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Document 52012IE1049

    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Cooperativas e reestruturações (parecer de iniciativa)

    JO C 191 de 29.6.2012, p. 24–29 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    29.6.2012   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 191/24


    Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Cooperativas e reestruturações (parecer de iniciativa)

    2012/C 191/05

    Relatora: Marie ZVOLSKÁ

    Correlator: Jan OLSSON

    Em 14 de julho de 2011, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do artigo 29.o, n.o 2, do Regimento, elaborar um parecer de iniciativa sobre

    Cooperativas e reestruturações.

    Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Comissão Consultiva das Mutações Industriais emitiu parecer em 12 de abril de 2012, sendo relatora Marie ZVOLSKÁ e correlator Jan OLSSON.

    Na 480.a reunião plenária de 25 e 26 de abril de 2012 (sessão de 25 de abril), o Comité Económico e Social Europeu adotou, por 148 votos a favor e 1 abstenção, o seguinte parecer:

    1.   Conclusões e recomendações

    1.1

    Pela sua própria natureza e pelo modelo de negócios que proporcionam, as cooperativas contribuem para a Estratégia Europa 2020. Gerem a mudança de uma forma economicamente eficiente e socialmente responsável. Contribuem para a coesão social e territorial. Organizam modelos de negócio novos e inovadores com vista a aumentar a competitividade. Todos estes fatores deverão ser colocados em evidência em 2012, o Ano Internacional das Cooperativas.

    1.2

    Com a exceção notável de alguns setores, as cooperativas representam uma parte limitada da economia europeia. No entanto, os dados apresentados no presente parecer indicam que, em tempos de crise, as cooperativas são mais resistentes e estáveis do que outras modalidades empresariais e desenvolvem novas iniciativas empresariais. Isto pode ser atribuído à especificidade das empresas cooperativas: a sua estratégia a longo prazo, as suas sólidas raízes territoriais, a sua promoção dos interesses dos membros e a sua orientação para a cooperação entre si. É importante divulgar e desenvolver a excelência cooperativa referida nas políticas nacionais e da UE.

    1.3

    A diversidade empresarial é reconhecida pelo Tratado e as especificidades do modelo empresarial cooperativo foram recentemente reconhecidas pelo Tribunal de Justiça Europeu (Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 8 de setembro de 2011 – Processos apensos C-78/08 a C-80/08), legitimando as políticas que lhes são destinadas.

    Recomendações dirigidas às políticas da UE

    1.4

    As cooperativas devem, por conseguinte, ser tidas em conta em todas as políticas da UE, contribuindo para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo, bem como nas iniciativas emblemáticas pertinentes da Estratégia Europa 2020. Há que garantir a equidade de condições entre as cooperativas e outros tipos de empresas, salvaguardando os objetivos e métodos de trabalho das primeiras.

    1.5

    A fim de sublinhar a experiência particular das cooperativas na restruturação, as sociedades cooperativas devem participar nos objetivos e ações da política industrial da UE, incluindo a iniciativa emblemática específica.

    1.6

    A Comissão Europeia e o BEI/FEI deverão garantir que os mecanismos financeiros ao nível da UE, incluindo o plano de ação de financiamento das PME sugerido no «Ato para o Mercado Único», sejam também acessíveis pelas sociedades cooperativas, devendo envidar esforços concretos, em conjunto com o setor bancário, para verificar se é efetivamente esse o caso, identificando igualmente instrumentos específicos. O papel de intermediário dos instrumentos financeiros do BEI para os pequenos bancos cooperativos deve ser mais facilitado, em particular através de requisitos administrativos simplificados.

    1.7

    As novas regras relativas aos contratos públicos e aos auxílios estatais («pacote Almunia») devem entrar em vigor assim que possível. Estas regras, bem como a sua aplicação nos Estados-Membros, devem ser simplificadas e incorporar medidas específicas, a fim de melhorar as oportunidades das cooperativas sociais que empregam pessoas portadoras de deficiência ou de outros grupos desfavorecidos. Devem igualmente abranger a experiência das cooperativas que administram propriedades confiscadas em resultado de atividades ilegais (por ex., as propriedades da máfia italiana).

    1.8

    Deverão ser tomadas medidas com vista a facilitar a transmissão de empresas aos trabalhadores, na sequência da proposta do CESE de criação de um quadro favorável à participação financeira dos trabalhadores. As cooperativas de trabalhadores/aquisições pelos trabalhadores (worker buy-outs) deverão ser apoiadas por uma rubrica orçamental específica da UE, que inclua igualmente instrumentos financeiros.

    1.9

    Os programas e fundos estabelecidos para o próximo período de programação da UE 2014-2020 devem tornar-se instrumentos importantes de apoio às cooperativas, em particular os fundos estruturais. Ao definir os programas operacionais, as prioridades e as medidas deverão concentrar-se no apoio ao desenvolvimento empresarial sustentável e à reestruturação responsável e incluir medidas como a transmissão de empresas aos trabalhadores, cooperativas sociais, desenvolvimento local e inovação social, através de subvenções globais e outros instrumentos financeiros.

    1.10

    O CESE solicita a adoção de um regulamento simplificado relativo ao Estatuto da Sociedade Cooperativa Europeia no decurso de 2012. Isto deverá ser complementado por uma atualização da forma de aplicar os princípios do cooperativismo nas legislações nacionais.

    1.11

    O CESE insta a Eurofound (Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho) e, em particular, o seu Observatório Europeu da Mudança, a analisarem detalhadamente o papel das cooperativas na reestruturação, em colaboração com o setor cooperativo.

    1.12

    O próximo programa de investigação da UE Horizonte 2020 deve também incluir referências específicas ao estudo dos fatores subjacentes à capacidade de resistência das cooperativas.

    1.13

    Tendo em conta os seus objetivos e modelos de gestão, as cooperativas são partes interessadas naturais na iniciativa em favor do empreendedorismo social recentemente lançada pela Comissão Europeia. As ações-chave propostas devem, portanto, ter também como alvo o setor cooperativo. Uma questão premente é ter em conta a experiência das cooperativas em instrumentos financeiros adaptados, também na recente proposta para um fundo europeu de empreendedorismo social.

    Recomendações dirigidas às políticas dos Estados-Membros

    1.14

    Em consonância com a Recomendação 193/2002 da OIT sobre a promoção das cooperativas, os Estados-Membros devem criar um ambiente favorável ao reconhecimento e ao desenvolvimento de cooperativas em todos os domínios e setores e adotar uma política abrangente para apoiar o modelo empresarial cooperativo. Deverão promover, em particular, a educação e formação de estudantes e trabalhadores, melhorar as estatísticas tendo em vista identificar e tornar o setor cooperativo mais visível, modernizar a legislação relativa às cooperativas, introduzir os instrumentos financeiros apropriados e reconhecer o papel das cooperativas no diálogo social nacional. Deverão analisar a possibilidade de introduzir, na sua legislação, as reservas indivisíveis ou o regime de bloqueio de ativos (asset lock) para as cooperativas, que já existem em muitos Estados-Membros da UE e se têm revelado um instrumento importante de desenvolvimento.

    1.15

    O CESE recomenda aos CES nacionais que adotem pareceres no quadro do Ano Internacional das Cooperativas.

    Recomendações dirigidas às cooperativas

    1.16

    As cooperativas deverão tornar-se mais visíveis e reforçar a aprendizagem mútua, quer no interior do movimento cooperativo, quer fora dele. A nível interno, devem centrar-se na «cooperação entre cooperativas», elaborar diretrizes e proceder com determinação à divulgação de boas práticas, prestando especial atenção à gestão da mudança e, a nível externo, empenhar-se em parcerias com outras empresas privadas, autoridades públicas e outros atores.

    1.17

    Os relatórios de responsabilidade social cooperativa (responsabilidade social da empresa de uma forma cooperativa) devem constituir um instrumento importante para a visibilidade e a promoção. O setor cooperativo deve também estabelecer regras de boa governação e de auditoria interna rigorosa, a fim de evitar abusos da forma de cooperativa.

    2.   Introdução

    2.1

    O objeto do presente parecer é salientar a forma como as sociedades cooperativas, devido ao seu modelo empresarial próprio, antecipam e gerem a mudança nos setores da indústria e dos serviços no contexto da crise atual, sendo o impacto no emprego particularmente acentuado, como assinalado pelos relatórios recentes da OIT. Pretende-se aumentar a sensibilização para o papel das cooperativas como uma forma de sociedade que traz novas perspetivas de inovação social e que contribui para a geração e distribuição sustentáveis da riqueza.

    2.2

    O modelo empresarial cooperativo centra-se nas pessoas. A Aliança Cooperativa Internacional (ACI) definiu, com o reconhecimento de diversas instituições internacionais (ONU, OIT, UE), a sociedade cooperativa como «uma associação autónoma de pessoas que se unem voluntariamente para satisfazer aspirações e necessidades económicas, sociais e culturais comuns através de uma empresa de propriedade comum e democraticamente gerida».

    2.2.1

    O parecer contribuirá também para os trabalhos em curso da CCMI sobre a reestruturação (1).

    2.3

    A identidade cooperativa é reforçada pelos valores da democracia, da igualdade, da equidade, da solidariedade, da transparência e da responsabilidade social. A ACI definiu sete princípios a observar pelas cooperativas: «a adesão voluntária; o poder democrático exercido pelos membros; a participação económica dos membros; a autonomia e a independência; a educação, a formação e a informação; a cooperação entre cooperativas e o compromisso com a coletividade».

    2.4

    O modelo empresarial cooperativo está em plena harmonia com os valores do Tratado da UE e com os objetivos da Estratégia Europa 2020. Ao perseguirem tanto objetivos económicos como sociais, as cooperativas são uma parte indispensável da «economia social de mercado».

    2.5

    As cooperativas visam um objetivo de longo prazo, a saber, a consecução da sustentabilidade económica e social através da capacitação das pessoas, antecipando a mudança e otimizando a utilização dos recursos. Os seus lucros não são utilizados para maximizar a remuneração do capital, mas sim para distribuir benefícios que permitam um investimento sustentável.

    2.6

    Estando centradas nas pessoas e sendo controladas pelos membros, as sociedades cooperativas possuem um forte enraizamento local. Algo que não está em contradição com a sua capacidade de operar em mercados nacionais e internacionais.

    2.7

    A flexibilidade e a criatividade do método cooperativo permitiram às cooperativas operar em todos os setores da economia, tanto tradicionais como novos.

    2.8

    Existem, na Europa, 160 000 sociedades cooperativas, propriedade de 123 milhões de membros, que proporcionam emprego a 5,4 milhões de pessoas.

    2.9

    A forma cooperativa de sociedade não é muito conhecida, quer entre os cidadãos em geral, quer entre as empresas privadas e setores da administração pública. Nalguns países, a expressão «cooperativa» tem inclusivamente uma conotação pejorativa, em especial nos países da Europa Central e Oriental. As sociedades cooperativas não são reconhecidas como empresas de pleno direito, à semelhança das empresas convencionais. Em alguns Estados-Membros, os obstáculos ao desenvolvimento de cooperativas têm mesmo vindo a aumentar nos últimos anos (por ex., na Polónia, onde uma tentativa de nova legislação sobre cooperativas procurou reduzir a autonomia e a independência daquelas, e em Itália, onde as vantagens fiscais para compensar o papel social das cooperativas foram muito reduzidas).

    2.10

    O acesso a capital de risco e ao crédito no mercado de capitais é difícil para as cooperativas.

    2.11

    Nem sempre existem condições equitativas, uma vez que as características específicas das cooperativas não são tidas em consideração na legislação nacional e europeia e nos programas de apoio às empresas.

    3.   Os desafios da reestruturação empresarial na Europa

    3.1

    Testemunhamos atualmente uma reestruturação em grande escala da economia europeia, em consequência da crise. São essenciais estratégias de reestruturação socialmente responsáveis que permitam evitar novos encerramentos e falências de empresas, preservar e criar emprego e organizar a assistência social, aumentando a competitividade e o desenvolvimento local.

    3.2

    A Comissão Europeia considera que a reestruturação implica uma conceção mais ampla de inovação empresarial, que deve ser «parte integrante de uma visão de longo prazo do desenvolvimento e orientação da economia europeia, a fim de garantir que as mudanças realmente sejam uma forma de reforçar a sua competitividade», incluindo padrões organizacionais e sociais, de modo a assegurar um desenvolvimento territorial sustentável. Para este efeito, a Comissão considera a inovação como sendo «gerada não só através da investigação e tecnologia, mas também através de novas soluções de marketing e gestão».

    3.3

    A Comissão Europeia observou que «as empresas capazes de lidar com a reestruturação de uma forma socialmente responsável são frequentemente as que registam melhores resultados em termos de competitividade e resistência no mercado» (2).

    3.3.1

    A Comissão manifestou igualmente o desejo de que uma reestruturação responsável inclua o envolvimento e a participação dos trabalhadores (3). Os parceiros sociais a nível da UE estabeleceram os princípios de uma reestruturação «socialmente inteligente» num texto conjunto que coloca a ênfase na importância de se criarem e salvarem postos de trabalho.

    3.4

    A Comissão pretende facilitar as condições para a transmissão de empresas aos trabalhadores:

    «Apesar de os trabalhadores terem um interesse particular na sustentabilidade das suas empresas e, frequentemente, um bom conhecimento da empresa em que trabalham, faltam-lhes muitas das vezes os meios financeiros e os apoios adequados para adquirirem e gerirem uma empresa. A preparação cuidadosa e gradual das transmissões para os trabalhadores organizados em cooperativas pode melhorar as taxas de sobrevivência» (4). «Se não for encontrado nenhum sucessor no seio da família, a transmissão aos empregados garante, em larga medida, a continuidade da empresa». No entanto, «são poucos os Estados-Membros que incentivam este tipo de transmissão por via de reduções fiscais específicas sobre o rendimento (…) (5)

    3.5

    A Comissão incentivou os Estados-Membros a desenvolverem um quadro para a transmissão de empresas aos trabalhadores com base em boas práticas para evitar encerramentos. Exemplos são o pagamento único (pago unico) em Espanha, e a Legge Marcora em Itália, que permite que os subsídios de desemprego financiem novas sociedades cooperativas.

    4.   A especificidade da economia cooperativa: resistência e novos desenvolvimentos também em tempos de crise

    4.1

    Em tempos de crise, as sociedades cooperativas revelam maior resistência do que as empresas convencionais. Esta constatação é especialmente válida no que se refere aos bancos cooperativos, às cooperativas de trabalhadores nos setores da indústria e dos serviços, às cooperativas sociais e às cooperativas constituídas por PME. O modelo empresarial cooperativo está a surgir também em novos setores (energia, profissões liberais, etc.). A reestruturação abriu um espaço adicional para que as cooperativas contribuam para um verdadeiro pluralismo da economia e, em particular, das empresas quando se procuram modelos mais sustentáveis de produção e consumo.

    4.2

    De acordo com o relatório da OIT sobre a resistência do modelo empresarial cooperativo em tempos de crise, as cooperativas financeiras permanecem financeiramente sólidas, as cooperativas de consumidores registam um aumento dos respetivos volumes de negócio, e as cooperativas de trabalhadores registam crescimento, à medida que as pessoas optam pela forma empresarial da cooperativa para responder às novas realidades económicas.

    4.3

    Isto é especialmente patente no setor bancário. Na UE, não se registou ainda qualquer falência de um banco cooperativo. Os dados da Associação Europeia de Bancos Cooperativos mostram que estes possuem uma quota de mercado de cerca de 20 % dos depósitos. Financiam cerca de 29 % das PME na Europa. Têm vindo progressivamente a aumentar a sua quota de mercado nos últimos anos. No Reino Unido, os bancos cooperativos quadruplicaram as suas quotas de mercado de 1,2 % em 2009 para 5 % em 2010. Em Itália, o sistema BCC – Banche di credito cooperativo – aumentou em 49 % os seus depósitos nos últimos cinco anos, em 60 % os seus empréstimos e em 17 % o seu nível de emprego (ao passo que no restante setor bancário italiano o nível de emprego diminuiu 5 %). Em Chipre, segundo a autoridade para a supervisão e desenvolvimento de sociedades cooperativas, as instituições de crédito cooperativas reforçaram as suas quotas de mercado em 2011 (de 35 % para 38 % em depósitos, de 27 % para 29 % em empréstimos), confirmando que os cipriotas consideram essas instituições um porto seguro em tempos de crise.

    4.4

    O Fundo Monetário Internacional (Redesigning the Contours of the Future Financial System (Redefinir os contornos do futuro sistema financeiro) – Nota sobre a posição do FMI, 16 de agosto de 2010, SPN/10/10) salienta o papel essencial dos bancos cooperativos: «os bancos cooperativos ou as instituições mutualistas de menor envergadura também conseguem prosperar. Estes bancos, menos dependentes das expectativas dos acionistas, conseguiram, em geral, evitar muitos dos erros cometidos pelas instituições de maior porte do setor privado. Embora nem sempre sejam vistos como as instituições mais eficientes, vibrantes e inovadoras, em numerosos países respondem de forma fiável e segura às necessidades de crédito das pequenas e médias empresas e de muitos agregados familiares».

    4.5

    A Cecop – Confederação Europeia dos Trabalhadores de Cooperativas, Cooperativas Sociais, e Empresas Sociais e Participadas nos domínios da indústria e serviços – observa, desde 2009, os efeitos da crise nas empresas da sua rede. As cooperativas em países com um forte nível de implantação e experiência no que respeita às cooperativas (França, Itália, Espanha) parecem ser mais resistentes face à crise do que as empresas convencionais com atividade nos mesmos setores e nos mesmos territórios.

    4.6

    Diferentes tipos de cooperativas sociais desempenham um importante papel no processo de reestruturação e têm sido os principais instigadores da inovação social. As cooperativas de integração no trabalho empregam muitas pessoas que foram despedidas e que não conseguiriam regressar ao mercado de trabalho tradicional. Em alguns países, as cooperativas sociais são os maiores empregadores de pessoas com deficiência (por ex., na Bulgária, República Checa, Polónia, Itália, etc.). As cooperativas de prestação de serviços sociais participam na reestruturação do setor público. Um fenómeno específico novo são as cooperativas italianas que administram as propriedades confiscadas em resultado de atividades ilegais.

    4.7

    Num setor gravemente atingido pela crise, as cooperativas de habitação mostram-se muito mais resistentes do que o setor privado, medido pelo nível de produção de habitações novas. Estão igualmente mais fortemente empenhadas em reduzir as emissões de gases com efeito de estufa aumentando a eficiência energética. Este papel é particularmente importante nalguns países da União Europeia, nos quais estão a ser levados a cabo grandes projetos de renovação de cooperativas, frequentemente financiados pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, como acontece, por exemplo, na República Checa e na Polónia.

    4.8

    Um breve panorama de alguns países europeus mostra os desempenhos relativamente superiores das sociedades cooperativas no que se refere ao crescimento, emprego, taxas de sobrevivência, criação de novas empresas (ver em particular: Zevi A., Zanotti A., Soulage F. e Zelaia A. (2011), Beyond the crisis: Cooperatives, Work, Finance (Para além da crise: Cooperativas, Trabalho, Finanças), Publicações Cecop, Bruxelas 2011).

    4.8.1

    Em 2009, o volume de negócios das cooperativas do Reino Unido cresceu 10 %, numa altura em que a economia britânica sofria uma contração de 4,9 %. Em 2010, o setor cooperativo continuou a crescer 4,4 % em comparação com uma taxa de crescimento do conjunto da economia britânica de 1,9 %. O número de cooperativas no Reino Unido tem vindo a aumentar de forma constante, com um crescimento de 9 % em 2010. Regista-se um crescimento das cooperativas em todos os setores da economia.

    4.8.2

    Na Alemanha, o setor cooperativo está em expansão, particularmente nos domínios da energia, das PME e dos cuidados de saúde. Nos últimos três anos, registou-se um aumento extraordinário em novas cooperativas: 370 em 2011, 289 em 2010, 241 em 2009 (Genossenschaften in Deustchland do DZ-Bank). Segundo o relatório DGRV Geschäftsbericht 2010, com base em dados fornecidos pelo Creditreform-Datenbank, em 2010, apenas 0,1 % das insolvências foram declaradas por sociedades cooperativas, o valor mais baixo entre todas as formas de empresa. No entanto, tem também sido afirmado que a adesão a uma cooperativa reduz muito o risco de falência individual das diversas empresas-membro.

    4.8.3

    Em França, a taxa de sobrevivência das cooperativas de trabalhadores após três anos é de 74 % em comparação com a média nacional de 66 %. Entre 2000 e 2009, 329 empresas foram convertidas em cooperativas de trabalhadores. Mais de 250 delas sobreviveram. Os números relativos a 2010 confirmaram a tendência de crescimento observada, em particular, nos últimos três anos. Realizaram-se mais de 50 novas conversões (Relatório Anual CG SCOP 2010).

    4.8.4

    Em Itália, o emprego em cooperativas cresceu 3 % em 2010 contra uma queda de 1 % no total do emprego privado. A crise no bem-estar social tem provocado um crescimento rápido do número de cooperativas sociais. A maioria das novas cooperativas são novas empresas (start-ups), mas aproximadamente uma em cada quatro são empresas derivadas (spin-offs), promovidas por outras cooperativas. As cooperativas têm uma esperança de vida mais longa. Um terço das cooperativas criadas em 1970-1989 ainda está em atividade, contra um quarto das restantes empresas. A «mortalidade» é menor: 4 % das cooperativas encerraram entre 2006 e 2009, em comparação com mais de 6 % no caso das outras empresas. A falência foi a causa mais dramática dos encerramentos, afetando 2‰ das cooperativas em 2009, contra 6‰ no caso das restantes empresas. O emprego nas cooperativas, medido por tipo de contrato de trabalho, é menos precário. Seis por cento dos trabalhadores recentemente recrutados têm contratos de trabalho temporários, contra 11 % noutras empresas. Foi proporcionada formação a 40 % do pessoal em cooperativas, em comparação com uma média nacional de 26 %.

    4.8.5

    No caso de Espanha, país que tem sido particularmente atingido pela crise, a diminuição dos postos de trabalho em 2008 e 2009 foi de 4,5 % no setor cooperativo, em comparação com 8 % no caso das empresas convencionais. No entanto, em 2010, as cooperativas de trabalhadores aumentaram o número dos seus postos de trabalho em 0,2 % enquanto o nível de emprego total diminuiu 3,2 % nas empresas convencionais.

    4.8.6

    A situação em alguns países é semelhante à descrita. Por exemplo, na Suécia, o número de cooperativas em fase de arranque tem sido proporcionalmente maior do que o de outras empresas novas. A «taxa de mortalidade» das cooperativas é menor do que a das empresas convencionais. O movimento cooperativo em Chipre também está em crescimento, e o governo sublinha que o seu contributo para a melhoria da sociedade em termos económicos e sociais é de importância vital.

    5.   A forma como a mudança é gerida pelas cooperativas

    5.1

    O modelo de gestão específico das cooperativas, assente na propriedade comum, na participação democrática e no controlo pelos membros, bem como a capacidade de as cooperativas contarem com seus próprios recursos financeiros e redes de apoio, explica por que motivo as cooperativas são mais flexíveis e inovadoras na gestão da reestruturação ao longo do tempo, bem como na criação de novos negócios.

    5.2

    Uma das características essenciais de uma empresa cooperativa é a visão de longo prazo. A crise veio reforçar o uso de estratégias de longo prazo para proporcionar sustentabilidade económica e social aos seus membros. Uma sociedade cooperativa sacrificará o rendimento do capital, com vista a manter o emprego e o investimento.

    5.3

    Outra das características essenciais da sua gestão é o facto de as cooperativas estarem enraizadas no território em que exercem a sua atividade. Ao contrário do setor privado, não procedem a deslocalizações, o que não é incompatível com a globalização.

    5.4

    Devido a esse enraizamento local, o papel das cooperativas em zonas rurais assume uma importância cada vez maior, promovendo o desenvolvimento sustentável local, criando novos empregos e, dessa forma, perseguindo objetivos de interesse geral. Na medida em que a reestruturação se realiza ao nível local, a experiência das cooperativas é importante para encontrar as soluções necessárias. Nas zonas rurais, mantêm as atividades económicas e sociais, reduzindo assim a migração.

    5.5

    A sua implantação territorial e a sua ênfase nos interesses dos membros (famílias ou pequenas empresas) explicam por que razão os bancos cooperativos têm tido desempenhos bastante positivos durante a crise financeira. Os bancos cooperativos têm também mantido uma aposta muito forte no financiamento sustentável e socialmente responsável. Os efeitos da sua conduta têm vindo a ser reforçados pela transferência, por parte da clientela, dos seus depósitos e empréstimos de bancos privados para os bancos cooperativos.

    5.6

    As cooperativas salvaguardam o emprego mediante um modelo de mobilidade interna conjugada com segurança no emprego. As cooperativas sociais e de trabalhadores preferem ajustar os níveis salariais ou o número de horas de trabalho, em vez de reduzirem postos de trabalho. Sempre que possível, têm internalizado atividades que anteriormente eram externalizadas. A segurança no emprego tem sido reforçada através da partilha de postos de trabalho disponíveis entre as empresas de um mesmo grupo ou rede de cooperativas. O modelo de criação de segurança para os trabalhadores durante o processo de transição assenta na formação profissional, uma vez que as cooperativas colocam a ênfase no desenvolvimento dos recursos humanos.

    5.7

    As cooperativas desenvolveram ao longo dos tempos diversas modalidades para cooperarem permanentemente entre si, tanto através de organizações representativas a todos os níveis como através de diferentes organizações empresariais como grupos, consórcios e cooperativas de segundo grau. Nos últimos anos e décadas, observa-se uma forte consolidação desta tendência, com uma correlação comprovada entre o aumento das cooperativas e o desenvolvimento das instituições que as interligam.

    5.8

    O potencial das organizações representativas é bem ilustrado pelo exemplo italiano. Itália caracteriza-se pela existência de várias associações intersetoriais de cooperativas. Todos os tipos de cooperativas (de trabalhadores, consumidores, agrícolas, etc.) são membros de uma dessas associações. Este padrão facilitou a criação de estruturas económicas comuns entre os vários setores, que são fatores de grande importância. As possibilidades de transferência de recursos humanos e financeiros, bem como de experiências, de um setor para outro, permitem a muitas sociedades e setores cooperativos resistir inclusivamente nos momentos mais difíceis.

    5.9

    Os grupos, consórcios e cooperativas de segundo grau permitem às empresas individuais manter-se de pequena dimensão, aproveitando simultaneamente as vantagens das economias de escala. Itália é um bom exemplo de consórcios nos setores da construção e dos serviços e no domínio das cooperativas sociais, que contribuem substancialmente para o desenvolvimento de cooperativas pequenas e novas. Noutros países como a Suécia existem também pequenos consórcios de cooperativas sociais. Existem grupos cooperativos importantes noutros setores como na agricultura, na indústria transformadora, no setor bancário e de distribuição em vários outros países da UE, tais como França, Alemanha, Espanha e Países Baixos, entre outros.

    5.10

    O grupo espanhol Mondragón é um excelente exemplo da forma como diversas sociedades cooperativas podem, numa base voluntária, constituir-se em autênticos grupos empresariais que incluem indústria, agricultura, distribuição, finanças, I&D e ensino superior. Um aspeto marcante do grupo Mondragón é a capacidade de manter o emprego em setores industriais globalizados e de levar a cabo uma reestruturação permanente de produtos, processos e serviços de pós-venda, através das suas plataformas industriais em todo o mundo e de um triângulo de inovação que engloba as empresas industriais, os centros universitários e de I&D do grupo.

    5.11

    As PME também se organizam em cooperativas, seguindo a mesma lógica de aumentar a sua capacidade empresarial. Esta experiência foi muito bem-sucedida, por exemplo, na Alemanha, onde as cooperativas de pequenas empresas são significativas, em comércios como padarias, talhos, etc.

    5.12

    Estão a surgir novos fenómenos para dar resposta às necessidades de certos grupos. As cooperativas formadas por médicos na Alemanha, mencionadas anteriormente, são um bom exemplo. Em Itália, em particular, a geração mais recente de profissionais altamente especializados está a voltar-se para o modelo da sociedade cooperativa para explorar oportunidades de mercado, o que lhes permite combinar o seu trabalho por conta própria com uma forma empresarial coletiva. Em Itália, foi aprovada recentemente uma lei sobre as profissões liberais, como parte do pacote global de reformas económicas, que apoia essas iniciativas.

    5.13

    As chamadas «Cooperativas de Atividade e de Emprego» têm vindo a ser criadas em França e, em menor medida, na Bélgica e na Suécia. Estas permitem que os desempregados se tornem trabalhadores por conta própria, organizando não só as suas atividades comerciais, mas também a sua formação profissional e segurança social no âmbito de uma sociedade cooperativa.

    5.14

    Em geral, as cooperativas não obtêm grande quantidade de capitais dos seus membros, e o acesso ao mercado de capitais não é fácil. As cooperativas desenvolveram os seus próprios mecanismos de financiamento. Geralmente, as quotas dos membros das cooperativas não são transferíveis e os lucros não são utilizados para remunerar o capital, sendo normalmente reinvestidos na empresa sob a forma de reservas, o que reflete a sua estratégia a longo prazo: é do interesse dos seus membros evitar riscos excessivos e investir em atividades que respondam diretamente às suas necessidades.

    5.15

    Em alguns países da UE, como França, Espanha e Itália, estas reservas são indivisíveis, ou seja, não podem ser repartidas entre os membros mesmo em caso de liquidação, devendo antes ser utilizadas para o desenvolvimento do movimento cooperativo. As reservas indivisíveis são comprovadamente um forte travão contra a desmutualização.

    5.16

    Foram introduzidas disposições legais nalguns países com vista a permitir que terceiros proporcionem capital de risco, com e sem direito de voto, a cooperativas (por ex., socio sovventore na Lei italiana 59/1992), tendo sido criadas instituições especiais para esse fim (por ex., em Itália, os Fundos de Desenvolvimento de Cooperativas (Fondi mutualistici) e a Cooperazione Finanza Impresa (CFI), em França a IDES e em Espanha as estruturas de investimento do Grupo Mondragón). Isso veio possibilitar também às cooperativas melhorar o seu diálogo com outras instituições financeiras.

    Bruxelas, 25 de abril de 2012

    O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

    Staffan NILSSON


    (1)  COM(2012) 7. «Reestruturação e antecipação da mudança: que lições tirar da experiência recente?».

    (2)  COM(2005) 120. «Reestruturações e emprego – Antecipar e acompanhar as reestruturações para desenvolver o emprego: O papel da União Europeia».

    (3)  COM(2001) 366. «Promoção de um enquadramento europeu para a responsabilidade social das empresas».

    (4)  COM(2004) 18. «Promoção das cooperativas na Europa».

    (5)  COM(2006) 117. “Realizar o programa comunitário de Lisboa em prol do crescimento e do emprego – Transmissão de empresas – Continuidade pela renovação”.


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