A definição cobre igualmente o tráfico para efeitos de remoção de órgãos, uma violação extremamente grave da integridade física e dos direitos humanos. O CESE manifesta o seu forte apoio a esta definição abrangente das infracções relativas ao tráfico de seres humanos.

    3.7

    O CESE considera que os Estados-Membros deveriam integrar nas suas legislações uma definição mais abrangente de tráfico (e além disso, uma terminologia mais ampla em matéria de luta contra o tráfico), a fim de proporcionar um quadro quer permita atacar este fenómeno complexo e em evolução nas suas mais variadas formas. Por exemplo, deveriam também ser tidas em consideração as possíveis formas de criminalidade que recorram à internet e às tecnologias da informação, em geral.

    3.8

    A directiva constitui um importante passo no estabelecimento de níveis claros de penas e sanções. O documento tem como objectivo garantir o nível de sanções entre os Estados-Membros.

    3.9

    O CESE está consciente das dificuldades encontradas no processo de elaboração da directiva, nomeadamente no que diz respeito ao estabelecimento de níveis máximos uniformes para as sanções. No entanto, é importante que as sanções sejam harmonizadas, uma vez que há variações consideráveis entre os Estados-Membros: de três a vinte anos de prisão para infracções básicas e de dez anos a prisão perpétua se houver circunstâncias agravantes. Apesar das diferenças entre os vários sistemas e políticas em matéria penal, o CESE considera que uma política de sanções severas e pesadas e incriminações firmes, é a resposta ao aumento do número destes crimes.

    3.10

    A partir dos dados disponíveis, foi estimado que, todos os anos, várias centenas de milhares de pessoas são vítimas de tráfico para e dentro da UE. Além disso, em 2008, o número de casos de tráfico de seres humanos registados pela Eurojust aumentou mais de 10 % em relação a 2007. Hoje em dia, este tráfico existe de uma ou de outra forma nos 27 Estados-Membros e a incidência deste crime está a aumentar.

    3.11

    O peso das penas e sanções para aqueles que lucram com o tráfico de seres humanos deveria reflectir a gravidade do crime e ter um efeito verdadeiramente dissuasivo. As sanções propostas poderiam muito bem ser revistas, endurecendo as penas, uma vez que cinco anos de prisão, na opinião do CESE, não reflectem realmente a gravidade deste crime. Sanções mais pesadas serviriam melhor os objectivos da directiva em análise. No caso de circunstâncias agravantes, as penas deveriam ser ajustadas em conformidade. A prática de comutar sentenças de prisão devido a bom comportamento ou por ocasião da celebração de festividades nacionais ou outros acontecimentos não se deveria aplicar a esta categoria de crimes.

    3.12

    Assegurar que as penas são cumpridas é outro aspecto que deve ser considerado de importância fundamental pelos Estados-Membros. Dada a gravidade do crime, não deveria ser aceite a prática de comutação das sentenças de prisão e de libertação antes de cumprido integralmente o período fixado na sentença.

    3.13

    Para além das medidas punitivas previstas na directiva em análise, os Estados-Membros deveriam incluir sanções com vista à confiscação de bens, o que assestaria um rude golpe nos interesses económicos que motivam estas actividades (2), à proibição de saída do país e a restrições de certos direitos cívicos e políticos. As investigações sobre o tráfico de seres humanos deveriam igualmente incluir investigações financeiras.

    3.14

    O CESE corrobora a opinião de que as vítimas de tráfico estão numa situação vulnerável e devem ser protegidas contra a vitimização secundária e os traumas adicionais durante o processo judicial. Devem igualmente estar em condições de exercer eficazmente os seus direitos e obter a assistência e o apoio necessários.

    3.15

    O CESE concorda inteiramente em que as vítimas do tráfico de seres humanos devem ser protegidas da acção judicial e da aplicação de sanções devido a actividades criminosas praticadas como consequência de serem objecto de tráfico (por exemplo, utilização de documentos falsos, prostituição, imigração ilegal, etc.). Esta protecção é necessária para evitar uma maior vitimização e para encorajar as vítimas a testemunhar em processos judiciais. O artigo 7.o refere: «Os Estados-Membros devem, de acordo com os princípios de base do seu sistema jurídico, prever a possibilidade de não instaurar processos penais nem aplicar sanções às vítimas…». O CESE recomenda que a palavra «possibilidade» seja substituída por um termo mais forte, de forma a que a não instauração de processo penal ou não aplicação de sanções à vítima se torne a regra e não a excepção.

    3.16

    As vítimas de tráfico deveriam ser protegidas de vitimização secundária e de traumas adicionais durante os processos penais. Por conseguinte, deveria ser dada a possibilidade a todas as vítimas de tráfico de testemunhar atrás de uma tela ou em sala separada, de modo a não serem directamente confrontadas com os traficantes/autores do crime, o que poderia causar stress ou medo.

    3.17

    O CESE considera que qualquer pessoa, a partir do momento que é identificada como vítima de tráfico de seres humanos, deveria beneficiar de assistência jurídica gratuita e de qualidade, que é também do interesse do Estado, na medida em que garante que a vítima obtém a protecção necessária o mais rapidamente possível e assegura a sua participação voluntária em investigações e processos penais.

    3.18

    O CESE considera essencial reafirmar o princípio da não-repulsão, assegurando que as vítimas não são repatriadas para o país de origem, caso isso possa constituir uma ameaça à sua vida ou à liberdade.

    3.19

    O CESE considera que a norma de competência extraterritorial proposta pela directiva poderia criar conflitos de competência no processo penal.

    3.20

    A assistência e o apoio a crianças vítimas de tráfico de seres humanos deveriam consistir essencialmente no reagrupamento familiar das crianças se as famílias não estiveram envolvidas no tráfico.

    3.21

    Para conseguir a plena integração das vítimas e evitar que elas voltem a ser objecto de tráfico, deveria ser-lhes dado um período de reflexão (3) durante o qual, para além de assistência médica, lhes seria ministrada educação e formação profissional. O período de reflexão deveria ser concedido independentemente de as vítimas testemunharem contra os infractores e independentemente do regresso voluntário ao seu país de origem.

    3.22

    O CESE partilha da opinião de que de entre as medidas e decisões a tomar em matéria de tráfico de seres humanos se deveria incluir a prevenção, a protecção e a assistência às vítimas, bem como uma cooperação mais estreita entre todas as partes interessadas.

    3.23

    Os Estados-Membros deveriam ter em consideração as causas que estão na origem do tráfico, nomeadamente a pobreza e as disparidades na legislação dos diferentes países. Distribuição desequilibrada da riqueza, défice na educação, discriminação, má governação, taxas de desemprego elevadas, sistemas de aplicação da lei ineficientes, conflitos armados e corrupção criam um ambiente favorável ao tráfico de seres humanos. A luta contra estes factores deveria contribuir igualmente para a redução do tráfico de seres humanos.

    3.24

    Apesar de a directiva definir «pessoa colectiva» como uma pessoa que pode ser considerada responsável por infracções penais referentes ao tráfico de seres humanos (excluindo os Estados ou organismos públicos no exercício da autoridade do Estado), é importante que os Estados tomem todas as medidas necessárias para identificar e erradicar a participação ou a cumplicidade do sector público neste tráfico. Os funcionários públicos envolvidos em tais actividades ilegais ou criminosas deveriam ser processados e condenados sem qualquer excepção.

    3.25

    Os Estados-Membros devem ter em conta que este tráfico também se rege pela lei da oferta e da procura. A este respeito, deveriam ser tomadas medidas para diminuir a procura e assim ajudar a reduzir o tráfico existente. Se os Estados-Membros adoptassem medidas apropriadas para desencorajar a procura que estimula todas as formas de exploração e tomassem igualmente precauções para minimizar o risco de as pessoas se tornarem vítimas de tráfico, seria dado um enorme passo em frente para a redução da ocorrência deste crime.

    3.26

    O tráfico de seres humanos é um problema simultaneamente mundial e local. O CESE crê que as políticas repressivas – acção policial e judicial – só serão eficazes se houver uma vasta cooperação entre ONG, associações patronais, o sector privado, sindicatos e todos os níveis de governo. Tem de ser criado um contexto hostil para os traficantes de seres humanos.

    3.27

    De acordo com a proposta de directiva, as medidas que os Estados-Membros devem tomar consistem em campanhas de informação e sensibilização, programas de investigação e educação, se necessário em colaboração com organizações da sociedade civil, com vista à diminuição do risco de pessoas, nomeadamente crianças, se tornarem vítimas do tráfico de seres humanos. O CESE considera que campanhas isoladas não são suficientemente eficientes e propõe campanhas de educação contínuas a nível europeu.

    3.28

    O CESE acolhe positivamente o facto de a proposta de directiva prever a cooperação com organizações da sociedade civil. É crucial que estas organizações sejam envolvidas em cada fase do processo, desde a identificação das vítimas até à prestação de assistência.

    3.29

    As organizações da sociedade civil podem desempenhar um papel-chave na reintegração social de potenciais vítimas e, por conseguinte, produzir um efeito preventivo indirecto e contribuir para a prevenção da vitimização secundária e da participação no tráfico de seres humanos. Os Estados-Membros deveriam cooperar estreitamente com as ONG para dar assistência. Em cooperação com elas, os Estados-Membros poderiam apoiar o desenvolvimento de linhas telefónicas de assistência directa e outros recursos informativos para grupos em risco, vítimas de tráfico e as suas famílias.

    3.30

    O CESE sublinha que a Comissão Europeia (4) lançou um convite à apresentação de propostas no âmbito de um programa específico designado «Prevenir e combater a criminalidade», que fazia parte de um programa geral sobre «Segurança e protecção das liberdades». O objectivo é intensificar a política da UE de luta contra o tráfico, o que deveria contribuir para melhorar as medidas não legislativas de combate ao tráfico de seres humanos. A este respeito, as prioridades estabelecidas para 2010 incluem: prevenção, protecção das vítimas, acusação e investigação dos infractores, mecanismos de coordenação e cooperação, assim como a compilação de dados fiáveis. Este programa disponibiliza 4 milhões de euros e prevê o financiamento de 12 projectos. É um bom início, mas as ONG necessitam de muito apoio na luta contra o tráfico de seres humanos e os Estados-Membros deveriam assumir o compromisso de apoiar as organizações da sociedade civil nesta tarefa.

    3.31

    O CESE considera que a auto-regulação (por exemplo através de códigos de conduta), as práticas de comércio justo e a gestão da cadeia de abastecimento introduzidas nas empresas poderiam garantir que as vítimas de tráfico não seriam forçadas a trabalhar e não estariam, por conseguinte, envolvidas na produção de bens e serviços das empresas. A elaboração de orientações sobre boas práticas no recrutamento de trabalhadores migrantes e o estabelecimento de uma cooperação bilateral entre os países de origem e de acolhimento para monitorizar as condições de recrutamento e de trabalho dos trabalhadores migrantes são igualmente métodos muito bem-vindos para impedir este fenómeno.

    3.32

    Dado que as medidas para lutar contra o tráfico não se podem limitar à adopção de instrumentos legislativos, sendo necessária a aplicação de medidas suplementares não legislativas, como a compilação e a transmissão de dados, a cooperação, o desenvolvimento de parcerias e o intercâmbio das melhores práticas, o CESE gostaria de sublinhar a necessidade de uma abordagem única e coerente a nível europeu.

    3.33

    O CESE concorda em que há falta de dados comparáveis no que diz respeito ao tráfico de seres humanos. Por conseguinte, é necessário recolher dados de qualidade sobre este fenómeno de forma harmonizada nos Estados-Membros da UE, criando, para o efeito, relatores nacionais.

    3.34

    A designação de relatores nacionais nesta matéria deveria tornar-se sistemática, e a sua tarefa claramente definida. De acordo com a directiva, os Estados-Membros têm direito a estabelecer relatores nacionais ou mecanismos equivalentes. O CESE considera que se deveria mencionar apenas um tipo de instituição e que esse órgão nacional deveria coordenar as políticas e as acções a nível regional e com os outros Estados-Membros, para evitar grandes discrepâncias entre os países da UE.

    3.35

    Apesar de o tráfico de seres humanos fazer parte de muitos acordos entre a União Europeia e países terceiros (por exemplo, da Parceria Estratégica África-UE e da Parceria Oriental) e ser igualmente uma das prioridades dos Acordos de Estabilização e Associação realizados entre a União Europeia e os Balcãs Ocidentais, o CESE considera que a luta contra o tráfico de seres humanos se deveria tornar numa das tarefas prioritárias destes acordos. Dever-se-ia promover activamente a criação de acordos semelhantes entre a UE e outros países.

    3.36

    O CESE espera que do acordo alcançado pelos Estados-Membros relativo à designação de um coordenador europeu para a luta contra o tráfico de seres humanos a nível da UE resultem medidas coerentes, satisfatórias e determinantes.

    Bruxelas, 21 de Outubro de 2010

    O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

    Staffan NILSSON


    (1)  Este período de reflexão poderia ser de pelo menos seis meses como na Noruega.

    (2)  O relatório da Europol publicado em 2009 sobre o tráfico de seres humanos na União Europeia mostra que se trata de uma actividade que rende muitos milhões de euros por ano.

    (3)  Este período de reflexão poderia ser de pelo menos seis meses como na Noruega.

    (4)  Direcção-Geral Justiça, Liberdade e Segurança, Direcção F: Segurança, Unidade F4: Apoio Financeiro – Segurança.


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