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Document 62024CJ0551
Judgment of the Court (Eighth Chamber) of 9 October 2025.#Deutsche Lufthansa AG v AirHelp Germany GmbH.#Request for a preliminary ruling from the Sąd Okręgowy w Krakowie.#Reference for a preliminary ruling – Judicial cooperation in civil matters – Regulation (EU) No 1215/2012 – Second indent of Article 7(1)(b) – Special jurisdiction in matters relating to a contract – Determination of the court with jurisdiction – Contract of carriage by air concluded between a consumer and a trader – Passenger’s claim for compensation arising from a delayed flight – Assignment of that claim to a collection agency – Claim for compensation brought by the assignee against the air carrier before the court for the place of the aircraft’s departure – Place of performance of the obligation in question – Place in a Member State where, under the contract of carriage, the services were provided or should have been provided.#Case C-551/24.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Oitava Secção) de 9 de outubro de 2025.
Deutsche Lufthansa AG contra AirHelp Germany GmbH.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Sąd Okręgowy w Krakowie.
Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria civil — Regulamento (UE) n.o 1215/2012 — Artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão — Competência especial em matéria contratual — Determinação do tribunal competente — Contrato de transporte aéreo celebrado entre um consumidor e um profissional — Crédito indemnizatório do passageiro decorrente de um voo atrasado — Cessão desse crédito a uma sociedade de cobrança de créditos — Ação de indemnização intentada pelo cessionário contra a transportadora aérea no tribunal do lugar de partida do avião — Lugar de cumprimento da obrigação em questão — Lugar num Estado‑Membro onde, nos termos do contrato de transporte, os serviços foram ou devam ser prestados.
Processo C-551/24.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Oitava Secção) de 9 de outubro de 2025.
Deutsche Lufthansa AG contra AirHelp Germany GmbH.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Sąd Okręgowy w Krakowie.
Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria civil — Regulamento (UE) n.o 1215/2012 — Artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão — Competência especial em matéria contratual — Determinação do tribunal competente — Contrato de transporte aéreo celebrado entre um consumidor e um profissional — Crédito indemnizatório do passageiro decorrente de um voo atrasado — Cessão desse crédito a uma sociedade de cobrança de créditos — Ação de indemnização intentada pelo cessionário contra a transportadora aérea no tribunal do lugar de partida do avião — Lugar de cumprimento da obrigação em questão — Lugar num Estado‑Membro onde, nos termos do contrato de transporte, os serviços foram ou devam ser prestados.
Processo C-551/24.
ECLI identifier: ECLI:EU:C:2025:771
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção)
9 de outubro de 2025 ( *1 )
«Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria civil — Regulamento (UE) n.o 1215/2012 — Artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão — Competência especial em matéria contratual — Determinação do tribunal competente — Contrato de transporte aéreo celebrado entre um consumidor e um profissional — Crédito indemnizatório do passageiro decorrente de um voo atrasado — Cessão desse crédito a uma sociedade de cobrança de créditos — Ação de indemnização intentada pelo cessionário contra a transportadora aérea no tribunal do lugar de partida do avião — Lugar de cumprimento da obrigação em questão — Lugar num Estado‑Membro onde, nos termos do contrato de transporte, os serviços foram ou devam ser prestados»
No processo C‑551/24,
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Sąd Okręgowy w Krakowie (Tribunal Regional de Cracóvia, Polónia), por Decisão de 1 de agosto de 2024, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 14 de agosto de 2024, no processo
Deutsche Lufthansa AG
contra
Airhelp Germany GmbH,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Oitava Secção),
composto por: O. Spineanu‑Matei (relatora), presidente de secção, S. Rodin e N. Piçarra, juízes,
advogado‑geral: N. Emiliou,
secretário: A. Calot Escobar,
vistos os autos,
vistas as observações apresentadas:
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em representação da Deutsche Lufthansa AG, por M. Korcz, radca prawny, |
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em representação da AirHelp Germany GmbH, por P. P. Gad e K. Żbikowska, adwokaci, |
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em representação do Governo Polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente, |
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– |
em representação da Comissão Europeia, por J. Hottiaux e S. Noë, na qualidade de agentes, |
vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,
profere o presente
Acórdão
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1 |
O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, e ponto 5, do Regulamento (UE) n.o 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 2012, L 351, p. 1). |
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2 |
Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Deutsche Lufthansa AG (a seguir «Lufthansa») à AirHelp Germany GmbH (a seguir «AirHelp»), sociedades com sede na Alemanha, a respeito de um pedido de pagamento de uma quantia apresentado pela segunda sociedade, cessionária de um crédito indemnizatório de um passageiro, na sequência do atraso de um voo, contra a primeira num órgão jurisdicional polaco. |
Quadro jurídico
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3 |
Os considerandos 15 e 16 do Regulamento n.o 1215/2012 enunciam:
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4 |
O capítulo II deste regulamento, intitulado «Competência», contém nomeadamente uma secção 1, intitulada «Disposições gerais», e uma secção 2, intitulada «Competências especiais». O artigo 4.o, n.o 1, do referido regulamento, que figura nesta secção 1, dispõe: «Sem prejuízo do disposto no presente regulamento, as pessoas domiciliadas num Estado‑Membro devem ser demandadas, independentemente da sua nacionalidade, nos tribunais desse Estado‑Membro.» |
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5 |
O artigo 5.o, n.o 1, do mesmo regulamento, que figura na mesma secção 1, prevê: «As pessoas domiciliadas num Estado‑Membro só podem ser demandadas nos tribunais de outro Estado‑Membro nos termos das regras enunciadas nas secções 2 a 7 do presente capítulo.» |
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6 |
O artigo 7.o do Regulamento n.o 1215/2012, que figura na secção 2 do capítulo II deste regulamento, enuncia: «As pessoas domiciliadas num Estado‑Membro podem ser demandadas noutro Estado‑Membro:
[…]
[…]» |
Litígio no processo principal e questão prejudicial
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7 |
Resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que, em 4 de abril de 2023, a AirHelp intentou, no Sąd Rejonowy dla Krakowa — Krowodrzy w Krakowie (Tribunal de Primeira Instância de Cracóvia — Krowodrza, Polónia), uma ação contra a Lufthansa para obter a sua condenação no pagamento da quantia de 250 euros, acrescida dos juros legais, correspondente à indemnização devida a um passageiro pelo atraso de um voo operado por esta companhia aérea com partida de Cracóvia. |
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8 |
A Lufthansa deduziu oposição à injunção de pagamento emitida por esse órgão jurisdicional e suscitou uma exceção relativa à sua incompetência internacional. |
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9 |
Por Despacho de 5 de dezembro de 2023, esse órgão jurisdicional julgou improcedente a exceção de incompetência e a oposição. |
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10 |
A Lufthansa interpôs recurso desse despacho no Sąd Okręgowy w Krakowie (Tribunal Regional de Cracóvia, Polónia), que é o órgão jurisdicional de reenvio. Em apoio do seu recurso, a Lufthansa alegou que o Sąd Rejonowy dla Krakowa — Krowodrzy w Krakowie (Tribunal de Primeira Instância de Cracóvia — Krowodrza) não podia basear a sua competência internacional para conhecer da ação de indemnização no ponto 1, alínea b), segundo travessão, nem no ponto 5 do artigo 7.o do Regulamento n.o 1215/2012, uma vez que as partes no litígio no processo principal não estavam vinculadas por um contrato de transporte. A pretensão da AirHelp tem origem num contrato de cessão de créditos celebrado com um passageiro, que é o único que está vinculado à Lufthansa por um contrato de transporte. |
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11 |
Segundo a Lufthansa, os órgãos jurisdicionais alemães são os únicos competentes para conhecer dessa ação, em conformidade com a regra de competência geral prevista no artigo 4.o, n.o 1, deste regulamento. |
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12 |
O órgão jurisdicional de reenvio esclarece que está obrigado a examinar, mesmo oficiosamente, em qualquer fase do processo, a questão da sua competência internacional. |
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13 |
Para o efeito, esse órgão jurisdicional interroga‑se sobre a aplicabilidade do artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, e ponto 5, do Regulamento n.o 1215/2012 para determinar o tribunal competente para conhecer de um litígio que tem por objeto a cobrança de um crédito resultante de um contrato de transporte aéreo e transferido para uma sociedade de cobrança de créditos na sequência de uma cessão efetuada por um consumidor, parte nesse contrato de transporte aéreo. |
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14 |
O referido órgão jurisdicional informa que a prática dos órgãos jurisdicionais polacos revela duas orientações quanto à interpretação destas disposições. Uma parte da jurisprudência considera que, independentemente da natureza do contrato de cessão de crédito no direito polaco, as referidas disposições permitem fundamentar a competência dos órgãos jurisdicionais polacos para conhecer desse litígio. Outra parte da jurisprudência baseia‑se nas particularidades desse contrato no direito polaco para considerar que as mesmas disposições excluem a competência desses órgãos jurisdicionais. |
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15 |
O órgão jurisdicional de reenvio indica que, na jurisprudência a favor da competência dos órgãos jurisdicionais polacos, é colocada a tónica na conexão estreita que existe entre o contrato e o órgão jurisdicional chamado a decidir. A competência desses órgãos jurisdicionais assenta, por conseguinte, não em considerações subjetivas relacionadas com a qualidade das partes no litígio, mas no seu objeto, ou seja, o pedido de cobrança de um crédito decorrente de um contrato de prestação de serviços ou relacionado com a exploração de uma sucursal, de uma agência ou de outro estabelecimento. |
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16 |
Esse órgão jurisdicional precisa também que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, para cobrar um crédito resultante da execução de um contrato de transporte aéreo, um demandante pode intentar uma ação no tribunal do domicílio do demandado, em conformidade com o artigo 4.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1215/2012, ou no tribunal do lugar onde os serviços foram ou devam ser prestados, a saber, o tribunal competente do lugar de partida ou de chegada do voo em causa, em conformidade com o artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, deste regulamento. Desde que estejam reunidas as condições de aplicação das regras de competência especial previstas na secção 2 do capítulo II do referido regulamento, de que faz parte o artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, e ponto 5, do mesmo regulamento, estas disposições são aplicáveis mesmo quando se trate de um litígio entre profissionais. |
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17 |
Todavia, o referido órgão jurisdicional considera que é necessário interpretar esta reserva e observa, a este respeito, que, nos termos do artigo 7.o, ponto 1, do Regulamento n.o 1215/2012, o tribunal competente para conhecer de um litígio em matéria contratual é o do lugar de cumprimento da obrigação em questão. Ora, em caso de cessão de crédito, a questão que se coloca é saber se o litígio diz respeito à cobrança de um crédito decorrente do contrato de cessão ou do contrato de prestação de serviços, no caso em apreço, um contrato de transporte aéreo. |
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18 |
O órgão jurisdicional de reenvio indica que, segundo o direito nacional, um credor pode, sem o consentimento do devedor, ceder o seu crédito a terceiros, a menos que a lei, o contrato ou a natureza da obrigação o impeçam. O objeto dessa cessão é o direito subjetivo do credor de exigir ao devedor que cumpra a sua obrigação, o que não inclui os direitos processuais do credor, nomeadamente, a faculdade de suscitar exceções de incompetência, de prescrição ou de compensação, a menos que o contrato de cessão o preveja. |
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19 |
Esse órgão jurisdicional precisa que resulta do contrato de cessão de crédito em causa no processo principal que a AirHelp apenas adquiriu legitimidade ativa para efeitos do cumprimento da obrigação de indemnização do cedente. Consequentemente, não se pode considerar que, por força desse contrato, a AirHelp adquiriu todos os direitos resultantes do contrato de transporte aéreo, incluindo os direitos processuais de que este cedente beneficia enquanto consumidor. |
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20 |
Por conseguinte, poder‑se‑ia argumentar que o profissional que adquire um crédito decorrente de um contrato de transporte aéreo não pode validamente invocar, como fundamento da sua ação de indemnização intentada contra a transportadora aérea, apenas o contrato de transporte que vincula o cedente a essa transportadora, dado que, na base dessa ação, se encontra o contrato de cessão de crédito do qual deriva a sua legitimidade ativa. Atendendo a que o cessionário não é parte no contrato de transporte aéreo, a relação contratual vincula o cedente e o cessionário e não o cessionário e a transportadora aérea obrigada a pagar o crédito resultante do contrato de transporte. |
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21 |
Neste caso, a AirHelp não se pode basear na jurisprudência relativa à competência judiciária em matéria de contrato de transporte aéreo, invocando o artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, do Regulamento n.o 1215/2012, conforme interpretado no Acórdão de 9 de julho de 2009, Rehder (C‑204/08, EU:C:2009:439), uma vez que as partes no litígio no processo principal não estão vinculadas por um contrato de transporte. |
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22 |
Todavia, o órgão jurisdicional de reenvio indica que resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça, nomeadamente dos Acórdãos de 20 de maio de 2021, CNP (C‑913/19, EU:C:2021:399), e de 21 de outubro de 2021, T. B. e D. (Competência em matéria de seguros) (C‑393/20, EU:C:2021:871), que uma entidade que, agindo na qualidade de profissional, adquiriu um crédito a uma parte mais fraca pode invocar o artigo 7.o do Regulamento n.o 1215/2012. Por conseguinte, à luz desta jurisprudência, é possível admitir a competência dos órgãos jurisdicionais polacos para conhecer de uma ação de cobrança de um crédito de um consumidor, decorrente de um contrato de transporte aéreo, adquirido por um profissional. |
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23 |
Nestas condições, o Sąd Okręgowy w Krakowie (Tribunal Regional de Cracóvia) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a seguinte questão prejudicial: «Os processos relativos à cobrança de um crédito adquirido ao abrigo de um contrato de cessão celebrado com um consumidor por um profissional com sede fora da República da Polónia e que transfere o crédito do consumidor contra outro profissional também com sede noutro [Estado‑Membro] são da competência dos tribunais polacos, que resulta [do] artigo 7.o, ponto 1, alínea b, segundo travessão, e [do artigo] 7.o, ponto 5, do Regulamento [n.o 1215/2012]?» |
Quanto à questão prejudicial
Quanto à admissibilidade da questão no que diz respeito à interpretação do artigo 7.o, ponto 5, do Regulamento n.o 1215/2012
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24 |
A Lufthansa suscitou uma exceção de inadmissibilidade da questão submetida na parte em que diz respeito à interpretação do artigo 7.o, ponto 5, do Regulamento n.o 1215/2012, tendo em conta o caráter hipotético desta questão, porquanto não foi alegado, no âmbito do litígio no processo principal, que o seu estabelecimento na Polónia esteve de algum modo envolvido na celebração do contrato de transporte na origem do crédito reclamado pela AirHelp. |
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25 |
A este propósito, resulta de jurisprudência constante que a necessidade de obter uma interpretação do direito da União que seja útil ao órgão jurisdicional de reenvio exige que este defina o quadro factual e regulamentar no qual se inserem as questões que coloca ou que, pelo menos, explique as hipóteses factuais em que se baseiam essas questões. Além disso, esse órgão jurisdicional deve indicar ainda as razões precisas que o conduziram a interrogar‑se sobre a interpretação do direito da União e a considerar necessário questionar o Tribunal de Justiça a título prejudicial (v. Acórdãos de 26 de janeiro de 1993, Telemarsicabruzzo e o., C‑320/90 a C‑322/90, EU:C:1993:26, n.o 6; de 8 de setembro de 2009, Liga Portuguesa de Futebol Profissional e Bwin International, C‑42/07, EU:C:2009:519, n.o 40; e de 29 de julho de 2024, LivaNova,C‑713/22, EU:C:2024:642, n.o 54). |
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26 |
Como enuncia o artigo 94.o, alíneas a) e c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, um pedido de decisão prejudicial deve conter, nomeadamente, uma exposição sumária dos factos pertinentes ou, no mínimo, uma exposição dos dados factuais em que as questões assentam, bem como uma exposição das razões que conduziram o órgão jurisdicional de reenvio a interrogar‑se sobre a interpretação ou a validade de certas disposições do direito da União e o nexo que esse órgão estabelece entre essas disposições e a legislação nacional aplicável ao litígio no processo principal. |
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27 |
No caso em apreço, importa recordar que o artigo 7.o, ponto 5, do Regulamento n.o 1215/2012 estabelece, no que respeita aos litígios relativos à exploração de uma sucursal, de uma agência ou de qualquer outro estabelecimento, uma regra de competência especial a favor do tribunal do lugar em que tal sucursal, agência ou estabelecimento se encontram. |
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28 |
Há que observar que, apesar de o órgão jurisdicional de reenvio fazer referência a este artigo 7.o, ponto 5, tanto na fundamentação do pedido de decisão prejudicial como na questão submetida ao Tribunal de Justiça, esse órgão jurisdicional não menciona nenhum dado factual sobre atos relativos à exploração de uma sucursal, agência ou qualquer outro estabelecimento da Lufthansa na Polónia, ou compromissos assumidos em nome da Lufthansa, como um eventual envolvimento dessas entidades na celebração do contrato de transporte aéreo em causa no processo principal. Embora o referido órgão jurisdicional dedique amplos desenvolvimentos à questão de saber se o contrato que está na origem da obrigação em questão, na aceção do artigo 7.o, ponto 1, deste regulamento, é o contrato de cessão de crédito ou o contrato de transporte, não indica as razões que o conduziram a interrogar‑se também sobre a interpretação do artigo 7.o, ponto 5, do referido regulamento. |
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29 |
O órgão jurisdicional de reenvio limita‑se a precisar que está obrigado a verificar oficiosamente a sua competência internacional para conhecer do recurso que lhe foi submetido. Embora não se possa excluir que tal verificação o possa levar a examinar o critério de competência previsto no artigo 7.o, ponto 5, do Regulamento n.o 1215/2012, não é menos verdade que o Tribunal de Justiça deve dispor de informações suficientes para se certificar de que a interpretação do direito da União solicitada apresenta uma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal. |
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30 |
Ora, no caso em apreço, tais informações não existem. Consequentemente, a questão prejudicial é inadmissível na parte em que tem por objeto a interpretação do artigo 7.o, ponto 5, do Regulamento n.o 1215/2012. |
Quanto ao mérito
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31 |
Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, do Regulamento n.o 1215/2012 deve ser interpretado no sentido de que um tribunal de um Estado‑Membro é competente, em conformidade com esta disposição, para conhecer de um litígio relativo a uma ação de indemnização intentada contra uma transportadora aérea, estabelecida no território de outro Estado‑Membro, por uma sociedade cessionária do crédito de um passageiro resultante da execução de um contrato de transporte celebrado com essa transportadora. |
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32 |
A título preliminar, importa recordar, por um lado, que o Regulamento n.o 1215/2012 visa unificar as regras de conflito de jurisdição em matéria civil e comercial, por meio de regras de competência que apresentem um elevado grau de certeza jurídica. Assim, este regulamento prossegue um objetivo de segurança jurídica que consiste em reforçar a proteção jurídica das pessoas estabelecidas na União Europeia, permitindo simultaneamente ao requerente identificar facilmente o órgão jurisdicional a que se pode dirigir e ao requerido prever razoavelmente aquele em que pode ser demandado (Acórdão de 11 de abril de 2024, Credit Agricole Bank Polska,C‑183/23, EU:C:2024:297, n.o 40 e jurisprudência referida). |
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33 |
Por outro lado, o sistema de atribuição de competências comuns previstas no capítulo II do Regulamento n.o 1215/2012 baseia‑se na regra geral, enunciada no artigo 4.o, n.o 1, do mesmo, segundo a qual as pessoas domiciliadas no território de um Estado‑Membro devem ser demandadas perante os tribunais desse Estado‑Membro, independentemente da nacionalidade das partes. Só por derrogação desta regra geral da competência dos tribunais do domicílio do requerido é que o capítulo II, secção 2, deste regulamento prevê certo número de regras de competência especiais, entre as quais figura a do artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, do referido regulamento (Acórdão de 14 de setembro de 2023, EXTÉRIA,C‑393/22, EU:C:2023:675, n.o 27 e jurisprudência referida). |
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34 |
Por força da regra de competência especial prevista nesta última disposição, o tribunal competente para conhecer de uma ação baseada num contrato de prestação de serviços é o tribunal do lugar num Estado‑Membro onde, nos termos do contrato, os serviços foram ou devam ser prestados. |
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35 |
Resulta também da jurisprudência que a regra de competência especial enunciada no artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, do Regulamento n.o 1215/2012 responde a uma preocupação de proximidade, tendo como fundamento a existência de um vínculo de conexão estreito entre o contrato em causa e o tribunal chamado a decidir sobre o mesmo (v., neste sentido, Acórdão de 14 de setembro de 2023, EXTÉRIA, C‑393/22, EU:C:2023:675, n.o 2 e jurisprudência referida). |
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36 |
É à luz destas considerações que há que determinar se a circunstância de um crédito, resultante da execução de um contrato de transporte aéreo celebrado entre um consumidor e um profissional, ter sido transferido por esse consumidor para uma sociedade especializada na cobrança de créditos de passageiros aéreos é suscetível de impedir a aplicação do artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, do Regulamento n.o 1215/2012 para determinar o tribunal competente para conhecer de uma ação de indemnização intentada pela sociedade cessionária contra a transportadora aérea. |
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37 |
A este respeito, como resulta do n.o 35 do presente acórdão, a regra de competência especial prevista neste artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, não visa proteger a parte mais fraca de uma relação contratual, uma vez que esta regra não foi estabelecida tendo em conta a qualidade das partes contratantes, mas assenta na existência de uma conexão estreita entre o órgão jurisdicional chamado a decidir e o contrato em causa. Nestas condições, a circunstância de o crédito indemnizatório do consumidor ter sido transferido para um profissional não tem impacto na aplicação da referida regra. |
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38 |
Como o Tribunal de Justiça precisou no âmbito de um litígio relativo a créditos em matéria extracontratual, uma cessão de créditos, efetuada pelo credor inicial, não pode, por si só, impactar a determinação do órgão jurisdicional competente (v., neste sentido, Acórdãos de 18 de julho de 2013, ÖFAB,C‑147/12, EU:C:2013:490, n.o 58, e de 21 de maio de 2015, CDC Hydrogen Peroxide,C‑352/13, EU:C:2015:335, n.o 35). |
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39 |
Analogamente, um litígio que tem por objeto a cobrança de um crédito resultante da execução de um contrato de prestação de serviços continua a apresentar um vínculo de conexão estreito com o lugar de cumprimento da obrigação em questão, a saber, o lugar de um Estado‑Membro onde, nos termos desse contrato, os serviços foram ou devam ser prestados, na aceção do referido artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, ainda que esse crédito tenha sido cedido a um terceiro. |
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40 |
Esta interpretação permite garantir a segurança jurídica e a previsibilidade, nomeadamente para o demandado, em matéria de competência judiciária, que representam objetivos prosseguidos pelo Regulamento n.o 1215/2012, como resulta dos seus considerandos 15 e 16, uma vez que o tribunal competente para conhecer dessa ação será sempre o do lugar onde, nos termos do contrato, os serviços foram ou devam ser prestados, independentemente da existência de uma cessão do crédito resultante desse contrato. |
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41 |
No caso em apreço, resulta dos autos de que dispõe o Tribunal de Justiça que a AirHelp adquiriu um crédito resultante da execução de um contrato de transporte aéreo, celebrado entre um consumidor e a Lufthansa, que teve origem num atraso num voo operado por essa companhia aérea, a partir de Cracóvia com destino a Nice (França) e com escala em Munique (Alemanha), o que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar. |
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42 |
Atendendo a que o lugar de partida desse voo corresponde a um dos lugares da prestação principal dos serviços objeto desse contrato e assegura, por conseguinte, o vínculo de conexão estreito, exigido pelas regras de competência especial enunciadas no artigo 7.o, ponto 1, do Regulamento n.o 1215/2012, entre o referido contrato e o tribunal em cuja área de jurisdição se situa o referido lugar, os tribunais polacos parecem competentes para conhecer do recurso no processo principal (v., neste sentido, Acórdão de 3 de fevereiro de 2022, LOT Polish Airlines,C‑20/21, EU:C:2022:71, n.o 20). |
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43 |
Nem as particularidades do contrato de cessão de crédito em causa no processo principal nem a inexistência de vínculo contratual entre as partes no litígio são suscetíveis de pôr em causa esta competência. |
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44 |
Por um lado, a circunstância de, como resulta da decisão de reenvio, nos termos do contrato de cessão de crédito em causa, o consumidor cedente não transmitir, segundo o direito polaco, os seus direitos processuais ao profissional cessionário não é pertinente para a aplicação da regra de competência prevista no artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, do Regulamento n.o 1215/2012. Com efeito, esta regra baseia‑se na obrigação em questão na ação, ou seja, o objeto do litígio, determinado pelo objeto do contrato em causa, sendo que o contrato de cessão de crédito apenas confere legitimidade ativa ao cessionário. |
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45 |
Por outro lado, quanto à circunstância de as partes no processo principal não estarem diretamente vinculadas por um contrato, evocada tanto pelo órgão jurisdicional de reenvio como pela Lufthansa nas suas observações escritas, importa observar que, atendendo a que o contrato de cessão confere ao cessionário os direitos de que goza o cedente em relação à transportadora e, portanto, o direito de intentar uma ação de cobrança do crédito resultante do contrato de transporte aéreo, esta circunstância também não é suscetível de impedir a aplicação da regra de competência prevista nesta disposição. |
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46 |
À luz do conjunto destas considerações, há que responder à questão submetida que o artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, do Regulamento n.o 1215/2012 deve ser interpretado no sentido de que um tribunal de um Estado‑Membro é competente, em conformidade com esta disposição, para conhecer de um litígio relativo a uma ação de indemnização intentada contra uma transportadora aérea, estabelecida no território de outro Estado‑Membro, por uma sociedade cessionária do crédito de um passageiro resultante da execução de um contrato de transporte celebrado com essa transportadora, desde que esse tribunal seja o do lugar onde, nos termos desse contrato, os serviços foram ou devam ser prestados. |
Quanto às despesas
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47 |
Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir sobre as despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis. |
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Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Oitava Secção) declara: |
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O artigo 7.o, ponto 1, alínea b), segundo travessão, do Regulamento (UE) n.o 1215/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial, |
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deve ser interpretado no sentido de que: |
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um tribunal de um Estado‑Membro é competente, em conformidade com esta disposição, para conhecer de um litígio relativo a uma ação de indemnização intentada contra uma transportadora aérea, estabelecida no território de outro Estado‑Membro, por uma sociedade cessionária do crédito de um passageiro resultante da execução de um contrato de transporte celebrado com essa transportadora, desde que esse tribunal seja o do lugar onde, nos termos desse contrato, os serviços foram ou devam ser prestados. |
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Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: polaco.