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Document 52013AE4413

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Para um setor da defesa e da segurança mais competitivo e eficiente [COM(2013) 542 final]

JO C 67 de 6.3.2014, p. 125–131 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

6.3.2014   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 67/125


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões — Para um setor da defesa e da segurança mais competitivo e eficiente

[COM(2013) 542 final]

2014/C 67/25

Relator: Joost VAN IERSEL

Correlatora: Monika HRUŠECKÁ

Em 3 de julho de 2013, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Para um setor da defesa e da segurança mais competitivo e eficiente

COM(2013) 542 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Comissão Consultiva das Mutações Industriais, que emitiu parecer em 26 de setembro de 2013.

Na 493.a reunião plenária de 16 e 17 de outubro de 2013 (sessão de 17 de outubro), o Comité Económico e Social Europeu adotou, por 172 votos a favor, 23 votos contra e 24 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE acolhe com grande satisfação o próximo Conselho Europeu dedicado à defesa, de dezembro deste ano, que se baseará na comunicação da Comissão Europeia (1) e no relatório da Alta Representante/chefe da Agência Europeia de Defesa (AED) (2). Estas iniciativas constituem uma resposta muito urgente e oportuna aos desafios internos e externos, tendo em vista potenciar a previsibilidade a longo prazo e a credibilidade da defesa europeia.

1.2

Ao ultrapassar os tabus tradicionais, a comunicação e o parecer (provisório) da Alta Representante permitem abordar a situação atual e as ações a empreender da perspetiva correta.

1.3

O relatório da Alta Representante, em particular, defende de forma convincente a necessidade imperiosa de uma estratégia global em matéria de Política Comum de Segurança e Defesa (PCSD) para dar resposta às exigências da defesa e da segurança europeias. O CESE concorda que a PCSD constituirá o quadro mais adequado para uma cooperação eficaz no âmbito das capacidades militares, mas sublinha que a credibilidade da PCSD passará também pela colaboração.

1.4

Para assegurar o êxito desta iniciativa, há que criar condições políticas favoráveis. Tendo em conta que o caminho a percorrer para introduzir ajustes substanciais nas estruturas (industriais) de defesa europeias será longo e tortuoso e envolverá políticas interrelacionadas, o CESE considera que a condição principal para realizar os progressos deveras necessários será o empenho constante dos líderes de governo da UE.

1.5

O CESE insiste em que o Conselho adote medidas e ações concretas para reforçar a competitividade e a cooperação no setor europeu da defesa que lancem uma mensagem clara para o futuro.

1.6

O CESE apoia o objetivo de garantir uma defesa europeia independente que corresponda ao peso económico e outros interesses a nível mundial da Europa. O objetivo a longo prazo deve ser proteger de forma autónoma os cidadãos europeus, assegurando o fornecimento continuado de equipamento moderno ao setor militar e garantindo os valores da Europa (direitos humanos e democracia) (3).

1.7

A nova fase de transição também está a ter um impacto na defesa e segurança na Europa. Mudanças geopolíticas estão a ganhar forma num período de estagnação grave da economia e de desemprego persistente em muitas partes da Europa, ao mesmo tempo que surgem novos atores na cena mundial. A evolução da situação mundial está a ultrapassar a europeia, acentuando o fosso. A Europa tem de se adaptar com maior rapidez para conseguir acompanhar os outros países.

1.8

Além disso, a necessidade de a indústria ser competitiva, a par da redução dos recursos financeiros, requer eficácia em relação aos custos. A abordagem europeia deve eliminar as sobreposições contraproducentes, as políticas descoordenadas e demais lacunas, fomentando uma boa relação qualidade-preço, o que se traduzirá em menos desperdício de dinheiro e maior produtividade, em benefício do contribuinte.

1.9

O CESE congratula-se com a análise clara e acertada desenvolvida na comunicação da Comissão sobre a posição relativa da Europa. Uma análise comparativa levou o CESE, no ano passado, a defender uma mudança radical de mentalidade na Europa em todas as questões relativas à defesa comum (4).

1.10

O CESE concorda, em particular, com o capítulo 9 da comunicação da Comissão sobre os elementos essenciais da agenda do Conselho: uma abordagem estratégica europeia, uma Política Comum de Segurança e Defesa (5) e uma estratégia industrial europeia no domínio da defesa.

1.11

A Europa necessita seriamente de uma «linguagem comum em matéria de defesa. Isto requer uma mudança de mentalidade em que os interesses nacionais sejam concretizados através da realização dos objetivos estratégicos da UE.

1.12

É igualmente necessário empenho a nível a nível político e cívico para garantir que a opinião pública é informada de forma adequada sobre a importância dos interesses globais e industriais estratégicos europeus, a fim de promover o apoio ativo dos cidadãos e dos contribuintes.O CESE concorda com a Comissão que uma indústria da defesa saudável e baseada na Europa contribuirá também de forma essencial para a indústria transformadora europeia em geral (6).

1.13

Para alcançar este objetivo de grande importância, há que envolver o maior número possível de Estados-Membros. Se nem todos os Estados-Membros estiverem dispostos a participar, o processo deve avançar com os que estiverem dispostos a fazê-lo.

1.14

O CESE sublinha o papel da Comissão e da AED que deverão colaborar estreitamente na execução da comunicação. Apoia em grande medida as ações propostas pela Comissão. No capítulo 6 do presente parecer, apresenta observações e recomendações adicionais às propostas.

1.15

A comunicação da Comissão não discute uma política industrial proativa. O CESE, ao invés, remete para a posição excecional do setor da defesa nos mercados totalmente institucionais de todo o mundo. É necessária que a Comissão e os Estados-Membros desenvolvam uma política industrial proactiva em determinados domínios para obter uma produção moderna e rentável. As competências partilhadas entre a UE e os Estados-Membros, bem como uma interação eficaz e sinergias entre os projetos e as tecnologias militares e civis revelar-se-ão em última instância extremamente benéficas e rentáveis.

1.16

Importa identificar novos projetos num quadro europeu multilateral, a partir da fase de conceção e aproveitando a AED. Pode levar décadas até esses projetos estarem plenamente operacionais, por isso quanto mais cedo começarem melhor.

1.17

A I&D no setor público e privado é essencial. Nesta área, o investimento na defesa encontra-se no nível mais baixo desde 2006 (7). Em termos gerais, há que encontrar formas de melhorar as condições de investimento e a sua aplicação em projetos concretos.

1.18

A maior responsabilidade recai sobre os principais países produtores enquanto impulsionadores do processo, devendo garantir-se uma relação harmoniosa entre eles e os demais Estados-Membros. As PME e os centros de investigação em todos os países devem estar amplamente interligados, a fim de envolver o maior número possível de Estados-Membros numa estratégia europeia.

1.19

Dada a agitação que reina entre os trabalhadores do setor, consequência de reorganizações desestruturadas, são mais do que nunca necessárias políticas previsíveis, sendo também necessária coordenação para antecipar as mudanças, a fim de garantir perspetivas e contratos de trabalho dignos. Cabe também estabelecer diálogos sociais.

1.20

O presente parecer centra-se, em primeiro lugar, nos princípios de política, com vista a realizar progressos urgentes numa área estratégica que não permite mais atrasos. Os primeiros passos em dezembro deverão abrir caminho para o processo avançar eficazmente. Tanto o Conselho Europeu, como os governos, a Comissão, a AED, os parlamentos e a indústria (incluindo os representantes dos trabalhadores) devem participar na elaboração das orientações estratégicas e dos projetos concretos.

2.   A Europa face aos desafios

2.1

A Comissão assinala, e bem, que «O equilíbrio de poder a nível mundial está a mudar à medida que novos centros de gravidade emergem e os EUA reequilibram as suas prioridades estratégicas na direção da Ásia». Os países BRIC estão a intensificar a sua despesa militar, em particular, a China e a Rússia que estão a aumentar consideravelmente os seus orçamentos até 2015.

2.2

A pressão norte-americana sobre a Europa para que esta assuma plenamente a sua parte na despesa militar global do mundo ocidental está a aumentar de forma constante. Devido a restrições orçamentais, os EUA estão a racionalizar o seu setor da defesa, o que está a ter impacto nos acordos com os europeus.

2.3

O fosso entre os EUA e a Europa é muito acentuado. Em 2010, o orçamento total da defesa na Europa (excetuando a Dinamarca) foi 196 mil milhões de euros, em comparação com 520 mil milhões de euros do orçamento norte-americano (8). Mais importante ainda, o orçamento global de I&D europeu representa um sétimo do norte-americano, o que afecta o equipamento e a mobilização do pessoal armado.

2.4

Entretanto, as ameaças multiplicam-se. As tensões políticas e militares não diminuem e surgem novas tensões, algumas às portas da Europa. A fim de se equipararem aos poderes tradicionais, novos protagonistas ambiciosos a nível mundial querem garantir que as respetivas defesas nacionais correspondem aos seus interesses económicos e outros.

3.   Abordagens europeias

A.   Aspetos políticos

3.1

Os europeus enfrentam duas categorias de problemas relacionadas entre si:

uma queda substancial da despesa no setor da defesa, criando disparidades e prejudicando as capacidades militares e na eficiência a nível nacional, especialmente devido à redução constante da despesa em I&D;

mudanças geopolíticas, que deveriam levar a uma cooperação europeia muito mais estreita e a uma maior independência dos setores da defesa e da segurança.

No entanto, o debate europeu sobre estes dois temas interrelacionados é ainda incipiente.

3.2

Todos os documentos dos governos (9) refletem uma diminuição considerável da despesa no setor da defesa (10). Centram-se principalmente na introdução de ajustes no quadro nacional, isto é, como atingir a melhor relação custo-eficácia possível mantendo níveis suficientes de capacidades. Os Estados-Membros mantêm-se afastados de uma abordagem que integre de forma natural as capacidades de defesa nacionais numa perspetiva europeia.

3.3

No ano passado, o CESE concluiu que a «política de defesa é determinada pelos interesses estratégicos dos países, (…) que, na Europa, são definidos essencialmente em termos nacionais. Abordagens obsoletas contribuem claramente para aumentar a fragmentação, as disparidades, o excesso de capacidade e a falta de interoperabilidade das capacidades de defesa europeias» (11).

3.4

Sessenta anos de integração europeia e de mercado interno conduziram a estruturas económicas e empresariais resistentes que geram um sólido modelo de atividade económica de base europeia. Todavia, do ponto de vista militar e de defesa, para não mencionar os aspetos organizacionais, a Europa encontra-se ainda numa fase inicial.

3.5

A defesa, enquanto função da política externa que continua a ser a expressão por excelência da soberania nacional, é concebida, desenvolvida e gerida segundo critérios nacionais. A cooperação multinacional, seja com países europeus ou terceiros, é considerada desse ponto de vista.

3.6

Em grande medida, as iniciativas empreendidas até hoje para superar os obstáculos inerentes a esta abordagem falharam. O Pacto ou Acordo Militar de Saint-Malo, de 1998, de cooperação em matéria de defesa, entre o Reino Unido e França, deveria ter marcado um passo significativo na cooperação militar. Quinze anos depois, e apesar de novas negociações, os resultados continuam modestos.

3.7

Uma iniciativa empreendida em 1998 por seis nações deu lugar, em 2000, a uma Carta de Intenções dos seis principais países produtores de armas da Europa – França, Alemanha, Reino Unido, Itália, Espanha e Suécia, o chamado «Grupo LoI» – que se traduziu num tratado para a reestruturação e o funcionamento do setor da defesa. Este tratado relativo ao planeamento e à cooperação com a indústria, bem como às capacidades e à investigação não produziu resultados concretos durante um longo período de tempo.

3.8

Existem outras formas de cooperação entre os Estados-Membros, tal como entre as marinhas da Bélgica e dos Países Baixos, a cooperação nórdica em matéria de defesa (Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia) e a cooperação entre as forças terrestres da Alemanha e dos Países Baixos. No entanto, estes quadros de cooperação não devem ser confundidos com a cooperação industrial, que praticamente não existe.

3.9

Em 2004 criou-se a Agência Europeia de Defesa que visa a cooperação estrutural em matéria de defesa, com o apoio também de iniciativas da Comissão. Apesar de alguns progressos, a cooperação estrutural ainda não foi lançada devido à falta de empenho dos Estados-Membros.

3.10

Em conclusão, o CESE assinala que, não obstante a crescente sensibilização para a necessidade de uma cooperação mais estreita e de uma visão europeia em matéria de defesa, a falta de vontade política, as posições tradicionais e os interesses instituídos impediram progressos significativos.

B.   Aspetos industriais

3.11

A reação da indústria europeia da defesa aos acontecimentos internacionais tem sido bastante diferente:

Este setor opera num contexto mundial. Está necessariamente ligado aos governos nacionais, mas é também muito ativo nos mercados internacionais, com resultados cada vez mais positivos.

Além disso, as indústrias principais estão a trabalhar tanto para o setor civil como para o militar. A parte civil, mais dinâmica, está a aumentar devido à redução das vendas no setor militar e dos respetivos lucros, especialmente na Europa.

3.12

Há muito que a competitividade da indústria suscita preocupação no setor. A posição institucional do setor difere muito de país para país, desde empresas comparticipadas a 100 % pelo Estado ou pelo setor privado até todo o tipo de variantes intermédias. O denominador comum é o papel preponderante dos governos em todo o lado. Apesar da privatização (parcial), a ligação entre indústria e estado mantém-se muito forte na medida em que depende da procura e regulamentação estatal (de ordem monopolista), bem como de licenças de exportação.

3.13

A indústria preferiria uma consolidação ao nível europeu, mas o mercado é demasiado limitado. BAE-Systems, Finmeccanica e, em menor medida, Thales e EADS são empresas muito ativas nos EUA, mas que não podem operar livremente na Europa porque, devido às suas relações especiais, os governos nacionais se mantêm à frente de qualquer decisão estratégica no setor.

3.14

A dinâmica de mercado reforça a concorrência ao nível mundial. A indústria norte-americana está a redobrar os seus esforços de exportação para compensar a redução de alguns dos seus mercados nacionais. Novos protagonistas mundiais irão satisfazendo cada vez mais as suas necessidades. Fixarão igualmente a exportação como objetivo, competindo dessa forma com a indústria europeia nos mercados dos países terceiros.

3.15

Por último, a indústria faz sua a posição que o CESE sublinhou no ano passado de que uma indústria da defesa madura nunca gozará de uma posição internacional credível sem uma sólida base interna. Dada a elevada componente tecnológica dos equipamentos militares, os mercados nacionais e os orçamentos nacionais de defesa já deixaram de ter volume suficiente a título individual. Tal já acontece desde há vinte anos, e as consequências são cada vez mais graves.

3.16

Na via para uma Europa independente em matéria de defesa, o CESE sublinha a prioridade absoluta das capacidades soberanas e dos investimentos de alto valor acrescentado, essenciais para a Europa poder desempenhar um papel diferenciado a nível mundial, e contribuindo também para uma nova mentalidade entre os europeus.

3.17

Recentemente, a indústria reiterou todos os argumentos habituais a favor de sistemas de tecnologia e produção a longo prazo, estáveis, previsíveis e fomentados a nível europeu, em todos os domínios importantes.

3.18

A indústria dá o alerta. Para sobreviver e manter a sua capacidade de rendimento e o seu nível de emprego, a alternativa é aumentar a produção no setor civil. Nesse caso, porém, a Europa sentiria a falta crescente de uma indústria da defesa interna, o que também afetaria a sua política externa.

3.19

Os sindicatos, representados por IndustriAll, refletem sentimentos semelhantes de grande preocupação. Em 2011, o setor aeroespacial e de defesa empregava diretamente 7330 00 trabalhadores qualificados na Europa (12), sendo que mais dois milhões dependiam dele. Na última década, a mão de obra diminuiu consideravelmente e o emprego vê-se ameaçado por novos cortes orçamentais. Os jovens não se sentem suficientemente atraídos pelo setor da defesa devido à imprevisibilidade do mesmo.

3.20

O CESE assinala que os trabalhadores estão, em grande medida, a sofrer as consequências da incapacidade dos governos de reestruturar as suas organizações de defesa. Ao adiar a racionalização da base militar, os governos estão a perder a oportunidade de investir na renovação eficaz das capacidades, o que tem um impacto negativo na mão de obra.

3.21

A situação atual provocará uma resistência crescente, enquanto se mantiverem as reorganizações mal planeadas e desestruturadas. Para levar a cabo transformações políticas proactivas, será necessária a participação de representantes dos trabalhadores ao nível empresarial e territorial, a fim de evitar ajustamentos bruscos.

3.22

O emprego, porventura em menor escala, exigirá o reforço acentuado da coordenação europeia nos domínios da tecnologia e da produção. Neste processo, convém evitar a precariedade do emprego mediante a aquisição de novas capacidades e competências, a fim de garantir, na medida do possível, perspetivas e contratos de trabalho dignos. Importa estabelecer diálogos sociais eficazes a vários níveis.

3.23

A redução da produção europeia devido aos cortes orçamentais deve ser gerida de forma estruturada, organizando diálogos sociais adequados tendo em vista preservar o emprego e permitir a reclassificação do pessoal excedentário. É mais benéfico, tanto para a indústria como para os trabalhadores, um quadro europeu previsível e orientada para o mercado do que um quadro de reorganizações mal planeadas e a curto prazo numa base exclusivamente nacional e sem objetivos claros (13).

4.   Condições políticas e perspetivas possíveis

4.1

As perspetivas da indústria europeia da defesa tornar-se-ão progressivamente tão incertas que é necessário lançar de imediato um debate fundamental entre europeus sobre o seu futuro – se não entre todos, ao menos entre aqueles que a tal estejam dispostos.

4.2

É preciso um novo modo de pensar, bem como a criação de uma «linguagem comum» entre os Estados-Membros e na UE, partindo de três premissas básicas:

uma economia europeia integrada passa por uma abordagem comum em matéria de defesa e segurança para salvaguardar e proteger os seus interesses, os seus cidadãos e as suas posições no mundo;

há que realizar uma análise comum da evolução da situação no mundo, em curso e prevista (a longo prazo) enquanto ponto de partida para elaborar ideias e estratégias concretas a fim de apoiar a posição geral da Europa no mundo;

há que estabelecer a ligação entre a política externa, as ameaças, a defesa e a segurança, as perspetivas a longo prazo e uma indústria da defesa sustentável, incluindo o emprego.

4.3

O CESE tem plena consciência do enorme impacto destas premissas interrelacionadas cujo debate é constantemente negligenciado. Muitas iniciativas empreendidas de boa fé durante os últimos quinze anos falharam por nunca se ter questionado a soberania nacional, ou seja, as perceções nacionais de ameaças e posições expressas ao nível da política externa nacional. Por este motivo, coexiste atualmente na Europa uma vasta gama de posições que são, em certa medida, incompatíveis. O CESE considera que não serão possíveis progressos significativos se não se aceitar uma soberania partilhada no quadro da UE.

O debate deve ser lançado a partir de uma nova base, com vista a processos inovadores e mais prometedores.

4.4

Tendo em conta o grande número de domínios de política em causa, o CESE acolhe com muita satisfação o Conselho Europeu dedicado à defesa, de dezembro deste ano. Até agora, a responsabilidade pela defesa e segurança recaiu principalmente sobre os ministros da Defesa, geralmente em harmonia com as orientações gerais dos ministros dos Negócios Estrangeiros, sob a supervisão estrita dos ministros das Finanças.

4.5

Entretanto, o contexto está a mudar totalmente devido às fortes restrições orçamentais e à necessidade de racionalizar, bem como aos novos paradigmas e às novas ameaças que deles resultam. Dado, entre outras coisas, a relação entre a tecnologia e a inovação militar e civil e a ligação entre a defesa e a segurança pública, outros aspetos da política governamental também entram em linha de conta. Todos esses fatores requerem uma abordagem holística e global.

4.6

Muitos, sobretudo os industriais e os trabalhadores, estão a contar com uma forma de pensar e uma ação estruturadas a partir de dezembro. Se a UE deixar passar esta oportunidade, pode levar anos até se conseguir levar a cabo um processo positivo.

4.7

O Conselho Europeu de dezembro será o primeiro Conselho da UE a abordar a questão da defesa na íntegra. Dadas a enorme complexidade associada ao lançamento de um novo rumo, o CESE estima que serão indispensáveis mais Conselhos Europeus para estabelecer uma via clara, credível e previsível.

5.   Política industrial

5.1

O CESE acolheu com agrado a comunicação da Comissão sobre política industrial (14), que tem por objetivo estimular condições, políticas e programas benéficos para gerar, desenvolver e reforçar as atividades industriais na Europa. A Europa tem de assegurar o seu futuro industrial num ambiente aberto.

5.2

A defesa é um setor predominante e excecional. que, pela sua natureza, opera em mercados totalmente institucionais em todo o mundo. O setor e os centros de investigação são criados e organizados principalmente segundo critérios nacionais. Os países mais pequenos, que carecem de uma produção industrial própria, adquirem material já comercializado, o que, no final de contas, equivale a adquiri-lo aos Estados Unidos.

5.3

A interdependência entre as grandes empresas e as PME no continente deve-se à consolidação do setor (fusões e aquisições transfronteiras) e à internacionalização (penetrando o tecido industrial norte-americano). A situação das exportações mantém-se positiva. O maior obstáculo é a relação difícil com os governos europeus devido a uma falta de visão comum.

5.4

Para além das ações da AED, a UE adotou duas diretivas tendo em vista a abertura dos mercados intraeuropeus (15). O prazo para a transposição era o verão de 2011 (16), mas a sua aplicação efetiva está a revelar-se morosa.

5.5

O CESE congratula-se com a comunicação da Comissão (17), que mostra que foram realizados progressos substanciais em termos de análises e propostas. A Comissão sublinha, com razão, no contexto de uma política industrial para o setor da defesa, o significado do mercado interno de produtos de defesa, a I&D, o papel das PME, o potencial contributo da política regional e o desenvolvimento das competências adequadas.

5.6

No entanto, para o CESE, um ponto a criticar é o facto de a Comissão não salientar suficientemente a posição excecional do setor da defesa nem a necessidade de uma política industrial proativa. Não se trata apenas da abertura dos mercados, já que esta exige uma definição adequada dadas as características específicas do setor da defesa e o disposto no artigo 346.o do TFUE.

5.7

Trata-se também de criar uma base política na Europa para os governos colaborarem rumo ao seu destino comum a longo prazo. Só dessa maneira se cumprirão as condições necessárias para dar início a programas verdadeiramente comuns, desde a fase inicial à investigação orientada, à inovação e à produção no mercado interno europeu durante um longo período.

5.8

A I&D é fundamental na fase inicial da cadeia de valor, que deve ser europeizada (18). Estas foram as razões para chamar a atenção para a cooperação em I&T e I&D quando se criou a AED, os seus predecessores (Grupo de Armamento da Europa Ocidental (GAEO) e Grupo Europeu Independente de Programação (GEIP)), bem como na OTAN. No entanto, também neste caso não houve uma aplicação concreta.

5.9

Nos últimos trinta anos, o fracasso da cooperação tem sido a regra e não a exceção. Alguns projetos, tais como o NH-90 e o A400M, já foram iniciados, mas há exemplos que mostram que os requisitos do sistema eram, com demasiada frequência, a simples soma dos requisitos nacionais, as fases de desenvolvimento demasiado longas e os produtos finais demasiado onerosos.

5.10

Salvo alguns êxitos relativos, outras iniciativas de cooperação, como o NF-90, também fracassaram e, paralelamente, foram implementados uma série de programas concorrentes de aviões de combate (Typhoon, Rafale, Grippen), enquanto muitos países aderiram ao programa norte-americano F-35, bem como a uma grande variedade de programas de mísseis.

5.11

Neste momento, não está a decorrer nenhum programa de grande escala, apesar de os sistemas existentes estarem a envelhecer e a ficar obsoletos. A título de exemplo, o CESE assinala os veículos blindados, submarinos, helicópteros de transporte e sistema portáteis de defesa antiaérea. Neste contexto, os novos sistemas não tripulados parecem oferecer a oportunidade ideal para iniciativas comuns, mas, na prática, esses objetivos ainda não existem. Outra possibilidade seria uma cooperação menos ambiciosa, por exemplo na normalização das capacidades de reabastecimento de combustível em voo.

5.12

O CESE insta ao lançamento de programas europeus, em particular na próxima geração de sistemas de aeronaves pilotadas à distância (RPAS), desenvolvendo sinergias com a Comissão, e nas comunicações seguras por satélite. Também se podem analisar outras áreas de cooperação (com os norte-americanos) como, por exemplo, as capacidades de reabastecimento de combustível em voo, uma área muito onde existem grandes lacunas e para a qual a AED está à procura de soluções europeias.

5.13

A comunicação da Comissão menciona oportunidades que requerem total apoio político. Neste contexto, uma iniciativa fundamental seria criar uma capacidade europeia de vigilância de alta resolução do espaço, fornecendo sistemas para substituir o Helios, RadarSat, etc. Para tal, é essencial agregar os conhecimentos técnicos existentes em todos os Estados-Membros, na AED e nos centros comuns de investigação, incluindo os recursos financeiros. Nenhum país europeu tem capacidade para o fazer individualmente.

5.14

Sempre que for apropriado, os projetos de defesa devem estar ligados aos programas de I&D da UE. O Sétimo Programa-Quadro (7.o PQ) já intervém em projetos de dupla utilização. O seu valor acrescentado é o facto de favorecer os projetos transfronteiras. O CESE apela a que as tecnologias de dupla utilização sejam consideradas de forma mais sistemática no âmbito do programa Horizonte 2020.

5.15

É essencial que a política industrial da defesa aborde também a clivagem entre os principais produtores e os outros países. Há que promover ativamente a participação das indústrias de todos os países, de modo a envolver política e economicamente o maior número possível de países. Desta forma, a questão das compensações, habitualmente muito controversa e criticada, pode eliminar-se progressivamente. Estes elementos devem fazer parte de uma estratégia europeia de defesa global.

5.16

O CESE assinala o aspeto problemático de adquirir produtos acabados fora da UE. No quadro de uma estratégia europeia de defesa, é necessário reconsiderar estas políticas. Esta questão fundamental e muito complexa tem de ser abordada ao mais alto nível.

5.17

Se o setor da defesa europeu for bem gerido, proporciona muito melhores oportunidades de cooperação internacional equilibrada, designadamente com os EUA. Tendo em conta que os EUA defendem os seus interesses estratégicos, o CESE apela a que o caráter excecional do setor da defesa seja devidamente tido em conta durante as negociações sobre o próximo acordo de comércio livre.

5.18

Ainda neste contexto, há que garantir devidamente a continuidade do aprovisionamento de peças essenciais ou sensíveis originárias dos EUA na cadeia de valor europeia. Uma posição europeia comum também facilitará as negociações com países terceiros sobre o abastecimento de matérias-primas essenciais.

5.19

Do mesmo modo, há que assegurar adequadamente os direitos de propriedade intelectual europeus quando se exporta para países terceiros.

5.20

O êxito da cooperação entre as indústrias de vários países não deve ser comprometido por decisões unilaterais de alguns Estados-Membros relativamente ao controlo das exportações, que resultariam em diferenças na aplicação dos critérios para o controlo das exportações, quer relativamente à posição comum (19), quer aos critérios nacionais dos vários Estados-Membros.

6.   Ações da Comissão

6.1

O CESE concorda em grande medida com as ações propostas na comunicação. que considera um avanço significativo. No que respeita a algumas questões, gostaria de acrescentar o que a seguir se enuncia.

6.2

A cooperação com a AED é crucial. O CESE considera que a coordenação e a articulação entre a Comissão e a AED, tal como proposto em diversas ações previstas na comunicação, são uma condição essencial para realizar progressos e obter êxito. Assinala também como essencial a promoção das capacidades de dupla utilização, tal como a capacidade de transporte aéreo.

6.3

O CESE sublinha que, para realizar todo o seu potencial, a Agência Europeia de Defesa necessita de uma base financeira mais firme e do empenho total dos Estados-Membros. Importa conferir à AED um papel de maior relevo na planificação da defesa, a fim de apoiar os Estados-Membros.

6.4

O CESE apoia firmemente as propostas da Comissão em matéria de normas e certificação, que darão um contributo para a cooperação transfronteiras no domínio da indústria, bem como para a especialização regional e para as redes de excelência. Fomenta as sinergias entre a AED e a AESA, nomeadamente no que respeita à certificação.

6.5

As PME, também interligadas com grandes empresas, são determinantes para a produção e a inovação na defesa europeia. A fim de apoiar as ações propostas, o CESE sublinha a necessidade de redes abertas. Menos projetos (europeus) mas mais bem direcionados podem criar novas oportunidades.

6.6

A participação de um leque mais vasto de PME em toda a Europa contribuirá igualmente para envolver o maior número possível de países. Esta participação pode ainda constituir uma oportunidade para compensar os países por deixarem de adquirir produtos acabados para adotarem as orientações europeias.

6.7

O CESE apoia veementemente as ações da Comissão previstas em matéria de competências, que são fundamentais. Acolhe com muita satisfação o contributo positivo do Fundo Social Europeu e dos fundos estruturais e congratula-se com o trabalho desenvolvido pela AED na sensibilização dos Estados-Membros, apoiando igualmente a conceção de projetos concretos nestes domínios.

6.8

O CESE reitera o seu apoio inequívoco à ação da Comissão no sentido de explorar ativamente as tecnologiasde dupla utilização.

6.9

O CESE salienta a potencial correlação positiva entre as políticas espaciais e a defesa, relativamente a projetos já existentes e a novos projetos (20).

6.10

O CESE subscreve as ações propostas no domínio da energia que também envolverão um número crescente de PME.

6.11

A dimensão internacional é de extrema importância, tal como a comunicação prevista para definir uma visão a longo prazo no que respeita ao controlo das exportações estratégicas da UE. O CESE assinala que as relações externas no setor industrial só poderão ter êxito se existir um verdadeiro mercado interno.

6.12

Para terminar, o CESE apoia sem reservas todas as considerações estratégicas constantes do capítulo 9.2 da comunicação.

Bruxelas, 17 de outubro de 2013

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Henri MALOSSE


(1)  «Para um setor da defesa e da segurança mais competitivo e eficiente» (COM), etc.

(2)  Este documento ainda não foi publicado. A Alta Representante formulou um parecer com caráter provisório.

(3)  JO C 299 de 4.10.2012, p. 17.

(4)  JO C 299 de 4.10.2012, p. 17.

(5)  Ver o artigo 42.o do TUE.

(6)  Neste contexto, um exemplo bem ilustrativo na indústria civil é o desenvolvimento dinâmico e bem sucedido da Airbus.

(7)  Ver dados sobre a defesa, AED, 2011.

(8)  Fonte: EDA, janeiro de 2012.

(9)  «Strategic Defence and Security Review», Reino Unido, outubro de 2010. «Livre Blanc sur la Défense et la sécurité nationale», França, maio de 2013.

(10)  Jean-Yves Le Drian, ministro da Defesa francês, falou de forma muito aberta e contundente sobre as repercussões desta diminuição na sua intervenção na Escola Militar de Paris, em 29 de abril deste ano.

(11)  Ibidem, ponto 1.2.

(12)  Relatório Anual da ASD (Associação das Indústrias Aeroespacial e de Defesa da Europa) de 2012.

(13)  Ver também «Twelve demands for a sustainable industrial policy», comité executivo de IndustriAll Europe, 12-13 de junho de 2013.

(14)  Comunicação da Comissão Europeia sobre a política industrial (COM(2012) 582 final) e parecer do CESE sobre a comunicação.

(15)  Pacote «Defesa», 2007.

(16)  Diretivas 2009/43/CE (JO L 146 de 10.6.2009) sobre as transferências de produtos relacionados com a defesa e 2009/81/CE (JO L 216 de 20.8.2009) sobre os contratos públicos nos domínios da defesa e da segurança. O Pacote «Defesa» continha igualmente uma comunicação intitulada «Uma estratégia para uma indústria da defesa europeia mais forte e mais competitiva», COM(2007) 764, de 5.12.2007.

(17)  Ver nota de rodapé 1.

(18)  Segundo diversos documentos. Ver também JO C 299 de 4.10.2012, p. 17.

(19)  2008/944/PESC.

(20)  Ver o parecer do CESE sobre o espaço, de setembro de 2013.


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