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Document 52007DC0354

Livro verde da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões - Adaptação às alterações climáticas na Europa – possibilidades de acção da União Europeia {SEC(2007) 849}

/* COM/2007/0354 final */

52007DC0354

Livro verde da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões - Adaptação às alterações climáticas na Europa – possibilidades de acção da União Europeia {SEC(2007) 849} /* COM/2007/0354 final */


[pic] | COMISSÃO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS |

Bruxelas, 29.6.2007

COM(2007) 354 final

LIVRO VERDE DA COMISSÃO AO CONSELHO, AO PARLAMENTO EUROPEU, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES

Adaptação às alterações climáticas na Europa – possibilidades de acção da União Europeia {SEC(2007) 849}

LIVRO VERDE DA COMISSÃO AO CONSELHO, AO PARLAMENTO EUROPEU, AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU E AO COMITÉ DAS REGIÕES

Adaptação às alterações climáticas na Europa – possibilidades de acção da União Europeia(Texto relevante para efeitos do EEE)

Índice

1. Adaptação e mitigação - dois conceitos a relacionar 3

2. Um desafio global? Porquê? 4

3. A Europa não sairá incólume 5

4. A Europa tem de se adaptar – Os desafios para a sociedade europeia e as políticas públicas europeias 10

5. Orientar a acção da União – Opções prioritárias de uma abordagem flexível fundada em quatro pilares 15

5.1. Primeiro pilar: acção rápida da União Europeia 15

5.1.1. Integração da adaptação às alterações climáticas no âmbito da aplicação da legislação e das políticas actuais e futuras 15

5.1.2. Integrar a adaptação às alterações climáticas nos programas de financiamento comunitários existentes. 21

5.1.3. Elaborar novas respostas políticas. 22

5.2. Segundo pilar: integrar a adaptação na acção externa da União Europeia 23

5.3. Terceiro pilar: reduzir a incerteza alargando a base de conhecimentos através de investigação integrada sobre o clima 26

5.4. Quarto pilar: fazer participar a sociedade, as empresas e o sector público europeus na elaboração de estratégias de adaptação coordenadas e abrangentes 29

6. Próximas etapas 29

Anexos

Nota: todas as imagens e mapas do presente documento serão impressos a cores.

1. ADAPTAÇÃO E MITIGAÇÃO - DOIS CONCEITOS A RELACIONAR As alterações climáticas colocam-nos perante um duplo desafio. Em primeiro lugar, as graves consequências das alterações climáticas só poderão ser evitadas pela diminuição rápida e radical das emissões de gases com efeito de estufa (emissões GEE). A passagem rápida a uma economia global com menos emissões do carbono constitui, deste modo, o elemento fundamental da política integrada da União Europeia em matéria de alterações climáticas e energia, de modo a alcançar o objectivo da União Europeia de manter o aumento médio das temperaturas mundiais abaixo de 2°C em relação aos níveis da era pré-industrial. |

Em caso de subida superior a 2°C, o risco de alterações climáticas perigosas e imprevisíveis agrava-se de forma considerável e os custos da adaptação irão aumentar rapidamente. É, assim, imperativo que se adopte uma estratégia de mitigação das alterações climáticas para a comunidade internacional, tendo os chefes de Estado ou de governo da União Europeia acordado por unanimidade, no Conselho da Primavera de 2007, e no âmbito de um esforço internacional, reduzir as suas emissões de gases com efeito de estufa em 20% até 2020 ou, caso se alcance um acordo global e abrangente, 30% até 2020. Apelaram ainda a uma redução global de 50%, no máximo, até 2050, em comparação com os níveis de 1990. Em segundo lugar, como as alterações climáticas já se fazem sentir, as sociedades do mundo inteiro confrontam-se com o duplo desafio da adaptação às respectivas consequências, visto que estamos perante um processo de certo modo irreversível, neste século e mais para diante, mesmo que se revelem bem sucedidos os esforços de mitigação globais a levar a cabo nas próximas décadas. Se bem que a adaptação se tenha tornado um complemento incontornável e indispensável da estratégia de mitigação, não é uma alternativa à redução das emissões GEE, pois tem os seus limites. Uma vez ultrapassados determinados limiares de temperatura, algumas consequências climáticas (como a deslocação maciça das populações) serão graves e irreversíveis. | [pic] |

A União Europeia tem de assumir o desafio da adaptação, de parceria com os Estados-Membros e a nível global com países parceiros. É necessária uma abordagem europeia para garantir a devida coordenação e eficácia da actuação exigida para a resolução deste problema. As medidas de adaptação devem ser coerentes com as medidas de mitigação e inversamente. São também necessárias para garantir os benefícios obtidos com a estratégia de Lisboa para o crescimento e o emprego. O presente Livro Verde analisa o impacto das alterações climáticas na Europa, assim como os possíveis cenários de actuação da União Europeia. Embora incida sobre a actuação da União Europeia, não deixa de ter em consideração o papel proeminente desempenhado quer pelos Estados-Membros, quer pelas entidades regionais e locais no contexto de uma estratégia de adaptação que se pretende eficaz. Dado que o desafio da adaptação, pela sua natureza intrínseca, tem um carácter global, o Livro Verde aborda a dimensão externa desta questão, analisa medidas de adaptação já concretizadas na Europa, susceptíveis de aplicação noutras partes do mundo, assim como a oportunidade, para a União Europeia, de assumir a liderança internacional neste processo. Os participantes na recente cimeira do G8, em Heiligendamm, acolheram favoravelmente a adopção do programa de trabalho de Nairobi sobre a adaptação e reiteraram o seu empenho em reforçar a cooperação com os países em desenvolvimento e auxiliá-los neste domínio. |

2. UM DESAFIO GLOBAL? PORQUÊ?

Em muitas zonas do mundo fazem-se já sentir os efeitos negativos de um aumento das temperaturas médias globais de apenas 0,76º, em comparação com 1850. Sem uma política global eficaz de mitigação das alterações climáticas, as estimativas mais optimistas do quarto relatório de avaliação do Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas (IPCC 4AR, Grupo de Trabalho I), no que se refere ao aquecimento global até 2100, oscilam entre 1,8°C e 4°C em relação aos níveis de 1990 (ver anexo 1). Ou seja, de três a seis vezes o aumento das temperaturas registado desde a era pré-industrial. Mesmo nas perspectivas menos pessimistas, baseadas num cenário de status quo , se admite um aumento das temperaturas superior a 2°C em relação à era pré-industrial. No anexo do presente Livro Verde explicam-se mais pormenorizadamente as principais consequências das mudanças de temperatura para o planeta.

Nas últimas três décadas, as alterações climáticas deixaram já profundas marcas em muitos sistemas físicos e biológicos em todo o mundo:

- água: o acesso ao aprovisionamento seguro em água potável reduzir-se-á ainda mais. A água de fusão dos glaciares abastece actualmente mais de mil milhões de pessoas; quando se esgotar, as populações serão provavelmente forçadas a migrar para outras regiões do mundo, desencadeando perturbações locais e até mundiais, o que criará um clima de insegurança. É provável o aumento das áreas atingidas pela seca;

- ecossistemas e biodiversidade: cerca de 20%-30% das espécies animais e vegetais até agora identificadas encontrar-se-ão muito possivelmente sob um risco acrescido de extinção se as temperaturas médias globais ultrapassarem 1,5º-2,5º;

- alimentação: prevê-se que as alterações climáticas aumentem o risco de carência alimentar; o número adicional de pessoas em risco poderá ascender a várias centenas de milhares;

- regiões costeiras: o aumento do nível do mar irá ameaçar os deltas do Nilo, do Ganges/Brahmaputra e do Mekong e forçará a deslocação de mais de um milhão de pessoas em cada uma destas áreas, até 2050. Os pequenos Estados insulares já sentem estas repercussões;

- saúde: as alterações climáticas terão impactos directos e indirectos sobre a saúde humana e animal. Entre os riscos mais graves contam-se os efeitos de fenómenos meteorológicos extremos e o recrudescimento de doenças infecciosas. As doenças dependentes das condições climáticas são das mais letais em todo o mundo. A diarreia, a malária e a desnutrição energético-proteica provocaram por si só a morte de mais de 3,3 milhões de pessoas em todo o mundo, em 2002, tendo 29% destes óbitos sido registados em África.

3. A EUROPA NÃO SAIRÁ INCÓLUME

Os efeitos das alterações climáticas na Europa e no Árctico são já significativos e mensuráveis. As alterações climáticas terão graves consequências para o ambiente natural da Europa e afectarão praticamente todos os segmentos da sociedade e da economia. Devido à não linearidade dos efeitos das alterações climáticas e da sensibilidade dos ecossistemas, mesmo pequenas variações de temperatura podem ter uma incidência considerável. No anexo 3 descrevem-se os efeitos das mudanças de temperatura nas principais zonas geográficas europeias.

As temperaturas na Europa aumentaram praticamente 1ºC no último século, a um ritmo mais rápido que a média global. Uma atmosfera mais quente contém mais vapor de água, mas os novos níveis de precipitação podem variar bastante consoante as regiões. Na Europa do Norte o volume de precipitações (chuva e queda de neve) aumentou significativamente, ao passo que na Europa do Sul se tornaram mais frequentes os períodos de seca. As temperaturas extremas registadas recentemente, como a vaga de calor sem precedentes de 2003, são consentâneas com as alterações climáticas causadas pelas actividades humanas. Ainda que os fenómenos meteorológicos isolados não possam ser atribuídos a uma única causa, as análises estatísticas revelam que as alterações climáticas provocadas pelas actividades humanas já aumentaram consideravelmente o risco de ocorrência de tais fenómenos. Existem provas irrefutáveis de que quase todos os processos naturais, biológicos e físicos reagem às alterações climáticas na Europa e no resto do mundo (por exemplo, as árvores florescem mais cedo, os glaciares fundem-se). Mais de metade das espécies vegetais da Europa poderão encontrar-se vulnerabilizadas ou ameaçadas até 2080.

As áreas mais vulneráveis da Europa são (ver figuras 1 e 2):

- a Europa do Sul e toda a bacia do Mediterrâneo, devido ao efeito conjugado de elevados aumentos da temperatura e redução da precipitação em zonas já afectadas pela escassez de água;

- zonas montanhosas, sobretudo os Alpes, visto que as temperaturas aumentam rapidamente provocando a fusão generalizada de neve e de gelo que altera os caudais dos rios;

- zonas costeiras, devido à subida do nível do mar conjugada com o agravamento do risco de temporais;

- zonas alagadiças densamente povoadas, devido a um maior risco de temporais, precipitações intensas e inundações repentinas, que provocarão graves prejuízos em zonas urbanizadas e infra-estruturas;

- a Escandinávia, visto que se prevê o aumento das precipitações e uma larga parte destas sob a forma de chuva e não de neve;

- a região árctica, onde as mudanças de temperatura serão as mais profundas de todo o planeta.

Numerosos sectores económicos estão muito dependentes das condições meteorológicas e sofrerão directamente as consequências das alterações climáticas nas suas actividades e empresas: agricultura, silvicultura, pescas, turismo (estâncias balneares e de esqui) e saúde. A escassez de água, a erosão, as elevadas temperaturas, o aumento dos incêndios e uma maior pressão fitossanitária irão causar danos às florestas. Fenómenos extremos, como temporais, fortes precipitações, inundações provocadas pela subida do nível do mar, inundações repentinas, secas, incêndios florestais e desabamento de terras, serão cada vez mais frequentes e mais intensos, provocando danos em edifícios e em infra-estruturas de transporte e industriais com repercussões indirectas sobre os serviços financeiros e o sector de seguros. Mesmo os danos ocorridos fora da União Europeia terão graves consequências para a economia europeia, por exemplo, as indústrias transformadoras europeias terão problemas com o abastecimento de madeira.

As alterações climáticas afectarão, por exemplo, o sector energético e os padrões de consumo de energia:

- nas regiões em que as precipitações vão diminuir e os estios secos se tornarão mais frequentes, haverá menos água para o arrefecimento de centrais térmicas e nucleares, assim como para a produção de energia hidroeléctrica; a capacidade de refrigeração da água será também menor devido ao aquecimento geral da água, pelo que os limiares de descarga poderão ser ultrapassados;

- os cursos dos rios serão perturbados pelos níveis de precipitação alterados e pela redução do gelo e da neve nos picos montanhosos; o aumento da erosão poderá ocasionar maior assoreamento das barragens para a produção de energia hidroeléctrica;

- reduzir-se-á a procura de combustível para o aquecimento, mas aumentará o risco de falhas de energia, pois as canículas estivais implicarão uma maior necessidade de climatização, pelo que aumentará o consumo de electricidade;

- a recrudescência de temporais e inundações poderá pôr em risco as infra-estruturas energéticas.

As principais infra-estruturas de transporte com longos períodos de exploração, como auto-estradas, redes ferroviárias, vias navegáveis, aeroportos, portos e gares ferroviárias são vulneráveis às condições meteorológicas, por conseguinte os respectivos modos de transporte podem ser afectados pelas alterações climáticas. Por exemplo:

- a subida do nível do mar reduzirá a protecção proporcionada pelos quebra-mar e muralhas de cais;

- de um modo geral, é de prever o aumento dos riscos de danos e perturbações devido a temporais, inundações, vagas de calor, incêndios e desabamento de terras.

Podemos, assim, afirmar que embora as alterações climáticas tenham alguns aspectos positivos (por exemplo, a produção agrícola em determinadas zonas limitadas da Europa), esses são largamente ultrapassados pelos impactos negativos.

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Figura 1: Evolução da temperatura anual média até ao final do século[1]

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Temperaturas: Evolução da temperatura anual média [ºC]

Figura 2: Evolução das precipitações anuais médias até ao final do século

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Precipitações: Evolução dos volumes anuais [%]

4. A EUROPA TEM DE SE ADAPTAR – OS DESAFIOS PARA A SOCIEDADE EUROPEIA E AS POLÍTICAS PÚBLICAS EUROPEIAS

É necessário agir para evitar custos futuros

O relatório Stern[2] sobre os aspectos económicos das alterações climáticas conclui que as medidas de adaptação poderiam reduzir os custos desde que se estabeleça um dispositivo para eliminar os obstáculos à acção privada. É pouco provável que as forças de mercado permitam uma adaptação eficaz devido a alguma incerteza nas projecções climáticas e à falta de recursos financeiros. Por conseguinte, uma estratégia de adaptação que demonstre ser rentável é a opção mais adequada.

As primeiras estimativas do relatório Stern sugerem que, em caso de uma subida das temperatura médias globais compreendida entre 3ºC e 4°C, os custos suplementares de adaptação de infra-estruturas e edifícios poderiam já atingir 1% a 10% do total dos investimentos realizados no sector da construção pelos países da OCDE. Nestes países, as despesas suplementares necessárias para que as novas infra-estruturas e edifícios sejam mais resistentes às alterações climáticas poderiam oscilar entre 15 a 150 mil milhões de dólares por ano (0,05 a 0,5% do PIB). Se as temperaturas subirem de 5ºC a 6°C, as medidas de adaptação sofrerão, provavelmente, um acentuado aumento e, nesse caso, a sua eficácia relativa diminui.

Por exemplo, como se pode ver no gráfico da figura 3, os prejuízos causados pela subida do nível do mar numa situação de ausência de adaptação podem ser até quatro vezes superiores aos custos de meios suplementares de protecção contra as inundações. Se nada se fizer, os custos dos prejuízos aumentarão de forma exorbitante de 2020 até 2080.

Quando será necessária a adaptação?

Agindo rapidamente podemos colher inegáveis benefícios económicos mediante a antecipação dos potenciais prejuízos e a minimização dos riscos para os ecossistemas, a saúde humana, o desenvolvimento económico, bens e infra-estruturas. Seria ainda possível conquistar vantagens competitivas para as empresas europeias que se encontram na liderança das tecnologias e estratégias de adaptação.

É importante possuir um conhecimento suficiente da dimensão temporal das consequências para se estabelecerem as prioridades. Não se sabe ao certo o nível exacto do aumento das temperaturas, que, de resto, dependerá também das medidas globais de mitigação eventualmente tomadas nas próximas décadas. A incerteza é ainda maior em relação a prazos mais longos.

Na ausência de acção coerente, a União Europeia e os seus Estados-Membros poderão ser forçados a uma adaptação reactiva não planeada, frequentemente em situações de urgência para dar resposta a crises e a catástrofes cada vez mais frequentes, o que se revelará bem mais dispendioso e poderá ainda fazer perigar os sistemas sociais e económicos da União Europeia, bem como a sua segurança. Nos casos em que as previsões nos inspiram suficiente confiança, a adaptação deve começar quanto antes.

Figura 3: Impacto das medidas de adaptação sobre os prejuízos causados pela subida, maior ou menor, do nível do mar. Custos «com» e «sem» medidas de adaptação[3].

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Como se adaptarão os europeus?

O sector privado, as empresas, os sectores da indústria e dos serviços e até os cidadãos da União Europeia ver-se-ão confrontados com as consequências das alterações climáticas e podem desempenhar um papel importante no contexto das medidas de adaptação. Esta situação traduz-se num vasto leque de medidas, por exemplo:

- medidas «suaves» relativamente pouco dispendiosas, como a conservação dos recursos hídricos, modificação da rotação de culturas, das datas das sementeiras e utilização de variedades que resistam à seca, planeamento público e acções de sensibilização;

- medidas «duras» e dispendiosas, de defesa e deslocalização, por exemplo, aumentar a altura dos diques, deslocalizar portos, indústrias e cidades inteiras de zonas costeiras baixas e alagadiças, assim como a construção de novas centrais eléctricas em substituição de centrais hidroeléctricas obsoletas.

São necessárias medidas por parte do sector público, por exemplo, adaptação do ordenamento do território a riscos de inundação, reformulação da legislação existente em matéria de construção de modo a garantir que as infra-estruturas de longo prazo resistam a futuros riscos climáticos, actualização das estratégias de gestão de catástrofes, bem como de sistemas de alerta de inundações e incêndios florestais.

A adaptação implicará também novas oportunidades económicas, incluindo novas competências e mercados para produtos e serviços inovadores como:

- novos mercados para técnicas, materiais e produtos de construção mais resistentes às alterações climáticas;

- as estâncias balneares das praias do Mediterrâneo podem passar a ser mais frequentadas na Primavera e no Outono, quando o Verão for demasiado quente, por outro lado, as condições meteorológicas favoráveis nesta estação podem transformar o Atlântico e o mar do Norte em potenciais destinos turísticos;

- na Escandinávia, adaptação das práticas locais de gestão agrícola a épocas de cultura mais longas;

- o sector dos seguros pode desenvolver novos produtos destinados a minorar preventivamente os riscos e a vulnerabilidade em caso de catástrofe. Os prémios de seguro que antecipassem as alterações climáticas poderiam incentivar medidas privadas de adaptação.

Papel a desempenhar pelos Estados-Membros e pelas entidades a nível regional e local

A adaptação é uma questão complexa porque a gravidade dos efeitos das alterações climáticas dependerá em parte da vulnerabilidade física de cada região, do seu nível de desenvolvimento socioeconómico, da capacidade de adaptação das populações e do seu meio natural, dos serviços de saúde e dos mecanismos de prevenção de catástrofes.

Por conseguinte, no contexto das questões de adaptação às alterações climáticas surge o conceito de governança a vários níveis, implicando todos os intervenientes desde os cidadãos e as entidades públicas até às instâncias comunitárias. Devem ser tomadas medidas que se complementem aos níveis mais adequados, com base em parcerias conjuntas. A divisão de competências entre Estados e suas regiões é extremamente variada na União Europeia, pelo que os exemplos a seguir referidos devem ser adaptados a cada situação. De qualquer modo, muitos dos exemplos exigem a participação quer de entidades aos níveis nacional, regional e local, quer de outras entidades como as administrações das bacias hidrográficas, que teriam de trabalhar em estreita coordenação.

- Nível nacional

Melhorar os processos de gestão de catástrofes e crises

Irá aumentar a frequência e a intensidade de catástrofes de grande escala como incêndios, desabamento de terras, secas, vagas de calor, inundações ou surtos de doença. Os Estados-Membros devem considerar ainda mais prioritárias as medidas de prevenção, preparação, resposta e recuperação de catástrofes. A capacidade de resposta rápida às alterações climáticas deve ser acompanhada de uma estratégia de prevenção e alerta, tanto a nível nacional como europeu.

Poderiam ser reforçados instrumentos de gestão de riscos e criados novos meios: por exemplo, levantamento cartográfico das áreas vulneráveis segundo os tipos de impactos, desenvolvimento de métodos e modelos, avaliação e previsão de riscos, avaliação das consequências sanitárias, ambientais, económicas e sociais, utilização de dados provenientes da observação da Terra e recolhidos via satélite, em apoio das tecnologias de gestão de riscos. Podiam ser partilhadas a experiência adquirida e as boas práticas, incluindo planos de emergência.

Desenvolvimento de estratégias de adaptação

A experiência e a competência na concepção de estratégias de adaptação eficazes e respectivas medidas de execução são ainda limitadas. A partilha de informações sobre medidas de adaptação poderia reduzir de forma significativa os custos de aprendizagem ao nível dos Estados-Membros, das regiões, dos municípios e das comunidades.

As camadas mais necessitadas da população serão mais vulneráveis às alterações climáticas. É necessário, por conseguinte, tomar em consideração os aspectos sociais da adaptação, designadamente as ameaças que pesam sobre o emprego e a garantia de condições de vida e de alojamento decentes. Por exemplo, as crianças e os idosos são mais vulneráveis às vagas de calor.

- Nível regional

A adaptação às alterações climáticas constitui um desafio para os responsáveis pelo ordenamento do território na Europa, em especial ao nível regional. O ordenamento do território é uma questão transsectorial, sendo assim um instrumento adequado para definir medidas de adaptação rentáveis. Os requisitos mínimos em matéria de ordenamento do território, utilização do solo e modificação da utilização do solo, no contexto da adaptação, poderiam desempenhar um papel importante tanto em campanhas de sensibilização destinadas ao público em geral, aos responsáveis políticos e a especialistas como no desencadeamento de uma abordagem mais proactiva, a todos os níveis. Seria ainda de considerar a elaboração de documentos específicos de orientação técnica e o estudo de casos e de boas práticas. A União Europeia poderia dar apoio às regiões para a implementação do processo de adaptação e o intercâmbio de boas práticas.

- Nível local

Muitas das decisões que influenciam directa ou indirectamente a estratégia de adaptação são tomadas a nível local. É ainda a esse nível que melhor se conhecem as condições naturais e humanas prevalecentes. Logo, as autoridades locais contam-se entre os principais protagonistas deste processo. As mudanças de comportamento das sociedades e das comunidades depende, em larga medida, do grau de sensibilização para o problema. Os cidadãos e outros intervenientes podem não estar ainda conscientes da escala e da gravidade das consequências das alterações climáticas, designadamente sobre as suas actividades.

Por exemplo, podiam ser seguidas práticas de gestão e utilização dos solos de parceria com os agricultores, para evitar que a erosão provoque enxurradas, danificando habitações e localidades. Na Europa do Sul, alguns municípios desenvolveram, juntamente com os agricultores, iniciativas para poupar os recursos hídricos através da instalação de sistemas electrónicos de gestão e distribuição de água para a irrigação das culturas.

Nas regiões de maior precipitação, seria interessante adoptar sistemas distintos de recolha de águas residuais e pluviais para não ser necessário reforçar a capacidade de evacuação das águas residuais.

Por que razão é necessário agir a nível da União Europeia?

São óbvias as vantagens de uma estratégia de adaptação integrada e coordenada, a nível comunitário. Os sistemas físicos, biológicos e humanos da Europa caracterizam-se por uma grande diversidade, que as alterações climáticas irão realçar. Se, por um lado, uma estratégia de adaptação de «modelo único» não é obviamente adequada, por outro, as repercussões das alterações climáticas serão generalizadas e não obedecerão a fronteiras administrativas. Em numerosas áreas será necessário adoptar uma abordagem transfronteiriça, por exemplo, nas bacias fluviais e regiões biogeográficas. Ainda que as medidas tenham de ser tomadas ou implementadas a nível nacional ou local, onde existe capacidade operacional, é essencial que os esforços a todos os níveis sejam coordenados de modo rentável. Há que mobilizar os intervenientes a todos os níveis.

Determinados sectores (agricultura, recursos hídricos, biodiversidade, pescas e redes de energia) estão bastante entrosados a nível comunitário, através do mercado interno e das políticas comuns, pelo que seria judicioso integrar directamente nesses contextos os objectivos de adaptação. Podia também analisar-se o modo de ter em conta a adaptação nos programas de despesas comunitários (por exemplo, investigação, coesão, redes transeuropeias, desenvolvimento rural, agricultura, pescas, fundo social, acções externas e Fundo Europeu de Desenvolvimento). A adaptação exige solidariedade entre os Estados-Membros, de modo a garantir que as regiões mais pobres, mais desfavorecidas ou mais afectadas por este fenómeno possam tomar as medidas necessárias.

Em quase todos os Estados-Membros se adoptam estratégias de adaptação. É fundamental partilhar a experiência adquirida com medidas de adaptação prévias assim como os resultados das pesquisas efectuadas. A estratégia de adaptação beneficiaria da experiência adquirida em reacção a fenómenos meteorológicos extremos e com a implementação de planos de gestão, específicos e proactivos, dos riscos decorrentes das alterações climáticas.

A Europa dispõe das capacidades humanas, das competências técnicas e dos recursos financeiros necessários para assumir uma forte liderança deste processo. A adaptação é, sobretudo, uma questão de vontade política, de planeamento, de coerência e coordenação das acções. A União Europeia deve mostrar como se insere a adaptação em todas as políticas comunitárias pertinentes. Pode, assim, dar o exemplo e intensificar a cooperação com os seus parceiros em todo o mundo no que se refere à adaptação a esta ameaça globalizante.

O presente Livro Verde incide num primeiro conjunto de acções prioritárias mais prementes, a nível comunitário, no âmbito da esfera de competências da Comunidade. Neste contexto, podem considerar-se quatro linhas de acção.

- Nos casos em que os conhecimentos actuais sejam suficientes, há que desenvolver estratégias de adaptação para identificar a melhor afectação e gestão dos recursos, de modo a orientar as acções a nível comunitário, através das políticas comunitárias, sectoriais e outras, e dos fundos comunitários disponíveis.

- É imprescindível que a União Europeia reconheça a dimensão externa dos impactos climáticos e da adaptação, e forme uma nova aliança com os seus parceiros de todo mundo, sobretudo com os países em desenvolvimento. É indispensável coordenar as medidas de adaptação com os países vizinhos e estreitar a cooperação com as organizações internacionais.

- Nos casos em que se verifiquem lacunas no conhecimento, a investigação comunitária, o intercâmbio de informações e a concretização de acções preparatórias irão contribuir para minorar a incerteza e aumentar a base de conhecimentos. Seria conveniente reforçar a integração dos resultados da investigação nas políticas e práticas adoptadas.

- Há que aprofundar a análise e o debate no que se refere a estratégias e acções coordenadas, no âmbito de um grupo consultivo europeu em matéria de adaptação às alterações climáticas sob a égide do Programa Europeu sobre as Alterações Climáticas.

Analisam-se seguidamente, para cada uma destas quatro linhas de acção, uma série de opções prioritárias de actuação a nível comunitário.

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5. ORIENTAR A ACÇÃO DA UNIÃO – OPÇÕES PRIORITÁRIAS DE UMA ABORDAGEM FLEXÍVEL FUNDADA EM QUATRO PILARES

5.1. Primeiro pilar: acção rápida da União Europeia

A acção rápida incide nas seguintes medidas:

- integrar a adaptação às alterações climáticas no âmbito tanto da aplicação como da alteração da legislação em vigor e das políticas actuais e futuras;

- integrar a adaptação às alterações climáticas nos programas de financiamento comunitários existentes;

- elaborar novas respostas políticas.

5.1.1. Integração da adaptação às alterações climáticas no âmbito da aplicação da legislação e das políticas actuais e futuras

A adaptação às alterações climáticas terá repercussões sobre um grande número de domínios de acção da União Europeia. Apresenta-se em seguida uma panorâmica inicial da forma como a adaptação às alterações climáticas foi ou pode ser tida em conta nestes domínios. Como muitas das políticas comunitárias se baseiam numa legislação-quadro, o êxito da abordagem da União Europeia em matéria de adaptação depende do reforço da cooperação, aquando da fase de aplicação, entre os Estados-Membros, por um lado, e entre a União Europeia e os Estados-Membros, por outro.

Agricultura e desenvolvimento rural

A agricultura europeia deverá superar numerosas dificuldades nos anos vindouros, como os desafios associados à concorrência internacional, à continuação da desregulamentação da política comercial e ao declínio demográfico. As alterações climáticas exacerbarão estas dificuldades e agravarão a complexidade e o custo dos desafios a enfrentar. As alterações climáticas previstas terão repercussões sobre a produção agrícola, a gestão de explorações pecuárias e a localização das instalações de produção, com riscos importantes para os rendimentos agrícolas e a ameaça de desertificação em determinadas partes da Europa. Os riscos em matéria de produção alimentar poderão colocar problemas em algumas regiões europeias, já que as vagas de calor, as inundações e os parasitas farão provavelmente aumentar a frequência das más colheitas. À medida que aumenta a variabilidade dos rendimentos, agravam-se os riscos para o aprovisionamento alimentar a nível mundial. Neste contexto, importaria avaliar o potencial impacto do aumento possível da biomassa para a produção de energia sobre a oferta global de alimentos.

Com as alterações climáticas aumentará ainda mais a importância da agricultura e da silvicultura comunitárias no contexto da prestação de serviços ecossistémicos e ao ambiente. A gestão agrícola e florestal tem um papel essencial a desempenhar no que diz respeito, entre outros aspectos, à utilização racional dos recursos hídricos nas regiões secas, à protecção dos cursos de água contra as infiltrações excessivas de nutrientes, à melhoria da gestão das inundações, à manutenção e reabilitação das paisagens multifuncionais, como os pastos de elevado valor natural que fornecem um habitat a numerosas espécies e permitem a sua migração. A promoção de técnicas de gestão florestal mais adaptadas às alterações climáticas e de medidas de gestão dos solos que permitem preservar o carbono orgânico (por exemplo, técnicas de trabalho do solo atenuadas), bem como a protecção dos prados permanentes constituem medidas de mitigação igualmente susceptíveis de favorecer a adaptação aos riscos decorrentes das alterações climáticas.

O apoio comunitário à agricultura, à silvicultura e ao desenvolvimento rural desempenha um papel importante no contexto da produção de alimentos, da manutenção da paisagem rural e da prestação de serviços ambientais. As mais recentes reformas da Política Agrícola Comum (PAC) representam um primeiro passo para o estabelecimento de um quadro propício ao desenvolvimento sustentável da agricultura europeia. As próximas reformulações da PAC e o «controlo sanitário» de 2008 poderiam constituir a oportunidade de se analisarem meios para melhor integrar a adaptação às alterações climáticas nos programas de apoio à agricultura. Por exemplo, seria conveniente analisar em que medida a PAC poderia promover a aplicação de boas práticas agrícolas compatíveis com as novas condições climáticas, contribuindo de forma proactiva para a preservação e protecção do ambiente.

Indústria e serviços

Os sectores da indústria e dos serviços da União Europeia ver-se-ão confrontados com a necessidade, por um lado, de se adaptarem às alterações climáticas, por outro, de tirarem partido da possibilidade de comercialização de produtos e serviços que favorecerão esse processo. As alterações climáticas repercutir-se-ão sobre a indústria e os serviços, como os sectores da construção e do turismo, podendo implicar reestruturações e causar danos às infra-estruturas industriais. As empresas deverão adaptar-se às alterações climáticas, por exemplo integrando esta matéria nos planos de negócio. Simultaneamente, convirá explorar os benefícios conexos entre as medidas de mitigação e as de adaptação. Por exemplo, os investimentos em matéria de isolamento permitirão não só reduzir as necessidades de aquecimento no Inverno como proteger contra o calor e reduzir, assim, a necessidade de climatização nos Verões mais quentes.

Na próxima revisão intercalar, a Comissão analisará em que medida a política industrial pode contribuir para os esforços de adaptação. Seguir-se-á um plano de acção nos princípios de 2008.

Energia

A evolução das condições climáticas abrirá novas possibilidades, como as energias solar e fotovoltaica. Por outro lado, estios mais prolongados e secos podem afectar outras fontes de energia, como as energias nuclear e hidroeléctrica, aumentando paralelamente a necessidade de electricidade para a climatização. Este cenário potencia a importância da diversificação das fontes de energia, do desenvolvimento de fontes renováveis de energia, de uma melhor gestão da procura e da oferta e de um sistema de referência adaptado a uma maior variabilidade da procura e produção de electricidade. A Comissão está a preparar um plano estratégico para as tecnologias energéticas, cujo objectivo será acelerar a inovação nesse domínio, para enfrentar o duplo desafio da mitigação e da adaptação. Os edifícios são uma questão fundamental. Exemplificam a necessidade imediata de adaptação, para os tornar mais agradáveis num clima mais quente e para reduzir os gastos energéticos, o que se inclui na mitigação. A Comissão vai começar, num futuro próximo, a rever o quadro normativo pertinente, designadamente a directiva relativa ao rendimento energético dos edifícios.

Transportes

Para adaptar as infra-estruturas de transporte existentes às condições climáticas, sem deixar de garantir o seu bom funcionamento e a continuidade do serviço prestado, serão necessários investimentos suplementares significativos. Logo na fase de concepção de novas infra-estruturas e de meios de transporte associados se devem integrar características de resistência às alterações climáticas. Por exemplo, a variação do regime hidráulico e do nível das águas das vias fluviais navegáveis já teve implicações na concepção das embarcações de navegação interior. Um bom planeamento, incluindo questões de ordenamento do território, como a escolha dos locais de implantação, deve ter em conta a evolução das condições climáticas. Seria também útil disponibilizar guias sobre a interpretação da legislação comunitária em vigor que auxiliassem as autoridades portuárias e os gestores de infra-estruturas aquáticas a adaptarem essas infra-estruturas.

Saúde

As alterações climáticas acarretam, inegavelmente, impactos negativos para a saúde através das vagas de calor, das catástrofes naturais, da poluição atmosférica e das doenças infecciosas transmitidas por vectores. Além disso, doenças provocadas pelas águas, pela alimentação, incluindo doenças zoonóticas na população humana, podem ser afectadas pelas alterações climáticas. Estes efeitos podem ser agravados por outros factores de stress, como a exposição ao ozono e às partículas finas por ocasião de uma vaga de calor. A exposição a longo prazo às partículas finas na atmosfera está associada a diversas afecções como as doenças pulmonares crónicas obstrutivas, que exacerbam a sensibilidade dos indivíduos ao stress climático. Vários projectos desenvolvidos ao abrigo de programas comunitários de financiamento (sobretudo o programa de acção comunitária no domínio da saúde pública e os programas-quadro de investigação) incidiram sobre as consequências das vagas de calor sobre a saúde humana, medidas de saúde pública, prevenção de efeitos agudos para a saúde provocados por condições meteorológicas e estratégias de adaptação para a saúde. No âmbito da revisão intercalar do Plano de Acção Europeu «Ambiente e Saúde» (2004-2010) serão incluídas recomendações de acção.

A sanidade animal será muito provavelmente afectada pelas consequências das alterações climáticas nas condições de vida e pela potencial recrudescência das doenças infecciosas transmissíveis. As alterações climáticas podem ter repercussões directas ou indirectas nas doenças animais transmitidas por vectores.

A adaptação constitui uma estratégia de acção fundamental para assegurar que os efeitos potenciais das alterações climáticas sobre a saúde sejam minorados e mantidos ao nível mais reduzido possível. A Comissão Europeia reconhece que estes efeitos aumentam a um ritmo rápido e perigoso. Assim, prevê adoptar, em 2008, uma comunicação que incidirá especificamente sobre esta questão e que definirá um quadro de luta contra as consequências das alterações climáticas sobre a saúde humana e a sanidade animal. Esta comunicação irá examinar diferentes aspectos da mortalidade e da morbilidade provocados pelas alterações climáticas, incluindo a modificação do modo de transmissão de certas doenças infecciosas que afectam seres humanos e animais, a modificação dos modos de propagação de alguns alérgenos devido às variações atmosféricas e os riscos induzidos pelas radiações ultravioletas, num contexto em que as alterações climáticas retardam a recuperação da camada de ozono estratosférica.

A legislação relativa à defesa dos consumidores, à saúde pública, aos géneros alimentícios e aos alimentos para animais deve ser cuidadosamente analisada e adaptada de forma a limitar a vulnerabilidade às alterações climáticas. A Comissão poderá solicitar aos comités científicos e às agências da União Europeia que facultem informações quanto a riscos sanitários específicos associados às alterações climáticas.

Água

A directiva-quadro «Água» constitui um quadro coerente de gestão integrada dos recursos hídricos, mas não incide directamente sobre as alterações climáticas. O desafio será incorporar na respectiva implementação medidas referentes às alterações climáticas, logo no primeiro ciclo de planeamento para 2009. Em particular, os instrumentos económicos e o princípio do «utilizador-pagador» devem ser aplicados em todos os sectores, incluindo agregados familiares, transportes, energia, agricultura e turismo; assim se fomentará a redução e a racionalização do consumo de água.

A Comissão está a preparar uma comunicação sobre a escassez de água e a seca, estreitamente ligada às alterações climáticas e à adaptação. Algumas regiões da Europa Meridional, cujos recursos de água doce são já raros, sofrerão inevitavelmente. Os episódios de seca poderão tornar-se mais frequentes em toda a União Europeia e a qualidade da água irá deteriorar-se. É de extrema importância assegurar uma gestão sustentável da procura a nível comunitário. A tarifação inadequada da água, uma política incoerente de ordenamento do território e uma má distribuição dos recursos hídricos traduzem-se automaticamente na sobreutilização. A aplicação de uma política de tarifação racional, a elaboração de uma estratégia prioritária de economia da água, assim como a melhoria da eficácia em todos os sectores constituem já elementos fundamentais da abordagem da União Europeia.

De igual modo, a legislação proposta no que diz respeito à avaliação e à gestão das inundações focará os aspectos de prevenção, protecção e preparação. A implementação deve incluir a avaliação da amplitude de fenómenos extremos susceptíveis de ocorrerem no futuro, de molde a reduzir os riscos. É necessário atribuir um grau de prioridade elevado às medidas «suaves» não estruturais, ou seja, a utilização mais ampla possível de processos naturais para reduzir os riscos de inundação (utilização das zonas húmidas, maximização das capacidades de retenção na fonte, utilização sustentável dos solos e ordenamento do território limitando a exposição e a vulnerabilidade). Os dispositivos estruturais de protecção «duros» permanecerão, contudo, elementos importantes da luta contra as inundações calamitosas.

Meio marinho e pescas

A Comissão examinará a questão das alterações climáticas no contexto dos seus trabalhos sobre a política marítima da União Europeia. A estratégia para o meio marinho e a legislação correlacionada, que constituirão o pilar ambiental da política marítima, integrarão as alterações climáticas e as medidas de adaptação nos programas e planos de execução.

Assegurar a sustentabilidade das unidades populacionais é um objectivo importante da política comum das pescas. As alterações climáticas podem afectar os padrões de distribuição e a abundância das espécies, do plâncton aos grandes predadores, implicando acentuadas mudanças nas funções dos ecossistemas e na distribuição geográfica das unidades populacionais. Alterações significativas da temperatura das águas poderão também ter consequências na aquicultura. As medidas de adaptação necessárias devem reflectir-se plenamente na execução dos programas em vigor.

Ecossistemas e biodiversidade

As alterações climáticas afectarão profundamente as economias e as sociedades principalmente através dos seus efeitos sobre os ecossistemas e, mais particularmente, sobre o património natural, a biodiversidade e a continuidade dos serviços ecossistémicos terrestres, de água doce e marinhos. Com efeito, é, em grande parte, através dos sistemas naturais que as alterações climáticas se fazem sentir nas actividades humanas. Ecossistemas saudáveis resistirão melhor às alterações climáticas e, por conseguinte, estarão em melhores condições para continuar a prestar os serviços dos quais dependem a nossa prosperidade e o nosso bem-estar. São o âmago da política de adaptação. Por conseguinte, as pressões «clássicas» que provocam a fragmentação, a degradação, a sobreexploração e a poluição dos ecossistemas devem ser reduzidas para melhorar a resistência dos ecossistemas às alterações climáticas (« ecosystem climate-proofing »).

As alterações climáticas terão repercussões profundas sobre as componentes físicas e biológicas dos ecossistemas, ou seja a água, o solo, o ar e a biodiversidade. Para cada um destes elementos, vigoram já, ou estão em fase de preparação, disposições e políticas comunitárias. Será necessário que sejam implementadas em tempo útil para permitir uma acção rápida no intuito de reforçar a resistência dos ecossistemas às alterações climáticas. Será, contudo, muito difícil preservar ecossistemas saudáveis e funcionais, pois as alterações climáticas poderão comprometer os esforços passados e presentes. Será talvez necessário continuar a adaptar as políticas.

A implementação eficaz da comunicação de 2006 sobre a biodiversidade e o «Plano de Acção da UE para 2010 e Mais Além» contribuirão de forma significativa para preservar e recuperar a biodiversidade e os ecossistemas. A tónica deve recair sobre os seguintes objectivos: garantir a integridade, a coerência e a conectividade da rede Natura 2000; preservar e restabelecer a biodiversidade e os serviços ecossistémicos nas zonas rurais e no meio marinho; actuar de modo a que o desenvolvimento regional e territorial seja compatível com a biodiversidade; reduzir os efeitos prejudiciais das espécies exóticas invasoras.

Por utilização sustentável entende-se o facto de o desenvolvimento e a exploração não conduzirem ao declínio do património natural nem à degradação dos serviços ecossistémicos. Neste contexto, revestem-se de importância capital as contrapartidas que garantam a exequibilidade de projectos de desenvolvimento propícios à conservação do património natural. As análises de custos/benefícios e as avaliações de impacto deverão progressiva e sistematicamente internalizar o custo ambiental da deterioração dos ecossistemas.

Outros recursos naturais

Os programas Forest Focus 2003-2006 incluem a elaboração de estudos previsionais sobre alterações no crescimento das florestas, nas existências de carbono e na migração das espécies de árvores. Importa fomentar os programas de vigilância das florestas e dos solos a nível comunitário, dado que é com base nos resultados assim obtidos que deveriam ser desenvolvidas as medidas de intervenção necessárias. O Plano de Acção para as Florestas inclui investigação e formação no domínio da adaptação, da avaliação dos impactos e do intercâmbio de práticas; incentiva uma gestão das florestas atenta ao carbono, semelhante à gestão dos solos, tanto em termos de mitigação como de adaptação.

A estratégia sobre os solos e a legislação relacionada têm por objectivo proteger as funções dos solos em toda a União Europeia. Devem ser identificadas as zonas ameaçadas por uma diminuição dos teores em matéria orgânica, para que as alterações climáticas possam ser tidas em conta nos programas destinados a inverter as tendências não sustentáveis. A perda nítida de matéria orgânica do solo, num contexto de aquecimento climático, constitui uma preocupação essencial, pois o solo é o mais vasto reservatório terrestre de carbono.

A estratégia temática sobre a utilização sustentável dos recursos naturais pretende reduzir as consequências negativas da utilização dos recursos numa economia em expansão e melhorar a utilização dos recursos, segundo uma abordagem de continuidade. As alterações climáticas provocam a escassez de recursos naturais e acentuam o impacto ambiental da utilização dos recursos. O futuro plano de acção para um consumo e produção sustentáveis incluirá acções para melhorar a coerências das políticas vigentes e para reduzir a utilização de recursos e de energia.

Questões transversais

A resistência às alterações climáticas ( climate proofing ) deve ser integrada tanto na directiva sobre a avaliação do impacto ambiental como na directiva sobre a avaliação ambiental estratégica. As avaliações do impacto ambiental, as avaliações ambientais estratégicas e as avaliações de impacto das políticas devem analisar as repercussões sobre os ecossistemas mediante instrumentos que internalizem o custo dos prejuízos causados ao património natural e aos serviços ecossistémicos.

Os Estados-Membros e os mecanismos de protecção civil da União Europeia devem dar destaque à prevenção, à rapidez da acção e à preparação.

A recomendação relativa à gestão integrada da zona costeira (GIZC) defende uma abordagem estratégica do ordenamento e da gestão da zona costeira. As zonas costeiras encontram-se cada vez mais expostas aos riscos decorrentes das alterações climáticas e devem ser consideradas como um objectivo prioritário das medidas de mitigação e de adaptação. Uma abordagem coerente e integrada do ordenamento e da gestão das zonas costeiras deveria constituir um quadro propício às sinergias e nivelar as potenciais incoerências entre o desenvolvimento económico destas zonas e a necessária adaptação às alterações climáticas. Aquando da elaboração das abordagens e estratégias, devem ser dadas orientações em matéria de ordenamento e de gestão e aplicados os melhores princípios e práticas.

5.1.2. Integrar a adaptação às alterações climáticas nos programas de financiamento comunitários existentes.

Os Estados-Membros devem integrar actividades de adaptação quando da preparação dos respectivos programas no âmbito dos quadros comunitários de apoio, o que se aplica particularmente aos projectos de infra-estruturas. Já que as grandes infra-estruturas, como pontes, portos e auto-estradas têm uma duração de vida de 80 a 100 anos, é necessário que os investimentos efectuados hoje tenham plenamente em conta as condições previstas para o final do século. Os edifícios e outras infra-estruturas com um período de vida compreendido entre 20 e 50 anos deverão também ser concebidos para resistirem às condições climáticas do futuro. Investimentos que são considerados os melhores nas condições actuais não serão necessariamente viáveis do ponto de vista económico se tomarmos em consideração as condições climáticas do futuro ou os seus efeitos sobre a saúde dos ecossistemas. Por conseguinte, os investimentos a médio e longo prazo devem resistir às alterações climáticas. Por exemplo, nos Países Baixos, os conhecimentos mais recentes relativos aos efeitos das alterações climáticas sobre o débito dos cursos de água e a elevação do nível do mar já são tidos em conta na fase de projecto das infra-estruturas. Nos Estados Unidos, os arquitectos contam com uma elevação do nível do mar de um metro quando concebem projectos de pontes nas regiões litorais.

O quarto relatório sobre a coesão realçou a importância das alterações climáticas no âmbito da política de coesão comunitária[4]. A Comissão examinará como o conceito de resistência às alterações climáticas pode transparecer e ser aplicado nos programas e projectos adoptados ao abrigo do Fundo de Coesão, do Fundo de Desenvolvimento Regional (por exemplo, no âmbito das estratégias regionais de inovação), dos instrumentos de pré-adesão, dos programas relativos às redes transeuropeias, e nas medidas em matéria de infra-estruturas ao abrigo do Fundo de Desenvolvimento Rural.

O Fundo Social Europeu prevê um vasto leque de medidas que têm um papel primordial a desempenhar na sensibilização do público para as alterações climáticas, no reforço das capacidades, na formação, e sempre que ocorram deslocações forçadas de populações. Estas medidas poderiam consistir, por exemplo, num programa de formação para arquitectos sobre a resistência dos edifícios às alterações climáticas, em novas possibilidades de emprego para os jovens numa economia com menos emissões do carbono, ou cuidados de saúde preventivos tanto para crianças como pessoas idosas em caso de vagas de calor. Os Estados-Membros deveriam já tirar partido dos programas operacionais existentes para incluir estas medidas.

O fundo estrutural das pescas define as prioridades políticas e as modalidades de assistência para o sector da pesca e da aquicultura. Este fundo vai contribuir para a realização dos objectivos da política comum das pescas através de intervenções estruturais. Reforçar-se-á deste modo a competitividade das estruturas de exploração e o desenvolvimento de empresas economicamente viáveis. O impacto das alterações climáticas deve ser tido mais em conta.

O programa LIFE + deveria financiar projectos-piloto para promover a adaptação para além das fronteiras nacionais; poderia tratar-se de projectos de demonstração relativos, por exemplo, à rentabilidade das tecnologias de adaptação, a abordagens inovadoras, ao ordenamento para a adaptação e aos intercâmbios de boas práticas. Além disso, este programa deveria favorecer uma comunicação sustentável e sensibilizar o público para os efeitos das alterações climáticas e a adaptação.

O presente Livro Verde constitui uma oportunidade para se analisar em que medida as alterações climáticas e em especial as necessidades de adaptação podem ser devidamente contempladas nos programas de financiamento vigentes.

5.1.3. Elaborar novas respostas políticas.

Os efeitos das alterações climáticas influenciam directa ou indirectamente várias políticas comunitárias e a União Europeia ainda não encontrou uma resposta adaptada para o problema. Em relação a essas políticas, a Comissão deveria tentar instituir estímulos adequados para uma adaptação eficaz e economicamente vantajosa. Convirá proceder, até 2009, a uma verificação sistemática do impacto das alterações climáticas sobre o conjunto dos domínios de acção da Comunidade e das disposições legislativas comunitárias e completá-lo com novas medidas concretas.

Por exemplo, são necessárias medidas orientadas no que se refere à elaboração de códigos e métodos aplicáveis ao sector da construção, bem como ao desenvolvimento de culturas que possam resistir às alterações climáticas. A adaptação é também uma oportunidade para a inovação e as novas tecnologias com um crescente potencial de exportação das soluções tecnológicas desenvolvidas na UE. Este aspecto deve ser examinado em estreita cooperação com o sector privado.

As alterações climáticas e as suas repercussões em termos de danos materiais, interrupções das actividades comerciais e incêndios florestais representam um risco financeiro para os indivíduos, as empresas e o sector financeiro. Os serviços financeiros e os mercados de seguros terão de encontrar formas inovadoras para responder eficazmente ao agravamento dos riscos relacionados com as condições climáticas. Já se comercializam novos produtos financeiros, como produtos derivados climáticos ou «obrigações catástrofe» ( catastrophe bonds ), que devem continuar a ser desenvolvidos. Conviria por conseguinte reforçar a integração dos mercados europeus dos seguros ao abrigo da política comunitária relativa aos serviços financeiros e da Directiva «Solvabilidade II», na medida em que estamos perante mais uma oportunidade em termos tanto de oferta como de procura de produtos de seguros. Além disso, é importante avaliar a futura estrutura de riscos dos fundos públicos e privados existentes para dar resposta às catástrofes naturais, incluindo o fundo de solidariedade da União Europeia.

O ordenamento do território poderia constituir um quadro integrado permitindo relacionar a avaliação da vulnerabilidade e dos riscos, por um lado, e as capacidades de adaptação e as reacções de adaptação, por outro, de modo a facilitar a identificação de opções políticas e de estratégias rentáveis. Seria útil considerar fórmulas inovadoras de financiamento consagradas à adaptação para apoiar a aplicação de estratégias de adaptação coordenadas, nomeadamente em relação às regiões e aos segmentos da sociedade mais vulneráveis da Europa. A União Europeia tem um papel a desempenhar no estabelecimento e na coordenação de quadros e plataformas de avaliação ou redes de intercâmbio de informações.

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5.2. Segundo pilar: integrar a adaptação na acção externa da União Europeia

A crescente preocupação suscitada pelos efeitos das alterações climáticas e as necessidades de adaptação decorrentes influenciará as relações da União Europeia com os países terceiros. É necessário instaurar o diálogo e parcerias com os países em desenvolvimento, os países vizinhos e os países industrializados sobre esta temática. Se, por um lado, a diversidade das situações económicas, políticas, sociais e ambientais dos países parceiros exige estratégias de adaptação específicas, por outro, um grande número de medidas de adaptação é semelhante nos diferentes países e oferece, por conseguinte, vastas possibilidades de cooperação.

A política externa e de segurança comum (PESC) da União Europeia é um elemento fundamental para potenciar a sua capacidade de prevenção e arbitragem de litígios, como os conflitos fronteiriços, as tensões sobre o acesso a recursos naturais e os problemas causados por catástrofes naturais, agravados pelas alterações climáticas, bem como pelas suas possíveis consequências, como a migração forçada e as deslocações internas da população. A política de migração da União Europeia deve também integrar os efeitos das alterações climáticas, designadamente no que se refere à gestão das migrações.

Países em desenvolvimento

As alterações climáticas representam um sério desafio para a redução da pobreza nos países em desenvolvimento e ameaçam neutralizar as numerosas realizações em matéria de desenvolvimento. As populações pobres destes países dependem consideravelmente da utilização directa dos recursos naturais locais. Têm uma escolha limitada de meios de subsistência e uma capacidade igualmente limitada para enfrentar a variabilidade climática e as catástrofes naturais. Os países menos desenvolvidos de África, certas regiões da América Latina e da Ásia bem como os pequenos Estados insulares serão os mais gravemente atingidos. As alterações climáticas poderiam provocar deslocações maciças de populações, nomeadamente em regiões próximas da Europa.

Enquanto responsáveis pela maior de parte das emissões antropogénicas de gases com efeito de estufa que se acumularam ao longo do tempo na atmosfera, os países desenvolvidos devem apoiar medidas de adaptação nos países em desenvolvimento. A adaptação será fundamental para garantir a concretização, para além de 2015, dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio definidos pelas Nações Unidas, nomeadamente na África Subsariana. A União Europeia deve analisar de maneira mais exaustiva como integrar a adaptação às alterações climáticas tanto nas políticas externas como nos instrumentos de financiamento existentes e, caso necessário, elaborar novas políticas. A experiência adquirida pela União Europeia com as medidas de adaptação devia ser partilhada com os governos dos países em desenvolvimento, devendo estes ser auxiliados na elaboração de estratégias abrangentes. A adaptação deve igualmente ser integrada nas estratégias de redução da pobreza (documento de estratégia de redução da pobreza), bem como no planeamento do desenvolvimento e na gestão orçamental. As parcerias existentes, como com a China, a Índia e o Brasil, constituem uma sólida base para alargar a cooperação comunitária em matéria de alterações climáticas com as economias em desenvolvimento.

As políticas e os programas de adaptação dos países em desenvolvimento podem assumir muitas formas diferentes em função das necessidades específicas dos países (por exemplo, diversificação da agricultura ou dos meios de subsistência, melhoria do ordenamento do território e do repovoamento florestal, reforço da protecção das zonas costeiras em associação com a das zonas húmidas e dos ecossistemas costeiros, ou consolidação dos mecanismos de prevenção de catástrofes). São necessárias acções vigorosas assentes na redução das pressões convencionais sobre os ecossistemas, de modo a torná-los mais adaptáveis às alterações climáticas, em paralelo com o processo de resistência às alterações climáticas (« climate proofing ») para garantir a sustentabilidade dos investimentos.

Para promover a adaptação nos países em desenvolvimento, a União Europeia deve agir tanto a nível mundial como a nível europeu:

- no contexto da convenção-quadro das Nações Unidas sobre as alterações climáticas (CQNUAC), a União Europeia continuará a dar protagonismo à questão da adaptação e a promover a sua integração nos planos nacionais de desenvolvimento, por exemplo, através dos programas de acção nacionais de adaptação (PANA) e do programa de trabalho quinquenal relativo à adaptação, adoptado recentemente em Nairobi. Será indispensável a liderança comunitária para garantir a disponibilidade de recursos financeiros e técnicos suficientes, nomeadamente através do fundo de adaptação nos termos do Protocolo de Quioto, do Fundo Mundial para a Protecção do Ambiente e dos canais bilaterais, para levar a efeito os PANA e outras estratégias similares;

- o plano de acção da União Europeia sobre as alterações climáticas e o desenvolvimento (2004) prevê já estratégias de apoio à adaptação nos países em desenvolvimento, que podem, por exemplo, ser financiadas ao abrigo do programa temático para os recursos ambientais e naturais e dos fundos geográficos aos níveis nacional e regional. Há que potencializar a introdução de medidas de adaptação na programação geográfica. A revisão intercalar das estratégias nacionais e regionais em 2010 propiciará a primeira ocasião para tal. A avaliação intercalar do plano de acção, actualmente em curso, constitui igualmente a primeira ocasião para reexaminar o plano à luz do agravamento das alterações climáticas;

- a Comissão examina actualmente como incentivar o desenvolvimento do diálogo e da cooperação entre a União Europeia e os países em desenvolvimento no que diz respeito às alterações climáticas, ao abrigo de uma aliança global ( Global Climate Change Alliance) . A Comissão reservou um montante global de 50 milhões de euros para o período de 2007-2010, no intuito de apoiar o diálogo e de auxiliar os países em desenvolvimento através de medidas orientadas de mitigação e de adaptação. Algumas dessas medidas de apoio poderiam incluir o acompanhamento dos programas de acção de adaptação nacionais através de projectos-piloto concretos, em especial no que respeita à integração das actividades de adaptação nas políticas sectoriais fundamentais. Acrescente-se que a futura estratégia comunitária de redução de riscos de catástrofes lançará uma ponte entre a adaptação e a reacção a catástrofes.

Países vizinhos

A União Europeia deveria associar a Rússia, os países da Europa Setentrional, a Gronelândia, os países do Mar Negro, da Bacia mediterrânica, as regiões do Árctico e dos Alpes aos esforços de adaptação às alterações climáticas. Esta cooperação poderia incidir em especial sobre questões transfronteiriças, como os mares regionais, a gestão das bacias hidrográficas, o funcionamento dos ecossistemas, a investigação, a biodiversidade e a natureza, a gestão das catástrofes, a saúde humana, a transição económica, o comércio e o aprovisionamento energético. Os países vizinhos deveriam ser incentivados e auxiliados a analisar os impactos, os riscos, as vulnerabilidades e as respostas adequadas, bem como a incluir a adaptação nos seus planos de desenvolvimento. As acções desenvolvidas com os países vizinhos deveriam potenciar a cooperação, o diálogo e os processos existentes, nomeadamente no âmbito da política europeia de vizinhança (PEV), plataforma esta em já decorre um diálogo regular e estrutural, incluindo as questões relacionadas com as alterações climáticas, no contexto de planos de acção mutuamente acordados, estabelecidos até à data. O instrumento europeu de vizinhança e de parceria (IEVP) poderia apoiar projectos de adaptação para os países PEV e a Rússia. Nos países candidatos e potenciais candidatos, poderia recorrer-se ao Instrumento de Assistência de Pré-Adesão.

Países industrializados

Seria útil que as regiões industrializadas que se debatem com problemas análogos, como o Japão, o Sudeste da Austrália e o Sudoeste dos Estados Unidos, por exemplo, trocassem boas práticas em matéria de análises de impacto e medidas de adaptação. Conviria aprofundar as estratégias de cooperação com estes países.

Reforçar o comércio de bens e serviços sustentáveis

A Comissão pretende criar um mercado global de tecnologias ambientais que propicie o comércio de bens e serviços sustentáveis, assim como a transferência de tecnologia, em especial entre os países industrializados e os países em desenvolvimento. Uma via para se alcançar este objectivo é a utilização das negociações comerciais multilaterais e bilaterais sobre a questão do comércio e do investimento em tecnologias verdes e bens e serviços ambientais, no âmbito de uma abordagem articulada em torno de dois eixos, cooperação e estimulação.

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5.3. Terceiro pilar: reduzir a incerteza alargando a base de conhecimentos através de investigação integrada sobre o clima

Para a elaboração de estratégias para enfrentar o problema das alterações climáticas é de importância crucial a disponibilização de sólidos resultados científicos. Embora se tenham alcançado progressos consideráveis na compreensão do sistema climático do planeta, subsistem incertezas sobretudo no que diz respeito à precisão e à pormenorização das previsões relativas aos efeitos das alterações climáticas, aos níveis regional e local, bem como aos custos e aos benefícios de medidas de adaptação a mais curto prazo, como 2020-2030. Seria oportuno promover uma abordagem transsectorial e integrada, assim como a internalização dos custos ambientais da degradação dos sistemas físicos e biológicos. A investigação deveria incidir sobre o problema complexo dos factores interdependentes que não podem ser analisados separadamente. O sétimo programa-quadro de investigação da União Europeia (2007-2013) destaca marcadamente as alterações climáticas quer em termos da capacidade de previsão quer das estratégias de modelização e de adaptação. No anexo 4 descrevem-se alguns projectos de grande importância. Os aspectos seguidamente referidos serão analisados, entre outros, no âmbito dos trabalhos de investigação sobre a adaptação e as alterações climáticas:

- desenvolver metodologias globais e integradas para a avaliação dos impactos, das vulnerabilidades e de medidas de adaptação rentáveis; definir indicadores para medir a eficácia das respostas; melhorar a avaliação, à escala europeia, dos riscos, dos impactos e da rendibilidade das medidas de adaptação, em relação a um cenário de «não actuação»; comparar as medidas integradas tomadas à escala da União Europeia com as abordagens sectoriais, incluindo a análise de custos e vantagens numa perspectiva socioeconómica; melhorar a avaliação integrada, desenvolver e utilizar instrumentos que permitam demonstrar as vantagens económicas, ambientais e sociais da adaptação às alterações climáticas para as regiões europeias transfronteiriças;

- melhorar a compreensão de base e a previsão dos impactos na Europa, designadamente no Atlântico Norte, no Árctico, no Mediterrâneo e no mar Negro; reduzir a escala dos modelos climáticos e melhorar as previsões dos impactos à escala regional e local, incluindo os efeitos potenciais sobre o sector da água, o sector energético (redução da capacidade de arrefecimento das centrais eléctricas, incidências na hidroelectricidade, no aumento da procura de edifícios climatizados), sobre as infra-estruturas de transporte, as indústrias e as empresas, o ordenamento do território, a agricultura e a saúde humana;

- precisar os efeitos prováveis das alterações climáticas e do empobrecimento da camada de ozono sobre os ecossistemas e estudar meios para melhorar a sua resistência às alterações climáticas. Neste contexto, seria oportuno analisar os efeitos das alterações climáticas sobre as reservas de carbono dos solos e da biosfera em geral, bem como sobre os ecossistemas aquáticos, avaliar a influência das práticas agroecológicas e determinar os habitats , as espécies e os recursos naturais mais expostos a riscos;

- estabelecer, à escala europeia, modelos e séries de dados de alta resolução, necessários para uma utilização a longo prazo. Melhorar a coordenação entre os centros de dados, os sistemas e as redes de informação;

- melhorar o acesso aos dados existentes e integrar os dados pertinentes em matéria de adaptação nos sistemas INSPIRA ( Infrastructure for Spatial Information in Europe ), SEIS ( Shared Environment Information System ) e GMES ( Global Monitoring for Environment and Security ), reforçando a vigilância in situ, a longo prazo, dos aspectos relacionados com a qualidade e a quantidade dos recursos naturais, da biodiversidade e dos serviços ecossistémicos;

- incentivar e optimizar a utilização dos sistemas de informação que beneficiam de apoio comunitário, como o sistema europeu de alerta para inundações, o sistema europeu de informação sobre incêndios florestais e o centro de informação e vigilância para a protecção civil, o sistema de previsão dos resultados das colheitas, por exemplo ligando estes sistemas a uma infra-estrutura europeia adaptada para os dados meteorológicos e a programas de acompanhamento orientados. Melhorar as informações disponibilizadas pelos centros de dados europeus em matéria de qualidade do ar, recursos naturais, saúde humana, produtos e resíduos, adoptando uma perspectiva de ciclo de vida;

- apresentar, com uma periodicidade de quatro ou cinco anos, relatórios de síntese actualizados sobre os efeitos das alterações climáticas, adaptação às alterações climáticas e vulnerabilidades em relação ao fenómeno. Estes relatórios serão elaborados pela Agência Europeia do Ambiente e o Centro Comum de Investigação, com base nos resultados dos programas-quadro comunitários de investigação e dos programas nacionais de investigação;

- em cooperação com o sector privado, incentivar a investigação sobre a adaptação tendo em vista as empresas, os serviços e as indústrias; lançar actividades de investigação para o desenvolvimento de tecnologias de adaptação e de produtos para estimular a inovação em diferentes sectores (por exemplo, agricultura, silvicultura, água, energia, construção, pesca e aquicultura);

- lançar estudos à escala europeia sobre os planos actuais e futuros das regiões litorais para reforçar a protecção das zonas costeiras, os custos ambientais e económicos ligados a estes planos, os efeitos que poderão ter sobre o orçamento comunitário e sobre a economia das regiões litorais. Conviria ainda analisar os custos ligados aos portos e às vias navegáveis para continuar a assegurar as funções de transporte de base;

- melhorar os conhecimentos sobre os fluxos e a disponibilidade dos recursos no mundo, incluindo as fontes de energia renováveis; proceder a uma avaliação científica independente dos efeitos ambientais causados pela exploração dos recursos naturais, bem como da eficiência dos recursos. Seria útil tirar o melhor partido possível da análise proveniente do painel internacional sobre a utilização sustentável dos recursos naturais e dos relatórios IPCC;

- promover a cooperação, as parcerias e o estabelecimento de redes com a comunidade científica nos países-membros e não membros da União Europeia, designadamente os países em desenvolvimento, os países vizinhos e os parceiros-chave, e partilhar os resultados das investigações, os modelos climáticos e outros instrumentos metodológicos, em especial no âmbito do programa de trabalho quinquenal sobre a adaptação, ao abrigo da CQNUAC;

- prestar apoio aos profissionais através de orientações sobre os conhecimentos científicos e as medidas de adaptação existentes, as opções e as análises custos-benefícios destas opções; promover redes europeias para o intercâmbio e a consolidação dos conhecimentos, das experiências e das medidas de adaptação na Europa; facilitar a transferência de conhecimentos, da comunidade dos investigadores para os profissionais.

As modernas tecnologias da informação e da comunicação (TIC) e respectiva evolução futura serão cruciais neste processo de adaptação, dando respostas pertinentes, flexíveis e rápidas às exigências em matéria de adaptação (por exemplo, no que diz respeito à vigilância das modificações do ambiente, à antecipação e à avaliação dos riscos, bem como à gestão das situações de crise).

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5.4. Quarto pilar: fazer participar a sociedade, as empresas e o sector público europeus na elaboração de estratégias de adaptação coordenadas e abrangentes

A necessidade de adaptação poderia desencadear uma profunda reestruturação de determinados sectores económicos particularmente dependentes das condições meteorológicas (por exemplo, a agricultura, a silvicultura, as energias renováveis, os recursos hídricos, a pesca e o turismo) ou particularmente expostos às alterações climáticas (por exemplo, os portos, as infra-estruturas industriais e as urbanizações nas zonas costeiras, as zonas alagadiças e montanhosas). Seria útil entabular um diálogo estruturado com as partes e a sociedade civil em causa para examinar sistematicamente estes desafios. Estes interlocutores teriam interesse em trocar pontos de vista e conselhos sobre estratégias abrangentes e coordenadas, e eventualmente sobre possíveis medidas de reestruturação e acompanhamento.

Enquanto parte no Programa Europeu para as Alterações Climáticas (PEAC), a Comissão considerará a criação de um grupo consultivo europeu sobre a adaptação às alterações climáticas, que deverá actuar como um dos grupo de peritos da Comissão, nele participando responsáveis políticos, cientistas de renome e representantes da sociedade civil; este grupo daria o seu parecer sobre os trabalhos de vários grupos de trabalho específicos, ao longo de um período de 12 meses, com início em Novembro de 2007.

Este processo de consulta das partes interessadas poderia abranger os seguintes temas: recursos hídricos, biodiversidade, agricultura e silvicultura, recursos marinhos, indústria, saúde pública, transportes, energia, investigação, tecnologia e inovação, serviços financeiros e seguros, política de coesão e fundos regionais, acção externa e cooperação com os países não membros da União Europeia, recurso aos instrumentos de ordenamento do território. A Comissão poderia assegurar o secretariado e presidir aos diferentes grupos de trabalho. O grupo consultivo europeu poderia apresentar o seu primeiro relatório em meados de 2008, servindo este de base para a comunicação da Comissão sobre a adaptação, cuja apresentação está prevista para finais de 2008.

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6. PRÓXIMAS ETAPAS

Todas as regiões da Europa serão cada vez mais afectadas pelos efeitos calamitosos das alterações climáticas. Os esforços de adaptação devem ser intensificados a todos os níveis e em todas as políticas comunitárias, sendo de primordial importância uma boa coordenação.

Solicitam-se as respostas do público às questões fundamentais levantadas no final dos principais capítulos do Livro Verde. As instituições europeias e todas as partes interessadas – organizações ou particulares – são convidadas a participar no debate público à escala comunitária que será lançado com a adopção do Livro Verde:

- o Livro Verde será lançado publicamente após a sua adopção em Bruxelas;

- até 30 de Novembro de 2007 manter-se-á aberta uma consulta pública na Internet;

- para propiciar uma troca de impressões mais directa, a Comissão organizará sessões de trabalho sobre o presente Livro Verde em vários Estados-Membros e, caso necessário, em países terceiros.

Os resultados da consulta pública contribuirão para orientar os futuros trabalhos da Comissão, sobretudo tendo em vista a sua comunicação sobre a adaptação e o desenvolvimento de outras políticas comunitárias e acções externas.

[1] As figuras 1 e 2 baseiam-se no cenário A2 do relatório especial sobre os cenários de emissão (SRES) apresentado pelo IPCC. As projecções relativas aos efeitos das alterações climáticas incidem sobre o período de 2071-2100 em relação ao período de 1961-1990. Os mapas baseiam-se nos dados DMI/PRUDENCE (http://prudence.dmi.dk) e foram tratados pelo CCI no âmbito do estudo PESETA financiado pelo CCI (http://peseta.jrc.es)

[2] http://www.hm-treasury.gov.uk/independent_reviews/stern_review_economics_climate_change/stern_review_report.cfm

[3] Cenário A2 do relatório sobre os cenários de emissão efectuado pelo IPCC; custos em 2100 (em euros de 1995). Resultados do estudo PESETA encomendado pelo CCI da CE.

[4] http://ec.europa.eu/regional_policy/sources/docoffic/official/reports/cohesion4/index_en.htm

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