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Documento 62014CJ0397

Acórdão do Tribunal de Justiça (Segunda Secção) de 14 de abril de 2016.
Polkomtel sp. z o.o. contra Prezes Urzędu Komunikacji Elektronicznej.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Sąd Najwyższy.
Reenvio prejudicial — Redes e serviços de comunicações eletrónicas — Diretiva 2002/22/CE — Artigo 28.° — Números não geográficos — Acesso dos utilizadores finais que residem no Estado‑Membro do operador aos serviços que utilizam números não geográficos — Diretiva 2002/19/CE — Artigos 5.°, 8.° e 13.° — Poderes e responsabilidades das autoridades reguladoras nacionais no que diz respeito ao acesso e à interligação — Imposição, modificação ou supressão das obrigações — Imposição de obrigações às empresas que controlam o acesso aos utilizadores finais — Controlo dos preços — Empresa que não dispõe de um poder de mercado significativo — Diretiva 2002/21/CE — Resolução dos litígios entre empresas — Decisão da autoridade reguladora nacional que fixa as condições de cooperação e as modalidades de tarifário aplicáveis aos serviços entre empresas.
Processo C-397/14.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2016:256

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção)

14 de abril de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Redes e serviços de comunicações eletrónicas — Diretiva 2002/22/CE — Artigo 28.o — Números não geográficos — Acesso dos utilizadores finais que residem no Estado‑Membro do operador aos serviços que utilizam números não geográficos — Diretiva 2002/19/CE — Artigos 5.°, 8.° e 13.° — Poderes e responsabilidades das autoridades reguladoras nacionais no que diz respeito ao acesso e à interligação — Imposição, modificação ou supressão das obrigações — Imposição de obrigações às empresas que controlam o acesso aos utilizadores finais — Controlo dos preços — Empresa que não dispõe de um poder de mercado significativo — Diretiva 2002/21/CE — Resolução dos litígios entre empresas — Decisão da autoridade reguladora nacional que fixa as condições de cooperação e as modalidades de tarifário aplicáveis aos serviços entre empresas»

No processo C‑397/14,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Sąd Najwyższy (Tribunal Supremo, Polónia), por decisão de 15 de maio de 2014, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 20 de agosto de 2014, no processo

Polkomtel sp. z o.o.

contra

Prezes Urzędu Komunikacji Elektronicznej,

sendo interveniente:

Orange Polska S.A., anteriormente Telekomunikacja Polska S.A.,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Segunda Secção),

composto por: M. Ilešič, presidente da Segunda Secção, C. Toader, A. Rosas, A. Prechal e E. Jarašiūnas (relator), juízes,

advogado‑geral: Y. Bot,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Polkomtel sp. z o.o., por M. Bieniek e E. Barembruch, radcowie prawni,

em representação do Prezes Urzędu Komunikacji Elektronicznej, por S. Szabliński, radca prawny,

em representação do Governo polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por J. Hottiaux e L. Nicolae, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 28.o da Diretiva 2002/22/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa ao serviço universal e aos direitos dos utilizadores em matéria de redes e serviços de comunicações eletrónicas (diretiva serviço universal) (JO L 108, p. 51), bem como dos artigos 5.°, n.o 1, e 8.°, n.o 3, da Diretiva 2002/19/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa ao acesso e interligação de redes de comunicações eletrónicas e recursos conexos (diretiva acesso) (JO L 108, p. 7).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Polkomtel sp. z o.o. (a seguir «Polkomtel») ao Prezes Urzędu Komunikacji Elektronicznej (presidente do Instituto das Comunicações Electrónicas, a seguir «presidente do UKE»), sendo interveniente a Orange Polska S.A., anteriormente Telekomunikacja Polska S.A. (a seguir «Orange Polska»), relativamente a uma decisão tomada pelo presidente do UKE, no âmbito de um litígio que opõe as referidas empresas, a propósito das condições de cooperação e das modalidades de tarifário aplicáveis aos serviços de acesso aos números não geográficos.

Quadro jurídico

Direito da União

Novo quadro regulamentar aplicável aos serviços de comunicações eletrónicas

3

O novo quadro regulamentar aplicável aos serviços de comunicações eletrónicas é composto pela Diretiva 2002/21/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações eletrónicas (diretiva‑quadro) (JO L 108, p. 33, a seguir «diretiva‑quadro»), e pelas diretivas específicas que a acompanham, a saber, a Diretiva 2002/20/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa à autorização de redes e serviços de comunicações eletrónicas (diretiva autorização) (JO L 108, p. 21), a diretiva acesso, a diretiva serviço universal e a Diretiva 97/66/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de dezembro de 1997, relativa ao tratamento de dados pessoais e à proteção da privacidade no setor das telecomunicações (JO 1998, L 24, p. 1).

– Diretiva‑quadro

4

O artigo 8.o da diretiva‑quadro define os objetivos de política geral e os princípios de regulação cujo respeito deve ser assegurado pelas autoridades reguladoras nacionais (a seguir «ARN»). Os n.os 3 e 4 deste artigo têm a seguinte redação:

«3.   As [ARN] devem contribuir para o desenvolvimento do mercado interno, nomeadamente:

[…]

b)

Encorajando à criação e ao desenvolvimento de redes transeuropeias à interoperabilidade dos serviços pan‑europeus e a conectividade de extremo a extremo;

[…]

4.   As [ARN] devem defender os interesses dos cidadãos da União Europeia, nomeadamente:

[…]

b)

Assegurando um elevado nível de proteção dos consumidores nas suas relações com os fornecedores [...];

[…]»

5

O artigo 20.o da diretiva‑quadro, sob a epígrafe «Resolução de litígios entre empresas», prevê, no seu n.o 3:

«Na resolução de litígios, a [ARN] deverá decidir tendo em vista a prossecução dos objetivos estabelecidos no artigo 8.o As obrigações impostas pela [ARN] às empresas no quadro da resolução de litígios devem respeitar as disposições da presente diretiva ou das diretivas específicas.»

– Diretiva acesso

6

O artigo 1.o da diretiva acesso, sob a epígrafe «Âmbito e objetivo», prevê:

«1.   No quadro estabelecido pela [diretiva‑quadro], a presente diretiva harmoniza o modo como os Estados‑Membros regulamentam o acesso e a interligação das redes de comunicações eletrónicas e recursos conexos. A presente diretiva tem por objetivo estabelecer um quadro regulamentar, conforme com os princípios do mercado interno, aplicável às relações entre fornecedores de redes e serviços, que conduza a uma concorrência sustentável e a uma interoperabilidade dos serviços de comunicações eletrónicas, e beneficie os consumidores.

2.   A presente diretiva fixa os direitos e obrigações dos operadores e das empresas que desejem a interligação e/ou o acesso às suas redes ou recursos conexos. Define ainda objetivos para as [ARN], no que diz respeito ao acesso e interligação [...]»

7

O artigo 5.o desta diretiva, sob a epígrafe «Poderes e responsabilidades das [ARN] relativamente ao acesso e à interligação», dispõe:

«1.   As [ARN] devem, agindo em conformidade com os objetivos estabelecidos no artigo 8.o da [diretiva‑quadro], incentivar e, sempre que oportuno, garantir, em conformidade com as disposições da presente diretiva, o acesso e a interligação adequados, bem como a interoperabilidade de serviços, exercendo a sua responsabilidade de modo a promover a eficiência, a concorrência sustentável, o investimento eficaz e a inovação, e a proporcionar o máximo benefício aos utilizadores finais.

Em especial, e sem prejuízo das medidas que possam ser tomadas em relação às empresas que detenham poder de mercado significativo nos termos do artigo 8.o, as [ARN] devem ter a possibilidade de:

a)

Na medida do necessário para garantir a ligação de extremo a extremo, impor obrigações às empresas que controlam o acesso aos utilizadores finais, incluindo, em casos justificados, a obrigação de interligarem as suas redes quando ainda não estiverem interligadas;

[…]

3.   As obrigações e as condições impostas nos termos dos n.os 1 e 2 deverão ser objetivas, transparentes, proporcionadas e não discriminatórias, e ser aplicadas em conformidade com o procedimento previsto nos artigos 6.° e 7.° da [diretiva‑quadro].

4.   No que diz respeito ao acesso e interligação, os Estados‑Membros assegurarão que as [ARN] tenham poderes para intervir por iniciativa própria quando tal se justificar ou, na falta de acordo entre as empresas, a pedido de qualquer das partes envolvidas, a fim de garantir os objetivos de política nesta matéria, constantes do artigo 8.o da [diretiva‑quadro], em conformidade com a presente diretiva e com os procedimentos referidos nos artigos 6.°, 7.°, 20.° e 21.° da [diretiva‑quadro].»

8

O artigo 8.o da diretiva acesso, sob a epígrafe «Imposição, alteração ou supressão de obrigações», dispõe:

«1.   Os Estados‑Membros assegurarão que as [ARN] tenham poderes para impor as obrigações definidas nos artigos 9.° a 13.°

2.   Caso um operador seja designado como operador com poder de mercado significativo num mercado específico, na sequência de uma análise do mercado efetuada em conformidade com o disposto no artigo 16.o da [diretiva‑quadro], as [ARN] imporão as obrigações previstas nos artigos 9.° a 13.° da presente diretiva, consoante adequado.

3.   Sem prejuízo:

[…]

do disposto nos artigos 12.° e 13.° da [diretiva‑quadro], da condição 7 na secção B do anexo à [diretiva autorização] tal como aplicado por força do n.o 1 do artigo 6.o dessa diretiva, e dos artigos 27.°, 28.° e 30.° da [diretiva serviço universal] […], que contêm obrigações relativas a empresas não designadas como detendo poder de mercado significativo, [...]

[…]

As [ARN] não imporão as obrigações definidas nos artigos 9.° a 13.° aos operadores que não tenham sido designados em conformidade com o n.o 2.

[…]

4.   As obrigações impostas em conformidade com o presente artigo basear‑se‑ão na natureza do problema identificado, e serão proporcionadas e justificadas à luz dos objetivos estabelecidos no artigo 8.o da [diretiva‑quadro]. Tais obrigações só serão impostas após consulta em conformidade com o artigo 6.o e 7.° dessa diretiva.

[…]»

9

O artigo 13.o da diretiva acesso, sob a epígrafe «Obrigações de controlo dos preços e de contabilização dos custos», tem a seguinte redação:

«A [ARN] pode, nos termos do disposto no artigo 8.o, impor obrigações relacionadas com a amortização de custos e controlos de preços, incluindo a obrigação de orientação dos preços para os custos e a obrigação relativa a sistemas de contabilização dos custos, para fins de oferta de tipos específicos de interligação e/ou acesso, em situações em que uma análise do mercado indique que uma potencial falta de concorrência efetiva implica que o operador em causa poderá manter os preços a um nível excessivamente elevado ou aplicar uma compressão da margem em detrimento dos utilizadores finais. […]»

– Diretiva serviço universal

10

A diretiva serviço universal enuncia, no seu considerando 38:

«O acesso dos utilizadores finais a todos os recursos numéricos da [União] constitui um requisito essencial para um mercado interno. Esse acesso deverá incluir os números verdes e de tarifa majorada e outros números não geográficos, exceto nos casos em que o assinante chamado tenha decidido, por motivos comerciais, limitar o acesso de chamadas provenientes de áreas geográficas específicas. […]»

11

O artigo 1.o desta diretiva, sob a epígrafe «Âmbito e objetivos», prevê, nomeadamente, que esta visa «garantir a disponibilidade em toda a [União] de serviços acessíveis ao público de boa qualidade, através de uma concorrência e de uma possibilidade de escolha efetivas, e atender às situações em que as necessidades dos utilizadores finais não sejam convenientemente satisfeitas pelo mercado».

12

O artigo 2.o, segundo parágrafo, alínea f), da referida diretiva contém a seguinte definição:

«‘Número não geográfico’, número do plano de numeração nacional que não seja um número geográfico. Inclui, nomeadamente, os números móveis, verdes e de tarifa majorada.»

13

O artigo 28.o da mesma diretiva, sob a epígrafe «Números não geográficos», prevê:

«Os Estados‑Membros garantirão que os utilizadores finais de outros Estados‑Membros possam aceder a números não geográficos nos seus territórios, sempre que tal seja técnica e economicamente viável, exceto nos casos em que um assinante chamado tenha decidido, por motivos comerciais, limitar o acesso de chamadas provenientes de áreas geográficas específicas.»

Diretiva 2009/136/CE

14

Sob a epígrafe «Alterações à [diretiva serviço universal]», o artigo 1.o da Diretiva 2009/136/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de 2009, que altera a Diretiva 2002/22, a Diretiva 2002/58/CE relativa ao tratamento de dados pessoais e à proteção da privacidade no setor das comunicações eletrónicas e o Regulamento (CE) n.o 2006/2004 relativo à cooperação entre as autoridades nacionais responsáveis pela aplicação da legislação de defesa do consumidor (JO L 337, p. 11), prevê, no seu n.o 19:

«O artigo 28.o passa a ter a seguinte redação:

‘Artigo 28.o

Acesso a números e serviços

1.   Os Estados‑Membros asseguram que, sempre que tal seja técnica e economicamente viável, exceto nos casos em que um assinante chamado tenha decidido, por motivos comerciais, limitar o acesso de chamadas provenientes de áreas geográficas específicas, as autoridades reguladoras nacionais tomem todas as medidas necessárias para que os utilizadores finais possam ter acesso:

a)

Aos serviços e utilizá‑los através de números não geográficos no interior da [União];

[…]’»

15

Em conformidade com o artigo 4.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2009/136, os Estados‑Membros devem aprovar e publicar até 25 de maio de 2011 as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento a esta diretiva.

Direito polaco

16

Nos termos do artigo 27.o, n.o 2, da Lei das telecomunicações (ustawa Prawo telekomunikacyjne), de 16 de julho de 2004 (Dz. U. n.o 171, posição 1800), na sua versão em vigor à data da decisão do presidente do UKE de 6 de maio de 2009 (a seguir «Lei das telecomunicações»):

«Se as negociações não forem iniciadas, o acesso for recusado pela entidade obrigada a garanti‑lo ou não for celebrado um contrato no prazo referido no n.o 1, qualquer das partes pode requerer ao presidente do UKE que profira uma decisão em que sejam resolvidas as questões controvertidas ou definidas as condições de cooperação.»

17

O artigo 28.o, n.o 1, da Lei das telecomunicações tem a seguinte redação:

«O presidente do UKE profere a sua decisão sobre a concessão do acesso no prazo de 90 dias a contar da data da apresentação do requerimento referido no artigo 27.o, n.o 2, tendo em conta os seguintes critérios:

1)

o interesse dos utilizadores das redes de telecomunicações;

2)

as obrigações impostas às empresas de telecomunicações;

3)

a promoção de serviços de telecomunicações modernos;

4)

a natureza das questões controvertidas existentes e a possibilidade prática de implementar soluções relativas aos aspetos técnicos e económicos do acesso às telecomunicações, tanto aquelas propostas pelas empresas de telecomunicações, que são partes nas negociações, como as suscetíveis de constituir soluções alternativas;

5)

a necessidade de assegurar:

a)

a integridade da rede e a interoperabilidade dos serviços,

b)

condições não discriminatórias no acesso às telecomunicações,

c)

o desenvolvimento de um mercado concorrencial de serviços de telecomunicações;

6)

o poder de mercado das empresas de telecomunicações cujas redes estão interligadas;

[...]»

18

O artigo 79.o, n.o 1, desta lei prevê:

«Um operador de uma rede pública de telecomunicações deve assegurar que os utilizadores finais da sua rede e de outros Estados‑Membros possam aceder aos números não geográficos no território da Polónia, na medida em que tal seja técnica e economicamente viável, exceto se o assinante chamado tiver limitado o acesso de utilizadores finais situados em certas áreas geográficas.»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

19

A Polkomtel e a Orange Polska disponibilizam redes de comunicações eletrónicas acessíveis ao público e serviços de comunicações eletrónicas aos seus assinantes. Não tendo a Polkomtel e a Orange Polska chegado a um acordo quanto à fixação das modalidades de cooperação e de tarifário aplicáveis ao acesso dos utilizadores da rede da Polkomtel aos serviços de uma rede inteligente fornecidos através da rede da Orange Polska, mediante a utilização de números não geográficos, foi submetido ao presidente do UKE um pedido de resolução do litígio.

20

Por decisão de 6 de maio de 2009, o presidente do UKE resolveu o referido litígio impondo designadamente à Polkomtel a obrigação de assegurar aos seus assinantes o acesso aos serviços que utilizam números não geográficos fornecidos na rede da Orange Polska em contrapartida do pagamento, por esta última, de uma remuneração.

21

Nesta decisão, o presidente do UKE estabeleceu também as modalidades de tarifário aplicáveis a esse acesso entre as referidas empresas. Considerando que a originação de chamadas a partir da rede da Polkomtel necessitava de recursos de rede análogos aos exigidos para a terminação de chamadas nessa rede, fixou designadamente a taxa dessa originação de chamadas para a rede da Orange Polska a um nível determinado tendo por referência a tarifa aplicável à terminação de chamadas na rede da Polkomtel.

22

A Polkomtel impugnou a decisão do presidente do UKE de 6 de maio de 2009 no Sąd Okręgowy (Tribunal Regional). Por decisão de 15 de março de 2012, esse órgão jurisdicional julgou improcedente o pedido de anulação desta decisão. A Polkomtel interpôs recurso da decisão do Sąd Okręgowy (Tribunal Regional) no Sąd Apelacyjny w Warszawie (Tribunal de Recurso de Varsóvia), que negou provimento ao referido recurso por acórdão de 25 de janeiro de 2013. A Polkomtel interpôs então recurso de cassação desse acórdão no Sąd Najwyższy (Tribunal Supremo).

23

O Sąd Najwyższy (Tribunal Supremo) questiona‑se, em primeiro lugar, sobre o âmbito de aplicação temporal e material do direito da União no processo principal. Salienta, por um lado, que a decisão do presidente do UKE de 6 de maio de 2009 foi adotada antes da alteração do artigo 28.o da diretiva serviço universal pela Diretiva 2009/136 e, portanto, do fim do prazo de transposição desta última para o direito nacional. Por outro lado, o artigo 28.o da diretiva serviço universal, na sua redação inicial, obrigava os Estados‑Membros a garantirem que os utilizadores finais de outros Estados‑Membros pudessem aceder a números não geográficos no seu território. A regulamentação nacional aplicável aos factos do processo principal previa, por seu turno, a obrigação de assegurar que todos os utilizadores finais pudessem aceder a números não geográficos no território polaco. O órgão jurisdicional de reenvio questiona‑se, assim, sobre se esta regulamentação podia impor uma obrigação mais abrangente do que a prevista no referido artigo.

24

Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se uma ARN pode impor aos operadores, nos termos do artigo 5.o, n.o 1, da diretiva acesso, obrigações que visam implementar o artigo 28.o da diretiva serviço universal. Tem dúvidas a este respeito, nomeadamente, devido à obrigação de ter em conta a liberdade de empresa consagrada no artigo 16.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») e à existência, no caso em apreço, de um eventual conflito entre esta liberdade e o princípio da defesa dos consumidores enunciado no artigo 38.o da Carta.

25

Em terceiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se, em circunstâncias como as que estão em causa no processo principal, uma ARN pode fixar modalidades de tarifário aplicáveis entre os operadores, com base no artigo 8.o, n.o 3, da diretiva acesso, lido em conjugação com o artigo 5.o, n.o 1, desta diretiva e com o artigo 28.o da diretiva serviço universal. Com efeito, considera que se coloca a questão de saber quais são os limites da intervenção das ARN no que diz respeito à fixação dos preços no âmbito da resolução de um litígio entre empresas que não dispõem de um poder de mercado significativo. Interroga‑se também quanto à conformidade de tal intervenção com a liberdade de empresa consagrada no artigo 16.o da Carta e pergunta‑se sobre se essa intervenção pode ser justificada pelo objetivo de assegurar a defesa dos consumidores garantida pelo artigo 38.o da Carta.

26

Nestas condições, o Sąd Najwyższy (Tribunal Supremo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o artigo 28.o da diretiva [serviço universal], [na sua redação inicial], ser interpretado no sentido de que o acesso a números não geográficos deve ser aberto não apenas aos utilizadores finais de outros Estados‑Membros[…] mas também aos utilizadores finais do Estado‑Membro do respetivo operador de uma rede pública de telecomunicações, com a consequência de se aplicarem, à verificação do cumprimento desta obrigação pela [ARN], os requisitos que decorrem dos princípios da eficácia do direito da União e da interpretação do direito interno conforme ao direito da União?

2)

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão: deve o artigo 28.o da diretiva [serviço universal], em conjugação com o artigo 16.o da [Carta], ser interpretado no sentido de que, para o cumprimento da obrigação em causa na primeira disposição, pode ser aplicado o procedimento previsto para as autoridades reguladoras nacionais no artigo 5.o, n.o 1, da diretiva [acesso]?

3)

Deve o artigo 8.o, n.o 3, da diretiva [acesso], conjugado com o artigo 28.o da diretiva [serviço universal] e o artigo 16.o da [Carta], ou o artigo 8.o, n.o 3, da diretiva [acesso], conjugado com o artigo 5.o, n.o 1, da diretiva [acesso] e o artigo 16.o da [Carta], ser interpretado no sentido de que, para garantir o acesso dos utilizadores finais de um operador nacional de rede pública de telecomunicações aos serviços de números não geográficos prestados através da rede de outro operador nacional, a [ARN] pode regular os princípios da faturação entre os operadores para [a originação de chamadas], recorrendo às tarifas de terminação fixadas para um dos operadores em função dos custos, com base no artigo 13.o da diretiva [acesso], quando o operador propôs a aplicação desta tarifa no decurso das negociações — fracassadas — levadas a cabo em cumprimento da obrigação imposta pelo artigo 4.o da diretiva [acesso]?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

27

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 28.o da diretiva serviço universal deve ser interpretado no sentido de que um Estado‑Membro pode prever que um operador da rede pública de comunicações eletrónicas deve garantir que o acesso a números não geográficos seja assegurado a todos os utilizadores finais da sua rede nesse Estado e não apenas aos dos outros Estados‑Membros.

28

Esta questão resulta da circunstância de o referido artigo 28.o prever, à data da adoção da decisão do presidente do UKE, apenas a obrigação dos Estados‑Membros de garantirem que os utilizadores finais dos outros Estados‑Membros pudessem aceder a números não geográficos no seu território, quando tal fosse técnica e economicamente viável, exceto nos casos em que um assinante chamado tivesse decidido, por motivos comerciais, limitar o acesso de chamadas provenientes de áreas geográficas específicas, ao passo que o artigo 28.o da referida diretiva, conforme alterado pela Diretiva 2009/136, prevê atualmente, no seu n.o 1, alínea a), que «os Estados‑Membros asseguram que [...] as autoridades reguladoras nacionais tomem todas as medidas necessárias para que os utilizadores finais possam ter acesso aos serviços e utilizá‑los através de números não geográficos no interior da [União]».

29

A este respeito, importa determinar se uma disposição nacional como o artigo 79.o, n.o 1, da Lei das telecomunicações, que contém, em substância, uma obrigação mais ampla do que a prevista no artigo 28.o da diretiva serviço universal, não prejudica os objetivos por esta prosseguidos.

30

Há que salientar que o considerando 38 da referida diretiva enuncia, de forma geral, que o acesso dos utilizadores finais a todos os recursos numéricos da União, incluindo os números não geográficos, constitui um requisito essencial para um mercado interno.

31

Além disso, decorre do artigo 1.o da diretiva serviço universal que, no âmbito da diretiva‑quadro, a diretiva serviço universal diz respeito à oferta de redes e serviços de comunicações eletrónicas aos utilizadores finais. Esta visa garantir a disponibilidade em toda a União de serviços acessíveis ao público de boa qualidade, através de uma concorrência e de uma possibilidade de escolha efetivas.

32

No que diz respeito aos objetivos do quadro regulamentar de que a diretiva serviço universal faz parte, o Tribunal de Justiça salientou, no n.o 29 do acórdão Telekomunikacja Polska (C‑522/08, EU:C:2010:135), que, se é verdade que, no exercício das suas funções, as ARN são, nos termos do artigo 8.o, n.o 4, alínea b), da diretiva‑quadro, obrigadas a defender os interesses dos cidadãos da União, assegurando um elevado nível de proteção dos consumidores, também é certo que a diretiva‑quadro e a diretiva serviço universal não preveem uma harmonização completa dos aspetos relativos à proteção dos consumidores.

33

Além disso, o facto de se garantir aos utilizadores de um Estado‑Membro o acesso a números não geográficos, mesmo no âmbito de uma situação puramente nacional, é suscetível de contribuir para a concretização do mercado interno, na medida em que utilizadores finais assinantes de um operador de outro Estado‑Membro recorrem aos serviços de originação de chamadas na rede de um operador desse primeiro Estado‑Membro, no decurso da sua permanência neste último, ao abrigo de um contrato de itinerância celebrado entre os referidos operadores.

34

Daqui decorre que o artigo 28.o da diretiva serviço universal, interpretado à luz dos respetivos objetivos, não se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa no processo principal, que prevê a obrigação de assegurar o acesso a números não geográficos no território nacional a todos os utilizadores finais.

35

Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à primeira questão submetida que o artigo 28.o da diretiva serviço universal deve ser interpretado no sentido de que um Estado‑Membro pode prever que um operador da rede pública de comunicações eletrónicas deve garantir que o acesso a números não geográficos seja assegurado a todos os utilizadores finais da sua rede nesse Estado e não apenas aos dos outros Estados‑Membros.

Quanto à segunda e terceira questões

Quanto à admissibilidade

36

A Polkomtel alega que a terceira questão é inadmissível, porquanto esta não fez à Orange Polska, no decurso das suas negociações, as propostas referidas pelo órgão jurisdicional de reenvio relativas às modalidades de tarifário aplicáveis aos serviços de originação de chamadas considerados. Assim, a terceira questão tem por objeto circunstâncias estranhas aos factos do processo principal.

37

A este propósito, importa recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, as questões relativas à interpretação do direito da União submetidas pelo órgão jurisdicional nacional no âmbito regulamentar e factual que define sob a sua responsabilidade, e cuja exatidão não cabe ao Tribunal de Justiça verificar, gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar‑se a pronunciar‑se sobre um pedido prejudicial apresentado por um órgão jurisdicional nacional quando for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for de natureza hipotética ou ainda quando o Tribunal de Justiça não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (acórdão Maatschap T. van Oosterom en A. van Oosterom‑Boelhouwer, C‑485/12, EU:C:2014:250, n.o 31 e jurisprudência referida).

38

A referida presunção de pertinência não pode ser ilidida pelo simples facto de uma das partes no processo principal contestar determinados factos cuja exatidão não compete ao Tribunal de Justiça verificar e de que depende a definição do objeto do referido litígio (acórdão Maatschap T. van Oosterom en A. van Oosterom‑Boelhouwer, C‑485/12, EU:C:2014:250, n.o 32 e jurisprudência referida).

39

No caso vertente, a questão de saber se a Polkomtel fez propostas relativas às modalidades de tarifário aplicáveis entre ela e a Orange Polska em relação aos serviços de originação de chamadas considerados constitui uma questão que faz parte do quadro factual, que não cabe ao Tribunal de Justiça verificar.

40

Por conseguinte, a terceira questão deve ser considerada admissível.

Quanto ao mérito

41

Com a segunda e terceira questões, que importa analisar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se os artigos 5.°, n.o 1, e 8.°, n.o 3, da diretiva acesso, lidos em conjugação com o artigo 28.o da diretiva serviço universal, devem ser interpretados no sentido de que permitem a uma ARN, no âmbito da resolução de um litígio entre dois operadores, impor a um deles a obrigação de assegurar aos utilizadores finais o acesso aos serviços que utilizam números não geográficos fornecidos na rede do outro operador e fixar, com base no artigo 13.o da diretiva acesso, modalidades de tarifário aplicáveis, entre os referidos operadores, a esse acesso, como as que estão em causa no processo principal.

42

A este respeito, há que recordar que, nos termos do seu artigo 1.o, n.os 1 e 2, a diretiva acesso, que se inscreve no quadro estabelecido pela diretiva‑quadro, harmoniza o modo como os Estados‑Membros regulamentam o acesso e a interligação das redes de comunicações eletrónicas e recursos conexos. O objetivo da diretiva acesso é estabelecer um quadro regulamentar, conforme com os princípios do mercado interno, aplicável às relações entre fornecedores de redes e serviços, que conduza a uma concorrência sustentável e a uma interoperabilidade dos serviços de comunicações eletrónicas, e beneficie os consumidores. A referida diretiva define designadamente os objetivos atribuídos às ARN no que diz respeito ao acesso e à interligação.

43

O artigo 5.o da dita diretiva refere‑se aos poderes e às responsabilidades das ARN relativamente ao acesso e à interligação. O artigo 5.o, n.o 1, da mesma diretiva prevê que, agindo em conformidade com os objetivos estabelecidos no artigo 8.o da diretiva‑quadro, as ARN devem incentivar e, sempre que oportuno, garantir, em conformidade com as disposições da referida diretiva, o acesso e a interligação adequados, bem como a interoperabilidade de serviços, promovendo a eficiência e a concorrência sustentável e proporcionando o máximo benefício aos utilizadores finais.

44

A este respeito, o Tribunal de Justiça já decidiu que resulta da letra do artigo 5.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da diretiva acesso que as ARN têm por missão garantir um acesso e uma interligação adequados, bem como a interoperabilidade dos serviços por meios que não são enumerados de forma taxativa [v., a propósito desta diretiva, conforme alterada pela Diretiva 2009/140/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro de 2009 (JO L 337, p. 37), acórdão KPN, C‑85/14, EU:C:2015:610, n.o 36 e jurisprudência referida].

45

Neste contexto, em conformidade com o artigo 5.o, n.o 1, segundo parágrafo, alínea a), da diretiva acesso, e sem prejuízo das medidas que podem ser tomadas relativamente a empresas que disponham de um poder de mercado significativo ao abrigo do respetivo artigo 8.o, as referidas autoridades devem ter a possibilidade de impor «obrigações às empresas que controlam o acesso aos utilizadores finais, incluindo, em casos justificados, a obrigação de interligarem as suas redes», apenas para garantir a interligação de extremo a extremo (v., a propósito desta diretiva, conforme alterada pela Diretiva 2009/140, acórdão KPN, C‑85/14, EU:C:2015:610, n.o 37 e jurisprudência referida).

46

O artigo 5.o, n.o 4, da diretiva acesso, por seu turno, clarifica que, quando as ARN intervêm a pedido das partes envolvidas, a fim de garantir os objetivos constantes do artigo 8.o da diretiva‑quadro, devem atuar em conformidade com o disposto na diretiva acesso e com os procedimentos referidos, em particular, nos artigos 6.°, 7.° e 20.° da diretiva‑quadro.

47

Além disso, nos termos do artigo 20.o, n.o 3, da diretiva‑quadro, na implementação do procedimento de resolução de litígios entre empresas previsto nesse artigo, as ARN deverão decidir tendo em vista a prossecução dos objetivos estabelecidos no artigo 8.o da diretiva‑quadro, que prevê no seu n.o 3, alínea b), que as ARN contribuem para o desenvolvimento do mercado interno, nomeadamente encorajando a interoperabilidade dos serviços pan‑europeus e a conectividade de extremo a extremo.

48

Assim, as disposições da diretiva‑quadro e da diretiva acesso permitem às ARN, no âmbito de um litígio entre operadores, tomar medidas destinadas a assegurar um acesso e uma interligação adequados, bem como a interoperabilidade dos serviços, tais como uma decisão que impõe a um operador a obrigação de assegurar aos utilizadores finais o acesso aos serviços que utilizam números não geográficos prestados na rede de outro operador.

49

Quanto à questão de saber se estas medidas, quando adotadas ao abrigo do artigo 28.o da diretiva serviço universal, podem conter obrigações tarifárias, importa salientar que, segundo o artigo 8.o, n.o 1, da diretiva acesso, os Estados‑Membros devem assegurar que as ARN tenham poderes para impor as obrigações definidas nos artigos 9.° a 13.° desta diretiva e, nomeadamente, as obrigações relativas ao controlo dos preços ao abrigo do artigo 13.o da referida diretiva. Nos termos do artigo 8.o, n.o 2, da mesma diretiva, caso um operador seja designado como operador com poder de mercado significativo num mercado específico, na sequência de uma análise do mercado efetuada em conformidade com o disposto no artigo 16.o da diretiva‑quadro, as ARN impor‑lhe‑ão as referidas obrigações (v., a propósito da diretiva serviço universal, conforme alterada pela Diretiva 2009/136, bem como da diretiva‑quadro e da diretiva acesso, conforme alteradas pela Diretiva 2009/140, acórdão KPN, C‑85/14, EU:C:2015:610, n.o 40).

50

Nos termos do artigo 8.o, n.o 3, da diretiva acesso, sem prejuízo de certas disposições, de entre as quais o artigo 28.o da diretiva serviço universal, que impõem obrigações a empresas diferentes das que são designadas como tendo um poder de mercado significativo, as ARN só podem impor obrigações relativas ao controlo dos preços definidas, nomeadamente, no artigo 13.o da diretiva acesso aos operadores designados como detendo poder de mercado significativo, em conformidade com o artigo 8.o, n.o 2, desta mesma diretiva (v., a propósito da diretiva acesso, conforme alterada pela Diretiva 2009/140, e da diretiva serviço universal, conforme alterada pela Diretiva 2009/136, acórdão KPN, C‑85/14, EU:C:2015:610, n.o 41).

51

Por conseguinte, há que interpretar o artigo 8.o, n.o 3, da diretiva acesso no sentido de que, salvo no âmbito de certas disposições, e, em particular, do artigo 28.o da diretiva serviço universal, as ARN não podem impor obrigações relativas ao controlo dos preços como as previstas no artigo 13.o da diretiva acesso aos operadores não designados como tendo poder de mercado significativo num mercado específico. Assim, o artigo 8.o, n.o 3, da diretiva acesso não se opõe a que, no quadro da aplicação do artigo 28.o da diretiva serviço universal, sejam impostas obrigações relativas ao controlo dos preços, como as visadas no artigo 13.o, n.o 1, da diretiva acesso, ao operador que não disponha de um poder de mercado significativo num mercado específico, desde que estejam preenchidos os requisitos de aplicação do referido artigo 28.o da diretiva serviço universal (v., neste sentido, a propósito da diretiva acesso, conforme alterada pela Diretiva 2009/140, e da diretiva serviço universal, conforme alterada pela Diretiva 2009/136, acórdão KPN, C‑85/14, EU:C:2015:610, n.o 42).

52

Daqui decorre que as ARN podem impor obrigações tarifárias comparáveis às visadas no artigo 13.o, n.o 1, da diretiva acesso, ao abrigo do artigo 28.o da diretiva serviço universal, a um operador que não disponha de um poder de mercado significativo, mas que controla o acesso aos utilizadores finais, se essas obrigações constituírem medidas necessárias e proporcionadas para garantir que os utilizadores finais podem ter acesso aos serviços que utilizam números não geográficos na União (v., a propósito da diretiva acesso, conforme alterada pela Diretiva 2009/140, e da diretiva serviço universal, conforme alterada pela Diretiva 2009/136, acórdão KPN, C‑85/14, EU:C:2015:610, n.o 43).

53

Assim, as ARN podem nomeadamente, no âmbito de um litígio entre operadores, impor obrigações tarifárias, como as modalidades de tarifário aplicáveis, entre os referidos operadores, ao acesso dos utilizadores finais aos serviços que utilizam números não geográficos fornecidos na rede de um deles, se tais obrigações forem necessárias e proporcionadas, o que cabe ao juiz nacional verificar.

54

Por outro lado, importa observar que os artigos 5.°, n.os 1 e 3, e 8.°, n.o 4, da diretiva acesso preveem os requisitos que as obrigações impostas pelas ARN aos operadores que fornecem redes ou serviços de comunicações eletrónicas devem preencher, em conformidade com os artigos 5.°, n.o 1, e 8.° desta diretiva (v., a propósito da referida diretiva, conforme alterada pela Diretiva 2009/140, acórdão KPN, C‑85/14, EU:C:2015:610, n.o 45).

55

Em especial, o artigo 5.o, n.o 3, da diretiva acesso prevê que as obrigações e condições impostas nomeadamente nos termos do n.o 1 deste artigo devem ser objetivas, transparentes, proporcionadas, não discriminatórias e que devem ser aplicadas em conformidade com os procedimentos previstos nos artigos 6.° e 7.° da diretiva‑quadro (v., a propósito da diretiva acesso e da diretiva‑quadro, conforme alteradas pela Diretiva 2009/140, acórdão KPN, C‑85/14, EU:C:2015:610, n.o 46).

56

Segundo o artigo 8.o, n.o 4, da diretiva acesso, as obrigações impostas em conformidade com este artigo devem basear‑se na natureza do problema identificado, ser proporcionadas e justificadas à luz dos objetivos estabelecidos no artigo 8.o da diretiva‑quadro, e só podem ser impostas após a consulta prevista nos artigos 6.° e 7.° da diretiva‑quadro (v., a propósito da diretiva acesso e da diretiva‑quadro, conforme alteradas pela Diretiva 2009/140, acórdão KPN, C‑85/14, EU:C:2015:610, n.o 47).

57

Resulta do exposto que uma medida, como a que está em causa no processo principal, adotada em conformidade com os artigos 5.°, n.o 1, e 8.°, n.o 3, da diretiva acesso, lidos em conjugação com o artigo 28.o da diretiva serviço universal, para assegurar aos utilizadores finais de um operador o acesso aos serviços que utilizam números não geográficos fornecidos na rede de outro operador deve igualmente respeitar os requisitos recordados nos n.os 52, 55 e 56 do presente acórdão.

58

Uma vez que o órgão jurisdicional de reenvio se interroga sobre a possibilidade de uma ARN, à qual foi submetido um litígio que opõe operadores, estabelecer modalidades de tarifário baseando‑se nas tarifas de terminação de chamadas que foram fixadas por um deles em função dos custos, cumpre observar que o artigo 13.o da diretiva acesso não regula tais modalidades. Assim, cabe às ARN determinar as referidas modalidades, assegurando que as mesmas preenchem os requisitos enunciados no artigo 8.o, n.o 4, da dita diretiva.

59

Uma vez que o referido órgão jurisdicional se questiona também sobre a possibilidade, à luz da liberdade de empresa garantida pelo artigo 16.o da Carta, de uma ARN adotar uma decisão, como a que está em causa no processo principal, que se substitui a um contrato entre os operadores em causa, há que salientar que a Carta, que entrou em vigor em 1 de dezembro de 2009, não se aplica ratione temporis à situação em causa no processo principal, dado que a decisão do presidente do UKE foi adotada em 6 de maio de 2009.

60

No entanto, segundo jurisprudência constante, tanto o direito de propriedade como o livre exercício de uma atividade profissional fazem parte dos princípios gerais do direito da União. Esses princípios não se apresentam, contudo, como prerrogativas absolutas, mas devem ser tomados em consideração relativamente à sua função na sociedade. Por conseguinte, podem ser impostas restrições ao exercício do direito de propriedade e ao livre exercício das atividades profissionais, na condição de essas restrições corresponderem efetivamente a objetivos de interesse geral prosseguidos pela União e não constituírem, relativamente ao objetivo prosseguido, uma intervenção excessiva e intolerável que atente contra a própria substância dos direitos assim garantidos (v., neste sentido, acórdão Di Lenardo e Dilexport, C‑37/02 e C‑38/02, EU:C:2004:443, n.o 82 e jurisprudência referida).

61

Ora, é facto assente que a decisão do presidente do UKE de 6 de maio de 2009 foi adotada com base numa lei nacional que transpõe, nomeadamente, as diretivas serviço universal e acesso e corresponde a um objetivo de interesse geral, reconhecido como tal pela União, a saber, o acesso dos utilizadores finais da União aos serviços que utilizam números não geográficos. Assim, a referida decisão não viola a liberdade de empresa desde que, como foi já indicado nos n.os 55 e 56 do presente acórdão, as obrigações impostas no âmbito da resolução do litígio entre os operadores em causa fossem necessárias e proporcionadas, o que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

62

Tendo em conta todas as considerações precedentes, há que responder à segunda e terceira questões submetidas que os artigos 5.°, n.o 1, e 8.°, n.o 3, da diretiva acesso, lidos em conjugação com o artigo 28.o da diretiva serviço universal, devem ser interpretados no sentido de que permitem a uma ARN, no âmbito da resolução de um litígio entre dois operadores, impor a um deles a obrigação de assegurar aos utilizadores finais o acesso aos serviços que utilizam números não geográficos fornecidos na rede do outro operador e fixar, com base no artigo 13.o da diretiva acesso, modalidades de tarifário aplicáveis, entre os referidos operadores, a esse acesso, como as que estão em causa no processo principal, desde que estas obrigações sejam objetivas, transparentes, proporcionadas, não discriminatórias, baseadas na natureza do problema identificado e justificadas à luz dos objetivos estabelecidos no artigo 8.o da diretiva‑quadro, e que os procedimentos previstos nos artigos 6.° e 7.° desta última diretiva tenham sido, sendo caso disso, respeitados, o que cabe ao juiz nacional verificar.

Quanto às despesas

63

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Segunda Secção) declara:

 

1)

O artigo 28.o da Diretiva 2002/22/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa ao serviço universal e aos direitos dos utilizadores em matéria de redes e serviços de comunicações eletrónicas (diretiva serviço universal), deve ser interpretado no sentido de que um Estado‑Membro pode prever que um operador da rede pública de comunicações eletrónicas deve garantir que o acesso a números não geográficos seja assegurado a todos os utilizadores finais da sua rede nesse Estado e não apenas aos dos outros Estados‑Membros.

 

2)

Os artigos 5.°, n.o 1, e 8.°, n.o 3, da Diretiva 2002/19/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa ao acesso e interligação de redes de comunicações eletrónicas e recursos conexos (diretiva acesso), lidos em conjugação com o artigo 28.o da Diretiva 2002/22, devem ser interpretados no sentido de que permitem a uma autoridade reguladora nacional, no âmbito da resolução de um litígio entre dois operadores, impor a um deles a obrigação de assegurar aos utilizadores finais o acesso aos serviços que utilizam números não geográficos fornecidos na rede do outro operador e fixar, com base no artigo 13.o da Diretiva 2002/19, modalidades de tarifário aplicáveis, entre os referidos operadores, a esse acesso, como as que estão em causa no processo principal, desde que estas obrigações sejam objetivas, transparentes, proporcionadas, não discriminatórias, baseadas na natureza do problema identificado e justificadas à luz dos objetivos estabelecidos no artigo 8.o da Diretiva 2002/21/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de março de 2002, relativa a um quadro regulamentar comum para as redes e serviços de comunicações eletrónicas (diretiva‑quadro), e que os procedimentos previstos nos artigos 6.° e 7.° desta última diretiva tenham sido, sendo caso disso, respeitados, o que cabe ao juiz nacional verificar.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: polaco.

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