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Document 52015AE3940

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de Ação da UE contra o tráfico de migrantes (2015-2020)» [COM(2015) 285 final]

JO C 71 de 24.2.2016, p. 75–81 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

24.2.2016   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 71/75


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de Ação da UE contra o tráfico de migrantes (2015-2020)»

[COM(2015) 285 final]

(2016/C 071/12)

Relatora:

Brenda KING

Em 6 de julho de 2015, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Plano de Ação da UE contra o tráfico  (1) de migrantes (2015-2020)

[COM(2015) 285 final].

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Relações Externas, que emitiu parecer em 12 de novembro de 2015.

Na 512.a reunião plenária de 9 e 10 de dezembro de 2015 (sessão de 10 de dezembro), o Comité Económico e Social Europeu adotou por 176 votos a favor, três votos contra e cinco abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O Comité Económico e Social Europeu (CESE) acolhe favoravelmente os objetivos declarados do Plano de Ação da UE contra o tráfico de migrantes (2), a saber, «combater e prevenir o tráfico de migrantes, garantindo simultaneamente a proteção dos seus direitos humanos» e «encontrar uma solução para as causas profundas da migração irregular». O CESE recorda que os refugiados beneficiam de um estatuto especial, conferido pela Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados, de 1951.

1.2.

O CESE apoia os esforços do plano de ação no sentido de desmantelar redes de crime organizado através de investigações financeiras e baseadas nos serviços de informação, pôr fim ao branqueamento de capitais e confiscar os ativos com origem em atividades ilícitas; no entanto, recomenda veementemente que o plano adote uma abordagem mais equilibrada e abrangente, descrevendo em pormenor de que forma a UE pretende proteger e dar assistência às pessoas que são introduzidas clandestinamente.

1.3.

Partindo da afirmação feita na comunicação da Comissão Europeia de que «as redes de tráfico podem ser enfraquecidas se menos pessoas recorrerem aos seus serviços», o CESE recorda a declaração do Gabinete da ONU para a Droga e a Criminalidade de que «atualmente, para as pessoas que vivem em países empobrecidos ou zonas afetadas por conflitos armados e instabilidade política, é difícil, mas não impossível, obter um visto para o espaço Schengen. Os indivíduos e os grupos cujo único objetivo é o lucro aproveitaram-se desta situação e criaram negócios rentáveis para dar resposta à procura para a passagem das fronteiras (3).» Por conseguinte, o CESE recomenda que sejam tomadas medidas preventivas atendendo ao apelo que o secretário-geral das Nações Unidas lançou à UE para «considerar a hipótese de aumentar as vias seguras de entrada legal na Europa destinadas a [refugiados e migrantes], para que não sejam deixados nas mãos de redes criminosas nem embarquem em viagens perigosas». Estas declarações refletem a recomendação repetida em muitos pareceres do CESE em matéria de migração.

1.4.

O CESE concorda que é necessário assegurar a aplicação dos princípios da solidariedade e da partilha de responsabilidades para que haja uma distribuição mais equilibrada dos requerimentos de asilo entre os Estados-Membros. A Convenção de Dublim teria de ser adaptada para refletir este sistema mais inclusivo e proteger o Acordo de Schengen.

1.5.

Por conseguinte, o CESE subscreve a declaração do presidente da Comissão, Jean-Claude Juncker, que alertou os Estados-Membros para não pretextarem a crise dos migrantes para atenuar as disposições do Acordo de Schengen (4). O CESE solicita à Comissão que acompanhe atentamente o desenrolar da situação e assegure um rápido regresso à normalidade.

1.6.

O CESE recomenda igualmente que o Gabinete Europeu de Apoio em matéria de Asilo (GEAA) seja dotado de mais poderes para efetuar os seus trabalhos, com particular incidência nas suas atividades operacionais de apoio e nas equipas de apoio conjunto ao asilo nos Estados-Membros que necessitam de apoio especial ou de emergência. É essencial que a União Europeia assegure uma utilização mais harmonizada, coerente, independente e flexível de vistos humanitários pelos Estados-Membros, de acordo com o previsto no Código Comunitário de Vistos.

1.7.

O CESE congratula-se com a mais recente proposta da Comissão de «abordar a dimensão externa da crise dos refugiados» (5), incluindo o lançamento do Fundo Fiduciário de Emergência da União Europeia em favor de África. Esta última proposta parece reconhecer que o combate às causas profundas da migração não pode limitar-se aos assuntos internos e à segurança e afeta igualmente outros domínios políticos, como o comércio, o desenvolvimento, a política externa e a integração. Além disso, está em consonância com o princípio da coerência das políticas da UE em matéria de cooperação internacional para o desenvolvimento.

1.8.

O CESE recomenda que, para dar resposta às causas socioeconómicas profundas do contrabando de migrantes, a Agenda para o Desenvolvimento Sustentável seja utilizada como uma solução de longo prazo. O CESE gostaria de relembrar aos Estados-Membros o compromisso que assumiram de afetar 0,7 % do seu rendimento nacional bruto (RNB) à ajuda ao desenvolvimento. Em muitos casos, este compromisso não está a ser cumprido e alguns dos Estados-Membros estão inclusivamente a reduzir a sua ajuda pública ao desenvolvimento.

1.9.

Tendo em conta os desafios que um crescimento lento, do envelhecimento e da diminuição da população e da escassez de mão de obra representam para a Europa, é igualmente importante estabelecer uma ligação entre as políticas de migração da UE e as políticas de migração laboral e de integração no âmbito do mercado de trabalho europeu, à luz dos muitos dados que descrevem a migração como um fator crucial de recuperação económica e desenvolvimento na Europa.

1.10.

O CESE concorda que a política de retorno da UE precisa de ser melhorada e relembra à Comissão as muitas recomendações que fez para que os direitos humanos dos requerentes de asilo fossem respeitados em todas as ocasiões.

1.11.

O presente parecer exorta os representantes das instituições da UE e os governos nacionais a terem em conta o papel fundamental dos parceiros sociais e da sociedade civil organizada em dotar as políticas europeias de migração de uma dimensão social e de valor acrescentado.

1.12.

O CESE também solicita que seja dada mais atenção ao financiamento sistemático das organizações da sociedade civil que estão a prestar uma assistência crucial aos migrantes que procuram segurança e a apoiar esforços de integração, compensando assim, muitas vezes, a falta de capacidade das instituições. O CESE é favorável ao reconhecimento do papel das organizações da sociedade civil na compreensão das questões relacionadas com o contrabando de migrantes e enquanto intermediárias na assistência a pessoas em situações a que nem os Estados nem a UE conseguem fazer face.

2.   Contexto

2.1.

A Agenda Europeia da Migração (6), adotada em 13 de maio de 2015, define as medidas a tomar imediatamente pela Comissão para dar resposta à situação de crise no Mediterrâneo e identifica a luta contra o contrabando de migrantes como uma prioridade, a fim de «evitar que os migrantes sejam explorados por redes criminosas, podendo também servir como um desincentivo à migração irregular».

2.2.

Desde a adoção da Agenda, a rápida evolução da situação, com a chegada de um elevado número de requerentes de asilo, criou uma conjuntura excecional que levou a Comissão Europeia a tomar medidas decisivas e a apresentar, em 9 de setembro de 2015, um pacote alargado de propostas para dar resposta à crise dos refugiados.

2.3.

A razão subjacente à proposta (7) da Comissão prende-se com o facto de a situação migratória no Mediterrâneo Central e Oriental se ter agravado. Segundo a Frontex, entre 1 de janeiro e 30 de agosto de 2015, as rotas do Mediterrâneo Central e Oriental e a rota dos Balcãs Ocidentais foram as principais áreas de travessia irregular da fronteira da UE, representando 99 % do total de passagens irregulares das fronteiras da UE. A agência Frontex revela também que a rota dos Balcãs Ocidentais representa mais de 30 % do total de passagens irregulares das fronteiras em 2015. Isto traduz-se num fluxo de aproximadamente 500 000 requerentes de asilo, colocando sob uma enorme pressão os Estados-Membros situados nas fronteiras da UE (8). A maioria dos migrantes que chegam através da rota do Mediterrâneo Central provém da Síria e da Eritreia, duas nacionalidades que, segundo dados do Eurostat, têm uma taxa de reconhecimento de asilo superior a 75 %. Do mesmo modo, a maior parte dos migrantes que chegam pela rota do Mediterrâneo Oriental e dos Balcãs Ocidentais é originária da Síria e do Afeganistão. Isso está em consonância com a declaração do Gabinete da ONU para a Droga e a Criminalidade de que mais de 80 % das pessoas que chegaram à Europa por mar este ano são originárias dos dez países de onde partem mais refugiados (9).

2.4.

Segundo o Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), havia 4 185 302 refugiados sírios registados em 4 de outubro de 2015. Este valor inclui 2,1 milhões de sírios registados pelo Egito, Iraque, Jordânia e Líbano, 1,9 milhões de sírios registados pelo Governo turco, assim como mais de 26 700 refugiados sírios registados no norte de África (10).

2.5.

Tendo em conta que o conflito sírio dura há quase cinco anos, um estudo do ACNUR revela uma deterioração rápida das condições de vida dos refugiados sírios na Jordânia, sendo que muitas destas pessoas resvalaram para níveis de pobreza extrema devido à magnitude da crise e à insuficiência de apoio por parte da comunidade internacional, com apenas 37 % de financiamento conseguido em relação ao apelo feito pelo ACNHR para apoiar a Síria. O ACNUR afirma que, enquanto não houver dinheiro suficiente para reforçar as infraestruturas dos países (vizinhos da UE) de acolhimento e melhorar a vida e as perspetivas das populações de refugiados, as pessoas continuarão a deixar os seus países em direção à Europa. Embora a grande maioria dos refugiados seja demasiado pobre para sair dos campos de refugiados, os que podem estão a procurar os serviços de passadores.

2.6.

Na sua proposta de decisão do Conselho, de 9 de setembro de 2015 (11), a Comissão afirma que continuará a acompanhar a evolução dos fluxos migratórios, incluindo a situação no leste da Ucrânia, caso venha a deteriorar-se ainda mais.

2.7.

Esta crise de refugiados excecional decorre ao mesmo tempo que a situação económica na UE está a afetar a capacidade e a disponibilidade de alguns Estados-Membros, especialmente os Estados fronteiriços, de prestarem serviços humanitários, em conformidade com a Convenção de Genebra (12). As medidas de austeridade também atingiram as organizações da sociedade civil que prestam serviços aos requerentes de asilo. Alguns Estados-Membros reagiram reforçando os controlos nas fronteiras, ao passo que outros introduziram leis para deter e penalizar os que atravessam as fronteiras do espaço Schengen para pedir asilo.

3.   Observações na generalidade

3.1.

O CESE pretende reforçar a sua mensagem, dirigida a todos os órgãos de decisão, de que a UE deve agir como uma verdadeira União, adotando, respeitando e aplicando regras comuns. A nova fase da política europeia de imigração deve seguir uma abordagem estratégica, ter uma visão de médio e longo prazo e procurar facultar, de forma global e abrangente, canais legais de admissão abertos e flexíveis (13). Face à atual crise, será necessária uma abordagem comum em matéria de gestão das fronteiras externas que habilite a Comissão e as agências europeias a realizarem tarefas operacionais com o nível adequado de financiamento.

3.2.

O CESE deseja contribuir com propostas estratégicas baseada nos pareceres que emitiu anteriormente sobre questões relacionadas com a migração (14). Os parceiros sociais e os representantes da sociedade civil organizada e do diálogo social devem estar presentes em todo o processo de debate que precede a fase seguinte da política europeia de migração. A «dimensão social» é fundamental para garantir o valor acrescentado e determinar a proporcionalidade e o impacto destas políticas.

3.3.

O CESE considera que a situação demográfica e o envelhecimento da população e dos mercados de trabalho nos Estados-Membros devem ser tidos em consideração neste contexto. No seu parecer exploratório de 2011 (15) sobre «O papel da imigração legal no contexto demográfico» da Europa, o CESE sublinhou que a imigração de trabalhadores e das respetivas famílias provenientes de países terceiros deverá aumentar. A UE carece de uma legislação aberta e flexível que permita a migração de trabalhadores através de canais legais e transparentes, tanto para trabalhadores altamente qualificados ou que possuam uma formação de nível médio como para trabalhadores menos qualificados, desde que os Estados-Membros continuem a ter liberdade para determinar os seus volumes de admissão. Importa, ao mesmo tempo, reconhecer que a imigração não é a única forma de dar resposta à escassez de mão de obra no mercado de trabalho, e que os Estados-Membros podem contemplar outras soluções mais adequadas.

3.4.

O CESE recomenda vivamente a revisão do Regulamento de Dublim, visto que o Tribunal de Justiça da União Europeia e o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem assinalaram que há uma deficiência inerente neste regulamento. Ao associar a responsabilidade de analisar o estatuto de refugiado à entrada inicial, os Estados fronteiriços da UE ficaram sobrecarregados.

3.5.

O CESE está extremamente preocupado com as atuais tentativas de limitar o Acordo de Schengen, que é um dos êxitos fundamentais que mais beneficiam os cidadãos da UE. Lamenta a decisão dos Estados-Membros que reintroduziram ou pretendem reintroduzir controlos nas fronteiras no interior do espaço Schengen e solicita à Comissão que acompanhe atentamente a evolução dos acontecimentos e assegure o rápido regresso à normalidade.

3.6.

A comunicação afirma que o plano de ação deve ser encarado no contexto mais amplo dos esforços da UE no sentido de encontrar uma solução para as causas profundas da migração irregular e, na frase seguinte, fala da operação para identificar, capturar e destruir as embarcações utilizadas pelos passadores. O CESE discorda veementemente de que o acesso a uma embarcação seja uma causa profunda da migração irregular. Pelo contrário, colocar exageradamente a ênfase no confisco das embarcações só vai exacerbar ainda mais os riscos para os migrantes introduzidos clandestinamente, uma vez que os passadores começarão a utilizar embarcações mais baratas e mais perigosas.

3.7.

O CESE recomenda que as ineficiências das políticas de ajuda ao desenvolvimento para os países de origem dos migrantes sejam resolvidas e os Estados-Membros da UE têm de reassumir o compromisso de consagrar 0,7 % do rendimento nacional bruto à ajuda ao desenvolvimento, conforme prometido. Além disso, a UE deve assegurar que outras políticas pertinentes, como o comércio internacional, a agricultura, a energia e a política externa, tenham efeitos positivos na estabilidade social e económica e no desenvolvimento dos países de origem, em consonância com o princípio da coerência das políticas da UE em matéria de cooperação internacional para o desenvolvimento.

3.8.

O CESE reconhece que a ajuda proveniente dos Estados-Membros e a assistência da UE só podem alcançar os seus objetivos numa sociedade segura, livre de guerras e sem problemas de segurança graves. Por conseguinte, é importante que a comunidade internacional implemente os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável adotados pelos líderes mundiais na cimeira das Nações Unidas de setembro de 2015. Estes objetivos consistem, nomeadamente, em erradicar a pobreza, capacitar todas as raparigas e mulheres, reduzir as desigualdades dentro dos países e entre eles, promover um crescimento sustentado, inclusivo e sustentável e trabalho digno para todos, bem como fomentar sociedades pacíficas e inclusivas.

4.   Observações na especialidade

4.1.

O CESE congratula-se com os objetivos declarados da comunicação da Comissão relativa ao Plano de Ação da UE contra o tráfico de migrantes, mas recomenda vivamente que este plano adote uma abordagem mais equilibrada e abrangente caso pretenda ver os seus objetivos alcançados. O CESE observa que não foram dadas quaisquer indicações relativamente à forma como a UE pretende proteger e prestar assistência às pessoas introduzidas clandestinamente, nem foi feita referência específica ao papel positivo da migração no mercado de trabalho e no desenvolvimento económico da Europa.

4.2.

O CESE observa que, embora se faça uma distinção entre a introdução clandestina de migrantes e o tráfico de seres humanos, não é feita qualquer distinção entre migrantes e requerentes de asilo. Esta distinção é importante pois, tal como o secretário-geral das Nações Unidas relembrou aos decisores políticos europeus, «a grande maioria das pessoas que fazem estas viagens penosas e perigosas são refugiados que fogem de países como a Síria, o Iraque e o Afeganistão. O direito internacional estipulou, e os países já reconheceram há muito, o direito dos refugiados a proteção e asilo. Ao analisarem os pedidos de asilo, os países não podem fazer distinções baseadas na religião ou noutra identidade, nem podem forçar as pessoas a regressar aos locais de onde fugiram se existir um receio bem fundamentado de perseguição ou ataque. Não se trata apenas de uma questão de direito internacional, trata-se do nosso dever enquanto seres humanos.» E acrescentou: «Faço um apelo a todos os governos implicados para que encontrem soluções abrangentes, aumentem as vias seguras e legais de migração e ajam com humanidade, compaixão e em conformidade com as suas obrigações internacionais (16).» O CESE recomenda que todas as pessoas que fazem a perigosa viagem até à Europa sejam tratadas como refugiados em conformidade com a Convenção de Genebra de 1951 e o seu Protocolo de 1967, até prova em contrário.

4.3.   Reforçar as respostas policiais e judiciárias

4.3.1.

O CESE recomenda que a adoção de uma abordagem mais abrangente para combater a introdução clandestina de migrantes passe por dar aos requerentes de asilo acesso a vias legais e seguras de migração. Esta abordagem, combinada com o desmantelamento de redes de crime organizado através de investigações financeiras e baseadas nos serviços de informações, será uma medida mais eficaz, mais humana e mais eficiente em termos de custos.

4.3.2.

O CESE recomenda vivamente que os decisores políticos da UE se rejam pelo princípio da não maleficência e considerem as consequências, tanto previstas e imprevistas, das suas intervenções. A decisão da UE de passar da operação Mare Nostrum (que incide na busca e salvamento) para a operação Triton (centrada no controlo das fronteiras) não reduziu o número de pessoas que embarcam em viagens perigosas para chegar à Europa. Contudo, esta decisão contribuiu para um aumento dramático do número de mortes no Mediterrâneo. Em 31 de maio de 2015, já tinham morrido 1 865 pessoas a tentar atravessar o Mediterrâneo, em comparação com as 425 que morreram no mesmo período em 2014 (17). Esta decisão também explica a mudança dos fluxos de migração por via terrestre pelos Balcãs Ocidentais para a Hungria. Pessoas entrevistadas em ambos os lados da fronteira húngara declararam que tinham escolhido a rota dos Balcãs por ser mais barata e recomendada pelos passadores.

4.3.3.

O CESE faz notar que os passadores conseguem adaptar-se às decisões políticas da UE, como o reforço do patrulhamento das fronteiras no mar Mediterrâneo e a destruição das embarcações. A abordagem da UE de «guerra contra os passadores» teve o resultado indesejado de caos nas fronteiras da UE, perda de vidas nas estradas da Europa e no mar e tensões entre os Estados-Membros.

4.4.   Reforçar a prevenção do contrabando e a assistência a migrantes vulneráveis

4.4.1.

O CESE concorda que a Comissão precisa de reforçar a prevenção do contrabando de pessoas e dar assistência aos migrantes vulneráveis; no entanto, é necessário que tudo seja feito de forma coerente, tendo como primeira prioridade salvar vidas.

4.4.2.

Segundo dados da Frontex, 70 % das pessoas que recorrem a passadores para atravessar as fronteiras da UE são nacionais da Síria, da Eritreia e do Iraque. Com base nos dados do Eurostat, no que se refere a estas nacionalidades, a taxa de reconhecimento de asilo da UE é igual ou superior a 75 %. Dado que estas pessoas e famílias estão em fuga por temerem perseguições ou ataques, qualquer campanha nos meios de comunicação social sobre os riscos do contrabando será inútil.

4.4.3.

O CESE relembra à Comissão que já existem instrumentos para contrariar a contratação de migrantes irregulares a nível nacional. A proposta da Comissão de utilizar recursos limitados para visar setores económicos específicos a nível da UE será dispendiosa e ineficaz.

4.4.4.

O CESE saúda a declaração do plano de ação de «dar assistência e proteção aos migrantes introduzidos clandestinamente, em especial aos grupos vulneráveis como as mulheres e as crianças». Contudo, o CESE observa que, além desta declaração, o plano de ação não refere exatamente o que pretende fazer. Trata-se de algo importante, dado que uma grande parte dos que procuram proteção na Europa são crianças não acompanhadas e separadas dos pais. Só em Itália, na Hungria e em Malta verificou-se, nos primeiros nove meses de 2015, a chegada de cerca de 19 000 crianças não acompanhadas e separadas dos pais. Alguns Estados-Membros situados nas fronteiras da UE não cumprem totalmente as normas internacionais, na medida em que apresentam más condições de receção, procedimentos ineficientes de determinação do estatuto, baixas taxas de reconhecimento, bem como falta de acesso a soluções duradouras no que diz respeito a saneamento e habitação. É necessário que o plano de ação indique exatamente de que forma irá ajudar os Estados-Membros com os recursos necessários para cumprirem as respetivas obrigações e responsabilidades nos termos do direito humanitário internacional e do direito internacional em matéria de direitos humanos e, especialmente, em consonância com a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança (18).

4.4.5.

O CESE entende que a forma mais eficaz de prestar assistência, enfraquecendo ao mesmo tempo as redes de passadores, é limitar o número de pessoas que procuram os seus serviços, fornecendo vias alternativas e legais de viajar para a Europa a partir de países terceiros nas regiões vizinhas da Europa. Deste modo, serão salvaguardados os direitos fundamentais previstos na Carta dos Direitos Fundamentais da UE.

4.4.6.

O CESE reitera que é crucial fazer a distinção entre aqueles que introduzem clandestinamente os migrantes tendo em vista o lucro e aqueles que ajudam os migrantes. Milhares de cidadãos europeus já lhes forneceram transporte e refúgio a custo zero, normal ou reduzido. A ajuda humanitária e a solidariedade devem ser incentivadas, e não penalizadas, no âmbito da agenda da UE contra o contrabando de migrantes.

4.4.7.

O CESE concorda que a eficácia da política de retorno da UE precisa de ser melhorada e aproveita a oportunidade para relembrar à Comissão as muitas recomendações que fez para que os direitos humanos dos requerentes de asilo fossem sempre respeitados, seja na altura em que são resgatados ou acolhidos, seja enquanto os seus pedidos estão a ser avaliados para determinar se necessitam do estatuto de proteção ou se estão em situação irregular. O repatriamento de migrantes deve ser feito em conformidade com as normas em vigor, que garantem que ninguém pode ser afastado, expulso ou extraditado para um Estado onde corra sério risco de ser sujeito à pena de morte, à tortura ou a outros tratos ou penas desumanos ou degradantes — o princípio da não repulsão. O CESE reitera a sua posição contra o retorno de menores não acompanhados, de indivíduos a necessitar de cuidados médicos e de grávidas.

4.5.   Aumentar a cooperação com países terceiros

4.5.1.

O CESE apoia firmemente uma cooperação estreita com os países terceiros ao longo de toda a rota do contrabando. Embora concorde que a tónica deve ser colocada no apoio à gestão das fronteiras, o Comité também considera que é neste domínio que a cooperação da UE e a coordenação entre a rede de agentes de ligação da imigração, os agentes europeus da migração e os representantes diplomáticos dos Estados-Membros deve ser uma prioridade fundamental.

4.5.2.

O objetivo desta coordenação deve ser a aplicação de processos acordados pelas instituições da UE — Comissão Europeia, Serviço Europeu para a Ação Externa (SEAE) e Estados-Membros — para permitir que os pedidos de vistos humanitários e de asilo sejam feitos nos países de origem ou num país vizinho seguro, proporcionando uma via alternativa, humana e legal de viagem para a Europa. Poderiam ser criados centros de registo em países vizinhos, como a Turquia, o Líbano, a Jordânia e a Líbia, onde seja possível avaliar os pedidos e conceder um visto humanitário a quem cumpra a taxa de reconhecimento de asilo da UE, como é atualmente o caso no Brasil. Importa igualmente fomentar o diálogo e associar as organizações da sociedade civil que estão em contacto direto com os refugiados nestas ações, com vista a assegurar a proteção dos direitos humanos e também uma maior eficiência no tratamento dos requerimentos.

4.5.3.

Estes vistos humanitários têm a vantagem de reduzir a pressão sobre os Estados fronteiriços da UE, garantindo que os requerentes de asilo são tratados em conformidade com a Carta dos Direitos Fundamentais da UE e a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, e de transformar o contrabando de migrantes numa operação de elevado risco e de lucro reduzido. O direito de permanência poderia ser temporário, dependendo de quão seguro é o regresso ao país de origem ou em função do mercado de trabalho, tendo em conta a escassez de mão de obra qualificada e os desafios demográficos que afetam o crescimento na Europa.

Bruxelas, 10 de dezembro de 2015.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  N.d.T.: A comunicação da Comissão utiliza o termo «tráfico de migrantes» para o título do plano de ação; este termo é reproduzido no presente parecer sempre que é feita referência ao título da comunicação ou que são citadas passagens da comunicação. No entanto, foi decidido, a nível interinstitucional, fazer uma distinção entre o «tráfico de migrantes (ou de seres humanos em geral)», em que os migrantes são vítimas inocentes dos traficantes e não atravessam necessariamente fronteiras internacionais, e o «contrabando de migrantes» (alternativamente: «introdução clandestina de migrantes»), em que os migrantes solicitam voluntariamente o auxílio de passadores para atravessarem fronteiras internacionais. É a este último conceito que a comunicação se refere, e é por isso que em todos os outros casos se utiliza no parecer o termo «contrabando de migrantes».

(2)  COM(2015) 285 final.

(3)  Martina Hanke, representante do Gabinete da ONU para a Droga e a Criminalidade. Discurso proferido durante a audição pública do CESE sobre o contrabando de migrantes, Bruxelas, 12 de outubro de 2015.

(4)  http://ec.europa.eu/commission/2014-2019/president/announcements/call-collective-courage_en

(5)  «Crise dos refugiados: Comissão Europeia toma medidas decisivas», Estrasburgo, 9 de setembro de 2015.

(6)  COM(2015) 240 final.

(7)  COM(2015) 451 final.

(8)  COM(2015) 451 final.

(9)  Martina Hanke, representante do Gabinete da ONU para a Droga e a Criminalidade. Discurso proferido durante a audição pública do CESE sobre o contrabando de migrantes, Bruxelas, 12 de outubro de 2015.

(10)  http://data.unhcr.org

(11)  Comunicado de imprensa intitulado «Crise dos refugiados: Comissão Europeia toma medidas decisivas» (http://europa.eu/rapid/press-release_IP-15-5596_pt.htm).

(12)  http://www.unhcr.org/

(13)  Parecer exploratório do CESE sobre «As políticas europeias de imigração», relator-geral: Giuseppe Iuliano (JO C 458 de 19.12.2014, p. 7).

(14)  CESE, Immigration: Integration and Fundamental Rights [Imigração: Integração e Direitos Fundamentais], 2012 (http://www.eesc.europa.eu/resources/docs/qe-30-12-822-en-c.pdf).

(15)  Parecer exploratório do CESE sobre «O papel da imigração legal no contexto do desafio demográfico», relator: Luis Miguel Pariza Castaños (JO C 48 de 15.2.2011, p. 6).

(16)  Declaração, Nova Iorque, 28 de agosto de 2015.

(17)  Dados da Organização Internacional para as Migrações (disponíveis em: http://missingmigrants.iom.int/incidents). Migration Read All About It, Mediterranean Update: 101 900 migrant arrivals in Europe in 2015 [Últimas da Migração, Atualização sobre o Mediterrâneo: chegaram 101 900 migrantes à Europa em 2015] (disponível em: http://weblog.iom.int/mediterranean-flash-report-0) (ambos consultados em 10 de junho de 2015).

(18)  http://www.ohchr.org/Documents/ProfessionalInterest/crc.pdf


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