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Document 52020AE5343

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões “Estratégia para a sustentabilidade dos produtos químicos — Rumo a um ambiente sem substâncias tóxicas”» [COM(2020) 667 final]

EESC 2020/05343

JO C 286 de 16.7.2021, p. 181–189 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

16.7.2021   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 286/181


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões “Estratégia para a sustentabilidade dos produtos químicos — Rumo a um ambiente sem substâncias tóxicas”»

[COM(2020) 667 final]

(2021/C 286/30)

Relatora:

Maria NIKOLOP OULOU

Correlator:

John COMER

Consulta

Comissão Europeia, 28.10.2020

Base jurídica

Artigo 192.o, n.o 1, e artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

Competência

Secção da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente

Adoção em secção

15.4.2021

Adoção em plenária

27.4.2021

Reunião plenária n.o

560

Resultado da votação

(votos a favor/votos contra/abstenções)

242/1/7

1.   Conclusões e recomendações

1.1.

O CESE apoia o objetivo da Comissão de promover a transição para um ambiente sem substâncias tóxicas e assegurar que os produtos químicos sejam produzidos de forma a maximizar o seu contributo positivo para a sociedade e reduzir o seu impacto ambiental.

1.2.

É necessário definir que utilizações de produtos químicos são «essenciais», bem como delinear claramente uma metodologia para a produção de produtos químicos «concebidos para serem seguros e sustentáveis». Neste contexto, frisamos que cumpre identificar, avaliar e classificar, do modo mais abrangente, inequívoco e simplificado, as «substâncias que suscitam preocupação» para permitir a adaptação da indústria.

1.3.

O CESE felicita a Comissão pela sua visão de que a UE deve ser pioneira a nível mundial na produção e utilização de produtos químicos seguros e sustentáveis e salienta a importância de assegurar condições de concorrência equitativas nos acordos de comércio internacionais para as empresas, e de adotar medidas a favor de uma transição justa para todos os cidadãos da UE.

1.4.

Para que a estratégia seja executada com êxito, é necessário o envolvimento das pessoas e da indústria, formas de pensar inovadoras, bem como transparência e participação na tomada de decisões.

1.5.

A estratégia visa alargar a abordagem genérica da gestão dos riscos aos produtos de consumo que contêm produtos químicos perigosos, como substâncias cancerígenas e mutagénicas ou desreguladores endócrinos. No entanto, para facilitar a adaptação da indústria, é necessário assegurar o equilíbrio entre as avaliações de risco genéricas e específicas.

1.6.

O CESE apela para que seja obrigatória uma rotulagem adequada e coerente, com aplicação efetiva a toda a cadeia de abastecimento, nomeadamente os produtos que contêm nanomateriais.

1.7.

O CESE congratula-se com os esforços realizados no sentido de reforçar a autonomia estratégica da UE, especialmente em termos de produtos químicos utilizados nas aplicações no domínio da saúde, espera que sejam envidados esforços semelhantes noutros setores e solicita que seja ponderada uma revisão da política industrial da UE com o objetivo de relocalizar parte da produção de produtos químicos essenciais para os países da UE.

1.8.

O CESE sublinha a importância de combater a falta de dados disponíveis sobre os produtos químicos, a fim de fomentar a inovação e a confiança dos consumidores e permitir a realização de avaliações de impacto adequadas. É fundamental dispor de bases de dados acessíveis e fiáveis, a fim de obter resultados de investigação que permitam rever os direitos de propriedade intelectual e industrial e as patentes que restringem o acesso aos dados, e reforçar o princípio de «ausência de dados, ausência de mercado».

1.9.

O CESE considera que abordar a questão das misturas químicas constitui um passo importante na avaliação dos riscos dos produtos químicos. No entanto, é crucial intensificar a investigação e o desenvolvimento para colmatar as lacunas de conhecimentos atuais e avançar na avaliação e na gestão das misturas químicas.

2.   Proposta da Comissão

2.1.

A estratégia em apreço é uma oportunidade para conciliar o valor dos produtos químicos para a sociedade com a saúde humana e os limites do planeta, respondendo às aspirações legítimas dos cidadãos da UE a um nível elevado de proteção contra produtos químicos perigosos, bem como para promover a indústria da UE como pioneira a nível mundial na produção e utilização de produtos químicos seguros e sustentáveis.

2.2.

Para a luta por um ambiente sem substâncias tóxicas, é estabelecida uma nova hierarquia na gestão dos produtos químicos, que passa, designadamente, pela utilização de produtos químicos seguros e sustentáveis, a minimização ou substituição das substâncias que suscitam preocupação, com efeitos crónicos na saúde humana e no ambiente, e a eliminação progressiva das mais nocivas cuja utilidade não seja essencial para a sociedade, em especial as presentes em produtos de consumo.

Figura

A hierarquia sem substâncias tóxicas — uma nova hierarquia na gestão dos produtos químicos

Image 1

2.3.   A estratégia centra-se em cinco objetivos principais:

2.3.1.

Inovação direcionada para produtos químicos seguros e sustentáveis na UE. As medidas propostas incluem, entre outras, a definição de critérios europeus para produtos químicos seguros e sustentáveis desde a conceção; a introdução de requisitos legais relativos à presença de substâncias que suscitam preocupação nos produtos, através da iniciativa sobre produtos sustentáveis, e a introdução de alterações na legislação da UE em matéria de emissões industriais para promover a utilização de produtos químicos mais seguros pela indústria europeia.

2.3.2.

Reforço do quadro jurídico da UE para fazer face às preocupações prementes em matéria de ambiente e de saúde. As ações propostas neste sentido visam a proteção dos consumidores e dos trabalhadores, evitando a presença de produtos químicos mais nocivos em todos os produtos de consumo, como, por exemplo, os materiais em contacto com os alimentos, brinquedos, artigos de puericultura, cosméticos, detergentes, mobiliário e têxteis. Será dedicada uma atenção especial aos produtos químicos que podem causar cancro ou mutações genéticas, afetar os sistemas reprodutivo e endócrino ou ser persistentes e bioacumuláveis. Tal abordagem aplicar-se-á também aos produtos químicos que afetam os sistemas imunitário, neurológico ou respiratório e os que são tóxicos para um órgão específico. Enquanto não for aplicada a abordagem genérica da gestão dos riscos, será dada prioridade às substâncias com todos os perigos acima enunciados no estabelecimento de restrições para todas as utilizações e por agrupamento, em vez de as regulamentar uma a uma.

2.3.3.

Simplificação e consolidação das medidas para melhorar o quadro jurídico. A proposta inclui o estabelecimento de um processo do tipo «uma avaliação por substância» para coordenar a avaliação dos perigos ou riscos dos produtos químicos em toda a legislação aplicável a esses produtos e o reforço da governação da Agência Europeia dos Produtos Químicos, bem como da sustentabilidade do seu modelo de financiamento. Além disso, a estratégia propõe alterações específicas ao Regulamento relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição dos produtos químicos (REACH) e ao Regulamento relativo à classificação, rotulagem e embalagem de substâncias perigosas (CRE), que devem ser realizadas em conformidade com os princípios da iniciativa «Legislar Melhor» e sujeitas a avaliações, incluindo avaliações de impacto, conforme apropriado.

2.3.4.

Criação de uma base de conhecimentos abrangente sobre produtos químicos. Está prevista a criação de um sistema de alerta rápido e ação em matéria de produtos químicos, a fim de assegurar que as políticas da UE abordam os riscos químicos emergentes assim que estes são identificados pela monitorização e investigação; além disso, será criado um quadro de indicadores para monitorizar os fatores e os impactos da poluição química e medir a eficácia da legislação no domínio dos produtos químicos.

2.3.5.

Dar o exemplo para uma boa gestão dos produtos químicos a nível mundial. As ações propostas visam apoiar o reforço das capacidades de países terceiros em matéria de avaliação e gestão dos produtos químicos e assegurar que os produtos químicos perigosos proibidos na UE não são produzidos para exportação.

3.   Observações na generalidade

3.1.

Nos últimos cinquenta anos, os produtos químicos tornaram-se elementos centrais da nossa forma de vida, dando um contributo positivo para a nossa cultura e para o progresso da sociedade em geral, com a sua população crescente. Paralelamente, os produtos químicos — tanto sintéticos como naturais — podem ter propriedades perigosas que representam um risco para a saúde humana e o ambiente.

Apesar disso, a humanidade está cada vez mais dependente destes produtos. De acordo com a ONU, a produção de produtos químicos crescerá a um ritmo sete vezes mais rápido do que a população mundial entre 1990 e 2030.

3.2.

O objetivo louvável de um ambiente sem substâncias tóxicas deve reunir o consenso de todos e, não obstante a dificuldade da sua concretização, ser prosseguido sem desculpas. O CESE aplaude a intenção da Comissão de criar, para esse efeito, uma mesa-redonda de alto nível com a participação de todas as partes interessadas.

3.3.

Continuam a verificar-se fugas de grandes quantidades de produtos químicos perigosos para o ambiente, de várias fontes, tais como as descargas de águas residuais domésticas e industriais tratadas e não tratadas, os aterros, a incineração e os processos de fabrico, etc., e tais fugas podem disseminar-se no ar, no solo e na água, onde causam danos graves (1).

3.4.

Existem muitos problemas persistentes decorrentes da contaminação química. Por exemplo, os éteres difenílicos polibromados (PBDE) e outros retardadores de chama migram facilmente dos produtos a que são adicionados, como a espuma de poliuretano, e contaminam o ar e as poeiras. Embora muitos PBDE nocivos tenham sido proibidos, estes permanecem no ambiente devido à sua persistência e utilização extensiva.

3.5.

Quando substituímos estes produtos químicos perigosos, temos de ter a certeza de que o impacto da substituição representa uma melhoria significativa. Por exemplo, o biodiesel de óleo de palma, que contribui para a desflorestação, pode ter um impacto mais negativo no ambiente do que a utilização de combustíveis fósseis.

3.6.

Além disso, os reguladores devem estar sensibilizados para o problema e evitar as tentativas de substituição de um produto químico perigoso por produtos químicos que tenham propriedades perigosas semelhantes. Por exemplo, as substâncias perfluoroalquiladas e polifluoroalquiladas (PFAS) devem ser tratadas como um grupo, e não numa base individual. Estudos recentes sugerem que algumas alternativas às PFAS utilizadas no passado podem não ser mais seguras do que estas (2).

3.7.

O CESE está preocupado com o facto de as ações de descontaminação tendentes ao restabelecimento da saúde humana e do ambiente não serem suficientes, em especial no que se refere a produtos químicos essenciais para os quais ainda não existem alternativas sem substâncias tóxicas ou as alternativas que existem requerem um processo de desenvolvimento a longo prazo, bem como no que respeita aos produtos químicos que têm sido progressivamente eliminados e que continuam a suscitar grande preocupação devido à sua persistência no ambiente. Uma vez que ainda existem grandes esforços para adotar estratégias de descontaminação, o CESE aguarda com expectativa o próximo plano de ação para a poluição zero.

3.8.

O CESE solicita que a utilização de rotulagem adequada e coerente seja obrigatória para toda a cadeia de abastecimento em relação aos produtos que contenham nanomateriais (brinquedos, biocidas, vestuário, pesticidas, medicamentos, tintas, artigos de puericultura, etc.) e que o cumprimento dessa obrigação seja controlado.

3.9.

O CESE também se questiona sobre se o calendário proposto para a realização das várias ações em paralelo será realista e viável, tendo em conta a necessidade da indústria de se adaptar à transição de forma gradual, evitando consequências graves do ponto de vista social e económico. Além disso, impõe-se um reforço das capacidades das autoridades, fator essencial para o êxito da aplicação das políticas revistas planeadas.

3.10.

Alguns aspetos não são contemplados ou não estão suficientemente explicados na estratégia, tais como o balanço energético estimado da transição química proposta e as consequências para os trabalhadores e para as grandes e pequenas empresas na Europa. Os Fundos Europeus Estruturais e de Investimento devem consagrar recursos financeiros para assegurar uma execução eficaz da estratégia.

4.   Observações na especialidade

4.1.   Inovação direcionada para produtos químicos seguros e sustentáveis na UE

4.1.1.

Existe um consenso de que a transição para a aplicação de critérios para produtos químicos seguros e sustentáveis desde a conceção é um imperativo social e económico, com vista a facilitar a transição ecológica e digital da indústria europeia. Constituirá um desafio enorme, e a investigação necessária representa potencialmente um grande encargo financeiro e proporcionará algumas vantagens competitivas. No entanto, o processo poderá provocar perdas económicas e de postos de trabalho, uma vez que nem todas as empresas poderão ter capacidade para se adaptar nem todos os trabalhadores para se requalificar ou melhorar as suas competências. Por conseguinte, são necessárias medidas financeiras e de incentivo para assegurar uma transição justa, especialmente para os trabalhadores manterem o seu emprego ou terem uma alternativa viável, bem como para apoiar investimentos e modelos de negócio inovadores.

4.1.2.

Não são especificadas medidas para garantir a plena adaptação dos trabalhadores, tais como incentivos e financiamento para a realização de formação com vista à requalificação e à especialização, a fim de evitar perdas de postos de trabalho. A forma como a distribuição geográfica dos setores da indústria determinará o impacto da estratégia é outra questão que suscita preocupação. As indústrias localizadas em zonas periféricas devem ser tidas em consideração, bem como a elevada percentagem de PME que participam no setor.

4.1.3.

O conceito de produtos químicos «seguros e sustentáveis desde a conceção» que será desenvolvido suscita reservas entre as partes interessadas. Por este motivo, a sua definição e as competências adequadas para impulsionar a sua produção devem envolver os critérios de todos os atores pertinentes.

4.1.4.

O processo de registo, avaliação e autorização de produtos químicos é complexo e exige especialização, o que, por vezes, constitui um desafio para as PME e implica normalmente elevados custos administrativos e de conformidade. A fim de facilitar o cumprimento dos processos de registo e de gestão regulamentar dos riscos no âmbito do Regulamento REACH e do Regulamento CRE, o processo deve ser simplificado ou a formação para não especialistas pode ser incentivada.

4.1.5.

A adoção de processos e tecnologias industriais novos e mais limpos reduzirá a pegada ambiental do fabrico de produtos químicos, melhorará a preparação para o mercado e contribuirá para a consecução dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e a aplicação do Pacto Ecológico Europeu. A adoção de orientações de avaliação e a partilha de boas práticas em matéria de conceção e aplicação de tecnologias e processos industriais mais limpos tornariam essa transição possível. Há que ter em conta as melhores tecnologias disponíveis.

4.1.6.

A Comissão visa minimizar a presença de substâncias que suscitam preocupação nos materiais reciclados, introduzindo requisitos e informações sobre a composição química e a utilização segura no âmbito da iniciativa para uma politica de sustentabilidade dos produtos. No que concerne aos materiais recicláveis, não deveria ser possível a utilização prolongada de produtos químicos perigosos em concentrações mais elevadas (3). Cumpre identificar, avaliar e classificar, do modo mais abrangente, inequívoco mas também simplificado, as «substâncias que suscitam preocupação» para permitir a adaptação da indústria.

4.1.7.

As medidas propostas aumentarão a confiança dos consumidores e produtores nos produtos reciclados. A falta de informações adequadas sobre a composição química dos produtos fabricados a partir de materiais reciclados constitui um problema, e as restrições relacionadas com a proteção de dados podem criar dificuldades neste domínio.

4.1.8.

A estratégia anuncia um aumento do investimento em tecnologias inovadoras. Trata-se de uma excelente oportunidade para promover a investigação no domínio da valorização dos resíduos industriais, nomeadamente dos resíduos da indústria agroalimentar, cujo forte potencial foi travado por investimento insuficiente.

Contudo, a questão dos requisitos legais aplicáveis aos produtos resultantes da valorização de resíduos da produção agroalimentar é praticamente negligenciada tanto na Estratégia do Prado ao Prato como na Estratégia para a Sustentabilidade os Produtos Químicos. Por exemplo, a presença de resíduos farmacêuticos em estrume animal tratado para fertilização, a reutilização de águas residuais tratadas para a irrigação de plantações e a presença de resíduos de produtos farmacêuticos e de pesticidas, herbicidas e inseticidas em resíduos alimentares otimizados são questões que suscitam especial preocupação, uma vez que estas substâncias bioativas podem disseminar-se no ambiente, desencadeando efeitos adversos nos ecossistemas. Por conseguinte, é fundamental identificar, avaliar e regulamentar essas substâncias. As populações humanas podem ser afetadas não só através da exposição mas também do consumo, dado que estas substâncias apresentam uma capacidade de bioacumulação e de bioamplificação ao longo da cadeia alimentar.

4.1.9.

As substâncias consideradas como preocupantes geram confusão entre as partes interessadas. Para compreender o impacto desta medida nos ciclos de matérias atuais, seria útil esclarecer que tipo de requisitos serão introduzidos e especificar o calendário da execução.

4.1.10.

O balanço energético estimado da transição proposta no domínio dos produtos químicos é motivo de preocupação. Tendo em conta que as principais transformações exigidas para a obtenção de ciclos de matérias ecológicos são processos fortemente endotérmicos (por exemplo, separação, reciclagem, descontaminação, conversão química), é expectável que se verifique um aumento da procura energética. Além disso, a pegada de carbono do fabrico de produtos químicos tem de ser reduzida, uma vez que este processo consome normalmente muita energia.

4.1.11.

O hidrogénio apresenta um forte potencial para a concretização desse objetivo, não só como fonte de energia mas também como redutor químico em processos específicos (por exemplo, para substituir o carbono como redutor). No entanto, as pilhas de hidrogénio continuam a basear-se na platina, que tem custos elevados e um forte impacto ambiental. É necessário que a investigação fundamental no campo da química encontre alternativas para a platina.

4.1.12.

A Comissão prevê aumentar a resistência da oferta e da sustentabilidade dos produtos químicos utilizados em aplicações essenciais para os cidadãos da União, diminuindo a dependência da UE e reforçando a prospetiva estratégica em matéria de produtos químicos. O aumento da resistência dos produtos químicos utilizados nas aplicações no domínio da saúde representará um avanço considerável para o mercado e o setor europeus dos produtos químicos utilizados na saúde. Cumpre saber de que forma estas medidas se aplicariam a outros produtos químicos de utilização essencial.

4.1.13.

Os produtos fabricados com matérias-primas importadas de países terceiros, por exemplo, o ETR, obtidos através de atividades de exploração de minérios que representam riscos para o ambiente e para a saúde, tornaram-se essenciais para várias tecnologias modernas, desde sistemas de defesa, telemóveis e televisões a lâmpadas LED e turbinas eólicas. Por conseguinte, coloca-se a questão de saber que estratégias serão adotadas para combater a dependência de outras substâncias essenciais, cujos processos de produção dependem de fornecimentos de países terceiros.

4.1.14.

Além disso, o CESE tem dúvidas de que a abordagem em matéria de «segurança e sustentabilidade desde a conceção» possa aplicar-se aos fornecedores de países terceiros, que têm a sua própria legislação em matéria de produtos químicos. Dado que os limites destes critérios aplicáveis à produção dos produtos químicos ainda não foram estabelecidos, não é claro se o princípio e as medidas de avaliação se aplicarão às fontes de matérias-primas, independentemente da sua origem. A Comissão não esclarece de que forma as medidas propostas se ligarão entre si e se articularão com as diferentes políticas em vigor nos países terceiros envolvidos nas cadeias de valor dos produtos químicos da UE.

4.1.15.

O CESE propõe, por conseguinte, que a estratégia industrial da UE seja revista e que seja ponderada a criação de incentivos para o regresso da produção de produtos químicos aos países da UE. Esta medida, além de promover a autonomia estratégica da UE, permitirá criar emprego de qualidade e facilitará a execução da estratégia para os produtos químicos.

4.2.   Reforço do quadro jurídico da UE para fazer face às preocupações em matéria de ambiente e de saúde

4.2.1.

O CESE acolhe favoravelmente o objetivo da Comissão de alargar a abordagem genérica à gestão dos riscos. No entanto, dado que alguns produtos serão restringidos, é necessário assegurar a coerência entre as avaliações de riscos genéricas e específicas em todos os produtos químicos, de modo a permitir que a indústria se adapte gradualmente.

4.2.2.

O CESE congratula-se igualmente com o recurso ao agrupamento para abordar a regulamentação relativa às PFAS e concorda que poderá ser necessário intensificar a adoção de estratégias de agrupamento para aumentar a eficiência e a eficácia da legislação (4).

4.2.3.

A estratégia proporá novas classes e critérios de perigo no âmbito do Regulamento CRE, a fim de abordar plenamente a toxicidade, a persistência, a mobilidade e a bioacumulação no ambiente. É importante que a avaliação dos efeitos adversos dos produtos químicos no ambiente e a atribuição de diferentes classes de perigo aos produtos químicos sejam efetuadas de forma abrangente e transparente. Os critérios de classificação devem ser definidos de forma pormenorizada, a fim de antecipar potenciais reservas relativamente a outros produtos em desenvolvimento.

4.2.4.

A introdução dos desreguladores endócrinos, das substâncias persistentes, móveis e tóxicas e das substâncias muito persistentes e muito móveis como categorias de substâncias que suscitam elevada preocupação (SVHC) exige uma apreciação e avaliação abrangentes e transparentes. Além disso, é necessária uma maior coerência entre as SVHC identificadas no Regulamento REACH e noutros atos legislativos da UE (por exemplo, a Diretiva-Quadro Água).

4.2.5.

A estratégia centra-se principalmente nos desreguladores endócrinos e nas substâncias perfluoroalquiladas e polifluoroalquiladas, mas também aborda certos pesticidas, biocidas, produtos farmacêuticos, metais pesados, plastificantes e retardadores de chama como sendo substâncias perigosas. No entanto, quase não é feita referência a outros produtos químicos que suscitam preocupação, tais como os nanomateriais. Embora estejam incluídas no Regulamento REACH, a revisão da definição está pendente e a sua regulamentação continua a ser insuficiente (por exemplo, a falta de regulamentação relativa à libertação de nanomateriais para o ambiente, a ausência de restrições à sua colocação no mercado, a transparência e a criação de um registo da UE para garantir a sua rastreabilidade desde o fabrico até aos consumidores).

4.2.6.

Tendo em conta as evidências amplamente documentadas dos riscos associados a certas famílias de substâncias, a UE não só deve restringir mas até mesmo proibir a utilização de desreguladores endócrinos já identificados, como o bisfenol e os ftalatos; o mesmo aplica-se aos produtos químicos sem utilidade nutricional presentes em produtos alimentares, como os nanomateriais.

4.2.7.

As medidas tendentes a promover e a facilitar a substituição das SVHC e de outros compostos perigosos poderiam ser aplicadas com recurso a um mecanismo financeiro (bónus/málus).

4.2.8.

A atenção especial dada às misturas representa um importante passo em frente na avaliação de riscos das substâncias químicas que suscitam preocupação, e o CESE congratula-se com o facto de a estratégia abordar tanto as misturas voluntárias como as involuntárias. No entanto, as lacunas ainda existentes em matéria de conhecimentos sobre a toxicidade e a exposição a misturas e o elevado número de produtos químicos em utilização conduzem a propostas como a utilização sistemática do fator de avaliação da mistura para produtos químicos isolados, a fim de abordar misturas involuntárias. A fiabilidade do fator de avaliação da mistura na avaliação dos riscos químicos suscita preocupação, uma vez que não se trata de um fator específico de cada cenário. Por conseguinte, o CESE subscreve convictamente as prioridades e recomendações em matéria de investigação e desenvolvimento enunciadas no relatório [SWD (2020) 250 (5)], a fim de avaliar e gerir eficazmente as misturas de produtos químicos.

4.3.   Simplificação e consolidação do quadro jurídico

4.3.1.

O CESE apoia fortemente que se considere a abordagem «uma avaliação por substância» enquanto método eficiente de avaliação da segurança dos produtos químicos.

4.3.2.

A adoção de tal abordagem simplificará e acelerará o processo de aprovação, beneficiando os produtores e facilitando a investigação e o desenvolvimento de substâncias alternativas sem toxinas. No entanto, os diferentes efeitos da mesma substância em diferentes circunstâncias e também em misturas não devem ser ignorados.

4.3.3.

Cerca de 30 % dos alertas emitidos sobre produtos perigosos presentes no mercado estão relacionados com riscos devidos a produtos químicos e apenas um terço dos processos de registo das substâncias químicas registadas pela indústria ao abrigo do Regulamento REACH estão plenamente conformes com os requisitos de informação.

4.3.4.

O CESE aplaude a abordagem de tolerância zero em relação ao incumprimento e as medidas propostas para reforçar a aplicação e o cumprimento da legislação em matéria de produtos químicos. O CESE recomenda vivamente que o princípio da «ausência de dados, ausência de mercado» seja devidamente aplicado, a fim de evitar a existência de produtos e substâncias químicas não regulamentados nos mercados.

4.3.5.

Além disso, os dados sobre produtos químicos aprovados no mercado devem ser atualizados a intervalos regulares pelos registantes desses produtos, uma vez que o Regulamento REACH é insuficiente em determinados aspetos. De acordo com o relatório sobre a avaliação de substâncias químicas (6), 64 % das substâncias avaliadas (126 de 196) não dispunham de informações que demonstrassem a segurança dos produtos químicos comercializados na Europa.

4.3.6.

Quase 90 % dos produtos considerados perigosos são importados de países terceiros. Prevê-se que a produção mundial de produtos químicos continue a aumentar. É provável que a UE e os países da OCDE se concentrem no desenvolvimento e fabrico de produtos químicos tecnologicamente avançados, como produtos químicos especializados e associados às ciências da vida. A África, o Médio Oriente e a Ásia produzirão provavelmente grandes volumes de produtos químicos de base. Esta situação suscitará enormes problemas na UE em termos de controlos nas fronteiras e de competitividade económica. Os acordos de comércio livre deverão prever medidas para garantir condições de concorrência equitativas para as empresas da UE.

4.3.7.

O CESE congratula-se com as medidas destinadas a reforçar os controlos fronteiriços da UE e a cooperação com as plataformas de venda direta em linha.

4.4.   Uma base de conhecimentos abrangente sobre produtos químicos

4.4.1.

Tendo em conta que a UE ainda não dispõe de uma base de informações abrangente sobre todas as substâncias, as propostas de medidas tendentes a melhorar a disponibilidade de dados sobre produtos químicos são bem-vindas, desde que sejam eficazes.

4.4.2.

Do ponto de vista da indústria, o questionável sistema de patentes impossibilita a revelação de todos os aspetos dos produtos patenteados presentes no mercado.

4.4.3.

Do ponto de vista científico, a limitada prática de uma ciência aberta e gratuita constitui um entrave ao livre intercâmbio dos conhecimentos e à conjugação de esforços e de investimentos. A disponibilidade de todas as informações relevantes sobre os produtos químicos, e, consequentemente, a inovação, é limitada atualmente por regras relativas à proteção de dados científicos e direitos de propriedade intelectual e industrial insuficientemente fundamentados.

4.4.4.

Os conflitos em matéria de acessibilidade de dados devem ser abordados e solucionados com a inclusão de medidas tendentes a alargar a base de dados disponíveis e a melhorar a sua qualidade. Por exemplo, poderia ser criado um mecanismo para incentivar as indústrias que importam nanomateriais para a produção a financiarem investigação independente sobre o risco dos nanomateriais, domínio em que falta conhecimento científico.

4.4.5.

A Comissão tem por objetivo continuar a fomentar a investigação e a (bio)monitorização para compreender e prevenir os riscos inerentes aos produtos químicos e impulsionar a inovação no domínio da avaliação de riscos dos produtos químicos e da ciência regulatória.

4.4.6.

Cabe também assegurar a participação dos trabalhadores e o apoio financeiro à otimização das boas práticas, tanto na transferência de conhecimentos industriais como científicos, a fim de facilitar a inovação através da investigação e tornar as bases de dados fiáveis, livres e facilmente acessíveis. Além disso, importa assegurar que o acesso à inovação esteja disponível para todos as partes interessadas na indústria química da UE.

4.4.7.

O CESE acolhe com agrado as medidas para fomentar a inovação no domínio dos ensaios de segurança e da avaliação de risco dos produtos químicos visando a redução dos ensaios em animais, em especial tendo em conta os avanços na investigação e os novos métodos de vanguarda desenvolvidos (por exemplo, ensaios in vitro) que melhorarão a qualidade, a eficiência e a rapidez das avaliações de risco dos produtos químicos.

4.4.8.

É essencial assegurar uma maior transparência na tomada de decisões. Vários assuntos importantes são debatidos em reuniões à porta fechada, o que suscita confusão entre os cidadãos europeus sobre as medidas adotadas pela UE para limitar a sua exposição a produtos químicos perigosos. Além disso, os dados em bruto que servem de base às avaliações e à tomada de decisões (ECHA e EFSA) (7) devem estar disponíveis. É necessário assegurar uma maior transparência das decisões e posições dos Estados-Membros em relação às substâncias químicas no mercado.

4.5.   Dar o exemplo para uma boa gestão dos produtos químicos a nível mundial

4.5.1.

Tendo em conta o impacto global da estratégia, o CESE constata com satisfação que, entre as medidas propostas pela Comissão para promover normas de segurança e sustentabilidade fora da UE, figura o compromisso de assegurar que os produtos químicos perigosos proibidos na UE não sejam produzidos para exportação. No entanto, continua a não ser claro como poderão os restantes textos legislativos que se prevê elaborar e harmonizar aplicar-se a nível mundial. A proibição de produtos para exportação pode afetar a indústria de outros países aos quais não se aplica a ambição da estratégia para os produtos químicos. Não é claro como serão tratados os efeitos sobre as indústrias de países terceiros, enquanto antigos produtores e exportadores de um produto específico.

4.6.   Utilização excessiva de produtos químicos nos cuidados de saúde

O CESE considera que deveria haver muito mais investigação no domínio do desenvolvimento de políticas de prevenção de doenças com uma ênfase especial no sistema imunitário. O objetivo deve ser a promoção de uma atitude positiva, favorável a um estilo de vida saudável que permita às pessoas utilizarem menos tratamentos baseados em produtos químicos, quando apropriado. Todos os tratamentos com produtos químicos devem destinar-se às pessoas para as quais são essenciais, evitando o uso excessivo.

4.7.   Produtos químicos na agricultura

4.7.1.

É necessário reduzir os impactos negativos, no ambiente, dos pesticidas utilizados na agricultura sem causar um declínio na qualidade da produção alimentar nem comprometer a segurança alimentar na UE.

4.7.2.

A atual Aliança Europeia de Investigação, que tem por missão pesquisar e testar alternativas orgânicas para produtos químicos sintéticos utilizados na agricultura, tem de ser financiada de forma adequada. O investimento deve centrar-se na investigação sobre pesticidas orgânicos biológicos. O reforço do apoio financeiro deve visar igualmente a promoção da investigação e da inovação no domínio dos promotores de crescimento das plantas e dos produtos fitofarmacêuticos de base natural. Por exemplo, a bioatividade inerente a certos compostos naturais metabolizados por rizóbios pode ser utilizada como agente de proteção das plantas contra organismos patogénicos externos.

4.7.3.

Uma utilização muito mais precisa dos fertilizantes químicos é desejável, prática essa que deverá contribuir para uma menor utilização destes produtos. É necessária mais investigação com vista a desenvolver alternativas que permitam manter uma produção agrícola adequada e assegurar um rendimento condigno para os agricultores.

4.7.4.

É necessário efetuar mais avaliações dos riscos para o ambiente e para a saúde, a fim de avaliar se a biotecnologia e a engenharia genética poderão dar um contributo positivo para o desenvolvimento de alternativas para os fertilizantes químicos e pesticidas.

4.7.5.

Se não forem apresentadas alternativas viáveis, uma redução significativa do uso de pesticidas implicará um aumento dos custos de produção e/ou conduzirá a rendimentos mais baixos. Por conseguinte, as questões dos encargos económicos a suportar pelos produtores e pelos consumidores e da importação de alimentos de países terceiros têm de ser analisadas.

4.7.6.

A nova Estratégia de Biodiversidade da UE para 2030 é muito ambiciosa, pois prevê a transformação de, pelo menos, 30 % do território europeu numa rede de áreas ativamente geridas e protegidas. Deverá contribuir de forma significativa para a biodiversidade e a recuperação da natureza, bem como para a aplicação da Estratégia para a Sustentabilidade dos Produtos Químicos no setor agrícola.

4.7.7.

Neste sentido, devem ser envidados esforços especiais para reforçar a proteção da biodiversidade e, em especial, dos insetos polinizadores dos pesticidas. Por exemplo, o documento de orientação da EFSA sobre a avaliação dos riscos dos produtos fitofarmacêuticos para as abelhas apresenta grandes lacunas. Deveria integrar os dados sobre toxidade crónica, os efeitos dos pesticidas nas larvas e os dados sobre a toxicidade aguda para as abelhas e outros insetos polinizadores.

4.7.8.

Para que a estratégia para os produtos químicos seja executada com êxito, é necessário um apoio significativo do público em geral, bem como uma verdadeira mudança cultural na abordagem dos cidadãos europeus à utilização dos produtos químicos, às alterações climáticas e à poluição ambiental.

Bruxelas, 27 de abril de 2021.

A Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Christa SCHWENG


(1)  Joyce Msuya, diretora-adjunta do Programa das Nações Unidas para o Ambiente.

(2)  Alerta de notícias da UE 517, 22/11/18.

(3)  Parecer do CESE «Aplicação da legislação ambiental da UE: qualidade do ar, água e resíduos» (JO C 110 de 22.3.2019, p. 33).

(4)  «EC Study for the strategy for a non-toxic environment of the 7th Environment Action Programme» [Estudo da Comissão para a estratégia para um ambiente sem substâncias tóxicas do Sétimo Programa de Ação em matéria de Ambiente].

(5)  «Commission Progress report on the assessment and management of combined exposures to multiple chemicals (chemical mixtures) and associated risks» [Relatório da Comissão sobre os progressos realizados na avaliação e gestão das exposições combinadas a vários produtos químicos (misturas) e riscos associados].

(6)  Gabinete Europeu do Ambiente: https://eeb.org/chemical-evaluation-report-achievements-challenges-and-recommendations-after-a-decade-of-reach/

(7)  Acrónimos: ECHA (Agência Europeia dos Produtos Químicos) & EFSA (Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos).


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