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Document 61995CC0164

Conclusões do advogado-geral Cosmas apresentadas em 16 de Janeiro de 1997.
Fábrica de Queijo Eru Portuguesa Ldª contra Alfândega de Lisboa (Tribunal Técnico Aduaneiro de 2ª Instância).
Pedido de decisão prejudicial: Supremo Tribunal Administrativo - Portugal.
Pauta aduaneira comum - Classificação pautal - Queijo ralado.
Processo C-164/95.

Colectânea de Jurisprudência 1997 I-03441

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1997:18

61995C0164

Conclusões do advogado-geral Cosmas apresentadas em 16 de Janeiro de 1997. - Fábrica de Queijo Eru Portuguesa Ldª contra Alfândega de Lisboa (Tribunal Técnico Aduaneiro de 2ª Instância). - Pedido de decisão prejudicial: Supremo Tribunal Administrativo - Portugal. - Pauta aduaneira comum - Classificação pautal - Queijo ralado. - Processo C-164/95.

Colectânea da Jurisprudência 1997 página I-03441


Conclusões do Advogado-Geral


1 O Supremo Tribunal Administrativo submeteu ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177._, terceiro parágrafo, do Tratado CE, determinadas questões prejudiciais relativas à classificação pautal do queijo, que considera necessárias à solução do litígio perante ele pendente.

I - O enquadramento legal

2 O Regulamento (CEE) n._ 2658/87 do Conselho, de 23 de Julho de 1987, contém regras respeitantes à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum (1). Da segunda parte do Anexo I deste regulamento, na redacção que lhe foi dada após a sua alteração pelo Regulamento (CEE) n._ 3174/88 da Comissão, de 21 de Setembro de 1988 (2), consta o quadro dos direitos aplicáveis. Na secção I, capítulo 4, respeitante ao leite e aos lacticínios, determina-se o seguinte:

«Código NC Designação das mercadorias

0406 Queijos e requeijão:

...

0406 20 - Queijos ralados ou em pó, de qualquer tipo:

0406 20 10 -- Queijos de Glaris com ervas...

0406 20 90 -- Outros

...

0406 90 - Outros queijos:

0406 90 11 -- Destinados à transformação

...» (3).

3 A Comissão, com o objectivo de permitir a aplicação uniforme da nomenclatura combinada na classificação das mercadorias, publicou uma série de notas explicativas. Na edição de 1989, relativamente à subposição 0406 20 10, referia-se que estavam abrangidos nesta subposição os queijos ralados e em pó, de qualquer tipo, e, relativamente à subposição 0406 20 90, que nesta se incluíam os queijos ralados, geralmente utilizados como condimentos. Estes queijos obtêm-se geralmente a partir de queijos de pasta dura (por exemplo «grana», parmigiano-reggiano, emmental, reggianito, sbrinz, asiago, pecorino, etc.). Estes queijos ralados são parcialmente desidratados, com o objectivo de lhes assegurar a mais duradoura conservação possível.

4 Em 1990, a Comissão publicou novas notas explicativas (4) respeitantes às subposições pautais acima referidas, cujo texto era o seguinte:

«0406 20 10 e Queijos ralados ou em pó, de qualquer tipo 0406 20 90

O número 1 é substituído pelo seguinte texto:

`1. Os queijos ralados, geralmente utilizados como condimentos ou noutros fins da indústria alimentar. Geralmente obtêm-se a partir de queijos de pasta dura (designadamente 'grana', parmigiano-reggiano, emmental, reggianito, sbrinz, asiago, pecorino, etc.). Estes queijos podem ter sido parcialmente desidratados com a finalidade de lhes assegurar a mais duradoura conservação possível. Classificam-se nesta subposição os queijos que, depois de serem ralados, são aglomerados'.»

5 Em seguida, a Comissão adoptou o Regulamento (CEE) n._ 316/91, de 7 de Fevereiro de 1991, relativo à classificação pautal de certas mercadorias na nomenclatura combinada (5). O anexo deste regulamento tem o seguinte teor:

Designação das mercadorias

(1)

Classificação Código NC

(2)

Fundamento

(3)

1. Queijo ralado, que, devido ao seu elevado teor em humidade, às condições de transporte ou de embalagem (parcialmente acondicionado no vácuo) se apresenta sob a forma aglomerada

0406 20 90

A classificação é determinada pelas disposições das regras gerais 1 a 6 para a interpretação da nomenclatura combinada, bem como pelo descritivo dos códigos NC 0406, 0406 20 e 0406 20 90.

6 O Anexo I do Regulamento n._ 2658/87, com a redacção que lhe foi dada pelo Regulamento n._ 3174/88 da Comissão, primeira parte, título I, letra A, contém as regras gerais de interpretação da nomenclatura combinada. Aí se prevê o seguinte:

«A classificação das mercadorias na nomenclatura combinada rege-se pelas seguintes regras:

1. Os títulos das secções, capítulos e subcapítulos têm apenas valor indicativo. Para os efeitos legais, a classificação é determinada pelos textos das posições e das notas de secção e de capítulo e, desde que não sejam contrárias aos textos das referidas posições e notas, pelas regras seguintes:

2. a) Qualquer referência a um artigo em determinada posição abrange esse artigo mesmo incompleto ou inacabado, desde que apresente, no estado em que se encontra, as características essenciais do artigo completo ou acabado. Abrange igualmente o artigo completo ou acabado, ou como tal considerado nos termos das disposições precedentes, mesmo que se apresente desmontado ou por montar;

b) ...

3. Quando pareça que a mercadoria pode classificar-se em duas ou mais posições... a classificação deve efectuar-se da forma seguinte:

a) A posição mais específica prevalece sobre as mais genéricas...

b) ...

c) Nos casos em que a regra 3, alínea a) e alínea b), não permita efectuar a classificação, a mercadoria classifica-se na posição situada em último lugar na ordem numérica dentre as susceptíveis de validamente se tomarem em consideração.

...

6. A classificação de mercadorias nas subposições de uma mesma posição é determinada, para efeitos legais, pelos textos dessas subposições e das notas de subposição respectivas, assim como, mutatis mutandis, pelas regras precedentes, entendendo-se que apenas são comparáveis subposições do mesmo nível. Para os fins da presente regra, as notas de secção e de capítulo são também aplicáveis, salvo disposições em contrário.»

7 Destas disposições, interpretadas em conjugação com os restantes meios de interpretação, resulta que se incluem na subposição 0406 20 os «queijos ralados ou em pó, de qualquer tipo», que se obtêm geralmente a partir de queijos de pasta dura, como aqueles que são citados, a título de exemplo, na nomenclatura combinada (por exemplo, parmigiano-reggiano, emmental, etc.), e geralmente utilizados como condimentos. Destas disposições decorre além disso que se incluem na subposição 0406 90 11 outros queijos, isto é, os queijos que não são abrangidos pelas restantes quatro subposições da referida posição pautal 0406 (queijos e requeijão) e «destinados à transformação industrial». Por transformação industrial, que é um conceito jurídico lato sensu, deve entender-se a criação (produção) de um novo artigo, mediante um complemento de fabrico ou transformação da matéria-prima.

II - Matéria de facto

8 A sociedade Fábrica de Queijo ERU Portuguesa, Ld.a (a seguir «ERU»), pelo bilhete de despacho n._ 14 595, de 20 de Março de 1989, da Alfândega de Lisboa (Delegação Aduaneira de Xabregas da Alfândega de Lisboa), importou para Portugal 1 110 cartões contendo queijo proveniente da Holanda, embalado em sacos de matéria plástica com cerca de 15 kg cada.

9 Esse queijo embalado apresentava, no momento da importação, o aspecto de uma pasta ou massa compacta. Porém, quando foi desembalado e exposto às condições ambiente, desagregou-se em grânulos irregulares.

10 A factura do exportador designava a mercadoria a importar como queijo ralado («grated cheese»). A ERU considerou que pertencia à posição pautal 0406 20 90, referente a «queijos ralados ou em pó, de qualquer tipo», com excepção dos queijos de Glaris com ervas.

11 O verificador, o reverificador, a conferência de reverificadores e o Tribunal Técnico Aduaneiro de Primeira Instância classificaram o queijo importado na posição pautal 0406 90 11, referente a «outros queijos destinados à transformação».

12 A ERU recorreu para o Tribunal Técnico Aduaneiro de Segunda Instância da decisão do Tribunal Técnico Aduaneiro de Primeira Instância. Aquele tribunal manteve no seu acórdão a classificação pautal anteriormente efectuada.

13 O Tribunal Técnico Aduaneiro de Segunda Instância considerou que a mercadoria em discussão, descrita na factura como queijo ralado («grated cheese»), era efectivamente constituída por pasta de queijo em blocos compactos de superfície irregular, com o peso de 15 kg, encerrada em sacos de matéria plástica. Considerando que a subposição pautal 0406 20 diz respeito a «queijos ralados ou em pó, de qualquer tipo», isto é, a queijos reduzidos a pequenos fragmentos ou a partículas microscópicas, todos os queijos que se apresentem sob forma diferente (por exemplo, em blocos) não pertencem - por contrariarem essa descrição - a esta subposição, como o impõem as regras gerais 1 a 6 de interpretação da nomenclatura combinada (6).

14 O Tribunal Técnico Aduaneiro de Segunda Instância considerou, ainda, que a nota explicativa posterior da nomenclatura combinada, de 1990, relativa às subposições 0406 20 10 e 0406 20 90, contém uma descrição coincidente.

15 Com base nestes fundamentos, o Tribunal Técnico Aduaneiro de Segunda Instância concluiu que o queijo em causa não satisfaz estes requisitos, dado que se apresenta sob a forma de blocos compactos, insusceptíveis de lançamento directo no mercado consumidor; além disso, possui um elevado grau de humidade e desagrega-se em grumos irregulares quando é exposto ao ar, revestindo, por estes motivos, características de um produto inacabado ou em curso de processamento, que deveria ser classificado na subposição 0406 90 11.

16 Contra esta decisão do Tribunal Técnico Aduaneiro de Segunda Instância foi interposto recurso para o Tribunal Tributário de Segunda Instância. Contra a decisão deste último foi interposto recurso para o Supremo Tribunal Administrativo.

III - As questões prejudiciais

17 Tendo dúvidas sobre a interpretação de determinadas disposições de direito comunitário que, do seu ponto de vista, se aplicam à questão em litígio, o Supremo Tribunal Administrativo submeteu ao Tribunal de Justiça, por decisão de 25 de Janeiro de 1995, as seguintes questões prejudiciais:

«Considerando que é presente à alfândega portuguesa, em 29 de Março de 1989, para introdução em livre prática ou para outro destino aduaneiro, queijo proveniente de um país comunitário, designado pelo exportador como queijo ralado (`grated cheese'), que foi triturado e objecto de uma operação industrial de substituição de oxigénio por uma solução de nitrogénio/002 injectado, para lhe aumentar a conservação, e depois embalado e prensado em sacos de plástico, com cerca de 15 kg cada, com elevado índice de humidade, ficando com o aspecto de uma pasta ou massa compacta, e que, após desembalado e exposto às condições ambiente, se desagrega em grânulos irregulares, pergunta-se:

1) Em face do Regulamento (CEE) n._ 316/91, da Comissão, de 7 de Fevereiro, o referido queijo é de classificar pela posição pautal 0406 20 90, como `queijos ralados ou em pó, de qualquer tipo', ou pela posição pautal 0406 90 11, como `queijos destinados à transformação'?

2) O referido regulamento é interpretativo e por isso aplicável retroactivamente à importação do queijo referido?

3) Em caso de resposta negativa a qualquer das referidas questões, são de considerar no caso as Notas Explicativas da Nomenclatura Combinada das Comunidades Europeias na redacção a que se refere o Jornal Oficial C 263/10, de 18.10.1990, ou as Notas Explicativas anteriores?

4) Num e noutro caso, em qual das duas referidas posições pautais deve ser enquadrado o dito queijo?» (7).

IV - Respostas às questões prejudiciais

18 Por razões de sistematização, julgo útil examinar as questões prejudiciais submetidas, em três grupos, pela ordem seguinte: em primeiro lugar, examinarei a segunda questão, a seguir, a terceira e, por último, a primeira e a quarta em conjunto.

A - Quanto à segunda questão prejudicial

19 Com a segunda questão, o tribunal nacional pretende saber se um regulamento da Comissão - no caso, o Regulamento n._ 316/91 - se aplica retroactivamente, enquanto regulamento interpretativo, isto é, também a casos anteriores à publicação desse mesmo regulamento.

20 A ERU, invocando o artigo 9._, alínea e), do Regulamento n._ 2658/87, que confia à Comissão a tarefa de proceder a «alterações da nomenclatura combinada destinadas a adaptá-la à evolução tecnológica ou comercial ou tendo em vista o alinhamento e a clarificação dos seus textos», bem como o artigo 10._, n._ 2, do mesmo regulamento, de acordo com o qual as medidas adoptadas pela Comissão são de aplicação imediata, considera que o disposto no artigo 10._, já referido, consagra o princípio da integração da norma interpretativa na norma interpretada, daí deduzindo que as regras interpretativas da nomenclatura combinada são de aplicação imediata, mesmo aos litígios pendentes na data da sua entrada em vigor.

21 O Governo português, nas suas observações escritas, sustenta que o Regulamento n._ 316/91 introduz alterações na nomenclatura combinada, que têm como objectivo a adaptação desta ao desenvolvimento tecnológico. E um texto de adaptação às inovações tecnológicas não pode, por definição, ser interpretativo. Tem que ser considerado como um texto novo que abarca os casos não previstos pelo texto anterior. Se o legislador comunitário tivesse pretendido que essa nova regulamentação retroagisse a situações ocorridas anteriormente, isto é, à data em que a inovação se verificou, tal deveria constar expressamente do novo texto.

22 Quanto a este aspecto, devo sublinhar que o Regulamento n._ 316/91 tem a natureza de um regulamento de classificação pautal. Segundo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, um «regulamento que precisa as condições de classificação numa posição ou subposição pautal reveste natureza constitutiva e não pode produzir efeitos retroactivos» (8). À luz desta jurisprudência, julgo que o regulamento em causa (Regulamento n._ 316/91) não pode ter aplicação retroactiva.

23 Pelo contrário, para garantir a segurança jurídica e facilitar o controlo, deve indagar-se, in concreto, em que posição ou subposição pautal pode incluir-se o produto a importar, com base nas suas qualidades e características objectivas, tal como estas são definidas no título da posição da pauta aduaneira comum e nas notas das secções ou dos capítulos (9). Poder-se-á assim chegar à conclusão de que o Regulamento n._ 316/91 se limita a prever uma regra que já decorria da legislação anterior, de acordo com a qual, embora não o soubéssemos, as mercadorias em questão deveriam ser incluídas, em qualquer caso, na subposição 0406 20 90 (10). É o que examinaremos a seguir, quando respondermos às primeira e quarta questões.

24 Deve, por conseguinte, responder-se à segunda questão que o Regulamento n._ 316/91 define os pressupostos de classificação numa determinada posição ou subposição pautal e tem natureza constitutiva. Não pode, portanto, ter efeitos retroactivos. Ou seja, não pode vincular as autoridades nacionais que são chamadas a determinar, com base nas suas características objectivas, a classificação pautal das mercadorias importadas antes da sua entrada em vigor.

B - Quanto à terceira questão prejudicial

25 Com a terceira questão prejudicial, o tribunal nacional pede ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre a questão de saber se devem ser tomadas em consideração, para a classificação pautal das mercadorias importadas, notas explicativas da nomenclatura combinada posteriores ao momento da importação.

26 As dificuldades com que se defronta o tribunal nacional para a interpretação da pauta aduaneira comum são devidas à diferente redacção dos textos das notas explicativas de 1989 e 1990 respeitantes à subposição 0406 20 90.

27 Como o Tribunal de Justiça tem decidido, para a interpretação da pauta aduaneira comum, as notas de capítulo e as notas explicativas da nomenclatura do Conselho de Cooperação Aduaneira «constituem elementos importantes», «meios válidos» (11) para a aplicação uniforme da pauta aduaneira e podem, por isso, ser consideradas como «um valioso meio de interpretação da pauta» (12).

28 Assim, para a interpretação das posições e subposições pautais, deve ter-se em conta não só a formulação e a estrutura da pauta aduaneira comum mas também as notas explicativas correspondentes (13). Contudo não têm força jurídica vinculativa e, por isso, deve-se, quando tal se revelar necessário, verificar se o seu conteúdo é conforme com o disposto na pauta aduaneira comum ou se, eventualmente, altera o seu significado (14). Além disso, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, as notas explicativas da nomenclatura do Conselho de Cooperação Aduaneira, na falta de disposições específicas de direito comunitário, são um valioso meio de interpretação das posições da pauta aduaneira comum (15).

29 No caso em apreço, o queijo a importar era um queijo holandês do tipo Gouda, ralado e acondicionado de uma forma especial. Como o salienta a Comissão, se do texto da nota explicativa de 1989 resultasse que esse queijo ralado, que, no momento da importação, se apresentava sob a forma de um bloco compacto, não se incluía entre os queijos abrangidos pela subposição pautal 0406 20 90 e, por conseguinte, que estava incluído numa subposição pautal diferente, quando do texto da subposição da pauta aduaneira comum e das características que apresenta resultasse que a subposição 0406 20 90 era a adequada, tal significaria que a nota explicativa alterava o sentido da disposição da pauta aduaneira comum, o que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça (16), não é admissível.

30 Mais precisamente, verifica-se pela descrição dos produtos que correspondem à subposição 0406 20 90 que esta se refere a queijos ralados ou em pó, de qualquer tipo, com excepção dos queijos de Glaris com ervas. Na nota explicativa de 1989, indicava-se, relativamente à subposição 0406 20 90, que se incluíam nesta subposição queijos ralados, geralmente utilizados como condimentos. Estes obtêm-se geralmente a partir de queijos de pasta dura (por exemplo, «grana», parmigiano-reggiano, emmental, reggianito, sbrinz, asiago, pecorino, etc.). Estes queijos ralados são parcialmente desidratados com a finalidade de lhes assegurar a mais duradoura conservação possível.

31 Tendo em conta o que acima fica dito, considero que a referência da nota explicativa de 1989 a queijos ralados provenientes de queijos de pasta dura, que são referidos a título de exemplo, acondicionados de determinada forma (com desidratação parcial), geralmente utilizados como condimentos, não excluía produtos semelhantes obtidos a partir de outros tipos de queijo e acondicionados de forma diferente, com uma finalidade diferente (utilização para outros fins da indústria alimentar), desde que tivessem as características de queijo ralado. Por conseguinte, a nota explicativa de 1989 apresenta uma lacuna em relação ao produto importado no caso em apreço, lacuna essa que a nota explicativa de 1990, mais completa, pretendeu preencher.

32 Deve, portanto, responder-se ao tribunal nacional que as notas explicativas posteriores à ocorrência dos factos que interessam à decisão da causa podem ser consideradas pelas autoridades nacionais para a classificação pautal de mercadorias a importar, desde que do exame das suas características objectivas se conclua que não foi alterado o alcance da disposição aplicável da pauta aduaneira comum.

C - Quanto às primeira e quarta questões prejudiciais

33 Com as primeira e quarta questões prejudiciais, o tribunal nacional solicita ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre a questão de saber em que medida a nomenclatura combinada da pauta aduaneira comum deve ser interpretada no sentido de que a subposição pautal 0406 20 90 inclui o queijo com as características descritas na decisão de reenvio ou, em caso de resposta negativa a esta pergunta, se esse mesmo queijo se inclui na subposição 0406 90 11.

34 Segundo a ERU, a desidratação constitui um processo técnico de conservação do produto e não um pressuposto necessário da sua caracterização como queijo ralado. Nem a subposição 0406 20 90 nem a nota explicativa de 1989 excluem outros métodos de conservação, tal como não impõem que o produto conservado pelo método de embalagem no vácuo seja apto para uso imediato no consumo. Sublinha igualmente que o queijo importado pode ser utilizado após a importação não apenas como condimento mas também noutros usos, sem que seja necessária nenhuma transformação industrial ulterior para além da neutralização do processo de conservação utilizado anteriormente para a sua embalagem e exportação.

35 Para o Governo português, pelo contrário, o produto importado, na altura do desalfandegamento, não tinha as características objectivas de queijo ralado, uma vez que devia ainda ser sujeito a um processo especial de desconservação para efeitos do seu lançamento no consumo final. Sustenta, portanto, que o produto em apreço, ainda que se considerasse que estava aglomerado no momento da importação, como o prevê o Regulamento n._ 316/91, não reunia contudo as restantes características do queijo ralado, pelo que não devia ser incluído na subposição 0406 20 90, mas na subposição 0406 90 11.

36 Finalmente, a Comissão alega que o queijo em causa era efectivamente queijo ralado à saída da máquina, mas que, pelo seu elevado teor de humidade, era natural que formasse grumos após o processo de trituração. Explica ainda que a tendência para a aglomeração é reforçada pelo método de embalagem destinado a assegurar-lhe uma mais longa conservação (retirada do oxigénio e injecção de uma mistura de nitrogénio e dióxido de carbono) e pelo elevado peso de cada saco (15 kg). Por todas estas razões, a Comissão considera que o queijo continuava a ter as características de queijo ralado, facto este que a nota explicativa de 1990 e o Regulamento n._ 316/91 apenas confirmam.

37 Segundo a decisão de reenvio, o queijo importado, antes de embalado, era queijo ralado, como sustenta aliás igualmente a ERU. Perdeu porém as suas características de queijo ralado por causa do processo a que foi submetido na embalagem, com o objectivo de lhe assegurar a mais duradoura conservação possível.

38 Por outro lado, como já indicámos acima, a sujeição à desconservação não visa a criação de um novo artigo, mas a neutralização do processo de conservação, de modo a ser lançado no consumo com a forma inicial, isto é, constituindo queijo ralado, tal como era o caso no momento da sua importação embalado em sacos.

39 Assim, o processo sofrido, após a importação, pelo queijo embalado visa a neutralização dos resultados do processo anterior de conservação, sem que tal dê origem a um novo produto (17). Visa igualmente o restabelecimento da forma que tinha antes da embalagem (18). A interpretação da jurisprudência respeitante à transformação dos produtos para a produção de novos artigos leva-nos às mesmas conclusões (19).

40 Tendo em conta o que acima fica dito, na minha opinião, o processo de eliminação da mistura de nitrogénio e dióxido de carbono do produto importado não constitui uma transformação, porque através dela não se visa a criação de um produto novo, mas o restabelecimento da sua forma inicial como queijo ralado. Isto é, este processo não é uma «transformação» como a que é exigida pela subposição pautal 0406 90 11.

41 Por conseguinte, deve responder-se ao tribunal nacional que a nomenclatura combinada da pauta aduaneira comum deve ser interpretada no sentido de que a subposição pautal 0406 20 90 inclui queijo com as características descritas na decisão de reenvio.

V - Conclusão

42 Tendo em consideração a análise acima feita, proponho que o Tribunal de Justiça responda da seguinte forma às questões prejudiciais que lhe foram submetidas pelo Supremo Tribunal Administrativo:

«1) O Regulamento (CEE) n._ 316/91 da Comissão, de 7 de Fevereiro de 1991, relativo à classificação de certas mercadorias na nomenclatura combinada, que define os pressupostos de classificação numa posição ou subposição pautal, não vincula as autoridades nacionais que são chamadas a definir, com base nas características objectivas dessas mercadorias, a classificação pautal de mercadorias que tinham sido importadas antes da sua entrada em vigor.

2) Notas explicativas posteriores à altura dos factos que interessam à decisão da causa podem ser tomadas em consideração pelas autoridades nacionais para a classificação pautal de produtos a importar, desde que, da análise das suas características objectivas, se conclua que não alteram o sentido da disposição aplicável da pauta aduaneira comum.

3) A nomenclatura combinada da pauta aduaneira comum, com a formulação que lhe foi dada pelo anexo do Regulamento (CEE) n._ 3174/88 da Comissão, de 21 de Setembro de 1988, que modifica o Anexo I do Regulamento (CEE) n._ 2658/87 do Conselho relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira, deve ser interpretada no sentido de que a subposição pautal 0406 20 90 inclui queijo que, depois de ralado, é sujeito a uma operação de substituição do oxigénio por uma injecção de nitrogénio e dióxido de carbono, destinada a assegurar-lhe uma maior conservação, e é em seguida embalado e comprimido em sacos de plástico com cerca de 15 kg cada, com um elevado teor de humidade, apresentando o aspecto de uma pasta ou massa compacta, queijo este que, depois de desembalado e exposto às condições ambiente, se desagrega em grânulos irregulares.»

(1) - JO L 256, p. 1.

(2) - JO L 298, p. 1.

(3) - Isto é, a posição pautal acima referida (0406 «Queijos e requeijão») abrange as subposições nela referidas (cinco no total), entre as quais a subposição 0406 20 «Queijos ralados ou em pó, de qualquer tipo» e a subposição 0406 90 «Outros queijos». A primeira subposição (0406 20) distingue ainda os queijos de Glaris com ervas (0406 20 10) e outros queijos ralados (0406 20 90). A segunda subposição (0406 90) distingue, na subposição 0406 90 11, os queijos «Destinados à transformação» e os restantes queijos, que são definidos nominalmente (por exemplo, feta, etc.).

(4) - Comunicação 90/C 263/08, de 18 de Outubro de 1990 (JO C 263, p. 10), nos termos do artigo 10._, n._ 2, do Regulamento (CEE) n._ 2658/87, com a redacção que lhe foi dada pelo Regulamento (CEE) n._ 2472/90 (JO L 247, p. 1).

(5) - JO L 37, p. 25.

(6) - Na decisão de reenvio, faz-se notar que, segundo literatura da especialidade, queijo ralado é o queijo que se obtém a partir de queijos muito secos («gruyère», «comté», parmesão, etc.), que geralmente se utiliza para polvilhar os pratos confeccionados antes de irem a gratinar, mas que também pode ser servido à parte para junção a sopas, especialmente de peixe (remetendo para a entrada correspondente do «Dictionnaire des Fromages», de R.-J. Courtine, Librairie Larousse, p. 196).

(7) - Como correctamente o salienta a Comissão nas suas alegações escritas, as palavras «por uma solução de nitrogénio/002» devem ler-se «por uma mistura de nitrogénio/CO2» (diüxido de carbono). Aliás, tal foi igualmente realçado, durante a fase oral do processo, pelos representantes da República Portuguesa e da Comissão.

(8) - Acórdão de 28 de Março de 1979, Biegi (158/78, Recueil, p. 1103, n._ 11).

(9) - V., por exemplo, os acórdãos de 19 de Maio de 1994, Siemens Nixdorf (C-11/93, Colect., p. I-1945, n._ 11); de 18 de Abril de 1991, WeserGold (C-219/89, Colect., p. I-1895, n._ 6); e um acórdão mais antigo, de 8 de Dezembro de 1977, Carlsen-Verlag (62/77, Recueil, p. 2343, n._ 3, Colect., p. 857).

(10) - V. o acórdão Siemens Nixdorf (já referido, n.os 11 e 17) e as conclusões do advogado-geral F. G. Jacobs nesse mesmo processo (n._ 17).

(11) - Acórdão de 11 de Julho de 1980, Chem-Tec (798/79, Recueil, p. 2639, n._ 11).

(12) - V., também, os acórdãos de 15 de Fevereiro de 1977, Dittmeyer (69/76 e 70/76, Recueil, p. 231, Colect., p. 83), e de 14 de Dezembro de 1995, Colin e Dupré (C-106/94 e C-139/94, Colect., p. I-4759, n._ 21).

(13) - Acórdão de 10 de Outubro de 1985, Erika Daiber (200/84, Recueil, p. 3363, n.os 13 e 14).

(14) - V., a título de exemplo, o acórdão Chem-Tec (já referido na nota 11, n._ 11).

(15) - Acórdão de 4 de Outubro de 1979, Cleton (11/79, Recueil, p. 3069).

(16) - Acórdão de 16 de Junho de 1994, Develop Dr. Eisbein (C-35/93, Colect., p. I-2655, n.os 18 e 21).

(17) - Pode-se igualmente retirar um argumento a favor desta posição, como o faz a Comissão, do facto de o Regulamento (CEE) n._ 1523/70 da Comissão, de 29 de Julho de 1970, relativo à classificação de mercadorias na subposição 02.01 A II a) 2 da pauta aduaneira comum (JO L 167, p. 28; EE 02 F1 p. 79), que foi transposto para a nomenclatura combinada pelo Regulamento (CEE) n._ 2723/90 da Comissão, de 24 de Setembro de 1990 (JO L 261, p. 24), considerar que a carne de bovino, depois de descongelada, embora se alterem substancialmente as características que apresenta, deveria incluir-se na mesma posição pautal 0202.

(18) - Sem prejuízo de o tribunal só poder tomar em consideração os diplomas que estavam em vigor na altura dos factos, não é despiciendo sublinhar que, segundo a Comissão, a nota explicativa de 1990 e o Regulamento n._ 316/91 - de cuja leitura retiramos a mesma conclusão - foram adoptados com o objectivo de resolver problemas surgidos a respeito da classificação pautal desse tipo de queijo. V. igualmente o acórdão Carlsen-Verlag (já referido na nota 9, n._ 10), caso em que, com o objectivo de harmonização linguística dos textos, tinha sido publicado um corrigendum em data posterior à ocorrência dos factos que interessavam à decisão da causa.

(19) - V. o acórdão de 23 de Março de 1972, Henck (36/71, Recueil, p. 187, Colect., p. 73), respeitante à transformação de milho e de sorgo; e os acórdãos de 29 de Maio de 1974, König (185/73, Recueil, p. 607, Colect., p. 321); de 2 de Agosto de 1993, Hoche (C-87/92, Colect., p. I-4623); e de 14 de Dezembro de 1995, França/Comissão (C-267/94, Colect., p. I-4845, n._ 34). No acórdão de 26 de Janeiro de 1977, Gesellschaft für Überseehandel (49/76, Recueil, p. 41, Colect., p. 25), o Tribunal declarou que a limpeza e a moagem de um produto de base (no caso, a caseína em bruto), bem como a triagem e o acondicionamento do produto obtido, não constituíam uma transformação ou complemento de fabrico substancial e não conduziam à obtenção de um produto novo nem representavam um estádio importante de fabrico, na acepção do artigo 5._ do Regulamento (CEE) n._ 802/68 do Conselho, de 27 de Junho de 1968, relativo à definição comum da noção de origem das mercadorias (JO L 148, p. 1; EE 02 F1 p. 5).

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