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Document 52020IE1563

    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Contratos públicos como instrumento de criação de valor e de dignidade no trabalho nos serviços de limpeza e de manutenção» (parecer de iniciativa)

    EESC 2020/01563

    JO C 429 de 11.12.2020, p. 30–36 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    11.12.2020   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 429/30


    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Contratos públicos como instrumento de criação de valor e de dignidade no trabalho nos serviços de limpeza e de manutenção»

    (parecer de iniciativa)

    (2020/C 429/05)

    Relator:

    Diego DUTTO

    Correlator:

    Nicola KONSTANTINOU

    Decisão da Plenária

    20.2.2020

    Base jurídica

    Artigo 32.o, n.o 2, do Regimento

     

    Parecer de iniciativa

    Competência

    Comissão Consultiva das Mutações Industriais (CCMI)

    Adoção na CCMI

    2.9.2020

    Adoção em plenária

    18.9.2020

    Reunião plenária n.o

    554

    Resultado da votação

    (votos a favor/votos contra/abstenções)

    192/7/18

    1.   Conclusões e recomendações

    1.1.

    A Comissão Europeia, o Parlamento Europeu e os Estados-Membros devem criar os instrumentos de apoio necessários para promover a utilização de contratos públicos estratégicos no intuito de uma aplicação sistemática de critérios estratégicos que sejam sustentáveis, transparentes, ambiciosos e vinculativos, a fim de assegurar um nível mais elevado de normas sociais e de qualidade nos contratos públicos.

    1.2.

    Para assegurar que os serviços de limpeza se centram na qualidade e não no preço, o princípio da transparência deve ser respeitado tanto pelo cliente como pelo contratante. Cumpre definir e enumerar as especificações dos contratos, nomeadamente a frequência, o horário, a saúde e segurança no trabalho e os custos financeiros da limpeza (1). A verificação da aplicação destes critérios durante todo o período de vigência de um contrato é fundamental para avaliar a qualidade dos serviços de limpeza prestados.

    1.3.

    Os parceiros sociais devem participar na formação e profissionalização dos adquirentes públicos, conforme estabelecido na recomendação da Comissão de 3 de outubro de 2017 (2).

    1.4.

    A Comissão Europeia e os Estados-Membros devem tomar a iniciativa de combater o trabalho não declarado e de continuar a melhorar as condições laborais no setor da limpeza. Uma regulamentação reforçada e mecanismos de aplicação mais sólidos, tais como critérios salariais e negociação coletiva no setor, podem contribuir para uma concorrência leal, normas sociais mais elevadas e emprego de qualidade.

    1.5.

    O Comité Económico e Social Europeu (CESE) apela à Comissão Europeia, ao Parlamento Europeu, aos Estados-Membros e aos órgãos de poder local e regional para que exijam a realização de limpeza durante o dia, sempre que possível, em todos os contratos públicos.

    1.6.

    É possível assegurar a concorrência leal, colocando a tónica nos aspetos qualitativos e no respeito da jurisprudência do Tribunal de Justiça e das regras nacionais relativamente à possibilidade de impor o cumprimento das convenções coletivas como condição para a adjudicação de contratos públicos. Os Estados-Membros, em conjunto com os parceiros sociais e de acordo com as práticas nacionais, devem promover a cobertura ao nível setorial das convenções coletivas nacionais nos serviços de limpeza e certificar-se de que essas convenções são cumpridas.

    1.7.

    A mão de obra do setor é constituída predominantemente por mulheres e por nacionais de países terceiros. Por conseguinte, estes podem ser afetados mais diretamente pelas políticas de aquisição das administrações públicas. Assim, o CESE considera que, para além das convenções coletivas, haverá que desenvolver salvaguardas adicionais para respeitar os princípios da não discriminação e da igualdade de tratamento dos trabalhadores. O CESE propõe que os critérios de adjudicação contenham pontos adicionais de modo a recompensar formas de integração, nomeadamente cursos de formação específicos, serviços de apoio familiar, como o apoio pós-escolar para menores, bem como outras medidas de apoio social das empresas.

    1.8.

    O CESE recomenda que, quando se proceder à revisão das diretivas da UE relativas aos contratos públicos, de 2014, os custos da segurança e da formação obrigatórias sejam apresentados fora do âmbito dos preços concorrenciais, enquanto elemento incompressível e verificável na discriminação dos custos que consta da proposta.

    1.9.

    O CESE recomenda que as condições de sustentabilidade, os direitos laborais e as convenções coletivas de trabalho de aplicação geral sejam respeitados (responsabilizando também a autoridade adjudicante, o adjudicatário principal e os subcontratantes pelo seu parceiro contratual direto) em toda a cadeia de subcontratação e durante toda a fase de execução dos contratos.

    1.10.

    O CESE insta os Estados-Membros a dedicarem especial atenção, caso ainda não o façam, a todas as obrigações legais e contratuais relativas a aspetos de saúde e segurança no trabalho, sociais, ambientais e de sustentabilidade, verificando eficazmente o seu cumprimento, na fase de execução dos contratos públicos no setor dos serviços de limpeza.

    1.11.

    No que diz respeito às obrigações que incumbem aos Estados-Membros, às autoridades adjudicantes e à Comissão instituídas pelos artigos 83.o a 85.o da Diretiva 2014/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho (3), o CESE solicita a todos estes organismos públicos que disponibilizem sem demora os dados correspondentes, garantindo, nomeadamente, que são fornecidos os critérios de adjudicação e a respetiva ponderação para os contratos de limpeza. A Comissão Europeia é convidada a apoiar financeiramente os projetos de acompanhamento e estudos dos parceiros sociais setoriais que investiguem o tema dos contratos públicos nos serviços de limpeza e de manutenção.

    1.12.

    A Comissão Europeia deve reforçar a arquitetura legislativa e a capacidade de negociação dos parceiros sociais ao nível nacional, incluindo mediante a atribuição de financiamento a medidas de reforço das capacidades, especialmente em países da Europa do Sudeste, Central e Oriental (4).

    1.13.

    O CESE recomenda que, para serviços com grande intensidade de mão de obra, como os serviços de limpeza, as diretivas da UE relativas aos contratos públicos, mediante a revisão das Diretivas Contratos Públicos de 2014, solicitem ou exijam aos Estados-Membros que excluam a aplicação do critério do preço mais baixo para a adjudicação das propostas, que fixem um limite de 30 % para a pontuação a atribuir ao preço em comparação com a pontuação a atribuir à qualidade, e que assegurem, através de cláusulas sociais específicas, a estabilidade do emprego dos trabalhadores empregados ao abrigo do contrato, em conformidade, porém, com a Diretiva 2001/23/CE (5) relativa à transferência de empresas e à proteção do emprego, interpretada na jurisprudência da UE, bem como os regimes de trabalho da empresa e respeitando as convenções coletivas.

    1.14.

    O CESE insta as autoridades adjudicantes a aplicarem as suas próprias estimativas de custos para os serviços de limpeza, consultando instrumentos setoriais especializados, como o guia «Selecionar o melhor valor», e exemplos nacionais para avaliar devidamente o mercado do setor, bem como destinando parte destes serviços a contratos reservados, de acordo com o artigo 20.o da Diretiva 2014/24/UE, conforme transposto pelos Estados-Membros para os respetivos códigos dos contratos públicos.

    1.15.

    A Comissão Europeia deve incentivar os Estados-Membros a lançarem um processo de acreditação ou um sistema de qualificação destinado a contratantes que pretendam ser elegíveis para contratos públicos de serviços de limpeza. Este processo deve ser supervisionado por um comité de avaliação constituído por várias partes interessadas, incluindo sindicatos e um representante de contratantes do setor.

    1.16.

    Uma vez que o risco da COVID-19 subsiste, a ameaça de contágio por esta ou qualquer outra doença semelhante tem de ser combatida protegendo os trabalhadores e o público em geral. O CESE recomenda que a Comissão e os Estados-Membros elaborem protocolos vinculativos sobre saúde e segurança no trabalho, com a ajuda dos parceiros sociais.

    1.17.

    O CESE insta ainda os Estados-Membros a tomarem medidas e a colaborarem com os parceiros sociais para debater soluções práticas temporárias com vista a um regresso rápido a práticas leais e orientadas para a qualidade nos contratos públicos.

    1.18.

    No contexto da crise da COVID-19, o CESE recomenda que os Estados-Membros promovam a formação e a profissionalização do pessoal de limpeza. Importa disponibilizar recursos financeiros que permitam aos poderes públicos e às empresas contratantes investir em formação e competências. Os trabalhadores dos serviços de higiene e limpeza devem ser incentivados a adquirir qualificações profissionais, lançando as bases para melhores oportunidades de emprego para as pessoas vulneráveis.

    1.19.

    O CESE defende que as instituições da UE, os Estados-Membros e os órgãos de poder local e regional devem adotar uma abordagem abrangente para a aquisição de serviços de limpeza. Esta abordagem deve evitar soluções de compromisso entre condições ambientais e laborais e promover, em vez disso, a coesão social, as normas laborais, a igualdade de género e os objetivos ambientais propostos pelo Pacto Ecológico da Comissão Europeia.

    2.   Observações gerais

    2.1.

    O presente parecer visa, em primeiro lugar, propor recomendações para uma utilização dos contratos públicos que promova a qualidade do emprego e a dignidade no trabalho nos serviços de limpeza e de manutenção.

    2.2.

    Muitas destas recomendações são de âmbito geral e podem ser aplicadas em todos os setores da economia. É o caso, em particular, dos setores dos serviços com grande intensidade de mão de obra, como a segurança privada e a restauração.

    3.   Antecedentes e contexto

    3.1.

    Todos os anos, mais de 250 mil administrações públicas na UE gastam cerca de 14 % do PIB (sensivelmente 2 biliões de EUR por ano) na aquisição de serviços, obras e fornecimentos (6). A maior parte dos contratos públicos dizem respeito a serviços como os de limpeza. Em 2017, o valor da adjudicação de serviços ascendeu a 250 mil milhões de EUR (7).

    3.2.

    Os contratos públicos podem apoiar o investimento na economia real, proteger e criar postos de trabalho de qualidade e promover a inclusão e melhores condições para as pessoas com deficiência ou oriundas de meios desfavorecidos, bem como para os trabalhadores migrantes (8). Podem igualmente incentivar a procura de produtos inovadores, contribuir para os objetivos da política industrial e promover a transição para uma economia circular eficiente em termos de recursos e energia (9).

    3.3.

    A utilização dos critérios da «proposta economicamente mais vantajosa», com base na Diretiva 2014/24/UE relativa aos contratos públicos, deve incluir todos os critérios estratégicos abordados no ponto 3.2 anterior. Como as regras permanecem vagas, os contratos públicos continuam, na sua maioria, a ser adjudicados à proposta com o preço mais baixo, por vezes até a uma proposta anormalmente baixa (10).

    3.4.

    As diretivas relativas aos contratos públicos não estão a ser utilizadas em todo o seu potencial e a sua aplicação diverge entre Estados-Membros. Consequentemente, os poderes públicos devem decidir de acordo com as suas prioridades (11).

    3.5.

    Mais do que uma questão técnica, esta é uma questão política. A decisão sobre quais os serviços a adquirir e quais os critérios de adjudicação a aplicar, com que ponderação relativa, faz parte do processo de decisão política. Estas decisões definem o enquadramento e os parâmetros fundamentais para o procedimento de adjudicação. Não ter em conta os direitos dos trabalhadores, ambientais e sociais criaria condições de concorrência desiguais.

    4.   A crise da COVID-19, o setor dos serviços de limpeza e os contratos públicos

    4.1.

    A pandemia de COVID-19 veio realçar o valor fundamental do trabalho de limpeza enquanto bem público comum. As empresas contratantes têm de cumprir determinados requisitos em matéria de qualificação, de eficiência e de especialização. Na sua declaração conjunta de 22 de abril de 2020, os parceiros sociais da UE EFCI (Federação Europeia das Indústrias de Limpeza) e UNI Europa salientam o papel crucial desempenhado pelo setor da limpeza e pelos seus trabalhadores na prevenção da propagação do vírus (12).

    4.2.

    Em 2018, havia 4,11 milhões de trabalhadores da limpeza na UE, exercendo a sua atividade através de 283 506 empresas. Observa-se um aumento constante do volume de negócios deste setor desde meados da década de 2010. Ao mesmo tempo, o volume de negócios por empresa atingiu os 393 mil EUR em 2017. Segundo a EFCI, o volume de negócios médio por trabalhador ascendeu a quase 30 mil EUR. O volume de negócios por trabalhador ascende a 27 400 EUR e os trabalhadores auferem um salário médio anual de 12 200 EUR. Uma grande parte dos trabalhadores no setor europeu da limpeza trabalha a tempo parcial. Além disso, num setor com grande intensidade de mão de obra como este, as margens das empresas não ultrapassam 3 %. As empresas contratantes incorreram em despesas adicionais devido à pandemia de COVID-19, pela necessidade de proteger os interesses dos seus clientes e dos seus próprios trabalhadores. A percentagem de trabalhadores a tempo parcial, mulheres e trabalhadores imigrantes é especialmente elevada. A percentagem de mulheres situa-se sempre acima de 50 % (exceto na Dinamarca), com picos superiores a 80 % na Lituânia, no Luxemburgo, em Portugal e no Reino Unido (13). Em toda a UE, 30 % dos trabalhadores da limpeza são imigrantes (60 % na Bélgica).

    4.3.

    Os obstáculos à entrada no mercado dos serviços de limpeza e de manutenção são reduzidos ou inexistentes. Os serviços de limpeza apresentam uma grande intensidade de mão de obra, sendo quase 80 % das receitas das empresas destinadas ao pagamento de encargos salariais, com margens muito reduzidas para os contratantes dos serviços de limpeza. Por conseguinte, a decisão de aquisição dos clientes, públicos ou privados, conduz a uma pressão descendente sobre os preços, comprometendo as normas sociais e a dignidade do trabalho de limpeza.

    4.4.

    Durante e após a crise da COVID-19, os serviços de limpeza e de manutenção só poderão assegurar valor e alcançar padrões elevados de qualidade de emprego se os trabalhadores da limpeza forem suficientemente qualificados e dispuserem do equipamento técnico adequado, e se houver uma definição clara dos direitos e das obrigações dos empregadores e dos trabalhadores. Para tal, os poderes públicos poderão ter de pagar um preço mais elevado pelos serviços de limpeza. Com efeito, devido à suspensão das atividades durante a crise da COVID-19, muitos prestadores de serviços empresariais enfrentaram graves problemas de tesouraria e suportaram custos acrescidos para aplicar as medidas de saúde e segurança necessárias à proteção tanto dos trabalhadores como dos clientes. Estes problemas financeiros são agravados por más práticas de contratação pelos adquirentes públicos e privados. A fim de apoiar as empresas para que continuem a garantir a saúde e a segurança dos seus agentes de limpeza, bem como a manter e melhorar a qualidade das suas condições de emprego, o CESE insta os adquirentes públicos e privados a regressarem rapidamente a contratos públicos eficientes, a práticas de contratação justas e a uma melhor atenção aos critérios de qualidade (14). Os trabalhadores da limpeza exercem muitas vezes as suas funções em circunstâncias perigosas e potencialmente nocivas, que podem colocar a sua saúde em risco (15). Embora alguns trabalhadores prefiram trabalhar a tempo parcial, outros desejam trabalhar mais horas ou a tempo inteiro. No entanto, por vezes, os empregadores podem ter dificuldade em oferecer contratos a tempo inteiro. Além disso, não obstante o empenho dos parceiros sociais na realização de limpeza durante o dia, os serviços de limpeza são frequentemente prestados por trabalhadores que trabalham sozinhos durante a noite, o que acontece, muitas vezes, a pedido do cliente. Estas práticas de emprego contribuem para que o trabalho do pessoal de limpeza permaneça invisível (16), subvalorizado e não reconhecido (17). Infelizmente, ainda existem contratos sem especificação do horário de trabalho em alguns Estados-Membros. Os poderes públicos são responsáveis, na medida em que continuam a gerir o contrato, a acompanhá-lo e a avaliar a qualidade. O objetivo deve consistir em aumentar as oportunidades para os trabalhadores trabalharem durante o dia num único turno, no âmbito de contratos a tempo inteiro, para melhorarem a qualidade de vida.

    4.5.

    A utilização do preço mais baixo como único critério de adjudicação dos contratos públicos compromete a prestação de serviços de qualidade e contribui para a deterioração das condições de trabalho, para o desvanecimento (diminuição) da qualidade e para a fuga às responsabilidades (menos esforço) (18). Tendo em conta que a limpeza é uma tarefa heterogénea e que não é fácil de quantificar, é difícil avaliar a qualidade tanto durante o processo como posteriormente. Por conseguinte, é importante basear a qualidade nos resultados ao longo de todo o ciclo de vida e não no processo.

    4.6.

    A expressão «preço mais baixo» desapareceu do texto da Diretiva 2014/24/UE, mas é permitida a adjudicação baseada unicamente no preço (artigo 67.o, n.o 2, último parágrafo). Isto significa que algumas autoridades adjudicantes continuam a adjudicar contratos a proponentes com a proposta mais baixa e, por vezes, com propostas anormalmente baixas. Os países que pretendam utilizar o critério da «proposta economicamente mais vantajosa» para serviços com grande intensidade de mão de obra deverão ir mais longe, orientando as administrações públicas no sentido de uma utilização eficaz deste critério, mediante a fixação de um limite máximo para a ponderação do preço e recorrendo a fórmulas que não acentuem as diferenças de preços entre as propostas. Para o efeito, é necessária formação específica com vista à profissionalização dos responsáveis pelos contratos públicos. Além disso, a próxima revisão das diretivas deve introduzir regras obrigatórias para a) identificar possíveis propostas anormalmente baixas estabelecendo uma diferença de 20 % em relação à proposta mais baixa seguinte, obrigando à verificação, b) verificar exaustivamente se o proponente tem motivos objetivos e plausíveis para apresentar uma proposta baixa e c) excluir essas propostas se o proponente não apresentar tais motivos.

    4.7.

    Por conseguinte, a crise oferece uma oportunidade para as empresas de limpeza e os seus trabalhadores reforçarem o valor e a importância fundamental dos serviços de limpeza perante o público e os seus clientes diretos. O guia «Selecionar o melhor valor» (19), elaborado em 2017 pelos parceiros sociais do setor da limpeza da UE, é um instrumento que pode orientar as organizações públicas e privadas para a adjudicação de contratos de serviços de limpeza que ofereçam as condições mais vantajosas. Alguns parceiros sociais nacionais criaram ferramentas semelhantes.

    4.8.

    A digitalização está a gerar oportunidades e desafios para os trabalhadores pouco qualificados deste setor, e os parceiros sociais da UE consideram que as tecnologias podem ser utilizadas para promover o reconhecimento do valor dos trabalhadores de limpeza e a pertinência da limpeza em geral e para criar valor acrescentado para os adquirentes de serviços de limpeza (20). O projeto SK-Clean da EFCI fará um levantamento das competências necessárias no setor, que estão em mudança, e tornar-se-á um instrumento com vista a uma maior profissionalização dos trabalhadores da limpeza (21).

    4.9.

    O novo contexto criado pela emergência da COVID-19 exige que as autoridades competentes assegurem a divulgação de informação sobre a utilização de equipamento de proteção individual, bem como a disponibilização do equipamento adequado para proteger os trabalhadores e os cidadãos. As empresas precisam de apoio financeiro para suportar os custos adicionais crescentes decorrentes de medidas organizativas, da realização de avaliações dos riscos e de análises, bem como da distribuição de equipamento de proteção individual pelos trabalhadores (22). Além disso, os investimentos realizados pelas empresas contratantes são fundamentais para lhes permitir oferecer aos seus clientes soluções de limpeza que sejam inovadoras e mais eficazes por se basearem em investigação química e biológica.

    5.   Contratos públicos e o Pacto Ecológico

    5.1.

    O Pacto Ecológico propõe a utilização dos contratos públicos para reduzir as emissões de carbono. Contudo, é necessária uma abordagem abrangente.

    5.2.

    O setor da limpeza pode contribuir para uma transição ecológica e para a economia circular através de rótulos ecológicos para produtos de limpeza, sabonetes, papel higiénico e toalhas de papel ecológicos, bem como através da triagem adequada dos resíduos. Este é também o objetivo dos rótulos ecológicos para serviços de limpeza (23) e produtos de limpeza (24), embora a sua eficiência, na prática, não seja evidente. Se a utilização de produtos e procedimentos ecológicos não for aceite pelo cliente, poderá resultar em aumentos de custos, o que exerceria uma pressão ainda maior sobre todos os elementos de custo. Tal poderá também conduzir a um agravamento das condições sociais, laborais e de saúde e segurança no trabalho. Além disso, todos estes fatores poderão conduzir a um acesso mais restrito às oportunidades dos contratos públicos para as pequenas e médias empresas (25). Por conseguinte, é necessária uma abordagem abrangente dos contratos públicos.

    5.3.

    Estudos realizados sugerem que os critérios ambientais são insuficientes para incentivarem, de facto, os fornecedores a realizar alterações (26). As entidades privadas enquanto contratantes de serviços empenhadas na defesa do ambiente não poderão utilizar todo o seu potencial se as autoridades adjudicantes não estiverem dispostas a pagar os custos adicionais. Por conseguinte, é necessária uma maior profissionalização dos adquirentes.

    6.   Considerações sociais e de qualidade nos contratos públicos

    6.1.

    O artigo 18.o, n.o 2, da Diretiva 2014/24/UE estipula que os Estados-Membros devem «assegurar que, ao executarem os contratos públicos, os operadores económicos respeitem as obrigações aplicáveis em matéria ambiental, social e laboral estabelecidas pelo direito da União, por legislação nacional, por convenções coletivas ou pelas disposições de direito internacional em matéria ambiental, social e laboral constantes do Anexo X.»

    6.2.

    O guia «Compra social» da Comissão Europeia, de outubro de 2010, apresenta várias considerações sociais para as autoridades adjudicantes, tais como a proibição do trabalho infantil e do trabalho forçado, requisitos de saúde e segurança no trabalho, obrigações de pagamento de salários mínimos, requisitos relacionados com a segurança social e, de uma forma mais geral, normas de trabalho digno (27). Sendo obrigações legais, têm de ser respeitadas, independentemente de serem ou não mencionadas nas cláusulas de execução dos contratos.

    6.3.

    Segundo o considerando 98 da Diretiva 2014/24/UE, as condições de execução dos contratos podem igualmente destinar-se a facilitar a aplicação de medidas que promovam a igualdade entre mulheres e homens no trabalho e a conciliação da vida profissional com a vida privada.

    6.4.

    A fim de evitar que os encargos salariais sejam utilizados como o principal elemento concorrencial entre propostas, todos os proponentes (incluindo subcontratantes) têm de respeitar as normas mínimas estabelecidas localmente por lei ou por convenções coletivas vinculativas e de aplicação geral no que se refere aos encargos salariais e às cláusulas-tipo dos contratos públicos. As convenções coletivas vinculativas e de aplicação geral do setor podem assegurar condições de concorrência equitativas.

    6.5.

    Embora instrumentos como o guia «Selecionar o melhor valor» possam aliviar a pobreza no trabalho e contribuir para a coesão social nos Estados-Membros da UE, não reforçam os parceiros sociais ao nível setorial nem contribuem para a sua capacidade de criar sistemas vinculativos de negociação coletiva no setor. Os Estados-Membros, que dispõem de competência neste domínio, terão de tornar mais rigorosas as regras relativas à aplicação da negociação coletiva nos contratos públicos.

    6.6.

    As instituições públicas, como jardins de infância, escolas, estruturas residenciais de acolhimento e hospitais, tornaram-se marcas e disputam clientes com outras instituições. Nesta concorrência, a «higiene» e a qualidade da limpeza são, portanto, consideradas fatores diferenciadores, que contribuem diretamente para a satisfação dos utentes e a competitividade.

    6.7.

    A não aplicação de critérios sociais e de qualidade nos contratos públicos também tem implicações negativas para a rotação da mão de obra, o que constitui uma situação de perda a triplicar, para empregadores, clientes e trabalhadores (28).

    6.8.

    Promover o ensino e a formação no contexto laboral é uma forma de assegurar uma qualidade superior e os direitos dos trabalhadores nos contratos públicos. O ensino e formação profissionais, a certificação e o reconhecimento oficial das qualificações contribuem para o reconhecimento do setor. O reconhecimento da sua importância no processo concursal aumentaria a sua valorização e permitiria uma melhor compreensão dos custos que tal implica para as empresas, os quais têm de estar suficientemente refletidos tanto nos preços como nos salários. A responsabilidade de dar formação aos trabalhadores cabe à empresa de limpeza; aceitar a proposta mais baixa acarreta o risco de as empresas não terem condições financeiras para investir em formação e segurança (ou em máquinas, inovação ou formação conexa) além do estritamente exigido por lei.

    Bruxelas, 18 de setembro de 2020.

    O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

    Luca JAHIER


    (1)  http://www.europeancleaningjournal.com/magazine/articles/latest-news/managing-quality-in-german-contract-cleaning

    (2)  https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:32017H1805&from=PT Recomendação (UE) 2017/1805 da Comissão (JO L 259 de 7.10.2017, p. 28).

    (3)  JO L 94 de 28.3.2014, p. 65.

    (4)  https://www.eurofound.europa.eu/publications/report/2019/representativeness-of-the-european-social-partner-organisations-industrial-cleaning-sector#tab-01

    (5)  Diretiva 2001/23/CE do Conselho (JO L 82 de 22.3.2001, p. 16).

    (6)  https://ec.europa.eu/growth/single-market/public-procurement_en

    (7)  https://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/STUD/2018/631048/IPOL_STU(2018)631048_EN.pdf, p. 14.

    (8)  https://ec.europa.eu/info/policies/public-procurement/support-tools-public-buyers/social-procurement_pt

    (9)  A Comissão disponibiliza uma série de instrumentos de apoio para os adquirentes públicos, além do relativo a uma contratação pública socialmente responsável, e todos estes aspetos devem ser tidos em consideração: https://ec.europa.eu/info/policies/public-procurement/support-tools-public-buyers_pt

    (10)  Este assunto é abordado no artigo 69.o da Diretiva da UE relativa aos contratos públicos, de 2014.

    (11)  Jeremy Prassl, «The Future of EU Labour Law» [O futuro da legislação laboral da UE].

    (12)  «Joint Statement on the Covid-19 impact to the Industrial Cleaning and Facility Services sector and the necessary measures to protect it» [Declaração conjunta sobre o impacto da COVID-19 no setor dos serviços de limpeza e de manutenção industrial e as medidas necessárias para o proteger], https://www.uni-europa.org/2020/04/22/joint-statement-on-the-covid-19-impact-to-the-industrial-cleaning-and-facility-services-sector-and-the-necessary-measures-to-protect-it/

    (13)  Eurofound (2019) «Representativeness Study for the Industrial Cleaning Sector» [Estudo de representatividade no setor da limpeza industrial], p. 19: https://www.eurofound.europa.eu/sites/default/files/ef_publication/field_ef_document/ef19012en.pdf

    (14)  http://servicealliance.eu/wp-content/uploads/2020/05/EBSA-Statement_Contracting-recommendations-during-COVID_13-5-2020.pdf

    (15)  Bergfeld, Mark (2020) «The Insanity of Making Sick People work» [A insensatez de obrigar pessoas doentes a trabalhar], Jacobin Magazine: https://jacobinmag.com/2020/03/coronavirus-workers-rights-health-care-cleaners-gig-economy

    (16)  Bergfeld, Mark & Ylitalo, Jaana, «Putting Europe’s invisible precariat in the spotlight» [Trazer à luz a precariedade invisível da Europa], Social Europe, 18 de abril de 2019, https://www.socialeurope.eu/europes-invisible-precariat

    (17)  De Gasparo, Sandro et al., «When Creativity Meets Value Creation. A Case Study on Daytime Cleaning: Volume VIII: Ergonomics and Human Factors in Manufacturing, Agriculture, Building and Construction, Sustainable Development and Mining» [Quando a criatividade se alia à criação de valor. Um estudo de caso sobre limpeza durante o dia: volume VIII: Ergonomia e fatores humanos na indústria transformadora, na agricultura, na construção e obras públicas, no desenvolvimento sustentável e na exploração mineira].

    (18)  «Evidence from Public Administration Review» [Dados da análise da administração pública], Vol. 79, n.o 2, pp. 193-202.

    (19)  http://www.cleaningbestvalue.eu/

    (20)  Ver EFCI: https://www.efci.eu/wp-content/uploads/2019/02/Digital-transition-in-cleaning-industry-in-FR.pdf https://www.efci.eu/wp-content/uploads/2019/10/2019-10-29_Joint-statement-on-digitalisation-EFCI-UNI-Europa-29.10.2019.pdf e https://www.efci.eu/wp-content/uploads/2019/10/2019-10-29_Joint-statement-on-digitalisation-EFCI-UNI-Europa-29.10.2019.pdf

    (21)  Projeto SK-Clean.

    (22)  Declaração conjunta UNI-CoeSS: https://www.uni-europa.org/2020/05/08/private-secruity-joint-declaration-ensuring-business-continuity-and-protection-of-workers-in-the-covid-19-pandemic/

    (23)  https://ec.europa.eu/environment/ecolabel/documents/Cleaning_Services_Factsheet_Final.pdf e http://www.ecolabelindex.com/ecolabel/cleaning-industry-management-standard-cims

    (24)  http://www.ecolabelindex.com/ecolabels/?st=category,cleaning

    (25)  Sofia Lundberg & Per-Olov Marklund (2016) «Influence of Green Public Procurement on Bids and Prices» [A influência de uma contratação pública ecológica nas propostas e nos preços], https://www.nhh.no/globalassets/departments/business-and-management-science/seminars/2016-spring/120516.pdf

    (26)  Sofia Lundberg & Per-Olov Marklund (2016) «Influence of Green Public Procurement on Bids and Prices» [A influência de uma contratação pública ecológica nas propostas e nos preços], https://www.nhh.no/globalassets/departments/business-and-management-science/seminars/2016-spring/120516.pdf

    (27)  «Compra social» (nota de rodapé 43), p. 47.

    (28)  Grimshaw, Damian et al., «Market Exposure and the Labour Process: The Contradictory Dynamics in Managing Subcontracted Services Work» [A exposição ao mercado e o processo laboral: a dinâmica contraditória na gestão do trabalho de serviços subcontratados]. REFERÊNCIAS.


    ANEXO

    As seguintes propostas de alteração foram rejeitadas durante o debate, tendo recolhido, contudo, pelo menos um quarto dos sufrágios expressos:

    Ponto 1.10

    Suprimir.

     

    O CESE insta os Estados-Membros a dedicarem especial atenção a todas as obrigações legais e contratuais relativas a aspetos sociais, ambientais e de sustentabilidade, verificando eficazmente o seu cumprimento, na fase de execução dos contratos públicos no setor dos serviços de limpeza.

    Resultado da votação

    Votos a favor:

    61

    Votos contra:

    105

    Abstenções:

    9

    Ponto 2.1

    Alterar.

     

    O presente parecer visa, em primeiro lugar, propor recomendações para uma utilização dos contratos públicos que promova a qualidade do emprego e a dignidade no trabalho nos serviços de limpeza e de manutenção.

    Resultado da votação

    Votos a favor:

    61

    Votos contra:

    107

    Abstenções:

    9

    Ponto 4.3

    Alterar.

     

    Os obstáculos à entrada no mercado dos serviços de limpeza e de manutenção são reduzidos ou inexistentes. Os serviços de limpeza apresentam uma grande intensidade de mão de obra, sendo quase 80 % das receitas das empresas destinadas ao pagamento de encargos salariais, com margens muito reduzidas para os contratantes dos serviços de limpeza. Por conseguinte, a decisão de aquisição dos clientes, públicos ou privados, conduz a uma pressão descendente sobre os preços, comprometendo as normas sociais e a dignidade do trabalho de limpeza.

    Resultado da votação

    Votos a favor:

    61

    Votos contra:

    108

    Abstenções:

    8


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