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Document 52008AE1503

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Uma iniciativa europeia para o desenvolvimento do microcrédito em prol do crescimento e do emprego COM(2007) 708 final/2

JO C 77 de 31.3.2009, p. 23–28 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

31.3.2009   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 77/23


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Uma iniciativa europeia para o desenvolvimento do microcrédito em prol do crescimento e do emprego»

COM(2007) 708 final/2

(2009/C 77/04)

Em 13 de Novembro de 2007, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 262.o do Tratado que institui a Comunidade Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

«Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social e ao Comité das Regiões: Uma iniciativa europeia para o desenvolvimento do microcrédito em prol do crescimento e do emprego»

Em 15 de Julho de 2008, a Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo, encarregada de preparar os correspondentes trabalhos, emitiu parecer com base no projecto do relator A. PEZZINI.

Na 447.a reunião plenária de 17 e 18 de Setembro de 2008 (sessão de 18 de Setembro), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por unanimidade, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité acolhe favoravelmente as iniciativas da Comissão propícias à criação e ao crescimento das microempresas, à consolidação e à promoção do espírito empresarial, com o fito de alargar a base produtiva e de emprego da Comunidade, numa óptica de maior competitividade, de maior coesão e de uma economia do conhecimento mais qualificada, tudo isto em sintonia com os objectivos da estratégia de Lisboa renovada.

1.2

O Comité, embora aplaudindo a iniciativa de criar uma nova estrutura comunitária de apoio ao microcrédito, considera insuficiente uma simples acção de incentivo dirigida aos Estados-Membros, uma vez que o sector não bancário, excluído das directivas bancárias da CE, não dispõe em muitos Estados-Membros de uma base suficientemente sólida nem de disposições elementares uniformes.

1.3

Uma acção-piloto para microinvestimentos, socialmente responsáveis, congregando instituições de microcrédito bancárias e não bancárias num sistema europeu em rede — mediante a realização de um protocolo de acordo (MOU) para investimentos socialmente responsáveis com cada uma das instituições e com o apoio das associações sectoriais — deveria ter, na opinião do Comité, como objectivo prioritário os grupos «com poucas possibilidades de crédito bancário», para:

desenvolver autênticos projectos de trabalho produtivo e digno;

alargar a base produtiva, cooperativa e de emprego;

reactivar a capacidade de responsabilização do indivíduo, com a construção de percursos de aproximação, acompanhamento e valorização das pessoas em risco de exclusão das áreas produtiva, económica e social.

1.4

O Comité está convencido de que a aplicação inovadora das novas tecnologias ao microcrédito permitirá aumentar, graças a um sistema em rede, o raio de acção da microfinança, promover a concorrência e reduzir, deste modo, os custos para todos os utilizadores.

1.5

O Comité considera, além disso, que uma acção de apoio ao microcrédito deve ser acompanhada de uma acção de formação para facilitar o desenvolvimento e o êxito no mercado, prevenir a exclusão social e realizar cada vez melhor os objectivos estabelecidos pela estratégia de Lisboa.

1.6

Embora concordando que as mudanças no enquadramento institucional e jurídico de apoio ao microcrédito se manifestam predominantemente ao nível nacional e que resultam de mecanismos integrados no ciclo anual de governação da estratégia de Lisboa, o Comité considera indispensável promover o sistema de referência europeu para

a realização de uma rede de acordos sobre investimentos socialmente responsáveis (MOU), entre o fundo europeu para o microcrédito a criar e cada uma das instituições de microcrédito no território, de forma a que o sistema de microcrédito em rede se guie por normas compatíveis de solidez, solvabilidade, diversificação da carteira (1), de transparência e de combate à usura;

um sistema comunitário de avaliação das instituições de microfinança (IDMF) bancárias ou não bancárias, para melhorar a sua qualidade e disponibilidade de informação sobre os riscos e os desempenhos, com a adopção de formatos comuns que fomentem o diálogo e o intercâmbio de boas práticas e permitam, ao mesmo tempo, atribuir temporariamente um rótulo europeu de qualidade e de visibilidade às instituições de microcrédito (IMC), com o fito de atrair fundos e granjear a confiança dos eventuais beneficiários;

instrumentos comunitários de informação e formação dos interessados em intervenções de microcrédito, tanto sobre as possibilidades e formas de intervenção como as exigências e formas de apresentação de projectos de planos de negócios pelos potenciais beneficiários, com base em formatos simplificados e harmonizados;

instrumentos comunitários de formação contínua e de requalificação para os quadros superiores e os operadores das instituições IMF, com base em pacotes de conhecimentos técnicos comuns, para responder à evolução da microfinança, às novas exigências dos utilizadores, às necessidades básicas comuns e facilitar o diálogo e o intercâmbio de boas práticas numa dimensão europeia;

um sistema europeu em rede de bancos de dados, com base em critérios harmonizados, que permita a recolha e a elaboração de dados normalizados sobre as transacções realizadas e sobre os riscos que lhes estão associados, também no intuito de reduzir os custos da avaliação dos riscos inerentes a operações individuais de microcrédito.

1.7

No atinente à proposta de uma estrutura comunitária específica de apoio no departamento JEREMIE do Fundo Europeu de Investimento, o Comité está convencido de que essa solução não conferirá à iniciativa a visibilidade de que necessita — restringindo além disso o seu papel de coordenação das várias iniciativas em curso — nem acrescentará outras actividades às actividades de assistência técnica. O Comité é, por conseguinte, favorável à criação de um departamento autónomo funcionando como fundo para o microcrédito.

1.8

O financiamento e a assistência técnica por parte da nova estrutura não deverão, contudo, contemplar unicamente as IMC novas e as IMC não bancárias, mas dirigir-se a todos para não dar origem a distorções da concorrência.

1.9

A iniciativa comunitária IDMF deveria incluir igualmente o reforço do diálogo social e o diálogo entre os vários actores da sociedade civil e também valorizar as redes europeias de intercâmbio de boas práticas, como a Rede Europeia de Microfinança, o Centro de Microfinança e a Plataforma Europeia de Microfinança.

1.10

Na opinião do Comité, esta iniciativa deve relevar o papel das associações de empresas na verificação da fiabilidade e da competência dos proponentes, no desenvolvimento de um forte potencial relacional e fiduciário, no apoio e no acompanhamento — formação e aconselhamento — para fazer emergir as capacidades autónomas dos beneficiários e reduzir e simplificar os encargos administrativos, em particular os decorrentes da preparação de planos de negócios.

1.11

A criação de um fundo para o microcrédito, ligado racionalmente com as instituições financeiras, as administrações estatais (2), as organizações sectoriais e com os consórcios e as cooperativas de garantia de crédito, poderia ser muito útil para orientar a engenharia financeira para formas de «gestão social» do crédito.

1.12

Uma visão social do crédito, que sirva também de base à criação de um fundo para o microcrédito, coaduna-se perfeitamente com os princípios da responsabilidade social das empresas e com os valores de empregos de maior qualidade e mais disseminados.

1.13

O apoio à certificação ambiental EMAS pode, melhor do que qualquer outro instrumento, favorecer o crescimento social das empresas e facilitar a difusão, deliberada, de um fundo para o microcrédito.

2.   Introdução

2.1

O Observatório das PME salientou, em Abril de 2007, que o maior obstáculo à inovação de produtos e de processos para as PME europeias é o acesso ao crédito, vindo logo a seguir a dificuldade de encontrar pessoal qualificado. Já nas empresas de maiores dimensões, os problemas relacionam-se sobretudo com os recursos humanos.

2.2

Os principais hiatos patentes no mercado devem-se à falta de capital de arranque, a uma oferta insuficiente de fundos e a uma inadequação à procura. Estas questões foram tratadas pela Comissão na sua comunicação «Aplicar o Programa Comunitário de Lisboa: Financiar o crescimento das PMEPromover a mais-valia europeia» (3) sobre a qual o Comité se pronunciou por diversas vezes (4).

2.3

Mais concretamente, o CESE relevou que «devem ser desenvolvidas políticas de apoio à criação e desenvolvimento de empresas, nomeadamente estabelecendo processos de criação de empresas mais rápidos e menos onerosos, medidas para melhorar o acesso ao capital de risco, mais programas de formação empresarial, medidas destinadas a facilitar o acesso às redes e aos serviços de utilidade pública e uma rede mais densa de serviços de apoio a pequenas empresas» (5).

2.3.1

O Comité aproveita para corroborar o que já referiu em pareceres anteriores (6), ou seja, que «as cooperativas, as empresas coligadas e as sociedades mútuas (“mutuals”), bem como as empresas emergentes e as microempresas, também podem contribuir para o reforço da competitividade e da capacidade de inovação da UE».

2.4

O Comité salientou ainda que «uma questão fundamental é a de facilitar o acesso aos mercados financeiros» e que «os bancos e outros operadores financeiros, nomeadamente fundos de capital de risco, deveriam ser encorajados a adoptar uma atitude mais positiva em relação ao risco» (7).

2.5

A Comissão Europeia anunciou no Outono de 2007 que iria analisar uma série de iniciativas em prol das PME, entre as quais uma iniciativa europeia para a criação de uma nova estrutura de apoio ao microcrédito (8).

2.6

Todos reconhecem que o microcrédito é um instrumento financeiro de grande impacto no espírito empresarial, no desenvolvimento económico e na inclusão social produtiva, mas também admitem que as suas carências e as suas imperfeições ainda são muitas dada a dificuldade em conseguir investimentos no capital inicial da empresa, sobretudo quando o requerente está desempregado, imigrou recentemente, faz parte de uma minoria étnica ou reside numa região da «convergência».

2.7

Outro problema é que a instituição financeira pode fazer economias de escala no atinente aos custos fixos da transacção, como a recolha de informações, a avaliação e o destino dado ao empréstimo. Isso acontece especialmente na concessão de microcréditos, sobretudo os destinados a actividades autónomas e a PME não suficientemente transparentes e com uma capacidade reduzida para fornecer informações adequadas à instituição financeira.

2.8

Microcrédito é definido internacionalmente como um empréstimo de pequeno valor — no máximo de 25 000 euros na Europa (9) e de 100 000 dólares nos Estados Unidos — destinado a pessoas com baixos rendimentos, que não reúnem condições para terem acesso às formas convencionais de crédito, visto a sua solvibilidade ser considerada insuficiente e/ou porque os custos de gestão desse empréstimo são considerados demasiado elevados (10). Está excluído desta definição o crédito ao consumo.

2.9

O Comité concorda com a Comissão que é fundamental o papel do microcrédito na realização da estratégia de Lisboa para o crescimento e o emprego e na promoção da inclusão social, e reputa essencial preservar a sua função principal de apoio ao crescimento do trabalho por conta própria e ao desenvolvimento de microempresas, mas sem transformá-lo em mera ajuda social.

2.10

Na sua opinião, o microcrédito poderá ser na UE uma resposta aos problemas evidenciados pelo fracasso do mercado em garantir o acesso ao crédito necessário para desenvolver o espírito empresarial indispensável ao lançamento ou à ampliação de actividades economicamente produtivas, também no âmbito da política de apoio e de cooperação para o desenvolvimento (11).

2.11

Ao nível comunitário, a vertente «micro-credit guarantee» do Programa-Quadro para a Competitividade e a Inovação (PCI), apoiado pelo FEI (12), oferece um sistema de garantias para o microcrédito concedido por instituições locais às microempresas (13). Porém, não há actualmente regulamentação comunitária específica sobre o microcrédito, a não ser a aplicável ao sector do microcrédito bancário que está subordinado à regulamentação bancária europeia (14) e algumas referências que lhe são feitas em vários programas e iniciativas comunitários (15).

2.12

Por outro lado, nos Estados-Membros, o sector do microcrédito é regulado e gerido de várias formas. Apenas dois deles prevêem legislação específica e disciplinam o sector não bancário da microfinança (16), embora vigorando em quatro outros disposições regulamentares contra a usura (17).

2.13

O Conselho Europeu da Primavera salientou, designadamente, o interesse prioritário imediato de «medidas para facilitar ainda mais o acesso ao financiamento, nomeadamente através dos actuais instrumentos financeiros da UE» (18) e para «promover uma maior participação no mercado de trabalho em geral e lutar contra a segmentação, a fim de assegurar uma inclusão social activa».

2.14

O Comité considera que um quadro jurídico e de apoio mais amplo poderia contribuir para fomentar a criação de novas empresas produtivas e a sua consolidação, evitando-se assim expor o sistema produtivo a riscos de marginalização e de exclusão que são solo fértil para flagelos sociais e criminosos, como o recurso à usura.

3.   Proposta da Comissão

3.1

São duas as linhas de acção enunciadas pela Comissão:

lançamento de um programa de reforma pelos Estados-Membros vocacionado para a melhoria das condições do microcrédito, de acordo com as circunstâncias e prioridades nacionais, com uma eventual ajuda comunitária na indicação de objectivos quantitativos e de boas práticas;

criação de uma nova iniciativa comunitária de apoio ao microcrédito, em alternativa à iniciativa JEREMIE, oferecendo assistência técnica e apoio geral à consolidação dos organismos/instituições de microcrédito, bem como acções de divulgação e de comunicação.

4.   Quadro de desenvolvimento do microcrédito em prol do crescimento e do emprego

4.1

O microcrédito é uma alavanca da inclusão social visto permitir às pessoas e às empresas economicamente débeis e excluídas do sistema bancário clássico acederem a recursos financeiros indispensáveis para a criação e o desenvolvimento de actividades geradoras de rendimento.

4.2

Ao nível europeu, a iniciativa para as pequenas empresas (Small Business Act) da UE (19), cujo objectivo declarado é definir princípios e medidas concretos para melhorar o ambiente em que operam as PME europeias, tornará possível identificar e remover os obstáculos que impedem a libertação de potencialidades das empresas de menores dimensões, graças a esforços de simplificação, à melhoria do acesso ao crédito e a disposições adequadas no âmbito da energia e do ambiente.

4.3

O Comité entende que é preciso melhorar igualmente a coordenação dos vários instrumentos accionados para esse efeito, aproveitando os ensinamentos colhidos da experiência com antigos instrumentos e com os utilizados ainda agora, no contexto do microcrédito, conforme assinala a comunicação da Comissão (20), ou seja

a iniciativa JEREMIE;

as garantias de microcrédito do PCI (21); a experiência da REM e do CMF (22) no âmbito do programa de acção de combate à exclusão social;

as iniciativas do Fundo Social Europeu;

os programas de desenvolvimento rural FEADER (23).

4.3.1

O Comité considera oportuno que, na definição da nova iniciativa comunitária para o microcrédito, se tenha na devida conta as experiências positivas acumuladas com a elaboração e a aplicação plurianual concreta do Programa-Quadro Microfinança UE-ACP da Direcção-Geral EuropAid.

4.4   Engenharia financeira e «Fundo europeu para o microcrédito»

4.4.1

As instituições financeiras europeias, a partir dos anos oitenta (24) e, sobretudo, graças a reflexões e sugestões nascidas dos debates durante as conferências europeias do artesanato e das pequenas empresas (25), têm vindo a difundir e a apoiar nos Estados-Membros a cultura da engenharia financeira (26).

4.4.2

A necessidade de concretizar linhas de acção capazes de reduzir as dificuldades de acesso ao crédito e de contribuir para a organização da engenharia financeira levou a Comissão e o BEI (Banco Europeu de Investimento), também sob a pressão das organizações europeias das pequenas empresas, a criar o FEI (27), o qual, depois de um primeiro parêntese muito breve, em que apoiou igualmente as redes de comunicação (28), redireccionou os seus esforços para o apoio, mediante várias formas de garantia, sobretudo das acções de engenharia financeira e das medidas em prol das microempresas e das pequenas e médias empresas (PME).

4.4.3

Graças aos programas plurianuais da Comissão, em prol das microempresas e das pequenas e médias empresas e da cooperação, e ultimamente através do Eixo 1 do PIC (29), as acções de engenharia financeira desenvolveram-se através

da garantia fiduciária sobre empréstimos conferida às «cooperativas e consórcios de garantia de crédito» das PME;

a garantia de titularização (30) dos fundos de risco e de encargos (provisões) dos consórcios de garantia de crédito;

a garantia fiduciária sobre o capital conferida através do crédito «mezzanine» (31);

os investimentos em capital de risco, apoio à eco-inovação, transferência de tecnologia;

as intervenções dos investidores providenciais (business angels).

4.4.4

O CESE teve, em várias ocasiões, a oportunidade de exprimir o seu apreço às intervenções, sobretudo nos últimos quinze anos, da Comissão, do BEI e do FEI em apoio das pequenas empresas. O CESE saúda a ampliação e a modernização do apoio financeiro do BEI às PME (32), mas considera que convinha redobrar esforços, designadamente mediante programas concertados com

o BEI, para os capitais, e o FEI, para as garantias fiduciárias;

as instituições financeiras de cada um dos Estados-Membros;

as organizações representativas das microempresas e das pequenas e médias empresas;

os consórcios de garantia de crédito que já operam em regime de engenharia financeira, conferindo uma garantia fiduciária que oscila entre 50 % e 80 % do empréstimo concedido às empresas.

4.4.5

Ao nível nacional, poder-se-ia constituir uma rede de «fundos para o microcrédito» dotada de fundos rotativos alimentados pelo BEI, e com garantias adicionais do FEI, para funcionar em vários níveis. Ao nível regional (NUTS II) e ao nível provincial (NUTS III), a concessão de empréstimos poderia passar pelas organizações dos consórcios de garantia de crédito, quando os houver (33). Estes consórcios possuem já uma notável experiência com o capital semente (seed capital) e, com um fundo de risco adequado, sujeito a uma contragarantia do FEI, poderiam, por seu turno, conceder uma garantia fiduciária.

4.4.5.1

Seria oportuno dilucidar esta nova proposta no que respeita à criação do fundo de microcrédito pelo BEI e pela Comissão Europeia. O objectivo desta iniciativa è apoiar as instituições de microfinança em toda a Europa não só através de financiamento propriamente dito (esquemas de garantia, empréstimos, financiamento «mezzanine» ou instrumentos de capital próprio) como também de assistência técnica. Este microfundo está a ser estabelecido pelo FEI com um capital inicial de cerca de 40 milhões de euros de apoio (dos quais 20 milhões provenientes do BEI), a quem, na opinião do Comité, deveria caber futuramente a gestão do fundo.

4.4.6

O microempréstimo poderia bastar para a compra de materiais e de equipamentos simples, necessários para o arranque de uma actividade empresarial ou para a renovação de equipamento, sempre necessário, numa microempresa (34).

4.4.6.1

Na opinião do Comité, convém prestar atenção especial ao microcrédito direccionado para as mulheres empresárias. Neste caso importa ter sobretudo em mente a flexibilidade, as modalidades e os critérios de concessão do crédito que permitam enfrentar vicissitudes sociais e psicológicas concretas que podem agudizar-se se a pessoa em causa:

pertencer a uma minoria;

estiver a passar por uma situação familiar difícil;

ter tendência para a auto-exclusão social.

4.4.6.2

As modalidades e a gestão do microcrédito, direccionado para o desenvolvimento da actividade feminina, deveriam ter principalmente em conta as prioridades de inserção e de reinserção social e económica das mulheres no tecido produtivo da sociedade, perante a necessidade de reforçar a auto-estima, desenvolver o espírito empresarial e aumentar a capacidade de assumir mais responsabilidades e mais riscos.

4.4.7

O microempréstimo deveria ser também entendido como uma oportunidade para os jovens que, animados pelo desejo de trabalharem por conta própria, com suficiente preparação profissional mas sem possibilidades económicas, pretendem iniciar uma actividade independente.

4.4.7.1

A primeira garantia sobre o empréstimo, a conceder de qualquer modo por uma instituição financeira, bancária ou não bancária, é o equipamento comprado. Mas o que leva as instituições financeiras a adoptarem uma abordagem menos fiscal na concessão do empréstimo (35) é o facto de haver para além de um «Fundo Europeu para o Microcrédito», dotado de recursos financeiros e de conhecimento especializado, em condições de intervir periodicamente, por intermédio do FEI, consórcios de garantia de créditos e organizações sectoriais, para sanar as eventuais insolvências acumuladas, também com a capacidade e a vontade de promover normas óptimas de solidez, diversificação e melhoria da produção, de transparência e combate à usura (36).

4.4.8

Os inquéritos realizados sobre a insolvência das pequenas e das microempresas, nos últimos dez anos, nos principais países europeus, revelamque as insolvências não vão além de 4 % dos empréstimos concedidos (37). Isso significa que, tratando-se de uma percentagem inferior a 5 %, o multiplicador a utilizar para garantir o crédito concedido pelas instituições financeiras equivale a 20.

4.4.9

Com um multiplicador de 20 e uma garantia fiduciária cobrindo 50 % da insolvência de cada devedor individual, um consórcio de garantia de crédito, com um fundo de risco de um milhão de euros, poderia garantir a um grande número de empresas empréstimos até 40 milhões de euros (38).

4.4.9.1

O sistema de «cooperativas e de consórcios de garantia de crédito» possibilitou em 2007, graças à concessão de garantias, financiamentos às empresas de artesanato italianas num montante aproximado de 6 mil milhões de euros.

4.4.10

Todos os anos são criadas, na UE, cerca de 500 000 novas empresas. O número das empresas que desaparecem é ligeiramente inferior (39). 99 % das empresas que surgem anualmente são PME e, entre estas, pelo menos 240 000 são empresas de um único titular (40).

4.4.11

Retomando o exemplo dado no ponto 4.4.9, é possível, com um milhão de euros ao abrigo do fundo de risco e com recurso a engenharia financeira, garantir através de um fundo de microcrédito um empréstimo de 25 mil euros a 1 600 pequenas empresas.

4.5   A gestão social do crédito

4.5.1

Conforme ficou dito, o crédito é um dos instrumentos mais importantes para o desenvolvimento económico e social e para a realização de uma «economia social de mercado».

4.5.2

Foram, por isso, surgindo a pouco e pouco, e conquistando espaço próprio, novas concepções segundo as quais o crédito já não é considerado como simples relação entre cliente e instituição financeira, mas como um instrumento de valor social muito elevado dado o seu papel na criação de empregos melhores e mais seguros e no desenvolvimento económico.

4.5.3

Esta nova e mais ampla visão requer a distribuição por vários actores dos riscos associados à concessão de crédito.

4.5.4

Esta distribuição de riscos de crédito entre várias entidades

aumenta as garantias para com as instituições financeiras;

reduz a taxa de juro sobre o crédito concedido;

facilita a concessão do empréstimo ao requerente.

4.5.5

Dado o seu valor social, a concessão de um crédito terá de subordinar-se cada vez mais e melhor ao princípio da responsabilidade social das empresas e exige, por isso, dos empresários preparação e adesão aos valores do desenvolvimento sustentável.

4.5.6

A certificação ambiental EMAS (41) poderia, melhor do que qualquer outra, ser colocada como premissa no âmbito de um processo de engenharia financeira, associada à função social do crédito.

4.5.7

Nos últimos anos, só poucas dezenas de milhares de empresas puderam utilizar os instrumentos financeiros comunitários (42). Há, por isso, uma grande discrepância entre a fenomenologia do problema e os resultados obtidos, o que induz a uma reflexão sobre as possibilidades concretas de intervenção com sistemas capazes de reforçar a participação das instituições financeiras e multiplicar os resultados.

4.5.8

Em 20 e 21 de Novembro de 1997, o Conselho Europeu Extraordinário do Luxemburgo, que tinha o emprego como ponto único da ordem do dia, aprovou, inter alia, três iniciativas concretas para ajudar as empresas a manterem a sua competitividade nos mercados, e solicitou à Comissão que apresentasse propostas para reforçar a economia e o emprego. Eram elas o instrumento «apoio ao arranque» do MET (Mecanismo Europeu para as Tecnologias), a JEV (Empresa Comum Europeia) e o Mecanismo de Garantia a favor das PME (GPME). Destas iniciativas, duas — o MET e o GPME — tinham por objectivo facilitar o acesso ao crédito.

4.5.8.1

No fim de 2006, mais de 277 000 PME haviam já beneficiado das medidas previstas (43) no Programa de Crescimento e Emprego do MAP (programa plurianual).

4.5.8.2

O Mecanismo de Garantia a favor das PME (GPME) é um dos mais importantes programas europeus dirigidos às PME (44).

4.5.9

Quando falamos de capital de risco nas microempresas (23 milhões na Europa) e nas pequenas empresas (1,1 milhão na Europa), das quais cerca de 90 % são sociedades unipessoais ou de pessoas (em nome colectivo), referimo-nos apenas a 5-6 % deste universo.

4.5.10

Face ao exposto, o Comité considera que é imprescindível ponderar formas de apoio ao crédito dirigidas igualmente às sociedades de pessoas, como acontece já com os instrumentos de engenharia financeira. Doutro modo, a sua aplicação continuará a ter um carácter marginal e as pequenas e as microempresas serão impedidas de crescer em termos de cultura financeira.

Bruxelas, 18 de Setembro de 2008.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Ver estudos do Prémio Nobel Harry Markovitz sobre as relações entre diversificação da carteira, a redução do risco e as compensações nas flutuações dos rendimentos dos investimentos (efficiency curve) com efeitos de estabilização do ciclo económico.

(2)  Em muitos Estados as administrações regionais e locais apoiam, com financiamentos destinados às cooperativas de garantia de crédito, o desenvolvimento de pequenas e médias empresas.

(3)  COM(2006) 349 final de 29 de Junho de 2006.

(4)  Parecer CESE 599/2007 in JO C 168 de 20.7.2007, p. 1 — Relatores: VAN IERSEL e GIBELLIERI.

(5)  Parecer CESE 982/2007 in JO C 256 de 27.10.2007, p. 8 — Relatora: FAES.

(6)  Parecer CESE 1485/2005 de 14.12.2005 sobre a criação de um Programa-quadro para a Competitividade e a Inovação (2007-2013), relatores: WELSCHKE e FUSCO.

(7)  Ver notas 4 e 5.

(8)  Já em 1997, com a Garantia a favor das PME (GPME) a Comissão havia organizado, em colaboração com o Fundo de Investimentos Europeu, o apoio ao microcrédito.

(9)  SEC(2004) 1156 — Programa competitividade e inovação, Decisão n.o 1639/2006/CE.

(10)  Ver sítio WEb da Eurofi França: www.eurofi.net

(11)  Ver Regulamento (CE) n.o 1905/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2006, que institui um instrumento de financiamento da cooperação para o desenvolvimento.

(12)  FEI — Fundo Europeu de Investimento.

(13)  Para definição de microempresa ver a Recomendação 2003/361/CE.

(14)  Directiva 2006/48/CE e 2006/49/CE relativa ao acesso à actividade das instituições de crédito e ao seu exercício.

(15)  Ver Iniciativa JEREMIE, Iniciativa Crescimento e Emprego (Decisão n.o 98/347/CE), o Programa Plurianual para as PME, o Programa Competitividade e Inovação (Decisão n.o 1639/2006/CE), o Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER) (Regulamento (CE) n.o 1698/2005), o Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização (Regulamento (CE) n.o 1927/2006).

(16)  Bulgária e Roménia. Além disso, o Reino Unido e a Finlândia, embora não possuindo legislação específica, prevêem no seu sistema jurídico algumas excepções na matéria.

(17)  Bélgica, Alemanha, Itália e Polónia.

(18)  13-14 de Março de 2008, ponto 11.

(19)  Ver, neste contexto, o parecer CESE 977/2008, relatore: Cappellini.

(20)  Ver COM(2007) 708 final, anexo 3 (não traduzido em português).

(21)  PCI — Programa-Quadro para a Competitividade e a Inovação (2007-2013).

(22)  REM — Rede Europeia de Microfinança; CMF — Centro de Microfinança para a Europa Central e Oriental.

(23)  FEADER — Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural.

(24)  1982: Ano europeu do artesanato e das pequenas empresas.

(25)  1990: Avignon; 1994:Berlim; 1997 Milão.

(26)  A engenharia financeira parte do princípio de que o apoio financeiro aos pequenos empresários que desejam iniciar uma nova actividade ou investir em novos produtos ou processos não pode circunscrever-se à relação entre pequeno empresário e instituição financeira, e de que convém, no atinente à função social da empresa, associar outros actores que assumem responsabilidades a diversos níveis e podem distribuir entre si os riscos e os custos.

(27)  FEIFundo Europeu de Investimento. É criado em 1994, por instigação das então DG XXIII (uma direcção-geral surgida para apoiar as pequenas empresas e o artesanato, graças à qual tinham sido organizadas as «conferências europeias») e DG II (Economia e finanças). O FEI iniciou as suas actividades com uma dotação financeira de mil milhões de ECU, por conta do BEI, de oitocentos milhões de ECU, por conta da Comissão, e de duzentos milhões de ECU, a cargo, como quota de participação, em fracções de dois milhões cada uma, das instituições financeiras europeias. Mais de cinquenta instituições europeias aderiram imediatamente à iniciativa.

(28)  Por exemplo, o Metropolitano de Lille.

(29)  Eixo 1 do PIC: Apoio ao espírito empresarial; eixo 2: Apoio às TIC; eixo 3: Apoio à energia inteligente para a Europa.

(30)  A titularização aplica-se mediante a cessão parcial ou total do montante das dívidas de um consórcio de crédito (ou de um banco) a instituições financeiras especializadas para que, sobretudo esses consórcios, possam aumentar as suas possibilidades de garantia de crédito às empresas.

(31)  O financiamento «mezzanine» baseia-se mais nos fluxos de tesouraria esperados das empresas financiadas do que nas garantias reais. Pode funcionar de duas maneiras: 1) dívida subordinada (empréstimo com taxa fixa ou indexada); 2) Equity kicker (o credor/investidor tem direito a uma percentagem da mais-valia da propriedade a que se refere o empréstimo). O prazo do financiamento «mezzanine» varia de 4 a 8 anos.

(32)  http://www.eib.org/projects/publications/sme-consultation-2007-2008.htm

(33)  O sistema de «consórcios de crédito» encontra-se bem enraizado em muitos países europeus e funciona no nível da federação europeia.

(34)  As microempresas representam 94 % de todas as empresas privadas europeias, não agrícolas.

(35)  A engenharia financeira, retirando às instituições financeiras uma boa percentagem de risco, permite-lhes obter, com mais facilidade e menos custos, empréstimos, sobretudo para os novos empresários ainda pouco conhecidos.

(36)  Acções conjuntas, entre bancos e associações sectoriais, para melhorar a gestão financeira das microempresas, já foram indicadas nos documentos da primeira conferência europeia do artesanato de Avignon, em 1990, e na segunda conferência de Berlim, em 1994, tendo sido desenvolvidas, em particular, pelo sistema dos «bancos populares alemães» com as organizações sectoriais (União central alemã de artesanato — ZDH).

(37)  Ver FedartFidi UE, Federação Europeia de Consórcios Fiduciários de Artesanato dos Estados que têm um sistema operacional de consórcios de crédito.

(38)  5 % de 40 milhões de euros corresponde a 2 milhões, mas o consórcio fiduciário responde unicamente por 50 % do débito não pago, ou seja, por 1 milhão de euros que tem à sua disposição no próprio fundo de risco. A titularização deste fundo de risco permitirá ao consórcio fiduciário conceder novos empréstimos com um novo limite máximo de 40 milhões de euros.

(39)  Fonte: Observatório Europeu para as PME.

(40)  Na UE, 49 % das microempresas não têm assalariados. São sociedades unipessoais.

(41)  Ver Regulamento 1836/93/CE e Regulamento 761/2001/CE.

(42)  Documento de consulta sobre o programa comunitário a favor do espírito empresarial e da competitividade, 2006/2010 DG Empresas, 2004, ponto 118. http://europa.eu.int/yourvoice/consultations/index_en.htm#open.

(43)  Fonte: COM(2007) 235 final — Relatório da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu relativo aos instrumentos financeiros do programa plurianual para a empresa e o espírito empresarial, em especial para as pequenas e médias empresas(PME) (2001-2006)

(44)  Em 31.12.2005, a média de utilização da vertente «Garantia de Empréstimos» era de 67 %, da vertente «Microcrédito» de 66 % e da vertente «Capital Próprio» de 65 %.


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