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Document 52001AE1496

    Parecer do Comité Económico e Social sobre a "Simplificação"

    JO C 48 de 21.2.2002, p. 130–141 (ES, DA, DE, EL, EN, FR, IT, NL, PT, FI, SV)

    52001AE1496

    Parecer do Comité Económico e Social sobre a "Simplificação"

    Jornal Oficial nº C 048 de 21/02/2002 p. 0130 - 0141


    Parecer do Comité Económico e Social sobre a "Simplificação"

    (2002/C 48/28)

    Em 28 de Fevereiro de 2001, o Comité Económico e Social decidiu, nos termos do n.o 2 do artigo 23.o do Regimento, elaborar um parecer sobre o tema: "Simplificação".

    Incumbida da preparação dos respectivos trabalhos, a Secção do Mercado Interno, Produção e Consumo emitiu parecer em 21 de Novembro de 2001, sendo relator K. Walker.

    Na 386a reunião plenária de 28 e 29 de Novembro de 2001 (sessão de 29 de Novembro), o Comité Económico e Social adoptou, por 62 votos a favor, 5 votos contra e 5 abstenções, o seguinte parecer.

    1. Resumo e recomendações

    1.1. Embora constitua, antes de mais, um problema nacional, o excesso de regulamentação assume igualmente uma dimensão europeia que importa abordar. A UE deve não só estar na vanguarda do processo de simplificação, mas também exortar os Estados-Membros a seguir o seu exemplo. Mesmo quando a legislação tem origem no âmbito europeu, a supervisão dos mercados é da responsabilidade dos Estados-Membros, e as administrações nacionais interpretam os instrumentos legislativos europeus em função da sua própria cultura administrativa, neles imprimindo uma "marca" nacional.

    1.2. É manifestamente necessário reformular em profundidade o quadro regulamentar na União Europeia, racionalizando e simplificando em simultâneo a legislação existente. Importa estabelecer objectivos claros e simples para este exercício, que deverá ser empreendido a nível europeu, nacional e local e terá de ser orientado no sentido da obtenção de resultados concretos; não se poderá ficar por declarações de princípio e de intenções. O Comité aguarda com interesse a publicação do relatório que a Comissão vai apresentar ao Conselho de Laeken.

    1.2.1. Esta revisão da regulamentação terá de se centrar não só na futura legislação, mas também naquela que se encontra em vigor, e deverá impreterivelmente orientar-se não só para a simplificação, mas também para uma redução em termos quantitativos.

    1.3. Tanto a revisão da legislação existente como a introdução de nova legislação devem assentar no mesmo princípio: se não ficar claramente comprovado que a sua manutenção ou introdução são do interesse público, a legislação deve ser abolida ou não deve ser introduzida. Nos casos em que seja decidida a sua manutenção, os textos legislativos existentes devem, sempre que necessário, ser reformulados no sentido de se tornarem mais simples, menos ambíguos e mais transparentes.

    1.4. Para evitar oscilações nacionais no quadro regulamentar, susceptíveis de criar distorções de concorrência no mercado único, há que assegurar um vasto grau de harmonia entre os instrumentos legislativos em vigor nos vários Estados-Membros. A única forma de o conseguir consiste em criar mais legislação com origem na UE e garantir um maior grau de uniformidade na sua transposição para o direito nacional e - o que é igualmente importante - na sua execução. A normalização é um elemento essencial da simplificação. O enquadramento regulamentar deverá contribuir para colocar as empresas europeias "em pé de igualdade". Nas actuais circunstâncias, a transposição e a aplicação das directivas nos Estados-Membros são fonte de novas complicações, divergências e atrasos. Para que o processo seja coroado de êxito a nível europeu, é manifestamente necessário adoptar uma abordagem paralela em matéria de simplificação nos Estados-Membros.

    1.5. Sempre que possível, devem ser procuradas alternativas antes de recorrer à introdução de novos actos legislativos. Poder-se-á aqui optar pela auto-regulação, pela co-regulação ou inclusive pela ausência de regulamentação. Se as circunstâncias o permitirem, deverá ser analisada a possibilidade de passar a aplicar os sistemas da auto-regulação ou co-regulação aos mercados que actualmente se encontram submetidos a regulamentação.

    1.6. Os actos regulamentares devem ser, nomeadamente, acessíveis, pertinentes e proporcionais. A acessibilidade do acervo existente deixa muitíssimo a desejar. As regulamentações devem, é certo, ser concebidas com suficiente flexibilidade para poderem enfrentar circunstâncias em rápida mutação, mas também têm de ser estáveis no tempo, a fim de criar um clima de certeza legislativa.

    1.7. A legislação-quadro é, pela sua natureza, mais flexível e oferece maior liberdade às empresas, dentro de limites predeterminados, mas apresenta o risco de deslocar simplesmente o processo regulamentar para um nível inferior, criando assim divergências ainda maiores entre os ambientes regulamentares de diferentes Estados-Membros. A aplicação do princípio da subsidiariedade comporta os mesmos riscos.

    1.8. É frequente registarem-se grandes atrasos na adopção final, no Conselho, de propostas de legislação simplificada apresentadas pela Comissão. O Comité insta o Conselho a colaborar de forma mais eficaz no processo de simplificação, aprovando para tal as propostas da Comissão dentro de prazos mais curtos.

    1.9. O Comité formula as seguintes recomendações específicas no sentido de melhorar o quadro regulamentar a nível europeu:

    - Importa criar um organismo de revisão da regulamentação, incumbido de monitorizar a revisão da legislação existente e de estabelecer as linhas directrizes para a introdução de nova legislação. O organismo a criar deverá igualmente realizar avaliações ex post dos efeitos da legislação. Nele deverão participar representantes da Comissão, dos órgãos nacionais e das empresas.

    - Deverão ser estabelecidos objectivos específicos para a redução do volume de legislação: p. ex., reduzir em 20 %, ao longo de cinco anos, o volume total de regulamentos e directivas.

    - Todos os novos actos regulamentares e todos os actos em vigor que forem prorrogados deverão passar a ter uma vigência limitada, no termo da qual caducarão automaticamente, a menos que sejam novamente prorrogados.

    - As PME, e especialmente as microempresas, deverão ficar isentas, total ou parcialmente, da aplicação de alguns actos. Estas isenções poderão ser moduladas, tornando-se mais alargadas para as microempresas com menos de dez trabalhadores.

    - Importa simplificar o acervo comunitário, definindo para tal um "núcleo" e instaurando uma certa ordem e racionalização externas, através da introdução de um processo de codificação segundo o modelo sueco.

    - Convém melhorar a acessibilidade do acervo, revendo para tal o Jornal Oficial e colocando o acervo à disposição para consultas em linha.

    - Importa procurar, sempre que possível, alternativas à regulamentação.

    - Todas as propostas legislativas deverão ser submetidas ao "teste do interesse público".

    - Os progressos registados nas tecnologias da informação e da comunicação deverão ser plenamente aproveitados para reduzir os custos decorrentes da execução de actos regulamentares.

    - As avaliações de impacto efectuadas pela Comissão a respeito de propostas legislativas deverão futuramente passar a incluir um relatório sobre a análise de outras possibilidades não legislativas.

    2. Introdução

    2.1. O presente parecer surge no seguimento do parecer do Comité sobre a "Simplificação da Legislação no Mercado Único", adoptado em 19 de Outubro de 2001(1). Nesse parecer, o Comité sublinhou a urgência de lançar um processo de simplificação da legislação no mercado único, melhorando a qualidade dos preceitos, a eficácia da sua transposição, a liberdade e a responsabilidade dos actores da sociedade civil.

    2.1.1. O Comité solicitou para tal que o Conselho Europeu de Estocolmo, na Primavera de 2001, aprovasse, sob proposta da Comissão, um plano plurianual de simplificação 2001-2005, com objectivos, prioridades, métodos, orçamento, meios de acompanhamento e de controlo. O Comité foi de opinião que esse plano deveria ser avaliado anualmente, no Conselho Europeu da Primavera, com base num relatório da Comissão.

    2.1.1.1. O Comité propôs algumas medidas específicas, tendo designadamente referido que:

    - as instituições da União deveriam adoptar códigos de conduta, por forma a contribuir para promover a simplificação das regras, e não para as tornar mais complexas;

    - a Comissão deveria dar o exemplo, difundindo a nível interno uma cultura de simplificação;

    - os Estados-Membros e as suas administrações deveriam adoptar códigos de conduta e contribuir para a divulgação das melhores práticas neste domínio;

    - importa reforçar a análise de impacto que deve acompanhar qualquer projecto de legislação;

    - a Comissão deveria proceder a um reexame da escolha dos instrumentos legislativos;

    - a Comissão deveria assegurar a activa participação do Comité na definição, aplicação e avaliação anual do processo de simplificação;

    - a Comissão deveria consultar anualmente o Comité sobre as questões prioritárias que merecem ser objecto de projectos SLIM e de painéis.

    2.1.1.2. A fim de contribuir efectivamente para o processo de simplificação, o Comité adoptou ele próprio um Código de Conduta, reproduzido no Anexo 1.

    2.2. No mandato conferido pelo Conselho Europeu de Lisboa, foi igualmente salientada a necessidade de tomar medidas a nível nacional. A maior parte da carga legislativa imposta às empresas tem a sua origem nacional e local; mesmo quando é introduzida legislação a nível europeu, é aos Estados-Membros que cabe assegurar a sua incorporação no direito nacional, aplicação e execução. O êxito da iniciativa destinada a simplificar e melhorar o enquadramento regulamentar depende, por conseguinte, do activo empenhamento de todos os intervenientes ao longo de toda a "cadeia de produção legislativa", e exige também uma acção coordenada entre as instituições comunitárias e os Estados-Membros.

    2.2.1. Há que prestar especial atenção à interacção entre a UE e as instituições nacionais; para a UE, é importante dispor da capacidade de prever os efeitos de novos actos regulamentares em vários sistemas nacionais. Os novos actos podem ter repercussões maciças a nível nacional se forem transpostos para o direito interno com excessivo zelo (a chamada "cosmética"). Assim acontece, em particular, no caso dos regulamentos que estabelecem "normas mínimas", deixando aos Estados-Membros a liberdade de impor, à sua vontade, exigências mais estritas.

    2.2.2. É natural que a principal preocupação consista em eliminar regulamentações obsoletas, mas, para que a simplificação regulamentar tenha um impacto positivo nas empresas, é essencial centrar os trabalhos nos regulamentos existentes e nos processos de elaboração de novos actos. Destas duas tarefas, é a primeira que se afigura mais vasta, mas é a segunda que, em última análise, assume maior importância; é imperioso que ambos os elementos sejam integrados desde o início, a fim de evitar que o processo fique reduzido a discussões gerais de princípio.

    2.2.3. Os processos de elaboração de nova regulamentação deveriam englobar a criação de mecanismos de avaliação ex post dos efeitos que a legislação surte na prática.

    2.3. Nas diligências para assegurar a simplificação, é necessário aproveitar plenamente as oportunidades oferecidas pelos progressos registados nas tecnologias da informação e comunicação. Importa, em especial, que os textos dos instrumentos legislativos, a todos os níveis, sejam colocados livremente à disposição do público em sítios web abertos. Os computadores podem também aliviar o fardo que representam as tarefas mecânicas e facilitar, desta forma, o processo de cumprimento da regulamentação, não devendo, porém, o facto de estarem disponíveis ser utilizado como desculpa para impor mais incumbências.

    2.4. A simplificação da legislação é uma questão que se repercute não só nas empresas, mas também em toda a sociedade. Os parceiros sociais, os consumidores, as ONG e os outros elementos da sociedade civil organizada são todos eles afectados negativamente pela confusão e incerteza resultantes de uma legislação que carece de clareza, concisão, coesão e compatibilidade. Quando a regulamentação resulta em custos acrescidos para as empresas, esse acréscimo reflecte-se invariavelmente no consumidor. Acima de tudo, é o cidadão quem mais sofre com esta situação.

    2.5. A simplificação é também uma questão do âmbito do mercado interno. A ausência de harmonização dos instrumentos regulamentares representa um importante obstáculo à plena realização do mercado interno, conduzindo frequentemente a distorções de concorrência. O processo de reconhecimento mútuo, contribuindo embora, até certo ponto, para compensar esta situação, não pode surtir o grau de conformidade que é necessário num verdadeiro mercado interno.

    3. Progressos realizados até à data

    3.1. O Comité sempre apoiou a iniciativa SLIM (Simplificação da Legislação do Mercado Interno) e sempre a considerou um passo na boa direcção. Pensa, todavia, que algo mais é necessário para que sejam efectuados autênticos melhoramentos.

    3.2. A iniciativa SLIM foi lançada pela Comissão em Maio de 1996, mas forçoso é admitir que os progressos realizados até à data têm sido manifestamente decepcionantes. No relatório intercalar que apresentou ao Conselho Europeu de Estocolmo, intitulado "Melhorar e Simplificar o Ambiente Regulador"(2), a Comissão adoptou muitas das recomendações do Comité que acima se descrevem em pormenor, integrando-as nas suas propostas de futuras medidas destinadas a contribuir para alcançar o objectivo definido na Cimeira de Lisboa: tornar a União "o espaço económico mais dinâmico e competitivo do mundo, baseado no conhecimento e capaz de garantir um crescimento económico sustentável, com mais e melhores empregos e com maior coesão social". Desde o momento em que este objectivo foi enunciado, pouco se logrou fazer para o concretizar; surgiram outras prioridades, e a dinâmica gerada na sequência da Cimeira de Lisboa diluiu-se em grande medida.

    3.2.1. Em 1995, o Relatório Molitor apresentou dezoito recomendações de carácter geral (cf. Anexo 2). Há um ano, o Comité(3) observou que "muitas destas recomendações foram desde então largamente 'esquecidas'". No essencial, a situação em nada se alterou.

    3.2.2. Tal como a Comissão reconhece, é essencial, para atingir esse objectivo, que se avance efectivamente no processo de melhoramento e simplificação do enquadramento regulamentar. No seu relatório para o Conselho Europeu de Estocolmo, a Comissão salienta que "os cidadãos e as empresas, principalmente as PME, necessitam de um ambiente regulador claro, eficaz e prático num mercado mundial em rápida evolução".

    3.2.2.1. O Comité subscreve esta abordagem. Conforme tem repetidamente lembrado, é necessário, em especial, aliviar a carga regulamentar imposta às pequenas e médias empresas, com particular realce para as microempresas, que constituem a principal fonte de crescimento económico e de criação de emprego em qualquer sociedade dinâmica. Num inquérito recentemente organizado, no Reino Unido, pelo Institute of Directors (Instituto dos Chefes de Empresa), a maioria das microempresas mencionaram a carga regulamentar como o maior desincentivo à criação de empresas e o maior obstáculo à sua expansão.

    3.2.2.2. O Comité considera que, para desempenhar a missão definida na Cimeira de Lisboa, a regulamentação deve cumprir os seus objectivos sociais, sem representar um condicionalismo para o comércio.

    3.3. A Comissão estabeleceu os seguintes princípios fundamentais da estratégia regulamentar:

    - a acção legislativa deve cingir-se aos casos em que se revela necessária;

    - antes da formulação de qualquer proposta, há que proceder a vastas consultas e análises de impacto;

    - importa escolher o instrumento adequado;

    - há que acelerar o processo legislativo;

    - importa assegurar uma transposição rápida e correcta e uma efectiva aplicação;

    - os efeitos da legislação devem ser avaliados;

    - há que acelerar a simplificação e a codificação dos textos existentes.

    3.3.1. O Comité apoia vivamente estes princípios, mas é de opinião que há falhas nos mecanismos destinados a concretizá-los. Tal como a Comissão afirma, a estratégia terá de ser desenvolvida dentro do quadro institucional da União Europeia. Os Tratados oferecem oportunidades, mas também impõem constrangimentos. A Comissão tenciona continuar a utilizar plenamente os instrumentos previstos nos Tratados e a desempenhar o seu papel motor, no âmbito das competências que lhe foram conferidas.

    3.4. Para a Comissão, os esforços de melhoramento e simplificação do enquadramento regulamentar não são mero sinónimo de "desregulação"; é seu objectivo garantir uma melhor regulamentação, e não desregular. Mais uma vez, o Comité subscreve este princípio, mas gostaria de frisar que a consecução de uma melhor regulamentação passará inevitavelmente por uma redução do número de actos regulamentares existentes, sem todavia comprometer nenhum dos objectivos regulamentares que se revelam necessários, inclusive em matéria de normas sociais e ambientais ou de prestação de serviços importantes a todos os cidadãos. Tal não tem forçosamente de equivaler - nem deve equivaler - a uma desregulação; a eficácia da regulamentação depende da sua qualidade, e não da quantidade; sob muitos aspectos, a quantidade é inimiga da qualidade. Os actos regulamentares deverão ser:

    - acessíveis;

    - pertinentes;

    - desprovidos de ambiguidade;

    - imparciais;

    - necessários;

    - objectivos;

    - uniformes;

    - simples;

    - proporcionais;

    - equitativos;

    - estáveis;

    - transparentes.

    Deverão igualmente ser compatíveis entre si, eficazes e rentáveis.

    3.4.1. Verifica-se com demasiada frequência que os requisitos de um regulamento estão em conflito com as exigências impostas por outro. Assim sucede, em especial, no caso da legislação secundária introduzida a nível regional e local. Trata-se de uma situação que não pode deixar de prejudicar a eficácia com que são concretizados os objectivos regulamentares. Os actos devem, antes de mais, ser rentáveis; os benefícios que deles se retiram devem, no mínimo, corresponder aos custos impostos - e estes custos não se medem apenas em termos financeiros.

    3.5. No contexto do mercado único, uma regulamentação eficaz deve imperiosamente ter por objectivo garantir uma concorrência leal e a ausência de discriminação. Deve assegurar que os cidadãos gozem de protecção contra a fraude, a falsificação e a má gestão; deve também colocar os operadores de mercado em "pé de igualdade"; deve, além disso, ser flexível e evitar uma intervenção desnecessária. Impõe-se que os enquadramentos regulamentares sejam dotados de suficiente flexibilidade para responder a novas ocorrências e acompanhar a rápida evolução das tecnologias, mantendo-se simultaneamente estáveis e previsíveis.

    3.5.1. Em especial, a regulamentação não deverá entravar o desenvolvimento do mercado, nem tão-pouco colocar as empresas ou os cidadãos europeus em situação de desvantagem nos esforços envidados para tirar plenamente partido do potencial do mercado em termos de criação de emprego e de melhoria do nível de vida.

    3.5.2. Uma regulamentação eficaz engloba imperiosamente um elemento de desregulação; para garantir a simplificação, não basta substituir velhos regulamentos por novos; o que é necessário é repensar completamente o enquadramento regulamentar.

    3.6. A legislação comunitária ou nacional deveria definir claramente objectivos regulamentares, concebidos por forma a promover os interesses dos consumidores através de uma efectiva concorrência, bem como a assegurar, se necessário, uma prestação universal de serviços.

    3.7. Revela-se agora essencial obter resultados concretos em matéria de simplificação regulamentar a nível europeu, nacional e local. A actividade a desenvolver não deve ficar limitada a declarações de princípio. É necessária uma mudança de cultura, bem como um novo ambiente regulamentar.

    3.8. A tónica actualmente colocada pela UE no alargamento a novos membros vem tornar ainda mais premente a necessidade de simplificar a estrutura regulamentar da União.

    4. Formas alternativas de regulamentação

    4.1. A regulamentação pode assumir uma das três seguintes formas:

    - regulamentação por via legislativa;

    - co-regulação;

    - auto-regulação.

    4.2. Todas estas formas podem coexistir dentro do mesmo mercado, tendo talvez mais cabimento encarar a co-regulação e a auto-regulação como abordagens complementares e não como alternativas à regulamentação por via legislativa.

    4.3. Disso é exemplo claro a liberalização de mercados anteriormente dominados por um fornecedor que ocupava uma posição de monopólio e que, por regra, pertencia ao Estado. Nas primeiras fases da liberalização, é muitas vezes necessário um elevado grau de regulação e fiscalização por parte dos poderes públicos. Em certa medida, esta regulação substitui-se à concorrência. Um dos seus principais objectivos deveria consistir em assegurar uma concorrência leal e efectiva no mercado e, o que é ainda mais importante, fomentar essa mesma concorrência e garantir a prestação de serviços importantes a todos os cidadãos, tal como o prevê, por exemplo, o conceito de serviço universal no que toca à prestação de serviços de interesse geral.

    4.3.1. Uma vez instaurada uma concorrência leal e aberta entre vários operadores independentes, o consumidor fica protegido contra a imposição de preços excessivos, a discriminação e práticas de mercado desleais, em virtude das pressões concorrenciais; as empresas apenas podem melhorar a sua posição no mercado se oferecerem melhores serviços, uma escolha mais diversificada e preços mais baixos. Nestas circunstâncias, torna-se possível depositar maior confiança nas regras gerais de concorrência estabelecidas no Tratado, e o regulamentador pode então ir gradualmente cedendo o seu lugar às forças de mercado, acabando por passar a limitar a regulamentação aos domínios em que os objectivos políticos não podem ser exclusivamente alcançados através da concorrência. É aí que se poderá começar a recorrer à auto-regulação ou à co-regulação.

    4.3.2. A auto-regulação é voluntária e baseia-se na cooperação entre todos os interessados, integrando, se for caso disso, regras comunitárias destinadas a reger os acordos entre as partes. A nova economia caracteriza-se por uma rápida mutação tecnológica, uma célere evolução dos mercados e uma crescente globalização. Neste ambiente em rápida mudança, a auto-regulação é de molde a revelar-se um poderoso instrumento. A Comissão tem, de forma consistente, preconizado a auto-regulação enquanto alternativa flexível, eficaz e rentável à regulamentação em numerosos domínios. O Comité concorda com esta abordagem, desde que sejam respeitadas determinadas condições. "Auto-regulação" não significa "auto-execução da regulamentação": tem de estar em conformidade com a lei e ser por esta apoiada; tem de assentar numa comunidade de interesses entre as empresas e o público; tem de poder ser executada, verificada e controlada; tem igualmente de ser eficaz e proporcionar vias de recurso explícitas, particularmente a nível transfronteiras. A auto-regulação não é uma panaceia (uma auto-regulação com base nacional pode, nalguns casos, vir criar novos obstáculos à livre circulação de serviços, e as regras impostas por associações de empresas podem ter um impacto negativo em empresas que delas não são membros, em especial as PME), mas, nas devidas condições, pode constituir um útil instrumento para evitar uma legislação pesada.

    4.3.3. A co-regulação combina os elementos da legislação, muito em especial no que toca à sua natureza previsível e vinculativa, com o regime mais flexível da auto-regulação. Pressupõe que esta última seja levada mais longe na via de uma abordagem de cooperação a respeito da governação. Limita ao essencial a intervenção dos poderes públicos e deixa às empresas a maior liberdade possível na escolha da forma como cumprem as suas obrigações. Mais do que uma mera coexistência entre auto-regulação e regulamentação, a co-regulação implica a partilha de responsabilidades entre os parceiros dos sectores público e privado. Trata-se de uma fórmula que já tem sido aplicada em diversos domínios. São nomeadamente de citar os seguintes exemplos:

    - a "Nova Abordagem", no âmbito da qual os requisitos fundamentais são definidos numa directiva-quadro, podendo os operadores de mercado determinar por si próprios qual a melhor forma de cumprir as suas obrigações; um dos factores-chave destes requisitos fundamentais é a sua neutralidade em termos tecnológicos;

    - a possibilidade, introduzida pelo Tratado de Maastricht, de recorrer aos acordos entre os parceiros sociais (por sua própria iniciativa ou após consulta à Comissão) enquanto método alternativo de produção normativa em áreas relacionadas com as condições de trabalho e o acesso ao emprego.

    4.3.3.1. O desafio a enfrentar pela co-regulação consiste em definir, manter e preservar objectivos políticos, permitindo ao mesmo tempo uma maior flexibilidade no quadro regulamentar. Para tal, é necessário, em primeiro lugar, apurar quais os domínios em que a co-regulação melhor poderá funcionar. Seguidamente, importa formular respostas globais; as soluções de carácter parcial não serão eficazes. Por último, cabe agir com rapidez; as pressões da globalização não permitirão que se adopte um calendário relaxado.

    4.3.3.2. Num colóquio sobre a co-regulação no mercado único, realizado em 3 de Maio de 2001, em Bruxelas, sob os auspícios do Observatório do Mercado Único (Comité), concluiu-se que ainda havia diferenças substanciais entre os processos de co-regulação que começam a surgir no mercado único. Em determinados domínios (estabelecimento de normas, domínio social), os processos revelam-se bem pensados, estruturados e testados a nível europeu; noutros domínios (consumidores, ambiente, serviços financeiros), encontram-se ainda numa fase incipiente, são pontuais e descentralizados, muito embora possuam um potencial considerável de desenvolvimento.

    4.3.3.3. De um modo geral, estas práticas apresentam a vantagem de simplificar as regras, aliviar a maquinaria legislativa, acelerar a adaptação à mudança e promover a co-responsabilização entre os actores do meio económico e da sociedade civil. Para se revelarem bem-sucedidas, necessitam de margens de manobra para as empresas e a sociedade civil organizada, de parcerias com as autoridades públicas, de actores representativos, de processos transparentes, de uma concretização eficaz e de um controlo rigoroso do seu impacto e seguimento, nomeadamente por parte dos poderes públicos.

    4.3.3.4. Através de abordagens diversificadas em matéria de co-regulação, com a participação dos grupos socioeconómicos, pode ser dado um útil contributo para melhorar o funcionamento do mercado único na resposta ao triplo desafio do alargamento, aprofundamento e globalização.

    4.4. Outra das alternativas à regulamentação é a "não-regulação", em que a responsabilidade é deixada ao mercado. Embora nem sempre seja adequada, esta solução não deve ser totalmente posta de lado. Eis a primeira pergunta que importa fazer a respeito de toda e qualquer proposta legislativa: "Por que motivo é necessário um acto legislativo?". Trata-se de uma questão que poderá ser abordada pelo Comité nos seus pareceres e propostas legislativas. Cabe igualmente colocar a mesma pergunta a respeito da introdução de sistemas de co-regulação e auto-regulação.

    4.5. Qualquer regime regulamentar, seja ele regulador, co-regulador ou auto-regulador, ou ainda uma combinação destes três elementos, será negativo em termos de comércio se não for uniforme e uniformemente aplicado. Nada é mais demolidor para a actividade empresarial do que um clima de incerteza legislativa.

    5. Simplificar a legislação existente

    5.1. A simplificação e a actualização sistemática da legislação existente deverão assegurar que o direito em vigor seja sempre adequado aos seus objectivos. Para tal, a Comissão tenciona:

    - avaliar rapidamente o feedback que indique a existência de situações de complexidade excessiva e não justificada;

    - estabelecer uma programação plurianual, actualizada regularmente, das acções de simplificação a efectuar, com prazos politicamente vinculativos a acordar entre as instituições;

    - propor um acordo entre as instituições, com vista a definir os princípios da simplificação e assumir um compromisso político no sentido da aceleração dos trabalhos legislativos para esse efeito;

    - introduzir sistematicamente um elemento de simplificação no âmbito da revisão periódica das directivas ou regulamentos em vigor;

    - reforçar e desenvolver a acção já iniciada em matéria de codificação, reformulação e consolidação, e decidir a publicação sistemática e rápida dos textos consolidados, a título de informação, sempre que forem alterados.

    5.2. O Comité aprova, em princípio, estas medidas, mas receia que não sejam, por si sós, suficientes para conduzir ao melhoramento radical do status quo, cuja necessidade tão manifestamente se faz sentir. O actual acervo comunitário perfaz mais de 80000 páginas, entre as quais se contam quase 10000 instrumentos jurídicos de nove tipos diferentes, e é de tal modo complexo que só juristas com formação especial e experiência podem enfrentar com êxito o seu conteúdo labiríntico. Daí decorre não só um pesado encargo para as empresas dos Estados-Membros, mas também uma situação quase insuportável para os países candidatos, uma vez que, em muitos casos, a taxa de aumento do volume de actos legislativos é superior ao ritmo a que esses países podem transpor o acervo existente.

    5.3. O Comité está preocupado com o risco de o processo poder vir a tornar-se aleatório e ineficaz, caso a revisão da legislação vigente apenas seja desencadeada pelo feedback proveniente do mercado. O que é necessário é proceder a uma profunda e completa reformulação de toda a legislação existente. Esta revisão deverá pautar-se pelo princípio de que, se não for possível justificar de forma clara e convincente a manutenção de cada instrumento legislativo, numa perspectiva de interesse público, então o instrumento em causa deverá ser imediatamente revogado.

    5.4. Não basta, contudo, abolir actos regulamentares que se tornaram obsoletos. Mesmo nos casos em que o texto legislativo ainda é manifestamente necessário, tal não significa que deva manter a sua forma actual. A legislação comunitária tem evoluído de modo fragmentário, sendo os actos em vigor alterados para permitir uma adaptação a circunstâncias em mutação. Têm sido assim introduzidas múltiplas alterações nalgumas directivas, sendo que, de cada vez que a situação muda, são acrescentadas novas imposições a uma estrutura já de si complexa. Daí resultam instrumentos legislativos que são complicados, confusos e, por vezes, contraditórios. Em muitos dos casos em que as directivas não são revogadas, será necessário proceder a uma reformulação de fundo, a fim de restabelecer a clareza, a coerência e a concisão da estrutura legislativa, havendo no entanto que analisar atentamente, neste contexto, as consequências das alterações para as normas sociais e ambientais.

    6. A experiência sueca

    6.1. Em qualquer exercício deste género, é sempre instrutivo analisar as melhores práticas, e a Suécia é um dos Estados-Membros onde tem sido seguida uma abordagem sistemática para o problema da simplificação legislativa.

    6.2. Muitos ensinamentos podem ser tirados de uma análise do quadro regulamentar na Suécia. No topo estão as leis, aprovadas pelo Parlamento; actualmente, elevam-se a um número ligeiramente superior a mil. Seguidamente vêm os decretos, aprovados pelo Governo; calcula-se que haverá mais de 2000 em vigor. Depois destes, há os instrumentos regulamentares dos órgãos do governo central, que se dividem em regulamentações oficiais e recomendações gerais: as primeiras são juridicamente vinculativas; as segundas não, mas, na prática, é-lhes conferida uma importância considerável, inclusive por parte dos tribunais. Em termos globais, existem cerca de 7000 instrumentos regulamentares importantes nas categorias acima referidas, representando cerca de 40000 páginas de texto; entre estes, cerca de 8 % estão relacionados com a UE. A taxa de aumento do volume de textos legislativos, tanto novos como alterados, tem-se mantido, de forma constante, em cerca de 5000 páginas por ano, sendo que cerca de 80 % são alterações a textos existentes, e não textos "novos". Por outras palavras, os empresários e os seus consultores têm anualmente de absorver 5000 páginas de novas exigências legislativas e "esquecer" 4000 páginas de legislação existente. Estes números são muito mais elevados nalguns outros Estados-Membros.

    6.2.1. Abaixo destes principais instrumentos regulamentares, existem mais três categorias de regulamentação: regulamentação das autoridades regionais, regulamentação municipal e acordos colectivos - estes últimos com a participação dos parceiros sociais. Esta regulamentação secundária não deve ser ignorada nem subestimada.

    6.2.2. Há três conclusões importantes a tirar dos números respeitantes à Suécia:

    - a taxa de aumento do volume de actos legislativos (novos e alterados) a nível governamental representa cerca de 12,5 % por ano;

    - é relativamente reduzida a proporção de textos legislativos que podem ser atribuídos à intervenção da UE;

    - quanto mais se desce na hierarquia legislativa, mais o volume de actos legislativos vai aumentando.

    6.2.2.1. Embora estes números digam especificamente respeito à Suécia, é muitíssimo provável que a situação se repita igualmente nos demais Estados-Membros, com diferenças locais relativamente pouco significativas. Em especial, é de contar que a proporção entre o número de actos legislativos com origem na UE e o número de regulamentações nacionais seja globalmente semelhante.

    6.3. Em finais da década de 80, a Suécia empreendeu uma racionalização dos blocos de actos regulamentares dos órgãos. A nível dos órgãos centrais, foram elaborados códigos legislativos especiais - 55, actualmente -, no intuito de criar um sistema bem ordenado e de tornar os actos regulamentares mais acessíveis ao público e às empresas.

    6.3.1. A experiência sueca veio revelar que as ambições de simplificação a nível central - Governo e Parlamento - ficarão, em grande medida, goradas se os próprios órgãos não se interessarem pela questão. Este exercício demonstrou igualmente que uma iniciativa central tem fracas probabilidades de êxito se não puder contar com uma liderança ao mais alto nível da hierarquia. E também revelou que é essencial estabelecer objectivos específicos.

    6.4. A adopção de legislação-quadro tem vindo, nos últimos anos, a tornar-se um fenómeno de crescente importância. Trata-se de uma prática que, embora tenha comprovadamente apresentado nítidas vantagens em comparação com a legislação excessivamente pormenorizada de anos anteriores, especialmente no contexto de um rápido avanço tecnológico, também apresentou inconvenientes, na medida em que resultou numa proliferação de instrumentos legislativos a um nível inferior. A título de exemplo, refira-se que a Lei sueca sobre Géneros Alimentícios, um modesto texto que apenas contém 35 artigos e não ultrapassa as seis páginas, deu origem a mais de 100 actos administrativos de execução que perfazem, no total, mais de 1800 páginas.

    6.5. A Suécia tomou medidas para aliviar a carga regulamentar imposta às PME, tendo-as dispensado, no todo ou em parte, da obrigação de dar cumprimento a determinados actos regulamentares, ou tendo atenuado o grau de cumprimento exigido. Foram tomadas medidas semelhantes nos Estados Unidos, com resultados muito eficazes em termos de encorajamento da actividade empresarial. Contrariamente ao que se pensa em geral, os Estados Unidos são uma sociedade altamente regulamentada, mas a autoridade responsável em matéria de pequenas empresas (Small Business Administration - SBA) tem actuado no sentido de reduzir a carga regulamentar, particularmente no caso das microempresas.

    6.5.1. Este exemplo poderia muito bem ser seguido de forma mais ampla na Europa. Como é óbvio, alguns actos regulamentares haverá para os quais não poderão ser previstas isenções, mas muitas regulamentações são de uma severidade desproporcionada para as microempresas e exercem um efeito dissuasivo no que respeita à sua criação; nesses casos, poderá justificar-se alguma flexibilização, sem que desse modo sejam, porém, afectados os princípios subjacentes à legislação em causa.

    7. Código de Conduta do Comité Económico e Social

    7.1. Com a sua iniciativa de elaborar e adoptar um Código de Conduta, o CES veio impulsionar a promoção da simplificação. Para que esta dinâmica não se extinga, é essencial que o CES consagre maior atenção à implementação do Código.

    7.2. Um dos elementos-chave do seu Código de Conduta consistia na introdução de um controlo sistemático da avaliação do impacto de cada projecto legislativo, mas a verdade é que poucos dos pareceres que entretanto formulou deram relevo a esta questão.

    7.3. O Comité acordou em chamar a atenção das instituições da UE para a eventual necessidade de orientar as regras da União no sentido de uma abordagem assente em acordos contratuais, na auto-regulação e na co-regulação, mas, uma vez mais, pouco foi feito neste domínio. Para o efeito, o Observatório do Mercado Único organizou, em Maio de 2001, um colóquio em que participaram representantes de cinco Direcções-Gerais da Comissão Europeia, bem como de outras instituições europeias.

    7.4. O Comité comprometeu-se a encetar diálogos com os actores socioeconómicos europeus, o Comité das Regiões e os conselhos económicos e sociais dos Estados-Membros, a fim de contribuir para o êxito do processo de simplificação. Estes diálogos ainda não foram instituídos sob nenhum formato estruturado, mas é intenção do Observatório do Mercado Único dar início, no próximo ano, a uma série de visitas a conselhos económicos e sociais nacionais, visitas essas que terão como tema de debate a questão da simplificação. Foram igualmente estabelecidos contactos preliminares com o Comité das Regiões.

    7.5. No Código de Conduta, foi observado que, embora apoiando amplamente as iniciativas da Comissão em matéria de simplificação, o Comité raramente propôs, de moto próprio, medidas de simplificação, nem tão-pouco apresentou soluções mais simples do que a actuação proposta pela Comissão. Infelizmente, assim continua a suceder até hoje.

    7.6. É patente a necessidade de uma actuação mais positiva neste domínio por parte do Comité, da Comissão, das demais instituições e dos governos dos Estados-Membros.

    8. Algumas questões de ordem regulamentar

    8.1. O tema da simplificação regulamentar é tão complexo como a natureza do problema que procura resolver, suscitando algumas questões que são contraditórias.

    8.2. A questão da legislação-quadro é paradigmática neste contexto. Não pode haver qualquer dúvida de que uma legislação pormenorizada e demasiado normativa não tem cabimento num mercado em rápida mutação, no qual o ritmo da evolução tecnológica é de molde a tornar a legislação obsoleta quase mesmo antes de entrar em vigor. Daí decorre a necessidade de ir constantemente actualizando e alterando as disposições regulamentares, o que cria um clima de incerteza legislativa e conduz com frequência a instrumentos legislativos que são complicados ao ponto de serem praticamente incompreensíveis. Neste contexto, a legislação deve ser redigida, na medida do possível, em termos gerais que se prestem melhor a uma adaptação a novas ocorrências.

    8.2.1. Sucede porém que a legislação-quadro assenta no princípio segundo o qual as empresas devem gozar de liberdade dentro dos limites estabelecidos; está-se perante uma violação deste princípio se a legislação-quadro a nível europeu for interpretada de formas diferentes pela legislação nacional ou se a legislação-quadro a nível nacional for completada por regulamentações administrativas ou locais. As regulamentações-quadro são de preferir se proporcionarem a flexibilidade necessária para fazer frente a rápidas mutações e oferecerem às empresas liberdade de acção dentro de limites predeterminados, mas podem revelar-se nocivas se mais não fizerem do que deslocar o poder regulamentar do nível político para um nível inferior.

    8.3. Outro exemplo emblemático é a questão da subsidiariedade. É amplamente admitido que o princípio da subsidiariedade deve constituir a base de todos os esforços de regulamentação. Nesta conformidade, a UE não deve regulamentar nenhum domínio que possa ser regulamentado a nível nacional ou resolvido por qualquer outra via; do mesmo modo, importa que os Estados-Membros não regulamentem centralmente nenhum domínio para o qual seja mais indicado um tratamento a nível regional ou municipal.

    8.3.1. Na prática, a aplicação deste princípio dá azo a consideráveis dificuldades, tanto para as empresas como para as administrações nacionais. Nos casos em que o princípio da subsidiariedade impõe que a legislação seja executada a nível nacional, é frequente surgirem diferenças substanciais na forma como as disposições legislativas são configuradas em cada Estado-Membro. O mesmo sucede, de modo ainda mais acentuado, no caso dos poderes regulamentares exercidos a nível local. Assim, o princípio da subsidiariedade pode conduzir a que as empresas se vejam confrontadas com textos legislativos que, incidindo embora na mesma matéria, são contraditórios de um Estado-Membro para outro e inclusive até dentro do mesmo Estado-Membro. A subsidiariedade vai de par com a diversidade.

    8.3.2. É lícito argumentar que, em virtude do requisito de uniformidade no mercado único, a aplicação do princípio de subsidiariedade deverá levar a que passem a ser executados a nível europeu maior proporção de actos legislativos do que até à data acontece. Esses actos deverão, além disso, ser formulados em termos que não sejam de molde a sofrer alterações substanciais no decurso do processo de transposição a nível nacional ou local. Importa, afinal, ter presente que um dos objectivos intrínsecos da legislação da UE consiste em assegurar a simplificação, mediante uma harmonização e uniformização dos quinze conjuntos de regras nos Estados-Membros, por forma a permitir que o mercado único funcione com eficácia.

    8.4. Neste contexto, coloca-se também a questão da execução. Mesmo nos domínios - e são relativamente poucos - onde se verifica uma concordância de legislação entre os Estados-Membros, existem frequentemente disparidades generalizadas no tocante ao grau de execução. Eis mais um factor que vem criar distorções de concorrência no mercado único.

    8.5. Um dos elementos-chave numa legislação eficaz é a acessibilidade. Tanto as empresas como outros sujeitos passivos precisam de saber qual a sua situação perante a lei e devem gozar da possibilidade de obter acesso aos textos legislativos sem dificuldades ou despesas injustificadas. É de lamentar que o acervo seja não só dificilmente compreensível, mas também relativamente inacessível. A resolução do primeiro destes problemas poderia passar pela identificação de um "núcleo" que incluiria os elementos fundamentais das cerca de 1200 directivas e regulamentos aprovados pelo Conselho, bem como das cerca de 2500 directivas e regulamentos associados, adoptados pela Comissão. Haveria também vantagens em dar início a um processo de codificação semelhante ao que foi empreendido na Suécia. Quanto ao segundo problema, seria necessário proceder a uma revisão do Jornal Oficial das Comunidades Europeias, cujo sistema actual de publicação se afigura desnecessariamente complexo e pouco claro. A título de complemento, o acervo poderia ser colocado à disposição, na sua totalidade, num sítio web especial, com indicação das alterações que fossem sendo introduzidas na legislação.

    8.6. Também o princípio da proporcionalidade se reveste de importância fundamental. No âmbito regulamentar, requer este princípio que os encargos impostos às empresas não excedam aquilo que pode ser genuinamente justificado em razão do interesse público. Aquando da introdução de todo e qualquer acto legislativo a nível europeu, nacional ou local, dever-se-ia, pois, exigir aos autores das propostas, enquanto requisito prévio essencial, que comprovassem claramente a necessidade de tais actos do ponto de vista do interesse público. O mesmo se deveria aplicar à revisão da legislação em vigor.

    8.6.1. É necessário que os actos regulamentares sejam relevantes e desprovidos de ambiguidade. Infelizmente, nem sempre assim acontece a nível europeu, e ainda menos aos níveis inferiores da hierarquia legislativa. Alguns actos considerados necessários para responder a um determinado caso são frequentemente "colados" a actos vigentes que não foram inicialmente concebidos para o fim em causa. Surgem assim situações em que não é claro, nem sequer para os peritos na matéria, se um dado conjunto de circunstâncias é regido por uma parte de um regulamento ou por outra parte do mesmo regulamento, ou ainda por outro regulamento, ou se não é regido por nenhuma disposição. Esta ausência de clareza é lesiva dos interesses de todas as partes envolvidas - empresas, público, administrações nacionais e instituições europeias.

    8.7. Considera o Comité que urge proceder a uma revisão da legislação existente e estabelecer linhas directrizes para a introdução de nova legislação. Coloca-se a questão de saber como e por quem deverá esta revisão ser efectuada. Na Suécia, a experiência revelou que, para obter os melhores resultados, importa que estejam preenchidas as seguintes condições:

    - os órgãos envolvidos devem participar no processo;

    - o processo deve ser liderado ao mais alto nível da hierarquia política;

    - deve ser mantido um diálogo activo entre os órgãos e os mercados;

    - devem ser estabelecidos objectivos específicos.

    Todavia, será talvez irrealista esperar que sejam os funcionários públicos os primeiros a pôr em marcha o processo de redução e racionalização da legislação; a sua participação é essencial, mas a verdade é que o impulso tem de vir de outra fonte, e essa fonte não pode ser senão política - os dirigentes políticos têm, porém, muitas outras solicitações e muitos outros deveres a cumprir.

    8.7.1. No seu anterior parecer sobre o tema em análise(4), o Comité sublinhou a necessidade de reforçar a independência e a qualidade das análises de impacto, tendo-lhes sido consagrados meios adequados, com uso do direito de iniciativa, bons métodos e consulta efectiva dos meios socioprofissionais dos meios directamente interessados. Para o efeito, considerou que seria uma boa prática confiar estas análises a um organismo exterior à Comissão, que tivesse as necessárias qualificações e critérios de independência.

    8.7.2. O Comité é de opinião que o organismo em causa deverá assumir a forma de instância permanente a nível europeu, podendo igualmente ficar incumbido de monitorizar o processo de revisão tendente à simplificação. A fim de assegurar um diálogo activo entre administrações e mercados, do organismo de revisão deverão fazer parte representantes de empresas, além de representantes da Comissão e administrações e dos demais actores socioeconómicos. Trata-se aqui de uma falha do actual processo. A UE velou cuidadosamente por permitir que todos os órgãos nacionais estivessem representados nos grupos de redacção, mas os porta-vozes dos mercados estão muito longe de ter tão boa representação. As empresas são os "consumidores" da legislação, e a representação directa no organismo de revisão é tão essencial para elas como o é para os órgãos. São elas, afinal, que estão em melhor posição para avaliar o impacto da legislação nas suas actividades. O ideal seria que o organismo tivesse homólogos a nível nacional, incumbidos de desempenhar as mesmas funções no que respeita à massa muito mais volumosa de legislação nacional. Como é óbvio, seria de desejar que houvesse um estreito contacto entre o organismo europeu e os seus homólogos nacionais. Os organismos nacionais poderiam, adicionalmente, verificar a compatibilidade entre as leis nacionais e a legislação da UE.

    8.7.3. O referido organismo poderia, além disso, desempenhar todas ou algumas das seguintes funções:

    - determinar quais os actos legislativos existentes que devem ser incluídos na iniciativa SLIM;

    - estabelecer linhas directrizes para a introdução de nova legislação;

    - estabelecer objectivos para a redução da produção legislativa;

    - codificar o acervo comunitário;

    - efectuar avaliações de impacto;

    - fiscalizar o mercado;

    - efectuar avaliações ex post dos efeitos práticos dos instrumentos legislativos;

    - assumir as funções dos Painéis de Empresas Europeias;

    - acompanhar os progressos do Grupo Especial para a Simplificação do Enquadramento Empresarial;

    - coordenar as diversas iniciativas existentes em matéria de simplificação (SLIM, BEST, painéis, avaliações de impacto).

    8.8. Uma medida que viria facilitar grandemente os trabalhos do organismo e dar um importante contributo para a simplificação a longo prazo da estrutura regulamentar consistiria em atribuir a todos os novos actos (inclusive os actos existentes cuja manutenção tenha sido decidida na sequência do processo de revisão) vigência limitada, no termo da qual expirariam automaticamente, salvo se fossem prorrogados (a chamada "legislação 'pôr do sol'"). Ficaria deste modo assegurada uma revisão sistemática dos actos regulamentares em causa, bem como uma reanálise destinada a verificar se continuam a ter razão de ser. A vigência limitada não tem forçosamente de ser a mesma para todos os instrumentos legislativos; alguns podem ser introduzidos por um período de sete anos, por exemplo, ao passo que outros, pela sua natureza, podem ter um prazo mais reduzido. Conviria instituir um processo semelhante a nível nacional.

    8.9. O processo de simplificação tem de ser fortemente acelerado por forma a facilitar o alargamento da União. A excessiva complexidade de uma grande parte da legislação europeia impõe aos países candidatos um fardo desnecessário nas suas tentativas de transposição do acervo. Acresce que, se esta situação não for corrigida antes da adesão, as empresas desses países, e em especial as PME, terão de suportar os encargos que representam os custos adicionais e desnecessários actualmente impostos às suas congéneres dos Estados-Membros. Estes custos far-se-ão sentir com maior intensidade nas empresas dos países candidatos do que nas empresas dos Estados-Membros, uma vez que as suas actividades são exercidas em economias muito menos desenvolvidas.

    8.10. A complexidade da legislação existente também suscita questões relacionadas com o Estado de direito. O desconhecimento da lei não pode ser invocado como desculpa, e acontece que muitas pequenas empresas correm o risco de se verem obrigadas a infringir a lei, por lhes ser impossível determinar a natureza e o alcance das suas obrigações legais. Em virtude da complexidade da legislação, a interpretação das questões mais obscuras converteu-se no feudo de uns poucos juristas altamente especializados que, por serem escassos em número e peritos na matéria, cobram honorários exorbitantes, o que leva a que apenas as maiores organizações possam ter acesso aos seus serviços.

    8.11. Existe uma vasta hierarquia de legislação, repartida da seguinte forma:

    >POSIÇÃO NUMA TABELA>

    Existem ainda regulamentos que emanam de instâncias internacionais, como a OMC e a OIT, e derivam de acordos internacionais, tanto a nível bilateral como multilateral.

    8.11.1. Verifica-se em muitos, se não mesmo em todos os Estados-Membros, que quanto mais se desce na hierarquia regulamentar, mais o volume de regulamentação vai aumentando. Além disso, os poderes regulamentares são frequentemente exercidos com mais severidade e incoerência a esses níveis inferiores. Por conseguinte, é ao nível municipal, local e regional que o peso da legislação mais severamente se faz sentir nas empresas, sobretudo PME. Este impacto é exacerbado pelas diferenças entre os hábitos e as práticas empresariais vigentes nos Estados-Membros, práticas e hábitos esses que, embora não tendo força de lei, são muitas vezes aplicados de modo arbitrário.

    8.11.2. O impacto da regulamentação secundária deve ser encarado não só em termos de custos e carga burocrática para as empresas, mas também na perspectiva da legitimidade democrática. A regulamentação secundária carece frequentemente de uma verdadeira base jurídica. Os parlamentos e os governos permitem que os poderes regulamentares sejam assumidos por órgãos anónimos, o que prejudica a legitimidade e a aceitabilidade do processo regulamentares. Sucede também que, em muitos casos, não há transparência no processo de elaboração de regulamentação secundária.

    8.12. Um dos motivos na origem da complexidade da legislação europeia reside nas alterações substanciais e, por vezes, contraditórias que são introduzidas nas propostas legislativas ao nível do Parlamento e do Conselho, no intuito de chegar a um consenso. Não tendo embora qualquer solução para este problema, o Comité gostaria de chamar a atenção para a relação entre consenso e complexidade. Acresce que as avaliações de impacto são efectuadas com base nas propostas da Comissão e não são forçosamente pertinentes para a legislação resultante, que pode apresentar diferenças consideráveis em relação à proposta inicial.

    9. O papel do Comité Económico e Social

    9.1. No seu anterior parecer(5), o Comité reconheceu que, na sua qualidade de única assembleia representante de todos os utentes da legislação, lhe cabia um importante papel no quadro da formulação e acompanhamento de uma nova política europeia de simplificação; a fim de desempenhar este papel de forma mais eficaz, solicitou à Comissão que:

    - o consultasse numa fase mais recuada, sempre que possível, para evitar que o valor acrescentado do seu parecer, em matéria de simplificação, fosse fortemente penalizado;

    - em especial, o consultasse anualmente, por ocasião da apresentação pela Comissão ao Comité do programa indicativo anual das consultas que lhe seriam dirigidas, sobre a preparação do relatório para o Conselho Europeu da Primavera relativo à evolução do processo de simplificação;

    - o associasse directamente às reflexões para melhorar e reforçar a análise de impacto.

    9.1.1. O Comité vem aqui reiterar estes pedidos.

    9.1.1.1. Pela parte que lhe toca, o Comité compromete-se a aplicar de modo mais activo as disposições do seu próprio Código de Conduta.

    10. Conclusão

    10.1. O presente parecer contém poucas ideias novas. O processo de simplificação não precisa de ideias novas, mas sim de uma concretização eficaz das ideias que já foram expostas pelo próprio Comité, pela Comissão, pelo Conselho Europeu de Lisboa, pelo Relatório Molitor e por muitas outras instâncias interessadas. Embora reconheça que, muitas vezes, é simples complicar e é complicado tornar mais simples, o Comité assinala que é escusado falar de compromissos se não estivermos preparados para os cumprir e é inútil introduzir novos compromissos quando os anteriores ainda estão por honrar.

    Bruxelas, 29 de Novembro de 2001.

    O Presidente

    do Comité Económico e Social

    Göke Frerichs

    (1) JO C 14 de 16.1.2001, p. 1.

    (2) COM(2001) 130 final, de 7.3.2001.

    (3) JO C 14 de 16.1.2001, p. 1.

    (4) JO C 14 de 16.1.2001, p. 1.

    (5) JO C 14 de 16.1.2001, p. 1.

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