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Document 52023DC0072

    RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO E AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU Relatório sobre a aplicação pelos Estados-Membros da Diretiva 2003/88/CE relativa a determinados aspetos da organização do tempo de trabalho

    COM/2023/72 final

    Bruxelas, 15.3.2023

    COM(2023) 72 final

    RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO E AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU

    Relatório sobre a aplicação pelos Estados-Membros da Diretiva 2003/88/CE relativa a determinados aspetos da organização do tempo de trabalho

    {SWD(2023) 40 final}


    I.Introdução

    O presente relatório analisa a forma como os Estados-Membros aplicaram a Diretiva 2003/88/CE relativa a determinados aspetos da organização do tempo de trabalho (a seguir designada por «diretiva» ou «diretiva relativa ao tempo de trabalho»), conforme exigido pelo seu artigo 24.º. Além disso, atualiza o relatório anterior publicado em 2017 1 . O relatório é acompanhado de um documento de trabalho dos serviços da Comissão no qual se circunstanciam os resultados da análise 2 .

    O presente relatório não fornece uma lista exaustiva de todas as medidas nacionais de transposição nem obsta à posição que a Comissão possa vir a adotar em futuros processos judiciais.

    A Comissão atualizou igualmente a comunicação interpretativa 3 que resume a jurisprudência aplicável do Tribunal de Justiça da União Europeia (a seguir designado por «Tribunal de Justiça» ou «TJUE»). A referida comunicação tem por objetivo promover a clareza e segurança jurídicas para os Estados-Membros e outras partes interessadas na aplicação da diretiva relativa ao tempo de trabalho.

    II.Objetivo e prescrições da diretiva

    A fim de proteger a segurança e a saúde dos trabalhadores, a diretiva estabelece prescrições mínimas comuns, incluindo:

    -limites ao horário de trabalho (que não deve exceder uma média de 48 horas semanais, incluindo horas extraordinárias);

    -períodos mínimos de descanso diários e semanais (pelo menos 11 horas consecutivas de descanso diário e 35 horas ininterruptas de descanso semanal);

    -férias anuais remuneradas (pelo menos 4 semanas por ano);

    -proteção adicional para os trabalhadores noturnos.

    A diretiva prevê também flexibilidade na organização do tempo de trabalho. Os períodos mínimos de descanso podem ser diferidos, parcial ou totalmente, em certas atividades. Os trabalhadores podem, a título individual, aceitar trabalhar mais do que o limite das 48 horas (o chamado opt-out). As convenções coletivas podem prever maior flexibilidade, autorizando, por exemplo, que a média do tempo de trabalho semanal seja calculada ao longo de períodos não superiores a 12 meses.

    III.Análise da aplicação da diretiva pelos Estados-Membros

    As informações apresentadas a seguir e no documento de trabalho dos serviços da Comissão baseiam-se em relatórios nacionais (incluindo os pontos de vista dos parceiros sociais nacionais e europeus), em relatórios anteriores da Comissão e em informações recolhidas a partir de processos por infração e de peritos independentes. Foram recolhidas em 2021 e 2022.

    A.Exclusões do âmbito de aplicação da diretiva

    Das informações disponíveis pode concluir-se que a diretiva foi, na sua maioria, transposta, tanto no setor público como no setor privado.

    Em alguns Estados-Membros, determinadas categorias de trabalhadores estão excluídas do âmbito de aplicação da legislação geral de transposição da diretiva, mas estão geralmente sujeitas a regras específicas em matéria de condições de trabalho. No setor público, este é geralmente o caso das forças armadas, da polícia e de outras forças de segurança, bem como dos serviços de proteção civil, como os bombeiros e os guardas prisionais 4 .

    No que respeita ao setor privado, vários Estados-Membros excluem os trabalhadores domésticos 5 .

    Em geral, estas exclusões não são compatíveis com as exigências da diretiva relativa ao tempo de trabalho, a menos que a transposição das suas disposições seja assegurada por via de convenções coletivas.

    O Tribunal confirmou, em 2021, que, embora a diretiva se aplique às forças armadas 6 , certas atividades podem ser excluídas do seu âmbito, quando a sua aplicação prejudicaria a correta execução de operações militares, nomeadamente tendo em conta as responsabilidades internacionais específicas de alguns Estados-Membros, os conflitos ou ameaças com que são confrontados ou o seu contexto geopolítico. Cerca de metade dos Estados-Membros aplica explicitamente a diretiva às suas forças armadas 7 . Vários Estados-Membros, ainda que não o façam explicitamente, aplicam as suas disposições às forças armadas em certa medida 8 . Alguns Estados-Membros não aplicam a diretiva ao pessoal militar 9 , sem prejuízo da existência de regras nacionais relativas às condições de trabalho e à proteção da saúde e da segurança do pessoal das forças armadas.

    B.Trabalhadores com mais de um contrato de trabalho

    A diretiva não declara expressamente se as suas disposições estabelecem limites absolutos em caso de contratos simultâneos com uma ou mais entidades patronais, ou se se aplicam a cada relação de trabalho separadamente. O Tribunal de Justiça esclareceu recentemente que, quando os trabalhadores têm vários contratos de trabalho com a mesma entidade patronal, o período mínimo de descanso diário é aplicável a esses contratos no seu conjunto e não separadamente 10 . Tal como refere em anteriores relatórios de aplicação, a Comissão considera que, à luz do objetivo da diretiva de promover a melhoria da saúde e da segurança dos trabalhadores, os limites ao tempo de trabalho semanal médio e de descanso diário e semanal devem aplicar-se, tanto quanto possível, por trabalhador.

    As práticas nacionais variam consideravelmente relativamente a este ponto.

    A Bulgária, a Alemanha, a Estónia, a Irlanda, a Grécia, a França, a Croácia, a Itália, Chipre, o Luxemburgo, os Países Baixos, a Áustria e a Eslovénia aplicam a diretiva por trabalhador (na sua maioria ao abrigo de disposições legais expressas para esse efeito).

    Em contrapartida, a Chéquia, a Espanha, a Letónia, a Hungria, a Polónia, Portugal e a Eslováquia aplicam a diretiva por contrato.

    Na Bélgica, na Dinamarca, na Lituânia, em Malta, na Roménia, na Finlândia e na Suécia, a diretiva aplica-se por trabalhador quando houver mais de um contrato com a mesma entidade patronal, mas por contrato quando o trabalhador tiver mais de um contrato com diferentes entidades patronais.

    C.Definição e registo do «tempo de trabalho»

    Em geral, a definição formal de «tempo de trabalho» enunciada no artigo 2.º da diretiva (ou seja, «qualquer período durante o qual o trabalhador está a trabalhar ou se encontra à disposição da entidade patronal e no exercício da sua atividade ou das suas funções») não parece dar origem a problemas de aplicação.

    Os períodos de «permanência» e de «prevenção» são períodos durante os quais os trabalhadores devem permanecer disponíveis para retomar o seu trabalho em caso de necessidade. O «tempo de permanência» é aquele em que o trabalhador é obrigado a permanecer no local de trabalho ou noutro local determinado pela entidade patronal, pronto a desempenhar as suas funções, se tal lhe for solicitado. Durante a «prevenção», o trabalhador deve estar sempre disponível, mas não é obrigado a permanecer num local determinado pela entidade patronal.

    O Tribunal de Justiça declarou que o tempo de «permanência» deve ser contabilizado integralmente como «tempo de trabalho» na aceção da diretiva. Durante a «prevenção», o tempo associado à prestação efetiva de serviços é sempre tempo de trabalho. O restante tempo de prevenção pode ser considerado descanso, exceto quando as restrições impostas pela entidade patronal têm um impacto muito significativo na possibilidade de o trabalhador gerir livremente o seu tempo e de prosseguir os seus interesses pessoais e sociais. Nestes casos, todo o tempo de prevenção conta como tempo de trabalho 11 .

    A maioria dos Estados-Membros 12 dispõe de disposições jurídicas que regulam o trabalho de «permanência» e vários Estados-Membros abordam explicitamente os períodos de «prevenção» na sua legislação 13 . A primeira é, de um modo geral, coerente com a interpretação do Tribunal de Justiça, sendo que a segunda não tem em conta a jurisprudência recente que limita as situações em que o período de prevenção é considerado descanso. No entanto, alguns órgãos jurisdicionais nacionais começaram a aplicar a referida jurisprudência 14 .

    O respeito pelos Estados-Membros da obrigação de considerar o tempo de permanência como tempo de trabalho está a melhorar, mas persistem ainda alguns problemas.

    Na Dinamarca, os parceiros sociais podem acordar que os períodos de descanso possam ser gozados durante o tempo de permanência no local de trabalho e alguns parceiros sociais do setor da saúde fazem uso desta possibilidade. Na Polónia e na Eslovénia, apenas o serviço de permanência ativo no local de trabalho conta como tempo de trabalho e na Eslováquia o serviço de permanência no local de trabalho não conta integralmente como tempo de trabalho para determinados grupos.

    O Tribunal de Justiça declarou em 2019 que os Estados-Membros devem impor às entidades patronais a obrigação de «estabelecer um sistema objetivo, fiável e acessível que permita medir a duração do tempo de trabalho diário prestado por cada trabalhador» 15 . Na maioria dos Estados-Membros, as entidades patronais são obrigadas a monitorizar e registar o tempo de trabalho, mas em cinco deles essa obrigação não existe ou não está claramente definida: Bélgica, Dinamarca, Chipre, Malta e Suécia.

    D.Pausas e períodos de descanso

    No caso de o período de trabalho diário ser superior a seis horas, o artigo 4.º prevê pausas, sem especificar a sua duração ou definir as suas modalidades. Estas modalidades devem ser «fixadas por convenções coletivas ou acordos celebrados entre parceiros sociais ou, na sua falta, pela legislação nacional».

    De um modo geral, esta disposição parece ter sido transposta de forma satisfatória. A maior parte dos Estados-Membros estabeleceu regras mínimas relativas à duração e ao momento de usufruir das pausas ao longo do dia de trabalho. No entanto, em alguns Estados-Membros, a lei não estabelece uma duração mínima ou o momento de usufruir dessas pausas 16 e não é claro se todas as convenções coletivas regulamentam esta situação em todos os casos.

    No que respeita aos períodos de descanso (artigos 3.º e 5.º da diretiva), o requisito fundamental da diretiva é o de que o trabalhador tenha um período mínimo de descanso diário de 11 horas consecutivas por cada período de 24 horas e de um período mínimo de descanso ininterrupto de 24 horas por cada período de sete dias, às quais se adicionam as 11 horas de descanso diário. A diretiva prevê a possibilidade de, em condições objetivas, o período de descanso semanal ser reduzido para 24 horas.

    Os Estados-Membros Estes parecem ter transposto estes requisitos fundamentais para a legislação nacional de forma satisfatória na maior parte dos setores. Alguns Estados-Membros parecem ter transposto incorretamente alguns aspetos da obrigação de descanso semanal, por exemplo, porque não a transpuseram num determinado setor 17 ou porque estabeleceram um período de descanso de 24 horas sem a presença de razões objetivas 18 .

    E.Limites ao tempo de trabalho

    Nos termos do artigo 6.º da diretiva, a duração média do tempo de trabalho semanal (incluindo horas extraordinárias) não deve exceder 48 horas. De um modo geral, este limite tem sido transposto de forma satisfatória e muitos Estados-Membros preveem regras de proteção mais rigorosas.

    Num reduzido número de casos o limite estabelecido na diretiva é excedido, nomeadamente:

    -Na Irlanda, na prática, o limite ainda não é aplicado de forma satisfatória aos assistentes sociais, mas estão em curso ações para corrigir a situação.

    -O Código do Trabalho búlgaro ainda prevê um tempo de trabalho semanal máximo de 56 horas caso esteja estabelecido um sistema de cálculo da média do tempo de trabalho semanal e não limita a utilização de horas extraordinárias obrigatórias no caso das forças de defesa nacional, dos serviços de emergência, de reparação urgente de serviços de utilidade pública ou transportes, bem como da prestação de assistência médica 19 .

    O limite de quatro meses para o cálculo da duração máxima do tempo de trabalho parece ser também excedido na Bulgária 20 , na Alemanha 21 , e na Eslovénia 22 , onde é fixado em seis meses, e em Espanha, onde é fixado em 12 meses 23 . Este facto não se limita às atividades mencionadas no artigo 17.º, n.º 3, da diretiva. Na Bélgica, o regime do tempo de trabalho «Plus Minus Account» permite um período de referência superior a um ano 24 .

    F.Férias anuais

    O direito fundamental a férias anuais remuneradas (artigo 7.º da diretiva) foi, de um modo geral, transposto de forma satisfatória.

    Todos os Estados-Membros preveem explicitamente o direito a, pelo menos, quatro semanas de férias anuais remuneradas, e de os trabalhadores receberem a sua «remuneração média», o «valor semanal normal», o «salário mensal médio» ou equivalente quando estão de férias. Todos os Estados-Membros preveem o direito a uma compensação financeira quando a relação de trabalho cessa sem que sejam gozadas férias anuais.

    Contudo, foram identificados dois problemas. Em primeiro lugar, alguns Estados-Membros impõem condições à aquisição do direito de férias anuais remuneradas no primeiro ano de emprego que excedem o disposto na diretiva tal como interpretado pelo Tribunal de Justiça. Por exemplo, estabelecem períodos demasiado longos para a aquisição desse direito (seis — oito meses) antes de poderem ser gozadas as férias 25 .

    Dois Estados-Membros dispõem de sistemas em que o direito a férias anuais remuneradas é adquirido com base nos ganhos do trabalhador num determinado ano que precede o ano em que as férias anuais remuneradas podem ser gozadas («ano de férias») 26 . O trabalhador tem direito a gozar uma licença no primeiro ano de férias, mas sem qualquer remuneração.

    O segundo problema decorre da extinção do direito a férias anuais remuneradas que o trabalhador não tenha tido condições para gozar. O TJUE considerou que um trabalhador incapacitado para o trabalho por motivo de doença continua a acumular direitos a férias anuais remuneradas durante a baixa por doença. Os Estados-Membros podem fixar um limite à possibilidade de reportar férias anuais que não podem ser gozadas por incapacidade justificada. No entanto, o Tribunal de Justiça também decidiu que «qualquer período de reporte deve ultrapassar substancialmente a duração do período de referência em relação ao qual tenha sido concedido» 27 . Muitos Estados-Membros adotaram disposições que autorizam o trabalhador a reportar ou adiar períodos de férias anuais adquiridos quando o usufruto dessas férias coincida com um período de baixa por doença. Mas em vários países, o período que decorre antes de o trabalhador perder o direito a férias remuneradas parece ser demasiado curto, não sendo mais longo do que o período de referência de um ano 28 .

    G.Trabalho noturno

    A diretiva prevê normas de proteção mais rigorosas para os trabalhadores noturnos: o seu tempo de trabalho não deve ultrapassar oito horas diárias, em média, e o limite de oito horas é absoluto (não pode ser calculado em média) quando o trabalho noturno é particularmente arriscado ou gerador de stress.

    De um modo geral, os Estados-Membros limitam o tempo de trabalho médio dos trabalhadores noturnos a oito horas. No entanto, alguns Estados-Membros fixaram um período de referência de quatro meses para calcular essa média 29 . Trata-se da mesma duração que o período de referência normal para o cálculo do tempo de trabalho máximo geral e, na opinião da Comissão, é demasiado longo para cumprir o objetivo de proteção das disposições relativas ao trabalho noturno.

    A disposição da diretiva respeitante ao trabalho noturno que implique riscos especiais ou uma tensão significativa não foi transposta por dois Estados-Membros 30 . Um Estado-Membro autoriza exceções que não estão previstas na diretiva 31 .

    H.Derrogações (artigos 17.º, 18.º e 22.º da diretiva)

    1.Trabalhadores autónomos

    Nos termos do artigo 17.º, n.º 1, os Estados-Membros estão autorizados a derrogar as disposições relativas ao descanso diário e semanal, às pausas, ao tempo máximo de trabalho semanal, à duração do trabalho noturno e aos períodos de referência «sempre que, em virtude das características especiais da atividade exercida, a duração do tempo de trabalho não seja medida e/ou predeterminada ou possa ser determinada pelos próprios trabalhadores».

    Em certos casos, os Estados-Membros não incluem todos estes critérios nas respetivas definições nacionais. Por exemplo, alguns Estados-Membros isentam trabalhadores que aufiram três vezes o salário mínimo 32 ou que ocupem uma posição de grande importância ou confiança e recebam um salário sete vezes superior ao salário mínimo obrigatório 33 .

    2.Derrogações que obriguem a que sejam concedidos ao trabalhador períodos equivalentes de descanso compensatório

    A diretiva prevê derrogações das disposições em matéria de pausas, descanso diário e semanal, trabalho noturno e períodos de referência para o cálculo da duração média do tempo de trabalho:

    -numa série de atividades ou situações, por exemplo, as que impliquem continuidade, certas atividades sazonais ou em situações em que o local de trabalho e de residência sejam afastados (por convenção coletiva, acordo entre os parceiros sociais ou disposições legislativas ou regulamentares nacionais); e

    -em qualquer tipo de atividade ou situação definida por convenção coletiva ou acordo celebrado entre parceiros sociais a nível nacional ou regional (ou, se estes assim o decidirem, pelos parceiros sociais a um nível inferior ou pelos parceiros sociais ao nível coletivo adequado).

    No entanto, em geral, as regras não permitem que os períodos mínimos de descanso sejam completamente perdidos, exceto em casos excecionais em que seja objetivamente impossível conceder períodos equivalentes de descanso compensatório e em que o trabalhador tenha beneficiado de uma proteção adequada. Acresce que, segundo o acórdão Jaeger 34 , os períodos de descanso compensatório devem ser concedidos no período imediatamente seguinte ao do descanso perdido.

    Em geral, os Estados-Membros transpuseram e utilizam estas derrogações.

    No que diz respeito aos setores e atividades em causa, os Estados-Membros remetem-se, de um modo geral, às atividades enumeradas na própria diretiva.

    No entanto, algumas legislações nacionais parecem exceder as derrogações permitidas ao abrigo da diretiva, nomeadamente:

    -não impondo qualquer exigência de conceder um descanso compensatório equivalente ao trabalhador em causa, por exemplo, ao permitir que o descanso perdido seja compensado financeiramente 35 , ao não impor essa obrigação em determinados setores ou no trabalho por turnos 36 , ao recorrer a outros tipos de medidas de proteção ou ao não conceder um descanso compensatório equivalente à redução do período de descanso 37 ;

    -estabelecendo um prazo demasiado longo para a concessão do período de descanso compensatório, que varia entre 14 dias e seis meses para o descanso diário perdido em determinadas atividades ou setores 38  e entre seis semanas e seis meses para o repouso semanal perdido 39 .

    3.Opt-out

    Os Estados-Membros têm a possibilidade de não aplicar o limite máximo ao tempo de trabalho semanal desde que os princípios gerais de proteção da saúde e da segurança dos trabalhadores sejam respeitados e sejam tomadas as necessárias medidas de proteção (artigo 22.º). Um trabalhador não pode ser obrigado a trabalhar, em média, mais de 48 horas por semana, salvo se tiver explicitamente dado o seu consentimento prévio, livre e informado. A entidade patronal não pode prejudicar o trabalhador se tal consentimento não for dado. A entidade patronal deve dispor de registos atualizados de todos os trabalhadores que efetuem esse trabalho e deve colocá-los à disposição das autoridades competentes, que podem proibir ou restringir a possibilidade de ultrapassar o período máximo semanal de trabalho.

    São 15 os Estados-Membros que preveem atualmente a utilização do opt-out. Destes, quatro (Bulgária, Estónia, Chipre e Malta) autorizam a utilização do opt-out independentemente do setor, ao passo que os outros 11 (Bélgica, Alemanha, Espanha, França, Croácia, Hungria, Países Baixos, Áustria, Polónia, Eslovénia e Eslováquia) limitam a sua utilização a empregos com recurso extenso ao tempo de permanência, como os serviços de saúde ou de emergência.

    A Chéquia revogou o opt-out para os serviços de saúde em 30 de julho de 2020 e a Letónia deixou de o aplicar aos médicos a partir de 1 de janeiro de 2022. Por conseguinte, 12 Estados-Membros (Chéquia, Dinamarca, Irlanda, Grécia, Itália, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, Portugal, Roménia, Finlândia e Suécia) não utilizam atualmente o opt-out.

    As obrigações respeitantes ao consentimento explícito do trabalhador, à manutenção de registos e ao fornecimento às autoridades de informações sobre os trabalhadores que trabalhem, em média, mais de 48 horas semanais são, de um modo geral, respeitadas.

    Não existem limites explícitos ao número de horas de trabalho que podem ser autorizadas em conformidade com o artigo 22.º, mas tem de ser respeitada a proteção da segurança e da saúde dos trabalhadores. Uma vez que a diretiva não prevê derrogações ao descanso diário e semanal sem períodos de descanso compensatório, tal limita o número de horas de trabalho autorizadas.

    Afigura-se que metade dos Estados-Membros que aplicam o opt-out determina algum tipo de limitação explícita às horas de trabalho autorizadas 40 .

    I.Apreciações pelos Estados-Membros e os parceiros sociais

    1.Sindicatos

    As organizações de trabalhadores 41 consideram que a aplicação prática da diretiva não protege nem melhora a saúde e a segurança dos trabalhadores de forma satisfatória. Referem-se, em especial, ao opt-out e à derrogação para os trabalhadores autónomos.

    Os membros da CES identificam problemas de transposição relacionados com o facto de o tempo de permanência e de prevenção não ser devidamente contabilizado como tempo de trabalho; de o tempo de trabalho, incluindo durante o teletrabalho, não ser registado; de o descanso compensatório não ser gozado imediatamente após um turno; de os períodos de referência serem alargados a doze meses por via legislativa; e de os direitos a férias anuais serem perdidos em caso de baixa por doença.

    2.Entidades patronais

    As organizações patronais 42 destacam os problemas e a insegurança jurídica resultantes dos acórdãos do Tribunal de Justiça sobre o tempo de permanência e o tempo de prevenção, sobre o registo do tempo de trabalho e sobre as férias anuais. A legislação nacional e as convenções coletivas encontraram-se subitamente em violação da diretiva e a contagem do tempo de prevenção como tempo de trabalho criou desafios para a organização de serviços públicos que exigem a continuidade do serviço (saúde, serviços de emergência).

    As organizações patronais criticam as legislações nacionais mais rigorosas do que os requisitos mínimos da diretiva e consideram que o papel dos parceiros sociais na aplicação é demasiado limitado, restringindo a flexibilidade do tempo de trabalho num mundo global e digital.

    3.Estados-Membros

    A maioria dos Estados-Membros refere que a diretiva continua a cumprir os seus objetivos, proporcionando um quadro adequado e sólido para a tomada de medidas em matéria de saúde e segurança no trabalho. O aumento do teletrabalho, as novas formas de trabalho (por exemplo, o trabalho em plataformas digitais) e a recente jurisprudência do Tribunal de Justiça colocam novos desafios à interpretação das disposições da diretiva. Vários Estados-Membros solicitam esclarecimentos sobre o estatuto do tempo de trabalho durante o serviço de permanência e de prevenção, sobre o registo do tempo de trabalho e sobre o descanso compensatório. Alguns propõem a reavaliação e revisão das principais disposições da diretiva.

    J.Medidas relacionadas com a COVID-19 no domínio do tempo de trabalho

    A pandemia de COVID-19 teve um profundo impacto no mundo do trabalho. Em 2020 e 2021, os Estados-Membros adaptaram as regras aplicáveis às condições de trabalho, nomeadamente em matéria de organização do tempo de trabalho. A maior parte destas medidas teve um caráter temporário e já não está em vigor.

    Vários Estados-Membros criaram novas possibilidades de prolongamento do tempo de trabalho, por exemplo aumentando o tempo máximo de trabalho diário e semanal 43 e a possibilidade de realizar horas extraordinárias 44 , bem como reduzindo a duração mínima do descanso diário 45 ou semanal 46 . Estas regras aplicaram-se, de um modo geral, apenas a um número limitado de setores essenciais, nomeadamente o da saúde. As restrições temporárias implicaram o teletrabalho obrigatório no domicílio para vários trabalhadores, ao passo que vários Estados-Membros autorizaram as entidades patronais a exigir o gozo de férias anuais 47 .

    Os regimes do tempo de trabalho reduzido 48 ou do desemprego parcial 49 permitiram a redução do tempo de trabalho ou a suspensão total do dever de trabalho, com compensação pela perda de rendimentos.

    K.Conclusões

    Em termos gerais, a grande maioria dos trabalhadores na UE está sujeita a regras em matéria de tempo de trabalho que respeitam a legislação da UE e que são, em muitos casos, mais protetoras do que as normas mínimas estabelecidas na diretiva.

    De um modo geral, a legislação dos Estados-Membros está em conformidade com os requisitos da diretiva, mas foram identificados diversos problemas. A transposição incorreta das derrogações ao descanso diário e semanal, incluindo o descanso compensatório, é o problema mais comum. Alguns Estados-Membros ainda não definem o tempo de permanência ou não o aplicam de forma adequada em alguns setores (por exemplo, saúde, segurança, serviços de polícia e serviços de emergência). Ainda não foram amplamente abordados os desafios de dar resposta à jurisprudência recente do Tribunal de Justiça, nomeadamente no que diz respeito à qualificação do tempo de prevenção e ao registo do tempo de trabalho. Continuam a existir incoerências em matéria de duração máxima do trabalho para grupos específicos de trabalhadores (principalmente pessoal de saúde e forças armadas), mas o cumprimento entre os Estados-Membros está a melhorar.

    Os requisitos fundamentais da diretiva em matéria de pausas, descanso diário e descanso semanal foram, de um modo geral, transpostos de forma satisfatória. Os principais desafios prendem-se principalmente com a utilização de derrogações a estes requisitos.

    Todos os Estados-Membros preveem explicitamente o direito a pelo menos quatro semanas de férias anuais remuneradas. Os problemas mais comuns encontram-se no gozo das férias anuais durante o primeiro ano de trabalho e no direito de o trabalhador adquirir férias anuais durante a baixa por doença e a possibilidade de reportar os direitos a férias adquiridos por um período suficientemente longo.

    O número de Estados-Membros que autorizam a utilização do opt-out diminuiu ligeiramente.

    Em conjugação com e sem prejuízo do seu papel mais vasto de guardiã dos Tratados, a Comissão continuará a apoiar os esforços envidados pelos Estados-Membros para melhorar a aplicação da diretiva e está disposta a facilitar os intercâmbios entre os Estados-Membros e entre os parceiros sociais, sempre que estes possam ser úteis.

    (1) COM(2017) 254 final.
    (2) SWD(2023) 40 final.
    (3) C(2023) 969.
    (4) Irlanda (polícia, forças armadas, serviços de proteção civil, bombeiros, pessoal prisional e pessoal de emergência marítima), Chipre (forças armadas), Itália (polícia, forças armadas, sistema judicial, prisional, segurança pública e serviços de proteção civil).
    (5)  Bélgica, Grécia, Luxemburgo, Suécia.
    (6) Acórdão no processo C-742/19, Ministrstvo za obrambo.
    (7)

    Bélgica, Bulgária, Dinamarca, Alemanha, Grécia, Lituânia, Hungria, Países Baixos, Roménia, Eslovénia, Eslováquia, Finlândia, Suécia.

    (8) Chéquia, Estónia, Espanha, Itália, Luxemburgo, Áustria, Polónia.
    (9) Irlanda, França, Chipre, Letónia, Portugal.
    (10) Acórdão no processo C-585/19, Academia de Studii Economice din Bucureşti.
    (11) Acórdão de 9 de março de 2021 nos processos C-580/19, Stadt Offenbach am Main (Période d’astreinte d’un pompier), n.º 39, e C-344/19, Radiotelevizija Slovenija (Période d’astreinte dans un lieu reculé), n.º 38, bem como a jurisprudência citada.
    (12) Bulgária, Chéquia, Dinamarca, Alemanha, Estónia, Espanha, França, Lituânia, Letónia, Hungria, Países Baixos, Áustria, Polónia, Eslovénia, Eslováquia, Suécia.
    (13) Bulgária, Espanha, França, Itália, Lituânia, Hungria, Países Baixos, Áustria, Polónia, Finlândia, Suécia.
    (14) Na Bélgica, Chéquia, Dinamarca e Espanha.
    (15) Acórdão no processo C-55/18, CCOO, n.º 60.
    (16)

    Dinamarca, Luxemburgo, Roménia, Suécia.

    (17) Espanha (funcionários públicos), Polónia (pessoal da Agência Central de Informações).
    (18) Países Baixos (polícia voluntária e mineiros), Eslovénia (setor da saúde).
    (19) Código do Trabalho, artigos 142.º e 146.º, n.º 3.
    (20) Código do Trabalho, artigo 142.º, Lei da função pública, artigo 49.º.
    (21)

     Lei relativa ao tempo de trabalho, artigo 3.º, artigo 7.º, n.º 8, e artigo 14.º.

    (22) ZDR-1, artigo 144.º, n.º 3.
    (23) Código do Trabalho, artigo 34.º, n.º 2.
    (24) Lei de 27 de dezembro de 2006, artigos 204.º a 213.º.
    (25) Bulgária, Estónia, Lituânia, Polónia, Portugal.
    (26) Finlândia, Suécia.
    (27) Acórdão no processo C-214/10, KHS, n.os 38-40.
    (28) Chéquia, Estónia, Grécia, Hungria, Portugal, Eslovénia, Finlândia.
    (29) Dinamarca, Croácia, Malta, Hungria, Países Baixos, Polónia, Eslovénia, Eslováquia, Finlândia, Suécia.
    (30) Alemanha, Países Baixos.
    (31) Chéquia.
    (32) Países Baixos.
    (33) Hungria.
    (34) C-151/02, Jaeger.
    (35) França, Finlândia.
    (36) França, Hungria, Países Baixos, Roménia.
    (37) Alemanha.
    (38) Bélgica, Chéquia, Alemanha, Espanha, Lituânia, Áustria, Eslovénia, Eslováquia.
    (39) Chéquia, Lituânia, Eslováquia, Finlândia.
    (40) Bélgica, Espanha, Croácia, Hungria, Países Baixos, Áustria, Eslováquia.
    (41) Membros da CES e CESI.
    (42) BusinessEurope, CoESS, CEEMET, CMRE, PEARLE, SGI Europe e SMEunited.
    (43) Alemanha, Luxemburgo.
    (44) Bélgica, França, Letónia, Eslovénia, Finlândia.
    (45) Alemanha, Polónia.
    (46) Áustria, Polónia.
    (47) Bulgária, França, Letónia, Áustria.
    (48) Alemanha, Lituânia, Hungria, Áustria, Polónia, Roménia e Eslovénia.
    (49) Luxemburgo.
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