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Document 62012TJ0265

Acórdão do Tribunal Geral (Nona Secção) de 29 de fevereiro de 2016.
Schenker Ltd contra Comissão Europeia.
Concorrência — Acordos, decisões e práticas concertadas — Serviços de transitário aéreo internacional — Decisão que declara uma infração ao artigo 101.° TFUE — Fixação dos preços — Sobretaxas e mecanismos de tarifação com incidência no preço final — Elementos de prova contidos num pedido de imunidade — Proteção da confidencialidade das comunicações entre advogados e clientes — Regras deontológicas relativas a um dever de lealdade e a uma proibição de dupla representação — Obrigações fiduciárias — Afetação do comércio entre Estados‑Membros — Imputabilidade do comportamento ilícito — Escolha das sociedades — Coimas — Proporcionalidade — Gravidade da infração — Circunstâncias atenuantes — Igualdade de tratamento — Cooperação — Transação — Orientações para o cálculo do montante das coimas de 2006.
Processo T-265/12.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2016:111

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Nona Secção)

29 de fevereiro de 2016 ( *1 )

«Concorrência — Acordos, decisões e práticas concertadas — Serviços de transitário aéreo internacional — Decisão que declara uma infração ao artigo 101.o TFUE — Fixação dos preços — Sobretaxas e mecanismos de tarifação com incidência no preço final — Elementos de prova contidos num pedido de imunidade — Proteção da confidencialidade das comunicações entre advogados e clientes — Regras deontológicas relativas a um dever de lealdade e a uma proibição de dupla representação — Obrigações fiduciárias — Afetação do comércio entre Estados‑Membros — Imputabilidade do comportamento ilícito — Escolha das sociedades — Coimas — Proporcionalidade — Gravidade da infração — Circunstâncias atenuantes — Igualdade de tratamento — Cooperação — Transação — Orientações para o cálculo do montante das coimas de 2006»

No processo T‑265/12,

Schenker Ltd, com sede em Feltham (Reino Unido), representada por F. Montag, B. Kacholdt, F. Hoseinian, advogados, D. Colgan e T. Morgan, solicitors,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada inicialmente por A. Dawes e N. von Lingen, e em seguida por Dawes e G. Meessen, na qualidade de agentes, assistidos por B. Kennelly e H. Mussa, barristers,

recorrida,

que tem por objeto um pedido de anulação da Decisão C(2012) 1959 final da Comissão, de 28 de março de 2012, relativa a um processo de aplicação do artigo 101.o [TFUE] e do artigo 53.o do Acordo EEE (processo COMP/39462 — Serviços de transitário), na medida em que diz respeito à recorrente, bem como um pedido de reforma da coima que lhe foi imposta no âmbito da mesma,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção),

composto por: G. Berardis, presidente, O. Czúcz (relator) e A. Popescu, juízes,

secretário: C. Kristensen, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 24 de setembro de 2014,

profere o presente

Acórdão

Antecedentes do litígio e decisão recorrida

1

Através da Decisão C(2012) 1959 final, de 28 de março de 2012, relativa a um processo de aplicação do artigo 101.o [TFUE] e do artigo 53.o do Acordo EEE (processo COMP/39462 — Serviços de transitário) (a seguir «decisão recorrida»), a Comissão Europeia constatou que sociedades que operavam no setor dos serviços de transitário aéreo internacional tinham, durante períodos compreendidos entre 2002 e 2007, participado em diversos acordos e práticas concertadas no setor dos serviços de transitário aéreo internacional, dando lugar a quatro infrações distintas ao artigo 101.o, n.o 1, TFUE e ao artigo 53.o, n.o 1, do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (EEE).

2

A recorrente, Schenker Ltd, é detida pela Deutsche Bahn AG (a seguir «DB»), uma sociedade anónima de direito alemão integralmente detida pela República Federal da Alemanha. A DB é a sociedade de topo de um grupo de sociedades (a seguir «grupo DB») que prestam serviços nos domínios da mobilidade e da logística em todo o mundo. Sob a marca DB Schenker, designadamente através do grupo de sociedades Schenker, que compreende várias entidades, entre as quais a recorrente, o grupo DB fornece, nomeadamente, serviços de transitário aéreo. [confidencial] ( 1 ) The Brink’s Company (a seguir «Brink’s») vendeu à DB um grupo de sociedades dirigido pela Bax Global Inc., de que fazia parte designadamente a Bax Global Ltd (UK). Após as suas atividades terem sido transferidas para a recorrente, a Bax Global (UK) cessou as suas atividades e deixou de existir.

3

O presente processo apenas diz respeito a uma das quatro infrações mencionadas no n.o 1 supra, a saber, o acordo relativo ao novo sistema de exportação («new export system», a seguir «NES»). Não diz respeito ao acordo relativo ao fator de ajustamento monetário («currency adjustment factor», a seguir «CAF»), ao acordo relativo ao sistema de manifesto prévio («advanced manifest system», a seguir «AMS») nem ao acordo relativo à sobretaxa da época alta («peak season surcharge», a seguir «PSS»). Na medida em que, através da decisão recorrida, a Comissão puniu outras sociedades do grupo DB pela respetiva participação nos acordos relativos ao CAF, à AMS e à PSS, essas sociedades interpuseram um recurso distinto, que é objeto do processo T‑267/12.

4

Os acordos mencionados no n.o 3 supra dizem respeito ao mercado dos serviços de transitário internacional por avião. Segundo a descrição que a Comissão deu desse setor nos considerandos 3 a 71 da decisão recorrida, os serviços de transitário podem ser definidos como a organização do transporte de bens (o que pode também incluir atividades como o desalfandegamento, o armazenamento, ou serviços de assistência em terra), em nome dos clientes segundo as suas necessidades. Os serviços de transitário são segmentados entre serviços de transitário interno e de transitário internacional e entre serviços de transitário aéreo, de transitário terrestre e de transitário marítimo (considerando 3 da decisão recorrida).

5

A descrição que a Comissão deu do acordo relativo ao NES nos considerandos 92 a 114 da decisão recorrida pode ser resumida da seguinte forma: o NES é um sistema de pré‑desalfandegamento para as exportações do Reino Unido para os países exteriores ao EEE, lançado pelas autoridades do Reino Unido em 2002. No decurso de uma reunião, um grupo de transitários concordou introduzir uma sobretaxa para as declarações NES, concertou‑se sobre os níveis da sobretaxa e sobre o calendário da sua aplicação. Na sequência dessa reunião, esses transitários trocaram vários correios eletrónicos a fim de acompanhar a execução do acordo. Os contactos anticoncorrenciais duraram de 1 de outubro de 2002 e 10 de março de 2003.

6

As discussões sobre o acordo relativo à AMS e ao controlo da sua implementação tiveram lugar nomeadamente no quadro da associação Freight Forward International (denominada Freight Forward Europe até 1 de janeiro de 2004, a seguir «associação FFI»).

7

Resulta do considerando 72 da decisão recorrida que a Comissão começou a sua investigação na sequência do pedido de imunidade apresentado pela Deutsche Post AG (a seguir «DP») ao abrigo da Comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2006, C 298, p. 17, a seguir «comunicação sobre a cooperação de 2006»). A DP completou o seu pedido de imunidade com declarações e provas documentais apresentadas em junho e em setembro de 2012. Por carta de 24 de setembro de 2007, a Comissão concedeu imunidade condicional à DP em relação a um pretenso cartel entre fornecedores privados de serviços de transitário internacional, destinado a fixar ou a repercutir diversos direitos e sobretaxas.

8

A Comissão procedeu a inspeções inopinadas entre 10 e 12 de outubro de 2007.

9

[confidencial] A DB e as suas filiais apresentaram um pedido de imunidade ou, a título subsidiário, um pedido de redução do montante da coima ao abrigo da clemência (considerando 76 da decisão recorrida).

10

Em 5 de fevereiro de 2010, a Comissão enviou uma comunicação de acusações à recorrente, ao qual esta respondeu (considerandos 87 e 89 da decisão recorrida).

11

Entre 6 e 9 de julho de 2010, a Comissão organizou uma audição, na qual a recorrente participou (considerando 89 da decisão recorrida).

12

Na decisão recorrida, à luz das provas de que dispunha, a Comissão considerou que, enquanto sucessora económico da Bax Global (UK), a recorrente era responsável pela participação desta última no acordo relativo ao NES.

13

No artigo 1.o, n.o 1, alínea a), da decisão recorrida, a Comissão constatou que, no que respeita ao acordo relativo ao NES, enquanto sucessora económico da Bax Global (UK), a recorrente tinha infringido o artigo 101.o TFUE e o artigo 53.o do Acordo EEE por ter participado, de 1 de outubro de 2002 a 10 de março de 2003, numa infração única e continuada no setor dos serviços de transitário aéreo no território do Reino Unido, que consistia na fixação dos preços ou de outras condições comerciais. O artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da decisão recorrida dispõe que, por esta infração, é aplicada à recorrente uma coima no montante de 3673000 euros. A recorrente não beneficiou de uma redução do montante da sua coima pela sua cooperação com a Comissão.

14

Resulta do considerando 856 da decisão recorrida que o montante da coima aplicada foi calculado com base nas Orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.o 2, alínea a), do artigo 23.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 (JO 2006, C 210, p. 2) (a seguir «orientações de 2006»).

Tramitação processual no Tribunal Geral e pedidos das partes

15

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de junho de 2012, a recorrente interpôs o presente recurso.

16

Sob proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Nona Secção) decidiu iniciar a fase oral do processo e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.o do seu Regulamento de Processo de 2 de maio de 1991, colocou questões escritas às partes, convidando‑as a responder‑lhes. As partes satisfizeram este pedido no prazo fixado.

17

Por carta de 5 de setembro de 2014, a recorrente apresentou as suas observações sobre o relatório para audiência.

18

Foram ouvidas as alegações das partes e as suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 24 de setembro de 2014.

19

A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

anular o artigo 1.o, n.o 1, alínea a), da decisão recorrida;

anular integralmente ou, a título subsidiário, reduzir o montante da coima fixada no artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da decisão recorrida;

condenar a Comissão nas despesas.

20

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

negar provimento ao recurso;

condenar a recorrente nas despesas.

Questão de direito

21

Em apoio do seu recurso, a recorrente invoca sete fundamentos.

22

O primeiro fundamento é relativo, por um lado, à violação dos artigos 4.° e 7.° e do artigo 27.o, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras da concorrência estabelecidas nos artigos [101.° TFUE] e [102.° TFUE] (JO 2003, L 1, p. 1), dos direitos de defesa e do direito a um processo equitativo e, por outro, à violação do princípio da boa administração. Em substância, a recorrente sustenta que as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP eram inadmissíveis.

23

No segundo fundamento, a recorrente alega que a Comissão não era competente para adotar uma decisão sobre o acordo relativo ao NES, uma vez que esse acordo tinha sido excluído da aplicação do direito da concorrência da União Europeia pelo artigo 1.o do Regulamento n.o 141 do Conselho, relativo à não aplicação do Regulamento n.o 17 do Conselho ao setor dos transportes (JO 1962, 124, p. 2751; EE 07 F1 p. 57).

24

No âmbito do terceiro fundamento, a recorrente sustenta que, ao declarar que o acordo relativo ao NES era suscetível de ter afetado o comércio entre Estados‑Membros de maneira sensível, a Comissão violou o artigo 101.o, n.o 1, TFUE, os artigos 4.° e 7.° do Regulamento n.o 1/2003 e o princípio da boa administração e não respeitou as Orientações sobre o conceito de afetação do comércio que figura nos artigos [101.° TFUE] e [102.° TFUE] (JO 2004, C 101, p. 81, a seguir «orientações de 2004»).

25

O quarto fundamento é relativo a uma violação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE, do artigo 296.o TFUE e do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, dos artigos 4.°, 7.° e 23.°, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 e dos princípios da responsabilidade pessoal e da boa administração, na medida em que apenas a recorrente foi considerada responsável pelo comportamento da Bax Global (UK).

26

Através do quinto fundamento, por um lado, a recorrente sustenta que, ao fixar o montante da coima com base num volume de negócios que excedia o montante teórico máximo que poderia ter sido gerado pelo acordo relativo ao NES, a Comissão violou o artigo 23.o, n.os 2 e 3, do Regulamento n.o 1/2003, o princípio da proporcionalidade, o princípio da adequação da pena à infração, o princípio nulla poena sine culpa e o princípio da boa administração, não respeitou as orientações de 2006 e cometeu erros de apreciação. Por outro lado, alega que a Comissão violou o artigo 27.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1/2003 e os direitos de defesa.

27

No sexto fundamento, a recorrente alega que, ao avaliar os pedidos de imunidade e de redução do montante da coima, a Comissão violou o artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, bem como o princípio da igualdade de tratamento, não respeitou a comunicação sobre a cooperação de 2006 e cometeu um erro de apreciação.

28

O sétimo fundamento é relativo à violação pela Comissão do artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, bem como do princípio da igualdade de tratamento e de um erro de apreciação ao recusar iniciar discussões para chegar a uma transação em conformidade com a Comunicação da Comissão relativa à condução de procedimentos de transação para efeitos da adoção de decisões nos termos do artigo 7.o e do artigo 23.o do Regulamento n.o 1/2003 do Conselho nos processos de cartéis (JO 2008, C 167, p. 1, a seguir «comunicação da Comissão relativa aos procedimentos de transação»).

29

Nos seus articulados, a recorrente precisa que os quatro primeiros fundamentos são invocados em apoio do pedido de anulação do artigo 1.o, n.o 1, alínea a), da decisão recorrida e visam, «consequentemente», também a anulação do artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da decisão recorrida. O quinto a sétimo fundamentos e, a título subsidiário, o quarto fundamento são invocados em apoio do pedido de anulação do artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da decisão recorrida.

30

A recorrente pede igualmente ao Tribunal que faça uso da sua competência de plena jurisdição, tendo o quinto a sétimo fundamentos sido expressamente suscitados em apoio desse pedido. Por outro lado, no âmbito do quarto fundamento, a recorrente pede que, no exercício da sua competência de plena jurisdição, o Tribunal reduza o montante da coima.

31

Neste contexto, há que recordar que a fiscalização da legalidade das decisões adotadas pela Comissão é completada pela competência de plena jurisdição que é reconhecida ao juiz da União pelo artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003, em conformidade com o artigo 261.o TFUE.

32

Esta competência habilita o juiz, para além da simples fiscalização da legalidade da sanção, a substituir a apreciação da Comissão pela sua própria apreciação e, consequentemente, a suprimir, reduzir ou aumentar o montante da coima ou da sanção pecuniária compulsória aplicada. Sempre que as considerações nas quais a Comissão se baseou para fixar o montante da coima ou da sanção pecuniária compulsória aplicada padecerem de ilegalidade, mas que o seu montante final deva ser considerado adequado, a competência de plena jurisdição habilita o juiz a manter o montante da coima.

33

Por conseguinte, cabe ao Tribunal Geral, no âmbito da sua competência de plena jurisdição, apreciar, na data em que adota a sua decisão, se foi aplicada à recorrente uma coima cujo montante reflete corretamente a gravidade e a duração da infração em causa (v., neste sentido, acórdão de 27 de setembro de 2012, Shell Petroleum e o./Comissão, T‑343/06, Colet., EU:T:2012:478, n.o 117 e jurisprudência referida).

34

Importa, porém, salientar que o exercício da competência de plena jurisdição não equivale a uma fiscalização oficiosa e recordar que o processo nas jurisdições da União é contraditório (acórdão de 8 de dezembro de 2011, KME Germany e o./Comissão, C‑389/10 P, Colet., EU:C:2011:816, n.o 131).

1. Quanto ao primeiro fundamento, relativo, por um lado, à violação dos artigos 4.°, 7.° e 27.°, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, dos direitos de defesa e do direito a um processo equitativo e, por outro, à violação do princípio da boa administração

35

O presente fundamento tem por objeto a conclusão da Comissão, que figura no considerando 658 da decisão recorrida, segundo a qual a Comissão tinha o direito de utilizar as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP.

36

Articula‑se em duas partes. Em primeiro lugar, a recorrente sustenta que, ao utilizar as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP, a Comissão violou os artigos 4.°, 7.° e 27.°, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, os direitos de defesa e o direito a um processo equitativo. Em segundo lugar, alega que a Comissão violou o princípio da boa administração ao não ter devidamente em conta os argumentos por ela apresentados no procedimento administrativo.

Quanto à primeira parte, relativa à violação dos artigos 4.°, 7.° e 27.°, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, dos direitos de defesa e do direito a um processo equitativo

37

A recorrente alega que, ao utilizar as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP, a Comissão violou os artigos 4.°, 7.° e 27.°, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, os direitos de defesa e o direito a um processo equitativo, reconhecidos pelo direito da União e consagrados no artigo 47.o e no artigo 48.o, n.o 2, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, bem como no artigo 6.o da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950.

38

Segundo a recorrente, no caso em apreço, a Comissão não tinha o direito de utilizar as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP, deveria ter encerrado o inquérito ou, pelo menos, deveria ter afastado essas informações e esses elementos do processo. Em primeiro lugar, o escritório de advogados C. que assistiu a DP na elaboração e na apresentação do referido pedido violou o segredo profissional e a proibição de dupla representação ou o princípio da lealdade relativamente a antigos clientes. Segundo a recorrente, esse escritório de advogados desempenhou um papel duplo. Por um lado, foi o consultor jurídico da associação FFI e dos seus membros individuais, entre os quais ela própria. Por outro lado, ao mesmo tempo ou, pelo menos, pouco tempo depois de ter posto termo a essa relação, quando na verdade tinha sempre estado sujeito a obrigações legais resultantes da sua função de consultor jurídico da associação FFI e dos seus membros individuais, o referido escritório assistiu a DP, pelo menos a partir de 27 de julho de 2006, a recolher, compilar, analisar e submeter informações indicando eventuais violações das regras da concorrência da União a várias autoridades da concorrência, entre as quais a Comissão. Em segundo lugar, a DP violou as suas obrigações fiduciárias enquanto presidente e secretária da associação FFI. A razão pela qual essa empresa optou por ser assistida pelo escritório de advogados C. terá sido sem dúvida nenhuma que pretendia beneficiar das relações especiais que uniam esse consultório à associação FFI e das informações confidenciais que este assim detinha. Dado que os comportamentos relativos à AMS, nos quais membros da associação FFI estavam envolvidos, por um lado, e ao NES, por outro, estavam estreitamente ligados, a Comissão também não tinha o direito de utilizar as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP no que respeita ao acordo relativo ao NES.

39

A Comissão contesta estes argumentos. Em especial, afirma que, ao alegar, na réplica, que o direito da União prevê uma proibição de um advogado utilizar os conhecimentos e as informações obtidas junto do seu cliente em detrimento deste último, a recorrente apresenta um fundamento novo, que deve ser considerado inadmissível.

40

A este propósito, deve recordar‑se que o princípio que prevalece em direito da União é o da livre administração das provas (acórdão de 8 de julho de 2004, Dalmine/Comissão, T‑50/00, Colet., EU:T:2004:220, n.o 72).

41

Em princípio, nenhuma disposição nem nenhum princípio geral do direito da União proíbe a Comissão de invocar, contra uma empresa, declarações de outras empresas incriminadas. Com efeito, se não fosse esse o caso, o ónus da prova de comportamentos contrários aos artigos 101.° TFUE e 102.° TFUE, que incumbe à Comissão, seria insustentável e incompatível com a missão de vigilância da boa aplicação dessas disposições que lhe é atribuída pelo Tratado FUE (acórdão de 8 de julho de 2004, JFE Engineering e o./Comissão, T‑67/00, T‑68/00, T‑71/00 e T‑78/00, Colet., EU:T:2004:221, n.o 192).

42

Todavia, os poderes de que a Comissão dispõe durante as fases prévias de inquérito e de obtenção de informações devem ser conciliados com o respeito dos direitos fundamentais e com os princípios gerais do direito da União, que se aplicam em todos os procedimentos de aplicação das regras da concorrência da União.

43

É à luz desta jurisprudência e destes princípios que há que examinar as alegações baseadas, em primeiro lugar, numa violação do segredo profissional, em segundo lugar, na proibição da dupla representação e no princípio da lealdade e, em terceiro lugar, nas obrigações fiduciárias da DP.

Quanto à alegação relativa à violação do segredo profissional

44

A recorrente alega que, tendo o escritório de advogados C. violado o segredo profissional, as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP são inadmissíveis e não deveriam ter sido utilizados pela Comissão.

45

Neste contexto, há que recordar que a confidencialidade das comunicações entre advogados e clientes é objeto de proteção ao nível do direito da União (v., neste sentido, acórdão de 18 de maio de 1982, AM & S Europe/Comissão, 155/79, Colet., EU:C:1982:157, n.os 18 a 28).

46

Assim, no que se refere às medidas de inquérito da Comissão relativas às comunicações entre advogados e clientes, resulta de jurisprudência assente que a proteção da sua confidencialidade se opõe a que esta tome conhecimento do seu conteúdo. Por outro lado, na hipótese de ter tomado conhecimento, a proteção da sua confidencialidade opõe‑se a que baseie uma decisão que aplica uma coima por uma infração ao direito da concorrência da União nessas comunicações (v., neste sentido, acórdão de 17 de setembro de 2007, Akzo Nobel Chemicals e Akcros Chemicals/Comissão, T‑125/03 e T‑253/03, Colet., EU:T:2007:287, n.os 86 a 88 e jurisprudência referida).

47

A recorrente alega que, no caso em apreço, a proteção da confidencialidade das comunicações entre advogados e clientes se opunha igualmente a que a Comissão utilizasse as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP. Dado que a confidencialidade das comunicações entre advogados e clientes deve permitir a estes últimos confiar‑se aos seus advogados com toda a franqueza, sem recear uma divulgação posterior das suas comunicações que os poderia prejudicar, as referidas comunicações deveriam ser protegidas não apenas relativamente a medidas de inquérito da Comissão mas também relativamente a uma divulgação por um advogado em violação do segredo profissional.

48

A este respeito, basta salientar que resulta do considerando 658 da decisão recorrida que o conjunto das informações e dos elementos de prova que a DP apresentou no seu pedido de imunidade estava à disposição de todos os membros da associação FFI. Por conseguinte, segundo as constatações da Comissão, as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP estavam à disposição desta última, independentemente de uma violação, pelo escritório de advogados C., do segredo profissional.

49

A recorrente não apresenta nenhum argumento suscetível de pôr em causa esta conclusão. Com efeito, não se pode deixar de observar que, apesar de a empresa à qual pertence ser membro da associação FFI e de, portanto, estar bem colocada para verificar a justeza dessa constatação da Comissão, a recorrente não identifica nenhum elemento no pedido de imunidade da DP como tendo sido divulgado pelo escritório de advogados C. em violação do segredo profissional, limitando‑se a alegar que a razão pela qual a DP optou por fazer‑se assistir pelo escritório de advogados C. para a preparação do seu pedido de imunidade não poderia senão ter sido que pretendia «beneficiar das circunstâncias privilegiadas» relativas à ligação anterior entre esse escritório e a associação FFI e os seus membros.

50

Por conseguinte, há que rejeitar a alegação relativa à violação do segredo profissional, não sendo necessário pronunciar‑se sobre a questão de saber se a proteção da confidencialidade das comunicações entre advogados e clientes se opõe a que a Comissão utilize documentos que lhe foram apresentados por uma empresa após terem sido divulgados a essa empresa por um advogado em violação do segredo profissional.

Quanto à alegação relativa à violação da proibição da dupla representação e do princípio da lealdade

51

A recorrente alega que os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP eram inadmissíveis pelo facto de, ao assistir a DP no que respeita à preparação e à apresentação do seu pedido de imunidade, o escritório de advogados C. ter violado a proibição de dupla representação e o princípio da lealdade previstos na Carta dos princípios essenciais do advogado europeu e no Código Deontológico dos advogados europeus do Conseil des barreaux européens.

52

A este respeito, em primeiro lugar, há que observar que não existem, no direito da União, disposições que prevejam que a Comissão não tem o direito de utilizar informações e elementos de prova que lhe tenham sido submetidos por uma empresa num pedido de imunidade quando o advogado que assistiu essa empresa violou a proibição de dupla representação ou o dever de lealdade relativamente aos seus antigos clientes.

53

Em segundo lugar, atendendo a que os direitos fundamentais e os princípios gerais do direito da União devem ser respeitados pela Comissão igualmente durante as fases prévias de inquérito e de obtenção de informações (v. n.o 42 supra), há que analisar se a Comissão podia legitimamente utilizar as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP.

54

Neste contexto, a título preliminar, há que salientar que a proibição de dupla representação e o dever de lealdade invocados pela recorrente visam não apenas garantir a independência e a lealdade dos advogados mas também evitar que estes se vejam numa situação em que, em razão de um conflito entre os interesses dos seus diferentes clientes, poderiam ser levados a violar o segredo profissional.

55

Ora, mesmo admitindo, por um lado, que as regras deontológicas invocadas pela recorrente devem ser consideradas como a expressão de princípios gerais comuns que devem ser tidos em conta no âmbito do procedimento na Comissão e, por outro, que o comportamento do escritório de advogados C. não foi conforme com estas regras, há que constatar que, nas circunstâncias do caso em apreço, a Comissão não cometeu um erro quando concluiu que tinha o direito de utilizar as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP.

56

Com efeito, como se expôs nos n.os 48 e 49 supra, nas circunstâncias do caso concreto, a Comissão tinha o direito de considerar que as informações e os elementos de prova contidos no referido pedido provinham da DP e não eram, portanto, o resultado de uma violação do segredo profissional pelo escritório de advogados C. Por outro lado, uma empresa não tem a obrigação de se fazer assistir ou representar por um advogado no que respeita à preparação e à apresentação de um pedido de imunidade. Tendo em conta estas circunstâncias, mesmo na dupla hipótese mencionada no n.o 55supra, a Comissão podia legitimamente utilizar as informações e os elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP. Neste contexto, importa igualmente observar que a violação, pelos advogados do escritório C., das regras deontológicas nacionais que lhes são aplicáveis poderia ser punida em aplicação do direito nacional.

57

Por conseguinte, há que rejeitar a alegação relativa à violação da proibição da dupla representação e do princípio da lealdade, sem que seja necessário pronunciar‑se sobre a questão de saber se tais princípios constituem a expressão dos princípios gerais comuns aos direitos dos Estados‑Membros que devem ser tidos em conta no âmbito do procedimento na Comissão e se o comportamento do escritório de advogados C. era conforme com estes princípios.

Quanto à alegação relativa à violação das obrigações fiduciárias da DP

58

A recorrente sustenta que o pedido de imunidade da DP era inadmissível, na medida em que esta violou as suas obrigações fiduciárias resultantes da sua posição de presidente e de secretário da associação FFI.

59

Em primeiro lugar, na medida em que, através desta alegação, a recorrente visa a própria decisão da DP de cooperar com a Comissão, há que rejeitá‑la. A este respeito, importa, antes de mais, recordar que os poderes de que dispõe a Comissão durante as fases prévias de inquérito e de obtenção de informações não estão à disposição das empresas. Isto é sobretudo válido no que respeita à comunicação sobre a cooperação de 2006, tendo em conta que, através desta comunicação, a Comissão pretende incitar as empresas a revelar a existência de acordos ilícitos e a cooperar no seu inquérito, denunciando o comportamento das empresas que neles participaram.

60

Em segundo lugar, na medida em que tem unicamente por objeto a decisão da DP de ser assistida especificamente pelo escritório de advogados C., também há que rejeitar a presente alegação. Mesmo admitindo que, ao escolher fazer‑se assistir pelo escritório de advogados C., a DP tenha violado as suas obrigações fiduciárias, atendendo aos interesses em jogo no caso em apreço, isso não obstava a que a Comissão utilizasse as informações e os elementos de prova contidos no seu pedido de imunidade (v. n.o 56 supra). Neste contexto, há que recordar igualmente que, na hipótese de as obrigações fiduciárias invocadas pela recorrente não serem elas próprias de considerar proibidas e nulas em aplicação do artigo 101.o, n.o 2, TFUE, a violação das obrigações invocadas pela recorrente poderia, de qualquer modo, ser punida em aplicação do direito nacional.

61

Por conseguinte, há que rejeitar igualmente a terceira alegação, relativa à violação das obrigações fiduciárias da DP.

62

Assim, há que rejeitar a primeira parte do fundamento na totalidade, sem que seja necessário tomar posição sobre a alegação de inadmissibilidade formulada pela Comissão.

Quanto à segunda parte, relativa à violação do princípio da boa administração

63

A recorrente alega que a Comissão violou o princípio da boa administração ao não ter devidamente em conta os argumentos por si apresentados durante o procedimento administrativo, que tinham por objeto a violação do segredo profissional, da proibição de dupla representação, das obrigações de lealdade e das obrigações fiduciárias.

64

A Comissão contesta estes argumentos.

65

A título liminar, há que recordar que, no âmbito de um procedimento destinado a aplicar uma coima a empresas por violação do artigo 101.o TFUE, a Comissão não pode limitar‑se a analisar os elementos de prova apresentados pelas empresas, mas deve, no exercício do seu dever de boa administração, contribuir com os seus próprios meios para a prova dos factos e das circunstâncias pertinentes (v., neste sentido, acórdão de 13 de julho de 1966, Consten e Grundig/Comissão, 56/64 e 58/64, Colet., EU:C:1966:41, p. 501).

66

No caso em apreço, a Comissão teve em conta os argumentos relativos à violação do segredo profissional. Com efeito, como se expôs nos n.os 48 e 49 supra, examinou a proveniência das informações e dos elementos de prova contidos no pedido de imunidade da DP e declarou que estavam à disposição desta última, independentemente de uma violação, pelo escritório de advogados C., do segredo profissional. A recorrente não aduziu nenhum argumento suscetível de demonstrar que essas considerações da Comissão padeciam de um erro.

67

Por outro lado, quanto aos argumentos relativos a violações da proibição de dupla representação, do dever de lealdade e das obrigações fiduciárias da DP, basta recordar, remetendo para os n.os 51 a 61 supra, que, nas circunstâncias do caso em apreço, essas violações, mesmo supondo‑as provadas, não eram suscetíveis de impedir a Comissão de utilizar as informações. Portanto, a Comissão não era obrigada a examinar esses argumentos mais pormenorizadamente.

68

Atendendo às considerações precedentes, a segunda parte do primeiro fundamento deve igualmente ser rejeitada, e, portanto, também o primeiro fundamento na totalidade, sem que seja necessário responder à questão de saber se as violações invocadas pela recorrente, que diziam respeito ao acordo relativo à AMS, eram suscetíveis de afetar a legalidade da decisão recorrida a propósito do acordo relativo ao NES.

2. Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma violação do artigo 1.o do Regulamento n.o 141

69

O presente fundamento tem por objeto a conclusão da Comissão, que figura nos considerandos 644 a 648 da decisão recorrida, segundo a qual tinha o direito de se basear no Regulamento n.o 1/2003 para punir a recorrente pela participação da Bax Global (UK) no acordo relativo ao NES. Segundo a Comissão, esse acordo não estava excluído do âmbito de aplicação do Regulamento n.o 17 do Conselho, de 6 de fevereiro de 1962, Primeiro Regulamento de execução dos artigos [101.° TFUE] e [102.° TFUE] (JO 1962, 13, p. 204; EE 08 F1 p. 22), em virtude da exclusão para o transporte prevista no artigo 1.o do Regulamento n.o 141. Neste contexto, baseou‑se nomeadamente na consideração segundo a qual os participantes no acordo relativo ao NES coordenaram o respetivo comportamento a fim de reduzir os elementos de incerteza relativa aos diversos elementos de preços no setor dos serviços de transitário, tendo portanto sido os preços dos serviços de transitário que foram visados pelo referido acordo e não os serviços de transporte. Mesmo que os transitários tivessem tido relações contratuais com as companhias aéreas, essas relações teriam constituído a base para a prestação dos serviços de transporte aéreo, mas não para o fornecimento dos serviços de transitário objeto do acordo relativo ao NES.

70

A recorrente considera que estas considerações da Comissão estão erradas. Entende que, em aplicação do artigo 1.o do Regulamento n.o 141, esta última não tinha competência para adotar uma decisão sobre o acordo relativo ao NES.

71

Neste contexto, há que recordar que o Regulamento n.o 1/2003 na versão decorrente do Regulamento (CE) n.o 411/2004 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2004, que revoga o Regulamento (CEE) n.o 3975/87 e altera o Regulamento (CEE) n.o 3976/87 e o Regulamento n.o 1/2003, relativamente aos transportes aéreos entre a Comunidade e países terceiros (JO L 68, p. 1), no qual a Comissão baseou a decisão recorrida, aplica‑se ao transporte aéreo.

72

Todavia, por força da regulamentação em vigor antes de o Regulamento n.o 1/2003 ser aplicável, portanto, antes de 1 de maio de 2004, os acordos no domínio do transporte aéreo entre a Comunidade e os países terceiros estavam excluídos do âmbito de aplicação do Regulamento n.o 17. Com efeito, nos termos do artigo 1.o do Regulamento n.o 141, o Regulamento n.o 17 não se aplicava aos acordos no setor dos transportes que tivessem por objeto ou efeito a fixação dos preços e das condições de transporte, a limitação ou o controlo da oferta de transportes ou a repartição dos mercados de transportes. É certo que, no seu artigo 1.o, o Regulamento (CEE) n.o 3975/87 do Conselho, de 14 de dezembro de 1987, que estabelece o procedimento relativo às regras da concorrência aplicáveis às empresas do setor dos transportes aéreos (JO L 374, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CEE) n.o 2410/92 do Conselho, de 23 de julho de 1992 (JO L 240, p. 18), previa a supressão dessa isenção no caso dos transportes aéreos entre aeroportos da Comunidade, mas não no caso de transportes aéreos entre a Comunidade e os países terceiros.

73

No essencial, a recorrente alega que, dado que a participação da Bax Global (UK) no acordo relativo ao NES ocorreu antes de 1 de maio de 2004, estava excluída do âmbito de aplicação do Regulamento n.o 17 por força do artigo 1.o do Regulamento n.o 141. Segundo a recorrente, os serviços de transitário e os serviços de depósito NES fazem parte do processo de transporte e constituem, portanto, dos serviços de transporte na aceção do referido artigo. Em todo o caso, os serviços de transitário na sua totalidade e, mais especificamente, os que visam o NES, referem‑se diretamente o transporte aéreo. Por isso, a Comissão não tinha o direito de aplicar uma sanção por força do Regulamento n.o 1/2003.

74

Há que examinar, em primeiro lugar, os argumentos da recorrente relativos à interpretação do artigo 1.o do Regulamento n.o 141, antes de examinar os seus argumentos sobre a conclusão da Comissão segundo a qual o acordo relativo ao NES não visava os serviços de transporte, mas os serviços de transitário.

Quanto à interpretação do artigo 1.o do Regulamento n.o 141

75

A recorrente sustenta que o artigo 1.o do Regulamento n.o 141 visa excluir um domínio de atividades no interior do setor dos transportes, isto é, todas as atividades que fazem parte do processo de transporte, podendo o conceito de setor industrial ser mais ampla do que o do mercado em causa. Na apreciação das atividades excluídas ao abrigo deste artigo, deve ser tida em conta a natureza da atividade económica das empresas. Neste contexto, nenhuma distinção pode ser feita no que respeita aos diferentes níveis de atividade de uma empresa. Assim, no caso da Bax Global (UK), a Comissão não poderia ter distinguido a obtenção do espaço de carga junto dos transportadores, por um lado, e a oferta desse espaço aos carregadores, por outro. Por outro lado, a recorrente alega que o artigo 1.o do Regulamento n.o 141 deve ser aplicado a serviços ligados ao transporte, uma vez que esse artigo faz referência às «condições de transporte» e que o preâmbulo do referido regulamento faz referência aos acordos, decisões e práticas concertadas diretamente relacionados com a prestação de serviços de transporte.

76

A Comissão contesta estes argumentos.

77

A este respeito, a título liminar, há que recordar que, para ser excluído do âmbito de aplicação do Regulamento n.o 17 por força do artigo 1.o do Regulamento n.o 141, o comportamento de uma empresa deve ter por objeto ou por efeito restringir a concorrência num mercado de transporte. Nos termos do terceiro considerando do referido regulamento, só os comportamentos que digam diretamente respeito à prestação de serviços de transporte devem ser excluídos pelo referido artigo.

78

Por outro lado, deve recordar‑se que resulta da jurisprudência que não se pode considerar que o comportamento de uma empresa que não visa o próprio transporte aéreo, mas um mercado situado a montante ou a jusante deste, diga diretamente respeito à prestação de serviços de transporte, não sendo, portanto, excluído pelo artigo 1.o do Regulamento n.o 141 (v., neste sentido, acórdão de 17 de dezembro de 2003, British Airways/Comissão, T‑219/99, Colet., EU:T:2003:343, n.os 171 e 172).

79

Atendendo às considerações precedentes, a interpretação do artigo 1.o do Regulamento n.o 141 sugerida pela recorrente não pode ser acolhida.

80

Com efeito, a leitura do artigo 1.o do Regulamento n.o 141, segundo a qual esta disposição não se limita a excluir acordos que visam os serviços de transporte aéreo, mas exclui um conjunto de atividades no setor do transporte aéreo, não é conforme com a letra desta disposição, com o terceiro considerando do referido regulamento nem com a jurisprudência acima referida, dos quais resulta que o acordo deve visar diretamente a prestação de serviços de transporte aéreo.

81

Em seguida, contrariamente ao que afirma a recorrente, o artigo 1.o do Regulamento n.o 141 não exclui todas as atividades de uma empresa unicamente pelo facto de uma parte das suas atividades visar os serviços de transporte aéreo. Logo, mesmo que uma empresa procure serviços de transporte num mercado a montante, as suas atividades num mercado a jusante, que não visarem diretamente os serviços de transporte, não são excluídas ao abrigo do referido artigo.

82

Por outro lado, há que rejeitar a interpretação defendida pela recorrente de que o artigo 1.o do Regulamento n.o 141 exclui todos os serviços que têm uma relação direta com os serviços de transporte. Com efeito, como resulta das considerações que figuram no n.o 80 supra, esta disposição limita‑se a excluir os acordos que dizem diretamente respeito aos serviços de transporte, mas não exclui os acordos relativos aos serviços que têm uma relação direta com os serviços de transporte.

83

Além disso, na medida em que, em apoio da leitura do artigo 1.o do Regulamento n.o 141 que propõe, a recorrente invoca que este artigo faz referência às «condições de transporte», basta constatar que esta formulação se limita a clarificar que não só estão excluídos os acordos sobre os preços dos serviços de transporte como também os acordos que fixam as condições de transação na aceção do artigo 101.o, n.o 1, alínea a), TFUE. Todavia, contrariamente ao que alega a recorrente, não se pode concluir que os serviços que não sejam serviços de transporte, mas que tenham uma relação direta com estes, também estão excluídos da aplicação do Regulamento n.o 17.

Quanto aos serviços abrangidos pelo acordo relativo ao NES

84

A recorrente também põe em causa a afirmação da Comissão segundo a qual o acordo relativo ao NES visava os serviços de transitário enquanto lotes de serviços.

85

A este respeito, nomeadamente nos considerandos 3 a 6, 64 a 66, 614, 867 a 872 e 877 a 879 da decisão recorrida, a Comissão sublinhou que, do ponto de vista económico, os transitários transformavam os serviços de transporte e outros fatores de produção em serviços de transitário, que respondiam a uma procura específica dos seus clientes. Esta procura não seria satisfeita pelos serviços individuais que compõem os serviços de transitário. As sociedades de transitário oferecem um lote de serviços aos seus clientes que lhes permite expedir facilmente mercadorias, sem terem de se ocupar dos pormenores da organização do transporte. Estes serviços englobam os serviços de transporte aéreo, mas podem abranger igualmente serviços de entreposto, de manutenção de carga, de logística ou de transporte terrestre e as diligências aduaneiras e fiscais. Na hipótese de os carregadores serem obrigados a adquirir eles próprios os serviços individuais necessários para garantir que a mercadoria chegasse a bom porto, teriam, por um lado, de coordenar as diferentes operações por sua própria conta e risco e, por outro, não poderiam beneficiar das economias de escala que os transitários são capazes de obter através da consolidação das mercadorias dos seus diferentes clientes. Em contrapartida, os transitários pré‑financiam ou compram os serviços de terceiros que são necessários para o fornecimento de serviços de transitário por grosso e antecipadamente e estão em condições, agrupando por consolidação as mercadorias dos seus próprios clientes em carregamentos otimizados em termos de peso e de dimensões, de explorar economias de escala e de utilizar mais eficazmente estas capacidades do que poderia tê‑lo feito um dos seus clientes se tivesse tentado adquirir diretamente serviços de transporte aéreo ou serviços conexos a uma transportadora aérea, a uma sociedade de assistência em escala ou de entreposto. Para os clientes dos transitários, os serviços de transitário têm portanto um valor mais elevado do que os fatores de produção considerados individualmente.

86

Por outro lado, nomeadamente nos considerandos 129 e 130, 572, 645, 868, 869 e 872 da decisão recorrida, a Comissão considerou que, mesmo que, através do acordo relativo ao NES, os transitários não tenham chegado a um entendimento sobre a sobretaxa NES, esse acordo visava os serviços de transitário. Em primeiro lugar, neste contexto, baseou‑se na consideração segundo a qual a sobretaxa NES fazia parte do preço total que os clientes deviam pagar para o fornecimento de serviços de transitário. Em segundo lugar, salientou que os transitários que participaram no acordo relativo ao NES não eram simples fornecedores de serviços de depósito NES, não consideraram os terceiros não transitários que propõem serviços individuais de depósito NES concorrentes reais ou potenciais e não procuraram a implicar esses fornecedores no acordo relativo ao NES. Em terceiro lugar, observou que resultava dos elementos de prova de que dispunha que a decisão de um transitários de não repercutir fatores de risco e de custos sobre os seus clientes sob a forma de uma taxa adicional era suscetível de lhe conferir uma vantagem concorrencial no mercado dos serviços de transitário enquanto lotes de serviços. Caracterizando‑se o mercado dos serviços de transitário por margens de lucro reduzidas, um ligeiro aumento de preços ou a aplicação ou não de uma sobretaxa poderia desempenhar um papel decisivo na perda ou não de clientes por parte dos transitários, na manutenção ou não da sua base de clientes ou na aquisição ou não de novas oportunidades comerciais em detrimento dos seus concorrentes.

87

A recorrente entende que estas considerações são erradas.

88

Em primeiro lugar, afirma que a Comissão não teve em conta que os serviços de transporte estavam incluídos nos serviços de transitário e que, do ponto de vista dos clientes dos transitários, os serviços de transporte são muito importantes, uma vez que a organização do transporte enquanto tal, sem o transporte propriamente dito, não satisfaz as suas necessidades. A obrigação contratual dos transitários de carga para com os seus clientes vai além da simples organização do transporte de mercadorias da origem até ao destino. Do seu ponto de vista, o produto ou o serviço em causa é um espaço de carga, quer seja proposto por um transportador ou por um transitário.

89

A Comissão contesta estes argumentos.

90

Esta alegação deve ser rejeitada.

91

A este respeito, importa salientar que, na decisão recorrida, a Comissão não pôs em causa que, do ponto de vista dos clientes dos transitários, os serviços de transporte constituem um elemento importante dos serviços de transitário. Limitou‑se a concluir que, embora os serviços de transitário englobassem os serviços de transporte, deviam ser distinguidos destes. Por outro lado, na medida em que a recorrente alega que, do ponto de vista dos clientes dos transitários, os serviços que estes oferecem são espaços de carregamento, não se pode deixar de observar que se trata de um simples postulado e que a recorrente não apresenta nenhum argumento destinado a demonstrar que as considerações da Comissão expostas no n.o 85 supra, segundo as quais há que distinguir os serviços de transitário e os serviços de transporte, enfermam de erros.

92

Em segundo lugar, a recorrente sustenta, por um lado, que a Comissão não teve suficientemente em conta o facto de que alugava frequentemente aviões inteiros, o que lhe permitia determinar o destino e o horário dos serviços de transporte, e que suportava o risco económico ligado à exploração da capacidade de carregamento disponível. Por outro lado, os próprios transitários efetuam frequentemente os serviços de transporte, em parte ou integralmente. Assim, mesmo que alguns transportes possam ser rotulados de «transportes aéreos de carga», em curtas distâncias, ela própria efetua frequentemente tais transportes por via terrestre através da frota de veículos pesados de que dispõe.

93

A Comissão contesta estes argumentos.

94

Esta alegação deve igualmente ser rejeitada.

95

A este propósito, importa observar que a circunstância, invocada pela recorrente, de alugar aviões inteiros e suportar o risco económico ligado à exploração do carregamento disponível não permite considerar que o conjunto da sua atividade visa os serviços de transporte. De facto, na medida em que os transitários adquirem serviços de transporte aéreo às transportadores, a sua atividade visa o mercado do transporte aéreo. Todavia, como foi referido no n.o 81 supra, não basta que a recorrente tente adquirir serviços no mercado do serviço de transporte aéreo para que o conjunto da sua atividade seja excluído ao abrigo do artigo 1.o do Regulamento n.o 141. Ora, segundo as constatações da Comissão expostas nos n.os 85 e 86 supra, o acordo relativo ao NES não visava o mercado dos serviços de transporte, mas o mercado dos serviços de transitário, no qual os transitários oferecem serviços aos seus clientes e que se situa a jusante do mercado dos serviços de transporte. De qualquer modo, a recorrente não põe em causa a constatação da Comissão que figura no considerando 6 da decisão recorrida segundo a qual a maioria dos transitários não efetuam ele próprios transportes aéreos.

96

Por outro lado, o facto de, no âmbito da oferta dos serviços de transitário, a própria recorrente assegurar alguns ou a totalidade dos serviços de transporte por via terrestre em nada altera o facto de os serviços objeto do acordo relativo ao NES não serem serviços de transporte, mas serviços de transitário enquanto lotes de serviços.

97

Em terceiro lugar, a recorrente alega que as companhias aéreas negoceiam diretamente contratos de transporte aéreo com clientes importantes e que os transportadores podem elas próprias alugar aviões a fornecedores. Portanto, os transitários estão na realidade em concorrência direta com as companhias aéreas.

98

A Comissão contesta estes argumentos.

99

A este respeito, importa salientar que estes argumentos não são suscetíveis de pôr em causa a conclusão da Comissão segundo a qual os serviços de transitário devem ser distinguidos dos serviços de transporte, visto que, como lotes de serviços, respondem a uma procura específica de clientes, do ponto de vista dos quais, economicamente, os serviços de transitário não são substituíveis pelos serviços individuais de que se compõem. Com efeito, o facto de certos clientes importantes das transportadoras negociar diretamente contratos de transporte aéreo com as transportadoras não é suscetível de demonstrar que, para a maioria dos clientes dos transitários, pelas razões expostas no n.o 85 supra, os serviços individuais de que os serviços de transitário são compostos possam substituir, em termos económicos, os serviços de transitário.

100

Por outro lado, a recorrente não demonstra em que é que o facto de os transportadores alugarem aviões a fim de os explorarem para prestar serviços de transporte aéreo seria suscetível de pôr em causa a conclusão da Comissão segundo a qual os serviços objeto do acordo relativo ao NES eram os serviços de transitário que devem ser distinguidos dos serviços de transporte.

101

Esta alegação deve, portanto, ser rejeitada.

102

Em quarto lugar, a recorrente alega que a Comissão não teve em conta que as mercadorias não poderiam ser transportadas sem a declaração NES. Afirma que a Comissão aplicou um critério errado para determinar se existia uma relação direta entre os serviços de transitário (na sua totalidade ou apenas os que dizem respeito ao NES), por um lado, e o transporte aéreo, por outro. Dado que a declaração NES é uma condição prévia a uma atividade de transporte, a falta de apresentação dos documentos NES compromete a existência do transporte aéreo a partir do Reino Unido. Existe igualmente uma ligação com o transporte aéreo no que respeita aos serviços de transitário no seu conjunto.

103

A Comissão contesta estes argumentos.

104

A este respeito, há que observar que, no considerando 647 da decisão recorrida, a Comissão reconheceu que a observância do procedimento NES constituía um requisito legal para o transporte a partir do Reino Unido e que a inobservância desse procedimento seria suscetível de pôr em causa o transporte de mercadorias. A Comissão teve portanto em consideração a importância dos serviços de depósito NES para os serviços de transporte.

105

Por outro lado, importa assinalar que os argumentos apresentados pela recorrente, relativos a uma relação entre o procedimento NES e os serviços de transporte e a uma relação entre os serviços de trânsito transitário e os serviços de transitário, não são suscetíveis de pôr em causa a procedência das consideração da Comissão. Com efeito, o acordo relativo ao NES tinha por objeto os serviços de transitário e o artigo 1.o do Regulamento n.o 141 apenas exclui os acordos que têm diretamente por objeto os serviços de transporte (v. n.o 82 supra), mas não os que têm por objeto serviços relacionados com os serviços de transporte. Portanto, as relações entre o procedimento NES e os serviços de transporte aéreo a partir do Reino Unido e as relações entre os serviços de transporte e os serviços de transitário não são suscetíveis de pôr em causa a conclusão da Comissão segundo a qual o acordo relativo ao NES não estava excluído.

106

Por conseguinte, esta alegação deve ser rejeitada, sem que seja necessário examinar se as considerações adicionais da Comissão que figuram no considerando 647 da decisão recorrida, segundo as quais, por um lado, a inexistência de serviços de transitário ou a não execução do procedimento NES não compromete a existência dos serviços de transporte aéreo enquanto tais e, por outro, o serviço relativo ao procedimento NES poderia ser fornecido por prestadores diferentes das companhias ou dos transitários, são pertinentes.

107

Em quinto lugar, a recorrente invoca o facto de as regras da Associação Internacional de Transportes Aéreos (IATA) se aplicarem não apenas às relações entre as transportadoras e os transitários mas também entre os transitários e os seus clientes.

108

A Comissão contesta estes argumentos.

109

A este respeito, basta salientar que o âmbito de aplicação das regras da IATA não é suscetível de pôr em causa a consideração da Comissão de que existia uma procura específica dos serviços de transitário enquanto lotes de serviços que, pelas razões expostas no n.o 85 supra, por razões económicas, os serviços individuais que compõem os serviços de transitário não substituem.

110

Por conseguinte, nenhum dos argumentos aduzidos pela recorrente é suscetível de demonstrar que a Comissão interpretou ou aplicou incorretamente o artigo 1.o do Regulamento n.o 141.

111

Por conseguinte, há que rejeitar o segundo fundamento na totalidade.

3. Quanto ao terceiro fundamento, relativo à falta de afetação sensível do comércio entre Estados‑Membros

112

O presente fundamento visa as considerações da Comissão que figuram no ponto 5.2.1.3 da decisão recorrida, segundo as quais o acordo relativo ao NES era suscetível de ter afetado sensivelmente as trocas comerciais entre os Estados‑Membros.

113

A recorrente entende que estas considerações não são conformes com o artigo 101.o, n.o 1, TFUE e com os artigos 4.° e 7.° do Regulamento n.o 1/2003 e que a Comissão não respeitou o princípio da boa administração nem as orientações de 2004.

114

Os argumentos que a recorrente apresenta no quadro do presente fundamento podem ser divididos em duas partes. Em primeiro lugar, a recorrente alega que, contrariamente ao entendimento da Comissão, o acordo relativo ao NES não incluía os serviços de transitário, mas apenas os serviços de depósito NES. Em segundo lugar, a recorrente alega que a conclusão da Comissão segundo a qual o referido acordo era suscetível de afetar sensivelmente o comércio entre Estados‑Membros era errada, uma vez que os efeitos desse acordo se limitaram ao Reino Unido, ou mesmo a algumas partes desse Estado‑Membro.

Quanto à primeira parte, respeitante aos serviços abrangidos pelo acordo relativo ao NES

115

A recorrente põe em causa a consideração da Comissão, que figura no considerando 614 da decisão recorrida, segundo a qual o acordo relativo ao NES visava os serviços de transitário. Entende que esta consideração é errada. O acordo relativo ao NES tem unicamente em vista os serviços de depósito NES. Os transitários concertaram‑se unicamente a propósito dos montantes da sobretaxa NES e a prestação de serviços de depósito NES é independente de qualquer contexto de transitário. Trata‑se de uma atividade distinta respeitante a uma regulamentação especial no Reino Unido, e portanto de um mercado de serviços distinto para efeitos do direito da concorrência.

116

Em primeiro lugar, a recorrente alega que a Comissão não apresentou provas suficientes para demonstrar que o acordo relativo ao NES afetava os serviços de transitário na sua totalidade. Limitou‑se a salientar que a sobretaxa NES estava incluída no preço total pago pelos clientes para a prestação de serviços de transitário. Ora, existem terceiros não transitários independentes que oferecem serviços de depósito NES. Contrariamente às afirmações da Comissão, a circunstância de esses terceiros não terem sido mencionados nos debates entre os transitários não é pertinente.

117

A Comissão contesta estes argumentos.

118

Assim, este argumento deve ser rejeitado.

119

A este respeito, importa salientar que, contrariamente ao que alega a recorrente, a Comissão não se limitou a sublinhar que a sobretaxa NES estava incluída no preço total pago pelos seus clientes para a prestação de serviços de transitário.

120

Com efeito, por um lado, as considerações em que a Comissão baseou a sua conclusão de que os serviços de transitário enquanto lotes de serviços constituíam um mercado que devia ser distinguido dos mercados para os serviços individuais de que eram constituídas já foram expostas no n.o 85 supra.

121

Além disso, como já foi desenvolvido no n.o 86 supra, a conclusão da Comissão segundo a qual o acordo relativo ao NES visava os serviços de transitário não se baseava unicamente na consideração de que a sobretaxa NES fazia parte do preço total que os clientes deviam pagar para o fornecimento dos serviços de transitário. Com efeito, como a Comissão referiu, em primeiro lugar, todas as empresas que participaram no acordo relativo ao NES eram transitários e nenhuma delas era um simples fornecedor de serviços de depósito NES, em segundo lugar, estas empresas não tinham considerado esses fornecedores como concorrentes reais ou potenciais, em terceiro lugar, não procuraram implicá‑las no acordo relativo ao NES e, em quarto lugar, a decisão de um transitário de não repercutir os fatores de risco e de custos sobre os seus clientes sob a forma de uma taxa adicional era suscetível de lhe conferir uma vantagem concorrencial no mercado dos serviços de transitário.

122

Por conseguinte, o acordo relativo ao NES não tinha por objetivo restringir a concorrência relativa aos serviços de depósito NES enquanto serviços individuais, mas a concorrência relativa aos serviços de transitário enquanto lotes de serviços.

123

Por outro lado, é verdade que o facto de terceiros não transitários oferecerem serviços de depósito NES e a circunstância alegada pela recorrente segundo a qual até 40%, ou mesmo 50%, das declarações aduaneiras na Europa terem sido apresentadas diretamente pelo carregador ou através das agências aduaneiras, admitindo que se tenha verificado, são suscetíveis de demonstrar que existia uma procura de serviços de depósito NES individuais. Todavia, não são suscetíveis de demonstrar que o acordo em causa tinha por objeto esses serviços individuais.

124

Em segundo lugar, a recorrente alega que a fundamentação da decisão recorrida é incoerente. Por um lado, no considerando 441 da decisão recorrida, no quadro da descrição da infração, a Comissão apenas fez referência ao comportamento diretamente ligado à sobretaxa NES e não aduziu nenhuma prova suscetível de demonstrar que o acordo relativo ao NES tinha respeitado a outras matérias, por exemplo, aos preços do transporte ou a outros serviços acessórios. Por outro lado, no considerando 872 da decisão recorrida, a Comissão alegou que o acordo relativo ao NES não visava o mercado dos serviços de depósito NES, mas os serviços de transitário.

125

A Comissão contesta estes argumentos.

126

Esta alegação deve ser rejeitada.

127

Contrariamente ao que sustenta a recorrente, estas considerações da Comissão não são contraditórias. Com efeito, segundo as constatações da Comissão resumidas nos n.os 85 e 86 supra, mesmo que o acordo relativo ao NES apenas tivesse por objeto a sobretaxa NES, visava restringir a concorrência entre os transitários relativamente aos serviços de transitário.

128

Em terceiro lugar, a recorrente alega que a razão pela qual os transitários indicam serviços acessórios como serviços de depósito NES relacionados com serviços de transitário nas suas faturas é de natureza puramente administrativa, o que a própria Comissão reconheceu. Isso permitiria faturar esses serviços no âmbito de uma fatura global.

129

A Comissão contesta estes argumentos.

130

Esta alegação deve igualmente ser rejeitada.

131

A este respeito, importa recordar que a circunstância de os transitários terem faturado os serviços de depósito NES aos seus clientes não põe de modo algum em causa a consideração da Comissão de que existe uma procura específica para os serviços de transitário enquanto lotes de serviços, uma vez que permitem ganhar tempo e dinheiro. Ao invés, o argumento da recorrente segundo o qual isso permite enviar aos seus clientes uma fatura global corrobora estas considerações.

132

Por outro lado, há que observar que, contrariamente ao que a recorrente alega, no considerando 868 da decisão recorrida, a Comissão não constatou que o facto de os transitários faturarem os serviços de depósito NES aos seus clientes era de natureza puramente administrativa e não tinha importância. Apenas constatou que a circunstância de, nas suas faturas, os transitários mencionarem a sobretaxa NES separadamente, em vez de a incluírem no preço final dos serviços de transitário, constituía um aspeto puramente formal, sem importância económica ou jurídica.

133

Em quarto lugar, a recorrente alega que resulta do artigo 1.o, n.o 1, da decisão recorrida que o acordo relativo ao NES visava a prestação dos serviços de depósito NES.

134

A Comissão contesta estes argumentos.

135

A este respeito, basta observar que resulta claramente da redação desse número que o acordo relativo ao NES tinha por objeto o «setor dos serviços de transitário aéreo».

136

Por conseguinte, nenhum dos argumentos aduzidos pela recorrente é suscetível de demonstrar que a consideração da Comissão segundo a qual o acordo relativo ao NES visava restringir a concorrência no que respeita aos serviços de transitário enferma de erros.

137

Por conseguinte, esta parte do fundamento deve ser rejeitada.

Quanto à segunda parte, relativa à afetação do comércio entre Estados‑Membros

138

A recorrente põe igualmente em causa a conclusão da Comissão segundo a qual o acordo relativo ao NES era suscetível de afetar as trocas comerciais entre os Estados‑Membros de modo sensível.

139

No n.o 5.2.1.3 da decisão recorrida, nos considerandos 590 a 599 e 602 a 615, a Comissão salientou que o comércio entre Estados‑Membros podia ser afetado pelo acordo relativo ao NES, por um lado, diretamente, relativamente à prestação de serviços de transitário, e, por outro, indiretamente, relativamente às mercadorias transitadas.

140

A recorrente entende que estas considerações enfermam de erros. Nem os efeitos que o acordo relativo ao NES possa ter tido nos serviços de transitário nem os que possa ter tido no transporte das mercadorias foram suscetíveis de afetar sensivelmente o comércio entre os Estados‑Membros. A Comissão baseou‑se em argumentos genéricos, não apresentou provas suficientes, não respeitou as orientações de 2004 e não efetuou um inquérito adequado.

141

A este respeito, a título liminar, importa recordar que o artigo 101.o, n.o 1, TFUE e o artigo 53.o do Acordo EEE apenas visam os acordos que sejam suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados‑Membros. Como resulta da jurisprudência, para ser suscetível de afetar o comércio entre Estados‑Membros, um acordo deve, com base num conjunto de elementos objetivos de direito ou de facto, permitir prever, com um grau de probabilidade suficiente, que pode exercer uma influência direta ou indireta, atual ou potencial, sobre as correntes de trocas comerciais entre Estados‑Membros (acórdão de 13 de julho de 2006, Manfredi e o., C‑295/04 a C‑298/04, Colet., EU:C:2006:461, n.o 42).

142

Há que recordar igualmente que um acordo escapa à proibição do artigo 101.o TFUE quando apenas afeta o mercado de modo insignificante (v. acórdão de 21 de janeiro de 1999, Bagnasco e o., C‑215/96 e C‑216/96, Colet., EU:C:1999:12, n.o 34 e jurisprudência referida).

143

O caráter transfronteiriço dos serviços de transitário não se confunde com a questão do caráter sensível da afetação do comércio entre Estados‑Membros. Com efeito, se qualquer transação transfronteiriça fosse automaticamente suscetível de afetar de modo sensível o comércio entre Estados‑Membros, o conceito de caráter sensível, que é um requisito de aplicação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE, decorrente da jurisprudência, ficaria desprovido de conteúdo (acórdão de 16 de junho de 2011, Ziegler/Comissão, T‑199/08, Colet., EU:T:2011:285, n.os 52 e 53).

144

Atendendo ao facto de que o conceito de comércio na aceção do artigo 101.o TFUE não está limitado às trocas transfronteiriças tradicionais de produtos, mas engloba igualmente os serviços, há que examinar os argumentos da recorrente que põem em causa as considerações da Comissão baseadas nos efeitos do acordo relativo ao NES sobre o comércio relativamente aos serviços de transitário, antes de examinar os que põem em causa as suas considerações fundadas nos efeitos do referido acordo sobre o fluxo de mercadorias. Em seguida, há que analisar o argumento relativo à violação do princípio de boa administração e a uma violação do n.o 77 das orientações de 2004.

Quanto à afetação do comércio relativamente aos serviços de transitário

145

A recorrente põe em causa a conclusão da Comissão segundo a qual o acordo relativo ao NES era suscetível de ter efeitos sensíveis no mercado dos serviços de transitário.

146

Nos considerandos 598, 607, 608, 610, 613 e 614 da decisão recorrida, a Comissão afirmou que, apesar de o acordo relativo ao NES dizer respeito unicamente à regulamentação de um Estado‑Membro, era suscetível de afetar o comércio entre os Estados‑Membros, nomeadamente no que respeita aos serviços de transitário. Por um lado, os serviços de transitário abrangidos pelo acordo relativo ao NES são procurados não apenas por clientes situados no Reino Unido, mas também por clientes instalados fora do Reino Unido, noutros países do EEE ou por serviços locais dos mesmos. Por outro lado, o setor dos serviços de transitário caracteriza‑se por trocas comerciais substanciais entre Estados‑Membros, tanto entre os países da União como entre os Estados da Associação Europeia de Comércio Livre (EFTA). Os transitários estão numa relação de concorrência em todos ou quase todos os Estados pertencentes ao EEE e os seus clientes estão estabelecidos no EEE. É evidente que o comportamento de empresas globais no mercado inglês poderia ter tido repercussões na estrutura concorrencial do mercado interno, uma vez que a alteração das suas margens no Reino Unido poderia ter afetado as suas práticas comerciais noutros Estados‑Membros. Por outro lado, a Comissão salientou que os efeitos do acordo relativo ao NES sobre os serviços de transitário tinham sido sensíveis, uma vez que os requisitos da presunção prevista no n.o 53 das orientações de 2004 tinham sido preenchidos. Em primeiro lugar, o acordo relativo ao NES é, por natureza, um acordo suscetível de afetar o comércio entre Estados‑Membros na aceção desse número. Em segundo lugar, o volume de negócios realizado pelas partes com os serviços objeto do acordo relativo ao NES excedeu 40 milhões de euros e a sua quota de mercado foi superior ao limiar de 5%.

147

A recorrente entende que estas considerações são erradas e foram puramente especulativas. Contrariamente a tais considerações, o acordo relativo ao NES não dizia respeito ao comércio em vários Estados‑Membros e não tinha por finalidade regular a concorrência no EEE. Qualquer efeito da sobretaxa NES ficou circunscrito ao Reino Unido, ou mesmo apenas a algumas partes dele.

148

Mais concretamente, a recorrente põe em causa, em primeiro lugar, as considerações da Comissão baseadas nos efeitos sobre os clientes dos transitários e sobre o comportamento dos transitários noutros Estados‑Membros e, em segundo lugar, as suas considerações relativas ao caráter sensível da afetação do comércio.

– Quanto aos efeitos sobre os clientes dos transitários e sobre o comportamento dos transitários noutros Estados‑Membros

149

Em primeiro lugar, a recorrente alega que a afirmação da Comissão que figura no considerando 610 da decisão recorrida, segundo a qual a alteração das margens dos transitários no Reino Unido era suscetível de ter tido repercussões sobre o seu comportamento noutros Estados‑Membros, é puramente especulativa. A Comissão não apresentou nenhuma prova suscetível de demonstrar que a sobretaxa NES, que apenas é, na prática, aplicável às mercadorias do Reino Unido, pode ter tido efeitos nas atividades das empresas que operam noutros Estados‑Membros, sobretudo tendo em conta a reduzida importância comercial desta. Nas circunstâncias do caso vertente, o facto de as empresas que participaram no acordo serem membros titulares de grupos de diferentes nacionalidades não é pertinente.

150

A Comissão contesta estes argumentos.

151

A este respeito, há que recordar que o artigo 101.o, n.o 1, TFUE visa os acordos que sejam suscetíveis de afetar o comércio entre os Estados‑Membros. Por conseguinte, a Comissão não é obrigada a demonstrar os efeitos reais de um acordo, basta que demonstre que esses acordos são suscetíveis de produzir esse efeito. Por conseguinte, pode limitar‑se a demonstrar que existe um grau de probabilidade suficiente que o acordo possa ter exercido uma influência direta ou indireta, atual ou potencial, sobre as correntes de trocas comerciais entre Estados‑Membros (acórdão de 17 de julho de 1997, Ferriere Nord/Comissão, C‑219/95 P, Colet., EU:C:1997:375, n.o 20).

152

Ora, a Comissão não cometeu um erro ao considerar que, nas circunstâncias do caso em apreço, era suficientemente provável que o acordo relativo ao NES pudesse ter exercido uma influência sobre o comportamento dos transitários em Estados‑Membros diferentes do Reino Unido.

153

Com efeito, neste contexto, importa, em primeiro lugar, recordar que, contrariamente ao que afirma a recorrente, o acordo relativo ao NES visava os serviços de transitário (v. n.os 115 a 136 supra).

154

Em segundo lugar, saliente‑se que, segundo as conclusões da Comissão que figuram na decisão recorrida, que não foram postas em causa pela recorrente, os transitários que participaram no acordo relativo ao NES oferecem os seus serviços de transitário noutros Estados‑Membros além do Reino Unido e estão numa relação de concorrência nesses Estados‑Membros em relação aos serviços de transitário.

155

Em terceiro lugar, nas circunstâncias do caso em apreço, não se pode excluir que, na falta do acordo relativo ao NES, a concorrência entre os transitários quanto aos custos resultantes do NES poderia ter tido um impacto sobre a margem das transitários no Reino Unido e poderia ter ocasionado ganhos e perdas de quotas de mercado nesse país. É certo que, neste contexto, a recorrente afirma que a sobretaxa NES tinha uma reduzida importância comercial. Contudo, este argumento não é suscetível de pôr em causa a conclusão da Comissão segundo a qual, tendo em conta a circunstância de o mercado dos serviços de transitário se caracterizar por reduzidas margens de lucro, a importância comercial da sobretaxa NES não podia ser considerada insignificante. Com efeito, esta consideração da Comissão é confirmada, por um lado, pela sua afirmação que figura no considerando 907 da decisão recorrida, segundo a qual os clientes de transitários se opuseram ao pagamento da sobretaxa NES, e, por outro, pelos elementos de prova mencionados no considerando 869 da decisão recorrida, que dão conta dos receios de certos transitários que participaram no acordo relativo ao NES de que uma concorrência em matéria de custos resultante do NES poderia ser suscetível de alterar as margens e de ocasionar um ganho ou uma perda de quotas de mercado. Há que concluir que a recorrente não apresenta nenhum argumento suscetível de pôr em causa estas constatações.

156

Em quarto lugar, tendo em conta estas circunstâncias, parece suficientemente provável que o acordo relativo ao NES tenha sido suscetível de ter repercussões sobre o comportamento dos transitários noutros Estados‑Membros, nos quais estavam igualmente numa relação de concorrência, e de alterar a estrutura da concorrência na União a este respeito.

157

Por conseguinte, há que concluir que nenhum dos argumentos apresentados pela recorrente é suscetível de pôr em causa a consideração da Comissão baseada nas repercussões do acordo relativo ao comportamento dos transitários em Estados‑Membros diferentes do Reino Unido.

158

Em segundo lugar, a recorrente alega que a conclusão da Comissão, que figura no considerando 607 da decisão recorrida, segundo a qual os serviços afetados pelo acordo relativo ao NES eram procurados não apenas por clientes situados no Reino Unido mas também por empresas situadas noutros Estados‑Membros do EEE, padece de erros. O comércio transfronteiriço com os serviços de depósito NES não é fácil, uma vez que esses serviços apenas têm interesse no Reino Unido e não geram procura fora desse Estado‑Membro. Em todo o caso, segundo a recorrente, a Comissão não fez prova suficiente a este respeito.

159

Neste contexto, há que recordar que, contrariamente ao que afirma a recorrente, o acordo relativo ao NES não tinha por objeto os serviços de depósito NES, mas os serviços de transitário (v. n.os 115 a 136 supra).

160

Por outro lado, no que respeita às dúvidas da recorrente relativas às conclusões da Comissão segundo as quais havia, por parte dos clientes situados em Estados‑Membros diferentes do Reino Unido, uma procura de serviços de transitário que poderiam ter sido afetados pelo acordo relativo ao NES, há que recordar que a Comissão pode limitar‑se a demonstrar que existe um grau de probabilidade suficiente que o referido acordo possa ter exercido uma influência direta ou indireta, atual ou potencial, sobre as correntes de trocas comerciais entre Estados‑Membros (v. n.o 151 supra).

161

Ora, como a própria recorrente salienta, a Comissão baseou‑se numa declaração de [confidencial], segundo a qual [confidencial].

162

Contrariamente ao que sustenta a recorrente, a credibilidade dessa declaração não é suscetível de ser posta em causa pela sua alegação segundo a qual, na maior parte dos casos em que as mercadorias situadas noutro Estado‑Membro transitavam pelo Reino Unido, não seriam necessários serviços de depósito NES. Com efeito, mesmo admitindo que essa alegação pudesse ser comprovada, não se pode deixar de observar que a mesma não visa a situação em que um cliente situado num Estado‑Membro diferente do Reino Unido procura serviços de transitário para uma mercadoria que já se encontra no Reino Unido.

163

Por conseguinte, há que concluir que nenhum dos argumentos aduzidos pela recorrente é suscetível de pôr em causa a consideração da Comissão baseada nos efeitos do acordo relativo ao NES sobre os serviços de transitário procurados por clientes situados num Estado‑Membro diferente do Reino Unido.

164

Em terceiro lugar, a recorrente afirma que a natureza e o alcance do acordo relativo ao NES demonstram que tal acordo estava circunscrito ao Reino Unido e não tinha tido por objetivo produzir efeitos sobre o comércio entre Estados‑Membros. O acordo relativo ao NES foi uma iniciativa do pessoal de frete aéreo de diversas empresas baseadas na região do aeroporto de Londres‑Heathrow. A Comissão não demonstrou que as pessoas em causa dispusessem dos poderes necessários para vincular as suas organizações do Reino Unido na totalidade. O membro da Bax Global (UK) que participou no referido acordo, B., não desempenhou nenhum papel na fixação dos preços. A Bax aplicou uma política que privilegiava a autonomia, de modo que os diretores de sucursais da Bax Global (UK) dispuseram geralmente de uma importante margem de manobra quanto aos preços, cada sucursal constituindo uma unidade comercial diferente. O montante da sobretaxa NES aplicado a um cliente específico da Bax Global (UK) era, portanto, determinado pelo diretor da sucursal em causa após negociações entre a sucursal responsável pela expedição e o referido cliente.

165

A Comissão contesta estes argumentos.

166

A este respeito, importa observar que a recorrente não põe em causa as constatações da Comissão que figuram nos considerandos 94 a 114 da decisão recorrida, segundo as quais B. participou, enquanto representante da Bax Global (UK), numa reunião e em contactos posteriores ao longo dos quais chegou a acordo com os representantes de outros transitários sobre a introdução de uma sobretaxa relativa ao NES, as taxas da mesma, o seu calendário de aplicação e o acompanhamento da sua aplicação.

167

Por outro lado, quanto ao argumento relativo ao facto de B. não ter desempenhado um papel na fixação dos preços, basta salientar que a recorrente não põe em causa as constatações da Comissão que figuram no considerando 122 da decisão recorrida, no qual expôs de forma pormenorizada e baseando‑se em elementos de prova que B. tinha poderes em matéria de fixação de preços na Bax Global (UK), que a existência do acordo relativo ao NES era conhecida nesta sociedade e que os membros do conselho de administração tinham sido informados por B. da existência do acordo relativo ao NES e não se tinham oposto a ele. Neste contexto, importa igualmente recordar que um mandato formal não é necessário para que a participação de um empregado de uma empresa seja imputável à empresa (acórdão de 16 de novembro de 2011, Álvarez/Comissão, T‑78/06, EU:T:2011:673, n.o 39).

168

Por outro lado, na medida em que a recorrente alega que o alcance do acordo relativo ao NES estava circunscrito ao Reino Unido ou mesmo a uma parte do território desse Estado‑Membro, basta salientar que, pelas razões expostas nos n.os 149 a 163 supra, este argumento não põe em causa a conclusão da Comissão segundo a qual o acordo relativo ao NES era suscetível de ter efeitos noutros Estados‑Membros.

169

Consequentemente, há que considerar que nenhum dos argumentos aduzidos pela recorrente permite demonstrar que as considerações da Comissão, segundo as quais o acordo relativo ao NES era suscetível de ter efeitos sobre o comportamento dos transitários noutros Estados‑Membros e sobre os clientes dos transitários, enfermam de erros.

– Quanto ao caráter sensível da afetação do comércio

170

A recorrente põe igualmente em causa a constatação da Comissão segundo a qual o acordo relativo ao NES era suscetível de afetar o comércio entre Estados‑Membros de maneira sensível.

171

A este respeito, na decisão recorrida, a Comissão afirmou que, no caso em apreço, os requisitos da presunção positiva prevista no n.o 53 das orientações de 2004 estavam reunidos. Salientou que o acordo relativo ao NES era, pela sua própria natureza, suscetível de afetar o comércio entre Estados‑Membros. Por outro lado, no considerando 614 da decisão recorrida, observou que o volume de negócios que as partes em causa tinham realizado no setor comercial em causa era sensivelmente mais elevado do que os 40 milhões de euros exigidos. Nos considerandos 613 e 899 da decisão recorrida, considerou que não só a posição individual relativamente forte das empresas em causa nos mercados do Reino Unido e do EEE mas também a respetiva quota de mercado cumulada no Reino Unido e no EEE militavam a favor de uma afetação do comércio.

172

A recorrente entende que estas considerações enfermam de erros. Por um lado, a Comissão aplicou a presunção prevista no n.o 53 das orientações de 2004 de forma errada. Por outro lado, nas circunstâncias do caso em apreço, a referida presunção foi ilidida.

173

A Comissão contesta estes argumentos.

174

A este respeito, a título liminar, importa recordar que o n.o 53 das orientações de 2004, cuja legalidade ou pertinência não são postas em causa no âmbito do presente recurso, tem a seguinte redação:

«A Comissão considerará ainda que, no caso de um acordo ser suscetível, pela sua própria natureza, de afetar o comércio entre os Estados‑Membros, por exemplo porque diz respeito a importações e exportações ou porque abrange diversos Estados‑Membros, existe uma presunção positiva ilidível de que esses efeitos no comércio são sensíveis quando o volume de negócios das partes em relação aos produtos objeto do acordo […] for superior a 40 milhões de euros. No caso de acordos que pela sua própria natureza são suscetíveis de afetar o comércio entre Estados‑Membros também se pode presumir muitas vezes que esses efeitos são sensíveis quando a quota de mercado das partes exceder o limiar de 5% estabelecido no ponto anterior. No entanto, esta presunção não é aplicável quando o acordo abrange apenas parte de um Estado‑Membro (v. n.o 90 infra).»

175

Em seguida, há que rejeitar o argumento da recorrente decorrente do facto de o acordo relativo ao NES não ser um acordo que, pela sua própria natureza, era suscetível de afetar o comércio entre Estados‑Membros. Neste contexto, em primeiro lugar, importa salientar que a aplicação da presunção prevista no n.o 53 das orientações de 2004 não exige necessariamente que o acordo tenha em vista vários Estados‑Membros. Com efeito, como resulta da utilização dos termos «por exemplo», trata‑se apenas de um exemplo dos acordos abrangidos por este ponto. Em segundo lugar, há que remeter para os n.os 149 a 168 supra, nos quais foi exposto que a consideração da Comissão segundo a qual, apesar de o acordo relativo ao NES ter por objeto as despesas resultantes da legislação do Reino Unido relativa ao NES, tal acordo era suscetível de afetar o mercado dos serviços de transitário em vários Estados‑Membros não padece de erros.

176

Por outro lado, na medida em que põe em causa a análise da Comissão segundo a qual os limiares previstos no n.o 53 das orientações de 2004 estavam ultrapassados, deve reconhecer‑se que a recorrente se limita a afirmar que a Comissão não devia ter utilizado os volumes de negócios realizados com os serviços de transitário, mas unicamente os realizados com os serviços de depósito NES. A este respeito, basta recordar, por um lado, que, em aplicação do n.o 53 das orientações de 2004, há que ter em conta o volume de negócios realizado pelas partes com os serviços abrangidos pelo acordo e, por outro, que, em virtude das considerações expostas nos n.os 115 a 137 supra, há que considerar que o acordo relativo ao NES tinha por objeto os serviços de transitário.

177

Além disso, na medida em que a recorrente alega que a Comissão não teve em conta que a presunção prevista no n.o 53 das orientações de 2004 era ilidível e que, nas circunstâncias do caso em apreço, tinha sido ilidida, basta salientar que, neste contexto, a recorrente não apresenta nenhum argumento que não tenha sido já analisado e rejeitado nos n.os 115 a 176 supra.

178

Por conseguinte, nenhum dos argumentos aduzidos pela recorrente é suscetível de pôr em causa a conclusão da Comissão segundo a qual o acordo relativo ao NES era suscetível de afetar sensivelmente o comércio entre Estados‑Membros no que respeita aos serviços de transitário.

Quanto à afetação do fluxo de mercadorias

179

A recorrente sustenta igualmente que as considerações da Comissão baseadas numa afetação do fluxo das mercadorias enfermam de erros. O acordo relativo ao NES não levou a uma alteração dos fluxos comerciais, nem no que respeita às mercadorias provenientes do Reino Unido nem às mercadorias provenientes de outros países. Por um lado, a sobretaxa NES só foi aplicada a mercadorias provenientes do Reino Unido, dado que as possibilidades de aplicação da sobretaxa NES às expedições não provenientes do Reino Unido são praticamente nulas. Por outro lado, o fluxo das mercadorias situadas no Reino Unido não era passível de ser alterado pela sobretaxa NES. Portanto, o acordo relativo ao NES não era suscetível de afetar o comércio entre Estados‑Membros ou, pelo menos, não de maneira sensível.

180

Estes argumentos devem ser julgados inoperantes. Com efeito, mesmo admitindo que o acordo relativo ao NES não tenha afetado o fluxo das mercadorias entre Estados‑Membros de maneira sensível, isso não é suscetível de pôr em causa o entendimento da Comissão de que, em razão dos efeitos sobre os serviços de transitário, o referido acordo era passível de ter afetado o comércio entre Estados‑Membros de maneira sensível.

Quanto à violação do princípio da boa administração e à violação do n.o 77 das orientações de 2004

181

Na medida em que a recorrente alega que a Comissão violou o princípio da boa administração e o n.o 77 das orientações de 2004, segundo o qual, no caso de acordos que cobrem o território de um único Estado‑Membro, pode ser necessário proceder a uma avaliação mais aprofundada da possibilidade de esses acordos afetarem o comércio entre os Estados‑Membros, ao não realizar uma investigação suplementar, basta salientar que resulta das considerações precedentes que, com base nas informações de que a Comissão dispunha, pôde acertadamente concluir que o acordo relativo ao NES era suscetível de afetar o comércio entre Estados‑Membros, sem ter de proceder a uma investigação suplementar.

182

Consequentemente, há que concluir que nenhum dos argumentos aduzidos pela recorrente é suscetível de pôr em causa a justeza do argumento da Comissão segundo o qual o acordo relativo ao NES era suscetível de afetar de modo sensível as trocas comerciais entre os Estados‑Membros.

183

Por conseguinte, há que rejeitar o terceiro fundamento na totalidade.

4. Quanto ao quarto fundamento, relativo à decisão da Comissão de ter considerado a recorrente única responsável

184

Com o presente fundamento, a recorrente põe em causa a decisão da Comissão de a ter considerado única responsável pelo comportamento da Bax Global (UK). O fundamento divide‑se em três partes. Na primeira parte, relativa, nomeadamente, a uma violação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE e do princípio da responsabilidade pessoal, a recorrente alega que não há base jurídica para a considerar responsável pelo comportamento da Bax Global (UK). Na segunda parte, relativa à violação do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais e do princípio da boa administração, a recorrente acusa a Comissão de não ter investigado a fim de saber se a Brink’s, antiga sociedade‑mãe da Bax Global (UK), também deveria, ou deveria em exclusivo, ser considerada responsável pelo comportamento desta. Na terceira parte, relativa a uma violação do artigo 296.o TFUE, a recorrente acusa a Comissão de não ter fundamentado suficientemente a decisão recorrida a este respeito.

Quanto à primeira parte, relativa, nomeadamente, à violação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE e do princípio da responsabilidade pessoal

185

Nesta primeira parte do fundamento está em causa a decisão da Comissão de considerar a recorrente única responsável pela participação da Bax Global (UK) no acordo relativo ao NES.

186

Nos considerandos 664 e 754 da decisão recorrida, a Comissão afirmou que a Bax Global (UK) tinha participado no acordo relativo ao NES entre 1 de outubro de 2002 e 10 de março de 2003, que, antes da adoção da decisão recorrida, todas as suas atividades tinham sido transferidas para uma das suas sociedades associadas, isto é, a recorrente, que tinha deixado de existir e não podia, portanto, ser destinatária da decisão recorrida, que a recorrente era sua sucessora económica e que, consequentemente, esta última podia ser considerada responsável pelo comportamento da Bax Global (UK).

187

A recorrente considera que, ao proceder desta forma, a Comissão violou o princípio da responsabilidade pessoal, o artigo 101.o, n.o 1, TFUE, e os artigos 4.°, 7.°, e 23.°, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003. Em sua opinião, não existe no caso em apreço base jurídica para a considerar responsável pela participação da Bax Global (UK) no acordo relativo ao NES. Contrariamente às afirmações da Comissão, a aquisição e a absorção da Bax Global (UK) não tiveram como consequência uma transferência da responsabilidade para a recorrente pelo comportamento da empresa à qual a Bax Global (UK) tinha pertencido entre outubro de 2002 e março de 2003 e que tinha sido controlada pela Brink’s. Dado que esta última ainda existia à data da adoção da decisão recorrida, a Comissão devia tê‑la considerado responsável pelo comportamento da Bax Global (UK), em vez desta última. A transferência da responsabilidade para uma nova pessoa coletiva está sujeita à condição de que esta constitua, com a pessoa coletiva de origem, uma única e mesma empresa, para efeitos da aplicação das regras da concorrência da União, o que não se verifica no caso em apreço.

188

A Comissão contesta estes argumentos.

189

A este respeito, importa recordar, antes de mais, que, quando uma sociedade infringe as regras da concorrência, incumbe‑lhe, de acordo com o princípio da responsabilidade pessoal, responder por essa infração.

190

Todavia, como a Comissão concluiu acertadamente no considerando 664 da decisão recorrida, o princípio da responsabilidade pessoal não se opõe a que, em certos casos, o sucessor económico de uma sociedade seja considerado responsável pelo comportamento dessa sociedade.

191

Assim, por um lado, resulta da jurisprudência que o sucessor económico de uma entidade jurídica, que é responsável por uma infração ao direito da concorrência da União, pode ser responsabilizado quando, no momento da adoção da decisão da Comissão, a referida entidade tenha deixado de existir (v., neste sentido, acórdãos de 24 de setembro de 2009, Erste Group Bank e o./Comissão, C‑125/07 P, C‑133/07 P e C‑137/07 P, Colet., EU:C:2009:576, n.os 77 a 83, e de 5 de dezembro de 2013, SNIA/Comissão, C‑448/11 P, EU:C:2013:801, n.o 23).

192

Por outro lado, quando uma sociedade responsável por uma infração ao direito da concorrência transfere a atividade económica no mercado em causa para outra sociedade num momento em que essas duas sociedades fazem parte da mesma empresa, a sociedade para a qual a atividade foi transferida pode ser considerada responsável em virtude dos laços estruturais que então existiam entre essas duas empresas (v., neste sentido, acórdãos de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C‑204/00 P, C‑205/00 P, C‑211/00 P, C‑213/00 P, C‑217/00 P e C‑219/00 P, Colet., EU:C:2004:6, n.os 354 a 360, e de 31 de março de 2009, ArcelorMittal Luxembourg e o./Comissão, T‑405/06, Colet., EU:T:2009:90, n.os 106 a 119).

193

Nos dois casos acima mencionados, uma imputação da responsabilidade ao sucessor económico justifica‑se para efeitos da aplicação eficaz das regras da concorrência. Com efeito, se a Comissão não dispusesse de tal faculdade, as empresas poderiam facilmente escapar a sanções através de reestruturações, cessões ou outras alterações jurídicas ou organizacionais. O objetivo de reprimir os comportamentos contrários às regras da concorrência e de prevenir a sua reiteração por meio de sanções dissuasivas ficaria assim comprometido.

194

Tendo concluído que, antes da adoção da decisão recorrida, todas as atividades da Bax Global (UK) foram transferidas para a recorrente, que, nesse momento, era uma sociedade associada, e que, igualmente antes da adoção da decisão recorrida, a Bax Global (UK) deixou de existir (v. n.o 186 supra), a Comissão tinha o direito de considerar a recorrente responsável pela infração cometida pela Bax Global (UK) em aplicação da jurisprudência e dos princípios referidos nos n.os 191 e 192 supra.

195

Nenhum dos argumentos invocados pela recorrente é suscetível de pôr em causa esta conclusão.

196

Em primeiro lugar, a recorrente alega que resulta dos n.os 61 a 64 do acórdão de 30 de setembro de 2009, Hoechst/Comissão (T‑161/05, Colet., EU:T:2009:366), que, enquanto antiga sociedade‑mãe da Bax Global (UK), só a Brink’s deve responder pela infração.

197

A este respeito, há que salientar que, dado que participou no acordo relativo ao NES (v. n.o 186 supra), a Bax Global (UK) pode ser considerada responsável.

198

Por outro lado, quanto a uma eventual responsabilidade da Brink’s enquanto sociedade‑mãe da Bax Global (UK), há que recordar que, contrariamente ao que alega a recorrente, a faculdade da Comissão de a considerar responsável enquanto sucessora económica da Bax Global (UK) não está limitada pela sua eventual faculdade de considerar igualmente a sua antiga sociedade‑mãe Brink’s responsável (v., neste sentido, acórdão Erste Group Bank e o./Comissão, n.o 191 supra, EU:C:2009:576, n.o 82).

199

Além disso, deve salientar‑se que o n.o 61 do acórdão Hoechst/Comissão, n.o 196 supra (EU:T:2009:366), de modo nenhum se opõe a estas conclusões. Na verdade, nesse número, o Tribunal Geral considerou que incumbia à pessoa coletiva que dirigia a empresa em causa no momento em que foi cometida a infração responder por esta, apesar de, no dia da adoção da decisão que declarou a infração, a exploração da empresa estar colocada sob a responsabilidade de outra sociedade. Ora, resulta do seu contexto que, nesse número, o Tribunal se limitou a clarificar que uma sociedade‑mãe que, no momento da prática de uma infração, controlava a filial diretamente implicada nesta e fazia assim parte da mesma empresa podia ser considerada responsável por essa infração, apesar de, no dia da adoção da decisão da Comissão, essas duas sociedades já não fazerem parte da mesma empresa.

200

Por conseguinte, esta alegação deve ser rejeitada.

201

Em segundo lugar, a recorrente alega que resulta do n.o 109 do acórdão ArcelorMittal Luxembourg e o./Comissão, n.o 192 supra (EU:T:2009:90), que, em caso de transferência de todas ou de parte das atividades económicas de uma entidade jurídica para outra, a responsabilidade pela infração cometida pelo explorador inicial, no âmbito das atividades em questão, só podia ser imputada ao novo explorador se as duas constituíssem uma mesma entidade económica para efeitos da aplicação das regras da concorrência.

202

A este respeito, há que recordar que a situação objeto do acórdão ArcelorMittal Luxembourg e o./Comissão, n.o 192 supra (EU:T:2009:90), ou seja, a mencionada no n.o 192 supra, não é a única situação em que um sucessor económico pode ser responsabilizado. Com efeito, como se expôs nos n.os 190 a 193 supra, quando uma sociedade que cometeu uma infração às regras da concorrência deixou de existir no momento da adoção da decisão recorrida, a Comissão tem o direito de considerar o seu sucessor económico responsável, independentemente da questão de saber se essas duas entidades jurídicas faziam parte da mesma empresa. No caso em apreço, a Bax Global (UK) tinha deixado de existir no momento da adoção da decisão recorrida. Por conseguinte, a Comissão tinha o direito de considerar a recorrente responsável enquanto sua sucessora económica.

203

Por outro lado, e em qualquer caso, no que se refere à aplicação do acórdão ArcelorMittal Luxembourg e o./Comissão, n.o 192 supra (EU:T:2009:90), há que salientar que, no momento em que as atividades da Bax Global (UK) foram transferidas para a recorrente, estas duas sociedades pertenciam ao grupo DB. Por conseguinte, em razão dos laços estruturais que existiam entre elas no momento da transferência da atividade económica da Bax Global (UK) para a recorrente, a Comissão tinha o direito de considerar esta última responsável pelo comportamento da Bax Global (UK).

204

Por conseguinte, há que rejeitar este argumento.

205

Em terceiro lugar, a recorrente alega que os conceitos de empresa e de responsabilidade na aceção do artigo 101.o TFUE, bem como a questão da transferência de responsabilidade entre diferentes empresas, são conceitos jurídicos e que a Comissão não dispunha portanto de um poder discricionário relativamente a esses conceitos.

206

Quanto a este argumento, há que começar por referir que não resulta da decisão recorrida que a Comissão tenha considerado dispor de um poder discricionário relativamente ao conceito de empresa na aceção do direito da concorrência da União ou a respeito de uma transferência de responsabilidade. Com efeito, no considerando 754 da decisão recorrida, limitou‑se a aplicar a jurisprudência e os princípios referidos nos n.os 190 a 193 supra, segundo os quais, num caso como o presente, a Comissão tinha o direito de considerar responsável o sucessor económico da sociedade que participou diretamente numa infração.

207

No que respeita aos considerandos 791 e 782 da decisão recorrida, nos quais a Comissão indicou que não punia as antigas sociedades‑mãe das filiais que participaram no acordo relativo ao NES, impõe‑se concluir que, neste contexto, a Comissão se limitou a utilizar a margem de apreciação de que dispunha para determinar as entidades jurídicas às quais aplicava uma sanção, como a própria recorrente reconhece. Em contrapartida, neste contexto, não se pronunciou sobre a questão de saber se, no caso em apreço, se poderia considerar que essas antigas sociedades‑mãe faziam parte de uma empresa que cometeu uma infração ao artigo 101.o TFUE ou sobre questões de transferência de responsabilidade.

208

Dado que nenhum dos argumentos destinados a demonstrar que, no caso em apreço, não havia base jurídica para punir a recorrente é procedente, há que rejeitar esta parte do fundamento.

Quanto à segunda parte, relativa à violação do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais e do princípio da boa administração, e à terceira parte, relativa a uma violação do dever de fundamentação

209

No âmbito destas duas partes do fundamento, em primeiro lugar, a recorrente alega que, ao abster‑se de examinar de forma diligente e aprofundada se podia considerar a Brink’s responsável pelo comportamento da Bax Global (UK) e em que medida era necessário e equitativo desencadear um procedimento por infração contra a recorrente para garantir a aplicação adequada das regras da concorrência da União, a Comissão violou o artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais e o princípio da boa administração. Em segundo lugar, a recorrente alega que a Comissão se limitou a dar a conhecer a sua opção de não considerar a Brink’s responsável, ao passo que, por força do artigo 296.o TFUE, a Comissão deveria ter fundamentado a sua decisão de não considerar a Brink’s, antiga sociedade‑mãe da Bax Global (UK), como a sociedade responsável, exclusiva ou solidariamente. Por conseguinte, segundo a recorrente, há que anular a decisão recorrida ou, pelo menos, imputar à recorrente apenas a quota‑parte da coima que deveria ter suportado se pudesse ter acionado a Brink’s como devedora solidária.

210

A Comissão contesta estes argumentos.

Quanto à violação do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais e do princípio da boa administração

211

A título liminar, há que recordar que, nos termos do artigo 23.o, n.o 2, alínea a), do Regulamento n.o 1/2003, a Comissão pode, mediante decisão, aplicar coimas às empresas sempre que, deliberadamente ou por negligência, cometam uma infração ao disposto no artigo 101.o TFUE. Esta disposição faz unicamente referência à possibilidade de punir as empresas, mas não determina as entidades jurídicas às quais a coima pode ser aplicada. A Comissão dispõe, portanto, de uma margem de apreciação relativamente à escolha das entidades jurídicas às quais impõe uma sanção por uma infração ao direito da concorrência da União (v., neste sentido, acórdão Erste Group Bank e o./Comissão, n.o 191 supra, EU:C:2009:576, n.o 82).

212

No entanto, ao fazer esta escolha, a Comissão não é inteiramente livre. Deve respeitar, designadamente, os princípios gerais do direito da União e os direitos fundamentais garantidos ao nível da União (v., neste sentido, conclusões da advogada‑geral J. Kokott apresentadas no processo Alliance One International e Standard Commercial Tobacco/Comissão e Comissão/Alliance One International e o., C‑628/10 P e C‑14/11 P, Colet., EU:C:2012:11, n.o 48).

213

Assim, quando, durante o seu inquérito, a Comissão decide não aplicar uma coima a uma certa categoria de entidades jurídicas que poderiam ter feito parte da empresa que cometeu a infração, deve respeitar, nomeadamente, o princípio da igualdade de tratamento.

214

Daqui se conclui que não só os critérios que a Comissão estabelece para distinguir as entidades jurídicas às quais impõe uma coima das entidades às que decide não aplicar uma coima não devem ser arbitrárias mas devem igualmente ser aplicados de forma homogénea.

215

É à luz destes princípios e desta jurisprudência que há que examinar se, no caso em apreço, a Comissão ultrapassou os limites da sua margem de apreciação.

216

Em primeiro lugar, quanto aos argumentos através dos quais a recorrente põe em causa os critérios que a Comissão aplicou, importa salientar que, no caso em apreço, esta decidiu considerar responsáveis não só as filiais que participaram no acordo relativo ao NES mas também as sociedades‑mãe das referidas filiais que, no momento da adoção da decisão recorrida, faziam parte da mesma empresa na aceção do artigo 101.o TFUE, na medida em que a participação no referido acordo também lhes podia ser imputada. Em contrapartida, como resulta dos considerandos 791 e 782 da decisão recorrida, a Comissão decidiu não aplicar coimas às antigas sociedades‑mãe das referidas filiais, independentemente da questão de saber se também poderiam ter sido consideradas responsáveis pelo acordo relativo ao NES.

217

Tal abordagem enquadra‑se na margem de apreciação de que a Comissão dispõe. Com efeito, no uso da mesma, a Comissão pode ter em conta o facto de que uma abordagem destinada a punir todas as entidades jurídicas que podem ser consideradas responsáveis por uma infração seria suscetível de sobrecarregar consideravelmente os seus inquéritos (v., neste sentido, acórdão Erste Group Bank e o./Comissão, n.o 191 supra, EU:C:2009:576, n.o 82).

218

Resulta da decisão recorrida que, no caso em apreço, mesmo excluindo as antigas sociedades‑mãe das filiais que participaram nos acordos relativos ao AMS, ao NES, ao CAF e à PSS, o número de entidades jurídicas que participam no procedimento da Comissão ascendia a 47. Tendo em conta a importância deste número, a decisão da Comissão de não desencadear um procedimento por infração igualmente contra as antigas sociedades‑mãe dessas filiais não pode ser considerada arbitrária.

219

Neste contexto, há que recordar igualmente que, nos n.os 155 a 157 do seu acórdão de 11 de julho de 2013, Team Relocations e o./Comissão (C‑444/11 P, EU:C:2013:464), o Tribunal de Justiça já declarou que a Comissão não excedia os limites da sua margem de apreciação quando decidia aplicar sanções unicamente às sociedades diretamente implicadas na infração e às sociedades‑mãe atuais que podiam ser consideradas responsáveis pelo respetivo comportamento, e não às suas antigas sociedades‑mãe.

220

Em segundo lugar, no que respeita à forma como a Comissão aplicou os critérios que tinha determinado, basta observar que a recorrente não apresenta nenhum argumento suscetível de demonstrar que tais critérios não foram aplicados de maneira homogénea.

221

Por conseguinte, há que concluir que, ao decidir não punir a Brink’s, antiga sociedade‑mãe da Bax Global (UK) que participou diretamente no acordo relativo ao NES, embora a Brink’s pudesse eventualmente ter sido considerada responsável, a Comissão não ultrapassou os limites da margem de apreciação de que dispõe ao abrigo do artigo 23.o, n.o 2, alínea a), do Regulamento n.o 1/2003.

222

Nenhum dos argumentos da recorrente é suscetível de pôr em causa esta conclusão.

223

Em primeiro lugar, contrariamente ao que é alegado pela recorrente, não se pode deduzir do acórdão de 18 de julho de 2013, Dow Chemical e o./Comissão (C‑499/11 P, Colet., EU:C:2013:482), que, no caso em apreço, a Comissão fosse obrigada a examinar se podia considerar a Brink’s responsável enquanto antiga sociedade‑mãe da Bax Global (UK). Com efeito, mesmo que fosse de concluir do n.o 47 do referido acórdão que o Tribunal de Justiça considerou, em substância, que o princípio era que a Comissão aplica uma coima a todas as entidades jurídicas que fazem parte da empresa que cometeu a infração, esse número deve ser lido tendo em conta o contexto no qual se inscreve. Com efeito, no referido processo, uma sociedade‑mãe que a Comissão tinha considerado responsável pelo comportamento de uma das suas filiais alegou que, tendo em conta a margem de apreciação de que dispunha a Comissão, esta última devia ter justificado a sua opção de a considerar responsável. Foi em resposta a este argumento que o Tribunal de Justiça se baseou no princípio de que, enquanto sociedade pertencente à empresa que violou o artigo 101.o TFUE, a sociedade‑mãe devia ser sancionada. No entanto, não se pode deduzir desse acórdão que a Comissão esteja impedida de adotar uma abordagem que consista em apenas desencadear procedimentos por infração contra certas categorias de entidades jurídicas, quando tal abordagem não seja arbitrária e lhe permita utilizar os seus recursos de maneira eficaz. Com efeito, no n.o 47 do acórdão Dow Chemical e o./Comissão, já referido (EU:C:2013:482), o Tribunal de Justiça reconheceu expressamente que a Comissão se podia abster de punir uma sociedade‑mãe na medida em que essa decisão se baseava em razões objetivas.

224

Em segundo lugar, a recorrente alega que uma condenação conjunta dela própria e da Brink’s lhe teria conferido vantagens económicas, uma vez que lhe teria permitido acionar esta última em relação ao pagamento da sua quota‑parte da coima.

225

A este respeito, basta assinalar que, mesmo admitindo que a recorrente e a Brink’s pudessem ter sido condenadas solidariamente no pagamento da coima e que essa condenação teria conferido uma vantagem à recorrente, estas circunstâncias não são suscetíveis de demonstrar que a Comissão ultrapassou os limites da margem de apreciação de que dispõe. Com efeito, a Comissão assegura a observância do direito da concorrência da União no interesse da União e apenas dispõe de recursos limitados para a realização desse objetivo. Consequentemente, embora uma abordagem que consista em não desencadear procedimentos por infração contra todas as entidades jurídicas às quais uma coima poderia eventualmente ser imputada possa ter como consequência colocar as entidades jurídicas às quais uma coima é aplicada numa posição menos favorável, isso não impede a Comissão de adotar tal abordagem, desde que se baseie em razões objetivas e lhe permita utilizar os seus recursos de maneira mais eficaz.

226

Daqui resulta que, contrariamente ao que alega a recorrente, no caso em apreço, a Comissão não cometeu um erro ao decidir não aplicar uma coima à Brink’s enquanto antiga sociedade‑mãe da Bax Global (UK).

227

Consequentemente, a segunda parte, relativa à violação do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais e do princípio da boa administração, deve ser rejeitada.

Quanto à violação do dever de fundamentação

228

A recorrente alega igualmente que a Comissão violou o dever de fundamentação estabelecido no artigo 296.o, segundo parágrafo, TFUE.

229

A título preliminar, há que recordar que a fundamentação exigida por esta disposição deve ser adaptada à natureza do ato em causa e revelar, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição, autora do ato, de maneira a permitir aos interessados conhecer as razões da medida adotada e à jurisdição competente exercer a sua fiscalização (acórdão de 29 de setembro de 2011, Elf Aquitaine/Comissão, C‑521/09 P, Colet., EU:C:2011:620, n.o 147).

230

Assim, no âmbito das decisões individuais, resulta de jurisprudência constante que o dever de fundamentar uma decisão individual tem por finalidade, além de permitir uma fiscalização jurisdicional, fornecer ao interessado uma indicação suficiente para saber se a decisão enferma eventualmente de um vício que permita contestar a sua validade (v. acórdão Elf Aquitaine/Comissão, n.o 229 supra, EU:C:2011:620, n.o 148 e jurisprudência referida).

231

É igualmente jurisprudência constante que a exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato, da natureza dos fundamentos invocados e do interesse que os destinatários do ato ou outras pessoas direta e individualmente interessadas no mesmo podem ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o, segundo parágrafo, TFUE deve ser apreciada não só à luz do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das regras jurídicas que regulam a matéria em causa (v. acórdão Elf Aquitaine/Comissão, n.o 229 supra, EU:C:2011:620, n.o 150 e jurisprudência referida).

232

É à luz desta jurisprudência que há que examinar se a decisão recorrida está suficientemente fundamentada.

233

A este respeito, há que observar que, no considerando 754 da decisão recorrida, a Comissão afirmou que tinha o direito de considerar a recorrente responsável pela infração enquanto sucessora económica da Bax Global (UK). Além disso, nos considerandos 791 e 782 da decisão recorrida, indicou que tinha decidido não punir as antigas sociedades‑mãe. Resulta claramente da decisão recorrida que isso se aplicava à Brink’s enquanto antiga sociedade‑mãe da Bax Global (UK). Por outro lado, resulta de modo suficientemente claro do considerando 791 da decisão recorrida e do seu contexto que a Comissão considerava que esta abordagem visava evitar sobrecarregar excessivamente o seu inquérito. Com efeito, por um lado, resulta da decisão recorrida que o número de entidades jurídicas que participaram no procedimento perante a Comissão ascendia a 47 e que uma abordagem que consistisse em punir igualmente as antigas sociedades‑mãe teria tido como consequência aumentar esse número já de si importante. Por outro lado, na nota de pé de página n.o 802, no considerando 791 da decisão recorrida, a Comissão referiu‑se ao n.o 335 do acórdão de 14 de dezembro de 2006, Raiffeisen Zentralbank Österreich e o./Comissão (T‑259/02 a T‑264/02 e T‑271/02, Colet., EU:T:2006:396), no qual o Tribunal Geral considerou que os inquéritos da Comissão seriam consideravelmente sobrecarregados se fosse necessário verificar, em cada caso de sucessão no controlo de uma empresa, em que medida as atuações desta podem ser imputadas à antiga sociedade‑mãe.

234

Por conseguinte, há que concluir que as informações contidas na decisão recorrida eram suficientes para, por um lado, permitir à recorrente conhecer as razões pelas quais a Comissão decidiu aplicar‑lhe uma sanção e não punir a Brink’s e, por outro, permitir ao Tribunal Geral exercer a sua fiscalização.

235

Por consequência, há que rejeitar igualmente a terceira parte do quarto fundamento e, portanto, este último na totalidade, não apenas no que respeita ao pedido de anulação da decisão recorrida mas também ao pedido de exercício, pelo Tribunal Geral, da sua competência de plena jurisdição.

5. Quanto ao quinto fundamento, relativo a erros no cálculo do montante da coima bem como à violação do artigo 27.o, n. os 1 e 2, do Regulamento n.o 1/2003 e dos direitos de defesa

236

O presente fundamento divide‑se em duas partes, sendo a primeira relativa a erros no cálculo do montante da coima e a segunda a uma violação do artigo 27.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1/2003 e dos direitos de defesa.

Quanto à primeira parte, relativa a erros no cálculo do montante da coima

237

A primeira parte do presente fundamento tem por objeto a parte da decisão recorrida em que a Comissão calculou o montante da coima que aplicou à recorrente.

238

Neste contexto, a Comissão baseou‑se no método geral previsto nas orientações de 2006. Em particular, considerou que, para determinar o montante de base da coima, era necessário, por um lado, em aplicação do n.o 13 das orientações de 2006, utilizar o valor das vendas realizadas pela recorrente com os serviços de transitário prestados a clientes do EEE na rota comercial objeto do acordo relativo ao NES e, por outro, aplicar uma taxa resultante do grau de gravidade de 15%. Considerou igualmente que a recorrente não podia invocar nenhuma circunstância atenuante.

239

A recorrente sustenta que, ao proceder desta forma, a Comissão lhe aplicou uma coima que excede o alcance e a gravidade do acordo relativo ao NES. Neste contexto, a recorrente apresenta quatro alegações. Em primeiro lugar, considera que a Comissão não utilizou o valor de vendas adequado. Em segundo lugar, põe em causa a taxa de gravidade aplicada pela Comissão. Em terceiro lugar, alega que a Comissão se absteve de ter em conta uma circunstância atenuante, ou seja, a existência de um acordo ilícito que visava os serviços de transporte. Em quarto lugar, alega que a Comissão violou o princípio da igualdade de tratamento.

Quanto à alegação relativa ao valor das vendas

240

A presente alegação visa as considerações da Comissão que figuram nos considerandos 857 a 890 da decisão recorrida, segundo as quais, em aplicação do n.o 13 das orientações de 2006, para determinar o montante de base da coima a aplicar, havia que utilizar o valor das vendas realizadas pela recorrente com os serviços de transitário aos clientes do EEE na rota comercial objeto do acordo relativo ao NES.

241

A recorrente entende que estas considerações enfermam de erros. A Comissão desrespeitou as orientações de 2006 e violou o artigo 23.o, n.os 2 e 3, do Regulamento n.o 1/2003, o princípio da proporcionalidade, o princípio da adequação da pena à infração e o princípio nulla poena sine culpa. A Comissão também cometeu erros de apreciação.

242

Em substância, a recorrente alega que, ao utilizar o valor das vendas que tinha realizado com os serviços de transitário aos clientes do EEE na rota comercial objeto do acordo relativo ao NES, a Comissão lhe aplicou uma coima que excedia a dimensão e a gravidade da infração constatada na decisão recorrida. Segundo a recorrente, a Comissão não devia ter utilizado o valor das vendas realizadas com os serviços de transitário, mas devia ter‑se certificado de que o valor das vendas utilizado refletia o prejuízo económico causado pelo acordo relativo ao NES, em vez de se basear em objetivos de dissuasão geral, e devia ter adaptado esse valor tendo em conta a existência de um acordo a montante no mercado dos serviços de transporte.

243

A Comissão contesta estes argumentos.

244

A este respeito, há que observar que, nos termos do artigo 49.o, n.o 3, da Carta dos Direitos Fundamentais, as penas não devem ser desproporcionadas em relação à infração e, nos termos do artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1/2003, para determinar o montante da coima, a Comissão deve tomar em consideração a duração e a gravidade da infração.

245

Por seu turno, o princípio da proporcionalidade e o princípio da adequação da pena à infração exigem que as coimas não sejam desproporcionadas relativamente aos objetivos pretendidos, isto é, relativamente ao respeito do direito da concorrência da União, e que o montante da coima aplicada a uma empresa por uma infração em matéria de concorrência seja proporcionado à mesma, apreciada no seu conjunto, tendo em conta, nomeadamente, a sua gravidade. Em especial, o princípio da proporcionalidade implica que a Comissão deve fixar o montante da coima proporcionalmente aos elementos tidos em conta para apreciar a gravidade da infração e que deve a este respeito aplicar estes elementos de forma coerente e objetivamente justificada (acórdão de 27 de setembro de 2006, Jungbunzlauer/Comissão, T‑43/02, Colet., EU:T:2006:270, n.os 226 a 228).

246

Por outro lado, há que recordar que, no âmbito da apreciação da gravidade de uma infração ao direito da concorrência da União, a Comissão deve ter em conta um grande número de elementos cujo caráter e importância variam segundo o tipo de infração e as suas circunstâncias específicas. Entre esses elementos podem, consoante os casos, figurar o volume e o valor das mercadorias que são objeto da infração, a dimensão e o poderio económico da empresa e, portanto, a influência que esta possa ter exercido no mercado (acórdãos de e 7 de junho de 1983, Musique diffusion française o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, EU:C:1983:158, n.o 121; de 3 de setembro de 2009, Prym e Prym Consumer/Comissão, C‑534/07 P, Colet., EU:C:2009:505, n.o 96; e KME Germany e o./Comissão, n.o 34 supra, EU:C:2011:816, n.os 58 e 59).

247

No que se refere, mais especificamente, ao volume e ao valor das mercadorias que são objeto da infração, o Tribunal já declarou que, embora seja incontestável que o volume de negócios de uma empresa ou de um mercado é, enquanto fator de avaliação da gravidade da infração, necessariamente vago e imperfeito, apesar da sua natureza aproximativa, é considerado atualmente tanto pelo legislador da União como pela Comissão e pelo Tribunal de Justiça um critério adequado, no âmbito do direito da concorrência, para apreciar a dimensão e o poderio económico das empresas em causa (acórdão de 6 de maio de 2009, KME Germany e o./Comissão, T‑127/04, Colet., EU:T:2009:142, n.o 93).

248

Com efeito, a parte do volume de negócios proveniente da venda dos produtos ou serviços que são objeto da infração é a mais indicada para refletir a importância económica dessa infração.

249

Estes princípios foram consagrados nas orientações de 2006, que preveem um método geral para o cálculo do montante das coimas. Com efeito, resulta do n.o 6 das orientações de 2006 que «a combinação do valor das vendas relacionadas com a infração e da duração [desta] é considerada um valor de substituição adequado para refletir a importância económica da infração, bem como o peso relativo de cada empresa que participa na infração».

250

Assim, as orientações de 2006 preveem que, numa primeira fase, a Comissão determinará o montante de base da coima. No âmbito desta fase, em aplicação do n.o 13 das orientações de 2006, a Comissão identifica o valor das vendas de bens ou serviços, realizadas pela empresa relacionadas direta ou indiretamente com a infração, na área geográfica em causa no território do EEE ao longo de um ano. Por outro lado, aplica a este valor uma taxa de gravidade sob a forma de uma percentagem determinada em função do grau de gravidade da infração, multiplicando esse resultado pelo número de anos de participação da empresa na infração. Em caso de acordos horizontais de fixação de preços, de repartição de mercado e de limitação de produção, inclui um montante adicional. Numa segunda fase, leva em conta circunstâncias agravantes ou atenuantes.

251

Ao adotar as orientações de 2006, a Comissão autolimitou‑se no exercício do seu poder de apreciação. Sem apresentar justificações, não pode, portanto, afastar‑se do método previsto por estas, sob pena de poder ser sancionada, eventualmente, por violação dos princípios gerais do direito, como os princípios da igualdade de tratamento ou da proteção da confiança legítima (acórdão de 28 de junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, C‑189/02 P, C‑202/02 P, C‑205/02 P a C‑208/02 P e C‑213/02 P, Colet., EU:C:2005:408, n.o 211).

252

No entanto, o n.o 37 das orientações de 2006 permite à Comissão afastar‑se do método geral nelas previsto, a fim de ter em conta as especificidades de um dado processo ou de atingir um nível dissuasivo suficiente.

253

É à luz destes princípios e desta jurisprudência que há que examinar os argumentos da recorrente.

– Quanto às vendas realizadas em relação com o acordo relativo ao NES

254

A recorrente alega que o acordo relativo ao NES apenas teve por objeto a sobretaxa NES e que, portanto, a Comissão deveria ter utilizado exclusivamente o valor das vendas realizadas com os serviços de depósito NES. Por outro lado, a Comissão não devia ter incluído no valor das vendas os custos dos serviços de transporte faturados pelos transportadores. Os transitários organizam o transporte das mercadorias, mas os transportadores faturam‑lhes os respetivos serviços, incluindo taxas como os suplementos de carburante e segurança. Não se pode portanto considerar que as taxas e sobretaxas cobradas pelos transportadores, sobre as quais os transitários não têm qualquer controlo, estejam abrangidas pelo acordo relativo ao NES.

255

A Comissão contesta estes argumentos.

256

A este respeito, em primeiro lugar, importa recordar que, nos termos do n.o 13 das orientações de 2006, a Comissão identifica o valor das vendas de bens ou serviços realizadas relacionadas direta ou indiretamente com a infração. Como foi exposto nos n.os 84 a 101 e 115 a 137 supra, o acordo relativo ao NES visava os serviços de transitário enquanto lotes de serviços. Por conseguinte, a Comissão não ultrapassou os limites que ela própria se impôs no n.o 13 das orientações de 2006 ao utilizar o valor das vendas realizadas pela recorrente com os serviços de transitário enquanto lotes de serviços, e não unicamente o valor das vendas realizadas com os serviços de depósito NES.

257

Em segundo lugar, importa salientar que nenhuma das circunstâncias invocadas pela recorrente obrigava a Comissão a afastar‑se do método geral previsto no n.o 13 das orientações de 2006 em aplicação do n.o 37 destas.

258

A recorrente alega que a Bax Global (UK) agiu como simples intermediário, intervindo como «agente de cobrança» de certos encargos.

259

A este respeito, deve salientar‑se que, nomeadamente nos considerandos 65, 878 e 879 da decisão recorrida, a Comissão reconheceu que as transitários estavam numa posição de intermediários entre o transportador e o expedidor e podiam adotar uma multiplicidade de modelos de empresa.

260

No entanto, há que declarar que, na hipótese de um transitário não repercutir o custo do transporte sobre os seus clientes, mas de o seu rendimento se limitar a uma comissão recebida da transportadora, não se coloca nenhum problema, uma vez que só o montante da comissão é refletido no seu volume de negócios.

261

Quanto à hipótese em que um transitário repercute sobre os seus clientes o custo do transporte que ele próprio pagou ou deverá pagar a terceiros, deve recordar‑se que, como resulta das constatações da Comissão acima resumidas no n.o 85, do ponto de vista económico, o papel do transitário não se limita ao de um simples intermediário. Com efeito, transforma os serviços adquiridos a terceiros e outros fatores de produção em serviços de transitário integrados, que permitem aos seus clientes ganhar tempo e dinheiro, respondendo assim uma procura específica, que não seria satisfeita pelos serviços individuais que compõem os serviços de transitário. Tendo em conta estas considerações, em tal hipótese, a Comissão tem o direito de utilizar o valor das vendas do transitário na aceção do n.o 13 das orientações de 2006.

262

Por outro lado, contrariamente ao que alega a recorrente, a Comissão não estava obrigada a deduzir o valor dos serviços de transporte.

263

Com efeito, como acima se referiu, esses serviços devem ser considerados fatores de produção para os serviços de transitário. Ora, em todos os setores industriais há custos inerentes ao produto final que o fabricante não pode controlar, mas que, no entanto, constituem um elemento essencial do conjunto das suas atividades. Não há, portanto, que deduzir os custos dos fatores de produção, que são inerentes aos preços dos produtos e dos serviços vendidos, do valor das vendas, mesmo quando o custo dos fatores de produção constitui uma parte importante do valor das vendas em causa (v., neste sentido, acórdãos KME Germany e o./Comissão, n.o 34 supra, EU:C:2011:816, n.os 58 a 65, e KME Germany e o./Comissão, n.o 247 supra, EU:T:2009:142, n.o 91). É certo que esta jurisprudência foi proferida num processo ao qual as orientações de 2006 ainda não eram aplicáveis. No entanto, tal jurisprudência não deixa de ser pertinente à luz de tais orientações. Com efeito, as considerações em que se baseia têm a ver, de maneira geral, com a utilização dos volumes de negócios para o cálculo do montante das coimas e indicam que se trata de um critério objetivo que apresenta uma conexão estreita com a infração em causa (v., a este respeito, conclusões do advogado‑geral M. Wathelet apresentadas no processo Guardian Industries e Guardian Europe/Comissão, C‑580/12 P, Colet., EU:C:2014:272, n.o 59).

264

Por conseguinte, contrariamente ao que alega a recorrente, a natureza dos serviços de transitário e do acordo relativo ao NES não se opunham a que a Comissão utilizasse a totalidade do volume de negócios que a recorrente realizou com esses serviços na rota comercial em causa, sem deduzir os custos dos serviços de transporte ou de outros serviços, efetuadas por terceiros, mas que fizeram parte do lote de serviços de que os serviços de transitário são compostos.

– Quanto à aplicação da sobretaxa NES

265

A recorrente alega que a Comissão não devia ter tomado em conta os serviços de transitário que não foram sujeitos a uma sobretaxa NES. Em caso de não aplicação dessa sobretaxa, não se poderia considerar que o volume de negócios gerado pelo carregamento foi afetado pelo comportamento relativo ao NES.

266

A Comissão contesta estes argumentos.

267

A este respeito, deve recordar‑se que, em aplicação do n.o 13 das orientações de 2006, a Comissão utiliza o valor das vendas relacionadas com a infração, não sendo a concretização da infração tida em conta. Não resulta portanto desse número que só o valor das vendas resultantes das transações realmente afetadas pelos acordos ilícitos possa ser tomado em consideração para calcular o valor das vendas (v., neste sentido, acórdão de 16 de junho de 2011, Putters International/Comissão, T‑211/08, Colet., EU:T:2011:289, n.o 58).

268

No entanto, neste contexto, cumpre ainda recordar que, segundo a jurisprudência, o conceito de valor das vendas, referido no n.o 13 das orientações de 2006, não pode ser alargado até englobar as vendas realizadas pela empresa em causa que, direta ou indiretamente, não façam parte do perímetro do acordo imputado (acórdão Team Relocations e o./Comissão, n.o 219 supra, EU:C:2013:464, n.os 73 a 78).

269

Ora, há que salientar que a recorrente se limita a alegar que a Comissão não devia ter tido em conta os serviços de transitário aos quais a sobretaxa NES não foi aplicada, mas não apresenta nenhum argumento suscetível de demonstrar que os serviços de transitário que a Comissão tomou em conta, ou seja, os volumes de negócios na rota comercial objeto do acordo relativo ao NES, não faziam parte do perímetro do referido acordo.

270

Por outro lado, nas circunstâncias do caso em apreço, a Comissão não era obrigada a afastar‑se do método geral previsto no n.o 13 das orientações de 2006 em aplicação do n.o 37 destas. Com efeito, as jurisdições da União nunca impuseram à Comissão a obrigação de demonstrar, em cada caso, quais eram as vendas individuais afetados pelo acordo (acórdão Putters International/Comissão, n.o 267 supra, EU:T:2011:289, n.o 60). Pelo contrário, como resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, uma limitação ao valor das vendas que se prove terem sido realmente afetadas por uma infração cometida por uma dada empresa teria por efeito minimizar artificialmente a importância económica de tal infração, uma vez que o simples facto de só um número limitado de provas diretas das vendas realmente afetadas pelo acordo serem encontradas levaria a aplicar uma coima sem relação com o âmbito de aplicação real do acordo em causa. Esta recompensa ao segredo seria igualmente suscetível de pôr em causa o objetivo de repressão e de punição eficaz das infrações ao artigo 101.o TFUE e, portanto, não pode ser admitida (acórdão Team Relocations e o./Comissão, n.o 219 supra, EU:C:2013:464, n.os 76 e 77).

271

Por conseguinte, há que rejeitar o argumento relativo à aplicação da sobretaxa NES.

– Quanto à existência de um acordo tendo por objeto os serviços de transporte aéreo

272

A recorrente alega que a Comissão violou o princípio da adequação da pena à infração, o princípio da proporcionalidade e o princípio nulla poena sine culpa ao não ter em consideração a circunstância de que os preços para os serviços de transporte tinham sido inflacionados devido a um acordo que tinha por objeto esses serviços. Por conseguinte, puniu duas vezes os efeitos de uma única e mesma infração, por um lado, em relação aos transportadores que a tinham cometido e, por outro, em relação aos que eram os respetivos clientes. A recorrente alega igualmente que a afirmação da Comissão, que figura no considerando 884 da decisão recorrida, segundo a qual a recorrente pode intentar uma ação nos tribunais cíveis nacionais contra os transportadores não é pertinente.

273

A Comissão contesta estes argumentos.

274

A este respeito, a título preliminar, importa salientar que as orientações de 2006 não contêm uma regra que preveja expressamente que a existência de um acordo a montante deva ser tida em conta no âmbito do cálculo do montante das coimas.

275

Por conseguinte, há que examinar se a existência de um acordo tendo por objeto um mercado a montante do mercado objeto da infração em razão da qual é aplicada uma coima constitui uma circunstância que obriga a Comissão a afastar‑se do método geral previsto no n.o 13 das orientações de 2006.

276

Neste contexto, há que recordar que a utilização do critério do valor das vendas como ponto de partida do cálculo do montante das coimas justifica‑se designadamente porque a parte do volume de negócios proveniente da venda dos produtos que são objeto da infração é a solução mais adequada para refletir a importância económica da infração (v. n.os 247 e 248 supra) e que se trata de um critério objetivo que é fácil de aplicar.

277

Ora, a circunstância de o mercado dos serviços de transporte aéreo ser objeto de um acordo não é suscetível de invalidar a conclusão da Comissão segundo a qual o valor das vendas realizadas pela recorrente no mercado dos serviços de transitário, na rota comercial objeto do acordo relativo ao NES, reflete corretamente a importância económica da sua participação nesta infração. Com efeito, em primeiro lugar, trata‑se de um volume de negócios gerado pela recorrente nas condições concretas do mercado. Em segundo lugar, há um nexo objetivo entre o acordo relativo ao NES e o volume de negócios que reflete o peso relativo da participação da recorrente.

278

Por outro lado, há que salientar que uma abordagem segundo a qual a existência de um acordo ilícito tendo por objeto um mercado a montante obrigaria a Comissão a proceder a uma adaptação do valor das vendas realizadas beneficiando de uma infração num mercado a jusante teria como consequência introduzir um fator de incerteza logo na fase da primeira etapa do cálculo do montante das coimas. Com efeito, em primeiro lugar, o montante das deduções a efetuar é geralmente difícil de determinar. Em segundo lugar, a fim de respeitar o princípio da igualdade de tratamento, haveria que proceder a deduções não só na hipótese de um acordo ilícito ter por objeto um mercado a montante mas, mais genericamente, em todas as hipóteses em que fatores que fossem de considerar contrários ao direito da União fossem suscetíveis de ter uma influência, direta ou indireta, sobre os preços dos produtos ou dos serviços em causa. Em terceiro lugar, tal abordagem teria como consequência que a base de cálculo do montante de uma coima poderia ser posta em causa após a adoção da decisão recorrida, no caso de fatores suscetíveis de ter uma influência, direta ou indireta, sobre os preços dos fatores de produção serem descobertos após essa data. A abordagem defendida pela recorrente seria, portanto, suscetível de provocar litígios intermináveis e insolúveis, incluindo alegações de discriminação.

279

Quanto ao argumento relativo à violação do princípio nulla poena sine culpa, basta salientar que, uma vez que o montante da coima aplicada à recorrente foi calculado com base nos preços de venda que ele própria faturou aos seus clientes, a Comissão não a puniu por uma infração cometida por um terceiro, mas tendo em conta rendimentos que ela própria gerou e pelos quais deve responder. Este argumento deve assim ser igualmente rejeitado.

280

Tendo em conta estas considerações, há que concluir que a existência de um acordo num mercado situado a montante do mercado objeto da infração em razão da qual a coima é aplicada não pode ser considerada uma circunstância suscetível de obrigar a Comissão a afastar o método geral previsto no n.o 13 das orientações de 2006.

281

Por conseguinte, há que rejeitar o argumento relativo à existência de um acordo tendo por objeto o mercado dos serviços de transporte, sem que seja necessário pronunciar‑se sobre a questão de saber se a observação da Comissão, que figura no considerando 884 da decisão recorrida, segundo a qual a recorrente pode intentar uma ação nos tribunais cíveis nacionais contra os transportadores, é pertinente no presente contexto. Com efeito, mesmo que esta observação fosse errada, não poria em causa as outras considerações da Comissão cujo mérito foi acima apreciado.

– Quanto à tomada em conta do prejuízo económico causado

282

A recorrente afirma que a Comissão não tomou suficientemente em conta o prejuízo económico causado pelo acordo relativo ao NES. Segundo as orientações de 2006, as coimas estão especificamente ligadas ao suposto prejuízo económico extrapolado com base no valor das vendas relacionadas com a infração. A Comissão deve, portanto, assegurar que o volume de negócios utilizado reflete o prejuízo económico. Na fase da determinação do volume de negócios relativo à infração provada, não deve ser tido em conta de um efeito dissuasor geral, dado que esse efeito apenas pode ser tomado em consideração numa fase posterior do cálculo do montante da coima. No caso em apreço, a circunstância de o volume de negócios teórico máximo ligado ao sistema NES representar apenas uma parte insignificante do montante da coima aplicada e uma parte ainda mais reduzida do volume de negócios utilizado pela Comissão demonstra, segundo a recorrente, que a abordagem da Comissão é contrária às orientações de 2006.

283

A Comissão contesta estes argumentos.

284

A este respeito, há que salientar, em primeiro lugar, que, contrariamente ao que alega a recorrente, nem o n.o 13 nem outro número das orientações de 2006 prevê que o valor das vendas deva ser adaptado ao prejuízo económico causado pela infração.

285

Em segundo lugar, as circunstâncias invocadas pela recorrente não obrigam a Comissão a afastar‑se do método geral previsto no n.o 13 das orientações de 2006 em aplicação do n.o 37 das mesmas.

286

É verdade que, no âmbito do cálculo do montante das coimas, não deve ser atribuída uma importância desproporcionada ao valor das vendas (acórdão KME Germany e o./Comissão, n.o 34 supra, EU:C:2011:816, n.o 60). No entanto, a este propósito, basta recordar que o valor das vendas é apenas um critério, entre vários, que é tomado em consideração através do método geral previsto nas orientações de 2006. Com efeito, admitindo que as circunstâncias invocadas pela recorrente, como o prejuízo causado ou a margem de lucro realizada, são pertinentes para o cálculo do montante das coimas, segundo a referida metodologia, poderiam ser tidas em conta no âmbito das suas fases posteriores, como a apreciação do grau de gravidade da infração, a existência de circunstâncias atenuantes ou agravantes ou mesmo da capacidade contributiva das empresas envolvidas. Por conseguinte, mesmo admitindo que, no caso em apreço, a Comissão fosse obrigada a ter em conta as circunstâncias invocadas pela recorrente em fases posteriores da determinação do montante da coima, não estava obrigada, por esta razão, afastar‑se do n.o 13 das orientações de 2006 em aplicação do n.o 37 das mesmas.

287

No que respeita à relação entre o montante das coimas e o montante das sobretaxas aplicadas, há que observar que, embora seja verdade que as coimas devem ser fixadas num nível suficientemente elevado para que as empresas sejam dissuadidas de participar num acordo, apesar dos ganhos que dele poderiam retirar, em contrapartida, o montante de uma coima não pode ser considerado inadequado apenas porque não reflete o prejuízo económico que possa ou tenha podido ser causado pelo acordo em causa.

288

Neste contexto, há que rejeitar igualmente o argumento da recorrente relativo ao facto de, na fase da determinação do valor das vendas, a Comissão se ter baseado num objetivo de dissuasão geral, quando não tem o direito de tomar em consideração esse objetivo nessa fase do cálculo do montante das coimas.

289

A este respeito, há que salientar que, ao utilizar o valor das vendas realizadas pela recorrente com os serviços de transitário aos clientes do EEE na rota comercial objeto do pelo acordo relativo ao NES, a Comissão limitou‑se a aplicar o método geral previsto no n.o 13 das orientações de 2006 e, portanto, não se afastou desse método ao invocar um objetivo de dissuasão geral.

290

Por outro lado, na hipótese de, através dos seus argumentos, a recorrente pretender alegar que, na medida em que o valor das vendas não reflete o prejuízo económico causado sob a forma das sobretaxas cobradas, a Comissão era obrigada a adaptar o referido valor, a fim de evitar que um objetivo de dissuasão geral fosse tido em conta nessa fase do cálculo do montante das coimas, há igualmente que rejeitá‑los.

291

Neste contexto, há que salientar que o valor das vendas é utilizado como valor de substituição para a importância económica da infração, não só porque é a mais apta a refletir a importância económica da infração bem como o peso relativo de cada empresa participante na infração mas também porque se trata de um critério objetivo fácil de aplicar. Esta última qualidade do valor das vendas torna a ação da Comissão mais previsível para as empresas e permite‑lhes avaliar a importância do montante da coima a que se expõem quando decidem participar num acordo ilícito. A utilização do critério do valor das vendas no n.o 13 das orientações de 2006 prossegue, portanto, entre outros, um objetivo de dissuasão geral. Ora, contrariamente ao que dá a entender a recorrente, nada se opõe a que, no âmbito da missão de fiscalização do cumprimento do direito da concorrência da União que lhe é conferido pelo Tratado (acórdãos Musique Diffusion française e o./Comissão, n.o 246 supra, EU:C:1983:158, n.o 105, e Dansk Rørindustri e o./Comissão, n.o 251 supra, EU:C:2005:408, n.o 170), a Comissão prossiga um objetivo de prevenção geral quando determina o método geral para o cálculo do montante das coimas.

292

Assim, os argumentos relativos ao facto de que a Comissão não ter tido suficientemente em conta o prejuízo económico causado pelo acordo relativo ao NES devem igualmente ser rejeitados.

– Quanto aos fatores de concorrência afetados

293

A recorrente alega igualmente que, por ter utilizado o valor das vendas realizadas com os serviços de transitário, a Comissão puniu‑a como se o acordo relativo ao NES tivesse visado fixar o preço final dos serviços de transitário ou cobrir a totalidade dos fatores de concorrência existentes no setor transitário.

294

A Comissão contesta este argumento.

295

A este respeito, há que recordar que, como se expôs nos n.os 267 a 270 supra, a Comissão tinha o direito de utilizar como ponto de partida para o cálculo do montante da coima as vendas realizadas no perímetro do referido acordo, independentemente da gravidade dessa infração.

296

Por outro lado, há que recordar que, segundo o método geral previsto nas orientações de 2006, a natureza da infração é levada em conta numa fase posterior, aquando da determinação da taxa de gravidade, que, em aplicação do n.o 20 das referidas orientações, é apreciada numa base casuística para cada tipo de infração, tendo em conta todas as circunstâncias relevantes do caso.

297

Atendendo a estas considerações, não se pode inferir do facto de a Comissão ter utilizado o valor das vendas realizadas com os serviços de transitário afetados pelo acordo relativo ao NES como ponto de partida para o cálculo do montante da coima aplicada à recorrente que tal acordo tenha sido tratado como um acordo destinado a fixar o preço final dos serviços de transitário ou a cobrir a totalidade dos fatores de concorrência.

298

Por conseguinte, este argumento deve ser rejeitado.

– Quanto aos erros de apreciação

299

Na medida em que alega que a Comissão cometeu erros de apreciação, a recorrente limita‑se a fazer referência aos argumentos que já foram examinados e rejeitados. Portanto, há que rejeitar igualmente este argumento.

300

Por conseguinte, há que concluir que nenhum dos argumentos aduzidos pela recorrente é suscetível de demonstrar que, ao utilizar o valor das vendas realizadas com os serviços de transitário em relação com o acordo relativo ao NES, a Comissão violou as orientações de 2006, violou o artigo 23.o, n.os 2 e 3, do Regulamento n.o 1/2003, o princípio da proporcionalidade, o princípio da adequação da pena à infração ou o princípio nulla poena sine culpa ou cometeu erros de apreciação.

301

Por conseguinte, há que rejeitar na totalidade o argumento relativo à utilização, pela Comissão, do valor das vendas realizadas pela recorrente com os serviços de transitário aos clientes do EEE na rota comercial objeto do acordo relativo ao NES.

Quanto à alegação relativa à taxa de gravidade

302

Na réplica, a recorrente põe em causa a conclusão da Comissão, que figura no considerando 945 da decisão recorrida, segundo a qual uma taxa de gravidade de 15% era apropriada para o acordo relativo ao NES.

303

Nos considerandos 891 a 947 da decisão recorrida, a Comissão expôs os motivos pelos quais esta taxa de gravidade era adequada. Nesse contexto, a Comissão mencionou, nomeadamente, que o acordo relativo ao NES tinha por objetivo fixar, de forma direta ou indireta, preços ou outras condições de transação. A este respeito, salientou que as empresas tinham chegado a acordo sobre a introdução, o nível e o calendário de introdução de uma sobretaxa relativa ao NES. Considerou igualmente que esse acordo tinha sido executado de forma parcial e que a sua implementação tinha sido objeto de acompanhamento.

304

A recorrente considera que a taxa de gravidade de 15% estabelecida pela Comissão não reflete corretamente a gravidade do acordo relativo ao NES.

305

A Comissão contesta estes argumentos.

306

A este respeito, em primeiro lugar, importa salientar que a recorrente não apresenta nenhum argumento que ponha especificamente em causa as considerações da Comissão sobre a taxa de gravidade que figuram nos considerandos 891 a 947 da decisão recorrida.

307

Em segundo lugar, deve observar‑se que, mesmo que os argumentos da recorrente relativos à utilização do valor das vendas fossem igualmente tidos em consideração como argumentos destinados a contestar taxa de gravidade, não seriam suscetíveis de demonstrar que as considerações da Comissão sobre essa taxa enfermam de erro.

308

Com efeito, há que salientar que o acordo relativo ao NES constitui um acordo horizontal sobre um elemento do preço dos serviços de transitário e deve, portanto, ser considerado uma restrição grave à concorrência.

309

Em seguida, deve recordar‑se que resulta do n.o 23 das orientações de 2006 que, em relação aos acordos horizontais de fixação de preços, a proporção das vendas tida em conta pela Comissão situar‑se‑á geralmente num nível superior da escala, que pode ir até 30%.

310

Por outro lado, tendo em conta a natureza dos serviços em causa, a circunstância de o acordo relativo ao NES apenas ter tido por objeto a sobretaxa NES não permite considerar que uma taxa de gravidade de 15% não fosse apropriada. Com efeito, como a Comissão afirmou no considerando 869 da decisão recorrida e como é corroborado por elementos de prova aí referidas, a concertação relativa à repercussão de fatores de custos através da aplicação de uma sobretaxa era suscetível de ter um impacto considerável no comportamento dos transitários e na estrutura do mercado (v. n.os 155 e 156 supra).

311

Pelas mesmas razões, há que rejeitar o argumento relativo ao facto de o volume de negócios teórico máximo ligado ao sistema NES apenas representar uma parte insignificante do montante da coima aplicada e uma parte ainda mais reduzida do volume de negócios utilizado pela Comissão.

312

Por último, no que se refere à implementação do cartel, há que observar que a recorrente não põe em causa as considerações da Comissão que figuram no considerando 907 da decisão recorrida, segundo as quais, por um lado, o nível de implementação do acordo relativo ao NES não se devia à vontade das empresas de pôr termo a esse acordo, mas antes a situações alheias ao seu funcionamento, como as reticências manifestas dos clientes, e, por outro, nenhuma das partes demonstrou sem margem para dúvidas ter evitado pôr em prática esse acordo adotando um comportamento concorrencial no mercado.

313

Atendendo a estas considerações, a fixação de uma taxa de gravidade de 15% não pode ser considerada inapropriada.

314

Consequentemente, há que rejeitar igualmente a alegação relativa à taxa de gravidade de 15% fixada pela Comissão, sem que seja necessário pronunciar‑se sobre a questão de saber se esta alegação é admissível não obstante o facto de a recorrente, por um lado, apenar ter invocado o caráter inadequado da referida taxa na fase da réplica e, por outro, não ter identificado as considerações da Comissão respeitantes à taxa de gravidade que pretendia pôr em causa.

Quanto à alegação relativa à existência de uma circunstância atenuante

315

A recorrente afirma que a Comissão devia ter tido em conta a existência de um acordo a montante e a sua incidência sobre os preços dos serviços de transporte como circunstância atenuante. A Comissão devia ter investigado mais aprofundadamente a este respeito e, por conseguinte, segundo a recorrente, também violou o princípio da boa administração.

316

A Comissão contesta estes argumentos.

317

A este respeito, há que recordar que o n.o 29 das orientações de 2006 estabelece uma lista não exaustiva de circunstâncias atenuantes que, sob certas condições, podem levar a uma diminuição do montante de base da coima.

318

Com efeito, quando uma infração foi cometida por várias empresas, há que apreciar a gravidade relativa da participação de cada uma delas na infração, a fim de determinar se existem circunstâncias agravantes ou atenuantes que lhes possam ser aplicadas (acórdão de 25 de outubro de 2011, Aragonesas Industrias y Energía/Comissão, T‑348/08, Colet., EU:T:2011:621, n.o 277).

319

Ora, há que salientar que não é possível relacionar a existência de um acordo tendo por objeto um mercado a montante com uma das circunstâncias atenuantes mencionadas expressamente no n.o 29 das orientações de 2006.

320

Além disso, embora a lista estabelecida no n.o 29 das orientações de 2006 não seja exaustiva taxativa, há que observar que a existência de um acordo tendo por o mercado dos serviços de transporte é um fator externo que não é suscetível de diminuir a gravidade relativa da participação da recorrente no acordo relativo ao NES.

321

Por outro lado, na medida em que se deva considerar que o argumento aduzido pela recorrente visa o nexo de causalidade entre as sobretaxas que os transitários aplicavam aos seus clientes e as aplicadas pelos transportadores, basta assinalar que este argumento não é suscetível de justificar um acordo ilícito entre os transitários no sentido de não fazerem concorrência uns aos outros em relação aos custos resultantes dos serviços de depósito NES, mas de repercutirem esses encargos adicionais sobre os seus clientes.

322

Por conseguinte, no presente caso, a existência de um acordo tendo por objeto os serviços de transporte não pode ser considerada uma circunstância atenuante.

323

Neste contexto, há que recordar igualmente que o Tribunal Geral já teve oportunidade de examinar e rejeitar um argumento comparável (acórdão de 14 de maio de 2014, Reagens/Comissão, T‑30/10, EU:T:2014:253, n.o 289).

324

Atendendo a estas considerações, há que rejeitar a alegação de que a Comissão não teve em conta uma circunstância atenuante e violou o princípio da boa administração.

Quanto à alegação relativa à violação do princípio da igualdade de tratamento

325

A recorrente alega que a Comissão violou o princípio da igualdade de tratamento ao seguir no presente processo uma metodologia diferente da seguida no processo COMP/39258 — Transporte aéreo de mercadorias (a seguir «processo do transporte aéreo de mercadorias»). Neste último processo, fixou o montante das coimas aplicadas aos transportadores unicamente com base nos volumes de negócios gerados pelos custos adicionais relativos ao carburante e à segurança.

326

A este respeito, em primeiro lugar, há que recordar que o princípio da igualdade de tratamento constitui um princípio geral de direito a cuja observância a Comissão está obrigada no âmbito de um processo instaurado nos termos do artigo 101.o TFUE e que se opõe a que situações comparáveis sejam tratadas de maneira diferente e a que situações diferentes sejam tratadas de maneira igual, a menos que esse tratamento seja objetivamente justificado (acórdão de 29 de junho de 2012, GDF Suez/Comissão, T‑370/09, Colet., EU:T:2012:333, n.o 386).

327

Em segundo lugar, no que respeita à questão de saber se a Comissão tratou uma situação comparável de maneira diferente, antes de mais, há que recordar que a sua prática decisória anterior não serve de quadro jurídico para as coimas em matéria de concorrência e que as decisões relativas a outros processos têm caráter meramente indicativo em relação à existência de discriminações, uma vez que os dados circunstanciais dos diferentes processos não são idênticos (acórdão de 21 de setembro de 2006, JCB Service/Comissão, C‑167/04 P, Colet., EU:C:2006:594, n.os 201 e 205).

328

Isto é ainda mais válido no presente caso, no qual o elemento em causa, isto é, a determinação do valor das vendas utilizado como ponto de partida para o cálculo do montante das coimas, objeto de uma regra expressa no n.o 13 das orientações de 2006. Com efeito, em tal caso, há que examinar uma alegação relativa a uma violação do princípio da igualdade de tratamento à luz das indicações que figuram no referido número, que a Comissão adotou a fim de reforçar a coerência da sua posição nos vários processos. Ora, resulta das considerações precedentes que, por um lado, a Comissão respeitou a metodologia geral prevista no referido número e, por outro, nas circunstâncias do caso concreto, não era obrigada a afastar‑se dessa metodologia.

329

Consequentemente, mesmo na hipótese de a alegação da recorrente, segundo a qual a Comissão seguiu uma metodologia diferente no processo do transporte aéreo de mercadorias, vir a ser comprovada, isso não seria suscetível de demonstrar que, no presente caso, a Comissão violou o princípio da igualdade de tratamento. Com efeito, nessa hipótese, ou, contrariamente ao que sucede no caso em apreço, existiam particularidades no processo do transporte aéreo de mercadorias que justificavam que a Comissão se afastasse do método geral previsto no n.o 13 das orientações de 2006, ou a Comissão não as teria respeitado no referido processo. Ora, nas duas hipóteses, a recorrente não teria o direito de pedir para ser tratada da mesma maneira no presente processo e no processo do transporte aéreo de mercadorias.

330

Assim, há que rejeitar igualmente a alegação de uma violação do princípio da igualdade de tratamento.

Conclusão

331

Por conseguinte, na medida em que visa a anulação da coima aplicada pelo artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da decisão recorrida, há que rejeitar a presente parte do fundamento.

332

Há que rejeitá‑la igualmente na medida em que é suscitada em apoio do pedido de exercício, pelo Tribunal Geral, da sua competência de plena jurisdição.

333

Com efeito, a análise da presente parte não só não revelou erros como não demonstrou a existência de elementos inadequados no âmbito do cálculo do montante das coimas.

334

Em especial, tendo em conta as considerações que figuram nos n.os 240 a 264 e 272 a 301 supra, há que sublinhar que nem a abordagem equacionada pela recorrente, que consiste em ter unicamente em conta os volumes de negócios realizados com os serviços de depósito NES, nem a de que os custos dos serviços de transporte são deduzidos do valor das vendas utilizado ou de que esse valor das vendas seria adaptado em razão da existência de um acordo tendo por objeto o mercado dos serviços de transporte podem ser consideradas apropriadas, uma vez que tais abordagens não são suscetíveis de refletir de maneira adequada a importância económica da participação da recorrente no acordo relativo ao NES, que visava os serviços de transitário enquanto lotes de serviços.

335

Neste contexto, há que salientar igualmente que, mesmo que não se possa excluir que a existência de margens reduzidas possa ser uma indicação da reduzida capacidade financeira de uma empresa não obstante a importância do seu volume de negócios, não foi invocado nenhum argumento no caso em apreço que permitisse demonstrar que as coimas aplicadas foram excessivos atendendo à capacidade financeira da recorrente.

336

Por outro lado, pelas razões acima expostas nos n.os 265 a 271, a abordagem segundo a qual só podem ser tomadas em conta as vendas nas quais foi efetivamente faturada uma sobretaxa NES também não pode ser considerada adequada.

337

Assim, a primeira parte do quinto fundamento deve ser rejeitada.

Quanto à segunda parte, relativa a uma violação do artigo 27.o do Regulamento n.o 1/2003 e dos direitos de defesa

338

Esta parte do fundamento tem por objeto a fundamentação que figura nos considerandos 887 e 888 da decisão recorrida, nos quais a Comissão expôs as razões pelas quais não havia que dar à recorrente acesso aos documentos do processo do transporte aéreo de mercadorias. Neste contexto, a Comissão salientou que a recorrente não era mencionada no referido processo e que, portanto, não podia aceder aos respetivos documentos em aplicação da sua Comunicação relativa às regras de acesso ao processo nos casos de aplicação dos artigos [101.° TFUE] e [102.° TFUE], artigos 53.°, 54.° e 57.° do Acordo EEE e do Regulamento (CE) n.o 139/2004 do Conselho (JO 2005, C 325, p. 7), nem do Regulamento (CE) n.o 773/2004 da Comissão, de 7 de abril de 2004, relativo à instrução de processos pela Comissão para efeitos dos artigos [101.° TFUE] e [102.° TFUE] (JO L 123, p. 18). Por outro lado, constatou que, em qualquer caso, nenhum dos documentos contidos no processo do transporte aéreo de mercadorias era pertinente para a responsabilidade dos transitários no presente processo.

339

A recorrente sustenta que a Comissão violou o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003 e os direitos de defesa. Deveria ter‑lhe permitido examinar as informações pertinentes no processo do transporte aéreo de mercadorias, que está estreitamente relacionado com o presente processo. Sem poder aceder adequadamente ao processo, não pôde exercer plenamente os seus direitos de defesa.

340

A Comissão contesta estes argumentos.

341

A este respeito, a título preliminar, importa recordar que, por força do artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003, antes de tomar as decisões previstas nos artigos 7.°, 8.° e 23.° e no n.o 2 do artigo 24.o do referido regulamento, a Comissão dá às empresas sujeitas ao processo por si instruído a oportunidade de se pronunciarem sobre as acusações por ela formuladas. A Comissão deve basear as suas decisões apenas em acusações sobre as quais as partes tenham tido oportunidade de apresentar as suas observações.

342

O artigo 27.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 prevê que os direitos de defesa das partes interessadas serão plenamente acautelados no desenrolar do processo. As partes têm direito a consultar o processo em poder da Comissão, sob reserva do interesse legítimo das empresas na proteção dos seus segredos comerciais.

343

Por força do artigo 15.o do Regulamento n.o 773/2004, se solicitado, a Comissão facultará o acesso ao processo aos interessados diretos a quem tiver sido enviada uma comunicação de objeções e o acesso será facultado após a notificação da comunicação de objeções.

344

Resulta destas disposições que a Comissão deve facultar à empresa em causa a possibilidade de proceder a um exame de todos os documentos que figuram no processo de instrução e que possam ser pertinentes para a sua defesa. Estes incluem tanto os elementos incriminatórios como os que ilibam a empresa, sob reserva dos segredos comerciais de outras empresas, dos documentos internos da Comissão e de outras informações confidenciais (acórdão de 1 de julho de 2010, Knauf Gips/Comissão, C‑407/08 P, Colet., EU:C:2010:389, n.o 22).

345

Quanto à não comunicação de documentos suscetíveis de ilibar a empresa, é jurisprudência constante que a empresa em causa apenas deve demonstrar que a sua não divulgação pôde influenciar, em seu prejuízo, o desenrolar do processo e o conteúdo da decisão da Comissão. Basta que a empresa demonstre que poderia ter feito uso dos referidos documentos para sua defesa, no sentido de que, se pudesse tê‑los utilizado no procedimento administrativo, poderia ter invocado elementos que não concordavam com as deduções feitas nessa fase pela Comissão e, consequentemente, poderia ter influenciado, de uma maneira ou de outra, as apreciações feitas por esta última na eventual decisão, pelo menos no que respeita à gravidade e à duração do comportamento que lhe era imputado, e, portanto, ao nível da coima (acórdão Knauf Gips/Comissão, n.o 344 supra, EU:C:2010:389, n.o 23).

346

Daqui se conclui que incumbe à recorrente não só demonstrar que não teve acesso aos documentos constantes do processo do transporte aéreo de mercadorias mas também que poderia ter utilizado esses elementos em sua defesa. Com efeito, não pode utilmente invocar a não comunicação de documentos não pertinentes.

347

A recorrente alega que, com base nas partes pertinentes do processo do transporte aéreo de mercadorias, poderia ter fornecido uma estimativa da incidência do acordo relativo ao transporte aéreo de mercadorias no seu volume de negócios. Assim, poderia ter demonstrado que a decisão da Comissão de tomar em conta um volume de negócios sobreavaliado era inadequada e desproporcionada.

348

Ora, como acima se expôs nos n.os 272 a 281 e 315 a 324, a existência de um acordo tendo por objeto os serviços de transporte aéreo não era suscetível de ter um impacto sobre o volume de negócios utilizado pela Comissão nem de ser levada em conta como circunstância atenuante. Por outro lado, como se expôs nos n.os 325 a 330 supra, a recorrente não pode basear uma alegação de violação do princípio da igualdade de tratamento no comportamento da Comissão no processo do transporte aéreo de mercadorias.

349

Neste contexto, há que rejeitar igualmente o argumento da recorrente segundo o qual a decisão da Comissão de lhe recusar o acesso ao processo sem um exame adicional não é coerente com a «abordagem global do direito da União». Com efeito, este argumento não é suscetível de pôr em causa a conclusão segundo a qual o conteúdo do processo do transporte aéreo de mercadorias não poderia ter influenciado as apreciações da Comissão constantes da decisão recorrida. Por outro lado, na medida em que, neste contexto, a recorrente invoca o acórdão de 22 de maio de 2012, EnBW Energie Baden‑Württemberg/Comissão (T‑344/08, Colet., EU:T:2012:242), basta salientar que, por um lado, esse acórdão dizia respeito ao acesso ao processo ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 1049/2001 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 2001, relativo ao acesso do público aos documentos do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão (JO L 145, p. 43), e não às disposições mencionadas nos n.os 341 a 343 supra, e, por outro, que tal acórdão foi anulado pelo Tribunal de Justiça (acórdão de 27 de fevereiro de 2014, Comissão/EnBW, C‑365/12 P, Colet., EU:C:2014:112).

350

A recorrente não apresenta nenhum argumento suscetível de pôr em causa estas considerações ou de demonstrar que o conteúdo do processo do transporte aéreo de mercadorias podia ter influenciado outro elemento das apreciações feitas pela Comissão na decisão recorrida.

351

Por conseguinte, há que rejeitar igualmente esta parte do fundamento e, consequentemente, o presente fundamento na totalidade, não apenas no que respeita ao pedido de anulação mas também ao pedido de exercício, pelo Tribunal Geral, do seu poder de plena jurisdição.

6. Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação do artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 e do princípio da igualdade de tratamento, à inobservância da comunicação sobre a cooperação de 2006 e a um erro de apreciação

352

O presente fundamento tem por objeto a decisão da Comissão de conceder a imunidade em matéria de coimas à DP no que respeita ao acordo relativo ao NES.

353

Nos considerandos 1026 a 1103 da decisão recorrida, por um lado, a Comissão concedeu a imunidade em matéria de coimas à DP no que respeita aos acordos relativos ao NES, ao AMS, ao CAF e à PSS. A este propósito, a Comissão salientou que, no momento em que tinha recebido o pedido de imunidade da DP, atendendo às informações que esta lhe tinha submetido, tinha o direito de lhe conceder, na sua carta de 24 de setembro de 2007, uma imunidade condicional em relação a um suposto acordo entre fornecedores privados de serviços de transitário internacional destinado a fixar ou a repercutir sobre os seus clientes diversos direitos e sobretaxas, nomeadamente [confidencial]. No final do procedimento administrativo, a Comissão considerou que a DP tinha cooperado de forma satisfatória e que o suposto acordo para o qual tinha concedido uma imunidade condicional à DP «cobria plenamente o conjunto das infrações objeto da decisão recorrida». Por outro lado, a Comissão avaliou os pedidos de imunidade e de redução do montante das coimas das outras empresas em relação com esses acordos.

354

A recorrente alega que estas considerações enfermam de erros. Considera que a Comissão favoreceu a DP relativamente às outras empresas que apresentaram pedidos de imunidade e de redução, ao avaliar os seus pedidos numa base diferente da aplicada relativamente à DP. Embora tenha reconhecido a existência de quatro infrações, a Comissão concedeu uma imunidade condicional geral em relação ao setor dos serviços de transitário aéreo à DP, sem examinar se os elementos de prova apresentados por esta empresa cobriam todos os comportamentos em causa. A Comissão procedeu de maneira diferente no que respeita aos pedidos de redução do montante das coimas das outras empresas, que avaliou em relação a cada infração considerada separadamente. A recorrente alega que, se o conjunto dos pedidos de imunidade e de redução do montante das coimas tivesse sido apreciado tendo em consideração o setor do transitário no seu conjunto, teria tido direito a um tratamento mais favorável.

355

A Comissão contesta estes argumentos.

356

Atendendo aos seus argumentos, que visam demonstrar que, se a Comissão tivesse aplicado a comunicação sobre a cooperação de 2006 de maneira correta, a recorrente teria sido tratada de forma mais favorável, há que examinar, num primeiro momento, se a Comissão cometeu um erro ao conceder a imunidade à DP no que respeita ao acordo relativo ao NES, antes de examinar, num segundo momento, o argumento de que a Comissão utilizou uma base diferente para os pedidos de redução do montante das coimas das outras empresas, entre as quais a recorrente.

Quanto à observância dos requisitos previstos para a concessão de imunidade

357

A este respeito, há que recordar que resulta do ponto 8, alínea a), da comunicação sobre a cooperação de 2006 que a Comissão concede uma imunidade condicional em matéria de coimas a uma empresa que revela a sua participação num alegado cartel desde que seja a primeira a fornecer informações e elementos de prova que lhe permitam efetuar uma inspeção direcionada relativamente visando o alegado cartel.

358

O ponto 9 da comunicação sobre a cooperação de 2006 tem a seguinte redação:

«Para que a Comissão possa realizar uma inspeção direcionada, na aceção da alínea a) do ponto 8, a empresa deve fornecer à Comissão as informações e os elementos de prova referidos a seguir, na medida em que tal, na opinião da Comissão, não ponha em risco as inspeções:

(a)

Uma declaração da empresa […] que inclua, na medida daquilo que for do seu conhecimento no momento da apresentação do pedido:

Uma descrição pormenorizada […] do alegado cartel, incluindo, por exemplo, os seus objetivos, atividades e funcionamento; o produto ou serviço em causa, o âmbito geográfico, a duração e uma estimativa dos volumes de mercado afetados; informações específicas sobre datas, locais, conteúdo e participantes em contactos efetuados no âmbito do alegado cartel e todas as explicações relevantes relativas aos elementos de prova apresentados em apoio do pedido;

O nome e endereço da entidade jurídica que apresenta o pedido de imunidade, bem como os nomes e endereços de todas as outras empresas que participam ou participaram no alegado cartel;

Os nomes, funções, endereço profissional e, se necessário, o endereço privado de todas as pessoas que, tanto quanto for do conhecimento do requerente, participam ou participaram no alegado cartel, incluindo aquelas que participaram em nome do requerente;

Informação sobre se outras autoridades de concorrência, no interior ou no exterior da UE, foram ou deverão ser contactadas pela empresa a propósito do alegado cartel; bem como

(b)

Outros elementos de prova relacionados com o alegado cartel, na posse do requerente ou à sua disposição no momento da apresentação do pedido, em especial qualquer elemento de prova contemporâneo da infração.»

359

Em aplicação do ponto 18 da comunicação sobre a cooperação de 2006, após ter recebido da empresa as informações e os elementos de prova e após ter verificado se as condições enunciadas no seu ponto 8, alínea a), estão preenchidas, a Comissão concederá por escrito à empresa uma imunidade condicional em matéria de coimas.

360

Resulta do ponto 22 da referida comunicação que, se, no final do procedimento administrativo, a empresa tiver preenchido as condições previstas no ponto 12, designadamente uma cooperação sincera, plena, permanente e expedita com a Comissão, esta última conceder‑lhe‑á imunidade definitiva na decisão que põe termo ao procedimento administrativo.

361

Por outro lado, deve recordar‑se que, ao adotar a comunicação sobre a cooperação de 2006, a Comissão criou expectativas legítimas, o que, aliás, reconheceu no ponto 38 da referida comunicação. Tendo em conta a confiança legítima que as empresas que pretendam cooperar com a Comissão podem inferir dessa comunicação, a Comissão está, portanto, obrigada a respeitá‑la. Portanto, na hipótese de a Comissão não respeitar as linhas de conduta estabelecidas pela referida comunicação, não respeita o princípio da proteção da confiança legítima (v., neste sentido, acórdãos de 18 de junho de 2008, Hoechst/Comissão, T‑410/03, Colet., EU:T:2008:211, n.o 510, e de 13 de julho de 2011, Kone e o./Comissão, T‑151/07, Colet., EU:T:2011:365, n.o 127).

362

No que se refere à escolha dos elementos a tomar em consideração para efeitos da aplicação dos critérios mencionados na comunicação sobre a cooperação de 2006 e à avaliação destes elementos, cabe ao Tribunal Geral efetuar a fiscalização da legalidade que lhe incumbe, sem se basear na margem de apreciação de que a Comissão dispõe para renunciar a exercer uma fiscalização aprofundada tanto de direito como de facto (acórdão de 24 de outubro de 2013, Kone e o./Comissão, C‑510/11 P, EU:C:2013:696, n.os 24 e 54).

363

É à luz desta jurisprudência e destes princípios que há que examinar os argumentos da recorrente.

364

Tendo em conta a economia das regras constantes da comunicação sobre a cooperação de 2006, há que examinar se, nos termos do ponto 8, alínea a), e dos pontos 9 e 18 da comunicação sobre a cooperação de 2006, a Comissão tinha o direito de conceder imunidade condicional à DP no que respeita a um pretenso acordo da dimensão mencionada no n.o 353 supra, antes de examinar se, no termo do procedimento administrativo, a Comissão tinha o direito de lhe conceder a imunidade definitiva a respeito do acordo relativo ao NES.

365

Em aplicação do ponto 8, alínea a), da comunicação sobre a cooperação de 2006, a DP deve, portanto, ter sido a primeira empresa a fornecer informações e elementos de prova suscetíveis de permitir à Comissão efetuar uma inspeção direcionada em relação a um suposto acordo abrangendo o acordo relativo ao NES.

366

Resulta da decisão recorrida que, no momento em que a DP apresentou o seu pedido de imunidade, a Comissão não dispunha de nenhuma informação sobre a existência de eventuais infrações no setor dos serviços de transitário aéreo. Portanto, teve de avaliar o pedido de imunidade da DP com base nas informações e nos elementos de prova por esta fornecidos. No caso em apreço, a Comissão considerou que as informações da DP lhe permitiam efetuar inspeções direcionadas em relação a um acordo da dimensão mencionada no n.o 353 supra.

367

A este respeito, a recorrente limita‑se a alegar que a Comissão concedeu à DP uma imunidade genérica em relação a todos os comportamentos em causa sem ter apreciado se os elementos de prova apresentados pela DP abrangiam todos os comportamentos em causa.

368

Neste particular, importa recordar que, no momento em que recebe um pedido de imunidade na aceção desse ponto, a Comissão ainda não tem conhecimento do acordo em causa. Por conseguinte, como é precisado na nota de pé de página n.o 1, no ponto 8, alínea a), da comunicação sobre a cooperação de 2006, é obrigada a proceder a uma apreciação ex ante do pedido de imunidade, que se baseia em exclusivo na natureza e na qualidade das informações fornecidas pela empresa.

369

A comunicação sobre a cooperação de 2006 não se opõe, portanto, a que a Comissão confira imunidade condicional a uma empresa, mesmo que as informações fornecidas por esta última ainda não lhe permitam ter uma ideia pormenorizada e precisa sobre a natureza e a extensão do suposto acordo.

370

Com efeito, por um lado, embora o ponto 9, alínea a), da comunicação sobre a cooperação de 2006 exija que a empresa que pede a imunidade forneça à Comissão uma «descrição pormenorizada», nomeadamente, do suposto acordo e do seu âmbito geográfico, bem como «informações específicas» sobre o seu objeto, esta obrigação só é válida na medida em que a empresa tenha conhecimento desses dados no momento do pedido. Por outro lado, importa recordar que a colaboração de uma empresa para a descoberta de um acordo de que a Comissão ainda não tenha conhecimento tem um valor intrínseco suscetível de justificar a imunidade da coima. Com efeito, o objetivo do ponto 8, alínea a), e do ponto 18 da comunicação sobre a cooperação de 2006 é facilitar a deteção de infrações desconhecidas pela Comissão, que permaneceriam secretas na falta de elementos de prova comunicados pela empresa que faz o pedido de imunidade (v., por analogia, acórdão Kone e o./Comissão, n.o 362 supra, EU:C:2013:696, n.o 67).

371

Por conseguinte, contrariamente ao que alega a recorrente, os pontos 8, alínea a), 9 e 18 da comunicação sobre a cooperação de 2006 não exigem que os elementos submetidos por uma empresa constituam informações e elementos de prova especificamente sobre as infrações que a Comissão constata no final do procedimento administrativo. Basta que lhe tenham permitido realizar uma inspeção direcionada relativamente a uma suposta infração que abranja a infração ou as infrações que constata no final desse procedimento.

372

Em seguida, há que salientar que a recorrente não apresenta nenhum argumento suscetível de pôr em causa a conclusão da Comissão segundo a qual as informações que a DP lhe tinha fornecido antes de 24 de setembro de 2007 lhe permitiam efetuar uma inspeção direcionada sobre um suposto acordo entre fornecedores privados de serviços de transitário internacional destinado a fixar ou a repercutir diversos direitos e sobretaxas nos territórios mencionados no n.o 353 supra.

373

Por conseguinte, a Comissão não cometeu um erro ao conceder a imunidade condicional à DP em relação a esse suposto acordo em aplicação do ponto 8, alínea a), e dos pontos 9 e 18 da comunicação sobre a cooperação de 2006.

374

Quanto à decisão da Comissão de conceder a imunidade definitiva à DP no termo do procedimento administrativo, há que salientar que, após ter constatado, no considerando 1029 da decisão recorrida, que os acordos relativos ao NES, ao AMS, ao CAF e à PSS constituíam infrações únicas e continuadas distintas, a Comissão entendeu, no considerando 1031 da referida decisão, que o suposto acordo em relação ao qual tinha concedido uma imunidade condicional à DP «cobria plenamente o conjunto das infrações objeto da decisão recorrida».

375

Ao proceder desta forma, a Comissão seguiu o procedimento previsto no ponto 22 da comunicação sobre a cooperação de 2006.

376

Atendendo às considerações precedentes, deve concluir‑se que, no caso em apreço, a Comissão não desrespeitou as condições previstas no ponto 8, alínea a), e nos pontos 9, 18 e 22 da comunicação sobre a cooperação de 2006.

Quanto ao argumento relativo à utilização de uma base diferente

377

A recorrente alega que a Comissão violou o princípio da igualdade de tratamento e cometeu erros de apreciação ao tratar o pedido de imunidade da DP numa base diferente da que utilizou para os pedidos das outras empresas.

378

A este respeito, a título liminar, importa salientar que, como resulta dos considerandos 1029 e 1031 da decisão recorrida, quando, no termo do procedimento administrativo, a Comissão se pronunciou definitivamente sobre o pedido de imunidade da DP e decidiu quanto aos pedidos de redução do montante das coimas das outras empresas, avaliou estes pedidos utilizando a mesma base, ou seja, em relação aos acordos distintos relativos ao NES, ao AMS, ao CAF e à PSS constatados nessa fase do procedimento.

379

Em seguida, há que examinar o argumento da recorrente relativo ao facto de a Comissão ter aplicado erradamente a comunicação sobre a cooperação de 2006 tendo em conta os elementos de que dispunha no momento em que recebeu, por um lado, o pedido de imunidade da DP e, por outro, os pedidos das outras empresas, entre os quais o da recorrente. Segundo a recorrente, o momento da apresentação dos pedidos de imunidade e de redução do montante das coimas já tinha sido tomado em consideração no âmbito da classificação dos pedidos. Por conseguinte, não podia ser tido em conta novamente para justificar que o pedido da DP e os pedidos de redução das outras empresas tivessem sido tratados com bases diferentes.

380

Em primeiro lugar, na hipótese de esse argumento ter por objeto o facto de a Comissão ter tido em conta elementos de que dispunha no momento em que os diferentes pedidos foram apresentados, por um lado, há que salientar que resulta claramente das regras previstas pela comunicação sobre a cooperação de 2006 que a Comissão é obrigada a ter em conta os elementos de que dispõe no momento da apresentação de um pedido de imunidade ou de redução. Assim, resulta do ponto 10 da referida comunicação que a imunidade condicional nos termos do ponto 8, alínea a), dessa comunicação não é concedida se a Comissão já dispuser de elementos de prova suficientes para adotar uma decisão de efetuar uma inspeção relativamente ao alegado cartel. Quanto aos pedidos de redução do montante das coimas, resulta do ponto 24 da comunicação sobre a cooperação de 2006 que, a fim de obter uma redução, a empresa deve fornecer à Comissão elementos de prova da alegada infração que apresentem um valor acrescentado significativo «relativamente aos elementos de prova já na posse [desta última]».

381

Por outro lado, deve recordar‑se que o programa de clemência da Comissão não tem por objetivo facultar às empresas participantes nos acordos secretos a possibilidade de se eximirem às consequências pecuniárias das respetivas responsabilidades, mas facilitar a deteção de tais práticas e em seguida, no decurso do procedimento administrativo, a reconstituição dos factos pertinentes na medida do possível. Por conseguinte, os lucros que podem ser obtidos pelas empresas que participam em tais práticas não podem ultrapassar o nível que é necessário para assegurar a plena eficácia do programa de clemência e do procedimento administrativo conduzido pela Comissão.

382

Por conseguinte, contrariamente ao que alega a recorrente, no caso em apreço, a Comissão não cometeu um erro ao ter em conta o facto de, no momento em que a DP tinha apresentado o seu pedido de imunidade, ainda não ter conhecimento de um comportamento anticoncorrencial tendo por objeto os serviços de transitário, quando, no momento em que recebeu os pedidos das outras empresas, entre os quais o do grupo DB, já dispunha de tais informações. Neste contexto, importa recordar que, quando as outras empresas apresentaram os seus pedidos, a Comissão dispunha não só das informações e dos elementos de prova que a DP lhe tinha submetido mas também dos elementos de prova que tinha reunido durante as inspeções inopinadas.

383

Em segundo lugar, na hipótese de o argumento da recorrente ter por objeto o facto de, por um lado, no que se refere ao pedido de imunidade da DP, em primeiro lugar, a Comissão ter concedido a imunidade condicional com base nas informações de que dispunha nessa fase do procedimento e, em segundo lugar, no final do procedimento administrativo, ter concedido a imunidade definitiva em relação aos acordos constatados com o fundamento de que estes estavam cobertos pelo acordo para o qual tinha concedido a imunidade condicional, quando, por outro lado, no que respeita aos pedidos de redução das outras empresas, a Comissão se limitou a examinar o valor acrescentado das informações e dos elementos de prova fornecidos em relação aos acordos constatados no termo do procedimento administrativo, o argumento também deve ser rejeitado.

384

A este respeito, deve salientar‑se que a comunicação sobre a cooperação de 2006 prevê regimes distintos para, por um lado, os pedidos de imunidade e, por outro, os pedidos de redução do montante das coimas. Com efeito, só para os pedidos de imunidade prevê que a Comissão adote uma decisão de imunidade condicional com base nas informações de que dispõe no momento da receção de tal pedido, portanto com base numa apreciação ex ante. Em contrapartida, para os pedidos de redução do montante das coimas, essa decisão condicional antecipada não está prevista e a Comissão limita‑se a examinar, no termo do procedimento administrativo, o valor acrescentado das informações e dos elementos de prova apresentados em relação aos acordos que constatou no termo do procedimento.

385

Na medida em que o argumento da recorrente tenha por objetivo pôr em causa essa distinção efetuada pela comunicação sobre a cooperação de 2006, basta observar que o tratamento privilegiado da primeira empresa que cooperou utilmente com a Comissão na aceção do ponto 8 da referida comunicação é justificado pelos objetivos, por um lado, de incitar as empresas a cooperar o mais rapidamente possível com esta última a fim de beneficiarem desse tratamento privilegiado e, por outro, de não conferir às empresas que não são as primeiras a cooperar utilmente com a Comissão benefícios que ultrapassem o nível do que é necessário para garantir a plena eficácia do programa de clemência e do procedimento administrativo (v. n.o 381 supra).

386

Neste contexto, há que recordar igualmente que a distinção entre o regime previsto, por um lado, para os pedidos de imunidade e, por outro, para os pedidos de redução é atenuada pela regra estabelecida no ponto 26, terceiro parágrafo, da Comunicação sobre a cooperação de 2006. Segundo esta regra, quando uma empresa que solicita uma redução do montante da coima revela elementos de prova decisivos na aceção do ponto 25 da comunicação sobre a cooperação de 2006, que a Comissão utilize para determinar factos adicionais que venham aumentar a gravidade ou a duração da infração, a Comissão não tomará em consideração estes elementos ao fixar o montante da coima a aplicar à empresa que os forneceu, concedendo‑lhe, desse modo, uma «imunidade parcial».

387

Atendendo a estas considerações, o argumento relativo ao facto de a Comissão ter apreciado o pedido de imunidade da DP e os pedidos de redução do montante das coimas das outras empresas utilizando bases diferentes também deve ser rejeitado.

388

Deste modo, há que concluir que nenhum dos argumentos apresentados pela recorrente é suscetível de demonstrar que a avaliação, pela Comissão, do pedido de imunidade de coima da DP e dos pedidos de redução do montante das coimas das outras empresas enferma de erros.

389

Por conseguinte, o sexto fundamento deve ser rejeitado na totalidade, não apenas no que respeita ao pedido de anulação mas também no que respeita ao pedido de exercício, pelo Tribunal Geral, do seu poder de plena jurisdição.

7. Quanto ao sétimo fundamento, relativo à decisão da Comissão de não seguir um procedimento de transação

390

A recorrente alega que, por carta de 21 de outubro de 2009, o grupo DB informou a Comissão de que o presente processo se prestava a uma transação e manifestou o seu interesse em encetar negociações para chegar a uma transação. Considera que, ao responder‑lhe, por carta de 4 de novembro de 2009, que, à luz das circunstâncias específicas do caso concreto e da fase relativamente avançada do procedimento, não considerava adequado encetar discussões com vista a uma transação no presente processo, a Comissão, por um lado, violou o artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 e cometeu erros de apreciação e, por outro, violou o princípio da igualdade de tratamento.

Quanto à primeira parte, relativa, nomeadamente, à violação do artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 e a erros de apreciação

391

Em primeiro lugar, a recorrente alega que, na sequência da receção da sua carta de 21 de outubro de 2009, a Comissão deveria, por um lado, ter tentado saber se as partes em causa pretendiam participar numa transação para poder exercer utilmente o seu poder de apreciação e, por outro, ter iniciado uma discussão com ela para chegar à resolução do procedimento por transação. O objetivo de um processo de transação é otimizar a utilização dos recursos da Comissão, melhorando os seus desempenhos de execução sem necessariamente aumentar os seus encargos administrativos. Ora, segundo a recorrente, a Comissão não pode ter avaliado adequadamente as possibilidades de realizar ganhos de eficácia graças ao procedimento de transação sem se ter certificado antecipadamente se as partes visadas pelo inquérito estavam dispostas a eventualmente reconhecer as respetivas responsabilidades nos termos do artigo 101.o TFUE em relação à totalidade ou a parte do comportamento por ela analisado.

392

A Comissão contesta estes argumentos.

393

A este respeito, a título liminar, deve assinalar‑se que, na abordagem defendida pela recorrente, a Comissão não é capaz de apreciar plenamente a oportunidade de um procedimento de transação antes de entrar em contacto com as partes interessadas e antes de ter procurado determinar o interesse de cada uma em chegar a uma resolução por transação. Por conseguinte, na opinião da recorrente, a Comissão cometeu um erro de apreciação ao tomar a decisão de não seguir a via da resolução por transação antes de ter entrado em contacto com os destinatários da decisão recorrida.

394

Tal abordagem não está em conformidade com as disposições aplicáveis.

395

Com efeito, nos termos do artigo 10.o‑A, n.o 1, do Regulamento n.o 773/2004, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 622/2008 da Comissão, de 30 de junho de 2008 (JO L 171, p. 3), a Comissão pode fixar um prazo aos interessados para que declarem por escrito se estão dispostos a participar em conversações tendo em vista a eventual apresentação de propostas de transação. Resulta, assim, claramente do teor desta disposição que a Comissão não está obrigada a entrar em contacto com as partes, mas que dispõe de uma margem de apreciação a este respeito. Esta leitura do artigo 10.o‑A, n.o 1, do Regulamento n.o 773/2004, conforme alterado, é confirmada pelo considerando 4 do Regulamento n.o 622/2008, segundo o qual a Comissão conserva uma ampla margem discricionária para determinar quais os processos que se podem revelar adequados para explorar o interesse dos interessados diretos em realizar conversações de transação, bem como para decidir encetar esse procedimento, pôr‑lhe termo ou concluir um acordo final.

396

Neste contexto, é igualmente de salientar que a prática da Comissão está em conformidade com esta abordagem. Com efeito, segundo o ponto 6 da sua Comunicação relativa aos processos de transação, quando considera que um caso se presta, em princípio, a uma resolução por transação, deve procurar conhecer o eventual interesse de todas as partes em chegar a uma resolução por transação, ainda que as partes no processo não tenham direito a esta forma de procedimento. Resulta claramente do referido ponto que só no caso de a Comissão considerar que um processo se presta a um acordo é que deverá procurar conhecer o interesse das empresas envolvidas. Por conseguinte, o referido ponto prevê igualmente a possibilidade de a Comissão considerar que um processo não se presta a resolução por transação sem que, previamente, tenha entrado em contacto com as partes interessadas e procurado conhecer o interesse de cada uma em obter uma resolução por transação.

397

Daqui resulta que, contrariamente ao que alega a recorrente, o simples facto de a Comissão não ter procurado o seu interesse e o interesse das outras empresas em causa em obter uma resolução por transação não é, em si mesmo, suscetível de demonstrar que a decisão recorrida enferma de erros. Por conseguinte, há que rejeitar esta alegação.

398

Em segundo lugar, a recorrente alega que, nas circunstâncias do caso em apreço, a decisão da Comissão de não optar por uma resolução por transação enfermava de erros de apreciação. No caso em apreço, uma resolução por transação teria permitido obter ganhos de eficiência.

399

A Comissão contesta estes argumentos.

400

Há que salientar que, contrariamente ao que a recorrente dá a entender, a Comissão utilizou o seu poder de apreciação. Basta salientar que, na sua carta de 4 de novembro de 2009, respondeu que não considerava adequado encetar discussões de transação no presente processo.

401

Por outro lado, quanto às alegações relativas a um erro de apreciação da Comissão, a título liminar, há que recordar que, segundo as indicações desta última, a sua decisão de não optar pela resolução por transação no presente processo baseou‑se, entre outras, na consideração de que a probabilidade de se chegar a uma apreciação comum com as partes em causa sobre o alcance das acusações eventuais não se afigurava suficientemente elevada, atendendo, nomeadamente, ao grande número de partes envolvidas.

402

Neste contexto, há que recordar que uma resolução por transação visa maximizar a utilização dos recursos da Comissão mediante a aplicação de sanções eficazes e proferidas rapidamente. Nos termos do considerando 4 do Regulamento n.o 622/2008, a Comissão deve tomar em consideração a probabilidade de chegar a um entendimento com os interessados diretos relativamente ao âmbito das objeções potenciais, dentro de um prazo razoável. Como resulta do referido considerando, pode ter em conta fatores como o número de interessados diretos envolvidos, as previsíveis posições contraditórias no que se refere à atribuição de responsabilidades e a medida em que os factos sejam passíveis de ser contestados. Resulta igualmente deste considerando que a Comissão pode ter em conta outras considerações além de eventuais ganhos de eficiência, como a possibilidade de criar um precedente.

403

É à luz destas considerações que há que examinar se os argumentos apresentados pela recorrente são suscetíveis de demonstrar erros de apreciação da Comissão.

404

A este respeito, em primeiro lugar, a recorrente invoca o elevado número de partes em causa e o facto de que um procedimento de transação poderia ter permitido obter ganhos de eficiência.

405

No que respeita a este argumento, há que recordar que os ganhos de eficiência resultantes de um procedimento de transação são mais importantes quando todas as partes envolvidas aceitam uma resolução por transação. Com efeito, em tal hipótese, a Comissão não é obrigada a facultar o acesso aos autos e a organizar uma audição. Pode igualmente limitar‑se a redigir uma versão sucinta da comunicação de acusações numa única língua. Em contrapartida, se uma ou mais partes não estiverem dispostas a seguir a via transacional, os ganhos de eficiência são mais limitados. Por conseguinte, não é errado considerar que um número elevado de partes pode ter um impacto negativo sobre o prazo no qual a Comissão chega a uma apreciação comum sobre o alcance das acusações eventuais com as partes interessadas.

406

Atendendo à circunstância de, no caso em apreço, o número de partes que participaram no procedimento ascender a 47, a Comissão não cometeu um erro ao considerar que este aspeto não militava a favor de uma resolução do processo por transação.

407

Neste contexto, importa igualmente salientar, por um lado, que um número significativo de empresas não tinha cooperado com a Comissão com base na sua comunicação sobre a cooperação de 2006 e que, por outro lado, se corria o risco de certos elementos da sua decisão, como a admissibilidade das informações e dos elementos de prova apresentados pela DP, a atribuição da responsabilidade aos sucessores económicos e a determinação do valor das vendas realizadas em relação com os acordos, serem contestados por alguns dos destinatários da decisão recorrida. Por conseguinte, contrariamente ao que é alegado pela recorrente, não era de excluir que certos elementos da decisão recorrida viessem a ser contestados pelos seus destinatários.

408

Contrariamente ao que sustenta a recorrente, a circunstância de haver um número elevado de partes não se opunha, portanto, a que a Comissão decidisse não desencadear um procedimento de resolução por transação.

409

Em segundo lugar, a recorrente alega que o número de partes em causa poderia ter sido menos elevado se a Comissão tivesse decidido iniciar procedimentos diferentes para cada um dos acordos relativos ao AMS, ao CAF, ao NES e à PSS, em vez de os agrupar num único processo. A Comissão não pode invocar uma circunstância de que ela própria é responsável.

410

Este argumento deve igualmente ser rejeitado.

411

A este respeito, importa salientar que tanto a opção de uma resolução por transação como a opção de um tratamento paralelo de várias infrações no âmbito do mesmo procedimento visam obter ganhos de eficiência. Ora, uma vez que nenhuma disposição prevê uma hierarquia entre essas duas opções, a escolha da Comissão de tratar várias infrações no âmbito de um único procedimento não é limitada pela existência da opção de uma resolução por transação. Portanto, a Comissão não pode ser acusada de ter optado por tratar os acordos relativos ao AMS, ao CAF, ao NES e à PSS em conjunto e de ter apreciado a oportunidade de uma resolução por transação tendo em conta a situação processual resultante desta escolha.

412

Em todo o caso, há que constatar que a recorrente não demonstra que a decisão de tratar as infrações acima referidas de modo isolado tenha tido como consequência conduzir a outro resultado no que respeita a uma resolução por transação. Neste contexto, há que salientar que, mesmo considerando as referidas infrações de maneira isolada, existia, para cada infração, um número significativo de empresas que não tinham colaborado no âmbito da comunicação sobre a cooperação de 2006 e que, atendendo a esta circunstância, a Comissão tinha o direito de considerar que nenhuma das infrações se prestava a um tratamento por transação sem cometer um erro de apreciação.

413

Em terceiro lugar, a recorrente alega que a Comissão cometeu um erro ao invocar a fase avançada do procedimento. Não se trata, na opinião da recorrente, de uma razão pertinente para não dar início ao procedimento de transação. Pelo contrário, a Comissão não podia tomar uma decisão a propósito de um possível procedimento de transação antes de o procedimento chegar a uma fase relativamente avançada que lhe permitisse apreciar corretamente o comportamento das empresas em causa e de ter na sua posse elementos suficientes para demonstrar a existência de uma infração.

414

A Comissão contesta estes argumentos.

415

Este argumento deve ser rejeitado.

416

Este argumento deve ser julgado inoperante. Com efeito, no caso em apreço, a conclusão da Comissão de que o processo não se prestava a uma resolução por transação já se justificava devido à consideração relativa ao número elevado de partes (v. n.os 404 a 408 supra).

417

Por outro lado, e em todo o caso, há que salientar que, no caso em apreço, a Comissão não cometeu um erro ao ter em conta o momento em que o procedimento se encontrava no momento em que recebeu a carta do grupo DB na qual este último manifestava interesse num procedimento de transação. Como foi acima exposto, a circunstância de as empresas manifestarem o seu interesse em participar numa transação é um dos fatores que a Comissão pode ter em conta para decidir se o procedimento se presta a uma resolução por transação, podendo este fator influenciar a probabilidade de se chegar, num prazo razoável, a uma apreciação comum sobre o alcance das acusações eventuais com as partes em causa. Todavia, o peso de tal manifestação de interesse pode variar em função da fase do procedimento. Com efeito, num caso em que, sem cometer um erro, a Comissão tenciona não optar por uma resolução por transação e já se iniciou um procedimento não transacional, os ganhos de eficiência suscetíveis de resultar de uma resolução por transação podem revelar‑se mais limitados.

418

No caso em apreço, a Comissão tinha equacionado a possibilidade de um procedimento não transacional e, no momento em que recebeu a carta do grupo DB de 21 de outubro de 2009, já tinha preparado e discutido um projeto de comunicação de acusações. Assim, a sua consideração segundo a qual, atendendo ao trabalho que já tinha sido feita, a manifestação de interesse do grupo DB tinha menos peso não enferma de um erro de apreciação.

419

Em quarto lugar, a recorrente alega que as autoridades da concorrência em vários Estados terceiros, como a Nova Zelândia, os Estados Unidos e a África do Sul, consideraram útil transigir a respeito de infrações idênticas ou semelhantes.

420

Este argumento deve igualmente ser rejeitado.

421

Com efeito, a este respeito, basta recordar que a decisão da Comissão deve ser apreciada com base na regulamentação da União aplicável e que o facto de terceiros terem optado pela via transacional não é assim suscetível de demonstrar um erro de apreciação da Comissão. De qualquer forma, há que salientar que o procedimento de transação previsto no artigo 10.o‑A, n.o 1, do Regulamento n.o 773/2004, conforme alterado, diverge de maneira substancial do sistema da «confissão negociada» («plea bargaining») utilizado noutros Estados, invocados pela recorrente como exemplos.

422

Portanto, nenhum dos argumentos aduzidos pela recorrente é suscetível de demonstrar que a apreciação da Comissão segundo a qual o presente processo não se prestava a uma resolução por transação enferma de erros.

423

Em terceiro lugar, há que responder à alegação da recorrente de que a Comissão fundamentou de outra forma a sua decisão de não optar por uma resolução por transação no decurso do processo no Tribunal Geral e que esses elementos da sua fundamentação são inadmissíveis ou, pelo menos, desprovidos de pertinência.

424

Neste contexto, há que remeter para a jurisprudência referida nos n.os 229 a 231 supra. Importa igualmente recordar que a fundamentação de uma decisão deve, em princípio, ser comunicada ao interessado ao mesmo tempo que a decisão que lhe causa prejuízo e que a falta de fundamentação não pode ser regularizada pelo facto de o interessado tomar conhecimento dos fundamentos da decisão no decurso do processo perante as instâncias da União (acórdão de 19 de julho de 2012, Alliance One International e Standard Commercial Tobacco/Comissão, C‑628/10 P e C‑14/11 P, Colet., EU:C:2012:479, n.o 74).

425

Por outro lado, há que salientar que o presente recurso tem por objeto a anulação da decisão recorrida e que é, portanto, a fundamentação dessa decisão que deve ser examinada. Todavia, como contexto dessa decisão, o conteúdo da carta da Comissão de 4 de novembro de 2009 pode igualmente ser tido em conta.

426

No que se refere ao caráter suficiente da fundamentação da decisão recorrida, há que observar, em primeiro lugar, que, por um lado, na sua carta de 4 de novembro de 2009, a Comissão evocou o facto de o procedimento estar numa fase avançada e as circunstâncias particulares do processo. Por outro lado, resulta de modo suficientemente claro do contexto e do conteúdo da decisão recorrida que o número de partes em causa era elevado, que uma parte não despicienda das empresas não tinha colaborado com a Comissão e que havia o risco de certos elementos da abordagem adotada por esta última serem contestados (v., nomeadamente, a menção dos destinatários da decisão recorrida, o seu ponto 2.2, relativo às empresas objeto do procedimento perante a Comissão, o seu ponto 8.5, relativo à aplicação da comunicação sobre a cooperação de 2006, os seus considerandos 644 a 648, relativos à competência da Comissão, e os seus considerandos 857 a 890, relativos à determinação do valor das vendas).

427

Em segundo lugar, resulta do contexto jurídico da decisão recorrida, ou seja, do considerando 4 do Regulamento n.o 622/2008 e da comunicação da Comissão relativa aos processos de transação, que a Comissão considerou que essas circunstâncias eram pertinentes para a sua escolha de optar ou não por uma resolução do processo por transação.

428

Daqui resulta que a fundamentação da decisão recorrida era suficientemente clara para que a recorrente pudesse compreender os motivos da sua adoção e para que o Tribunal Geral pudesse exercer a sua fiscalização.

429

Consequentemente, a primeira parte do sétimo fundamento deve ser rejeitada.

Quanto à segunda parte, relativa à violação do princípio da igualdade de tratamento

430

A recorrente alega que a Comissão violou o princípio da igualdade de tratamento. O processo relativo aos transitários não é distinguido de maneira significativa de outros processos em que a Comissão optou por uma resolução por transação.

431

A título liminar, há que recordar que o princípio da igualdade de tratamento se opõe a que situações comparáveis sejam tratadas de maneira diferente e a que situações diferentes sejam tratadas de maneira igual, a menos que esse tratamento seja objetivamente justificado, mas que, no que diz respeito à comparabilidade das situações, a prática decisória anterior da Comissão não serve de quadro jurídico para as coimas em matéria de concorrência e que as decisões relativas a outros processos têm caráter meramente indicativo em relação à existência de discriminações, uma vez que os dados circunstanciais dos diferentes processos não são idênticos (n.os 326 e 327 supra).

432

Em seguida, e em todo o caso, há que salientar que as circunstâncias invocadas pela recorrente não são suscetíveis de demonstrar a existência de uma violação do princípio da igualdade de tratamento.

433

Neste contexto, há que recordar que o caráter comparável de duas situações deve ser apreciado nomeadamente à luz do objeto e da finalidade do enquadramento jurídico em causa (v., neste sentido, acórdão de 16 de dezembro de 2008, Arcelor Atlantique et Lorraine e o., C‑127/07, Colet., EU:C:2008:728, n.o 26). Dado que o procedimento de transação tem por objetivo permitir à Comissão tratar os processos de cartel mais rapidamente e mais eficazmente, deve, nomeadamente, ter em conta a probabilidade de se chegar, num prazo razoável, a uma apreciação comum do alcance das eventuais acusações com as partes em causa (v. considerando 4 do Regulamento n.o 622/2008).

434

Em primeiro lugar, na medida em que a recorrente alega que, noutros casos, as infrações foram mais complexas, basta referir que esses fatores não são, em si mesmos, suscetíveis de demonstrar que, no caso em apreço, a Comissão devia ter considerado que teria sido mais fácil chegar a uma apreciação comum da dimensão das eventuais acusações com as partes em causa num prazo razoável.

435

Em segundo lugar, na medida em que a recorrente alega, em substância, que cada um dos acordos relativos ao NES, ao AMS, ao CAF e à PSS se prestava, em sua opinião, a uma resolução por transação, basta constatar que este argumento não visa uma prática anterior da Comissão, mas se limita, em substância, a repetir o argumento de que o número de interessados poderia ter sido menos elevado se a Comissão tivesse decidido iniciar procedimentos diferentes em relação a cada um dos acordos relativos ao AMS, ao CAF, ao NES e à PSS, que já foi rejeitado nos n.os 409 a 412 supra.

436

Em terceiro lugar, na medida em que a recorrente alega que, na Decisão C (2010) final da Comissão, de 20 de julho de 2010, relativa a um procedimento nos termos do artigo 101.o [TFUE] e do artigo 53.o do Acordo EEE (processo COMP/38.866 — Fosfatos para a alimentação animal), a Comissão adotou uma decisão de transação que não cobria a totalidade das partes implicadas na infração, basta salientar que, nesse processo, depois de ter decidido iniciar uma discussão com as partes envolvidas com vista a uma transação, a Comissão decidiu não adotar uma decisão de transação a respeito de uma empresa que tinha decidido abandonar as discussões. Ora, a recorrente não explica de que modo isso torna o processo comparável ao presente processo, no qual o número de partes era muito elevado e uma parte não negligenciável das empresas em causa não tinha cooperado com a Comissão.

437

Por conseguinte, há que rejeitar a parte relativa à violação do princípio da igualdade de tratamento, e, portanto, o sétimo fundamento na totalidade.

438

Uma vez que a totalidade dos fundamentos deve ser rejeitada e que o respetivo exame não revelou elementos suscetíveis de justificar uma redução do montante da coima aplicada à recorrente no âmbito da competência de plena jurisdição do Tribunal Geral, há que negar provimento ao recurso na totalidade, não apenas no que respeita ao pedido de anulação mas também no que respeita ao pedido de exercício, pelo Tribunal Geral, do seu poder de plena jurisdição.

Quanto às despesas

439

Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a recorrente sido vencida, há que condená‑la nas despesas da Comissão, em conformidade com o pedido desta.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Nona Secção)

decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A Schenker Ltd é condenada nas despesas.

 

Berardis

Czúcz

Popescu

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 29 de fevereiro de 2016.

Assinaturas

Índice

 

Antecedentes do litígio e decisão recorrida

 

Tramitação processual no Tribunal Geral e pedidos das partes

 

Questão de direito

 

1. Quanto ao primeiro fundamento, relativo, por um lado, à violação dos artigos 4.°, 7.° e 27.°, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, dos direitos de defesa e do direito a um processo equitativo e, por outro, à violação do princípio da boa administração

 

Quanto à primeira parte, relativa à violação dos artigos 4.°, 7.° e 27.°, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003, dos direitos de defesa e do direito a um processo equitativo

 

Quanto à alegação relativa à violação do segredo profissional

 

Quanto à alegação relativa à violação da proibição da dupla representação e do princípio da lealdade

 

Quanto à alegação relativa à violação das obrigações fiduciárias da DP

 

Quanto à segunda parte, relativa à violação do princípio da boa administração

 

2. Quanto ao segundo fundamento, relativo a uma violação do artigo 1.o do Regulamento n.o 141

 

Quanto à interpretação do artigo 1.o do Regulamento n.o 141

 

Quanto aos serviços abrangidos pelo acordo relativo ao NES

 

3. Quanto ao terceiro fundamento, relativo à falta de afetação sensível do comércio entre Estados‑Membros

 

Quanto à primeira parte, respeitante aos serviços abrangidos pelo acordo relativo ao NES

 

Quanto à segunda parte, relativa à afetação do comércio entre Estados‑Membros

 

Quanto à afetação do comércio relativamente aos serviços de transitário

 

— Quanto aos efeitos sobre os clientes dos transitários e sobre o comportamento dos transitários noutros Estados‑Membros

 

— Quanto ao caráter sensível da afetação do comércio

 

Quanto à afetação do fluxo de mercadorias

 

Quanto à violação do princípio da boa administração e à violação do n.o 77 das orientações de 2004

 

4. Quanto ao quarto fundamento, relativo à decisão da Comissão de ter considerado a recorrente única responsável

 

Quanto à primeira parte, relativa, nomeadamente, à violação do artigo 101.o, n.o 1, TFUE e do princípio da responsabilidade pessoal

 

Quanto à segunda parte, relativa à violação do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais e do princípio da boa administração, e à terceira parte, relativa a uma violação do dever de fundamentação

 

Quanto à violação do artigo 41.o da Carta dos Direitos Fundamentais e do princípio da boa administração

 

Quanto à violação do dever de fundamentação

 

5. Quanto ao quinto fundamento, relativo a erros no cálculo do montante da coima bem como à violação do artigo 27.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 1/2003 e dos direitos de defesa

 

Quanto à primeira parte, relativa a erros no cálculo do montante da coima

 

Quanto à alegação relativa ao valor das vendas

 

— Quanto às vendas realizadas em relação com o acordo relativo ao NES

 

— Quanto à aplicação da sobretaxa NES

 

— Quanto à existência de um acordo tendo por objeto os serviços de transporte aéreo

 

— Quanto à tomada em conta do prejuízo económico causado

 

— Quanto aos fatores de concorrência afetados

 

— Quanto aos erros de apreciação

 

Quanto à alegação relativa à taxa de gravidade

 

Quanto à alegação relativa à existência de uma circunstância atenuante

 

Quanto à alegação relativa à violação do princípio da igualdade de tratamento

 

Conclusão

 

Quanto à segunda parte, relativa a uma violação do artigo 27.o do Regulamento n.o 1/2003 e dos direitos de defesa

 

6. Quanto ao sexto fundamento, relativo à violação do artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 e do princípio da igualdade de tratamento, à inobservância da comunicação sobre a cooperação de 2006 e a um erro de apreciação

 

Quanto à observância dos requisitos previstos para a concessão de imunidade

 

Quanto ao argumento relativo à utilização de uma base diferente

 

7. Quanto ao sétimo fundamento, relativo à decisão da Comissão de não seguir um procedimento de transação

 

Quanto à primeira parte, relativa, nomeadamente, à violação do artigo 23.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1/2003 e a erros de apreciação

 

Quanto à segunda parte, relativa à violação do princípio da igualdade de tratamento

 

Quanto às despesas


( *1 )   Língua do processo: inglês.

( 1 )   Dados confidenciais ocultados.

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