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Document 61991CJ0105

Acórdão do Tribunal de 17 de Novembro de 1992.
Comissão das Comunidades Europeias contra República Helénica.
Tributação de veículos particulares - Aplicação de taxas diferentes.
Processo C-105/91.

Colectânea de Jurisprudência 1992 I-05871

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1992:441

61991J0105

ACORDAO DO TRIBUNAL DE 17 DE NOVEMBRO DE 1992. - COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS CONTRA REPUBLICA HELENICA. - TRIBUTACAO DAS VIATURAS PARTICULARES - APLICACAO DE TAXAS DIFERENTES. - PROCESSO C-105/91.

Colectânea da Jurisprudência 1992 página I-05871


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Acção por incumprimento - Objecto do litígio - Determinação no decurso do procedimento administrativo - Adaptação meramente formal das acusações posteriormente ao parecer fundamentado, devida à alteração da legislação nacional - Admissibilidade

(Tratado CEE, artigo 169. )

2. Acção por incumprimento - Apreciação da procedência pelo Tribunal - Inaplicabilidade do princípio "de minimis"

(Tratado CEE, artigo 169. )

3. Acção por incumprimento - Apreciação da procedência pelo Tribunal - Situação a tomar em consideração - Situação no termo do prazo fixado no parecer fundamentado

(Tratado CEE, artigo 169. )

4. Disposições fiscais - Imposições internas - Sistema diferenciado de tributação de veículos - Aplicação aos veículos importados de uma taxa mais elevada do que a aplicada aos veículos de fabrico nacional - Inadmissibilidade

(Tratado CEE, artigo 95. )

Sumário


1. Se é verdade que o objecto da acção intentada nos termos do artigo 169. do Tratado está circunscrito pelo procedimento administrativo previsto nessa disposição e que, por conseguinte, o parecer fundamentado da Comissão e a acção devem basear-se em acusações idênticas, tal exigência não pode, contudo, ir ao ponto de impor, em qualquer hipótese, uma coincidência perfeita entre as disposições nacionais mencionadas no parecer fundamentado e as referidas na petição. Quando se verifica uma alteração legislativa entre estas duas fases do processo, basta com efeito que o sistema aplicado pela legislação impugnada no decurso do procedimento administrativo tenha, no seu conjunto, sido mantido pelas novas medidas adoptadas pelo Estado-membro posteriormente ao parecer fundamentado e impugnadas no âmbito da acção.

2. A partir do momento em que, no âmbito da acção nos termos do artigo 169. do Tratado, se reconhece a existência de um incumprimento das obrigações que incumbem aos Estados-membros por força do Tratado, esse incumprimento subsiste independentemente da frequência e da amplitude das situações reprovadas.

3. No âmbito de uma acção nos termos do artigo 169. do Tratado, a existência de um incumprimento deve ser apreciada em função da situação do Estado-membro tal como se apresenta no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, não sendo as alterações posteriormente ocorridas tomadas em consideração pelo Tribunal.

4. Um Estado-membro que, com o objectivo de proteger a produção nacional, aplica aos veículos particulares de tecnologia clássica importados de outros Estados-membros taxas do imposto especial de consumo mais elevadas do que as aplicadas aos veículos particulares de tecnologia clássica produzidos ou montados no território nacional, não cumpre as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 95. do Tratado.

Partes


No processo C-105/91,

Comissão das Comunidades Europeias, representada inicialmente por D. Calleja e M. Patakia, membros do Serviço Jurídico, e em seguida por D. Calleja e Th. Margellos, perito nacional em destacamento junto do Serviço Jurídico da Comissão, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de R. Hayder, representante do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

demandante,

contra

República Helénica, representada por P. Mylonopoulos, advogado, membro do contencioso comunitário do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada da Grécia, 117, Val Sainte Croix,

demandada,

que tem por objecto um pedido de declaração de que, ao aplicar aos veículos particulares de tecnologia clássica importados de outros Estados-membros taxas do imposto especial de consumo mais elevadas do que as aplicadas aos veículos particulares de tecnologia clássica produzidos ou montados na Grécia, a República Helénica não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 95. do Tratado CEE,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: O. Due, presidente, C. N. Kakouris, G. C. Rodríguez Iglesias e M. Zuleeg, presidentes de secção, R. Joliet, J. C. Moitinho de Almeida, F. Grévisse, P. J. G. Kapteyn e D. A. O. Edward, juízes,

advogado-geral: G. Tesauro

secretário: H. von Holstein, secretário adjunto

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 19 de Junho de 1992, no decurso da qual a República Helénica foi representada por N. Mavrikas, consultor jurídico adjunto do Conselho Jurídico do Estado, na qualidade de agente,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 7 de Julho de 1992,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 2 de Abril de 1991, a Comissão das Comunidades Europeias propôs, nos termos do artigo 169. do Tratado CEE, uma acção destinada a obter a declaração de que, ao aplicar aos veículos particulares de tecnologia clássica importados de outros Estados-membros taxas do imposto especial de consumo mais elevadas do que as aplicadas aos veículos particulares de tecnologia clássica produzidos ou montados na Grécia, a República Helénica não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 95. do Tratado CEE.

2 A Lei helénica n. 363, de 22 de Junho de 1976, na redacção que lhe foi dada pela Lei n. 1676/1986, criou um imposto especial de consumo (a seguir "imposto") sobre os veículos particulares importados ou montados na Grécia, cuja taxa varia em função da cilindrada.

3 A Lei n. 1858, de 31 de Maio de 1989, que entrou em vigor com efeitos retroactivos a 1 de Março do mesmo ano, prevê, no artigo 1. , uma redução a taxa do imposto sobre os veículos ditos de "nova tecnologia" ou "tecnologia antipoluição" que respondam aos critérios do Decreto ministerial n. 12141, de 22 de Maio de 1989. Para aplicação do artigo 1. , não é feita qualquer distinção entre veículos nacionais e veículos importados. Além disso, o artigo 2. , n. 1, da mesma lei alargou estas taxas reduzidas aos veículos de tecnologia clássica fabricados pela indústria nacional antes de 31 de Agosto de 1990, bem como aos veículos de tecnologia clássica importados. Mas, quanto a estes, a aplicação das taxas reduzidas foi sujeita à condição de terem sido desalfandegados antes de 30 de Junho de 1989 e de, antes de 28 de Fevereiro de 1989, preencherem as seguintes condições: primo, terem sido objecto de um crédito documentário irrevogável quanto à totalidade ou à parte do seu valor; secundo, terem sido transportados ou terem atravessado as fronteiras do seu país de origem; tertio, terem dado entrada no país e, quarto, terem sido adquiridos por importadores no estrangeiro, o que deve ser comprovado pela exibição de documentos, e terem sido importados sem formalidades cambiais.

4 Por notificação de incumprimento de 14 de Dezembro de 1989, a Comissão advertiu o Governo helénico de que considerava esta regulamentação contrária ao artigo 95. do Tratado e solicitou-lhe que apresentasse observações no prazo de um mês.

5 Não satisfeita com a resposta fornecida pelo Governo helénico, a Comissão formulou, em 16 de Março de 1990, um parecer fundamentado no qual reiterava a acusação constante da notificação de incumprimento e dava ao Governo helénico o prazo de um mês para cumprir as suas obrigações comunitárias.

6 Em 10 de Maio de 1990, o Governo helénico informou a Comissão de que algumas disposições da Lei n. 1858/1989 tinham sido modificadas e revogadas pela Lei n. 1882, de 21 de Março de 1990.

7 Esta última legislação operou uma nova diminuição das taxas aplicáveis aos veículos de tecnologia antipoluição. No artigo 42. , n.os 4 e 5, utilizando o mesmo processo da Lei n. 1858/1989, alargou as novas taxas a todos os veículos de tecnologia clássica fabricados pelas indústrias nacionais até 31 de Agosto de 1990. Além disso, para estes mesmos veículos, a data de fabrico foi prorrogada até 30 de Junho de 1991, desde que a sua cilindrada fosse inferior a 1 400 cm3 e preenchessem, no que respeita às emissões de gases, as condições menos rigorosas previstas para os veículos de cilindrada superior ou igual a 1 400 cm3 e inferior ou igual a 2 000 cm3.

8 Por seu lado, os veículos de tecnologia tradicional importados estão sujeitos, em aplicação do artigo 42. , n. 6, da nova lei, às taxas reduzidas previstas anteriormente pelo artigo 1. da Lei n. 1858/1989 - que, de qualquer modo, são menos favoráveis - desde que tenham entrado no país antes de 27 de Fevereiro de 1990 e desalfandegados antes de 30 de Abril de 1990. Nessa medida, a Lei n. 1858/1989 permaneceu, portanto, em vigor.

9 Por petição apresentada em 28 de Janeiro de 1991, a Comissão intentou a presente acção. As partes relativas à matéria de facto e de direito da petição fazem referência tanto à Lei n. 1882/1990 como à Lei n. 1858/1989. O pedido propriamente dito não contém qualquer referência legislativa.

10 Para mais ampla exposição da legislação nacional, da tramitação processual, bem como dos fundamentos e argumentos das partes, remete-se para o relatório para audiência. Estes elementos apenas serão adiante retomados na medida do necessário para a fundamentação da decisão do Tribunal.

Quanto à admissibilidade da acção

11 O Governo helénico salienta que as disposições da Lei n. 1882/1990, postas em causa na acção, não tinham sido criticadas pela Comissão no decurso do procedimento administrativo. Portanto, entende que o artigo 169. do Tratado foi violado e que a acção deve ser julgada inadmissível.

12 É verdade que, segundo jurisprudência assente do Tribunal de Justiça, o objecto de uma acção intentada nos termos do artigo 169. do Tratado está circunscrito pelo procedimento administrativo previsto por essa disposição; em consequência, o parecer fundamentado da Comissão e a acção devem basear-se em acusações idênticas (v. acórdão de 14 de Julho de 1988, Comissão/Bélgica, 298/86, Colect., p. 4343).

13 Esta exigência não pode, contudo, ir ao ponto de impor, em qualquer hipótese, uma coincidência perfeita entre as disposições nacionais mencionadas no parecer fundamentado e as referidas na petição. Quando se verifica uma alteração legislativa entre estas duas fases do processo, basta com efeito que o sistema aplicado pela legislação impugnada no decurso do procedimento administrativo tenha, no seu conjunto, sido mantido pelas novas medidas adoptadas pelo Estado-membro posteriormente ao parecer fundamentado e impugnadas no âmbito da acção (v. acórdãos de 1 de Dezembro de 1965, Comissão/Itália, 45/64, Recueil, p. 1057, e de 5 de Julho de 1990, Comissão/Bélgica, C-42/89, Colect., p. I-2821).

14 No caso vertente, resulta do parecer fundamentado que o objecto das críticas da Comissão ao longo do procedimento administrativo era a aplicação temporária de taxas diferentes aos veículos de tecnologia tradicional, consoante fossem montados na Grécia ou importados. Esta diferenciação de taxas foi mantida, senão mesmo agravada, com as disposições impugnadas da Lei n. 1882/1990. Como se infere do pedido, formulado em termos rigorosamente idênticos aos do parecer fundamentado, é igualmente este sistema que é posto em causa pela Comissão no âmbito da presente acção.

15 Em consequência, há que considerar que a Comissão, ao criticar as disposições da Lei n. 1882/1990 na petição, não alargou o objecto da acção e não violou o artigo 169. do Tratado. A acção deve pois ser julgada admissível.

Quanto ao mérito

16 A discriminação apontada pela Comissão entre as taxas aplicáveis aos veículos de tecnologia clássica importados e aos veículos de tecnologia clássica de fabrico nacional é evidente, tanto sob a vigência da Lei n. 1858/1989, como da Lei n. 1882/1990.

17 Do artigo 2. da Lei n. 1858/1989 resulta, com efeito, que os veículos de tecnologia clássica fabricados na Grécia antes de 31 de Agosto de 1990 estavam sujeitos às taxas reduzidas determinadas pelo artigo 1. desta mesma lei, enquanto os veículos da mesma tecnologia importados só beneficiavam dessas taxas se tivessem sido desalfandegados antes de 30 de Junho de 1989 e se, em 28 de Fevereiro do mesmo ano, preenchessem as diferentes condições suplementares e bastante restritivas estabelecidas no artigo 2. , n. 1, alínea b).

18 Como já foi dito, esta diferenciação de taxas foi mantida, senão mesmo agravada, pelas disposições da Lei n. 1882/1990. A aplicação do artigo 42. desta lei conduz, com efeito, à criação de quatro categorias de veículos de tecnologia clássica: veículos de fabrico nacional produzidos até 31 de Agosto de 1990; veículos de fabrico nacional produzidos após 31 de Agosto de 1990, com cilindrada inferior a 1 400 cm3 e que preencham, no que respeita às emissões de gases, as condições menos rigorosas fixadas para os veículos de cilindrada inferior ou igual a 2 000 cm3; veículos importados entrados na Grécia antes de 27 de Fevereiro de 1990 e desalfandegados antes de 30 de Abril de 1990 e, por fim, veículos importados entrados no país após 27 de Fevereiro de 1990 ou, de qualquer modo, desalfandegados após 30 de Abril de 1990. Enquanto as duas primeiras categorias, constituídas por veículos de fabrico nacional, estão sujeitas às novas taxas reduzidas previstas no artigo 37. , n. 2, da Lei n. 1882/1990, as duas outras categorias, constituídas por veículos importados, estão sujeitas a taxas menos vantajosas: para a terceira categoria, as taxas previstas no artigo 1. da Lei n. 1858/1989 e, para a quarta, as taxas normais, mais elevadas, fixadas na Lei n. 363/1976, na redacção que lhe foi dada pela Lei n. 1676/1986.

19 Em sua defesa, o Governo helénico avança três tipos de argumentos. Antes de mais, dado que a produção de veículos nacionais não representa mais do que 10% da procura interna, a discriminação não é manifesta. Em seguida, o artigo 42. da Lei n. 1882/1990 deixou, de facto, de ser aplicado em 30 de Abril de 1991. Por último, as disposições em litígio justificar-se-iam pelo objectivo de compensar a desvantagem concorrencial da indústria automóvel grega face aos construtores de outros Estados-membros e de lhe dar a possibilidade de se adaptar às novas normas comunitárias com objectivos ecológicos.

20 Tal argumentação não pode ser acolhida. Ao primeiro argumento, basta responder que, segundo jurisprudência assente, o incumprimento das obrigações que incumbem aos Estados-membros por força do Tratado existe, independentemente da frequência e da amplitude das situações reprovadas (v. acórdão de 21 de Março de 1991, Comissão/Itália, n. 19, C-209/89, Colect., p. I-1575).

21 Do mesmo modo, ao segundo argumento, segundo o qual a legislação impugnada deixou de ser aplicada em 30 de Abril de 1991, cabe objectar que, tal como o Tribunal já decidiu, a existência de um incumprimento deve ser apreciada em função da situação do Estado-membro tal como se apresenta no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, não sendo as alterações posteriormente ocorridas tomadas em consideração pelo Tribunal (v. acórdão de 27 de Novembro de 1990, Comissão/Grécia, n. 13, C-200/88, Colect., p. I-4299). No caso vertente, as práticas em litígio cessaram bem depois de expirar o prazo mencionado no parecer fundamentado, o qual - importa lembrá-lo - foi formulado em 16 de Março de 1990.

22 Quanto ao terceiro argumento, cabe observar que ele põe em evidência o objectivo de protecção da legislação impugnada e que, portanto, confirma o incumprimento.

23 Das considerações que precedem resulta que, ao aplicar aos veículos particulares de tecnologia clássica importados de outros Estados-membros taxas do imposto especial de consumo mais elevadas do que as aplicadas aos veículos particulares de tecnologia clássica produzidos ou montados na Grécia, a República Helénica não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 95. do Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

24 Por força do disposto no n. 2 do artigo 69. do Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas. Tendo a República Helénica sido vencida, há que condená-la nas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

decide:

1) Ao aplicar aos veículos particulares de tecnologia clássica importados de outros Estados-membros taxas do imposto especial de consumo mais elevadas do que as aplicadas aos veículos particulares de tecnologia clássica produzidos ou montados na Grécia, a República Helénica não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 95. do Tratado CEE.

2) A República Helénica é condenada nas despesas.

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