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Document 62023CC0107

    Conclusões do advogado-geral M. Campos Sánchez-Bordona apresentadas em 29 de junho de 2023.
    Processo penal contra C.I. e o.
    Pedido de decisão prejudicial apresentado pela Curtea de Apel Braşov.
    Reenvio prejudicial — Proteção dos interesses financeiros da União Europeia — Artigo 325.o, n.o 1, TFUE — Convenção “PIF” — Artigo 2.o, n.o 1 — Obrigação de lutar contra a fraude lesiva dos interesses financeiros da União por meio de medidas dissuasoras e efetivas — Obrigação de prever sanções penais — Imposto Sobre o Valor Acrescentado (IVA) — Diretiva 2006/112/CE — Fraude grave ao IVA — Prazo de prescrição da responsabilidade penal — Decisão de um Tribunal Constitucional que declarou inválida uma disposição nacional que regula as causas de interrupção desse prazo — Risco sistémico de impunidade — Proteção dos direitos fundamentais — Artigo 49.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Princípio da legalidade dos crimes e das penas — Requisitos de previsibilidade e precisão da lei penal — Princípio da aplicação retroativa da lei penal mais favorável (lex mitior) — Princípio da segurança jurídica — Padrão nacional de proteção dos direitos fundamentais — Obrigação de os tribunais de um Estado‑Membro não aplicarem as decisões do Tribunal Constitucional e/ou do órgão jurisdicional supremo desse Estado‑Membro em caso de não conformidade com o direito da União — Responsabilidade disciplinar dos juízes em caso de desrespeito dessas decisões — Princípio do primado do direito da União.
    Processo C-107/23 PPU.

    Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

    ECLI identifier: ECLI:EU:C:2023:532

     CONCLUSÕES DO ADVOGADO GERAL

    MANUEL CAMPOS SÁNCHEZ BORDONA

    apresentadas em 29 de junho de 2023 ( 1 )

    Processo C‑107/23 PPU [Lin] ( i )

    C. I.,

    C. O.,

    K. A.,

    L. N.,

    S. P.

    contra

    Statul român

    [pedido de decisão prejudicial apresentado pela Curtea de Apel Braşov (Tribunal de Recurso de Braşov, Roménia)]

    «Reenvio prejudicial — Proteção dos interesses financeiros da União — Fraude ao IVA — Artigo 325.o, n.o 1, TFUE — Convenção PIF — Diretiva (UE) 2017/1371 — Obrigação de lutar com medidas dissuasoras e efetivas contra a fraude lesiva dos interesses financeiros da União — Decisão 2006/928/CE — Mecanismo de cooperação e de verificação dos progressos realizados na Roménia relativamente a objetivos de referência específicos nos domínios da reforma judiciária e da luta contra a corrupção e a criminalidade organizada — Prazo de prescrição em matéria penal — Decisão judicial que declara a inconstitucionalidade das normas nacionais relativas à interrupção da prescrição penal — Risco sistémico de impunidade — Proteção dos direitos fundamentais — Artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta — Princípio da aplicação retroativa da lei penal mais favorável (lex mitior) — Padrão nacional de proteção dos direitos fundamentais — Obrigação de os juízes nacionais darem efetividade plena aos Acórdãos da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) — Responsabilidade disciplinar dos juízes em caso de incumprimento dessas decisões — Poder de não aplicação das decisões da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) não conformes com o direito da União — Princípio do primado do direito da União»

    1.

    No presente pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio pede ao Tribunal de Justiça que interprete várias disposições do direito da União para decidir se dá ou nega provimento aos recursos extraordinários de anulação interpostos por pessoas condenadas a penas de prisão por comportamentos qualificados de evasão fiscal e associação criminosa.

    2.

    O litígio tem por objeto a compatibilidade com o direito da União de um regime nacional de prescrição da responsabilidade penal que, após a intervenção da Curtea Constitutională (Tribunal Constitucional, Roménia), não prevê, para um certo período, a possibilidade de interrupção dos prazos de prescrição. Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, esse regime poderia levar à impunidade de numerosos comportamentos ilícitos em detrimento dos interesses financeiros da União.

    3.

    A resposta às questões prejudiciais exigirá que o Tribunal de Justiça desenvolva a sua jurisprudência, ainda incipiente, sobre o princípio da retroatividade da lei penal mais favorável (lex mitior), protegido pelo artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta de Direitos Fundamentais da União (a seguir «Carta»).

    I. Quadro jurídico

    A.   Direito da União

    1. Convenção PIF ( 2 )

    4.

    O artigo 1.o, n.o 1, da Convenção PIF tem a seguinte redação:

    «Para efeitos da presente convenção, constitui fraude lesiva dos interesses financeiros das Comunidades Europeias:

    […]

    b)

    Em matéria de receitas, qualquer ato ou omissão intencionais relativos:

    à utilização ou apresentação de declarações ou de documentos falsos, inexatos ou incompletos, que tenha por efeito a diminuição ilegal de recursos do Orçamento Geral das Comunidades Europeias ou dos orçamentos geridos pelas Comunidades Europeias ou por sua conta,

    […].»

    5.

    O artigo 2.o dispõe:

    «1.   Cada Estado‑Membro deve tomar as medidas necessárias para que os comportamentos referidos no artigo 1.o, bem como a cumplicidade, a instigação ou a tentativa relativas aos comportamentos referidos no n.o 1 do artigo 1.o, sejam passíveis de sanções penais efetivas, proporcionadas e dissuasoras, incluindo, pelo menos nos casos de fraude grave, penas privativas de liberdade que possam determinar a extradição, entendendo‑se que se deve considerar fraude grave qualquer fraude relativa a um montante mínimo, a fixar em cada Estado‑Membro. Esse montante mínimo não pode ser fixado em mais de 50000 [euros].

    […]»

    2. Decisão 2006/928/CE ( 3 )

    6.

    O artigo 1.o prevê:

    «A Roménia deve, até 31 de março de cada ano, e pela primeira vez até 31 de março de 2007, apresentar à Comissão um relatório sobre os progressos realizados relativamente a cada um dos objetivos de referência previstos no anexo.

    […]»

    7.

    O anexo tem a seguinte redação:

    «Objetivos de referência a atingir pela Roménia, referidos no artigo 1.o:

    1)

    Garantir processos judiciais mais transparentes e eficazes, nomeadamente mediante o reforço das capacidades e da responsabilização do Conselho Superior da Magistratura. Apresentar relatórios e acompanhar o impacto dos novos Códigos de Processo Civil e Penal.

    2)

    Estabelecer, tal como previsto, uma Agência para a Integridade com responsabilidades de verificação dos ativos, incompatibilidades e potenciais conflitos de interesses, e com poderes para emitir decisões vinculativas, com base nas quais podem ser aplicadas sanções dissuasivas.

    3)

    Continuar, com base nos progressos já efetuados, a realizar inquéritos profissionais e imparciais sobre as alegações de corrupção de alto nível.

    4)

    Tomar medidas suplementares para prevenir e combater a corrupção, nomeadamente no âmbito da administração local.»

    3. Diretiva (UE) 2017/1371 ( 4 )

    8.

    O artigo 2.o, n.o 2, tem a seguinte redação:

    «No que respeita a receitas provenientes dos recursos próprios do [Imposto Sobre o Valor Acrescentado (a seguir “IVA”], a presente diretiva é aplicável apenas aos casos de infrações graves ao sistema comum do IVA. Para efeitos da presente diretiva, as infrações ao sistema comum do IVA são consideradas graves caso os atos ou omissões intencionais definidos no artigo 3.o, n.o 2, alínea d), estejam relacionados com o território de dois ou mais Estados‑Membros da União e envolvam prejuízos totais de, pelo menos, 10000000 EUR.»

    9.

    Nos termos do artigo 16.o:

    «A Convenção relativa à Proteção dos Interesses Financeiros das Comunidades Europeias, de 26 de julho de 1995, incluindo os seus Protocolos de 27 de setembro de 1996, 29 de novembro de 1996 e 19 de junho de 1997, é substituída pela presente diretiva relativamente aos Estados‑Membros por ela vinculados, com efeitos a partir de 6 de julho de 2019.

    No que respeita aos Estados‑Membros vinculados pela presente diretiva, as remissões para a Convenção são entendidas como sendo feitas para a presente diretiva.»

    10.

    O artigo 17.o, n.o 1, dispõe:

    «Os Estados‑Membros adotam e publicam, até 6 de julho de 2019, as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva. Os Estados‑Membros comunicam imediatamente à Comissão o texto dessas disposições. Os Estados‑Membros aplicam essas disposições a partir de 6 de julho de 2019.

    […]»

    B.   Direito romeno

    1. Constituição da Roménia

    11.

    O artigo 15.o, n.o 2, dispõe que «a lei é aplicável apenas para o futuro, com exceção do direito penal ou administrativo mais favorável».

    12.

    O artigo 147.o dispõe:

    «1.   As disposições das leis e dos decretos em vigor, bem como as dos regulamentos, que sejam consideradas inconstitucionais, deixam de produzir os seus efeitos jurídicos 45 dias após a publicação do acórdão do Tribunal Constitucional, exceto se, durante esse período, o Parlamento ou o Governo, consoante o caso, procedam à harmonização das disposições inconstitucionais com as da Constituição. Durante esse período, as disposições consideradas inconstitucionais ficam automaticamente suspensas.

    […]

    4.   As decisões do Tribunal Constitucional são publicadas no Monitorul Oficial al României (Jornal Oficial da Roménia). A partir da data de publicação, as decisões têm força obrigatória geral e só produzem efeitos jurídicos para o futuro.»

    2. Direito penal

    a) Código Penal de 1969, alterado em 1996 ( 5 )

    13.

    Nos termos do seu artigo 123.o, primeiro parágrafo, «a prescrição […] interrompe‑se pela prática de qualquer ato que, segundo a lei, seja comunicado ao suspeito ou ao arguido no decurso do processo penal».

    b) Código Penal de 2009 ( 6 )

    14.

    O artigo 5.o, n.o 1, dispõe que «[q]uando, entre a prática do crime e a decisão definitiva, vigoraram uma ou mais leis penais, aplica‑se a lei mais favorável».

    15.

    Nos termos do artigo 5.o, n.o 2, o número anterior é igualmente aplicável quando as leis ou algumas das suas disposições, declaradas inconstitucionais, contenham disposições penais mais favoráveis.

    16.

    Em conformidade com o artigo 6.o, n.o 1, «[q]uando uma lei que preveja uma pena menos grave tiver entrado em vigor depois de a decisão de condenação ter transitado em julgado e antes da execução total da pena de prisão ou da multa, a pena aplicada, se ultrapassar o máximo especial previsto na nova lei para o crime cometido, é reduzida para esse máximo».

    17.

    O artigo 154.o, n.o 1, prevê:

    «Os prazos de prescrição da responsabilidade penal são:

    a)

    15 anos, quando a infração cometida seja punível com pena de prisão perpétua ou com pena de prisão superior a 20 anos;

    b)

    10 anos, quando a infração cometida seja punível com pena de prisão superior a 10 anos e não superior a 20 anos;

    c)

    8 anos, quando a infração cometida seja punível com pena de prisão superior a 5 anos e não superior a 10 anos;

    d)

    5 anos, quando a infração cometida seja punível com pena de prisão superior a 1 ano e não superior a 5 anos;

    e)

    3 anos, quando a infração cometida seja punível com pena de prisão não superior a 1 ano ou multa.»

    18.

    O artigo 155.o previa:

    «(1)   O prazo de prescrição da responsabilidade penal interrompe‑se pela prática de qualquer ato processual no processo.

    (2)   Cada interrupção faz correr novamente o prazo.

    […]»

    19.

    O Decreto‑Lei n.o 71, de 30 de maio de 2022 ( 7 ), alterou o artigo 155.o do Código Penal de 2009. Desde então, o n.o 1 deste artigo passa a ter a seguinte redação: «[o] prazo de prescrição da responsabilidade penal interrompe‑se pela prática de qualquer ato processual no processo que, por lei, deva ser notificado ao suspeito ou ao arguido».

    c) Código de Processo Penal ( 8 )

    20.

    O artigo 426.o, alínea b), dispõe que as decisões definitivas em processos penais podem ser objeto de recurso extraordinário de anulação quando o arguido tiver sido condenado apesar de existirem provas da existência de uma causa de extinção do processo penal.

    d) Acórdão Constitucional n.o 297/2018

    21.

    Com o Acórdão n.o 297/2018, de 26 de abril de 2018, publicado em 25 de junho de 2018, a Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional), ao julgar procedente uma exceção de inconstitucionalidade, declarou inconstitucional a interrupção do prazo de prescrição da responsabilidade penal pela prática de qualquer ato processual no processo, na aceção do artigo 155.o, n.o 1, do Código Penal de 2009.

    22.

    Na opinião da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional), essa disposição do Código Penal de 2009 não tinha previsibilidade e violava o princípio da legalidade dos crimes e das penas, uma vez que a expressão «qualquer ato processual», que dela constava, incluía igualmente atos que não eram notificados ao suspeito ou ao arguido. Esta circunstância impedia‑o de tomar conhecimento do facto de se ter verificado a interrupção do prazo de prescrição e de ter começado a correr um novo prazo de prescrição da sua responsabilidade penal ( 9 ).

    23.

    O legislador romeno não procedeu à alteração do artigo 155.o, n.o 1, do Código Penal de 2009 no sentido indicado pela Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional), tendo‑se originado uma jurisprudência não uniforme nos tribunais comuns no que respeita à interrupção dos prazos de prescrição da responsabilidade penal ( 10 ).

    e) Acórdão Constitucional n.o 358/2022

    24.

    Com o Acórdão n.o 358/2022, de 26 de maio de 2022, publicado em 9 de junho de 2022, a Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional), ao julgar procedente uma nova exceção de inconstitucionalidade, declarou que o artigo 155.o, n.o 1, do Código Penal de 2009 era inconstitucional.

    25.

    O tribunal afirmou que:

    O legislador não tinha intervindo, como determina o artigo 147.o, n.o 1, da Constituição, para adequar as disposições declaradas inconstitucionais no Acórdão n.o 297/2018 e regular as situações em que o prazo de prescrição da responsabilidade penal é interrompido.

    Na falta de tal intervenção legislativa, as autoridades judiciárias não estavam em condições de determinar por si próprias as causas de interrupção da prescrição da responsabilidade. Havia uma falta de clareza e de previsibilidade da aplicação do artigo 155.o, n.o 1, do Código Penal de 2009, que originava uma prática jurisdicional não uniforme. O quadro jurídico em vigor não fornecia os elementos legislativos necessários para uma aplicação previsível do artigo 155.o, n.o 1, do referido Código Penal após o Acórdão n.o 297/2018.

    Consequentemente, o direito positivo romeno não previa nenhum caso de interrupção do prazo de prescrição da responsabilidade penal a partir da data de publicação do Acórdão n.o 297/2018 e até à entrada em vigor de um ato normativo do legislador que regulasse expressamente as causas de interrupção desse prazo ( 11 ).

    f) Acórdão n.o 67/2022, da Înalta Curte de Casație și Justiție (Supremo Tribunal)

    26.

    Com o Acórdão n.o 67/2022, de 25 de outubro de 2022, publicado em 28 de novembro de 2022, a Înalta Curte de Casație și Justiție (Supremo Tribunal), pronunciando‑se num recurso de fixação de jurisprudência, como classificado pelo órgão jurisdicional de reenvio ( 12 ), fez as declarações seguintes:

    As normas relativas à interrupção da prescrição são normas de direito penal material (substantivo). Do ponto de vista da sua aplicação no tempo, estão sujeitas ao princípio da irretroatividade da lei penal, previsto no artigo 3.o do Código Penal de 2009, com exceção das disposições mais favoráveis, em conformidade com o princípio da lex mitior do artigo 15.o, n.o 2, da Constituição romena e do artigo 5.o do referido Código Penal.

    Entre 25 de junho de 2018 (data de publicação do Acórdão Constitucional n.o 297/2018, precisado pelo Acórdão Constitucional n.o 358/2022) e 30 de maio de 2022, o artigo 155.o, n.o 1, do Código Penal de 2009, não previu nenhuma causa de interrupção do prazo de prescrição da responsabilidade penal.

    Um órgão jurisdicional chamado a conhecer de um recurso extraordinário de anulação com base nos efeitos dos Acórdãos Constitucionais n.o 297/2018 e n.o 358/2022, não pode voltar a examinar a prescrição da responsabilidade penal, dado que o tribunal de recurso submeteu a discussão e examinou a incidência dessa causa de extinção do processo penal durante um processo anterior ao Acórdão n.o 358/2022.

    3. Legislação relativa ao regime disciplinar dos juízes

    27.

    O artigo 99.o, alínea ș), da Lei n.o 303/2004 ( 13 ) qualificava de infração disciplinar a inobservância dos acórdãos da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) ou dos acórdãos proferidos pela Înalta Curte de Casație și Justiție (Supremo Tribunal) nos recursos de fixação de jurisprudência.

    28.

    O artigo 271.o, alínea s), da Lei n.o 303/2022 ( 14 ) dispõe que «constituem infrações disciplinares […] o exercício de funções de má‑fé ou com negligência grave».

    29.

    Nos termos do artigo 272.o da Lei n.o 303/2022:

    «(1)   O juiz ou o procurador agem de má‑fé quando violarem conscientemente as normas de direito substantivo ou processual pretendendo ou aceitando prejudicar uma pessoa.

    (2)   O juiz ou o procurador incorrem em negligência grave quando violarem de forma culposa, grave, indubitável e indesculpável as normas de direito substantivo ou processual.

    […].»

    II. Matéria de facto, litigio e questões prejudiciais

    30.

    Pelo Acórdão n.o 285/AP, de 30 de junho de 2020 ( 15 ), a Curtea de Apel Brașov (Tribunal de Recurso de Braşov, Roménia) condenou a título definitivo várias pessoas (C. O., C. I., L. N., K. A. e S. P.) como autoras de crimes de evasão fiscal e de associação criminosa.

    31.

    No que respeita ao crime de evasão fiscal, o tribunal considerou provado que, durante o ano de 2010, os condenados não tinham, total ou parcialmente, inscrito na sua contabilidade operações comerciais efetuadas, bem como rendimentos provenientes da venda, a destinatários nacionais, de gasóleo que tinham adquirido em regime de suspensão do pagamento do imposto especial de consumo. Por conseguinte, tinham causado um prejuízo ao Erário Público, também no que respeita ao IVA e ao imposto especial de consumo sobre o gasóleo.

    32.

    As condenações aplicadas incluíam penas privativas de liberdade e a obrigação de pagamento de uma indemnização pelos prejuízos fiscais, no montante total de 13964482 RON (cerca de 3240000 euros), incluindo o imposto sobre o valor acrescentado (IVA).

    33.

    Dois dos condenados (K. A. e S. P.) estão atualmente presos em execução do Acórdão de 30 de junho de 2020.

    34.

    Os condenados interpuseram no órgão jurisdicional de reenvio um recurso extraordinário de anulação [artigo 426.o, alínea b), do Código de Processo Penal] contra o Acórdão de 30 de junho de 2020.

    35.

    No seu recurso extraordinário pedem a anulação desse acórdão, uma vez que tinham sido condenados apesar de ter decorrido o prazo de prescrição da responsabilidade penal. Neste sentido, invocam os Acórdão da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) n.o 297/2018 e n.o 358/2022.

    36.

    Na opinião dos recorrentes:

    Deve ser‑lhes aplicado o princípio da lei penal mais favorável. No que respeita aos crimes pelos quais foram condenados, a lei mais favorável previa um prazo de prescrição da responsabilidade penal mais curto que já tinha decorrido antes da decisão definitiva do processo. A prescrição da responsabilidade penal surgiu após a decisão penal definitiva, na sequência da prolação do Acórdão n.o 358/2022 que declarou inconstitucional o artigo 155.o, n.o 1, do Código Penal de 2009, e determinou que, no período subsequente à publicação do Acórdão n.o 297/2018, a legislação penal nacional não previa nenhuma causa de interrupção do prazo de prescrição da responsabilidade penal.

    A inexistência de causas de interrupção do prazo de prescrição da responsabilidade penal no período entre os dois Acórdãos constitucionais, declarada pelo Acórdão n.o 358/2022, constitui, por si só, uma lei penal mais favorável. Esta deve ser aplicada a favor dos acusados que cometeram crimes não definitivamente julgados até à data da publicação da Decisão n.o 297/2018. Nessas circunstâncias, se não fossem consideradas as causas de interrupção, o prazo de prescrição de dez anos previsto no artigo 154.o, n.o 1, alínea b), do Código Penal de 2009, já teria decorrido antes do trânsito em julgado do acórdão de condenação.

    37.

    No âmbito do recurso extraordinário, o Ministerul Public — Direcția Națională Anticorupție [Ministério Público — Direção Nacional Anticorrupção (a seguir «DNA»), Roménia] pediu que fosse submetido um pedido de decisão prejudicial ao Tribunal de Justiça para determinar se o artigo 325.o TFUE, a Decisão 2006/928 e o artigo 49.o da Carta devem ser interpretados no sentido de que permitem a não aplicação da jurisprudência constitucional resultante do Acórdão n.o 358/2022. Em seu entender, a aplicação desta decisão comporta um risco sistémico de impunidade nos casos em que o direito da União é aplicável.

    38.

    Em contrapartida, os recorrentes alegaram que as normas de direito da União não são relevantes para o caso presente, o que implicaria que o pedido de decisão prejudicial fosse indeferido. Além disso, alegaram que o princípio da aplicação da lei penal mais favorável tem valor constitucional e prevalece sobre qualquer norma do direito da União.

    39.

    O órgão jurisdicional de reenvio afirma que, se acolhesse os pedidos dos recorrentes, deveria anular o acórdão condenatório definitivo e arquivar o processo penal, o que tornaria impossível que os recorrentes continuassem a cumprir a sua pena. Uma vez estabelecida essa premissa, expõe, em substância, várias razões para, no presente processo, afastar o princípio da lei penal mais favorável, garantido pela Constituição romena, cuja aplicação seria contrária ao direito da União.

    40.

    Neste contexto, a Curtea de Apel Brașov (Tribunal de Recurso de Braşov) submete ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

    «1)

    Devem o artigo 2.o TUE, o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e o artigo 4.o, [n.o 3], TUE, conjugados com o artigo 325.o, n.o 1, TFUE, com o artigo 2.o, n.o 1, da Convenção PIF, com os artigos 2.o e 12.o da Diretiva PIF, bem como com a Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, por referência ao princípio das sanções efetivas e dissuasivas em caso de fraude grave lesiva dos interesses financeiros da União europeia, e em aplicação da Decisão da Comissão 2006/928/CE, por referência ao artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, ser interpretados no sentido de que se opõem a uma situação jurídica, como a que está em causa no processo principal, em que os recorrentes condenados pedem, através de um meio extraordinário de recurso, a anulação de uma decisão penal de condenação definitiva, invocando a aplicação do princípio da lei penal mais favorável, que seria aplicável quando da discussão do mérito do processo e que previa um prazo de prescrição mais curto que terminou antes da decisão definitiva do processo mas que só passou a ser observado depois desse momento, por uma decisão dos tribunais constitucionais nacionais que declarou inconstitucional um texto legal relativo à interrupção da prescrição da responsabilidade penal (decisão de 2022), invocando a inércia do legislador, que não interveio para adequar o texto da lei a outra decisão do mesmo Tribunal Constitucional, proferida quatro anos antes desta última decisão (decisão de 2018) — período durante o qual a jurisprudência dos tribunais comuns, formada com base na aplicação da primeira decisão, já se tinha consolidado no sentido de que esse texto continuava a subsistir na forma que resultou da primeira decisão do Tribunal Constitucional — com a consequência prática de o prazo de prescrição para todos os crimes em relação aos quais não tivesse sido proferida decisão de condenação definitiva anterior à primeira decisão do Tribunal Constitucional ser reduzido para metade e de o processo penal contra os acusados em causa nos autos ser, consequentemente, arquivado?

    2)

    Devem o artigo 2.o TUE, relativo aos valores do Estado de direito e do respeito pelos direitos do Homem numa sociedade caracterizada pela justiça, e o artigo 4.o, [n.o 3], TUE, sobre o princípio da cooperação leal entre a União e os Estados‑Membros, em aplicação da Decisão 2006/928/CE da Comissão no que respeita ao esforço para garantir a eficácia do sistema judiciário romeno, por referência ao artigo 49.o, [n.o 1], último período, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, que consagra o princípio da lei penal mais favorável, em relação ao sistema judiciário nacional no seu todo, ser interpretados no sentido de que se opõem a uma situação jurídica como a que está em causa no processo principal em que os recorrentes condenados pedem, através de um meio extraordinário de recurso, a anulação de uma decisão penal de condenação definitiva, invocando a aplicação do princípio da lei penal mais favorável, que seria aplicável quando da discussão do mérito do processo e que previa um prazo de prescrição mais curto que terminou antes da decisão definitiva do processo mas que só passou a ser observado depois desse momento, por uma decisão dos tribunais constitucionais nacionais que declarou inconstitucional um texto legal relativo à interrupção da prescrição da responsabilidade penal (decisão de 2022), invocando a inércia do legislador, que não interveio para adequar o texto da lei a outra decisão do mesmo Tribunal Constitucional, proferida quatro anos antes desta última decisão (decisão de 2018) — período durante o qual a jurisprudência dos tribunais comuns, formada com base na aplicação da primeira decisão, já se tinha consolidado no sentido de que esse texto continuava a subsistir na forma que resultou da primeira decisão do Tribunal Constitucional — com a consequência prática de o prazo de prescrição para todos os crimes em relação aos quais não tivesse sido proferida decisão de condenação definitiva anterior à primeira decisão do Tribunal Constitucional ser reduzido para metade e de o processo penal contra aos acusados em causa nos autos ser, consequentemente, arquivado?

    3)

    Em caso de resposta afirmativa, e apenas se não puder ser fornecida uma interpretação conforme com o direito da União, deve o princípio do primado do direito da União ser interpretado no sentido de que se opõe a uma legislação ou prática nacional por força da qual os tribunais comuns nacionais se encontram vinculados pelas decisões do Tribunal Constitucional nacional e pelas decisões vinculativas do órgão jurisdicional nacional supremo e não podem, por este motivo e sem incorrer numa infração disciplinar, não aplicar oficiosamente a jurisprudência resultante dessas decisões, ainda que considerem, à luz de um acórdão do Tribunal de Justiça, que essa jurisprudência é contrária ao artigo 2.o TUE, ao artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE e ao artigo 4.o, [n.o 3], TUE, conjugados com o artigo 325.o TFUE, em aplicação da Decisão da Comissão 2006/928/CE, por referência ao artigo 49.o, [n.o 1], último período, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, como na situação do processo principal?»

    III. Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

    41.

    O pedido de decisão prejudicial foi registado no Tribunal de Justiça em 22 de fevereiro de 2023, acompanhado do pedido de tramitação acelerada.

    42.

    Após ter recebido do órgão jurisdicional de reenvio a confirmação de que dois dos recorrentes no litígio de origem estavam presos em execução do Acórdão de 30 de junho de 2020 e que deveriam ser libertados se fosse dado provimento aos recursos extraordinários interpostos contra a sua condenação, o Tribunal de Justiça decidiu que o pedido de decisão prejudicial devia beneficiar da tramitação urgente.

    43.

    Em 24 de março de 2023, o órgão jurisdicional de reenvio enviou ao Tribunal de Justiça uma adenda ao seu pedido de decisão prejudicial, que foi comunicada aos interessados para que estas a tivessem em conta nas suas observações.

    44.

    Apresentaram observações escritas quatro dos recorrentes no litígio de origem (C. O, C. I., L. N. e S. P.), o Governo romeno e a Comissão Europeia.

    45.

    Na audiência, realizada em 10 de maio de 2023, intervieram o Governo da Roménia e a Comissão.

    IV. Apreciação

    A.   Admissibilidade

    46.

    Não tenho dúvidas quanto à admissibilidade das três questões prejudiciais submetidas, mas sim no que respeita à adenda enviada pelo órgão jurisdicional de reenvio em 24 de março de 2023.

    47.

    Nessa adenda, o órgão jurisdicional a quo pede ao Tribunal de Justiça que, em caso de resposta afirmativa às suas questões, inclua considerações que evitem que o princípio da não discriminação contido na Constituição romena torne essa resposta inoperante ( 16 ).

    48.

    Na realidade, como sublinharam C. I., C. O. e o Governo romeno, a adenda contém um novo e adicional pedido de decisão prejudicial disfarçado que, se revela hipotético ( 17 ), uma vez que não é indispensável para a solução do litígio de origem. As dúvidas que a inspiram dizem respeito a decisões que já foram anuladas pelos órgãos jurisdicionais romenos em aplicação da jurisprudência da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional). No litígio de origem, os recorrentes não se encontram nessa situação.

    B.   Primeira e segunda questões prejudiciais

    49.

    Com as suas duas primeiras questões prejudiciais, às quais se pode responder conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber, em substância, se, perante circunstâncias de facto e de direito como as que descreve, o artigo 325.o, n.o 1, TFUE, lido em conjugação com o artigo 2.o da Convenção PIF, a Decisão 2006/928 e o artigo 49.o da Carta, se opõe às normas e à jurisprudência nacionais sobre a interrupção dos prazos de prescrição da responsabilidade penal.

    50.

    A premissa das duas questões consiste no facto de a aplicação das normas internas na aceção da jurisprudência constitucional criar um risco de impunidade pelos factos constitutivos de fraude grave aos interesses financeiros da União. Com este pano de fundo, da argumentação exposta pelo órgão jurisdicional de reenvio constam referências, entre outras, aos Acórdãos do Tribunal de Justiça Åkerberg Fransson ( 18 ), Taricco e o ( 19 )., M.A.S. e M.B ( 20 )., e Euro Box Promotion e o ( 21 )..

    1. Disposições do direito da União aplicáveis

    51.

    Antes de mais, importa afastar a aplicação ao presente processo da Diretiva PIF, cujo artigo 12.o estabelece regras comuns relativas aos prazos de prescrição da responsabilidade penal nas infrações constitutivas de fraude lesiva dos interesses financeiros da União, uma vez que:

    Essas regras comuns dizem respeito (artigo 17.o) a infrações cometidas após 6 de julho de 2019. Os atos punidos neste litígio datam de 2010.

    A Diretiva PIF é aplicável (artigo 2.o, n.o 2) às infrações graves ao sistema comum do IVA relacionadas com o território de dois ou mais Estados‑Membros e que envolvam prejuízos totais de, pelo menos, 10000000 euros. As infrações deste litígio são de montante inferior.

    52.

    No que respeita à Diretiva 2006/112/CE ( 22 ), lida em conjugação com o artigo 4.o, n.o 3, TUE, é certo que a mesma impõe aos Estados‑Membros a obrigação de lutar contra a fraude ao IVA ( 23 ), mas não contém regras específicas aplicáveis a uma situação como a do litígio de origem.

    53.

    Quanto aos artigos 2.o, 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, e 4.o, n.o 3, TUE, podem ser tidos em conta no âmbito da análise da compatibilidade das leis e da jurisprudência nacionais com o artigo 325.o, n.o 1, TFUE, norma de direito primário que institui o princípio da proteção dos interesses financeiros da União.

    54.

    O mesmo se aplica à Convenção PIF, que clarifica o princípio do artigo 325.o TFUE.

    55.

    Além do artigo 325.o TFUE, também a Decisão 2006/928 ( 24 ) pode ter incidência na resposta. Embora as infrações aqui punidas digam respeito a fraudes ao IVA, a situação criada pela jurisprudência da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) sobre os prazos de prescrição da responsabilidade penal também afeta os crimes de corrupção, especialmente, de alto nível, como salientou a Comissão no seu Relatório MCV 2022 ( 25 ).

    56.

    Feitas estas clarificações, na minha exposição subsequente analisarei:

    se a jurisprudência constitucional romena sobre a interrupção da prescrição da responsabilidade penal viola o artigo 325.o TFUE e a Decisão 2006/928;

    se, verificando‑se essa violação, a referida jurisprudência poderá beneficiar do princípio da lex mitior protegido pelo artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta;

    a existência, no direito romeno, de um nível de proteção mais elevado do princípio da lex mitior, ao qual está ligada a referida jurisprudência constitucional.

    2. Artigo 325.o, n.o 1, TFUE, e jurisprudência relativa à proteção dos interesses financeiros da União

    57.

    Nos termos do artigo 325.o, n.o 1, TFUE, os Estados‑Membros «combaterão as fraudes e quaisquer outras atividades ilegais lesivas dos interesses financeiros da União, por meio de medidas […] que tenham um efeito dissuasor e proporcionem uma proteção efetiva nos Estados‑Membros […]» ( 26 ).

    58.

    Incumbe, nomeadamente, aos Estados‑Membros tomarem as medidas necessárias para garantir uma cobrança eficaz e completa dos recursos próprios, entre os quais as receitas provenientes da aplicação de uma taxa uniforme à matéria coletável harmonizada do IVA ( 27 ).

    59.

    A referência do artigo 325.o TFUE às «fraudes e [a] quaisquer outras atividades ilegais lesivas dos interesses financeiros da União» implica, segundo o Tribunal de Justiça ( 28 ), que os atos de corrupção podem estar relacionados com casos de fraude e, inversamente, a prática de uma fraude pode ser facilitada por atos de corrupção. A lesão dos interesses financeiros pode, em determinados casos, resultar da conjugação de uma fraude fiscal em matéria de IVA e de atos de corrupção ( 29 ).

    60.

    A «fraude», tal como é definida no artigo 1.o da Convenção PIF ( 30 ), engloba as receitas provenientes da aplicação de uma taxa uniforme à base tributável harmonizada do IVA, que se determina segundo as regras da União ( 31 ).

    61.

    Como já referi, os condenados neste processo foram‑no por crimes de evasão fiscal e de associação criminosa, cometidos no âmbito do IVA e do imposto especial de consumo sobre o gasóleo. Por conseguinte, não há dúvida de que o artigo 325.o, n.o 1, TFUE, é aplicável nem de que se trata de fraudes graves lesivas dos interesses financeiros da União: o montante da fraude é superior a 50000 euros (artigo 2.o, n.o 1, da Convenção PIF).

    62.

    Aplicando‑se o artigo 325.o, n.o 1, TFUE, os Estados‑Membros dispõem de uma liberdade para escolher as sanções aplicáveis. Estas podem tomar a forma de sanções administrativas, de sanções penais ou de uma combinação de ambas. Em todo o caso, devem garantir a cobrança da totalidade das receitas provenientes do IVA e, assim, a proteção dos interesses financeiros da União. Podem ser indispensáveis sanções penais para combater, de forma efetiva e dissuasora, certos casos de fraude ao IVA ( 32 ).

    63.

    O direito romeno prevê sanções penais para essas fraudes e, no presente reenvio, não há dúvida de que, enquanto tais, são efetivas e dissuasoras. Também não é contestado que, em abstrato, os prazos de prescrição ( 33 ) previstos no Código Penal de 2009 para esta categoria de crimes são adequados ( 34 ), ou seja, não se opõem ao caráter efetivo e dissuasor das sanções. Esses prazos são mais longos do que os prazos mínimos previstos no artigo 12.o da Diretiva PIF.

    64.

    Por conseguinte, o problema suscitado não diz respeito às sanções, tal como o direito romeno as previu, nem aos prazos de prescrição fixados pelo Código Penal de 2009, mas sim à impossibilidade jurídica de interromper esses prazos na sequência de duas decisões da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional).

    65.

    Para os supremos tribunais romenos, a prescrição da responsabilidade penal é, no seu ordenamento jurídico, um elemento de direito substantivo (e não, portanto, de direito processual). Este postulado não é contrário ao direito da União, como analisarei adiante.

    66.

    A consequência que decorre dessas decisões e da inércia do legislador nacional consiste em que, durante determinado período ( 35 ), nenhum ato adotado no decurso de um processo penal podia interromper os prazos de prescrição da responsabilidade penal. O desaparecimento das causas de interrupção é considerado «lei penal mais favorável», na aceção do artigo 15.o, n.o 2, da Constituição romena e do artigo 5.o do Código Penal de 2009. Apesar da jurisprudência divergente nos órgãos jurisdicionais inferiores, é esta a interpretação do direito romeno que deve ser tida em consideração, no que respeita ao referido período, uma vez que foi fixada de forma vinculativa pela Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) nos seus Acórdãos n.o 297/2018 e n.o 358/2022 e pela Înalta Curte de Casație și Justiție (Supremo Tribunal) no seu Acórdão n.o 67/2022, proferido em sede de fixação de jurisprudência.

    67.

    Por conseguinte, os condenados tanto por fraudes graves lesivas dos interesses financeiros da União como por outras infrações ( 36 ) podem ver as suas condenações anuladas e ser libertados: basta que os prazos de prescrição (sem possibilidade de ter em conta uma causa de interrupção) previstos no Código Penal de 2009 tenham decorrido entre a prática dos factos e a sentença definitiva que aplica as penas.

    68.

    O órgão jurisdicional de reenvio ( 37 ) preconiza uma interpretação do direito interno que permita afastar a existência de uma «lei penal mais favorável» no litígio ( 38 ). Todavia, esse aspeto competiria apenas ao órgão jurisdicional de reenvio. A possibilidade de interpretar o direito nacional em conformidade com o direito da União, mesmo que implique um afastamento da jurisprudência de um tribunal superior, tem como limite a não realização de interpretações contra legem do direito nacional ( 39 ).

    69.

    Pela minha parte, não vejo como proceder a uma interpretação das normas e da jurisprudência constitucional romenas sobre a interrupção dos prazos de prescrição da responsabilidade penal no período 2018‑2022 que não contrarie as decisões da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional). Estas declaram definitivamente o direito que prevalece na Roménia e a sua jurisprudência constitui a «última palavra» sobre a lei nacional ( 40 ).

    70.

    Excluída a possibilidade de outra interpretação, a questão consiste em saber se o direito nacional, tal como resulta das normas e da jurisprudência constitucional que as interpreta, viola a obrigação de punir com sanções penais efetivas e dissuasoras os casos de fraude grave lesiva dos interesses financeiros da União. No seu despacho de reenvio, o tribunal a quo considera que essa violação se verifica.

    71.

    Com base nas informações disponíveis no âmbito do processo prejudicial, essa apreciação poderia ser considerada fundada se a situação na Roménia, durante o período considerado, tivesse conduzido à impunidade de um número considerável de infrações contra os interesses financeiros da União, em termos incompatíveis com o artigo 325.o, n.o 1, TFUE.

    72.

    O Tribunal de Justiça atribui efeito direto à obrigação de combater as atividades ilegais lesivas dos interesses financeiros da União através de medidas dissuasoras e efetivas. O artigo 325.o, n.o 1, TFUE, impõe aos Estados‑Membros uma obrigação de resultado precisa, que não está subordinada a nenhuma condição ( 41 ).

    73.

    Incumbe a cada Estado‑Membro garantir que o regime aplicável às infrações lesivas dos interesses financeiros da União não seja concebido de tal modo que represente um risco sistémico de impunidade. Todavia, deve fazê‑lo assegurando simultaneamente a proteção dos direitos fundamentais dos arguidos ( 42 ).

    74.

    Como resulta do despacho de reenvio, o legislador romeno violou essa obrigação durante quase quatro anos, ao não alterar o artigo 155.o, n.o 1, do Código Penal de 2009, na sequência da Decisão da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) n.o 297/2018. A alteração acabaria por ser realizada pelo Decreto‑Lei n.o 71/2022, mas durante o período que decorreu entre a referida decisão e este decreto‑lei, manteve‑se a impunidade de um grande número de infrações graves, em detrimento dos interesses financeiros da União, devido ao efeito retroativo da lex mitior.

    3. Decisão 2006/928 e risco sistémico de impunidade

    75.

    A Decisão 2006/928 é um ato adotado pela Comissão com base no Ato de Adesão, que faz parte do direito primário da União. Constitui, mais concretamente, uma decisão na aceção do artigo 288.o, quarto parágrafo, TFUE.

    76.

    Os relatórios da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho, elaborados ao abrigo do Mecanismo de Cooperação e de Verificação (MCV) instituído pela Decisão 2006/928, devem igualmente ser considerados atos adotados por uma instituição da União com base jurídica no artigo 2.o dessa decisão ( 43 ).

    77.

    O Tribunal de Justiça analisou a natureza e os efeitos jurídicos da Decisão 2006/928, sublinhando que, enquanto não for revogada, é obrigatória em todos os seus elementos para a Roménia.

    78.

    Os objetivos de referência que figuram no anexo da Decisão 2006/928 visam assegurar o respeito do princípio do Estado de Direito (artigo 2.o TUE) e assumem caráter vinculativo para a Roménia: este Estado‑Membro deve tomar as medidas adequadas para a realização desses objetivos, tendo devidamente em conta, ao abrigo do princípio da cooperação leal (artigo 4.o, n.o 3, TUE), os relatórios elaborados pela Comissão, bem como as recomendações formuladas nos referidos relatórios ( 44 ).

    79.

    Em especial, a Decisão 2006/928 estabeleceu o MCV e fixou, em matéria de reforma do sistema judicial e de luta contra a corrupção na Roménia, os objetivos de referência referidos no artigo 1.o e detalhados no seu anexo. Esses objetivos de referência têm caráter vinculativo, pelo que a Roménia está vinculada à obrigação específica de os atingir e de se abster de aplicar qualquer medida suscetível de comprometer a realização desses mesmos objetivos ( 45 ).

    80.

    O órgão jurisdicional de reenvio sublinha que os tribunais romenos estão a arquivar os processos penais, incluindo através do recurso extraordinário de anulação, devido ao desaparecimento das causas de interrupção dos prazos de prescrição da responsabilidade penal entre 2018 e 2022, resultante da jurisprudência da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional).

    81.

    Neste contexto, recorda que o Relatório MCV 2022 constatou que a situação em causa poderia ter um «impacto substancial na fase de instrução e nos processos judiciais em curso», com eventuais «consequências graves» pela «eliminação da responsabilidade penal num número substancial de processos» ( 46 ). Por esta razão, considera que teria impacto em todo o sistema judicial romeno.

    82.

    A situação descrita pelo órgão jurisdicional de reenvio e no Relatório MCV 2022 revelaria um risco de impunidade na Roménia para os crimes de fraude grave aos interesses financeiros da União (e para os crimes de corrupção de alto nível, que frequentemente se encontram associados) durante o período compreendido entre 2018 e 2022, ainda que não se identifique com precisão quantos casos afetam esses interesses financeiros. Esse risco resultaria da inexistência de causas de interrupção dos prazos de prescrição da responsabilidade penal (e, concomitantemente, da duração excessiva dos processos penais correspondentes, além do prazo de prescrição).

    83.

    Cabe ao órgão jurisdicional de reenvio decidir, como questão de facto, se, na sequência da jurisprudência da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional), o Estado romeno apresenta um risco sistémico de impunidade para os crimes de fraude grave aos interesses financeiros da União e para os crimes de corrupção com eles relacionados. Nesse caso, a Roménia não cumpriria a obrigação específica de atingir os objetivos de referência enunciados no anexo da Decisão 2006/928 (nomeadamente os objetivos relativos à luta contra a corrupção).

    4. Artigo 49.o da Carta e lei penal mais favorável

    84.

    À semelhança da Decisão 2006/928, o artigo 325.o, n.o 1, TFUE, produz efeito direto. Por força do princípio do primado do direito da União, as duas disposições tornam inaplicável de pleno direito qualquer medida nacional contrária ( 47 ).

    85.

    «Incumbe […] aos órgãos jurisdicionais nacionais competentes dar pleno efeito às obrigações decorrentes do artigo 325.o, n.os 1 e 2, TFUE e não aplicar as disposições internas, nomeadamente em matéria de prescrição, que, no âmbito de um processo por infrações graves em matéria de IVA, obstem à aplicação de sanções efetivas e dissuasoras para combater as fraudes lesivas dos interesses financeiros da União» ( 48 ).

    86.

    O processo controvertido aplica o artigo 325.o, n.o 1, TFUE, e a Decisão 2006/928, ou seja, «aplica o direito da União» na aceção do artigo 51.o, n.o 1, da Carta.

    87.

    Partindo desta premissa, o órgão jurisdicional de reenvio deve assegurar que os direitos fundamentais garantidos pela Carta (neste caso, das pessoas condenadas) são respeitados. Se, tendo isto em conta, decidir não aplicar a jurisprudência nacional relativa à inexistência de causas de interrupção da prescrição da responsabilidade penal referente ao período de 2018‑2022, não o pode fazer ignorando as disposições da Carta, cujo valor não é inferior ao do artigo 325.o, n.o 1, TFUE ( 49 ).

    88.

    A obrigação de garantir uma cobrança eficaz dos recursos da União não dispensa os órgãos jurisdicionais nacionais do seu dever de salvaguardar o respeito dos direitos fundamentais garantidos pela Carta, quando estão em causa processos penais instaurados por infrações em matéria de IVA, em que se aplica o direito da União ( 50 ).

    89.

    Neste contexto, o direito fundamental que poderia justificar a manutenção e a aplicação da jurisprudência constitucional romena é o consagrado no artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta: a retroatividade da lei penal mais favorável ou lex mitior.

    90.

    A obrigação de proteger os recursos próprios da União no âmbito do IVA não pode, repito, dispensar os órgãos jurisdicionais nacionais de aplicarem a lex mitior, enquanto princípio ligado ao da legalidade em matéria penal, que é um elemento indissociável do Estado de direito. Por seu turno, este último constitui um valores principais em que se funda a União (artigo 2.o TUE).

    91.

    Nos termos do artigo 49.o, n.o 1, da Carta, «[…] não pode ser imposta uma pena mais grave do que a aplicável no momento em que a infração foi cometida. Se, posteriormente à infração, a lei previr uma pena mais leve, deve ser essa a pena aplicada».

    92.

    O princípio da retroatividade da lei penal mais favorável, consagrado nesses termos na Carta, faz parte do direito primário da União ( 51 ) e é referido por tratados internacionais celebrados pelos Estados‑Membros da União ( 52 ).

    93.

    Segundo o Tribunal de Justiça, «a aplicação da lei penal mais favorável implica necessariamente uma sucessão de leis no tempo e assenta na constatação de que o legislador mudou de opinião a respeito da qualificação penal dos factos ou a respeito da pena a aplicar a uma infração» ( 53 ).

    94.

    O princípio da lex mitior é concebido como uma exceção à proibição de aplicar retroativamente as normas penais. Visto que a retroatividade in bonam partem beneficia o arguido, não se pode argumentar que a execução da lei penal posterior viola o princípio da legalidade em matéria penal (nullum crimen, nulla poena sine lege). Simplesmente, a antiga lei, em vigor no momento dos factos constitutivos da infração, cede retroativamente à nova lei e melhora assim a situação penal do arguido (ou do condenado).

    95.

    Embora o seu fundamento seja contestado, o princípio da lex mitior baseia‑se na consideração de que uma pessoa cujo comportamento, na opinião (modificada) do legislador, deixou de ser crime, como previa a lei anterior, não deve ser condenada, nem privada de liberdade. Assim, as valorações posteriormente modificadas do legislador são aplicadas em benefício dessa pessoa ( 54 ).

    96.

    Resulta das Anotações relativas à Carta (artigo 52.o, n.o 3) que o direito reconhecido no seu artigo 49.o tem um sentido e um âmbito iguais aos do direito garantido pela Convenção Europeia dos Direitos do Homem (a seguir «CEDH»).

    97.

    Como a CEDH não previa expressamente este princípio, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (a seguir «TEDH»), seguindo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, deduziu‑o do seu artigo 7.o ( 55 ).

    98.

    Segundo o TEDH:

    «Aplicar uma pena mais grave pelo simples facto de estar prevista no momento da prática do crime implicaria a aplicação, em detrimento do arguido, das normas que regulam a sucessão das leis penais no tempo. Isso equivaleria a ignorar qualquer alteração legislativa favorável ao arguido, ocorrida antes da decisão, e a continuar a aplicar penas que o Estado e a coletividade que ele representa passam a considerar excessivas» ( 56 ).

    «A obrigação de aplicar, entre várias normas penais, aquela cujas disposições se revelem mais favoráveis ao arguido constitui uma clarificação das regras relativas à sucessão das leis penais, o que vai ao encontro de outro elemento essencial do artigo 7.o [da CEDH], a saber, a previsibilidade das sanções» ( 57 ).

    O princípio da retroatividade implica que, «quando existam diferenças entre o direito penal em vigor no momento em que a infração foi cometida e as normas penais posteriores adotadas antes de ser proferida uma decisão definitiva, o tribunal deve aplicar a legislação cujas disposições sejam mais favoráveis ao arguido» ( 58 ).

    99.

    Todavia, até à data, nem o TEDH nem o Tribunal de Justiça delimitaram precisamente o alcance exato do princípio da lex mitior em situações como a do presente processo. O presente reenvio prejudicial permite ao Tribunal de Justiça desenvolver a sua jurisprudência a fim de determinar se do artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta decorrem:

    A aplicabilidade do princípio da lex mitior aos prazos de prescrição da responsabilidade penal e às suas causas de interrupção.

    A equivalência entre uma alteração da legislação penal e a jurisprudência de um tribunal constitucional nacional, para efeitos da aplicação da lex mitior.

    A extensão do princípio da lex mitior apenas aos processos penais ainda não decididos por sentença transitada em julgado ou, pelo contrário, também aos processos findos por sentenças que fazem caso julgado (por conseguinte, com incidência sobre as penas em fase de execução).

    100.

    As tradições constitucionais dos Estados‑Membros são, na realidade, «pouco comuns» no que diz respeito ao princípio da lex mitior. Existem países que quase desconhecem esta garantia penal básica e outros que lhe conferem uma ampla cobertura, incluindo constitucional (Portugal, Roménia, Itália ou Espanha, entre outros). Em meu entender, o Tribunal de Justiça deve estabelecer um padrão de proteção autónomo e específico do artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta, que confira aos seus destinatários um nível de salvaguarda elevado e não apenas uma proteção de minimis.

    a)  Lex mitior e interrupção da prescrição da responsabilidade penal

    101.

    O artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta faz referência à retroatividade da lei que preveja «uma pena mais leve». Como já mencionei, o Tribunal de Justiça afirma que a aplicação da lei penal mais favorável assenta na constatação de que o legislador mudou de opinião «a respeito da qualificação penal dos factos ou a respeito da pena a aplicar a uma infração» ( 59 ).

    102.

    Estas duas referências não são determinantes, mas indicam que o princípio da lex mitior da Carta é apenas aplicável às normas de direito penal substantivo e não às normas de direito processual penal.

    103.

    Se assim for, será necessário determinar em cada caso quando é que a prescrição e as suas interrupções têm natureza substantiva (material) ou puramente processual, para efeitos do artigo 49.o da Carta. Trata‑se de uma clarificação importante, uma vez que as normas processuais penais são geralmente conformes com a regra tempus regit actum.

    104.

    A jurisprudência dos tribunais supremos da Roménia considera que, no seu país, as normas que regulam a prescrição penal têm natureza substantiva. Nada no direito da União se opõe a esta jurisprudência nacional, como o Tribunal de Justiça reconheceu no Acórdão M.A.S. e M.B.

    105.

    A proteção dos interesses financeiros da União através da aplicação de sanções penais constitui uma competência partilhada entre a União e os Estados‑Membros, na aceção do artigo 4.o, n.o 2, TFUE.

    106.

    À data dos factos controvertidos, o regime de prescrição aplicável às infrações penais relativas ao IVA não tinha sido objeto de harmonização pelo legislador da União ( 60 ). Os Estados‑Membros eram livres de prever que, na sua ordem jurídica, o regime da prescrição da responsabilidade penal e das suas interrupções fosse abrangido pelo direito penal substantivo ( 61 ).

    107.

    Por conseguinte, na falta de harmonização do regime de prescrição da responsabilidade penal por crimes contra os interesses financeiros da União, depende do direito de cada Estado‑Membro decidir se as suas normas de prescrição são de natureza processual ou substantiva ( 62 ).

    108.

    É certo que, no Acórdão Taricco, o Tribunal de Justiça optou por conferir um caráter processual às normas da prescrição da responsabilidade penal, como tinha indicado o TEDH ( 63 ); todavia, noutros casos, o Tribunal de Justiça adotou uma posição distinta relativamente aos prazos de prescrição ( 64 ).

    109.

    A jurisprudência do TEDH tendeu a considerar essas normas como sendo de natureza processual, uma vez que não determinam as infrações e as penas que as reprimem, limitando‑se a fixar uma condição prévia para a investigação do caso ( 65 ). Todavia, o TEDH considerou que havia violação do artigo 7.o da CEDH quando um arguido é condenado por uma infração já prescrita ( 66 ).

    110.

    No Acórdão M.A.S. e M.B ( 67 )., o Tribunal de Justiça (em meu entender, corretamente) matizou o Acórdão Taricco para:

    Fazer referência à jurisprudência do TEDH relativa ao artigo 7.o, n.o 1, da CEDH, por força da qual as disposições penais devem respeitar certas exigências de acessibilidade e de previsibilidade no que diz respeito quer à definição da infração quer à determinação da pena ( 68 ).

    Salientar que a exigência de precisão da lei aplicável implica que a lei defina de forma clara as infrações e as penas que as reprimem. Esta condição está preenchida quando o particular puder saber, a partir da redação da disposição relevante e, se necessário, recorrendo à interpretação que lhe é dada pelos tribunais, quais os atos e omissões pelos quais responde penalmente ( 69 ).

    Sublinhar que as exigências de previsibilidade, de precisão e de irretroatividade inerentes ao princípio da legalidade dos crimes e das penas se aplicam igualmente (em Itália) ao regime de prescrição das infrações penais em matéria de IVA.

    111.

    À luz do Acórdão M.A.S. e M.B, considero que, enquanto não houver harmonização no direito da União ( 70 ), cada Estado‑Membro pode continuar a conferir natureza substantiva às normas que regulam a prescrição da responsabilidade penal (incluindo, logicamente, as que regulam a interrupção dos prazos de prescrição). Na mesma medida, essas normas estão sujeitas ao princípio da lex mitior previsto no artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta.

    b)  Lex mitior e decisões dos tribunais constitucionais

    112.

    A Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional), além de considerar que a prescrição da responsabilidade penal é abrangida pelo direito penal substantivo, declarou a inconstitucionalidade do artigo 155.o do Código Penal de 2009, relativo à interrupção dos prazos de prescrição. Como sequência desta jurisprudência, durante o período entre 25 de junho de 2018 e 30 de maio de 2022, esses prazos corriam sem possibilidade de interrupção.

    113.

    Poder‑se‑ia argumentar que as decisões de um tribunal constitucional não constituem uma «lei penal mais favorável», uma vez que não se trata propriamente de medidas legislativas adotadas pelo Estado‑Membro. Todavia, penso que essa objeção deve ser rejeitada.

    114.

    A Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional), ao declarar a inconstitucionalidade do artigo 155.o do Código Penal de 2009, atua como «legislador negativo» ( 71 ). Nos Estados dotados da fiscalização da constitucionalidade concentrada, as declarações de inconstitucionalidade das leis têm um valor e uma força de obrigatoriedade semelhantes aos das próprias leis cuja inaplicabilidade (e, se for o caso, nulidade), total ou parcial declaram incompatíveis com a Constituição nacional. Nesses países, as declarações de inconstitucionalidade das leis produzem efeitos erga omnes e implicam o desaparecimento total ou parcial dessas leis do ordenamento jurídico (Espanha, Polónia, Portugal, Lituânia, Roménia, Alemanha ou Itália).

    115.

    Por conseguinte, para efeitos da aplicação retroativa da lex mitior, não vejo diferença entre a revogação total ou parcial de uma lei penal por outra lei posterior (decisões do legislador) e a expulsão, igualmente total ou parcial, dessa lei do ordenamento jurídico através de uma declaração de inconstitucionalidade (decisões do tribunal constitucional) ( 72 ).

    116.

    Por conseguinte, uma declaração de inconstitucionalidade como a proferida pela Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) nas suas Decisões n.o 297/2018 e n.o 358/2022 equivale, sob o ponto de vista substantivo, a uma alteração legislativa, para efeitos da aplicação do princípio da lex mitior. Essa declaração vincula todos os poderes públicos, incluindo os órgãos jurisdicionais ( 73 ), embora subsista a competência destes últimos para declararem incompatível com o direito da União uma norma nacional que o Tribunal Constitucional tenha declarado conforme com a sua Constituição ( 74 ).

    117.

    No presente litígio, os Acórdãos n.o 297/2018 e n.o 358/2022 da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) decidem uma questão de direito constitucional romeno, sem se pronunciarem sobre a sua compatibilidade com o direito da União nem «porem em causa» o seu primado.

    118.

    Quando o Tribunal de Justiça se refere à «sucessão de leis no tempo», utiliza o termo «leis» em sentido amplo. São obviamente abrangidas por essa aceção as adotadas pelos seus órgãos legislativos, mas também as alterações dessas mesmas leis, resultantes das declarações de inconstitucionalidade adotadas por um tribunal constitucional. Esta afirmação parece‑me mais conforme com a obrigação de não interpretar os direitos protegidos pela Carta de modo que restrinja o seu conteúdo.

    119.

    A interpretação que proponho não é contrariada pelo Acórdão do TEDH no processo Ruban c. Ucrânia. No seu âmbito foi invocada a eventual violação do princípio da lex mitior pelo Estado Ucraniano como consequência de uma decisão do seu tribunal constitucional. O TEDH rejeitou que se violasse o artigo 7.o da CEDH, mas analisou a declaração de inconstitucionalidade como se se tratasse de uma alteração legislativa, sem objetar que esta jurisprudência constitucional não implicava a sucessão de «leis» no tempo ( 75 ).

    c)  Lex mitior e decisões penais definitivas

    120.

    No Acórdão Scoppola c. Itália, o TEDH pareceu tender para a limitação da aplicação da lex mitior aos processos penais ainda não resolvidos por decisão transitada em julgado ( 76 ). Todavia, em alguns processos posteriores, alargou igualmente este princípio a decisões transitadas, desde que o direito nacional preveja essa possibilidade ( 77 ).

    121.

    À primeira vista, poder‑se‑ia pensar que o Tribunal de Justiça também circunscreveu o princípio da lex mitior às decisões definitivas ( 78 ). Todavia, considero que essa conclusão seria precipitada, uma vez que, no processo Delvigne, a legislação nacional em causa oferecia aos condenados a possibilidade de uma reapreciação, em aplicação da nova lei, da situação resultante de uma condenação penal prévia transitada em julgado.

    122.

    Em meu entender, a lex mitior deve igualmente aplicar‑se às decisões penais definitivas em fase de execução. Reconheço que tal não é o caso em todos os Estados‑Membros da União, embora seja a solução adotada por alguns ( 79 ). Mesmo naqueles em que, por via de regra, a lex mitior não se aplica às decisões em matéria penal transitadas em julgado, existem diversas exceções a essa regra. Assim, é frequente que o efeito retroativo in melius se estenda a esse tipo de decisões quando a nova legislação penal o preveja, quando um comportamento seja despenalizado ( 80 ), ou quando um tribunal constitucional declare a inconstitucionalidade de uma lei penal ( 81 ).

    123.

    Em todo o caso, o princípio do artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta, tem um significado autónomo, que não depende da pluralidade de soluções a que chegaram os Estados‑Membros e o nível de proteção que deve proporcionar tem de ser elevado e não de minimis, como já sugeri.

    124.

    Não tem lógica que a alteração de valores (ou de critérios punitivos) do legislador se aplique apenas em benefício dos arguidos ou acusados e não daqueles que, por factos semelhantes, se encontrem a cumprir penas definitivas. A falta de lógica é mais percetível no caso da despenalização, por lei posterior, de comportamentos já punidos (abolitio criminis). Não é possível, com boa consciência jurídica, aceitar que, nessa situação, razões meramente temporais determinem que os condenados a título definitivo por um desses comportamentos permaneçam na prisão, ao passo que os autores dos mesmos comportamentos, ainda a aguardar sentença, fiquem isentos de responsabilidade penal.

    125.

    O mesmo critério de equidade e de coerência que a lex mitior comporta para os arguidos ou acusados é transponível para os que já foram condenados. Não é razoável, repito, que duas pessoas que tenham praticado factos análogos no mesmo dia beneficiem ou não deste princípio pelo simples facto de o processo penal ter sido concluído mais rapidamente no que respeita a uma delas, dando lugar a uma condenação definitiva, enquanto se prolongou no tempo, para a outra, ainda não condenada por decisão transitada em julgado.

    126.

    A lógica do princípio da retroatividade da lei penal mais favorável deve aplicar‑se igualmente às decisões em matéria penal transitadas em julgado, a fim de evitar incoerências como a da situação acima referida. Todavia, é verdade que esta solução implica um processo de reapreciação das condenações que fazem caso julgado, mas esta objeção não me parece inultrapassável. Não o é nos casos de despenalização de comportamentos anteriormente qualificados de crimes e não vejo por que razão o seria noutras situações de sucessão de leis no tempo ( 82 ).

    127.

    A reapreciação das decisões definitivas como consequência da lex mitior exige que o direito interno ofereça um meio processual para esse efeito, a pedido da pessoa condenada. Na Roménia, segundo o despacho de reenvio, essa via é o recurso extraordinário de anulação do artigo 426.o, n.o 1, alínea b), do Código de Processo Penal romeno, dentro dos limites indicados na Decisão n.o 67/2022 da Înalta Curte de Casație și Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça).

    d) Conclusão intercalar

    128.

    Em suma, proponho uma interpretação do princípio da retroatividade da lei penal mais favorável, consagrado no artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta, que:

    abranja as normas de interrupção da prescrição da responsabilidade penal quando o direito penal nacional lhes confira natureza substantiva;

    considere equivalentes à sucessão de leis penais no tempo os casos de alteração da lei penal devidos a uma declaração da sua inconstitucionalidade proferida por um tribunal constitucional nacional; e

    seja aplicável aos processos penais em curso e às decisões transitadas em julgado quando o direito nacional o preveja, e mesmo de forma geral.

    129.

    No presente processo, o princípio da retroatividade da lei penal mais favorável, previsto no artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta, justifica a extinção de responsabilidade penal das pessoas condenadas a quem, à época, foi aplicado um regime de interrupção da prescrição da responsabilidade penal posteriormente declarado inconstitucional, desde que se trate de domínios em que se aplica o direito da União. Por conseguinte, a exoneração abrange os crimes de fraude grave aos interesses financeiros da União, contrários ao artigo 325.o TFUE e à Decisão 2006/928.

    130.

    Consequentemente, numa situação como a descrita, o direito da União não exige a não aplicação da jurisprudência controvertida da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional), apesar de os seus efeitos implicarem a impunidade dos autores de alguns desses crimes.

    5. Padrão de proteção mais favorável do princípio da lex mitior no direito romeno

    131.

    Se o Tribunal de Justiça considerar, contrariamente ao que proponho, que a retroatividade da lei penal mais favorável por força do artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta não se aplica no presente processo, há que examinar se o direito romeno prevê um padrão de proteção mais elevado do princípio da lex mitior.

    132.

    Um órgão jurisdicional de um Estado‑Membro pode ser confrontado, como aqui acontece, com uma situação em que é chamado a fiscalizar a conformidade com os direitos fundamentais de uma disposição ou de uma medida nacional que aplica o direito da União na aceção do artigo 51.o, n.o 1, da Carta.

    133.

    Quando, nesse contexto, a ação dos Estados‑Membros não é inteiramente determinada pelo direito da União, o artigo 53.o da Carta confirma que as autoridades e os tribunais nacionais podem aplicar os padrões nacionais de proteção dos direitos fundamentais.

    134.

    No direito romeno, o nível nacional de proteção do princípio da retroatividade da lei penal mais favorável é estabelecido pelo artigo 15.o, n.o 2, da Constituição e o artigo 5.o, n.o 1 do Código Penal de 2009, cujo alcance foi precisado pela Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional).

    135.

    Como já recordei, a jurisprudência da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) e da Înalta Curte de Casație și Justiție (Supremo Tribunal) declara que as normas relativas à prescrição da responsabilidade penal e à interrupção dos prazos de prescrição são de natureza substantiva e, por conseguinte, é‑lhes aplicável o princípio da lex mitior ( 83 ).

    136.

    Os Acórdãos da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) n.o 297/2018 e n.o 358/2022 sublinharam que, entre 25 de junho de 2018 e 30 de maio de 2022, não existia nenhuma causa de interrupção dos prazos de prescrição da responsabilidade penal, em aplicação desse princípio.

    137.

    Para que este padrão nacional de proteção do princípio da retroatividade da lei penal mais favorável, estabelecido pelo direito romeno, possa ser aplicável, o Tribunal de Justiça considera que deve respeitar duas condições ( 84 ):

    não deve comprometer o nível de proteção previsto pela Carta, conforme interpretada pelo Tribunal de Justiça.

    também não deve obstar ao primado, à unidade e à efetividade do direito da União.

    138.

    No que respeita à primeira condição, o direito da União não previa um regime específico na matéria. Por conseguinte, a aplicação do padrão de proteção romeno não afeta o nível de proteção previsto no artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta.

    139.

    Todavia, é mais difícil determinar se o padrão de proteção do princípio da lex mitior do direito romeno obsta à unidade, ao primado e à efetividade do direito da União, uma vez que a jurisprudência M.A.S. e M.B., por um lado, e o Acórdão Euro Box Promotion, por outro, não são fáceis de conciliar.

    140.

    No Acórdão M.A.S. e M.B. o Tribunal de Justiça:

    Reconheceu que, naquele momento, a República Italiana era livre de prever que, na sua ordem jurídica, o regime se inseria, à semelhança das regras relativas à definição das infrações e à determinação das penas, no direito penal substantivo e, como tal, estava submetido, como estas últimas regras, ao princípio da legalidade dos crimes e das penas ( 85 ).

    Afirmou que a República Italiana podia aplicar um padrão nacional de proteção do princípio da legalidade dos crimes e das penas mais elevado do que o previsto no direito da União, desde que não comprometesse a unidade, o primado e a efetividade do direito da União ( 86 ).

    Declarou, em face das considerações do Tribunal Constitucional italiano relativas à incidência negativa da aplicação do Acórdão Taricco no princípio da legalidade em matéria penal consagrado na sua Constituição, que incumbia ao juiz nacional verificar se a não aplicação das normas do Código Penal (que impediam a aplicação de sanções penais efetivas e dissuasoras num número considerável de casos de fraude grave lesiva dos interesses financeiros da União) conduzia a uma situação de incerteza no ordenamento jurídico italiano quanto à determinação do regime de prescrição aplicável, em violação do princípio da legalidade penal ( 87 ).

    Afirmou que, se o juiz nacional considerar que a obrigação de não aplicar as disposições do Código Penal relativas à prescrição da responsabilidade penal colide com o princípio da legalidade dos crimes e das penas, não deverá cumprir a obrigação de não as aplicar, mesmo que o respeito da mesma permitisse corrigir uma situação nacional incompatível com o direito da União ( 88 ).

    141.

    O Tribunal de Justiça admitiu assim um limite à aplicação do princípio do primado do direito da União: os juízes nacionais podem aplicar normas internas contrárias ao direito da União a fim de proteger um direito fundamental (o da legalidade penal) garantido com um padrão mais elevado pelo direito nacional do que o previsto no direito da União ( 89 ).

    142.

    Por conseguinte, o Acórdão M.A.S. e M.B. não impõe ao juiz nacional que atribua prioridade absoluta à proteção dos interesses financeiros da União, ao ponto de lhes dar primazia sobre um direito fundamental como o princípio da legalidade dos crimes e das penas.

    143.

    No Acórdão Euro Box Promotion, o Tribunal de Justiça analisou a legislação e a jurisprudência constitucional romenas ( 90 ) que, à semelhança da italiana no processo M.A.S. e M.B, eram suscetíveis de gerar um risco sistémico de impunidade dos factos constitutivos de crimes graves de fraude lesiva dos interesses financeiros da União, em detrimento da obrigação prevista no artigo 325.o, n.o 1, TFUE. Na sequência dessa análise, declarou que:

    o órgão jurisdicional de reenvio devia assegurar o necessário respeito dos direitos fundamentais garantidos no artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta, ou seja, o direito de toda a pessoa a que sua causa seja julgada de forma equitativa, publicamente e num prazo razoável, por um tribunal independente, previamente estabelecido por lei.

    «[…] [U]ma irregularidade cometida na composição das formações de julgamento [de um órgão jurisdicional] implica uma violação do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta, nomeadamente quando essa irregularidade seja de uma natureza e de uma gravidade tais que cria um risco real de que outros ramos do poder, particularmente o executivo, possam exercer um poder discricionário indevido que ponha em perigo a integridade do resultado a que conduz o processo de composição das formações de julgamento e semeie, assim, uma dúvida legítima no espírito dos sujeitos de direito quanto à independência e à imparcialidade do ou dos juízes em causa» ( 91 ).

    A prática quanto à especialização e à composição das formações de julgamento romenas em matéria de corrupção não constituía uma violação do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta, pelo que se tratava de uma situação distinta da apreciada no âmbito do Acórdão M.A.S. e M.B. Por esse motivo, «[…] as exigências decorrentes do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta não obstam à não aplicação da jurisprudência estabelecida nos [a]córdãos [constitucionais]» ( 92 ).

    A legislação e a jurisprudência constitucional romenas relativas à exigência de as decisões de recursos em matéria de corrupção serem proferidas por formações de julgamento em que todos os membros fossem selecionados por sorteio podia constituir um padrão nacional de proteção dos direitos fundamentais ( 93 ).

    Esse padrão nacional de proteção seria suscetível de comprometer o primado, a unidade e efetividade do direito da União, nomeadamente do artigo 325.o, n.o 1, TFUE, conjugado com o artigo 2.o da Convenção PIF e da Decisão 2006/928, pois implicaria um risco sistémico de impunidade dos factos constitutivos de crimes graves de fraude lesiva dos interesses financeiros da União ou de corrupção em geral ( 94 ).

    144.

    Na minha opinião, o presente litígio assemelha‑se mais ao que deu origem ao Acórdão M.A.S. e M.B. do que ao do Acórdão Euro Box Promotion. Neste último, o Tribunal de Justiça não considerou ter havido violação do artigo 47.o, segundo parágrafo, primeiro período, da Carta, na prática sobre a composição das formações de julgamento do Supremo Tribunal especializadas em matéria de corrupção, declarada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional romeno. Também não existia claramente no direito romeno um padrão nacional de proteção do direito a um tribunal independente, previamente estabelecido por lei. Tal foi sugerido por uma das partes na audiência em resposta a uma questão do Tribunal de Justiça, tendo o Governo romeno e a Comissão negado a sua existência ( 95 ).

    145.

    Em todo o caso, a invocação do risco sistémico de impunidade para infrações graves contra os interesses financeiros da União não me parece constituir um motivo que justifique a restrição de um direito fundamental como o da aplicação retroativa da lei penal mais favorável, quando exista um padrão de proteção desse direito no sistema constitucional de um Estado‑Membro mais elevado do que o fixado pelo artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta.

    146.

    Em suma, se não for acolhida a interpretação que defendo do artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta, a jurisprudência da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) relativa à inexistência de causas de interrupção da prescrição da responsabilidade penal entre 2018 e 2022 teria estabelecido um padrão nacional de proteção do princípio da retroatividade da lei penal mais elevado do que o previsto no referido artigo da Carta.

    147.

    É verdade que a aplicação desse padrão nacional pode implicar um risco de impunidade para as pessoas que foram julgadas pela prática de fraudes graves aos interesses financeiros da União, como já analisei e como realçou o órgão jurisdicional de reenvio.

    148.

    Todavia, o precedente do Acórdão M.A.S. e M.B. gerava o mesmo risco de impunidade e não vejo nenhuma razão para o ignorar neste processo. O padrão nacional de proteção mais elevado do princípio da lex mitior está aqui claramente presente, como acontecia no processo M.A.S. e M.B., ao contrário do que acontecia no processo Euro Box Promotion.

    149.

    É certo que os interesses financeiros da União são dignos de proteção, mas esta não pode prevalecer sobre a salvaguarda de um direito fundamental como o representado pelo princípio da retroatividade da lei penal mais favorável.

    150.

    Os direitos fundamentais numa comunidade de direito como é a União não são menos importantes do que os seus interesses financeiros. Por outras palavras, os interesses financeiros da União não podem ser protegidos à custa da violação dos direitos fundamentais.

    151.

    Se a aplicação do artigo 325.o TFUE e das normas que o desenvolvem for desadequada e se, em um ou mais Estados, der origem a um risco sistémico de impunidade, a União dispõe de outros mecanismos jurídicos para reagir, como a ação por incumprimento. Não me parece compatível com o valor do Estado de direito do artigo 2.o TUE reduzir o nível de proteção do princípio da lex mitior a fim de melhor salvaguardar os interesses financeiros da União.

    152.

    Por conseguinte, neste caso, o primado do direito da União não produziria o seu efeito e o órgão jurisdicional de reenvio não teria de deixar de aplicar a jurisprudência da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) para assegurar o respeito do artigo 325.o, n.o 1, TFUE, e da Decisão 2006/928. Pelo contrário, deve respeitar essa jurisprudência para preservar o padrão mais elevado de proteção do princípio da lex mitior do direito romeno, que, pela sua própria natureza, beneficia os autores de infrações penais.

    153.

    Esta solução é também a mais compatível com o princípio da legalidade em matéria penal e com as suas exigências de previsibilidade e de precisão da lei penal aplicável ( 96 ). As decisões da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional), completados pela da Înalta Curte de Casație și Justiție (Supremo Tribunal), clarificaram o regime da interrupção da prescrição da responsabilidade penal previsto no artigo 155.o, n.o 1, do Código Penal de 2009, após um período de dúvidas entre os tribunais comuns. Não aplicar essa jurisprudência introduziria novas incertezas quanto à interrupção da prescrição da responsabilidade penal entre 2018 e 2022.

    C.   Terceira questão prejudicial

    154.

    O órgão jurisdicional de reenvio submete a sua terceira questão para o caso de o Tribunal de Justiça responder afirmativamente às duas primeiras questões (e apenas se não puder ser fornecida uma interpretação conforme com o direito da União).

    155.

    Como proponho que se responda negativamente às duas questões iniciais, não seria necessário analisar a terceira. Todavia, fá‑lo‑ei para o caso de o Tribunal de Justiça adotar posição distinta.

    156.

    O Tribunal de Justiça já se pronunciou sobre aspetos do sistema judicial romeno ( 97 ) em termos que permitem responder a esta última questão prejudicial. Nessa questão, o órgão jurisdicional de reenvio salienta a possibilidade de os juízes serem punidos disciplinarmente quando se afastam da jurisprudência do Tribunal Constitucional por considerarem que não está em conformidade com o direito da União.

    157.

    Como salientam o órgão jurisdicional de reenvio ( 98 ) e o Governo romeno, o artigo 99.o, alínea ș), da Lei n.o 303/2004, que considerava infração disciplinar o incumprimento dos Acórdãos decisões da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) ou da Înalta Curte de Casație și Justiție (Supremo Tribunal) proferidos em recursos de fixação de jurisprudência, foi revogado após o Acórdão RS.

    158.

    Todavia, no Acórdão da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) n.o 520/2022, de 9 de novembro de 2022, afirmou‑se que o incumprimento pelos juízes das decisões da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) ou da Înalta Curte de Casație și Justiție (Supremo Tribunal) pode resultar numa sanção disciplinar, se o juiz tiver agido de má‑fé ou com negligência grave. O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a compatibilidade deste novo regime disciplinar com o direito da União.

    159.

    Ora, os Acórdãos Eurobox Promotion e RS contêm os elementos suficientes para responder a essa questão. Por conseguinte, limitar‑me‑ei a transcrever algumas das suas considerações:

    «[…] [A] salvaguarda da independência dos órgãos jurisdicionais não pode nomeadamente ter como consequência excluir inteiramente que, em certos casos absolutamente excecionais, a responsabilidade disciplinar de um juiz possa ser acionada devido a decisões judiciais por si proferidas. Com efeito, a referida exigência de independência não se destina, evidentemente, a justificar eventuais condutas graves e totalmente indesculpáveis de juízes, como, por exemplo, a violação deliberada e de má‑fé, ou com negligência especialmente grave e grosseira, das regras de direito nacional e da União cujo respeito devem assegurar, ou a adoção de uma conduta arbitrária ou de denegação de justiça, quando, enquanto depositários da função de julgar, os juízes são chamados a dirimir litígios que lhes são submetidos pelos particulares» ( 99 ).

    «Todavia, para preservar a independência dos órgãos jurisdicionais e assim evitar que o regime disciplinar possa ser desviado das suas finalidades legítimas e utilizado para fins de controlo político das decisões judiciais ou de pressão sobre os juízes, afigura‑se essencial que o facto de uma decisão judicial comportar um eventual erro na interpretação e aplicação das regras de direito nacional e da União, ou na apreciação dos factos e das provas, não possa, por si só, implicar a responsabilidade disciplinar do juiz em causa» ( 100 ).

    «[O] artigo 2.o e o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação ou a uma prática nacional que permite desencadear a responsabilidade disciplinar de um juiz nacional por qualquer incumprimento das decisões do tribunal constitucional nacional» ( 101 ).

    «O artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, lido em conjugação com o artigos 2.o e o artigo 4.o, n.os 2 e 3, TUE, com o artigo 267.o TFUE e com o princípio do primado do direito da União, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação ou a uma prática nacional que permite desencadear a responsabilidade disciplinar de um juiz nacional por este ter aplicado o direito da União, conforme interpretado pelo Tribunal de Justiça, afastando‑se da jurisprudência do tribunal constitucional do Estado‑Membro em causa, incompatível com o princípio do primado do direito da União» ( 102 ).

    160.

    Por conseguinte, a resposta à terceira questão prejudicial impõe‑se no mesmo sentido.

    V. Conclusão

    161.

    Atendendo ao exposto, proponho que se responda ao pedido de decisão prejudicial da Curtea de Apel Brașov (Tribunal de Recurso de Braşov, Roménia) nos seguintes termos:

    «1)

    Uma regulamentação e uma jurisprudência nacionais sobre a interrupção dos prazos de prescrição da responsabilidade penal que têm como consequência deixar impunes um número considerável de factos constitutivos de fraude grave aos interesses financeiros da União viola, em princípio, o artigo 325.o, n.o 1, TFUE, e a Decisão 2006/928/CE da Comissão, de 13 de dezembro de 2006, que estabelece um mecanismo de cooperação e de verificação dos progressos realizados na Roménia relativamente a objetivos de referência específicos nos domínios da reforma judiciária e da luta contra a corrupção e a criminalidade organizada.

    O juiz nacional não é obrigado a deixar de aplicar essa regulamentação e essa jurisprudência nacionais, quando encontrem justificação na aplicação do princípio da retroatividade da lei penal mais favorável, consagrado no artigo 49.o, n.o 1, último período, da Carta de Direitos Fundamentais da União Europeia, ou, na sua falta, num padrão nacional de proteção mais elevado desse princípio, estabelecido pelo direito nacional.

    2)

    O artigo 2.o e o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, devem ser interpretados no sentido de que se opõem a uma regulamentação ou a uma prática nacional que permite acionar responsabilidade disciplinar de um juiz nacional por qualquer incumprimento das decisões do tribunal constitucional ou do tribunal nacional supremo. Todavia, não se opõem a que essa responsabilidade disciplinar seja acionada nos casos, excecionais, de condutas graves e totalmente indesculpáveis de juízes, como a violação deliberada e de má‑fé, ou com negligência especialmente grave e grosseira, das normas de direito nacional e da União cujo respeito devem assegurar.

    O artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, lido em conjugação com o artigos 2.o e o artigo 4.o, n.os 2 e 3, TUE, com o artigo 267.o TFUE e com o princípio do primado do direito da União, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação ou a uma prática nacional que permite acionar a responsabilidade disciplinar de um juiz nacional por este ter aplicado o direito da União, conforme interpretado pelo Tribunal de Justiça, afastando‑se da jurisprudência do tribunal constitucional incompatível com o princípio do primado do direito da União.»


    ( 1 ) Língua original: espanhol.

    ( i ) O nome do presente processo é um nome fictício. Não corresponde ao nome real de nenhuma das partes no processo.

    ( 2 ) Convenção estabelecida com base no artigo K.3 do Tratado da União Europeia, relativa à proteção dos interesses financeiros das comunidades, assinada em Bruxelas em 26 de julho de 1995 e anexada ao Ato do Conselho, de 26 de julho de 1995 (JO 1995, C 316, p. 49; a seguir «Convenção PIF»).

    ( 3 ) Decisão da Comissão, de 13 de dezembro de 2006, que estabelece um mecanismo de cooperação e de verificação dos progressos realizados na Roménia relativamente a objetivos de referência específicos nos domínios da reforma judiciária e da luta contra a corrupção e a criminalidade organizada (JO 2006, L 354, p. 56).

    ( 4 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de julho de 2017, relativa à luta contra a fraude lesiva dos interesses financeiros da União através do direito penal (JO 2017, L 198, p. 29; a seguir «Diretiva PIF»).

    ( 5 ) Codul Penal din 21 iulie 1968, republicat (Monitorul Oficial al României, parte I, n.o 65, de 16 de abril de 1997) (Código Penal de 21 de julho de 1968, republicado). Este Código Penal resulta do texto revisto pela Lege nr. 140/1996, pentru modificarea și completarea Codului penal (Monitorul Oficial al României, part I, n.o 289, de 14 de novembro de 1996) (Lei n.o 140/1996 que altera o Código Penal) e esteve em vigor até 1 de fevereiro de 2014 (a seguir «Código Penal de 1969»).

    ( 6 ) Legea nr. 286/2009 privind Codul penal, de 17 de julho de 2009 (Monitorul Oficial al României, parte I, n.o 510, de 24 de julho de 2009) (Lei n.o 286/2009 que aprova o Código Penal; a seguir «Código Penal de 2009»). Encontra‑se em vigor desde 1 de fevereiro de 2014.

    ( 7 ) Ordonanța de urgență a Guvernului nr. 71 din 30 mai 2022 pentru modificarea articolului 155 alineatul (1) din Legea nr. 286/2009 privind Codul penal (Monitorul Oficial al României, n.o 531 de 30 de maio de 2022) (Decreto‑Lei n.o 71 de 30 de maio de 2022, que altera o artigo 155.o, n.o 1, da Lei n.o 286/2009, que aprova o Código Penal, a seguir «Decreto‑Lei n.o 71/2022»).

    ( 8 ) Legea nr. 135/2010 privind Codul de procedură penală (Monitorul Oficial al României, parte I, n.o 486 de 15 de julho de 2010) (Lei n.o 135/2010, relativa ao Código de Processo Penal).

    ( 9 ) Pelo contrário, a Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) entendeu que a solução legislativa anterior (artigo 123.o, n.o 1, do Código Penal de 1969) preenchia os requisitos de previsibilidade impostos pela Constituição, uma vez que previa que apenas a realização de um ato que, nos termos da lei, devesse ser notificado ao arguido era suscetível de interromper o prazo de prescrição da responsabilidade penal.

    ( 10 ) Segundo o despacho de reenvio, a Înaltei Curte de Casație și Justiție (Tribunal Superior de Cassação e Justiça, Roménia) declarou inadmissíveis tanto os pedidos de interpretação do artigo 155.o, n.o 1, do Código Penal de 2009, na sequência da Decisão constitucional n.o 297/2018, como um meio extraordinário de recurso de fixação de jurisprudência interposto para interpretar essa disposição. É o que se encontra refletido nos seus Acórdãos n.o 5, de 21 de março de 2019, e n.o 25, de 11 de novembro de 2019, respetivamente.

    ( 11 ) Esse ato normativo foi adotado poucos dias após a publicação da decisão constitucional n.o 358/2022 (v. n.o 19 das presentes conclusões).

    ( 12 ) A leitura deste acórdão parece indicar mais que se trata de uma consulta com caráter preliminar sobre questões de direito.

    ( 13 ) Legea nr. 303/2004 privind statutul judecătorilor și procurorilor (republicada no Monitorul Oficial al României, parte I, n.o 826, de 13 de setembro de 2005) (Lei n.o 303/2004, de 28 de junho de 2004, relativa ao Estatuto dos Juízes e dos Procuradores).

    ( 14 ) Legea nr. 303/2022 din 15 noiembrie 2022 privind statutul judecătorilor și procurorilor (publicada no Monitorul Oficial al României, n.o 1102, de 16 de novembro de 2022) (Lei n.o 303/2022, de 15 de novembro de 2022, relativa ao Estatuto dos Juízes e dos Procuradores).

    ( 15 ) O Acórdão de 30 de junho de 2020 confirmou o proferido com o n.o 38/S, em 13 de março de 2018, pelo Tribunalul Brașov (Tribunal Regional de Brașov, Roménia).

    ( 16 ) Em seu entender, a jurisprudência da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) conduziu à ineficácia de numerosas condenações de privação de liberdade, perante a falta de causas de interrupção da prescrição da responsabilidade penal. Daí resultaria uma situação discriminatória em relação aos recorrentes neste litígio, por um lado, e aos condenados que não sejam beneficiados pelo princípio da lex mitior, por outro.

    ( 17 ) O Tribunal de Justiça pode recusar pronunciar‑se sobre um pedido apresentado por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético (o sublinhado é meu) ou ainda quando o Tribunal não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas [Acórdão de 22 de fevereiro de 2022, Stichting Rookpreventie Jeugd e o. (C‑160/20, EU:C:2022:101, n.o 82)].

    ( 18 ) Acórdão de 26 de fevereiro de 2013, C‑617/10, EU:C:2013:105; a seguir «Acórdão Åkerberg Fransson».

    ( 19 ) Acórdão de 8 de setembro de 2015, C‑105/14, EU:C:2015:555; a seguir «Acórdão Taricco».

    ( 20 ) Acórdão de 5 de dezembro de 2017, C‑42/17, EU:C:2017:936; a seguir «Acórdão M.A.S. e M.B.».

    ( 21 ) Acórdão de 21 de dezembro de 2021, C‑357/19, C‑379/19, C‑547/19, C‑811/19 e C‑840/19, EU:C:2021:1034; a seguir «Acórdão Euro Box Promotion».

    ( 22 ) Diretiva do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1).

    ( 23 ) Acórdãos Åkerberg Fransson, n.o 25; e Taricco, n.o 36. Concretamente, «decorre […] dos artigos 2.o e 273.o da Diretiva [2006/112], conjugados com o artigo 4.o, n.o 3, TUE, que os Estados‑Membros têm a obrigação de tomar todas as medidas legislativas e administrativas necessárias para garantir a cobrança da totalidade do IVA devido nos seus territórios respetivos e para lutar contra a fraude» (Acórdão de 2 de maio de 2018, Scialdone, C‑574/15, EU:C:2018:295, n.o 26).

    ( 24 ) Sobre a sua natureza, conteúdo e efeitos, v. Acórdãos de 18 de maio de 2021, Asociația Forumul Judecătorilor din România e o. (C‑83/19, C‑127/19, C‑195/19, C‑291/19, C‑355/19 e C‑397/19, EU:C:2021:393; a seguir «Acórdão Asociaţia Forumul Judecătorilor din România»), n.os 152 a 178; e Euro Box Promotion, n.os 155 a 175.

    ( 25 ) Documento COM(2022) 664 final, de 22 de novembro de 2022, Relatório da Comissão ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre os progressos realizados pela Roménia no âmbito do Mecanismo de Cooperação e de Verificação (a seguir «Relatório MCV 2022»), pp. 13 e 27.

    ( 26 ) Acórdãos de 5 de junho de 2018, Kolev e o. (C‑612/15, EU:C:2018:392; a seguir «Acórdão Kolev», n.o 50); de 17 de janeiro de 2019, Dzivev e o. (C‑310/16, EU:C:2019:30; a seguir «Acórdão Dzivev», n.o 25); e Euro Box Promotion, n.o 181.

    ( 27 ) Acórdãos M.A.S. e M.B., n.os 31 e 32; Kolev, n.os 51 e 52; e Euro Box Promotion, n.o 182.

    ( 28 ) «[T]endo em conta a importância que deve ser reconhecida à proteção dos interesses financeiros da União, que constitui um dos seus objetivos […], o conceito de “atividade ilegal” [do artigo 325.o, n.o 1, TFUE] não pode ser restritivamente interpretado» (Acórdão de 2 de maio de 2018, Scialdone, C‑574/15, EU:C:2018:295, n.o 45 e jurisprudência aí referida).

    ( 29 ) Acórdão Euro Box Promotion, n.o 186; e Conclusões do advogado‑geral M. Bobek nesse processo (EU:C:2021:170), n.o 98.

    ( 30 ) «[Q]ualquer ato ou omissão intencionais relativos […] à utilização ou apresentação de declarações ou de documentos falsos, inexatos ou incompletos, que tenha por efeito o recebimento ou a retenção indevidos de fundos provenientes do Orçamento Geral [da União] ou dos orçamentos geridos [pela União] ou por sua conta».

    ( 31 ) Acórdão Taricco, n.o 41.

    ( 32 ) Acórdão Taricco, n.o 39.

    ( 33 ) «Ao legislador nacional incumbe, primeiro que tudo, prever regras de prescrição que permitam satisfazer as obrigações decorrentes do artigo 325.o TFUE, à luz das considerações expostas pelo Tribunal de Justiça no n.o 58 do Acórdão Taricco. Com efeito, é a esse legislador que cabe garantir que o regime nacional de prescrição em matéria penal não conduza à impunidade de um número considerável de casos de fraude grave em matéria de IVA […]» (Acórdão M.A.S, e M.B., n.o 41).

    ( 34 ) Como afirmou L. N. nas suas observações escritas, os prazos de prescrição previstos no artigo 154.o do Código Penal de 2009 variam entre oito e dez anos para os crimes de fraude grave ao IVA.

    ( 35 ) Entre 25 de junho de 2018 [data de publicação oficial do Acórdão n.o 297/2018 da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional)] e 30 de maio de 2022, data de publicação oficial de entrada em vigor do Decreto‑Lei n.o 71/2022.

    ( 36 ) Em casos de aplicação da lei penal mais favorável (devido ao desaparecimento das causas de interrupção dos prazos de prescrição da responsabilidade penal) a condenados por crimes de condução sem carta, o Tribunal de Justiça não admitiu um pedido de decisão prejudicial no Despacho de 12 de janeiro de 2023, SNI (C‑506/22, não publicado, EU:C:2023:46).

    ( 37 ) Despacho de reenvio, n.o 121.

    ( 38 ) Numa linha semelhante, a Comissão afirma que, no período de 2018‑2022, até à publicação do Decreto‑Lei n.o 71/2022, os tribunais comuns aplicaram o Acórdão n.o 297/2018 da Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional) no sentido de que os atos notificados ao arguido interrompiam os prazos de prescrição da responsabilidade penal. Como esta solução coincide com a do Código Penal de 1969, não teria existido, durante o período controvertido, uma lei penal mais favorável, pelo que não seria necessário não aplicar a jurisprudência constitucional.

    ( 39 ) Acórdãos de 4 de março de 2020, Telecom Italia (C‑34/19, EU:C:2020:148, n.os 59 e 60); e de 4 de maio de 2023, Agenția Națională de Integritate (C‑40/21, EU:C:2023:367, n.o 71).

    ( 40 ) Provavelmente, uma interpretação contra legem do direito romeno violaria o artigo 147.o, n.o 4, da Constituição desse país, embora apenas os órgãos jurisdicionais nacionais se possam pronunciar sobre esse aspeto.

    ( 41 ) Acórdão Taricco, n.o 51.

    ( 42 ) Acórdãos Kolev, n.o 65; e Dzivev, n.o 31.

    ( 43 ) Acórdãos Asociaţia «Forumul Judecătorilor din România», n.o 149; e Euro Box Promotion, n.o 156.

    ( 44 ) Acórdãos Asociaţia Forumul Judecătorilor din România, n.o 178; e Euro Box Promotion, n.o 175.

    ( 45 ) Acórdão Asociaţia Forumul Judecătorilor din România, n.o 172; e Euro Box Promotion, n.o 169.

    ( 46 ) «Segundo uma estimativa publicada pela DNA [Direção Nacional Anticorrupção], um total de 557 processos penais objeto de ações penais ou pendentes nos tribunais poderão, consequentemente, ser extintos. Embora o prejuízo deva ser avaliado caso a caso, a DNA estima que os danos nestes casos ascendam a 1200 milhões de euros e o montante total de suborno e tráfico de influência a cerca de 150 milhões de euros […]. Além dos processos de corrupção, de acordo com uma estimativa fornecida pelo gabinete do Ministério Público especializado em terrorismo e crime organizado, 605 processos em curso no total, com um prejuízo financeiro total estimado superior a mil milhões de euros, seriam afetados […] As estimativas do gabinete do procurador‑geral sobre outros crimes não se encontravam disponíveis» [Documento COM(2022) 664 final, p. 27].

    ( 47 ) Acórdão Taricco, n.os 50 a 52.

    ( 48 ) Acórdão M.A.S. e M.B., n.o 39.

    ( 49 ) Acórdãos Kolev, n.os 68 e 71; Dzivev, n.o 33; e Euro Box Promotion, n.o 204.

    ( 50 ) Acórdão M.A.S. e M.B., n.o 52; «Este princípio [da legalidade dos crimes e das penas], consagrado no artigo 49 da Carta, é imposto aos Estados‑Membros quando aplicam o direito da União, em conformidade com o respetivo artigo 51.o, n.o 1, o que é o caso quando estes preveem, no âmbito das obrigações que lhes são impostas pelo artigo 325.o TFUE, a aplicação de sanções penais às infrações em matéria de IVA. Assim, a obrigação de garantir a cobrança eficaz dos recursos da União não pode ir contra o referido princípio».

    ( 51 ) Anteriormente, o Tribunal de Justiça tinha afirmado que este princípio decorria das tradições constitucionais comuns aos Estados‑Membros e, por conseguinte, devia ser considerado parte dos princípios gerais do direito da União que o juiz nacional deve respeitar quando aplica o direito nacional: Acórdãos de 7 de agosto de 2018, Clergeau e o. (C‑115/17, EU:C:2018:651; a seguir «Acórdão Clergeau», n.o 26); de 6 de outubro de 2016, Paoletti e o. (C‑218/15, EU:C:2016:748; a seguir «Acórdão Paoletti», n.o 25); e de 3 de maio de 2005, Berlusconi e o. (C‑387/02, C‑391/02 e C‑403/02, EU:C:2005:270, n.os 68 e 69).

    ( 52 ) V., especialmente, artigo 15.o, n.o 1, primeiro período, do Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos, aberto à assinatura em 19 de dezembro de 1966 (UN Treaty Series, vol. 999, p. 171).

    ( 53 ) Acórdãos Clergeau, n.o 33; e Paoletti, n.o 27.

    ( 54 ) Conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Berlusconi e o. (C‑387/02, C‑391/02 e C‑403/02, EU:C:2004:624, n.os 159 a 161); e no processo Clergeau e o. (C‑115/17, EU:C:2018:240, n.os 39 e 40); bem como do advogado‑geral M. Bobek no processo Scialdone (C‑574/15, EU:C:2017:553, n.os 155 a 160). V. também, Acórdão Paoletti, n.o 27.

    ( 55 ) Acórdão do Tribunal Pleno do TEDH de 17 de setembro de 2009, Scoppola c. Itália (n.o 2) (CE:ECHR:2009:0917JUD001024903; a seguir «Acórdão Scoppola c. Itália», § 108).

    ( 56 ) TEDH, Acórdão Scoppola c. Itália, § 108.

    ( 57 ) TEDH, Acórdão Scoppola c. Itália, § 108.

    ( 58 ) TEDH, Acórdãos Scoppola c. Itália § 109; e de 18 de março de 2014, Öcalan c. Turquia (n.o 2) (CE:ECHR:2014:0318JUD002406903, § 175). V., também, Acórdãos do TEDH de 12 de janeiro de 2016, Gouarré Patt c. Andorra (CE:ECHR:2016:0112JUD003342710, § 28); de 12 de julho de 2016, Ruban c. Ucrânia (CE:ECHR:2016:0712JUD000892711, § 37); e de 24 de janeiro de 2017, Koprivnikar c. Eslovénia (CE:ECHR:2017:0124JUD006750313, § 49).

    ( 59 ) Acórdãos Clergeau, n.o 33; e Paoletti, n.o 27.

    ( 60 ) Posteriormente, o artigo 12.o da Diretiva PIF procedeu a uma harmonização parcial das normas de prescrição aplicáveis a este tipo de crimes, mas também não precisou se as normas de prescrição da responsabilidade penal têm natureza substantiva ou processual.

    ( 61 ) À semelhança da definição das infrações e da determinação das penas, cujo regime está igualmente sujeito ao princípio da legalidade em matéria penal. Acórdão M.A.S. e M.B., n.o 45.

    ( 62 ) A Bélgica, a Alemanha e a França adotaram uma conceção processual das normas da prescrição. Em contrapartida, na Grécia, em Espanha, em Itália, na Letónia, na Suécia e na Roménia, estão abrangidas pelo direito penal substantivo. Na Polónia e em Portugal, constituem simultaneamente normas substantivas e normas processuais.

    ( 63 ) Acórdão Taricco, n.os 55 a 57.

    ( 64 ) Acórdão de 22 de junho de 2022, Volvo e DAF Trucks (C‑267/20, EU:C:2022:494, n.o 46): «[…] ao contrário dos prazos processuais, o prazo de prescrição, ao levar à extinção da ação judicial, está relacionado com o direito substantivo, uma vez que afeta o exercício de um direito subjetivo que o interessado não pode voltar efetivamente a invocar nos tribunais». Por esse motivo confere um caráter substantivo e não processual ao artigo 10.o («Prazos de prescrição») da Diretiva 2014/104/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de novembro de 2014, relativa a certas regras que regem as ações de indemnização no âmbito do direito nacional por infração às disposições do direito da concorrência dos Estados‑Membros e da União Europeia (JO 2014, L 349, p. 1).

    ( 65 ) TEDH, Acórdãos de 22 de junho de 2000, Coëme e o. c. Bélgica (CE:ECHR:2000:0622JUD003249296, § 149); de 12 de fevereiro de 2013, Previti c. Itália (CE:ECHR:2013:0212DEC000184508, § 80); e de 22 de setembro de 2015 Borcea c. Roménia (CE:ECHR:2015:0922DEC005595914, § 64).

    ( 66 ) Parecer consultivo P16‑2021‑001, de 26 de abril de 2022, sobre a aplicação da prescrição às investigações, condenações e sanções por infrações constitutivas de atos de tortura, §§ 72 a 77; e TEDH, Acórdão de 18 de junho de 2020, Antia e Khupenia c. Geórgia (CE:ECHR:2020:0618JUD000752310, §§ 38 a 43).

    ( 67 ) Acórdão M.A.S. e M.B., n.os 54 a 58.

    ( 68 ) Acórdãos do TEDH de 15 de novembro de 1996, Cantoni c. França, (CE:ECHR:1996:1115JUD001786291, § 29); de 7 de fevereiro de 2002, E.K. c. Turquia, (CE:ECHR:2002:0207JUD002849695, § 51); de 29 de março de 2006, Achour c. França, (CE:ECHR:2006:0329JUD006733501, § 41); e de 20 de setembro de 2011, OAO Neftyanaya Kompaniya Yukos c. Rússia, (CE:ECHR:2011:0920JUD001490204, §§ 567 a 570).

    ( 69 ) Acórdão de 28 de março de 2017, Rosneft (C‑72/15, EU:C:2017:236, n.o 162).

    ( 70 ) O Tribunal de Justiça não pode, por via jurisprudencial, proceder a uma harmonização que o legislador da União não pôde alcançar, mesmo que isso fosse desejável para alcançar uma maior eficácia na repressão dos crimes graves contra os interesses financeiros da União.

    ( 71 ) Kelsen, H., «La garantie juridictionnelle de la constitution (la justice constitutionnelle)», Revue du droit public et de la science politique en France et à l’étranger, 1928, pp. 197 a 257.

    ( 72 ) Numa linha semelhante, v. Acórdão da Cour de cassation, chambre criminelle (Tribunal de Cassação, Secção Penal, França) de 8 de junho de 2021, n.o 20‑87.078 (FR:CCASS:2021:CR00864): «les décisions du Conseil constitutionnel s’imposant aux pouvoirs publics et à toutes les autorités administratives et juridictionnelles en vertu de l’article 62 de la Constitution, les déclarations de non‑conformité ou les réserves d’interprétation qu’elles contiennent et qui ont pour effet qu’une infraction cesse, dans les délais, conditions et limites qu’elles fixent, d’être incriminée doivent être regardées comme des lois pour l’application de l’article 112‑4, alinéa 2, du code pénal» (o sublinhado é meu). Esse artigo do Código Penal francês prevê que a pena deixa de ser executada quando tiver sido proferida devido a um facto que, por força de uma lei posterior à sentença, já não constitui uma infração penal.

    ( 73 ) O Tribunal de Justiça afirmou que o artigo 2.o e o artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE, bem como a Decisão 2006/928, não se opõem a uma regulamentação ou a uma prática nacional segundo a qual as decisões do tribunal constitucional vinculam os órgãos jurisdicionais comuns. Essa afirmação pressupõe que o direito nacional garanta a independência do referido tribunal constitucional, nomeadamente em relação aos poderes legislativo e executivo. Não resulta dos pedidos de decisão prejudicial apresentados neste e noutros processos nenhum elemento do qual se deduza que a Curtea Constituțională (Tribunal Constitucional), à qual cabe, nomeadamente, fiscalizar a constitucionalidade das leis e decretos e resolver os conflitos jurídicos de natureza constitucional entre as autoridades públicas, em conformidade com o artigo 146.o, alíneas d) e e), da Constituição romena, não satisfaz as exigências de independência impostas pelo direito da União [v., neste sentido, Acórdãos Euro Box Promotion, n.os 230 e 232; e de 22 de fevereiro de 2022, RS (Efeitos dos acórdãos de um tribunal constitucional) (C‑430/21, EU:C:2022:99; a seguir «Acórdão RS», n.o 44)].

    ( 74 ) Acórdão RS, n.os 45 e 46.

    ( 75 ) TEDH, Acórdão de 12 de julho de 2016, Ruban c. Ucrânia (CE:ECHR:2016:0712JUD000892711, §§ 41 a 46).

    ( 76 ) TEDH, Acórdão Scoppola c. Itália, § 109: «quando existam diferenças entre o direito penal em vigor no momento em que a infração foi cometida e as normas penais posteriores adotadas antes de ser proferida uma decisão definitiva, o tribunal deve aplicar a legislação cujas disposições sejam mais favoráveis ao arguido».

    ( 77 ) TEDH, Acórdãos 12 de janeiro de 2016, Gouarré Patte c. Andorra (CE:ECHR:2016:0112JUD003342710, §§ 33 a 36); de 12 de julho de 2016, Ruban c. Ucrânia (CE:ECHR:2016:0712JUD000892711, § 39); e de 24 de janeiro de 2017, Koprivnikar c. Eslovénia (CE:ECHR:2017:0124JUD006750313, § 49).

    ( 78 ) Acórdão de 6 de outubro de 2015, Delvigne (C‑650/13, EU:C:2015:648, n.o 56).

    ( 79 ) Nos termos do artigo 23.o, n.o 2, do Código Penal espanhol, as leis penais que favorecem o arguido têm efeito retroativo, mesmo que, à data da entrada em vigor, tenha sido condenado por sentença transitada em julgado e esteja a cumprir pena. Existem disposições semelhantes nos sistemas jurídicos da Lituânia, de Portugal ou da Polónia.

    ( 80 ) É o que preveem, por exemplo, o artigo 112‑4, segundo período do Código Penal francês e o artigo 2.o, n.o 2, do Código Penal italiano.

    ( 81 ) Na Alemanha, o Código de Processo Penal de 7 de abril de 1987 (BGBl. I, pp. 1074 e segs., especialmente, p. 1319), alterado pela Lei de 25 de março de 2022 (BGBl. I, p. 571), permite à pessoa condenada pedir a reabertura de um processo penal já encerrado por uma decisão transitada em julgado quando essa decisão se fundamente numa norma declarada pelo Bundesverfassungsgericht (Tribunal Constitucional Federal, Alemanha) inconstitucional e incompatível com a Lei Fundamental, ou nula ou incompatível com uma interpretação dessa lei fundamental feita por esse órgão jurisdicional. V., Schmidt‑Bleibtreu, Klein, Bethge, Bundesverfassungsgerichtsgesetz, 62.a edição, 2022, C.H. Beck, Munique, anotação 25, n.o 79.

    ( 82 ) A aplicação da lex mitior é suscetível de modulações, nomeadamente quando se trate de leis puramente temporárias, ou das que instauram apenas sanções pecuniárias, ou das leis aplicáveis a situações excecionais que posteriormente se extinguem.

    ( 83 ) V., especialmente, Acórdão n.o 67/2022 do Înalta Curte de Casație și Justiție (Supremo Tribunal).

    ( 84 ) Acórdãos Åkerberg Fransson, n.o 29; de 26 de fevereiro de 2013, Melloni (C‑399/11, EU:C:2013:107, n.o 60); M.A.S. e M.B., n.o 47; de 29 de julho de 2019, Pelham e o. (C‑476/17, EU:C:2019:624, n.o 80); e Euro Box Promotion, n.o 211.

    ( 85 ) Acórdão M.A.S. e M.B., n.os 45 e 58.

    ( 86 ) Acórdão M.A.S. e M.B., n.os 47 e 48.

    ( 87 ) Acórdão M.A.S. e M.B., n.os 49, 50 e 59.

    ( 88 ) Acórdão M.A.S. e M.B., n.os 59 e 61.

    ( 89 ) Acórdão M.A.S. e M.B., n.os 41, 42 e 60.

    ( 90 ) Segundo as quais as decisões em matéria de corrupção e de fraude em matéria de IVA que não tivessem sido proferidas, em primeira instância, por formações de julgamento especializadas nesta matéria ou, em sede de recurso, por formações de julgamento cujos membros tivessem sido selecionados por sorteio, estavam feridas de nulidade absoluta, pelo que os processos de corrupção e de fraude em matéria de IVA deveriam, eventualmente na sequência de um recurso extraordinário interposto de decisões transitadas em julgado, ser reapreciados em primeira ou em segunda instância.

    ( 91 ) Acórdão Euro Box Promotion, n.o 206. No n.o 207 acrescentou: «embora o Tribunal Constitucional tenha declarado, nos acórdãos em causa nos processos principais, que a prática anterior do [Supremo Tribunal], baseada, nomeadamente no Regulamento Relativo à Organização e ao Funcionamento Administrativo, quanto à especialização e à composição das formações de julgamento em matéria de corrupção, não estava em conformidade com as disposições nacionais aplicáveis, não se afigura que essa prática constitua uma violação manifesta de uma regra fundamental do sistema judicial da Roménia suscetível de pôr em causa a natureza de tribunal “previamente estabelecido por lei” das formações de julgamento em matéria de corrupção do [Supremo Tribunal], constituídas em conformidade com a referida prática anterior a estes acórdãos do Tribunal Constitucional».

    ( 92 ) Acórdão Euro Box Promotion, n.o 209.

    ( 93 ) Acórdão Euro Box Promotion, n.o 210.

    ( 94 ) Acórdão Euro Box Promotion, n.o 212.

    ( 95 ) Acórdão Euro Box Promotion, n.o 210.

    ( 96 ) Acórdão M.A.S. e M.B., n.os 55 e 56.

    ( 97 ) Acórdãos Asociaţia Forumul Judecătorilor din România; Euro Box Promotion; e RS.

    ( 98 ) Despacho de reenvio, n.os 145 e 146.

    ( 99 ) Acórdão RS, n.o 83, com referência aos Acórdãos de 15 de julho de 2021, Comissão/Polónia (Regime disciplinar aplicável aos juízes) (C‑791/19, EU:C:2021:596, n.o 137); e Euro Box Promotion, n.o 238.

    ( 100 ) Acórdão RS, n.o 84, com referência aos Acórdãos de 15 de julho de 2021, Comissão/Polónia (Regime disciplinar aplicável aos juízes) (C‑791/19, EU:C:2021:596, n.o 138); e Euro Box Promotion, n.o 239.

    ( 101 ) Acórdão RS, n.o 87, com referência do Acórdão Euro Box Promotion, n.o 242.

    ( 102 ) Acórdão RS, n.o 93 e dispositivo, ponto 2.

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