ECO/582
Recapitalizar as empresas da UE –
Uma solução inovadora para uma recuperação sustentável e inclusiva
PARECER
Secção da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social
Recapitalizar as empresas da UE – Uma solução inovadora para uma recuperação sustentável e inclusiva
[parecer de iniciativa]
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Contacto
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eco@eesc.europa.eu
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Administrador
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Sergio Lorencio Matallana
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Data do documento
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11/10/2022
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Relator: Antonio García del Riego
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Decisão da Plenária
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20/01/2022
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Base jurídica
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Artigo 52.º, n.º 2, do Regimento
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Parecer de iniciativa
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Competência
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Secção da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social
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Adoção em secção
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06/10/2022
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Resultado da votação
(votos a favor/votos contra/abstenções)
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74/0/0
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Adoção em plenária
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DD/MM/YYYY
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Reunião plenária n.º
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…
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Resultado da votação
(votos a favor/votos contra/abstenções)
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…/…/…
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1.Conclusões e recomendações
1.1Segundo dados recentes, o défice de capital próprio e de capital híbrido situa-se entre 450 e 600 mil milhões de euros. Esta situação coloca muitas empresas em risco, especialmente tendo em conta que estão a surgir novas tensões económicas e que as empresas da União Europeia (UE) estão sobre-endividadas. As empresas da UE dependem principalmente do financiamento bancário, pelo que é importante incentivar outras fontes de financiamento, o que exige a participação de intervenientes como gestores de ativos, companhias de seguros e fundos de pensões.
1.2Neste contexto, o CESE recomenda o desenvolvimento de um quadro que fomente os instrumentos financeiros híbridos, a fim de facilitar a aplicação desses instrumentos, reforçar os balanços das empresas e permitir-lhes manter o seu nível de investimento sem aumentar o seu endividamento. Deste modo, as empresas poderão manter-se competitivas e ser capazes de se adaptar ao futuro, impulsionando as suas transformações ecológica e digital.
1.3Os instrumentos altamente subordinados são a melhor alternativa possível, por vários motivos:
I)já existem e são regulamentados em diferentes países europeus, sendo por isso um instrumento seguro para as micro, pequenas e médias empresas (MPME);
II)constituem uma solução ágil a longo prazo, fácil de aplicar, para empresas de todas as dimensões, em comparação com alternativas mais sofisticadas, como as obrigações ou as ações;
III)constituem um produto compatível com as empresas familiares, que representam 60% das empresas da UE, visto que, normalmente, as famílias proprietárias pretendem manter o controlo das suas empresas.
1.4Para ser uma solução eficaz, estes instrumentos devem ter um estatuto de quase capital, de modo a não contar como dívida nos balanços, e ser classificados imediatamente antes do capital próprio na cascata de pagamentos em caso de liquidação de uma empresa.
1.5Para produzir um grande impacto, chegando a empresas de todas as dimensões, a melhor opção é um sistema em que haja colaboração entre as instituições privadas e públicas, nomeadamente, bancos, gestores de ativos, investidores do setor público e investidores institucionais (seguradoras e fundos de pensões).
1.6Esta recomendação serve um objetivo a longo prazo, com uma solução que pode ser aplicada a curto prazo, e apoiaria a União dos Mercados de Capitais (UMC). Um modelo de instrumento à escala da UE poderia beneficiar da visibilidade, da liquidez e da escala do mercado único e gerar uma ampla aceitação entre os investidores institucionais que procuram perfis de risco de dívida e de tipo híbrido, mas com rendimentos mais elevados, respondendo também às necessidades das empresas de menor dimensão. Com uma dimensão suficiente à escala da UE, um quadro bem-sucedido poderia evoluir para uma categoria de ativos bem definida capaz de incentivar o investimento e a integração na UE.
2.Contexto
2.1As pequenas e médias empresas (PME) são o núcleo da economia: na UE-27, representam 99,8% do número total de empresas, quase dois terços (65%) do emprego e mais de metade (53%) do valor acrescentado gerado pelo setor empresarial não financeiro
. São a economia real e o principal fator de coesão social em muitas regiões europeias. Em 2020, havia mais de 22,5 milhões de PME. Existem pouco menos de 200 mil empresas de média dimensão, mas representam 17,3% do valor acrescentado e 16% do emprego
.
2.2A COVID-19 atingiu duramente a economia ao longo de 2020 e durante parte de 2021, mas a resposta rápida dos governos, com medidas públicas temporárias, impediu uma vaga generalizada de falências relacionadas com a COVID-19, principalmente através de soluções para resolver problemas de liquidez e de curto prazo que resultaram no sobre-endividamento das empresas da UE.
2.3O fim da maioria das medidas de apoio público já concedidas coincide com novas tensões que afetam as economias mundial e europeia, como a crise energética, a inflação, o fim da política monetária flexível do Banco Central Europeu (BCE), o alargamento dos prémios de risco, o aumento das despesas de financiamento, os problemas nas cadeias de abastecimento e a invasão da Ucrânia pela Rússia.
2.4A posição da Europa como líder da transição ecológica exigirá grandes investimentos de agentes públicos e privados. O enfraquecimento da posição das PME poderá dificultar a sua adaptação às novas normas e mantê-las aquém das grandes empresas ou das empresas de média dimensão de outras partes do mundo.
2.5Dado que uma elevada percentagem de empresas está sobre-endividada e, ao mesmo tempo, necessita de recursos a longo prazo para enfrentar os desafios futuros, são necessárias novas soluções que reforcem o capital das MPME e das pequenas empresas de média capitalização. As iniciativas existentes a nível europeu, como o programa ESCALAR do Banco Europeu de Investimento, visam geralmente empresas de elevado crescimento que são consideradas empresas jovens de acelerado crescimento ou empresas em fases iniciais que são financiadas por fundos de capital de risco. As novas soluções devem complementar as soluções já em vigor e centrar-se nas MPME e pequenas empresas de média capitalização existentes e estabelecidas, que constituem a maioria das empresas europeias.
2.6Alguns países lançaram medidas seletivas para reforçar a capacidade de investimento das empresas, evitando simultaneamente o risco de «inviabilização». Em Espanha e França, estes programas representam mais de 30 mil milhões de euros para 15 mil empresas, utilizando os empréstimos altamente subordinados como principal instrumento e a notação de risco como critério de seleção para garantir que os beneficiários são empresas viáveis.
3.Observações na generalidade
3.1O sobre-endividamento das empresas europeias exige algum tipo de instrumento de recapitalização que lhes permita manter ou aumentar o seu esforço de investimento. Até ao momento, os mercados públicos têm apoiado de forma razoavelmente adequada as empresas cotadas em bolsa, mas os mercados privados não têm profundidade suficiente para apoiar as empresas de menor dimensão. Estima-se que o défice de capital próprio e de capital híbrido que a UE poderá enfrentar devido à pandemia e à redução das medidas de apoio estatal se situe entre 450 e 600 mil milhões de euros
.
3.2As MPME e as pequenas empresas de média capitalização referem, de um modo geral, que têm mais dificuldade do que as grandes empresas em aceder ao financiamento, especialmente o financiamento a longo prazo:
3.2.1Segundo o inquérito SAFE
, uma percentagem maior dessas empresas afirma que enfrenta obstáculos (7% das PME em comparação com 4% das grandes empresas), tem taxas de sucesso mais baixas (72% contra 85%) e taxas de rejeição mais elevadas (6% contra 2%) e obtém piores condições quando pede um empréstimo.
3.2.2As empresas familiares representam mais de 60% de todas as empresas europeias (com valores que ascendem a 85% em Espanha e 75% em Itália, França e Alemanha
). É menos provável que estas empresas procurem alternativas de capital próprio para financiamento a longo prazo que exijam a renúncia ao controlo da empresa.
3.3Além disso, as PME tendem a ter uma carteira menos diversificada de instrumentos financeiros externos, que são frequentemente baseados em bancos e orientados para utilizações a curto prazo.
I)A dependência das PME em relação aos bancos continua a ser elevada na área do euro, com 70% do financiamento externo a depender dos bancos, contra 40% nos EUA
.
II)Constata-se que 63% das grandes empresas declaram utilizar fundos para investimentos em capital fixo, em comparação com 38% das PME e apenas 28% das microempresas
.
3.4Por conseguinte, o presente parecer de iniciativa recomenda o desenvolvimento de um quadro comum para os instrumentos financeiros altamente subordinados que estimule a recapitalização das empresas da UE. Esse quadro deve assegurar que estes instrumentos assumem uma posição de quase capital, de modo a não afetar o rácio de dívida das empresas nem a sua notação.
3.4.1O presente parecer insta a UE a tomar medidas coletivas para desenvolver adequadamente este quadro comum, em conformidade com os princípios da subsidiariedade e da proporcionalidade, permitindo a intervenção da União quando, devido à dimensão e aos efeitos da ação proposta, os objetivos de uma ação puderem ser mais bem alcançados ao nível da União.
3.4.2Um quadro deste tipo para os instrumentos altamente subordinados deve:
I)colmatar o referido défice de financiamento a longo prazo para reforçar os balanços e apoiar o investimento;
II)proporcionar às empresas familiares um instrumento para impulsionar os seus investimentos a longo prazo sem renunciar ao controlo da sua empresa, pois os estudos mostram que estão dispostas a distribuir uma parte dos lucros e/ou a emitir instrumentos híbridos;
III)ser compatível com as práticas dos principais prestadores de serviços financeiros (bancos comerciais, gestores de ativos, setor público), para que possa chegar à maioria das empresas;
IV)ajudar a atrair investidores institucionais, como as companhias de seguros e os fundos de pensões, sujeitos ao Regulamento sobre os documentos de informação fundamental para pacotes de produtos de investimento de retalho e de produtos de investimento com base em seguros (PRIIP), que gerem as poupanças e são um interveniente fundamental para canalizar mais ativos para a economia real.
3.5Existem diferentes instrumentos altamente subordinados que podem ser utilizados para reforçar os balanços das PME e das empresas de média capitalização, tais como obrigações, obrigações convertíveis, sistemas de ações duplas e empréstimos híbridos (tais como empréstimos participativos):
I)As empresas de grande capitalização são as que mais utilizam a emissão de obrigações, nomeadamente para grandes emissões. Esses processos são complexos e dispendiosos. Por exemplo, embora a utilização de obrigações de empresas tenha aumentado consideravelmente nos últimos anos, existem apenas 2 mil emitentes ativos no total, principalmente empresas de maior dimensão.
II)As obrigações convertíveis privadas têm como principal vantagem o facto de serem extremamente flexíveis em termos de estrutura, uma vez que se trata de um contrato privado. No entanto, implicam também um baixo nível de segurança para as empresas mais pequenas, que geralmente possuem menos literacia financeira, e custos de transação elevados. São utilizadas principalmente por fornecedores de capital de risco sofisticados.
III)Os sistemas de ações duplas referem-se à emissão de duas categorias de ações, tendo uma delas geralmente associados direitos de voto limitados ou inexistentes, embora proporcione capital próprio. Embora este instrumento seja permitido em alguns Estados-Membros (como os países nórdicos, Polónia, Portugal e Itália), em muitos outros (como Alemanha, França e Espanha) não o é, afigurando-se difícil alcançar uma implantação em grande escala, uma vez que exigiria um elevado grau de adaptação à empresa emissora das ações.
IV)Os empréstimos híbridos são instrumentos de dívida altamente subordinados e orientados para o longo prazo (geralmente incluindo períodos de tolerância). Trata-se de um instrumento regulamentado em muitas jurisdições, que confere maior segurança às empresas e torna o processo mais ágil, uma vez que o produto não é criado em cada operação. Além disso, não penaliza as empresas em termos de endividamento, uma vez que ocupa a última posição na ordem de reembolso, antes do capital próprio.
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Implantação
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Viabilidade
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Histórico
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Proteção das empresas
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Proteção dos investidores
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Obrigações
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Baixa
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Alta
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Baixo
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Média
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Alta
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Obrigações convertíveis
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Média
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Média
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Baixo
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Baixa
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Alta
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Ações duplas
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Baixa
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Média
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Médio
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Alta
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Média
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Empréstimos híbridos
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Alta
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Alta
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Médio-alto
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Alta
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Média
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Fonte: Inbonis Rating.
3.6Um instrumento de empréstimo híbrido é a melhor alternativa, por vários motivos:
I)representa uma solução a longo prazo que é fácil de aplicar e proporciona maior proteção às empresas, em comparação com as obrigações ou as ações;
II)para as MPME, assegura que não há diluição ou perda do controlo, tendo simultaneamente vantagens nos custos, como a dedutibilidade fiscal ou custos de emissão mais baixos);
III)para os mutuantes, oferece um retorno atrativo, sem necessidade de envolver os detentores nas decisões das empresas;
IV)os empréstimos participativos, que são um tipo de empréstimo híbrido, já existem e são regulamentados em muitos países europeus, como Espanha (préstamos participativos), França (prêts participatifs), Alemanha (Partiarisches Darlehen) ou, mais recentemente, Portugal (empréstimos participativos).
3.6.1Os empréstimos híbridos são o instrumento escolhido por diferentes iniciativas públicas e privadas para fazer face à falta de financiamento de capital em toda a UE: existem pelo menos seis programas em três Estados-Membros, bem como alguns programas do Fundo Europeu de Investimento, que utilizam este empréstimo participativo híbrido:
I)França tem o programa Relance, um programa de dívida subordinada apoiado pelo Estado no valor de 12,7 mil milhões de euros, destinado a 10 mil empresas, principalmente PME, utilizando empréstimos participativos e obrigações subordinadas. Este programa é distribuído pelos bancos e financiado por investidores institucionais.
II)Em Espanha, o fundo de mil milhões de euros para a recapitalização de empresas afetadas pela COVID-19 destina-se a PME e empresas de média capitalização com problemas de solvabilidade mas viáveis, utilizando empréstimos participativos.
III)Também em Espanha, existe um fundo de apoio ao investimento industrial produtivo, num montante total de 9 mil milhões de euros a 15 anos (600 milhões de euros por ano), financiado por fundos públicos, que utiliza dívida regular, empréstimos participativos e capital próprio, destinado a empresas com projetos de investimento industrial.
IV)Em Valência, o banco de desenvolvimento regional, Instituto Valenciano de Finanzas, lançou vários programas de financiamento que utilizam um empréstimo participativo para apoiar as PME e as empresas de média capitalização estratégicas com um projeto de investimento, num montante total de 400 milhões de euros por ano.
V)Os Países Baixos lançaram um programa de apoio a empréstimos subordinados para PME, no valor de 400 milhões de euros.
3.7A fim de assegurar uma implantação eficaz que chegue a todas as MPME e tenha o máximo impacto, o melhor sistema operacional é aquele em que há múltiplas entidades cedentes e distribuidores, tanto do setor público como privado, que podem não coincidir. Entre as entidades cedentes contam-se os bancos, os gestores de ativos e também o setor público, ao passo que os investidores podem ser os próprios bancos, o setor público ou investidores institucionais (seguradoras e fundos de pensões). Este quadro diz respeito a operações de cedência novas e não à titularização de operações já existentes. Foi o que aconteceu, por exemplo, em França, com o programa Relance.
3.8Atenuação da potencial perceção do risco num sistema de empréstimos híbridos distribuído em grande escala em toda a Europa:
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Perceção do risco
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Solução
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Supervisão do sistema bancário paralelo
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A inclusão de instrumentos de gestão do risco, como a notação de risco, eliminaria o risco do sistema bancário paralelo.
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Exclusão dos bancos
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Um instrumento de empréstimo híbrido restabeleceria a solvabilidade das empresas, pelo que os bancos estariam dispostos a continuar a conceder-lhes empréstimos.
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Compatibilidade com a iniciativa DEBRA (Debt Equity Bias Reduction Allowance, dedução para reduzir a distorção dívida-capital próprio)
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Esta iniciativa procura igualmente evitar o sobre‑endividamento das empresas, pelo que é compatível com o objetivo principal da iniciativa DEBRA.
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Restabelecimento da solvabilidade das empresas não viáveis
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A introdução de normas de mercado, como a notação de risco, impediria as empresas não viáveis de acederem a estes instrumentos. Muitos programas públicos que utilizam empréstimos participativos incluíram este requisito.
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4.
Observações na especialidade
4.1O quadro proposto para empréstimos híbridos deve cumprir determinadas normas que o tornem atrativo para todas as partes interessadas: empresas, prestadores de serviços financeiros que atuam como distribuidores e investidores institucionais.
4.2É essencial que o quadro assegure que este tipo de empréstimo híbrido seja considerado capital próprio, com os seguintes efeitos:
I)Para o cálculo do rácio dívida-capital, de modo a não aumentar o endividamento existente ou não ter impacto excessivo no rácio dívida-capital. Por exemplo, em França, o artigo L313-14 do Code monétaire et financier [Código Monetário e Financeiro] estabelece que os empréstimos participativos são tratados como capital próprio para efeitos da avaliação da situação financeira das sociedades beneficiárias.
II)Para efeitos de redução do capital. É este o caso, por exemplo, na regulamentação espanhola, que estabelece que os empréstimos participativos são incluídos no cálculo do capital próprio para efeitos de redução de capital e liquidação de empresas e que o reembolso antecipado ou a amortização de empréstimos participativos só pode ocorrer se for seguido de um aumento de capital no mesmo montante.
III)Em caso de insolvência, os empréstimos híbridos devem ter um estatuto subordinado, abaixo das dívidas ordinárias ou dos credores comuns e acima dos acionistas. Interpretar a dívida de outra forma poria provavelmente em causa a capacidade das empresas para aumentar a dívida a partir de fontes tradicionais. Um dos objetivos do plano de ação para a UMC é alcançar uma maior convergência entre os regimes nacionais de insolvência, que diferem entre os Estados-Membros da UE.
4.2.1Há casos em que os empréstimos híbridos são considerados capital próprio de acordo com as normas internacionais de relato financeiro (IFRS) e o quadro de Basileia II. Por exemplo, quando um empréstimo híbrido tem maturidade perpétua, pode ser considerado capital próprio ao abrigo das normas IFRS, devido ao seu estatuto de altamente subordinado. Em geral, os instrumentos híbridos podem ser considerados capital próprio se forem não garantidos, subordinados e totalmente desembolsados, se não forem reembolsáveis por iniciativa do detentor, se puderem ser utilizados para cobrir perdas e se for possível adiar a obrigação de pagar juros.
4.2.2O CESE recomenda a alteração da Diretiva Contabilística (Diretiva 2013/34/UE), a fim de harmonizar o procedimento contabilístico para os empréstimos híbridos ou outros tipos de dívida com um prazo de vencimento superior a oito anos, com um período de tolerância de pelo menos três anos e com uma taxa de juro variável, em parte ligada ao «sucesso» definido de forma discricionária (por exemplo, em função do crescimento, da rentabilidade, etc.). Esta alteração facilitará o cálculo dos empréstimos híbridos como capital próprio aquando do cálculo do património líquido de uma sociedade para efeitos de direito comercial, tratando-os como capital próprio ou fundos próprios para efeitos contabilísticos.
4.3Para evitar incertezas, o instrumento deve manter a sua contrapartida de dívida para outros fins (ou seja, fiscais e legais), pelo que a emissão de um instrumento equiparável a capital próprio não deve implicar a perda do controlo de voto pelas empresas.
4.3.1Outro ponto importante tanto para as empresas como para os investidores é o facto de os juros periódicos pagos sobre o instrumento de dívida subordinada não poderem ser sujeitos a qualquer retenção ou dedução na fonte, de modo que o consórcio receba o rendimento de juros em termos brutos.
4.4No que diz respeito ao investimento, um instrumento de quase capital como o proposto seria considerado um instrumento elegível para os fundos europeus de investimento a longo prazo (ELTIF), em conformidade com o artigo 10.º do Regulamento ELTIF, permitindo a sua integração imediata no ecossistema financeiro.
4.4.1Os ELTIF poderiam posteriormente ser comercializados na UE através da publicação de um prospeto ou de um documento de informação fundamental que cumpra os requisitos da Diretiva Prospeto ou do regulamento relativo aos pacotes de produtos de investimento de retalho e de produtos de investimento com base em seguros, respetivamente. Tal ajudaria a integrar os pequenos investidores na dívida privada e na economia real, algo que ainda não foi alcançado com as iniciativas de financiamento por empréstimo colaborativo.
4.4.2De preferência, o instrumento deve incorporar normas de mercado, tais como notações de risco emitidas por agências registadas na Autoridade Europeia dos Valores Mobiliários e dos Mercados (ESMA) ou avaliações com base em indicadores ambientais, sociais e de governação, a fim de reforçar a carteira de investidores.
4.5Por último, esta iniciativa apoiaria a UMC. Uma abordagem à escala da UE, com um modelo de instrumento europeu comum, poderia beneficiar da visibilidade, da liquidez e da escala do mercado único e gerar uma ampla aceitação entre os investidores institucionais que procuram perfis de risco de dívida e de tipo híbrido, mas com melhores rendimentos, respondendo também às necessidades das empresas de menor dimensão. Com uma dimensão suficiente à escala da UE, um quadro bem-sucedido poderia evoluir para uma categoria de ativos bem definida capaz de incentivar o investimento e a integração na UE.
Bruxelas, 6 de outubro de 2022
Stefano Palmieri
Presidente da Secção da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social
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