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Document 52016AE2885

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A nova configuração do mercado da eletricidade e potenciais repercussões nos consumidores vulneráveis» (parecer exploratório)

JO C 34 de 2.2.2017, p. 78–85 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

2.2.2017   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 34/78


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «A nova configuração do mercado da eletricidade e potenciais repercussões nos consumidores vulneráveis»

(parecer exploratório)

(2017/C 034/12)

Relator:

Vladimír NOVOTNÝ

Consulta

Conselho da União Europeia, 14/03/2016

Base jurídica

Artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE)

 

Parecer exploratório

Competência

Secção Especializada de Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

Adoção em secção

06/10/2016

Adoção em plenária

19/10/2016

Reunião plenária n.o

520

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

146/66/43

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE apoia a ideia de base de uma nova configuração do mercado da eletricidade da UE, considerando-a necessária à garantia de um aprovisionamento de eletricidade estável, em conformidade com os objetivos da União Europeia da Energia. A transição, num horizonte de médio e longo prazo, da produção e comercialização de eletricidade para estruturas descentralizadas, bem como a realização do objetivo estabelecido na Diretiva «Energias renováveis» da UE, pressupõem uma configuração do mercado da eletricidade completamente nova. Neste contexto, o CESE remete para os seus pareceres TEN/577, TEN/578 e TEN/583, nos quais aborda esta matéria, referindo-se também ao futuro papel dos consumidores, prossumidores e novos participantes no mercado.

1.2.

O CESE considera que as redes de distribuição ditas «inteligentes», conjugadas com contadores inteligentes e tecnologias de armazenamento, constituirão também uma componente importante da nova configuração do mercado da eletricidade a médio e longo prazo. Estas redes inteligentes e tecnologias de regulação e armazenamento podem, portanto, produzir efeitos positivos, quer em termos de otimização do consumo, quer em termos de poupança de eletricidade.

1.3.

O CESE chama a atenção para o potencial não só dos pequenos produtores-consumidores (os chamados «prossumidores»), mas também de outros novos modelos, como, por exemplo, as cooperativas de energia, as quais podem contribuir para reduzir a pobreza energética. A fim de integrar plenamente os prossumidores no mercado da energia, o Comité considera essencial, entre outros aspetos, eliminar os obstáculos administrativos e outros obstáculos desnecessários que possam entravar a sua atividade, e assegurar o seu acesso às redes de distribuição com base nas condições prevalecentes no mercado em matéria de financiamento da exploração das referidas redes.

1.4.

O CESE considera que o recurso a controlos inteligentes de regulação nos denominados lares «inteligentes» constitui também uma componente importante da nova configuração do mercado da eletricidade. A sua utilização reforçará o papel ativo que cabe aos lares quando da sua plena integração na nova configuração do mercado da eletricidade e reduzirá o risco de pobreza energética. Estas mudanças importantes serão facilitadas por programas de formação para incentivo de vastas camadas da população, bem como pelo apoio à sua implementação junto da categoria das famílias vulneráveis e de outros consumidores vulneráveis no mercado da energia, como por exemplo as pequenas e médias empresas.

1.5.

O CESE está convicto de que todas as mudanças que previsivelmente ocorrerão com a nova configuração do mercado da eletricidade são condicionadas pela capacidade de este novo mercado fornecer incentivos associados ao preço a curto prazo (preço) e aos sinais de preço a longo prazo (custo), o que permitirá e favorecerá um amplo investimento no setor da energia elétrica da UE. Tal significa também que os preços devem refletir na íntegra o verdadeiro custo, ou seja, devem incluir também os chamados custos externos.

1.6.

Nos últimos anos, a evolução dos mercados da eletricidade resultou numa redução significativa dos preços grossistas, que, no entanto, não veio beneficiar os pequenos consumidores nem as PME, uma vez que os preços que lhes são cobrados aumentaram, em vez de terem diminuído.

1.7.

Através de uma configuração adequada do mercado da eletricidade, apoiada por investimentos estratégicos em sistemas, que associe também e precisamente os cidadãos socialmente mais desfavorecidos, por exemplo, através de cooperativas de energia, será possível articular a política energética com a política social e gerar um valor acrescentado regional.

1.8.

A política deve responder claramente à questão de saber quem, no futuro, deverá e/ou poderá produzir eletricidade no âmbito de uma produção descentralizada. Este aspeto é também crucial para se solucionar o problema da pobreza energética.

1.9.

Um exemplo disso é a região da Podláquia, na Polónia, onde está a ser implementado um programa de financiamento para pequenas instalações fotovoltaicas. Com uma ajuda ao investimento de 60 %, associada ao plano da Polónia de introduzir um sistema de medição do consumo líquido, é possível reduzir para metade os custos de eletricidade suportados pelos consumidores do país.

2.   Introdução

2.1.

Em 14 de março de 2016, a Presidência eslovaca do Conselho da UE solicitou, por carta dirigida ao CESE, a elaboração de um parecer sobre a dimensão social da nova configuração do mercado da eletricidade na dinâmica do desenvolvimento económico e social.

2.2.

No seu pedido, a Presidência eslovaca indicava que a nova configuração do mercado da eletricidade traz novas possibilidades para os consumidores, na condição de poderem interagir com o mercado de forma mais ativa. Para além do possível impacto que o aumento dos preços da eletricidade poderá ter na competitividade da indústria da União, é todavia essencial ter em conta os eventuais perigos que esse aumento poderá representar para os consumidores socialmente vulneráveis.

2.3.

Em vários pareceres anteriormente emitidos (1), (2), o CESE fez uma análise aprofundada da evolução esperada do mercado da energia e considera que as suas recomendações e conclusões não perderam atualidade. Refira-se também que o presente parecer se centra nos riscos, mas também nas oportunidades, que a nova configuração do mercado da eletricidade poderá representar para os grupos da população socialmente vulneráveis e nas manifestações específicas de pobreza energética em relação à acessibilidade da energia elétrica.

3.   Visão da nova configuração do mercado da energia

3.1.

A nova configuração dos mercados da eletricidade assente em princípios de sustentabilidade deve ter como papel essencial assegurar a todos os consumidores um aprovisionamento de eletricidade seguro e a um preço acessível e competitivo.

3.2.

O quadro estratégico da UE para uma União da Energia visa os seguintes objetivos estratégicos essenciais:

a segurança energética, a solidariedade e a confiança;

um mercado interno da energia plenamente integrado;

a eficiência energética como contributo para a moderação do consumo de energia;

a descarbonização da economia; e

uma União da Energia em prol da investigação, da inovação e da competitividade.

3.3.

As linhas principais do quadro estratégico do mercado da eletricidade são:

a transição para sistemas energéticos hipocarbónicos;

a integração rentável das energias renováveis intermitentes;

o encerramento das centrais elétricas convencionais e a transição para a produção descentralizada de eletricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis;

a evolução do papel dos consumidores no mercado da eletricidade; e

um nível acrescido de segurança e fiabilidade do aprovisionamento de eletricidade.

3.4.

A evolução do papel desempenhado pelos consumidores no mercado da eletricidade deverá constituir um aspeto fundamental da nova configuração deste mercado (3).

4.   Pobreza energética e respetiva prevenção

4.1.

Num passado recente, o CESE adotou vários pareceres sobre a problemática da pobreza energética, nomeadamente o parecer TEN/516 sobre uma «Ação coordenada a nível europeu para prevenir e combater a pobreza energética» (relator: Pierre Jean Coulon, 2013) (4), que foi objeto de análises pormenorizadas a nível nacional, por exemplo por parte do Conselho Económico e Social da Bulgária no seu parecer «Measures to overcome energy poverty in Bulgaria» (Medidas para vencer a pobreza energética na Bulgária) (ESC/3/030/2015). O CESE considera que as recomendações e as conclusões formuladas nesses documentos se mantêm atuais e não tenciona repeti-las no presente documento.

4.2.

O tema da pobreza energética é abordado, entre outros, no parecer TEN/578 sobre «Um novo quadro para os consumidores de energia» e no parecer TEN/583 sobre «Energia de “prossumidores” e cooperativas de energia: Oportunidades e desafios nos países da UE».

4.3.

A pobreza energética caracteriza-se por um acesso limitado às fontes de energia em virtude da inexistência de infraestruturas energéticas ou do seu mau funcionamento, ou ainda por uma incapacidade de pagar o fornecimento de produtos energéticos. Se existem riscos de falhas no funcionamento das infraestruturas, é indispensável aumentar a respetiva capacidade ou criar novas capacidades para garantir a segurança e a fiabilidade do aprovisionamento de eletricidade. Os próprios operadores de rede constatam que as unidades de produção descentralizada, como as instalações fotovoltaicas em residências particulares, podem contribuir para a estabilidade do aprovisionamento regional e, em alguns casos, também para a estabilização de redes regionais mais fracas.

4.4.

Embora muitas vezes a pobreza energética seja percecionada em relação aos consumidores finais privados, importa não esquecer que algumas pequenas e médias empresas são também frequentemente afetadas, com todas as consequências daí decorrentes para a sua competitividade.

4.5.

A pobreza energética está normalmente ligada à capacidade de assegurar o aquecimento dos lares e também pode estar ligada, nos Estados meridionais da UE, à disponibilidade de climatização nos meses quentes de verão. A pobreza energética manifesta-se especificamente na incapacidade de pagamento das faturas da eletricidade. Para esses casos, há abordagens baseadas numa ajuda direta ou indireta aos consumidores em situação de pobreza energética.

4.6.

A ajuda direta aos consumidores vulneráveis é fornecida sobretudo sob a forma de programas de subvenção com caráter social, como o reembolso direto em dinheiro ou em espécie, e está enquadrada nos sistemas internos de proteção social de cada Estado-Membro.

4.7.

A definição de consumidor vulnerável varia de Estado-Membro para Estado-Membro, em função da situação específica e do sistema social de cada um deles.

4.8.

A ajuda indireta é prestada sob a forma de tarifas sociais ou especiais. Atualmente, dez Estados-Membros praticam tarifas sociais, oito definiram um estatuto de consumidor vulnerável e um total de dezasseis pratica preços da eletricidade regulados no seu mercado interno. O CESE manifestou a sua oposição veemente aos preços regulados (ver parecer TEN/578).

4.9.

No entanto, será possível reduzir os riscos de pobreza energética através da adoção de um conjunto de medidas compatíveis com a nova configuração do mercado da eletricidade. Essas medidas incluem, nomeadamente:

a melhoria da acessibilidade da informação sobre os preços da eletricidade propostos pelos diferentes fornecedores;

a eliminação dos obstáculos à mudança de fornecedor de serviços energéticos;

o reforço da concorrência e uma oferta transparente de serviços energéticos complexos;

a garantia da transparência dos contratos, dos preços e das faturas da energia;

a formação e educação dos clientes, com uma forte participação ativa do poder local;

a eliminação das práticas comerciais desleais e das técnicas de pressão para a celebração de contratos de fornecimento de energia;

a poupança no consumo de energia e a divulgação ao consumidor de informações sobre formas de consumo limpo, bem como a disponibilização generalizada aos consumidores domésticos e a outros pequenos consumidores de controlos inteligentes de medição e de regulação;

o apoio ao isolamento térmico dos apartamentos e casas, a renovação e a modernização dos edifícios antigos, a fim de reduzir as perdas de energia;

o apoio de programas de incentivo e de formação destinados aos consumidores vulneráveis;

o apoio de iniciativas locais de luta contra a pobreza energética;

a proibição de aplicação de tarifas excessivamente onerosas aos consumidores vulneráveis;

o aumento da eficácia e fiabilidade do aprovisionamento de eletricidade.

4.10.

Nos últimos anos, a evolução dos mercados da eletricidade resultou numa redução significativa dos preços grossistas, que, no entanto, não veio beneficiar os pequenos consumidores nem as PME, uma vez que os preços que lhes são cobrados aumentaram, em vez de terem diminuído.

4.11.

O CESE salienta que os pequenos produtores-consumidores (prossumidores) podem também desempenhar um papel especial na redução da pobreza energética. A fim de os integrar plenamente no mercado da energia, é portanto indispensável eliminar, o mais rapidamente possível, todos os obstáculos administrativos e facilitar o seu acesso às redes, mantendo as condições do mercado e respeitando as normas de qualidade dos fornecedores de eletricidade.

4.12.

O CESE entende que, apesar da aplicação das medidas referidas, conformes às regras do mercado, para apoiar os consumidores vulneráveis, o encargo da luta contra a pobreza energética e respetivas consequências continuará no futuro a ser essencialmente suportado pelos sistemas sociais dos Estados-Membros, dado que estes constituem a única alternativa conforme do ponto de vista do mercado.

4.13.

Através de uma configuração adequada do mercado da eletricidade, apoiada por investimentos estratégicos em sistemas, que associe também e precisamente os cidadãos socialmente mais desfavorecidos, por exemplo, através de cooperativas de energia, será possível articular a política energética com a política social e gerar um valor acrescentado regional.

4.14.

A política deve responder claramente à questão de saber quem, no futuro, deverá e/ou poderá produzir eletricidade no âmbito de uma produção descentralizada. Este aspeto é também crucial para se solucionar o problema da pobreza energética.

4.15.

As energias renováveis proporcionam oportunidades completamente novas de combate à pobreza energética enquanto problema social. Por exemplo, um estudo do Centro Comum de Investigação da Comissão Europeia, realizado em 2014, concluiu que, potencialmente, 80 % da população europeia poderia produzir eletricidade através de instalações fotovoltaicas a um preço inferior ao da eletricidade proveniente da rede pública. O problema é que nem toda a população dispõe de um telhado ou de uma superfície para instalar unidades fotovoltaicas. Uma forma de solucionar este problema poderá passar por alargar a definição do conceito de «prossumidor» e apoiar instalações comuns (cooperativas de energia).

4.16.

Num estudo recentemente publicado pela consultora CE Delft, estima-se que, até 2050, no máximo 83 % dos agregados familiares poderiam produzir a sua própria eletricidade.

4.17.

No entanto, um problema importante reside no facto de os cidadãos socialmente desfavorecidos não disporem de meios para efetuarem os investimentos necessários. A «desvantagem» das energias renováveis reside no facto de implicarem investimentos iniciais elevados, embora depois as despesas correntes sejam muito reduzidas (como se sabe, o sol e o vento são gratuitos). Mas este problema também pode ser resolvido a nível político, entre outras medidas, através de investimentos estratégicos adequados.

4.18.

Um exemplo disso é a região da Podláquia, na Polónia, onde está a ser implementado um programa de financiamento para pequenas instalações fotovoltaicas. Com uma ajuda ao investimento de 60 %, associada ao plano da Polónia de introduzir um sistema de medição do consumo líquido, é possível reduzir para metade os custos de eletricidade suportados pelos consumidores do país.

4.19.

Neste contexto, o Comité recomenda à Comissão, ao Conselho e ao Parlamento Europeu que tenham também mais em conta as evoluções a médio e longo prazo passíveis de se revelarem positivas para os consumidores, como, por exemplo, a eletromobilidade. Prevê-se que, nos próximos 20-30 anos, haja um número cada vez maior de carros elétricos no mercado. Um carro elétrico consome cerca de 14 kWh/100 km, o que com um preço de eletricidade de 0,25 cêntimos/kWh significa um custo de 3,50 euros. Uma viagem de 100 km efetuada com um veículo com um motor de combustão custa 8,40 euros (consumo de 7 l/100 km a um preço de 1,20 euros/litro). Uma instalação com cerca de 6 módulos fotovoltaicos é suficiente para produzir a eletricidade que um carro elétrico necessita para um percurso de 10 000 km. Ora, com um investimento de cerca de 3 000 euros seria possível produzir, numa instalação própria, a eletricidade necessária para alimentar um carro deste tipo durante 20 anos. Os aspetos financeiros da transição para a eletromobilidade — tanto no que toca aos cidadãos como às regiões — não têm sido suficientemente debatidos.

Bruxelas, 19 de outubro de 2016.

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Georges DASSIS


(1)  JO C 82 de 3.3.2016, p. 13.

(2)  JO C 424 de 26.11.2014, p. 64.

(3)  JO C 82 de 3.3.2016, p. 22.

(4)  JO C 341 de 21.11.2013, p. 21.


ANEXO

O seguinte contraparecer foi rejeitado a favor do parecer da secção adotado pela Assembleia, mas obteve pelo menos um quarto dos votos expressos.

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE espera que a nova configuração do mercado da eletricidade proposta pela Comissão Europeia, enquanto parte do pacote energético de outono/inverno, conduza à plena integração das fontes renováveis no mercado comum da energia elétrica, o que constitui um instrumento importante para o cumprimento dos compromissos da UE em matéria de proteção do clima.

1.2.

Esta proposta deve ter por objetivo garantir a fiabilidade e a segurança do aprovisionamento de energia elétrica a longo prazo e eliminar as atuais distorções no mercado, conduzindo a preços de eletricidade que garantirão a competitividade da economia europeia e que serão estáveis e acessíveis para os consumidores finais, inclusivamente para os grupos da população com rendimentos modestos.

1.3.

O CESE está convicto de que a nova configuração do mercado da eletricidade, na sua forma definitiva, permitirá reduzir ou eliminar os riscos de potenciais efeitos negativos sobre a pobreza energética.

1.4.

O CESE considera que o processo da transformação que fará evoluir o mercado da eletricidade para uma nova configuração está associado a riscos de impacto nos grupos vulneráveis de consumidores de eletricidade, nomeadamente os cidadãos.

1.5.

Segundo o CESE, os riscos associados à transformação do mercado da eletricidade, dotando-o de uma nova configuração, estão nomeadamente ligados à necessidade de reforçar substancialmente a capacidade das redes nacionais de transporte de eletricidade em 220/440 kW e a interligação das suas capacidades, de alargar a função das redes de distribuição à função atualmente desempenhada pelos sistemas de transmissão (por exemplo, assegurar a estabilidade da rede) e de as converter em sistemas «inteligentes», de resolver o problema do armazenamento de grandes capacidades de energia elétrica, de descentralizar a produção de eletricidade, de conectar a produção descentralizada à rede de distribuição e de alterar o papel e o comportamento dos consumidores de eletricidade no mercado.

1.6.

Trata-se de processos de transformação a longo prazo, cuja realização exigirá décadas, investimentos avultados que deverão atingir várias centenas de milhares de milhões de euros, bem como outras despesas comparáveis ligadas ao desenvolvimento de novas soluções técnicas, muitas vezes ainda desconhecidas.

1.7.

No que diz respeito à aplicação integral dos princípios do mercado, uma parte significativa desses custos será repercutida na componente regulamentada do preço da eletricidade, o que poderá ter efeitos negativos no decorrer do processo de transformação, empurrando os grupos vulneráveis da população para uma situação de pobreza energética.

2.   Introdução

2.1.

Em 14 de março de 2016, a Presidência eslovaca do Conselho da UE solicitou, por carta dirigida ao CESE, a elaboração de um parecer sobre a dimensão social da nova configuração do mercado da eletricidade na dinâmica do desenvolvimento económico e social.

2.2.

O CESE foi solicitado a analisar mais aprofundadamente os fatores que influenciam o mercado da eletricidade e a avaliar a sua influência na evolução dos preços da energia na UE, de modo que esta evolução seja sustentável, não apenas de um ponto de vista ambiental (em matéria de proteção do clima), mas também económico e social, e muito particularmente no que diz respeito à segurança e disponibilidade do aprovisionamento de eletricidade.

2.3.

No seu pedido, a Presidência eslovaca indicava que a nova configuração do mercado da eletricidade traz novas possibilidades para os consumidores, permitindo-lhes interagir com o mercado de forma mais ativa. Para além do impacto que o aumento dos preços da eletricidade poderá ter na competitividade da indústria da União, é todavia essencial ter em conta os eventuais perigos que esse aumento poderá representar para os consumidores socialmente vulneráveis.

2.4.

Em vários pareceres anteriormente emitidos, o CESE fez uma análise aprofundada da evolução esperada do mercado da energia e considera que as suas recomendações e conclusões não perderam atualidade. Por conseguinte, o presente parecer centra-se unicamente nos riscos que a nova configuração do mercado da eletricidade poderá representar para os grupos da população socialmente vulneráveis e nas manifestações específicas de pobreza energética em relação à acessibilidade da energia elétrica.

3.   Principais problemas com que o mercado da eletricidade da UE se confronta atualmente e riscos associados ao seu desenvolvimento a médio prazo

3.1.

Os principais problemas com que o mercado da eletricidade da UE se confronta atualmente podem resumir-se como se segue:

o mercado da eletricidade é objeto de uma importante distorção;

os investimentos em equipamento no que respeita às novas fontes de energia reguláveis não são suficientes;

o desenvolvimento das infraestruturas de transporte é negligenciado em benefício do crescimento das fontes de energia renováveis;

a segurança e a fiabilidade do aprovisionamento de eletricidade são cada vez menores e encontram-se ameaçadas;

a inexistência de uma coordenação eficaz das políticas energéticas nacionais, embora se reconheça que esta coordenação deve assumir a forma de uma cooperação e coordenação à escala das regiões transnacionais com base nas condições reais que prevalecem nos mercados existentes;

a distorção do mercado da eletricidade agrava-se em virtude de uma integração ineficaz dos mercados.

3.2.

Um outro fator negativo significativo da disfunção que atinge na prática os mercados da eletricidade na UE prende-se com o facto de que determinados aglomerados importantes de fontes de energia renováveis se encontram geograficamente afastados das zonas com um elevado consumo de eletricidade; a isto acresce a insuficiência das capacidades de transporte ao nível dos Estados-Membros. A produção não controlada de eletricidade, nomeadamente a partir da energia eólica, dá origem, quando ocorrem picos temporários, a um desvio da eletricidade para os Estados vizinhos, o que provoca posteriormente situações de crise nas redes de transporte com um risco elevado de colapso geral.

3.3.

Em vários Estados-Membros, como reação à instabilidade do aprovisionamento a partir de fontes renováveis, são introduzidos mecanismos de capacidade, acompanhados de determinados elementos discriminatórios, como, por exemplo, uma orientação para tecnologias de produção de eletricidade previamente selecionadas ou a exclusão dos fornecimentos transfronteiras. O novo modelo de mercado da eletricidade deveria ter em conta e colmatar as lacunas existentes, sendo, contudo, essencial aumentar a qualidade das infraestruturas elétricas da UE.

3.4.

As redes de transporte dos Estados-Membros não asseguram a cobertura operacional de uma carência local de recursos entre os Estados-Membros; afigura-se desde logo problemático prosseguir a integração do mercado da eletricidade nas circunstâncias atuais. Na Europa existem alguns mercados regionais de eletricidade que não cooperam entre si e cuja ação não é suficientemente coordenada.

3.5.

A interconexão destes mercados realiza-se de forma progressiva em conformidade com a legislação em vigor (códigos de rede). Atualmente, ainda se verificam diferenças consideráveis entre estes mercados, tanto em termos de segurança operacional como do nível de preços a que são fornecidos os produtos e os serviços. Este processo de integração será muito difícil, ainda que imprescindível.

3.6.

Vários Estados-Membros, para dar resposta aos problemas de integração das fontes renováveis intermitentes nos seus sistemas energéticos, recorrem a mecanismos de capacidade que asseguram a fiabilidade e a disponibilidade do aprovisionamento de eletricidade em períodos de indisponibilidade das fontes renováveis devido à sua dependência das condições naturais. Este recurso aos mecanismos de capacidade assume a forma de mercados de capacidade ou de reservas estratégicas. Enquanto as reservas estratégicas são, por natureza, neutras para o mercado da eletricidade, devendo merecer a preferência enquanto solução favorável do ponto de vista do mercado, os mercados de capacidade apresentam o risco de distorções do mercado.

3.7.

A perspetiva da situação energética para os próximos vinte anos é um fator importante que terá influência na forma definitiva da nova configuração do mercado da eletricidade, bem como, naturalmente, no impacto nos consumidores vulneráveis. A este respeito, é necessário ter em conta os seguintes fatores:

3.7.1.

Face à evolução do contexto energético na UE nos últimos dez anos, torna-se necessário encontrar urgentemente uma solução com base numa reflexão estratégica objetiva. A fiabilidade de um aprovisionamento de eletricidade sustentável a preços aceitáveis ou acessíveis não deve ser somente matéria de grandes discursos, mas sim estar solidamente assente nos três pilares fundamentais do desenvolvimento sustentável. Por si só, a renovação das redes exigirá provavelmente um investimento de 655 mil milhões de dólares americanos.

3.7.2.

No período compreendido entre 2016 e 2025, cerca de 150 GW de capacidade térmica, ou seja, um quarto das capacidades térmicas atuais da UE, chegarão ao fim da sua vida útil. Para assegurar a manutenção de um sistema de produção de eletricidade adequado e o aprovisionamento dos consumidores, será necessário construir novas centrais térmicas de potência estável que representem uma capacidade instalada de 100 GW, sabendo que, até 2035, as fontes fósseis serão responsáveis por uma capacidade de 200 GW, mesmo que se verifiquem as hipóteses em matéria de desenvolvimento tecnológico, tanto no domínio da eficiência energética como no do armazenamento da energia elétrica.

3.7.3.

No entanto, no presente contexto do mercado da eletricidade, não é possível investir em tais capacidades de produção e, para garantir a segurança energética, serão necessárias reformas de fundo sistémicas, a fim de assegurar uma estrita aplicação dos mecanismos de mercado e, em simultâneo, reduções nos preços para o consumidor final.

O contraparecer foi rejeitado por 141 votos a contra, 91 a favor e 22 abstenções.


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