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Document 61991CJ0109

Acórdão do Tribunal de 6 de Outubro de 1993.
Gerardus Cornelis Ten Oever contra Stichting Bedrijfspensioenfonds voor het Glazenwassers- en Schoonmaakbedrijf.
Pedido de decisão prejudicial: Kantongerecht Utrecht - Países Baixos.
Igualdade de renumerações entre trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos - Pensões de sobrevivência - Limitação dos efeitos no tempo do acórdão C-262/88, Barber.
Processo C-109/91.

Colectânea de Jurisprudência 1993 I-04879

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1993:833

61991J0109

ACORDAO DO TRIBUNAL DE 6 DE OUTUBRO DE 1993. - GERARDUS CORNELIS TEN OEVER CONTRA STICHTING BEDRIJFSPENSIOENFONDS VOOR HET GLAZENWASSERS- EN SCHOONMAAKBEDRIJF. - PEDIDO DE DECISAO PREJUDICIAL: KANTONGERECHT UTRECHT - PAISES BAIXOS. - IGUALDADE DE REMUNERACAO ENTRE OS TRABALHADORES MASCULINOS E FEMININOS - PENSAO DE SOBREVIVENCIA - LIMITACAO DA APLICACAO NO TEMPO DO ACORDAO C-262/88, BARBER. - PROCESSO C-109/91.

Colectânea da Jurisprudência 1993 página I-04879
Edição especial sueca página I-00341
Edição especial finlandesa página I-00375


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Política social ° Trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos ° Igualdade de remunerações ° Remuneração ° Conceito ° Pensão de sobrevivência paga por um regime profissional privado ° Inclusão ° Prestação destinada ao supérstite do trabalhador ° Falta de pertinência

(Tratado CEE, artigo 119. )

2. Política social ° Trabalhadores masculinos e trabalhadores femininos ° Igualdade de remunerações ° Artigo 119. do Tratado ° Aplicabilidade aos regimes profissionais privados de pensões ° Verificação no acórdão de 17 de Maio de 1990, C-262/88 ° Efeitos limitados às prestações devidas ao abrigo de períodos de emprego posteriores à data da prolação do referido acórdão

(Tratado CEE, artigo 119. )

Sumário


1. É abrangida pelo conceito de remuneração na acepção do artigo 119. do Tratado, com a consequência de que está sujeita à proibição de discriminação em razão do sexo consagrada por esta disposição, uma pensão de sobrevivência paga por um regime profissional de pensões cujas disposições não foram fixadas directamente pela lei, sendo o resultado de uma concertação entre parceiros sociais, tendo-se os poderes públicos limitado, a pedido das organizações patronais e sindicais consideradas representativas, a declarar o regime obrigatório para a globalidade do sector profissional, e cujo financiamento é assegurado exclusivamente pelos trabalhadores e empregadores do sector em causa, com exclusão de qualquer intervenção financeira pública.

Esta interpretação não é afectada pelo facto de a pensão de sobrevivência, por definição, não ser paga ao trabalhador, mas ao seu supérstite, porque o direito a tal prestação é uma regalia que tem a sua origem na inscrição no regime do cônjuge do supérstite, de modo que a pensão é atribuída a este último no âmbito da relação de emprego entre o empregador e o referido cônjuge e é-lhe paga em razão do emprego deste último.

2. Por força do acórdão de 17 de Maio de 1990, C-262/88, Barber (Colect., p. I-1889), o efeito directo do artigo 119. do Tratado só pode ser invocado, a fim de exigir a igualdade de tratamento em matéria de pensões profissionais, em relação às prestações devidas ao abrigo de períodos de emprego posteriores à data da prolação do referido acórdão, sem prejuízo da excepção prevista em favor dos trabalhadores ou dos seus sucessores que tenham, antes dessa data, intentado uma acção judicial ou apresentado, nos termos do direito nacional aplicável, uma reclamação equivalente.

Partes


No processo C-109/91,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, pelo Kantongerecht te Utrecht (Países Baixos), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Gerardus Cornelis Ten Oever

e

Stichting Bedrijfspensioenfonds voor het Glazenwassers- en Schoonmaakbedrijf,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação do artigo 119. do Tratado CEE, bem como sobre a limitação dos efeitos no tempo do acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Maio de 1990, Barber (C-262/88, Colect., p. I-1889),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: O. Due, presidente, C. N. Kakouris, G. C. Rodríguez Iglesias, M. Zuleeg e J. L. Murray, presidentes de secção, G. F. Mancini, R. Joliet, F. A. Schockweiler, J. C. Moitinho de Almeida, F. Grévisse, M. Díez de Velasco, P. J. G. Kapteyn e D. A. O. Edward, juízes,

advogado-geral: W. Van Gerven

secretário: H. von Holstein, secretário-adjunto, e D. Louterman-Hubeau, administradora principal

vistas as observações escritas apresentadas:

° em representação de G. Ten Oever, por I. P. M. Boelens, colaborador da Stichting De Ombudsman,

° em representação da Stichting Bedrijfspensioenfonds voor het Glazenwassers- en Schoonmaakbedrijf, por M. van Empel e O. W. Brouwer, advogados no foro de Amsterdão,

° em representação do Governo neerlandês, por T. P. Hofstee, secretário-geral substituto no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente,

° em representação do Governo do Reino Unido, por R. Caudwell, do Treasury Solicitor' s Department, na qualidade de agente,

° em representação do Governo alemão, por E. Roeder, Regierungsdirektor no Ministério Federal da Economia, e C. D. Quassowski, Oberregierungsrat no mesmo ministério, na qualidade de agentes,

° em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por K. Banks e B. J. Drijber, membros do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações de G. Ten Oever, da Stichting Bedrijfspensioenfonds voor het Glazenwassers- en Schoonmaakbedrijf, do Governo neerlandês, representado por J. W. de Zwaan e T. Heukels, consultores jurídicos adjuntos no Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agentes, do Governo do Reino Unido, representado por Sir Nicholas Lyell, QC, S. Richards e N. Paines, barristers, e por J. Collins, Assistant Treasury Solicitor, na qualidade de agente, do Governo alemão e da Comissão, na audiência de 26 de Janeiro de 1993,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 28 de Abril de 1993,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por decisão de 28 de Março de 1991, entrada no Tribunal de Justiça em 9 de Abril seguinte, o Kantongerecht te Utrecht (Países Baixos) colocou, nos termos do artigo 177. do Tratado CEE, duas questões prejudiciais sobre a interpretação do artigo 119. do mesmo Tratado quanto a uma pensão de sobrevivência prevista por um regime profissional de pensões e sobre a interpretação do acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Maio de 1990, Barber (C-262/88, Colect., p. I-1889), quanto à limitação dos seus efeitos no tempo.

2 Estas questões foram suscitadas no âmbito de um litígio que opõe G. Ten Oever à Stichting Bedrijfspensioenfonds voor het Glazenwassers- en Schoonmaakbedrijf (a seguir "fundo de pensões") quanto à atribuição de uma pensão de viúvo.

3 Até ao seu falecimento, em 13 de Outubro de 1988, a esposa de G. Ten Oever fazia parte de um regime profissional de pensões, financiado pelos empregadores e pelos trabalhadores. Nessa altura, o referido regime previa uma pensão de sobrevivência apenas em benefício das viúvas. Só em 1 de Janeiro de 1989 é que este direito foi tornado extensivo aos viúvos.

4 Após o falecimento da sua esposa, G. Ten Oever solicitou a atribuição de uma pensão de viúvo. Esta foi-lhe recusada pelo fundo de pensões, porque a mesma não era prevista pelo regime no momento do falecimento da esposa de G. Ten Oever. Por outro lado, em resposta ao argumento de G. Ten Oever, que se baseava no acórdão Barber, já referido, para sustentar que a pensão solicitada devia ser considerada uma remuneração na acepção do artigo 119. do Tratado e que, em consequência, não era admissível qualquer discriminação entre homens e mulheres, o fundo de pensões retorquiu que este acórdão tinha sido proferido posteriormente ao falecimento da esposa de G. Ten Oever e que os seus efeitos tinham sido limitados no tempo.

5 G. Ten Oever submeteu o assunto à apreciação do Kantongerecht te Utrecht para que fosse declarado que o fundo de pensões era obrigado a atribuir-lhe a pensão em causa, o qual decidiu suspender a instância e colocar ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

"1) Deve considerar-se que as prestações pagas aos sucessores nos termos de um regime complementar (como no caso dos autos, o pagamento de uma pensão de sobrevivência) constituem uma 'remuneração' na acepção do artigo 119. do Tratado CEE ou uma das 'regalias' referidas nesse mesmo artigo?

2) Em caso de resposta afirmativa à questão 1, o artigo 119. do Tratado CEE é aplicável ao demandante de tal modo que ele pode ter direito ao pagamento de uma pensão de sobrevivência:

a) com efeitos a partir da data do falecimento da sua esposa (13 de Outubro de 1988)?

b) com efeitos a partir do acórdão do Tribunal de Justiça de 17 de Maio de 1990?

c) de nenhum modo já que a esposa do demandante faleceu antes de 17 de Maio de 1990?"

6 Para uma exposição mais ampla dos factos do litígio no processo principal, da tramitação processual, bem como das observações escritas apresentadas ao Tribunal de Justiça, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos dos autos só serão adiante retomados na medida necessária à fundamentação da decisão do Tribunal de Justiça.

Quanto à primeira questão

7 Através da sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se uma pensão de sobrevivência, como a do caso concreto, é abrangida pelo conceito de remuneração na acepção do artigo 119. do Tratado, com a consequência de que estaria sujeita à proibição de discriminação consagrada por esta disposição.

8 Segundo jurisprudência assente, o conceito de remuneração, constante do segundo parágrafo do artigo 119. , inclui todas as regalias pecuniárias ou em espécie, actuais ou futuras, desde que pagas, ainda que indirectamente, pela entidade patronal ao trabalhador em razão do emprego deste último. A circunstância de determinadas prestações serem pagas após a cessação da relação de trabalho não exclui a possibilidade de as mesmas terem a natureza de remuneração na acepção do artigo 119. (v., em especial, acórdão Barber, já referido, n. 12).

9 Em contrapartida, o conceito de remuneração definido deste modo, não pode abranger os regimes ou prestações de segurança social como, por exemplo, as pensões de reforma, directamente regulados pela lei, com exclusão de qualquer elemento de concertação no seio da empresa ou do ramo profissional interessado, obrigatoriamente aplicáveis a categorias gerais de trabalhadores. Com efeito, estes regimes garantem aos trabalhadores o benefício de um sistema legal para cujo financiamento os trabalhadores, os empregadores e, eventualmente, os poderes públicos contribuem numa medida que é menos função da relação de emprego entre empregador e trabalhador do que de considerações de política social (acórdão de 25 de Maio de 1971, Defrenne, 80/70, Colect., p. 161, n.os 7 e 8).

10 Na ocorrência, resulta dos autos que as disposições do regime de pensões em causa não foram fixadas directamente pela lei, sendo o resultado de uma concertação entre parceiros sociais, tendo-se os poderes públicos limitado, a pedido das organizações patronais e sindicais consideradas representativas, a declarar o regime obrigatório para a globalidade do sector profissional.

11 Além disso, é indiscutível que este regime de pensões é exclusivamente financiado pelos trabalhadores e empregadores do sector em causa, com exclusão de qualquer intervenção financeira pública.

12 Daqui resulta que a pensão de sobrevivência controvertida cai no âmbito de aplicação do artigo 119. do Tratado.

13 Esta interpretação não é afectada pelo facto de a pensão de sobrevivência, por definição, não ser paga ao trabalhador, mas ao seu supérstite. Convém sublinhar, com efeito, que o direito a tal prestação é uma regalia que tem a sua origem na inscrição no regime do cônjuge do supérstite, de modo que a pensão é atribuída a este último no âmbito da relação de emprego entre o empregador e o referido cônjuge e é-lhe paga em razão do emprego deste último.

14 Há assim que responder à primeira questão prejudicial que a pensão de sobrevivência prevista por um regime profissional de pensões, com as características do que está em causa no processo principal, cai no âmbito de aplicação do artigo 119. do Tratado.

Quanto à segunda questão

15 Através da segunda questão, pede-se essencialmente ao Tribunal de Justiça que se pronuncie sobre o alcance exacto da limitação dos efeitos no tempo do acórdão Barber, já referido.

16 Basta salientar a este respeito que a referida limitação foi decidida no contexto preciso de prestações (em especial, de pensões) previstas por regimes profissionais privados, que foram qualificadas de remuneração na acepção do artigo 119. do Tratado.

17 Esta decisão tinha em atenção a especificidade desta forma de remuneração, consistente numa dissociação temporal entre a constituição do direito à pensão, que se realiza progressivamente ao longo da carreira do trabalhador, e o pagamento efectivo da prestação, que é, em contrapartida, diferido até uma idade determinada.

18 O Tribunal de Justiça tomou igualmente em consideração as características dos mecanismos financeiros das pensões profissionais e portanto as relações contabilísticas existentes em cada caso especial entre as quotizações periódicas e os montantes futuros a pagar.

19 Atendendo igualmente às razões que justificaram a limitação dos efeitos no tempo do acórdão Barber, como indicadas no seu n. 44, há que esclarecer que a igualdade de tratamento em matéria de pensões profissionais só pode ser invocada em relação às prestações devidas ao abrigo de períodos de emprego posteriores a 17 de Maio de 1990, data do acórdão, sem prejuízo da excepção prevista em favor dos trabalhadores ou dos seus sucessores que tenham, antes dessa data, intentado uma acção judicial ou apresentado, nos termos do direito nacional aplicável, uma reclamação equivalente.

20 Assim, há que responder à segunda questão prejudicial que, por força do acórdão de 17 de Maio de 1990, C-262/88, Barber, o efeito directo do artigo 119. do Tratado só pode ser invocado, a fim de exigir a igualdade de tratamento em matéria de pensões profissionais, em relação às prestações devidas ao abrigo de períodos de emprego posteriores a 17 de Maio de 1990, sem prejuízo da excepção prevista em favor dos trabalhadores ou dos seus sucessores que tenham, antes dessa data, intentado uma acção judicial ou apresentado, nos termos do direito nacional aplicável, uma reclamação equivalente.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

21 As despesas efectuadas pelos Governos neerlandês, alemão e do Reino Unido, e pela Comissão das Comunidades Europeias, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre as questões submetidas pelo Kantongerecht te Utrecht, por decisão de 28 de Março de 1991, declara:

1) A pensão de sobrevivência prevista por um regime profissional de pensões, com as características do que está em causa no processo principal, cai no âmbito de aplicação do artigo 119. do Tratado CEE.

2) Por força do acórdão de 17 de Maio de 1990, C-262/88, Barber, o efeito directo do artigo 119. do Tratado só pode ser invocado, a fim de exigir a igualdade de tratamento em matéria de pensões profissionais, em relação às prestações devidas ao abrigo de períodos de emprego posteriores a 17 de Maio de 1990, sem prejuízo da excepção prevista em favor dos trabalhadores ou dos seus sucessores que tenham, antes dessa data, intentado uma acção judicial ou apresentado, nos termos do direito nacional aplicável, uma reclamação equivalente.

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