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Document 62022CJ0536

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quinta Secção) de 14 de março de 2024.
MW e CY contra VR Bank Ravensburg-Weingarten eG.
Reenvio prejudicial — Proteção do consumidor — Diretiva 2014/17/UE — Artigo 25.o, n.o 3 — Contratos de crédito aos consumidores para imóveis de habitação — Reembolso antecipado — Indemnização do mutuante — Lucro cessante do mutuante — Método de cálculo do lucro cessante.
Processo C-536/22.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:234

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

14 de março de 2024 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Proteção do consumidor — Diretiva 2014/17/UE — Artigo 25.o, n.o 3 — Contratos de crédito aos consumidores para imóveis de habitação — Reembolso antecipado — Indemnização do mutuante — Lucro cessante do mutuante — Método de cálculo do lucro cessante»

No processo C‑536/22,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Landgericht Ravensburg (Tribunal Regional de Ravensburg, Alemanha), por Decisão de 8 de agosto de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 10 de agosto de 2022, no processo

MW,

CY

contra

VR Bank Ravensburg‑Weingarten eG,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: E. Regan, presidente de secção, Z. Csehi (relator), M. Ilešič, I. Jarukaitis e D. Gratsias, juízes,

advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da VR Bank Ravensburg‑Weingarten eG, por T. Winter, Rechtsanwalt,

em representação do Governo Alemão, por J. Möller e M. Hellmann, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por C. Auvret, H. Tserepa‑Lacombe e G. von Rintelen, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 28 de setembro de 2023,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 25.o, n.o 3, da Diretiva 2014/17/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos de crédito aos consumidores para imóveis de habitação e que altera as Diretivas 2008/48/CE e 2013/36/UE e o Regulamento (UE) n.o 1093/2010 (JO 2014, L 60, p. 34).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe MW e CY, dois consumidores domiciliados na Alemanha, à VR Bank Ravensburg‑Weingarten eG, uma instituição de crédito com sede na Alemanha (a seguir «VR Bank»), a respeito de uma ação para restituição de uma indemnização paga pelo reembolso antecipado de um crédito aos consumidores para um imóvel de habitação.

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva 2008/48/CE

3

O artigo 16.o da Diretiva 2008/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2008, relativa a contratos de crédito aos consumidores e que revoga a Diretiva 87/102/CEE do Conselho (JO 2008, L 133, p. 66), sob a epígrafe «Reembolso antecipado», dispõe:

«[…]

2.   Em caso de reembolso antecipado do crédito, o mutuante tem direito a uma indemnização justa e justificada objetivamente por eventuais custos diretamente relacionados com o reembolso antecipado do crédito, desde que o reembolso antecipado ocorra num período em que a taxa devedora aplicável seja fixa.

Essa indemnização não pode exceder 1 % do montante do crédito reembolsado antecipadamente, se o período decorrido entre o reembolso antecipado e a data estipulada para a resolução do contrato de crédito for superior a um ano. Se esse período não exceder um ano, a indemnização não pode ser superior a 0,5 % do montante do crédito reembolsado antecipadamente.

[…]

4.   Os Estados‑Membros podem dispor que:

a)

A referida indemnização só pode ser pedida pelo mutuante na condição de o montante do reembolso antecipado exceder o limiar definido na lei nacional. Esse limiar não deve ser superior a 10000 [euros] num período de 12 meses;

b)

O mutuante pode excecionalmente pedir uma indemnização superior se puder provar que a perda que sofreu por causa do reembolso antecipado excede o montante determinado nos termos do n.o 2.

Se a indemnização pedida pelo mutuante exceder a perda de facto sofrida, o consumidor pode pedir uma redução correspondente.

Neste caso, a perda consiste na diferença entre a taxa de juros acordada inicialmente e a taxa de juros à qual o mutuante pode emprestar o montante reembolsado antecipadamente à data do reembolso antecipado e tem em conta o impacto do pagamento antecipado sobre os custos administrativos.

[…]»

Diretiva 2014/17

4

A Diretiva 2014/17 alterou a Diretiva 2008/48.

5

Os considerandos 5 a 7, 21 e 66 da Diretiva 2014/17 têm a seguinte redação:

«(5)

A fim de facilitar a criação de um mercado interno que funcione corretamente, com um nível elevado de proteção dos consumidores na área dos contratos de crédito para imóveis, e de assegurar que os consumidores que procuram esse tipo de contratos possam fazê‑lo com a certeza de que as instituições que irão contactar agem de forma profissional e responsável, é necessário criar um enquadramento legal da União [Europeia] adequadamente harmonizado em várias áreas, que tenha em conta as diferenças existentes nos contratos de crédito, resultantes, nomeadamente, das diferenças existentes nos mercados nacionais e regionais de bens imóveis.

(6)

Por conseguinte, a presente diretiva deverá desenvolver um mercado interno mais transparente, eficiente e competitivo, através de contratos de crédito para bens imóveis que sejam coerentes, flexíveis e equitativos, promovendo simultaneamente a concessão e contração de empréstimos de forma sustentável e a inclusão financeira, e proporcionando assim um nível elevado de proteção dos consumidores.

(7)

A fim de criar um verdadeiro mercado interno com um nível elevado e equivalente de proteção dos consumidores, a presente diretiva contém disposições que são objeto de harmonização máxima no que respeita à prestação de informação pré‑contratual através do formato normalizado da ficha de informação normalizada europeia (FINE) e ao cálculo da [taxa anual de encargos efetiva global (TAEG)]. Todavia, tendo em conta a especificidade dos contratos de crédito para bens imóveis e as diferenças na evolução do mercado e nas condições existentes nos Estados‑Membros, especialmente no que diz respeito à estrutura do mercado e aos participantes no mercado, às categorias de produtos disponíveis e às formalidades inerentes ao processo de concessão de crédito, os Estados‑Membros deverão ter a possibilidade de manter ou introduzir disposições mais restritivas do que as previstas na presente diretiva nos domínios que não estejam claramente identificados como objeto de harmonização máxima. Esta abordagem diferenciada é necessária para evitar prejudicar o nível de proteção dos consumidores relativamente aos contratos de crédito abrangidos pelo âmbito da presente diretiva. Os Estados‑Membros deverão, por exemplo, ser autorizados a manter ou introduzir disposições mais restritivas no que diz respeito aos requisitos de conhecimentos e competências aplicáveis ao pessoal e às instruções de preenchimento da FINE.

[…]

(21)

[…] A presente diretiva não deverá afetar as disposições gerais do direito dos contratos nacional, nomeadamente as regras relativas à validade, à formação ou aos efeitos dos contratos, na medida em que os aspetos gerais do direito dos contratos não são regulados na presente diretiva.

[…]

(66)

A capacidade de um consumidor para reembolsar o crédito antes do termo do contrato de crédito pode desempenhar um importante papel para promover a concorrência no mercado interno e a livre circulação dos cidadãos da União, bem como para ajudar a proporcionar durante a vigência do contrato de crédito a flexibilidade necessária para promover a estabilidade financeira de harmonia com as recomendações do Conselho de Estabilidade Financeira. No entanto, existem diferenças substanciais entre os princípios e condições em que os consumidores podem proceder ao reembolso dos seus créditos ao nível nacional e as condições em que esse reembolso antecipado pode ter lugar. Reconhecendo embora a diversidade dos mecanismos de financiamento do crédito hipotecário e da gama de produtos disponíveis, é essencial estabelecer determinadas normas em matéria de reembolso antecipado do crédito a nível da União a fim de garantir que os consumidores tenham a possibilidade de cumprir as suas obrigações antes da data estipulada no contrato de crédito, bem como a confiança necessária para compararem ofertas a fim de encontrarem os produtos que melhor satisfaçam as suas necessidades. Os Estados‑Membros deverão, por conseguinte, assegurar, através de legislação ou de outros meios, como cláusulas contratuais, o direito de os consumidores efetuarem o reembolso antecipado. No entanto, os Estados‑Membros deverão ter a possibilidade de definir as condições de exercício desse direito. Essas condições poderão incluir limitações temporais ao exercício do direito, tratamentos diferenciados em função do tipo de taxa devedora ou restrições quanto às circunstâncias em que o direito pode ser exercido. Se o reembolso antecipado ocorrer durante um período em que a taxa devedora é fixa, o exercício desse direito poderá ser condicionado à existência de um interesse legítimo por parte do consumidor, especificado pelo Estado‑Membro. Esse interesse legítimo poderá verificar‑se, por exemplo, em caso de divórcio ou de situação de desemprego. As condições estabelecidas pelos Estados‑Membros podem também prever que o mutuante deva ter direito a uma indemnização justa e objetivamente justificada pelos eventuais custos diretamente relacionados com o reembolso antecipado do crédito. Nos casos em que os Estados‑Membros disponham que o mutuante tem o direito a uma indemnização, esta deverá ser justa e objetivamente justificada pelos eventuais custos diretamente relacionados com o reembolso antecipado do crédito, de acordo com as regras nacionais aplicáveis à indemnização, que não poderá exceder a perda financeira do mutuante.»

6

O artigo 1.o desta diretiva, sob a epígrafe «Objeto», prevê:

«A presente diretiva estabelece um quadro comum aplicável a determinados aspetos das disposições legais, regulamentares e administrativas dos Estados‑Membros em matéria de contratos de crédito aos consumidores garantido por hipoteca ou outro direito para imóveis de habitação, incluindo a obrigação de efetuar uma avaliação de solvabilidade antes da concessão de um crédito, como base para o desenvolvimento de normas eficazes de celebração de contratos para imóveis de habitação […]»

7

O artigo 2.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Nível de harmonização», dispõe, no seu n.o 1:

«A presente diretiva não obsta a que os Estados‑Membros mantenham ou introduzam disposições mais restritivas para a proteção dos consumidores, desde que tais disposições sejam compatíveis com as suas obrigações decorrentes do direito da União.»

8

Nos termos do artigo 4.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Definições»:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[…]

13)

“Custo total do crédito para o consumidor”, o custo total do crédito para o consumidor na aceção do artigo 3.o, alínea g), da [Diretiva 2008/48], incluindo o custo da avaliação do imóvel se essa avaliação for necessária para a obtenção do crédito, mas excluindo as despesas relativas ao registo da transmissão de propriedade do imóvel. Estão excluídos os eventuais encargos devidos pelo consumidor por incumprimento de obrigações que lhe incumbam por força do contrato de crédito;

[…]»

9

O artigo 14.o da Diretiva 2014/17, sob a epígrafe «Informação pré‑contratual», dispõe nos seus n.os 1 e 2:

«1.   Os Estados‑Membros asseguram que o mutuante e, se for o caso, o intermediário de crédito ou o representante nomeado prestem ao consumidor a informação personalizada necessária para comparar os produtos de crédito disponíveis no mercado, avaliar as suas implicações e tomar uma decisão esclarecida e informada quanto à celebração do contrato de crédito:

[…]

2.   A informação personalizada referida no n.o 1 é prestada, em papel ou noutro suporte duradouro, através da FINE, cujo modelo consta do anexo II.»

10

O artigo 25.o desta diretiva, sob a epígrafe «Reembolso antecipado», prevê:

«1.   Os Estados‑Membros asseguram que o consumidor tem o direito de cumprir total ou parcialmente as suas obrigações decorrentes de um contrato de crédito antes do termo desse contrato. Nesses casos, o consumidor tem direito a uma redução do custo total do crédito ao consumidor, correspondente aos juros e aos custos relativos ao período remanescente do contrato.

[…]

3.   Os Estados‑Membros podem dispor que o mutuante tem direito a uma indemnização justa e objetiva, caso tal se justifique, dos eventuais custos diretamente associados ao reembolso antecipado, mas não pode impor outras indemnizações ao consumidor. Neste contexto, a indemnização não pode exceder o prejuízo financeiro do mutuante. Nestas condições, os Estados‑Membros podem prever que a indemnização não pode exceder um determinado nível ou que seja autorizada apenas durante um determinado período.

4.   Se um consumidor pretender cumprir as suas obrigações decorrentes de um contrato de crédito antes do termo do contrato, o mutuante deve prestar‑lhe sem demora após receção do pedido, em papel ou noutro suporte duradouro, as informações necessárias para estudar essa opção. Essas informações devem pelo menos quantificar as implicações para o consumidor do cumprimento das suas obrigações antes do termo do contrato de crédito e descrever claramente os pressupostos utilizados. Os referidos pressupostos devem ser razoáveis e justificáveis.

[…]»

11

O anexo II da referida diretiva, intitulado «Ficha de Informação Normalizada Europeia (FINE)», contém, na sua parte A, um modelo da FINE. Este modelo prevê que a ficha deve conter, nomeadamente, as seguintes indicações:

«[…]

9. Reembolso antecipado

Tem a possibilidade de reembolsar antecipadamente este empréstimo, total ou parcialmente.

[…]

(Se aplicável) Custos do reembolso antecipado: [Inserir o montante ou, se tal não for possível, o método de cálculo]

[…]»

12

Este anexo II inclui também uma parte B, intitulada «Instruções de preenchimento da FINE», com a seguinte redação:

«No preenchimento da FINE, devem ser seguidas as instruções mínimas a seguir indicadas. Os Estados‑Membros podem todavia completar ou especificar melhor as instruções de preenchimento da FINE.

[…]

Secção 9. Reembolso antecipado

[…]

2)

Na parte relativa aos custos do reembolso antecipado, o mutuante deve chamar a atenção do consumidor para eventuais custos de reembolso antecipado ou outros custos a pagar pelo reembolso antecipado a título de compensação do mutuante e indicar, se possível, o respetivo montante. Quando o montante da compensação depender de vários fatores, tais como o montante reembolsado ou a taxa de juro em vigor no momento do reembolso antecipado, o mutuante deve indicar o modo de cálculo da compensação e o montante máximo que os custos podem atingir ou, se tal não for possível, um exemplo indicativo que demonstre ao consumidor o nível da compensação em diferentes cenários possíveis.»

Direito alemão

13

O § 249 do Bürgerliches Gesetzbuch (Código Civil, a seguir «BGB»), sob a epígrafe «Modo e medida do pagamento da indemnização», dispõe, no seu n.o 1:

«Quem estiver obrigado a pagar uma indemnização deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que originou a obrigação de indemnizar.»

14

Nos termos do § 252 do BGB, sob a epígrafe «Lucros cessantes»:

«O dano indemnizável também inclui os lucros cessantes. Por “lucros cessantes” entende‑se o lucro que se podia razoavelmente esperar com o normal desenrolar dos acontecimentos ou em função de circunstâncias específicas, nomeadamente em caso de terem sido empreendidos esforços e diligências.»

15

O § 490 do BGB, sob a epígrafe «Direito de rescisão extraordinário», dispõe, no seu n.o 2:

«O mutuário pode rescindir antecipadamente, no respeito dos prazos previstos no § 488.o, n.o 3, segundo período, um contrato de mútuo ao abrigo do qual a taxa devedora é fixada e garantida por um direito de constituição de hipoteca sobre imóvel ou navio, se o seu interesse legítimo o exigir e se tiverem decorrido seis meses desde o recebimento completo do empréstimo. Este interesse existe, nomeadamente, se o mutuário tiver necessidade de fazer outro uso do bem hipotecado como garantia do empréstimo. O mutuário é obrigado a indemnizar o mutuante pelos danos sofridos devido à rescisão antecipada […]»

16

O § 500 do BGB, sob a epígrafe «Direito de rescisão do mutuário; reembolso antecipado», dispõe, no seu n.o 2:

«O mutuário pode, a qualquer momento, cumprir antecipadamente no todo ou em parte as obrigações que lhe incumbem por força de um contrato de crédito ao consumo. Em derrogação do primeiro período, o mutuário de um contrato de crédito ao consumo para aquisição de um imóvel para o qual tenha sido acordada uma taxa devedora fixa só pode cumprir antecipadamente as suas obrigações, no todo ou em parte, durante o período de fixação da taxa devedora, se existir um interesse legítimo em fazê‑lo.»

17

O artigo 25.o da Diretiva 2014/17 foi transposto para o direito alemão pelo § 502 do BGB, sob a epígrafe «Indemnização por reembolso antecipado». Esta disposição prevê:

«(1)   Em caso de reembolso antecipado, o mutuante pode exigir uma indemnização adequada dos danos diretamente relacionados com o reembolso antecipado se, no momento do reembolso, o mutuário tiver de pagar juros a uma taxa devedora fixa. […]

(2)   O direito a indemnização por reembolso antecipado está excluído se:

[…]

2.

as informações relativas à duração do contrato, ao direito de rescisão do mutuário ou ao cálculo da penalização de reembolso antecipado forem insuficientes no contrato.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

18

Em 11 de janeiro de 2019, os recorrentes no processo principal celebraram com o VR Bank um contrato de crédito aos consumidores para um imóvel que tinha por objeto um empréstimo líquido de 236000 euros para a aquisição de um apartamento. A taxa de juro do empréstimo foi fixada até 30 de janeiro de 2029. O contrato de crédito também continha disposições relativas ao reembolso antecipado do empréstimo e à indemnização por reembolso antecipado. A cláusula relativa à referida indemnização previa que, para calcular o prejuízo financeiro sofrido pelo mutuante devido ao reembolso antecipado, este devia basear‑se no método de cálculo denominado «ativo‑passivo», considerado admissível pelo Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal de Justiça Federal, Alemanha). Este método assenta no princípio segundo o qual os lucros cessantes do mutuante são calculados tendo em conta o rendimento fictício que este poderia esperar obter se reinvestisse os fundos libertados pelo reembolso antecipado em obrigações hipotecárias com um prazo de vencimento congruente com o do empréstimo.

19

Na sequência da transferência de um dos recorrentes no processo principal pela sua entidade patronal, estes venderam, em maio de 2020, o bem imóvel mencionado no número anterior pelo preço de 255000 euros e rescindiram o contrato de empréstimo com efeitos a partir de 30 de junho de 2020. Por carta de 9 de junho de 2020, o VR Bank reclamou aos recorrentes no processo principal uma indemnização de 27614,17 euros, a título do reembolso antecipado do empréstimo. Os recorrentes no processo principal pagaram esta indemnização, mas, por carta de 19 de abril de 2021, exigiram o seu reembolso ao VR Bank, considerando que esta indemnização não era devida. Face à recusa do VR Bank em proceder a este reembolso, os recorrentes no processo principal intentaram uma ação no Landgericht Ravensburg (Tribunal Regional de Ravensburg, Alemanha), o órgão jurisdicional de reenvio.

20

Esse órgão jurisdicional interroga‑se sobre a compatibilidade do § 502 do BGB, ao abrigo do qual o VR Bank reclama o direito ao pagamento da indemnização de reembolso antecipado com base no método de cálculo «ativo‑passivo», com o artigo 25.o, n.o 3, da Diretiva 2014/17. Em especial, pergunta‑se, por meio das suas duas primeiras questões, se a indemnização do mutuante pelos custos relacionados com o reembolso antecipado do crédito, prevista no artigo 25.o, n.o 3, da Diretiva 2014/17, abrange também os lucros cessantes do mutuante. Se for caso disso, esse órgão jurisdicional pretende conhecer as exigências do direito da União para efeitos do cálculo destes lucros cessantes, em especial no que respeita à tomada em consideração dos rendimentos provenientes de um reinvestimento.

21

A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio considera, por um lado, que o facto de, por força do artigo 25.o, n.o 3, primeiro período, da Diretiva 2014/17, apenas poderem ser reclamados os eventuais custos diretamente suportados em consequência do reembolso antecipado do crédito, se opõe a que sejam tidos em conta os juros que o consumidor deveria ter pago se não tivesse procedido a uma rescisão antecipada. Além disso, nos termos do artigo 25.o, n.o 1, segundo período, da referida diretiva, os Estados‑Membros devem assegurar que o consumidor tem direito, em caso de reembolso antecipado, a uma redução do custo total do crédito correspondente aos juros e aos custos relativos ao período remanescente do contrato, o que pode levar a que deixem de ser devidos juros e custos durante o período remanescente do contrato. Por outro lado, segundo esse órgão jurisdicional, a possibilidade de uma limitação da indemnização a um determinado período de tempo pode ser um argumento a favor de uma tomada em consideração, para efeitos da indemnização do mutuante, dos juros que o consumidor deveria ter pago se não tivesse procedido a uma rescisão antecipada.

22

Por outro lado, no que se refere às exigências do direito da União para efeitos do cálculo desses lucros cessantes, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que a redação do artigo 25.o, n.o 3, primeiro período, da Diretiva 2014/17, segundo o qual os Estados‑Membros podem prever que o mutuante tem direito a uma indemnização «objetiva», implica que só os custos em que efetiva e concretamente se incorreu poderiam ser tidos em conta neste cálculo. Em contrapartida, o artigo 25.o, n.o 4, segundo período, da Diretiva 2014/17, ao abrigo do qual, em caso de reembolso antecipado, o mutuante deve prestar ao consumidor «pelo menos» as informações que quantificam «as implicações para o consumidor do cumprimento das suas obrigações antes do termo do contrato de crédito e descrever claramente os pressupostos utilizados», leva a pensar que o mutuante pode basear o cálculo dos seus lucros cessantes tendo em conta os rendimentos fixos de um reinvestimento dos montantes resultantes desse reembolso.

23

Por último, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas sobre se a situação em que o consumidor rescinde o contrato de crédito aos consumidores para um imóvel de habitação com base num direito de rescisão previsto no direito nacional, antes de reembolsar antecipadamente o crédito ao mutuante, está também abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 25.o da Diretiva 2014/17. Resulta do pedido de decisão prejudicial que a interrogação do órgão jurisdicional de reenvio se explica pela coexistência, no direito nacional, de dois modos de indemnização diferentes do mutuante, consoante o reembolso antecipado seja pedido diretamente pelo consumidor, sem rescisão prévia do contrato, com fundamento no § 500 do BGB, ou ocorra após o consumidor exercer o seu direito de rescisão extraordinário do contrato, previsto no § 490 do BGB.

24

Nestas condições, o Landgericht Ravensburg (Tribunal Regional de Ravensburg) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve a expressão “indemnização justa e objetiva […] dos eventuais custos diretamente associados ao reembolso antecipado”, utilizada no artigo 25.o, n.o 3, da [Diretiva 2014/17], ser interpretada no sentido de que a indemnização também pode abranger o lucro cessante do mutuante, mais concretamente os juros que deixa de cobrar devido ao reembolso antecipado?

2)

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão:

O direito da União, em especial o artigo 25.o, n.o 3, da [Diretiva 2014/17,] estabelece regras quanto ao cálculo [dos lucros cessantes do mutuante, no que respeita à tomada em consideração dos rendimentos decorrentes do] reinvestimento dos montantes antecipadamente reembolsados de um crédito [aos consumidores para um imóvel]? Na afirmativa, que regras são essas?

Em especial:

a)

Devem as disposições nacionais relativas a esse cálculo ter em consideração o modo como o mutuante utiliza efetivamente os montantes antecipadamente reembolsados?

b)

Podem as disposições nacionais permitir ao mutuante calcular a indemnização devida pelo reembolso antecipado com base num reinvestimento fictício em títulos de mercado de capitais seguros, com prazo de vencimento congruente (o chamado método “ativo‑passivo”)?

3)

[Também se aplica o artigo 25.o da Diretiva 2014/17 a uma situação em que o consumidor], antes de reembolsar antecipadamente o crédito ao mutuante, rescinde o contrato [de crédito aos consumidores para um imóvel], no exercício de um direito de rescisão previsto pelo legislador nacional?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à terceira questão

25

Por meio da sua terceira questão, que importa examinar em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se o artigo 25.o da Diretiva 2014/17 deve ser interpretado no sentido de que também se aplica quando o consumidor cumpre antecipadamente as obrigações que lhe incumbem depois de ter rescindido o seu contrato de crédito aos consumidores para um imóvel de habitação, nas condições previstas pela regulamentação nacional.

26

Uma vez que o VR Bank sustenta, em substância, que esta questão é inadmissível pelo facto de não ser pertinente para efeitos da resolução do litígio no processo principal, basta constatar que a questão de saber se, e em que medida, o artigo 25.o da Diretiva 2014/17 se aplica a um caso como o que está em causa no processo principal diz respeito ao mérito da mesma questão e não à admissibilidade da mesma, pelo que há que rejeitar esta exceção de inadmissibilidade.

27

Importa lembrar que, em conformidade com o artigo 25.o, n.o 1, da Diretiva 2014/17, os Estados‑Membros asseguram que o consumidor tem o direito de cumprir total ou parcialmente as suas obrigações decorrentes de um contrato de crédito antes do termo desse contrato.

28

Ora, a este respeito, há que salientar que a Diretiva 2014/17 não estabelece nenhuma exigência relativa às modalidades, às condições e às consequências jurídicas de um direito de rescisão extraordinário do mutuário. Pelo contrário, conforme resulta do considerando 21 desta diretiva, a mesma não deverá afetar as disposições gerais do direito dos contratos nacional, nomeadamente as regras relativas à validade, à formação ou aos efeitos dos contratos, na medida em que os aspetos gerais do direito dos contratos não são regulados na Diretiva 2014/17.

29

Além disso, importa recordar que, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2014/17, lido à luz do seu considerando 7, os Estados‑Membros são livres de adotar, para efeitos de proteção dos consumidores, disposições mais restritivas, especialmente no que diz respeito à estrutura do mercado e aos participantes no mercado, às categorias de produtos disponíveis e às formalidades inerentes ao processo de concessão de crédito.

30

Todavia, quando adotam estas disposições mais restritivas, os Estados‑Membros são obrigados a assegurar o efeito útil da Diretiva 2014/17, e, mais especificamente, do artigo 25.o desta diretiva, tendo em conta o seu objeto (v., por analogia, Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Rust‑Hackner e o., C‑355/18 a C‑357/18 e C‑479/18, EU:C:2019:1123, n.os 55 e 62).

31

Ora, a este respeito, como resulta do considerando 66 da Diretiva 2014/17, o seu artigo 25.o tem por objetivo permitir que os consumidores cumpram as suas obrigações antes da data estipulada no contrato de crédito para que possam tirar o máximo partido do mercado interno, em especial comparando as ofertas a fim de encontrarem os produtos que mais bem satisfaçam as suas necessidades. Além disso, resulta dos considerandos 5 e 6 desta diretiva que, entre os objetivos desta última, figura o de garantir um nível elevado de proteção aos consumidores.

32

Nestas condições, como salienta o advogado‑geral nos n.os 82 e 83 das suas conclusões, o artigo 25.o da Diretiva 2014/17 reconhece aos consumidores um direito de reembolso antecipado, sem determinar as modalidades de exercício deste direito. Por conseguinte, embora caiba ao direito nacional determinar estas modalidades, seria, em contrapartida, contrário ao objetivo da referida diretiva considerar que a proteção que esta assegura ao consumidor depende da escolha que, se for caso disso, este último faz entre uma ou outra dessas modalidades, ou seja, exercer o seu direito à rescisão do contrato de crédito antes do reembolso antecipado, em conformidade com o direito nacional.

33

Tendo em consideração o exposto, há que responder à terceira questão que o artigo 25.o da Diretiva 2014/17 deve ser interpretado no sentido de que também se aplica quando o consumidor cumpre antecipadamente as obrigações que lhe incumbem depois de ter rescindido o seu contrato de crédito aos consumidores para um imóvel de habitação, nas condições previstas pela regulamentação nacional.

Quanto à primeira questão

34

Por meio da sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 25.o, n.o 3, primeiro período, da Diretiva 2014/17 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que, com vista à indemnização justa e objetiva dos eventuais custos diretamente associados ao reembolso antecipado, a que o mutuante tem direito por força desta disposição, tem em conta os lucros cessantes do mutuante diretamente suportados por este último devido a esse reembolso antecipado e, em especial, a perda dos juros contratuais que seriam devidos a título do empréstimo.

35

Conforme jurisprudência constante, para a interpretação de uma disposição de direito da União, há que ter em conta não só os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que faz parte [v., neste sentido, Acórdão de 24 de outubro de 2019, Autorità Garante della Concorrenza e del Mercato (Adjudicação por ajuste direto de um contrato de serviço público de transporte), C‑515/18, EU:C:2019:893, n.o 23].

36

A este respeito, importa recordar que, em conformidade com o artigo 25.o, n.o 3, da Diretiva 2014/17, os Estados‑Membros podem dispor que o direito do mutuante a uma indemnização justa e objetiva dos eventuais custos diretamente associados ao reembolso antecipado, sem impor, no entanto, outras indemnizações ao consumidor e sem exceder o prejuízo financeiro do mutuante. Além disso, os Estados‑Membros podem prever que a indemnização não pode exceder um determinado nível ou que seja autorizada apenas durante um determinado período.

37

Em primeiro lugar, no que respeita ao conceito de «eventuais custos diretamente associados ao reembolso antecipado», há que salientar que, embora o conceito de «custos» não remeta para um conteúdo unívoco, a análise do contexto em que se insere a disposição que o menciona fornece, por seu turno, indicações úteis para efeitos da sua interpretação.

38

Antes de mais, há que salientar que o artigo 25.o, n.o 3, segundo período, da Diretiva 2014/17, fixa o limite máximo da indemnização que pode ser paga ao mutuante em caso de reembolso antecipado do prejuízo financeiro sofrido por este. Como salientou o advogado‑geral, em substância, no n.o 29 das suas conclusões, este limite máximo tende a indicar que o legislador da União não pretendeu excluir que um eventual prejuízo financeiro relacionado com os juros que o mutuante não receberá devido ao reembolso antecipado possa ser tida em conta no âmbito do cálculo dessa indemnização.

39

Em seguida, a possibilidade, prevista no artigo 25.o, n.o 3, terceiro período, da Diretiva 2014/17, de os Estados‑Membros disporem que o mutuante só poderá beneficiar dessa indemnização por um determinado período não teria sentido se o cálculo da indemnização só pudesse ter em conta os custos administrativos adicionais suportados pelo mutuante devido ao reembolso antecipado, uma vez que esses custos administrativos surgem apenas uma vez e não se prolongam no tempo.

40

Por último, a referência feita no artigo 25.o, n.o 3, primeiro período, da Diretiva 2014/17, aos «eventuais» custos demonstra que o legislador da União não limitou a autorização dada aos Estados‑Membros para instituírem um regime de indemnização apenas dos custos de gestão administrativa do reembolso antecipado efetivamente suportados pelo mutuante, mas que este regime também pode cobrir os lucros cessantes cujo alcance ainda não esteja estabelecido no momento do reembolso antecipado do crédito.

41

Em segundo lugar, esta interpretação é confirmada pela sistemática do artigo 25.o da Diretiva 2014/17. Com efeito, primeiro, resulta do alcance da obrigação de informação do mutuante que o legislador da União partiu do princípio de que o direito a indemnização do mutuante, deixado à apreciação dos Estados‑Membros, pode incluir os lucros cessantes deste.

42

Assim, por um lado, o artigo 25.o, n.o 4, da Diretiva 2014/17 prevê a obrigação de o mutuante fornecer ao consumidor as informações necessárias que lhe permitam estudar a possibilidade de reembolsar antecipadamente o seu empréstimo. Daqui resulta que não está excluído que, em caso um reembolso semelhante, o consumidor tenha outras obrigações para com o mutuante além do reembolso do saldo do empréstimo. Do mesmo modo, o facto de esta disposição fazer referência aos «pressupostos utilizados» pelo mutuante demonstra que, em caso de reembolso antecipado, o cálculo da indemnização devida ao mutuante não se limita apenas ao pressuposto de o consumidor pagar os custos de gestão administrativa deste reembolso efetivamente suportados pelo mutuante.

43

Por outro lado, importa recordar que, de acordo como artigo 14.o, n.os 1 e 2, da Diretiva 2014/17, o mutuante é obrigado a prestar ao consumidor informações pré‑contratuais através da FINE, cujo modelo consta do anexo II, parte A desta diretiva. A secção 9 deste modelo FINE, intitulada «Reembolso antecipado», especifica as informações a prestar ao consumidor a este título, no caso de este reembolso impor ao consumidor o pagamento de «custos do reembolso antecipado».

44

Ora, o anexo II, parte B, secção 9, da referida diretiva especifica as instruções destinadas a completar a FINE no que, mais especificamente, diz respeito ao reembolso antecipado. Resulta destas instruções que o montante da indemnização pode depender de vários fatores, entre os quais «o montante reembolsado ou a taxa de juro em vigor no momento do reembolso antecipado». Estes elementos demonstram que o conceito de «indemnização» é suscetível de cobrir custos diferentes dos custos administrativos adicionais suportados pelo mutuante devido ao reembolso antecipado, uma vez que estes custos não deveriam normalmente depender da «taxa de juro em vigor». Além disso, em conformidade com este anexo II, parte B, secção 9, o mutuante deve chamar a atenção do consumidor, na secção relativa aos custos de reembolso antecipado da FINE, para «custos de reembolso antecipado ou outros custos a pagar pelo reembolso antecipado a título de compensação do mutuante», o que também tende a demonstrar que o conceito de «custos» em caso de reembolso antecipado pode cobrir outros custos, além destes custos administrativos adicionais.

45

Segundo, o artigo 16.o, n.o 4, alínea b), da Diretiva 2008/48, que fixa as condições em que os Estados‑Membros podem autorizar que seja excedido o limite máximo de indemnização previsto no artigo 16.o, n.o 2, da referida diretiva, dispõe que estes Estados podem prever o direito de o mutuante pedir excecionalmente uma indemnização superior a este limite se puder provar que a perda que sofreu por causa do reembolso antecipado excede o montante determinado nos termos desta última disposição. Isto demonstra, como salientou o advogado‑geral, em substância, nos n.os 54 e 55 das suas conclusões, que os juros que deixem de ser cobrados a partir do reembolso antecipado podem ser indemnizáveis e que o legislador da União considerou que o prejuízo financeiro do mutuante correspondente aos juros pode fazer parte dos eventuais custos incorridos pelo mesmo devido a este reembolso. A redação do artigo 25.o, n.o 3, da Diretiva 2014/17 não revela que o legislador da União tenha pretendido alterar esta situação no que respeita aos contratos de crédito aos consumidores para imóveis de habitação.

46

Em terceiro lugar, uma interpretação que excluísse a possibilidade de os Estados‑Membros preverem uma indemnização pelos lucros cessantes do mutuante em caso de reembolso antecipado seria contrária à finalidade da Diretiva 2014/17. Com efeito, o artigo 1.o desta diretiva prevê que a mesma se limita a estabelecer um quadro comum para regular determinados aspetos dos contratos de crédito para imóveis de habitação celebrados com consumidores, e o penúltimo período do considerando 66 da referida diretiva especifica que o cálculo da indemnização deve ser efetuado de acordo com as regras nacionais aplicáveis à indemnização. Assim, resulta do artigo 1.o e do artigo 25.o, n.o 3, da Diretiva 2014/17, lidos à luz do seu considerando 66, que o legislador da União deixou aos Estados‑Membros a opção de determinar os elementos de custos elegíveis, desde que se trate de uma indemnização justa e objetivamente justificada pelos custos diretamente relacionados com o reembolso antecipado do crédito, e desde que esta indemnização não constitua uma penalização e não exceda o prejuízo financeiro do mutuante.

47

Ora, como salientou o advogado‑geral, em substância, nos n.os 47 e 51 das suas conclusões, os objetivos da Diretiva 2014/17 não se limitam à vontade de garantir um elevado nível de proteção dos consumidores, mas também incluem a criação de um mercado interno dos contratos de crédito para imóveis de habitação simultaneamente eficiente e competitivo. Por conseguinte, o legislador nacional pode, tendo em conta a possibilidade que lhe é conferida de determinar os elementos de custos elegíveis que lhe é deixada, integrar entre os elementos da indemnização os lucros cessantes sofridos pelo mutuante, quando considere que tal é indispensável para promover os objetivos da Diretiva 2014/17 no seu próprio mercado de imóveis de habitação. Em especial, como especificou o advogado‑geral no n.o 50 das suas conclusões, no âmbito de um regime que não autoriza os mutuantes a serem indemnizados pela perda dos juros contratuais que seriam devidos a título do empréstimo, é concebível que estes optem por estratégias com efeitos potencialmente indesejáveis sobre os objetivos da Diretiva 2014/17, tal como a limitação da gama de produtos de crédito disponibilizados ou a cobrança de juros mais altos para todos os consumidores.

48

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à primeira questão que o artigo 25.o, n.o 3, primeiro período, da Diretiva 2014/17 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional que, com vista à indemnização do mutuante em caso de reembolso antecipado de um crédito aos consumidores para um imóvel de habitação, tem em conta os lucros cessantes do mutuante diretamente suportados por este último devido a este reembolso antecipado, e, em especial, o prejuízo financeiro sofrido por este mutuante, relacionado se for caso disso com os juros contratuais residuais que deixarão de ser recebidos, desde que se trate de uma indemnização justa e objetiva, que não seja imposta nenhuma penalização ao consumidor e que a indemnização não exceda este prejuízo financeiro.

Quanto à segunda questão

49

Por meio da sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 25.o, n.o 3, da Diretiva 2014/17 deve ser interpretado no sentido de que contém regras relativas ao cálculo do rendimento resultante do reinvestimento, pelo mutuante, dos fundos provenientes de um crédito aos consumidores para um imóvel de habitação reembolsado antecipadamente, que devem ser tidos em conta para a determinação dos seus lucros cessantes, e, sendo caso disso, se, por força destas regras, a regulamentação nacional deve nomeadamente ter em conta a forma como o mutuante utiliza efetivamente o montante reembolsado antecipadamente, e se, em caso afirmativo, uma regulamentação nacional pode autorizar o mutuante a calcular este prejuízo financeiro tomando em consideração a diferença entre a perda dos juros contratuais que seriam devidos a título do empréstimo e do rendimento fixo do montante reembolsado antecipadamente se fosse reinvestido em títulos de mercado de capitais seguros com um prazo de vencimento congruente com o empréstimo.

50

Em primeiro lugar, importa recordar que, como foi exposto no n.o 46 do presente acórdão, o facto de o considerando 66 da Diretiva 2014/17 fazer expressamente referência às disposições nacionais em matéria de indemnização indica que o artigo 25.o, n.o 3, primeiro e segundo períodos, da Diretiva 2014/17 se limita a prever que a indemnização deve ser justa e objetiva, cobrir apenas os danos diretos, não constituir uma penalização para o consumidor e não exceder o prejuízo financeiro do mutuante. De resto, esta diretiva não contém nenhuma outra indicação concreta relativa ao cálculo da eventual indemnização, sendo assim deixados à apreciação dos Estados‑Membros os pormenores deste cálculo.

51

Esta constatação é confirmada, por um lado, pelo artigo 25.o, n.o 3, primeiro e terceiro períodos, da Diretiva 2014/17, do qual resulta, nomeadamente, que os Estados‑Membros «podem dispor» as condições da indemnização. Por outro lado, resulta da secção 9 do modelo da FINE que consta do anexo II, parte A, da Diretiva 2014/17 que o mutuante deve indicar o montante ou, se tal não for possível, o método de cálculo dos custos do reembolso antecipado eventualmente devidos, o que pressupõe a existência potencial de vários métodos para calcular a indemnização de reembolso antecipado.

52

Em segundo lugar, no que respeita à questão de saber se a regulamentação nacional deve ter em conta a forma como o mutuante utiliza efetivamente o montante reembolsado antecipadamente, já foi indicado, no n.o 40 do presente acórdão, que a referência, no artigo 25.o, n.o 3, da Diretiva 2014/17, aos «eventuais» custos suportados pelo mutuante demonstra que o cálculo destes últimos não se deve necessariamente basear na utilização efetiva do montante reembolsado antecipadamente, mas que o método de cálculo destes custos pode também ter em conta os lucros cessantes do mutuante, cujo alcance ainda não esteja estabelecido no momento do reembolso antecipado do crédito. Como salientou o advogado‑geral, em substância, nos n.os 60 a 62 das suas conclusões, enquanto as exigências, previstas no artigo 25.o, n.o 3, primeiro e segundo períodos, da Diretiva 2014/17 forem respeitadas, o facto de se calcular a indemnização segundo um método que comporta um elemento hipotético não se opõe à Diretiva 2014/17.

53

Em terceiro lugar, no que respeita à admissibilidade do método dito «ativo‑passivo», cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se o cálculo do rendimento resultante do reinvestimento dos fundos provenientes de um crédito reembolsado antecipadamente com base num reinvestimento fixo em títulos no mercado de capitais seguros com o prazo de vencimento congruente respeita as exigências previstas no artigo 25.o, n.o 3, da Diretiva 2014/17, a saber, que se trata de uma indemnização justa e objetiva, que nenhuma penalização seja imposta ao consumidor e que a indemnização não exceda o prejuízo financeiro do mutuante.

54

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à segunda questão que o artigo 25.o, n.o 3, da Diretiva 2014/17 deve ser interpretado no sentido de que, em caso de reembolso antecipado de um crédito aos consumidores para um imóvel de habitação, os Estados‑Membros devem assegurar que o cálculo, pelo mutuante, dos seus lucros cessantes tendo em conta o rendimento fixo do montante reembolsado antecipadamente conduza a que a indemnização seja justa e objetiva, que não exceda o prejuízo financeiro do mutuante e que não seja imposta ao consumidor nenhuma penalização. A Diretiva 2014/17 não exige que este cálculo tenha em conta a forma como o mutuante utiliza efetivamente o montante reembolsado antecipadamente.

Quanto às despesas

55

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

 

1)

O artigo n.o 25 da Diretiva 2014/17/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 4 de fevereiro de 2014, relativa aos contratos de crédito aos consumidores para imóveis de habitação e que altera as Diretivas 2008/48/CE e 2013/36/UE e o Regulamento (UE) n.o 1093/2010,

deve ser interpretado no sentido de que:

também se aplica quando o consumidor cumpre antecipadamente as obrigações que lhe incumbem depois de ter rescindido o seu contrato de crédito aos consumidores para um imóvel de habitação, nas condições previstas pela regulamentação nacional.

 

2)

O artigo 25.o, n.o 3, primeiro período, da Diretiva 2014/17

deve ser interpretado no sentido de que:

não se opõe a uma regulamentação nacional que, com vista à indemnização do mutuante em caso de reembolso antecipado de um crédito aos consumidores para um imóvel de habitação, tem em conta os lucros cessantes do mutuante diretamente suportados por este último devido a este reembolso antecipado, e, em especial, o prejuízo financeiro sofrido por este mutuante, relacionado se for caso disso com os juros contratuais residuais que deixarão de ser recebidos, desde que se trate de uma indemnização justa e objetiva, que não seja imposta nenhuma penalização ao consumidor e que a indemnização não exceda este prejuízo financeiro.

 

3)

O artigo 25.o, n.o 3, da Diretiva 2014/17

deve ser interpretado no sentido de que:

em caso de reembolso antecipado de um crédito aos consumidores para um imóvel de habitação, os Estados‑Membros devem assegurar que o cálculo, pelo mutuante, dos seus lucros cessantes tendo em conta o rendimento fixo do montante reembolsado antecipadamente conduza a que a indemnização seja justa e objetiva, que não exceda o prejuízo financeiro do mutuante e que não seja imposta ao consumidor nenhuma penalização. A Diretiva 2014/17 não exige que este cálculo tenha em conta a forma como o mutuante utiliza efetivamente o montante reembolsado antecipadamente.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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