EUR-Lex Access to European Union law

Back to EUR-Lex homepage

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 52013AE4374

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Participação do setor privado no quadro de desenvolvimento pós-2015» (parecer exploratório)

JO C 67 de 6.3.2014, p. 1–5 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

6.3.2014   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 67/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Participação do setor privado no quadro de desenvolvimento pós-2015» (parecer exploratório)

2014/C 67/01

Relator: Ivan VOLEŠ

Em 19 de abril de 2013, por carta de Maroš Sefčovič, comissário europeu, a Comissão Europeia solicitou ao Comité Económico e Social Europeu, nos termos do artigo 304.o do TFUE, a elaboração de um parecer exploratório sobre a

Participação do setor privado no quadro de desenvolvimento pós-2015.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Relações Externas, que emitiu parecer em 25 de setembro de 2013.

Na 493.a reunião plenária de 16 e 17 de outubro de 2013 (sessão de 16 de outubro), o Comité Económico e Social Europeu adotou, por 100 votos a favor, 2 votos contra e 2 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   Reforçar a posição do setor privado na cooperação para o desenvolvimento.

1.1.1

O setor privado pode desempenhar um papel fulcral no combate à pobreza no mundo, uma vez que cria emprego, produz bens e serviços, gera receitas e benefícios e contribui, através dos impostos que paga, para cobrir despesas públicas, desde que respeite os princípios de cooperação para o desenvolvimento reconhecidos a nível internacional e que os empregos criados sejam dignos e de qualidade, em conformidade com a Agenda da OIT para o Trabalho Digno.

1.1.2

O Comité solicita que o setor privado tenha uma maior participação no programa de desenvolvimento pós-2015 e na nova parceria mundial. A participação do setor privado na definição dos objetivos destinados a eliminar a pobreza e a alcançar um desenvolvimento sustentável e um crescimento justo e inclusivo, que tenha em conta, na mesma medida, a quantidade e a qualidade, permitirá que este setor assuma a sua responsabilidade na consecução desses objetivos.

1.1.3

As organizações da sociedade civil chamam a atenção não só para os benefícios mas também para os riscos relacionados com a ação do setor privado; é por essa razão que a ajuda ao setor privado nos países em desenvolvimento se deve basear nos princípios de transparência, abertura dos mercados público, eficiência, eficácia dos meios investidos e responsabilidade dos intervenientes públicos face a todos atores interessados na aplicação da estratégia de desenvolvimento adotada. A crescente parcela da ajuda pública ao desenvolvimento afetada ao desenvolvimento do setor privado não deveria determinar uma redução dos recursos financeiros atribuídos no quadro da ajuda pública aos países em desenvolvimento mais pobres.

1.2   Orientar o setor privado para a realização dos objetivos de desenvolvimento.

1.2.1

No presente parecer, o setor privado abarca igualmente o setor social e é composto por trabalhadores independentes, microempresas, pequenas e médias empresas, grandes empresas multinacionais, cooperativas e outras empresas de economia social, e inclui os trabalhadores das empresas privadas, bem como as suas organizações sindicais e as organizações não governamentais que cooperam em projetos privados. Nos países em desenvolvimento, existe também um vasto setor privado informal. A ajuda ao setor privado e a cooperação com esse setor devem contribuir para combater o trabalho informal nas empresas, bem como as situações que o encorajam, desde o nível do Estado central onde estas exercem as suas atividades até ao seu impacto local sobre o desenvolvimento.

1.2.2

Importa associar ativamente a sociedade civil ao processo de definição do papel do setor privado e de criação de indicadores do contributo desse setor para a cooperação internacional para o desenvolvimento; a criação de uma plataforma vasta a nível europeu, com a participação de todas as partes interessadas, poderia contribuir para o efeito.

1.2.3

Seria proveitoso utilizar a ajuda pública ao desenvolvimento como um fator multiplicador, associando o capital privado aos investimentos nos países em desenvolvimento através do recurso a instrumentos financeiros inovadores. A ajuda prestada por estes meios deverá, por sua vez, ter objetivos definidos de forma clara como, por exemplo, a criação demais e melhores empregos, a melhoria da qualidade da produção, a transferência de conhecimentos em matéria de gestão para o setor privado, etc.

1.2.4

As parcerias entre os setores público e privado podem ser um instrumento essencial para aplicar as estratégias de desenvolvimento, desde que se assegure previamente um equilíbrio adequado e uma boa comunicação entre as partes interessadas.

1.3   Apoiar a criação de um contexto empresarial favorável

1.3.1

Para que o setor privado nos países em desenvolvimento possa contribuir para o desenvolvimento é necessário um ambiente empresarial favorável, que respeite os princípios democráticos reconhecidos a nível geral, facilite a criação e o crescimento das empresas, reduza os excessos burocráticos, reforce a transparência, trave a corrupção omnipresente e incentive os investidores estrangeiros e locais.

1.3.2

A responsabilidade social das empresas (RSE) deve ser vista como uma iniciativa voluntária e reflexo da sua adesão a um empreendedorismo ético. Deve ser proposto um quadro definido para a RSE no âmbito do desenvolvimento, no respeito das orientações da OCDE para as empresas multinacionais e demais princípios reconhecidos no plano internacional.

1.3.3

Sempre que o setor privado cria novos postos de trabalho, deve respeitar os direitos económicos e sociais fundamentais, designadamente as principais convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT). A criação desses novos postos de trabalho em conformidade com a Agenda para o Trabalho Digno da OIT é importante.

1.4   Estimular o potencial inovador do empreendedorismo para o desenvolvimento

1.4.1

Importa criar os programas de desenvolvimento das capacidades institucionais da administração do Estado nos países em desenvolvimento em colaboração estreita com os parceiros sociais e as organizações não governamentais empenhadas na ajuda ao desenvolvimento, e melhorar as condições em que especialmente as pequenas e médias empresas exercem as suas atividades, dado que são elas que oferecem o maior potencial para criar emprego e reduzir a pobreza.

1.4.2

Nos países em desenvolvimento, as organizações de empresários têm a necessidade de adquirir competências com vista a melhorar a sua capacidade de exercer uma influência positiva no ambiente empresarial. Importa apoiar o desenvolvimento das suas capacidades, aproveitando o contributo ativo das organizações parcerias nos países desenvolvidos. Os programas europeus de ajuda externa devem também financiar o apoio técnico que as organizações europeias de empresários disponibilizam aos seus parceiros nos países em desenvolvimento, e aumentar a sua motivação.

1.4.3

A ajuda ao desenvolvimento deverá apoiar os projetos inovadores e os modelos empresariais que favoreçam a inclusão, incluindo o apoio a uma sociedade sem barreiras, o que contribuirá para eliminar a pobreza dos grupos de cidadãos em risco, como pessoas com deficiência, mulheres, idosos, etc.

1.4.4

Importa apoiar a cooperação do setor privado com as organizações não governamentais, recorrendo, por exemplo a voluntários, no sentido de transferir para as empresas locais os conhecimentos no âmbito da gestão e das tecnologias, etc. Os projetos empresariais inovadores coroados de sucesso devem ser amplamente divulgados de forma sistemática.

1.4.5

O desenvolvimento do setor privado requer que se intensifique o apoio à formação e à aquisição de conhecimentos para as tecnologias essenciais, nomeadamente em proveito dos trabalhadores menos qualificados.

1.4.6

O Comité recomenda que o programa Erasmus para os jovens empreendedores seja alargado às pessoas interessadas provenientes de países em desenvolvimento, ou que se crie um programa com objetivos similares dotado dos meios financeiros necessários.

1.4.7

É necessário prestar uma especial atenção ao setor das indústrias extrativas e das matérias-primas, onde é necessário aplicar rigorosamente os requisitos em matéria de proteção do ambiente, as condições sociais dos trabalhadores e o caráter sustentável do desenvolvimento económico do país.

1.4.8

Frequentemente, os países em desenvolvimento não dispõem de estratégias para o desenvolvimento das PME e, por isso, a cooperação para o desenvolvimento deveria contribuir de forma mais adequada para colmatar essa lacuna. A experiência adquirida na Europa no que respeita às pequenas e médias empresas deveria ser transmitida aos países em desenvolvimento de forma certeira e pertinente.

2.   Teor essencial do parecer

2.1

O comissário Maroš Sefčovič enviou uma carta ao presidente do CESE informando que a Comissão está a elaborar propostas com vista a associar mais eficazmente o setor privado às parcerias mundiais para o desenvolvimento após 2015, na qual solicitava ao Comité que elaborasse um parecer exploratório sobre o papel do setor privado, com o objetivo de acelerar durante o período em causa o desenvolvimento inteligente, sustentável e inclusivo, que é de momento objeto de debate na ONU.

2.2

No seu parecer REX/372 (1) sobre a comunicação da Comissão «Uma vida digna para todos: Erradicar a pobreza e dar ao mundo um futuro sustentável», o Comité formulou uma série de recomendações com vista a envolver a sociedade civil na elaboração, implementação e acompanhamento dos objetivos de desenvolvimento sustentável para o pós-2015 a nível mundial.

2.3

O Comité, no âmbito dos seus pareceres (2), tem vindo a consagrar numerosos trabalhos à cooperação para o desenvolvimento e à cooperação externa, tendo adquirido experiência e conhecimentos concretos graças às suas iniciativas relacionadas com os países ACP, a Euromed e a Parceria Oriental, as negociações comerciais internacionais e outras questões associadas à problemática do desenvolvimento. O CESE tirou partido deste acervo para a elaboração do presente parecer.

3.   Observações na generalidade

3.1

O setor privado pode desempenhar um papel fulcral no combate à pobreza no mundo, uma vez que cria emprego, produz bens e serviços, gera receitas e benefícios e contribui, através dos impostos que paga, para cobrir despesas públicas, respeitando ao mesmo tempo os princípios de cooperação para o desenvolvimento reconhecidos a nível internacional. A ajuda pública ao desenvolvimento continuará a ser um motor importante de desenvolvimento, inclusivamente após 2015, mas não será, por si só, suficiente para erradicar a pobreza (3).

3.2

Os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio não definiram de forma clara um método para a sua realização, não criaram ligações recíprocas e negligenciaram o papel do setor privado no desenvolvimento (4). Importa associar mais o setor privado ao futuro quadro de cooperação para o desenvolvimento após 2015, enquanto parceiro estratégico e vetor de um crescimento sustentável, alicerçado em três pilares – económico, social e ambiental – que se baseiam em indicadores não só quantitativos, mas também qualitativos.

3.3

As organizações da sociedade civil (5) chamam também a atenção para as vantagens e os riscos da participação do setor privado na cooperação para o desenvolvimento. Para eliminar esses riscos, é necessário que as ajudas ao setor privado, através de recursos consagrados ao desenvolvimento, se baseiem nos princípios da transparência, eficiência, eficácia dos recursos investidos, abertura dos mercados públicos e responsabilidade dos intervenientes públicos perante todos os interessados na execução da estratégia de desenvolvimento adotada.

3.4

O setor privado engloba trabalhadores independentes, microempresas, pequenas e médias empresas, grandes empresas multinacionais, cooperativas e outras empresas da economia social e instituições financeiras. Num sentido mais lato, também são incluídos neste setor os trabalhadores de empresas privadas, as suas organizações sindicais e as organizações não governamentais envolvidas em projetos privados. Para além das empresas privadas que exercem legalmente as suas atividades, há nos países em desenvolvimento um amplo setor privado informal. Na concessão de ajudas ao desenvolvimento, é necessário diferenciar cada uma destas entidades privadas e o impacto das suas atividades no desenvolvimento, em função da sua dimensão, do seu campo de atividades e do nível de desenvolvimento do país em causa (país menos desenvolvido, moderadamente desenvolvido, em desenvolvimento ou em desenvolvimento vulnerável).

3.5

O setor privado, com os representantes da sociedade civil, deve participar na definição das necessidades em matéria de desenvolvimento em cada Estado e contribuir para que se estabeleçam novos objetivos de desenvolvimento sustentável para o pós 2015, de modo a poder assumir a sua responsabilidade na realização desses mesmos objetivos. Na esteira dos objetivos do milénio para o desenvolvimento, estes objetivos devem ser concretos e mensuráveis e incluir os domínios da água, agricultura, segurança alimentar, energia, infraestruturas de transporte, educação, saúde, economia digital, igualdade entre homens e mulheres e igualdade social.

3.6

O setor privado dever ser reconhecido como parte integrante e essencial da nova parceria mundial para o desenvolvimento. Seria aconselhável criar uma plataforma que reunisse os representantes dos empresários e os empregadores europeus e fosse aberta a outras partes interessadas, incluindo os representantes da sociedade civil, para dialogar com os representantes das instituições europeias e financeiras sobre a participação do setor privado na cooperação internacional para o desenvolvimento.

3.7

O setor privado dos Estados doadores participa na cooperação para o desenvolvimento, quer enquanto fornecedor de serviços e equipamentos pagos pela ajuda pública ao desenvolvimento, quer enquanto fornecedor direto de ajuda ao desenvolvimento por motivos filantrópicos no âmbito de projetos conjuntos com o setor público e organizações não governamentais, quer ainda como investidor em projetos que, não deixando de ser rentáveis para as empresas, têm um impacto significativo no desenvolvimento. Importa apoiar prioritariamente os projetos orientados para a inovação através da criação de capacidades de inovação, de serviços de aconselhamento e de incubadoras e clusters de empresas nos países beneficiários. Os contratos públicos para projetos de desenvolvimento devem ser transparentes e abertos.

3.8

O contributo do setor privado para o desenvolvimento deve também abranger o apoio a uma sociedade sem entraves, que contribua para erradicar a pobreza junto dos grupos de cidadãos em risco, como pessoas com deficiência, mulheres, idosos ou pessoas temporariamente incapacitadas. Neste sentido, o acordo-quadro sobre o mercado de trabalho inclusivo celebrado pelos parceiros sociais europeus em março de 2010 pode servir de inspiração para integrar esta exigência no futuro quadro de desenvolvimento.

3.9

O setor privado nos países em desenvolvimento necessita de uma ajuda sistemática para que possa desempenhar o seu papel no desenvolvimento, e é por isso que a quota de ajuda pública ao desenvolvimento do setor privado deve aumentar. No entanto, tal não pode ocorrer em detrimento da ajuda pública ao desenvolvimento concedida aos países menos avançados e que dela dependem para resolver os seus problemas mais prementes.

3.10

Os investimentos privados de grandes empresas multinacionais em projetos relevantes para o desenvolvimento são uma ocasião para as PME locais - existentes e novas - se associarem à sua realização, permitindo a estas últimas, graças à cooperação com os parceiros de países desenvolvidos, adquirir competências técnicas e aceder às tecnologias avançadas adequadas. As empresas multinacionais devem respeitar os princípios consagrados pela ONU, OCDE e outras organizações internacionais (6).

3.11

Tanto nos países em desenvolvimento como no resto do mundo, o principal potencial de desenvolvimento está nas pequenas e médias empresas e para o libertar há que recorrer ao microcrédito e a empréstimos bonificados das instituições europeias e internacionais de financiamento do desenvolvimento. Além disso, as poupanças e demais remessas dos emigrantes, que constituem uma fonte importante de investimento, devem ser mais orientadas para as necessidades de desenvolvimento dos países em causa, através de incentivos.

3.12

O Comité congratula-se com as ideias apresentadas na Comunicação da Comissão, intitulada «Para além de 2015: rumo a uma abordagem global e integrada do financiamento da erradicação da pobreza e de desenvolvimento sustentável» (7), e solicita que o setor privado e as organizações da sociedade civil sejam associadas ao debate proposto sobre a abordagem integrada ao financiamento.

3.13

Seria proveitoso utilizar a ajuda pública ao desenvolvimento como um fator multiplicador, associando o capital privado aos investimentos nos países em desenvolvimento. Para o efeito, dever-se-ia recorrer a instrumentos inovadores, nomeadamente o blending (combinação de vários recursos), os diversos mecanismos de garantia e as taxas de juro baixas. É importante ter em conta, no cálculo do montante da ajuda pública ao desenvolvimento, as garantias do Estado dadas aos investimentos nos países em desenvolvimento. A ajuda prestada ao capital privado por estes meios deverá ter condições e indicadores claros que levem em conta o caráter sustentável do desenvolvimento, a proteção do ambiente, a economia verde, a criação de emprego, a melhoria da qualidade da produção, a transferência de conhecimentos em matéria de gestão para o setor privado, etc.

3.14

Os investimentos devem ser orientados sobretudo para reforçar os setores dos serviços como o setor bancário, seguros, telecomunicações, transportes e outros serviços de apoio às empresas, indispensáveis para o bom desenvolvimento da indústria e da agricultura. Neste contexto, cabe ao Estado velar pelo respeito da concorrência e assegurar a proteção adequada dos investimentos.

3.15

As parcerias entre os setores público e privado podem ser um instrumento essencial para aplicar estratégias de desenvolvimento, uma vez que associam o mecanismo de subvenção dos fundos públicos e as iniciativas de investimento privado para responder às necessidades de desenvolvimento dos beneficiários finais. O sucesso destes projetos requer informação transparente e uma comunicação aberta com as partes interessadas.

4.   Apoiar a criação de um contexto empresarial favorável

4.1

Nos países em desenvolvimento beneficiários, são necessárias determinadas condições fundamentais para que o setor privado possa existir e realizar as suas atividades, a fim de desempenhar o seu papel no desenvolvimento. A cooperação para o desenvolvimento deve orientar-se sobretudo para a melhoria contínua do ambiente empresarial, o que facilitaria a criação e o crescimento das empresas, reduziria os excessos burocráticos, aumentaria a transparência e diminuiria assim a corrupção omnipresente. A afirmação do Estado de direito incentiva os investidores estrangeiros e locais e contribui para a diversificação das economias locais.

4.2

A criação de um ambiente empresarial saudável deve basear-se em mecanismos de mercado, incluindo a concorrência económica, mercados financeiros eficientes, tribunais independentes, a aplicação generalizada da legislação em vigor, nomeadamente em matéria comercial, respeito das regras do comércio internacional e respeito dos direitos de propriedade intelectual. Há que respeitar os costumes e culturas locais, desde que isso não ponha em causa a concorrência económica e não leve à corrupção e a uma redistribuição estéril dos fundos.

4.3

A responsabilidade social das empresas (RSE) no âmbito da cooperação para o desenvolvimento deve ser vista como uma iniciativa voluntária e reflexo da sua adesão a um empreendedorismo ético. As empresas escolhem, no quadro fundamental de princípios internacionalmente reconhecidos (8), as disposições que são relevantes para as suas atividades económicas. A definição desse quadro garantirá uma concorrência leal com outras empresas do setor.

4.4

O setor privado cria postos de trabalho e pode assim ajudar a eliminar a pobreza, mas é necessário que, ao mesmo tempo, respeite os direitos económicos e sociais fundamentais. É preciso cumprir rigorosamente as principais convenções da OIT (liberdade sindical e negociação coletiva, proibição do trabalho forçado, do trabalho infantil e da discriminação em matéria de emprego).

4.5

Os novos postos de trabalho criados devem estar em conformidade com a Agenda da OIT para o Trabalho Digno que prevê que a liberdade de escolha do emprego, o direito do trabalhador à proteção social, o respeito por parte do empregador dos direitos fundamentais dos trabalhadores e a necessidade de diálogo social. É importante que todos os investidores, nomeadamente os que recorrem às ajudas públicas para o desenvolvimento, cumpram integralmente estes princípios na implementação dos seus projetos e exerçam nos seus parceiros uma influência positiva nesse sentido.

4.6

Os programas de desenvolvimento das capacidades institucionais da administração do Estado nos países em desenvolvimento devem reforçar os princípios do Estado de direito e contribuir para melhorar o ambiente empresarial e aumentar a capacidade de absorção das empresas locais. Estes programas devem ser elaborados em estreita colaboração com os parceiros sociais e as organizações não governamentais pertinentes.

5.   Como envolver o setor privado de forma mais eficaz no desenvolvimento

5.1

As organizações empresariais, como as câmaras de comércio, as associações e os agrupamentos profissionais, as federações de empregadores e as organizações da economia social dos países doadores, devem estar ativamente envolvidas, em todas as fases do ciclo do projeto, nos programas de ajuda ao setor privado nos países em desenvolvimento. Para isso, há que desenvolver um programa que apoie as organizações locais que representam as pequenas e médias empresas e lhes permita ganhar experiência, especialmente nos domínios do marketing, integração nas cadeias abastecimento, certificação, logística, etc.

5.2

Nos países em desenvolvimento, as organizações empresariais precisam de adquirir competências para melhorar o ambiente empresarial, reforçar a gestão democrática dos seus organismos, angariar novos membros e comunicar ativamente com estes últimos. Importa apoiar o desenvolvimento das suas capacidades, aproveitando o contributo ativo das organizações parceiras similares da UE. Os programas europeus de ajuda externa devem também financiar o apoio técnico que as organizações europeias de empresários disponibilizam aos seus parceiros.

5.3

O desenvolvimento do setor privado deve incluir módulos de formação para empresários, nomeadamente estágios num país desenvolvido. O Comité recomenda que se analise a possibilidade de alargar o programa Erasmus para os jovens empreendedores às pessoas interessadas provenientes de países em desenvolvimento, ou se crie um programa com objetivos similares dotado dos meios financeiros necessários para o efeito.

5.4

Importa intensificar o apoio à formação e à aquisição dos conhecimentos relativos às tecnologias essenciais, sobretudo em benefício dos trabalhadores menos qualificados. Os programas de formação profissional há muito escasseiam, mas os países doadores atribuem principalmente bolsas de estudo para o ensino superior. No entanto, na indústria e noutros setores, o setor privado precisa de competências profissionais comuns que se adquirem através da aprendizagem tradicional, bem como determinados hábitos laborais necessários a quem está ao serviço de um investidor estrangeiro ou de uma empresa mista.

5.5

A ajuda ao desenvolvimento deve apoiar mais os projetos inovadores e os novos modelos empresariais que promovem a inclusão e oferecem um amplo espaço para a cooperação do setor privado com as organizações não governamentais. Podemos citar aqui o exemplo do destacamento de peritos voluntários que prestam assistência ao desenvolvimento do empreendedorismo em países em desenvolvimento (9). Uma maior divulgação de projetos empresariais inovadores em prol do desenvolvimento bem sucedidos contribuiria para o intercâmbio de experiências entre os Estados-Membros.

5.6

Importa dedicar atenção especial ao setor da indústria extrativa e das matérias-primas. Os projetos de investimento devem ter em conta desafios como a proteção do ambiente, as condições sociais dos trabalhadores e a sustentabilidade do desenvolvimento. Os serviços do Estado e dos órgãos de poder local do país beneficiário devem definir o enquadramento adequado para cada setor de atividade e velar pelo seu respeito, especialmente no cumprimento das obrigações fiscais. A ajuda deve levar à realização de uma abordagem sistemática, que defina as melhores regras para limitar a carga administrativa excessiva e evitar que a corrupção se propague.

5.7

A ajuda ao desenvolvimento deve apoiar a agricultura sustentável e as indústrias locais de transformação para melhorar o processamento de alimentos e matérias-primas. Há que incentivar a criação de associações de agricultores e de pequenos produtores que transformam os produtos agrícolas e os integram na cadeia de abastecimento.

Bruxelas, 16 de outubro de 2013

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Henri MALOSSE


(1)  Parecer do CESE «Uma Vida Digna para Todos: Erradicar a pobreza e dar ao mundo um futuro sustentável», JO C 271 de 19.9.2013, p. 144-150.

(2)  Ver os pareceres do CESE sobre os seguintes temas: Estratégia África-UE (2009), JO C 77 de 31.3.2009, p. 148-156, Comércio e segurança alimentar (2010), JO C 255 de 22.9.2010, p. 1-9, Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à aplicação de um sistema de preferências pautais generalizadas (2012), JO C 43 de 15.2.2012, p. 82-88, Aumentar o impacto da política de desenvolvimento da UE: Agenda para a Mudança/Futura abordagem do apoio orçamental da UE a países terceiros (2012), JO C 229 de 31.7.2012, p. 133-139, Participação da sociedade civil nas políticas de desenvolvimento da UE (2012), JO C 181 de 21.6.2012, p. 28-34 e Proteção social na política de desenvolvimento (2013) ainda não publicado no Jornal Oficial.

(3)  Apenas alguns países desenvolvidos alcançaram ou ultrapassaram o objetivo acordado de reservar 0,7 % do seu Produto Interno Bruto (PIB) à ajuda ao desenvolvimento.

(4)  Ver: Comité Consultivo Económico e Industrial junto da OCDE (BIAC), «Preliminary Perspectives for the Post-2015 Development Agenda» [Perspetivas preliminares do programa de desenvolvimento para o pós-2015], fevereiro de 2013.

(5)  Confederação Internacional dos Sindicatos: http://www.ituc-csi.org, CONCORD (Confederação Europeia das ONG de Emergência e Desenvolvimento): http://www.concordeurope.org, Comité de Dadores para o Desenvolvimento Empresarial (DCED – Donor Committee for Enterprise Development) http://www.enterprise-development.org.

(6)  As orientações das Nações Unidas relativas às empresas e aos direitos humanos, as orientações da OCDE para empresas multinacionais, a iniciativa para a transparência nas indústrias extrativas, as orientações de diligência prévia da OCDE sobre as cadeias de fornecimento responsável de minerais provenientes de zonas de conflito e de alto risco.

(7)  COM(2013) 531 final, de 16 de julho de 2013.

(8)  Por exemplo, a norma ISO 26000, a iniciativa da ONU relativa aos seis princípios para o investimento responsável.

(9)  Ver, por exemplo, a associação de utilidade pública Ex-Change: http://www.ex-change.be.


Top