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Document 62022CJ0551

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 18 de junho de 2024.
Comissão Europeia contra Conselho Único de Resolução.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Política económica e monetária — União bancária — Regulamento (UE) n.o 806/2014 — Mecanismo Único de Resolução — Procedimento de resolução aplicável no caso de uma entidade se encontrar em situação ou em risco de insolvência — Artigo 18.o, n.o 7 — Adoção pelo Conselho Único de Resolução de um programa de resolução — Aprovação deste programa pela Comissão Europeia — Artigo 86.o, n.o 2 — Ato suscetível de ser objeto de um recurso — Recurso de anulação — Admissibilidade.
Processo C-551/22 P.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2024:520

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

18 de junho de 2024 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Política económica e monetária — União bancária — Regulamento (UE) n.o 806/2014 — Mecanismo Único de Resolução — Procedimento de resolução aplicável no caso de uma entidade se encontrar em situação ou em risco de insolvência — Artigo 18.o, n.o 7 — Adoção pelo Conselho Único de Resolução de um programa de resolução — Aprovação deste programa pela Comissão Europeia — Artigo 86.o, n.o 2 — Ato suscetível de ser objeto de um recurso — Recurso de anulação — Admissibilidade»

No processo C‑551/22 P,

que tem por objeto um recurso de um acórdão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 17 de agosto de 2022,

Comissão Europeia, representada por L. Flynn, P. Němečková, A. Nijenhuis, A. Steiblytė e D. Triantafyllou, na qualidade de agentes,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

Fundación Tatiana Pérez de Guzmán el Bueno, com sede em Madrid (Espanha),

Stiftung für Forschung und Lehre (SFL), com sede em Zurique (Suíça), representada por R. Pelayo Jiménez e R. Pelayo Torrent, abogados,

recorrentes em primeira instância,

Conselho Único de Resolução (CUR), representado por H. Ehlers, S. Fernández Rupérez, A. R. Lapresta Bienz e J. M. Rius Riu, na qualidade de agentes, assistidos por F. B. Fernández de Trocóniz Robles, abogado, e por B. Meyring e S. Schelo, Rechtsanwälte,

recorrido em primeira instância,

Reino de Espanha,

Parlamento Europeu, representado por J. Etienne, P. López‑Carceller, M. Menegatti, L. Stefani e L. Visaggio, na qualidade de agentes,

Conselho da União Europeia, representado por J. Bauerschmidt, J. Haunold, H. Marcos Fraile e A. Westerhof Löfflerová, na qualidade de agentes,

Banco Santander SA, com sede em Santander (Espanha), representada por J. Remón Peñalver, J. M. Rodríguez Cárcamo, A. M. Rodríguez Conde e D. Sarmiento Ramírez‑Escudero, abogados,

intervenientes em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, L. Bay Larsen, vice‑presidente, K. Jürimäe, C. Lycourgos, E. Regan, T. von Danwitz (relator), F. Biltgen e N. Piçarra, presidentes de secção, S. Rodin, P. G. Xuereb, L. S. Rossi, N. Jääskinen, N. Wahl, I. Ziemele e D. Gratsias, juízes,

advogado‑geral: T. Ćapeta,

secretário: L. Carrasco Marco, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 13 de junho de 2023,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 9 de novembro de 2023,

profere o presente

Acórdão

1

Com o presente recurso, a Comissão Europeia pede a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 1 de junho de 2022, Fundación Tatiana Pérez de Guzmán el Bueno e SFL/CUR (T‑481/17, a seguir acórdão recorrido, EU:T:2022:311), que negou provimento ao pedido de anulação apresentado pela Fundación Tatiana Pérez de Guzmán el Bueno (a seguir «Fundación») e pela Stiftung für Forschung und Lehre (SFL) contra a Decisão SRB/EES/2017/08 da sessão executiva do Conselho Único de Resolução (CUR), de 7 de junho de 2017, com respeito à adoção de um programa de resolução em relação ao Banco Popular Español S.A. (a seguir «programa de resolução controvertido»).

Quadro jurídico

Regulamento (UE) n.o 1024/2013

2

O artigo 6.o, n.os 4 e 5, do Regulamento (UE) n.o 1024/2013 do Conselho, de 15 de outubro de 2013, que confere ao [Banco Central Europeu] atribuições específicas no que diz respeito às políticas relativas à supervisão prudencial das instituições de crédito (JO 2013, L 287, p. 63), dispõe:

«4.   No se refere às atribuições previstas no artigo 4.o, com exceção do n.o 1, alíneas a) e c), o [Banco Central Europeu (BCE)] dispõe dos poderes previstos no n.o 5 do presente artigo, e as autoridades nacionais competentes dispõem dos poderes previstos no n.o 6 do presente artigo […] em matéria de supervisão das seguintes instituições de crédito, companhias financeiras ou companhias financeiras mistas, ou sucursais — que estejam estabelecidas nos Estados‑Membros participantes — de instituições de crédito estabelecidas em Estados‑Membros não participantes:

Aquelas que sejam menos significativas em base consolidada, ao nível mais elevado de consolidação nos Estados‑Membros participantes, ou individualmente no caso específico das sucursais — que estejam estabelecidas em Estados‑Membros participantes — de instituições de crédito estabelecidas em Estados‑Membros não participantes. O caráter significativo é avaliado com base nos seguintes critérios:

i)

dimensão;

ii)

importância para a economia da União [Europeia] ou de um Estado‑Membro participante;

iii)

importância das atividades transfronteiriç[a]s.

No que respeita ao primeiro parágrafo acima, uma instituição de crédito, uma companhia financeira ou uma companhia financeira mista não é considerada menos significativa, a não ser que tal se justifique por circunstâncias específicas a mencionar na metodologia, se se verificar uma das seguintes condições:

i)

o valor total dos seus ativos exceder 30 mil milhões de euros; ou

ii)

o rácio entre a totalidade dos seus ativos e o [produto interno bruto (PIB)] do Estado‑Membro participante de estabelecimento exceder 20 %, salvo se o valor total dos seus ativos seja inferior a 5 mil milhões de euros;

iii)

após notificação, pela autoridade nacional competente, de que esta considera que a instituição em causa assume caráter significativo para a economia nacional, o BCE tomar uma decisão que confirma esse caráter significativo, após ter realizado uma avaliação completa da instituição de crédito, incluindo uma avaliação do seu balanço.

O BCE pode também, por iniciativa própria, considerar que uma instituição tem caráter significativo se tiver filiais bancárias estabelecidas em mais de um Estado‑Membro participante e os seus ativos ou passivos transfronteiriços representarem uma parte considerável da totalidade dos seus ativos ou passivos, sob reserva das condições estabelecidas na metodologia.

[…]

5)   No que respeita às instituições de crédito a que se refere o n.o 4, e no âmbito do n.o 7:

[…]

b)

Quando necessário para garantir a aplicação coerente de elevados padrões de supervisão, o BCE pode, a qualquer momento, por iniciativa própria e após consulta às autoridades nacionais competentes ou a pedido de uma autoridade nacional competente, decidir exercer diretamente todos os poderes relevantes em relação a uma ou mais das instituições de crédito a que se refere o n.o 4 […]

[…]»

Regulamento MUR

3

Os considerandos 24, 26, 62, 90 e 120 do Regulamento (UE) n.o 806/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de julho de 2014, que estabelece regras e um procedimento uniformes para a resolução de instituições de crédito e de certas empresas de investimento no quadro de um Mecanismo Único de Resolução e de um Fundo Único de Resolução bancária e que altera o Regulamento (UE) n.o 1093/2010 (JO 2014, L 225, p. 1; a seguir «Regulamento MUR»), têm a seguinte redação:

«(24)

Dado que só as instituições da União podem estabelecer a política de resolução da União e que subsiste uma margem de poder discricionário na adoção de cada programa específico de resolução, é necessário prever o envolvimento adequado do Conselho [da União Europeia] e da Comissão como instituições que podem exercer competências de execução nos termos do artigo 291.o do T[ratado] FUE. A Comissão deverá avaliar os aspetos discricionários das decisões de resolução adotadas pelo CUR. Dado o impacto considerável das decisões de resolução sobre a estabilidade financeira dos Estados‑Membros e da União, bem como sobre a soberania orçamental dos Estados‑Membros, é importante que sejam conferidas ao Conselho competências de execução para tomar determinadas decisões relativas à resolução. Deverá, por conseguinte, ser o Conselho a exercer, sob proposta da Comissão, o controlo efetivo sobre a avaliação realizada pelo CUR quanto à existência de um interesse público e a avaliar qualquer alteração significativa do montante do Fundo a ser utilizado numa determinada medida de resolução. Além disso, a Comissão deverá ficar habilitada a adotar atos delegados no que diz respeito à especificação dos critérios ou das condições adicionais a ter em conta pelo CUR no exercício das suas diversas competências. Essa atribuição de funções de resolução não deverá, de modo algum, dificultar o funcionamento do mercado interno de serviços financeiros. A [Autoridade Bancária Europeia (EBA)] deverá, por conseguinte, manter o seu papel e conservar as suas competências e funções existentes: deverá desenvolver e contribuir para a aplicação coerente da legislação da União aplicável a todos os Estados‑Membros e favorecer a convergência das práticas em matéria de supervisão no conjunto da União.

[…]

(26)

O BCE, enquanto autoridade de supervisão no âmbito do [Mecanismo Único de Supervisão (MUS)], bem como o CUR, deverão ter condições para avaliar se uma instituição de crédito está ou pode vir a estar em situação de insolvência e se não existem perspetivas razoáveis de que qualquer ação alternativa do setor privado ou de supervisão impeça a sua insolvência num prazo razoável. Se considerar que estão preenchidos os fatores de desencadeamento das medidas de resolução, o CUR deverá adotar o programa de resolução. O procedimento relativo à adoção do programa de resolução, que envolve a Comissão e o Conselho, reforça a necessária independência operacional do CUR, respeitando simultaneamente o princípio de delegação de poderes nas agências tal como interpretado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (a seguir designado por “Tribunal de Justiça”). Por conseguinte, o presente regulamento prevê que o programa de resolução adotado pelo CUR só entra em vigor se, no prazo de 24 horas após a sua adoção pelo CUR, não forem formuladas objeções pelo Conselho ou pela Comissão, ou o programa de resolução for aprovado pela Comissão. As razões com base nas quais o Conselho se pode opor, sob proposta da Comissão, ao programa de resolução do CUR deverão ser estritamente limitadas à existência de um interesse público e à alteração significativa pela Comissão do montante de utilização do Fundo proposto pelo CUR.

Uma alteração de 5 % ou superior do montante do Fundo em relação à proposta original do CUR deverá ser considerada significativa. O Conselho deverá aprovar ou opor‑se à proposta da Comissão, sem a alterar. Na qualidade de observador nas reuniões do CUR, a Comissão deverá verificar de forma permanente se o programa de resolução adotado pelo CUR é inteiramente conforme ao presente regulamento, garante o equilíbrio adequado entre os diferentes objetivos e interesses em causa, respeita o interesse público e se é preservada a integridade do mercado interno. Considerando que a medida de resolução requer um processo de tomada de decisão célere, o Conselho e a Comissão deverão cooperar estreitamente, não devendo o Conselho duplicar os trabalhos preparatórios já empreendidos pela Comissão. O CUR deverá dar instruções às autoridades nacionais de resolução, as quais deverão tomar todas as medidas necessárias para aplicar o programa de resolução.

[…]

(62)

A interferência com os direitos de propriedade não deverá ser desproporcionada. Daí decorre que os acionistas e credores afetados não deverão suportar perdas mais elevadas do que aquelas que suportariam se a entidade tivesse sido liquidada no momento em que é tomada a decisão de desencadear a resolução. Em caso de transferência parcial dos ativos de uma instituição objeto de resolução para um comprador do setor privado ou para uma instituição de transição, a parte remanescente da instituição objeto de resolução deverá ser liquidada ao abrigo dos processos normais de insolvência. Para proteger os acionistas e credores da entidade durante o processo de liquidação, estes deverão ter direito a receber em pagamento pelos seus créditos um valor não inferior ao que se estima que receberiam se a entidade no seu conjunto fosse liquidada ao abrigo dos processos normais de insolvência.

[…]

(90)

Quando aplicar os instrumentos de resolução e exercer os poderes de resolução, o CUR deverá dar instruções às autoridades nacionais de resolução para que os representantes dos trabalhadores das entidades em causa sejam informados e, quando adequado, consultados, como previsto na Diretiva 2014/59/UE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, que estabelece um enquadramento para a recuperação e a resolução de instituições de crédito e de empresas de investimento e que altera a Diretiva 82/891/CEE do Conselho, e as Diretivas 2001/24/CE, 2002/47/CE, 2004/25/CE, 2005/56/CE, 2007/36/CE, 2011/35/UE, 2012/30/UE e 2013/36/UE e os Regulamentos (UE) n.o 1093/2010 e (UE) n.o 648/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho (JO 2014, L 173, p. 190)].

[…]

(120)

O [Mecanismo Único de Resolução (MUR)] congrega o CUR, o Conselho, a Comissão e as autoridades de resolução dos Estados‑Membros participantes. O Tribunal de Justiça é competente, nos termos do artigo 263.o do [Tratado FUE], para apreciar a legalidade das decisões adotadas pelo CUR, pelo Conselho e pela Comissão, bem como para determinar a sua responsabilidade extracontratual. Além disso, o Tribunal de Justiça tem competência, nos termos do artigo 267.o do [Tratado FUE], para proferir decisões a título prejudicial a pedido das autoridades judiciais nacionais sobre a validade e a interpretação dos atos adotados pelas instituições, órgãos ou agências da União. As autoridades judiciais nacionais deverão ser competentes, em conformidade com a sua legislação nacional, para apreciar a legalidade das decisões adotadas pelas autoridades de resolução dos Estados‑Membros participantes no exercício das competências que lhes são conferidas pelo presente regulamento, bem como para determinar a sua responsabilidade extracontratual.»

4

O artigo 1.o do Regulamento MUR, sob a epígrafe «Objeto», dispõe:

«O presente regulamento estabelece regras uniformes e um processo uniforme para a resolução das entidades referidas no artigo 2.o estabelecidas nos Estados‑Membros participantes mencionadas no artigo 4.o

Essas regras uniformes e este processo uniforme serão aplicados pelo Conselho Único de Resolução, criado ao abrigo do artigo 42.o (a seguir designado por “CUR”), em colaboração com o Conselho e a Comissão e as autoridades nacionais de resolução no quadro do [M]ecanismo [Ú]nico de [R]esolução (a seguir designado por “MUR”) estabelecido no presente regulamento. O MUR é apoiado por um [F]undo [Ú]nico de [R]esolução (a seguir designado por “Fundo”).

[…]»

5

O artigo 2.o desse regulamento, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», prevê:

«O presente regulamento é aplicável às seguintes entidades:

a)

Instituições de crédito estabelecidas num Estado‑Membro participante;

b)

Empresas‑mãe, incluindo companhias financeiras ou companhias financeiras mistas estabelecidas num Estado‑Membro participante, caso estejam sujeitas a supervisão em base consolidada realizada pelo BCE nos termos do artigo 4.o, n.o 1, ponto g), do Regulamento [n.o 1024/2013];

[…]»

6

O artigo 7.o do Regulamento MUR, sob a epígrafe «Divisão de competências no âmbito do MUR», enuncia, nos seus n.os 1 e 2:

«1.   O CUR é responsável pelo funcionamento eficaz e coerente do MUR.

2.   Sem prejuízo das disposições referidas no artigo 31.o, n.o 1, o CUR é responsável por elaborar os planos de resolução e adotar todas as decisões relacionadas com a resolução:

a)

Para as entidades referidas no artigo 2.o que não fazem parte de um grupo e para os grupos:

i)

que não são considerados menos significativos nos termos do artigo 6.o, n.o 4, do Regulamento [n.o 1024/2013], ou

ii)

em relação aos quais o BCE tenha decidido, nos termos do artigo 6.o, n.o 5, alínea b), do Regulamento [n.o 1024/2013], exercer diretamente todos os poderes pertinentes; e

b)

Para outros grupos transfronteiriços.»

7

O artigo 14.o do Regulamento MUR, sob a epígrafe «Objetivos da resolução», dispõe:

«1.   Quando aplicarem o procedimento de resolução referido no artigo 18.o, o CUR, o Conselho e a Comissão, e, se for caso disso, as autoridades nacionais de resolução, no que diz respeito às respetivas responsabilidades, têm em conta os objetivos da resolução e escolhem os instrumentos de resolução e exercem os poderes de resolução que, em seu entender, [mais bem] realizam os objetivos de resolução relevantes nas circunstâncias do caso concreto.

2.   Os objetivos de resolução a que se refere o n.o 1 são os seguintes:

a)

Assegurar a continuidade das funções críticas;

b)

Evitar efeitos adversos significativos sobre a estabilidade financeira, nomeadamente evitando o contágio, inclusive das infraestruturas de mercado, e mantendo a disciplina do mercado;

c)

Proteger as finanças públicas, limitando o recurso ao apoio financeiro público extraordinário;

d)

Proteger os depositantes abrangidos pela Diretiva 2014/49/UE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de abril de 2014, relativa aos sistemas de garantia de depósitos (JO 2014, L 173, p. 149)] e os investidores abrangidos pela Diretiva 97/9/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de março de 1997, relativa aos sistemas de indemnização dos investidores (JO 1997, L 84, p. 22)];

e)

Proteger os fundos e ativos dos clientes.

Ao prosseguir os objetivos a que se refere o primeiro parágrafo, o CUR, o Conselho e a Comissão e, se for caso disso, as autoridades nacionais de resolução, procuram reduzir ao mínimo o custo da resolução e evitar a destruição de valor, a menos que tal seja necessário para atingir os objetivos da resolução.

3.   Sem prejuízo das diferentes disposições do presente regulamento, os objetivos de resolução assumem igual importância, devendo ser equilibrados em função da natureza e circunstâncias de cada caso.»

8

Em conformidade com o artigo 15.o, n.o 1, deste regulamento, o CUR, o Conselho, a Comissão e, se for caso disso, as autoridades nacionais de resolução «tomam todas as medidas adequadas» para assegurar que a medida de resolução é adotada de acordo com os princípios estabelecidos nessa disposição, quando aplicarem o procedimento de resolução referido no artigo 18.o do referido regulamento.

9

O artigo 18.o do Regulamento MUR, sob a epígrafe «Procedimento de resolução», prevê:

«1.   O CUR só pode adotar um programa de resolução nos termos do n.o 6 em relação às entidades e grupos a que se refere o artigo 7.o, n.o 2, e às entidades e grupos a que se refere o artigo 7.o, n.o 4, alínea b), e n.o 5, se estiverem preenchidas as condições para aplicação desses números, quando avaliar, na sua sessão executiva, após receção de uma comunicação nos termos do quarto parágrafo ou por sua própria iniciativa, que se verificam as seguintes condições:

a)

A entidade encontra‑se em situação ou em risco de insolvência;

b)

Tendo em conta os prazos e outras circunstâncias relevantes, não existe nenhuma perspetiva razoável de que uma ação alternativa do setor privado, incluindo medidas tomadas por um SPI, ou uma ação de supervisão, incluindo medidas de intervenção precoce ou de redução ou conversão de instrumentos de capital relevantes, nos termos do artigo 21.o, adotadas em relação à entidade, impediriam a sua insolvência num prazo razoável;

c)

É necessária uma medida de resolução para defesa do interesse público de acordo com o n.o 5.

É efetuada uma avaliação da condição referida no primeiro parágrafo, alínea a), pelo BCE, após consulta do CUR. O CUR, na sua sessão executiva, só pode proceder a essa avaliação após ter informado o BCE da sua intenção e apenas se o BCE, no prazo de três dias após a receção dessas informações, não proceder a essa avaliação. O BCE transmite ao CUR, sem demora, toda a informação relevante que este último solicite para fundamentar a sua avaliação.

Caso o BCE considere que está preenchida a condição referida no primeiro parágrafo, alínea a), em relação a uma instituição ou grupo referido no primeiro parágrafo, comunica sem demora essa avaliação à Comissão e ao CUR.

É efetuada uma avaliação da condição referida no primeiro parágrafo, alínea b), pelo CUR, na sua sessão executiva ou, se for caso disso, pelas autoridades nacionais de resolução em estreita cooperação com o BCE. O BCE pode também informar o CUR ou as autoridades nacionais de resolução em causa de que considera que a condição prevista nessa alínea está preenchida.

2.   Sem prejuízo dos casos em que o BCE tenha decidido exercer diretamente as funções de supervisão em relação às instituições de crédito ao abrigo do artigo 6.o, n.o 5, alínea b), do Regulamento [n.o 1024/2013], no caso da receção de uma comunicação nos termos do n.o 1 ou caso o CUR tencione proceder a uma avaliação ao abrigo do n.o 1 por sua própria iniciativa, em relação a uma entidade ou grupo referido no artigo 7.o, n.o 3, o CUR comunica sem demora a sua avaliação ao BCE.

[…]

4.   Para efeitos do n.o 1, alínea a), considera‑se que uma entidade se encontra em situação ou em risco de insolvência quando se verificar uma ou mais das seguintes circunstâncias:

[…]

5.   Para efeitos do n.o 1, alínea c), do presente artigo, considera‑se que uma medida de resolução é de interesse público se for proporcionada e necessária para a prossecução de um ou mais dos objetivos da resolução referidos no artigo 14.o que um processo de liquidação da entidade no quadro dos processos normais de insolvência não permitiria atingir.

6.   Se as condições previstas no n.o 1 estiverem satisfeitas, o CUR adota um programa de resolução. O programa de resolução:

a)

Coloca a entidade sob resolução;

b)

Determina a aplicação dos instrumentos de resolução a que se refere o artigo 22.o, n.o 2, à instituição objeto de resolução, em particular as eventuais exclusões da aplicação da recapitalização interna nos termos do artigo 27.o, n.os 5 e 14;

c)

Determina a utilização do Fundo com vista a apoiar a medida de resolução nos termos do artigo 76.o e de uma decisão da Comissão tomada nos termos do artigo 19.o

7.   Imediatamente após a adoção do programa de resolução, o CUR transmite‑o à Comissão.

No prazo de 24 horas a contar da transmissão do programa de resolução pelo CUR, a Comissão aprova o programa de resolução ou, nos casos não abrangidos pelo terceiro parágrafo do presente número, apresenta objeções sobre os aspetos discricionários do programa de resolução.

No prazo de 12 horas a contar da transmissão do programa de resolução pelo CUR, a Comissão pode propor ao Conselho que:

a)

Formule objeções ao programa de resolução devido ao facto de o programa de resolução adotado pelo CUR não cumprir o critério de interesse público referido no n.o 1, alínea c);

b)

Aprove ou formule objeções a uma alteração significativa do montante do Fundo previsto no programa de resolução do CUR.

Para efeitos do disposto no terceiro parágrafo, o Conselho delibera por maioria simples.

O programa de resolução só pode entrar em vigor se não tiverem sido formuladas objeções pelo Conselho ou pela Comissão no prazo de 24 horas após a sua transmissão pelo CUR.

O Conselho ou a Comissão, consoante o caso, explica as razões por que exerce os seus poderes de oposição.

Se, no prazo de 24 horas a contar da transmissão do programa de resolução pelo CUR, o Conselho aprovar a proposta da Comissão no sentido de alterar o programa de resolução pelo motivo referido no terceiro parágrafo, alínea b), ou a Comissão tiver apresentado objeções ao abrigo do segundo parágrafo, o CUR, no prazo de oito horas, altera o programa de resolução de acordo com as razões expostas.

Se o programa de resolução adotado pelo CUR previr a exclusão de determinados passivos nas circunstâncias excecionais referidas no artigo 27.o, n.o 5, e essa exclusão exigir uma contribuição do Fundo ou uma fonte de financiamento alternativa, a fim de proteger a integridade do mercado interno, a Comissão pode proibir ou exigir alterações da exclusão proposta, expondo razões adequadas com base no incumprimento dos requisitos previstos no artigo 27.o e no ato delegado adotado pela Comissão com base no artigo 44.o, n.o 11, da [Diretiva 2014/59].

8.   Se o Conselho se opuser a colocar uma instituição sob resolução devido ao facto de o critério de interesse público referido no n.o 1, alínea c), não ser cumprido, a entidade em causa deve ser liquidada de forma ordenada de acordo com a legislação nacional aplicável.

9.   O CUR assegura que a medida de resolução necessária seja adotada para a execução do programa de resolução por parte das autoridades nacionais de resolução competentes. O programa de resolução é dirigido às autoridades nacionais de resolução competentes, instruindo essas autoridades, que devem adotar todas as medidas necessárias para a sua execução, por força do artigo 29.o, no exercício dos poderes de resolução. Se se tratar de um auxílio estatal ou de um auxílio do Fundo, o CUR age em conformidade com uma decisão adotada pela Comissão sobre esse auxílio.

10.   A Comissão tem poderes para obter do CUR quaisquer informações que considere relevantes para o exercício das suas competências ao abrigo do presente regulamento. O CUR tem poderes para obter de qualquer pessoa, em conformidade com o capítulo 5 do presente título, todas as informações necessárias para que possa elaborar e decidir a medida de resolução, nomeadamente atualizando e completando as informações prestadas nos planos de resolução.»

10

O artigo 22.o do Regulamento MUR, sob a epígrafe «Princípios gerais aplicáveis aos instrumentos de resolução», dispõe, nos seus n.os 2 e 4:

«2.   Os instrumentos de resolução a que se refere o artigo 18.o, n.o 6, alínea b), são os seguintes:

a)

O instrumento de alienação da atividade;

b)

O instrumento de criação de uma instituição de transição;

c)

O instrumento de segregação de ativos;

d)

O instrumento de recapitalização interna.

[…]

4.   Os instrumentos de resolução devem ser aplicados para cumprir os objetivos da resolução especificados no artigo 14.o, de acordo com os princípios da resolução especificados no artigo 15.o Os instrumentos de resolução podem ser aplicados isoladamente ou combinados entre si, exceto o instrumento de segregação de ativos que só pode ser aplicado juntamente com outro instrumento de resolução.

[…]»

11

O artigo 23.o deste regulamento, sob a epígrafe «Programa de resolução», prevê:

«O programa de resolução adotado pelo CUR nos termos do artigo 18.o estabelece, em conformidade com quaisquer decisões em matéria de auxílios estatais ou de auxílios do Fundo, os detalhes relativos aos instrumentos de resolução a aplicar à instituição objeto de resolução […] e determina os montantes específicos e objetivos para os quais o Fundo deve ser utilizado.

[…]

Aquando da adoção de um programa de resolução, o CUR, o Conselho e a Comissão têm em conta e seguem o plano de resolução referido no artigo 8.o, a não ser que o CUR entenda que, tendo em conta as circunstâncias do caso, os objetivos da resolução serão atingidos com mais eficácia através da adoção de medidas não previstas no plano de resolução.

No decurso do processo de resolução, o CUR pode alterar e atualizar o programa de resolução na medida do que considere adequado, tendo em conta as circunstâncias do caso. Para alterações e atualizações é aplicável o procedimento previsto no artigo 18.o

[…]»

12

O artigo 30.o do referido regulamento, sob a epígrafe «Obrigação de cooperação e intercâmbio de informações no âmbito do MUR», enuncia, nos seus n.os 1 e 2:

«1.   O CUR informa a Comissão de qualquer ação por si adotada em preparação de um processo de resolução. No que diz respeito a quaisquer informações recebidas do CUR, os membros e o pessoal do Conselho e da Comissão ficam sujeitos ao requisito em matéria de segredo profissional estabelecido no artigo 88.o

2.   No exercício das respetivas responsabilidades no âmbito do presente regulamento, o CUR, o Conselho, a Comissão, o BCE e as autoridades nacionais de resolução e as autoridades nacionais competentes cooperam estreitamente, nomeadamente no planeamento da resolução, na intervenção precoce e nas diferentes fases da resolução, em conformidade com os artigos 8.o a 29.o Devem fornecer uns aos outros todas as informações necessárias para o exercício das suas funções.»

13

O artigo 43.o, n.o 3, do Regulamento MUR tem a seguinte redação:

«A Comissão e o BCE designam, cada um, um representante habilitado a participar nas reuniões das sessões plenárias e das sessões executivas, na qualidade de observador permanente.

Os representantes da Comissão e do BCE têm o direito de participar nos debates e têm acesso a todos os documentos.»

14

Nos termos do artigo 86.o deste regulamento, sob a epígrafe «Recurso perante o Tribunal de Justiça»:

«1.   Pode ser interposto recurso perante o Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 263.o [TFUE], em contestação de uma decisão tomada pela Câmara de Recurso ou, nos casos em que não exista direito de recurso perante a Câmara de Recurso, pelo CUR.

2.   Os Estados‑Membros e as instituições da União, bem como qualquer pessoa singular ou coletiva, podem interpor recurso perante o Tribunal de Justiça contra decisões do CUR, ao abrigo do artigo 263.o [TFUE].

3.   Caso o CUR esteja obrigado a agir e não adote uma decisão, pode ser interposto recurso por omissão perante o Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 265.o [TFUE].

4.   O CUR toma as medidas necessárias para dar cumprimento ao acórdão do Tribunal de Justiça.»

Antecedentes do litígio

15

Os antecedentes do litígio estão expostos nos n.os 24 a 80 do acórdão recorrido. Para efeitos do presente recurso, podem ser resumidos da seguinte forma.

16

O Banco Popular Español S.A. (a seguir «Banco Popular») era uma instituição de crédito sujeita à supervisão prudencial direta do BCE.

17

Por ocasião da sessão executiva de 7 de junho de 2017, o CUR, através da sua Decisão SRB/EES/2017/08, adotou, com base no Regulamento MUR, o programa de resolução controvertido relativamente ao Banco Popular.

18

Nos termos do artigo 1.o desse programa de resolução, o CUR decidiu que o Banco Popular seria sujeito a um procedimento de resolução a partir da data da resolução, pelo facto de estarem preenchidas as condições previstas no artigo 18.o, n.o 1, desse regulamento.

19

Como resulta dos artigos 2.o a 4.o desse programa de resolução, o CUR considerou, antes de mais, que o Banco Popular estava em situação ou risco de insolvência, em seguida, que não existiam outras medidas que pudessem impedir a insolvência desse banco num prazo razoável e, por último, que era necessária uma medida de resolução sob a forma de um instrumento de alienação da atividade do referido banco de modo a assegurar a continuidade das suas funções críticas e evitar efeitos adversos significativos sobre a estabilidade financeira.

20

O artigo 5.o, n.o 1, do programa de resolução controvertido tem a seguinte redação:

«O instrumento de resolução aplicado ao Banco Popular consistirá numa alienação da atividade ao abrigo do artigo 24.o do Regulamento [MUR] através da transferência das ações para um adquirente. A redução e a conversão dos instrumentos de fundos próprios serão efetuadas imediatamente antes da aplicação do instrumento de alienação da atividade.»

21

O artigo 6.o desse programa de resolução precisa as modalidades relativas a essa redução e à alienação da atividade.

22

Além disso, o artigo 12.o, n.o 1, do referido programa de resolução indica que este «entrará em vigor», em 7 de junho de 2017, às 6 h 30.

23

Em 7 de junho de 2017, às 5 h 13, o programa de resolução controvertido foi apresentado à Comissão para aprovação.

24

No mesmo dia, às 6 h 30, essa instituição adotou a Decisão (UE) 2017/1246, que aprova o programa de resolução para o Banco Popular Español S.A. (JO 2017, L 178, p. 15), e notificou‑a ao CUR. O considerando 4 desta decisão, conforme retificado em 6 de dezembro de 2017 (JO 2017, L 320, p. 31), enuncia o seguinte:

«A Comissão concorda com o programa de resolução. Em especial, concorda com os motivos, invocados pelo CUR, pelos quais a resolução é necessária para a defesa do interesse público em conformidade com o artigo 5.o do Regulamento (MRU) n.o 806/2014.»

25

Ainda em 7 de junho de 2017, o Fondo de Reestructuración Ordenada Bancaria (FROB) (Fundo de Reestruturação Ordenada das Instituições Bancárias, Espanha) adotou as medidas necessárias para executar o programa de resolução controvertido, em conformidade com o artigo 29.o do Regulamento MUR.

Recurso no Tribunal Geral e acórdão recorrido

26

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 2 de agosto de 2017, a Fundación e a SFL, então acionistas do Banco Popular, interpuseram um recurso de anulação do programa de resolução controvertido.

27

Por Decisões, respetivamente, de 1 de agosto de 2018 e de 12 de abril de 2019, foi admitida a intervenção do Reino de Espanha, do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, por um lado, e do Banco Santander SA, por outro, em apoio dos pedidos do CUR.

28

Embora o CUR se tenha limitado a concluir pela negação do provimento ao recurso sem contestar a sua admissibilidade, a Comissão suscitou, no seu articulado de intervenção, a inadmissibilidade do recurso. A Comissão sustentou que o programa de resolução controvertido era apenas um ato intermédio, que não produzia efeitos jurídicos vinculativos, uma vez que, com a sua Decisão 2017/1246, esta tinha aprovado esse programa de resolução, o tinha feito seu e o tinha dotado de tais efeitos.

29

O Parlamento e o Conselho alegaram igualmente, nos seus articulados de intervenção, que o programa de resolução controvertido, por si só, não produzia efeitos jurídicos em relação a terceiros na aceção do artigo 263.o TFUE.

30

No âmbito da apreciação sobre a admissibilidade do recurso, o Tribunal Geral recordou que, antes de mais, no n.o 112 do acórdão recorrido, é certo que resulta de jurisprudência constante que um interveniente não tem legitimidade para arguir autonomamente uma causa de não conhecimento de mérito e, portanto, este não é obrigado a examinar os fundamentos de inadmissibilidade exclusivamente invocados por ele. Todavia, no n.o 113 desse acórdão, o Tribunal Geral considerou que, tratando‑se de uma exceção de ordem pública, havia que conhecer oficiosamente da admissibilidade do recurso.

31

Em seguida, o Tribunal Geral apreciou se o programa de resolução controvertido podia ser considerado um ato recorrível na aceção do artigo 263.o TFUE. A este respeito, este recordou, nos n.os 114 e 115 do acórdão recorrido, que, segundo jurisprudência constante, são considerados atos desse tipo todas as disposições adotadas pelas instituições, qualquer que seja a sua forma, que visem produzir efeitos jurídicos vinculativos e que, para determinar se um ato produz esses efeitos, importa atender à substância desse ato e apreciar os referidos efeitos à luz de critérios objetivos, como o conteúdo desse mesmo ato, tendo em conta, se for caso disso, o contexto da sua adoção, bem como os poderes da instituição que dele é autora.

32

A este respeito, nos n.os 116 a 123 desse acórdão, o Tribunal Geral declarou o seguinte:

«116

[…] refira‑se que o CUR exerce as competências que lhe são atribuídas pelo [Regulamento MUR], nomeadamente a prevista no seu artigo 16.o, n.o 1, de “decid[ir] de uma medida de resolução em relação a uma instituição financeira estabelecida num Estado‑Membro participante se as condições previstas no artigo 18.o, n.o 1, se encontrarem preenchidas”. Assim, o legislador da União conferiu expressamente poder decisório ao CUR.

117

Uma decisão do CUR sobre uma medida de resolução é um ato suscetível de vigência. O artigo 12.o do programa de resolução [controvertido] indica que este entrou em vigor em 7 de junho de 2017 às 6 h 30.

118

Além do mais, segundo o artigo 23.o, primeiro parágrafo, do [Regulamento MUR], o programa de resolução adotado pelo CUR em aplicação do artigo 18.o desse mesmo regulamento estabelece os detalhes relativos aos instrumentos de resolução a aplicar à instituição objeto de procedimento de resolução que as autoridades nacionais de resolução devem implementar em conformidade com as disposições pertinentes da Diretiva 2014/59 transposta para a legislação nacional.

119

Assim, em aplicação do artigo 9.o do programa de resolução [controvertido], cabe ao FROB tomar todas as medidas necessárias para proceder à execução e implementação desta decisão. O FROB deve, nomeadamente, executar a venda do Banco Popular segundo as modalidades decididas no programa de resolução [controvertido]. O artigo 10.o do programa de resolução [controvertido] prevê igualmente que o CUR deve acompanhar a execução [deste] programa de resolução pelo FROB em conformidade com o artigo 28.o do [Regulamento MUR].

120

Por conseguinte, há que considerar que, atendendo à sua substância, o programa de resolução [controvertido] produz efeitos jurídicos vinculativos.

121

Além disso, refira‑se que o artigo 86.o, n.o 1, do [Regulamento MUR] prevê que pode ser interposto recurso para o Tribunal de Justiça, ao abrigo do artigo 263.o TFUE, em contestação de uma decisão tomada pela Câmara de Recurso ou, nos casos em que não exista direito de recurso para a Câmara de Recurso, pelo CUR. Segundo o artigo 86.o, n.o 2, do Regulamento [MUR], os Estados‑Membros e as instituições da União, bem como qualquer pessoa singular ou coletiva, podem interpor recurso perante o Tribunal de Justiça contra decisões do CUR, ao abrigo do artigo 263.o TFUE.

122

A esse respeito, o Tribunal de Justiça referiu que o artigo 86.o, n.o 2, do [Regulamento MUR] prevê que os Estados‑Membros e as instituições da União, bem como qualquer pessoa singular ou coletiva, ao abrigo do artigo 263.o TFUE, podem interpor recurso para o Tribunal de Justiça da União Europeia contra as decisões do CUR sendo este último citado com exclusão de qualquer outra instituição, órgão ou organismo da União (Acórdão de 6 de maio de 2021, ABLV Bank e o./BCE, C‑551/19 P e C‑552/19 P, EU:C:2021:369, n.o 56).

123

O Tribunal de Justiça considerou igualmente que o procedimento de resolução deve ser considerado um procedimento administrativo complexo que envolve várias autoridades e de que apenas o resultado final, decorrente do exercício, pelo CUR, da sua competência, pode ser objeto da fiscalização jurisdicional prevista no artigo 86.o, n.o 2, desse regulamento (Acórdão de 6 de maio de 2021, ABLV Bank e o./BCE, C‑551/19 P e C‑552/19 P, EU:C:2021:369, n.o 66).»

33

Com base nestas considerações, o Tribunal Geral concluiu, no n.o 124 do acórdão recorrido, que o programa de resolução controvertido poderia ser objeto de um recurso de anulação.

34

Por último, o Tribunal Geral considerou que esta conclusão não é posta em causa pelos argumentos aduzidos pelo Parlamento, o Conselho e a Comissão.

35

A este respeito, este salientou, em primeiro lugar, no n.o 127 do acórdão recorrido, que, embora um programa de resolução só entre em vigor com a sua aprovação pela Comissão, isso não significa que essa aprovação tenha a consequência de eliminar os efeitos jurídicos autónomos desse programa de resolução substituindo‑os apenas pelos da sua decisão. Nos n.os 128 a 130 desse acórdão, embora considerando que a aprovação da Comissão constitui uma etapa necessária à entrada em vigor do programa de resolução e que lhe confere força jurídica, o Tribunal Geral considerou que o respeito dos princípios em matéria de delegação de poderes formulados no Acórdão de 13 de junho de 1958, Meroni/Alta Autoridade (9/56, a seguir Acórdão Meroni/Alta Autoridade, EU:C:1958:7), não implica que apenas a decisão adotada pela Comissão produza efeitos jurídicos. Em seu entender, é necessário que a Comissão aprove o programa de resolução nos seus aspetos discricionários para que este produza efeitos jurídicos, evitando assim uma«verdadeira transferência da responsabilidade» na aceção da jurisprudência decorrente deste último acórdão. Além disso, o Tribunal Geral sublinhou, no n.o 132 do acórdão recorrido, que a Comissão dispõe de competência própria para proceder à avaliação dos aspetos discricionários do programa de resolução, mas não do poder de exercer as competências reservadas ao CUR nem do poder de alterar o programa de resolução ou os efeitos jurídicos do mesmo.

36

Em segundo lugar, o Tribunal Geral rejeitou o argumento de que a Comissão não está vinculada por um programa de resolução e constitui um ato preparatório que não pode ser objeto de recurso nos termos do artigo 263.o TFUE. A este respeito, considerou, no n.o 137 do acórdão recorrido, que, no âmbito do procedimento administrativo complexo implementado pelo Regulamento MUR, um programa de resolução não pode ser considerado um ato preparatório que tem por objeto preparar a decisão da Comissão. Embora, nos termos do artigo 18.o, n.o 7, desse regulamento, a aprovação do programa de resolução pela Comissão tenha por efeito fazê‑lo entrar em vigor e embora essa instituição possa opor‑se a esse programa nos seus aspetos discricionários, não se pode opor nos seus aspetos puramente técnicos nem alterá‑los.

37

Em terceiro lugar, nos n.os 140 a 142 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou que resulta quer do artigo 86.o do Regulamento MUR quer de outras disposições desse regulamento que um programa de resolução é um ato suscetível de ser objeto de um recurso. Este artigo 86.o não visa apenas as decisões autónomas do CUR, que não necessitam de aprovação da Comissão, mas visa todas as decisões do CUR, com exceção das suscetíveis de ser objeto de um recurso para a Câmara de Recurso. Assim, um programa de resolução, por definição, situa‑se na categoria das decisões que são, por força do referido artigo 86.o, suscetíveis de ser objeto de um recurso com fundamento no artigo 263.o TFUE.

38

Em quarto lugar, o Tribunal Geral considerou, no n.o 147 do acórdão recorrido, que a interpretação contrária seria incompatível com os princípios da segurança jurídica e da proteção jurisdicional efetiva, na medida em que qualquer pessoa afetada por uma decisão de resolução adotada pelo CUR estaria sujeita a um requisito de admissibilidade do seu recurso que não se encontra expressamente previsto.

39

Por último, no n.o 148 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral rejeitou o argumento segundo o qual não é possível anular o programa de resolução se a decisão da Comissão continuar em vigor. Este salientou a este respeito que, na hipótese de o acórdão anular um programa de resolução, a decisão da Comissão que o aprova ver‑se‑ia privada do seu objeto.

40

Nestas condições, considerando, no n.o 149 do acórdão recorrido, que depois de aprovado pela Comissão, um programa de resolução adotado pelo CUR produz efeitos jurídicos e constitui um ato suscetível de ser objeto de um recurso de anulação autónomo, o Tribunal Geral, no n.o 150 desse acórdão, julgou admissível o recurso de anulação interposto no caso vertente.

41

Quanto ao mérito, o Tribunal Geral declarou improcedentes todos os fundamentos invocados e, consequentemente, negou provimento ao recurso.

Pedidos das partes

42

A Comissão pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido, na parte em que o Tribunal Geral declara admissível o recurso de anulação em primeira instância,

declarar inadmissível o recurso de anulação interposto em primeira instância no processo T‑481/17 e, por conseguinte, negar‑lhe provimento na sua totalidade, e

condenar as recorrentes em primeira instância no pagamento das despesas efetuadas pela Comissão tanto no processo no Tribunal Geral como no presente recurso.

43

A SFL pede que o Tribunal de Justiça se digne negar provimento ao recurso e condenar a Comissão nas despesas.

44

O CUR pede que o Tribunal de Justiça se digne negar provimento ao recurso e condenar a Comissão nas despesas.

45

O Parlamento pede, em substância, que o Tribunal de Justiça se digne dar provimento ao recurso da Comissão e condenar as recorrentes em primeira instância nas despesas.

46

O Conselho pede que o Tribunal de Justiça, caso anule o acórdão recorrido, se digne declarar que nada obsta à legalidade do Regulamento MUR e da Diretiva 2014/59.

Quanto ao recurso da decisão do Tribunal Geral

47

Em apoio do seu recurso do acórdão recorrido, bem como pelo presente recurso, o Tribunal Geral declarou que o programa de resolução controvertido é um ato suscetível de ser objeto de um recurso nos termos do artigo 263.o TFUE, a Comissão invoca três fundamentos. O primeiro fundamento é relativo a um erro de direito na interpretação do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE e do artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento MUR. O segundo fundamento é relativo a um erro de direito na interpretação do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE e à violação dos direitos de defesa da Comissão. O terceiro fundamento é relativo a uma contradição dos fundamentos do acórdão recorrido.

Quanto à admissibilidade

48

A SFL alega que o presente recurso é inadmissível. Recorda que as conclusões de um pedido de intervenção não podem ter outro objeto senão apoiar os pedidos de uma das partes e daí deduz que a Comissão, que tinha a qualidade de interveniente em primeira instância, não pode suscitar uma exceção de inadmissibilidade de forma autónoma em sede de recurso.

49

A Comissão e o Parlamento opõem‑se a esta argumentação.

50

A este respeito, resulta do acórdão recorrido que, no Tribunal Geral, a Comissão invocou a inadmissibilidade do recurso em primeira instância com o fundamento de que o programa de resolução controvertido não constitui um ato recorrível. Além disso, e como o Tribunal Geral recordou, aliás, nos n.os112 e 113 do acórdão recorrido, se um interveniente não tem legitimidade para arguir autonomamente uma exceção de inadmissibilidade, tratando‑se de uma exceção de ordem pública, há que conhecer oficiosamente da admissibilidade do recurso (v., neste sentido, Acórdão de 24 de março de 1993, CIRFS e o./Comissão, C‑313/90, EU:C:1993:111, n.os 22 e 23). Nos n.os 114 a 149 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral procedeu a um tal exame oficioso da admissibilidade do recurso e, no termo desse exame, declarou o recurso admissível, indeferindo assim, tacitamente, a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão. O referido exame deve poder ser submetido à apreciação do Tribunal de Justiça no âmbito do presente recurso.

51

A este respeito, a circunstância de o Tribunal Geral ter, no acórdão recorrido, negado provimento ao recurso em primeira instância quanto ao mérito não implica a inadmissibilidade do presente recurso. Com efeito, em conformidade com jurisprudência constante, é admissível o recurso interposto de um acórdão do Tribunal Geral uma vez que, pronunciando‑se oficiosamente ou sobre uma questão prévia de inadmissibilidade suscitada por uma parte em relação a um recurso, tenha afastado a inadmissível do recurso, quando o Tribunal Geral, na sequência do mesmo acórdão, tenha negado provimento a esse recurso (v., neste sentido, Acórdão de 10 de setembro de 2009, Comissão/Ente per le Ville Vesuviane e Ente per le Ville Vesuviane/Comissão, C‑445/07 P e C‑455/07 P, EU:C:2009:529, n.o 40 e jurisprudência referida).

52

Daqui resulta que a exceção de inadmissibilidade do recurso suscitada pela SFL deve ser considerada improcedente.

Quanto ao mérito

Quanto ao primeiro fundamento

– Argumentos das partes

53

Com o seu primeiro fundamento, a Comissão, apoiada pelo Parlamento, alega que o Tribunal Geral cometeu um erro na interpretação do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE e do artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento MUR quando considerou, nos n.os 116 a 120, 127 e 137 do acórdão recorrido, que o programa de resolução controvertido é um ato recorrível que produz efeitos jurídicos vinculativos.

54

Antes de mais, a Comissão salienta que é ela ou, se for caso disso, o Conselho que confere a um programa de resolução efeitos jurídicos vinculativos para evitar uma «verdadeira transferência da responsabilidade», na aceção da jurisprudência decorrente do Acórdão Meroni/Alta Autoridade. Ao afirmar, no n.o 132 do acórdão recorrido, que a Comissão não dispõe de nenhum poder no que respeita à alteração de um programa de resolução, o Tribunal Geral violou o disposto no artigo 18.o, n.o 7, primeiro, segundo e sétimo parágrafos, do Regulamento MUR.

55

Em seguida, a interpretação de que o programa de resolução controvertido produz efeitos jurídicos autónomos independentemente da sua aprovação pela Comissão ou, se for caso disso, pelo Conselho é contrária à jurisprudência decorrente do Acórdão Meroni/Alta Autoridade. Com efeito, segundo esta jurisprudência, as competências que implicam o exercício de poderes discricionários não podem ser delegadas em entidades autónomas que não estejam previstas nos Tratados. A adoção de decisões vinculativas por essas entidades deve, de um modo geral, limitar‑se a questões estritamente técnicas, sem exceder os limites restritivos definidos no ato de base. Ora, resulta do considerando 24 do Regulamento MUR que a referida jurisprudência guiou o legislador da União aquando da adoção deste regulamento, através do qual o controlo dos aspetos discricionários de um programa de resolução foi reservado às instituições da União dotadas de competências para a política em matéria de resolução das instituições de crédito.

56

Além disso, a Comissão sustenta que, ao ter indicado, nos n.os 130, 132 e 137 do acórdão recorrido, que é chamada a apreciar apenas determinados aspetos discricionários decisivos para a aprovação de um programa de resolução, o Tribunal Geral não teve em conta o facto de os aspetos discricionários estarem intrinsecamente ligados aos aspetos mais técnicos. Assim, quando a Comissão formula objeções quanto aos aspetos discricionários de um programa de resolução, opõe‑se a esse programa no seu conjunto.

57

O Regulamento MUR instituiu um procedimento administrativo complexo no sentido de que, em conformidade com o artigo 18.o, n.o 7, deste regulamento, o procedimento de resolução conduz à decisão da Comissão ou, se for caso disso, do Conselho que aprova ou se opõe ao programa de resolução apresentado. Em contrapartida, a avaliação do CUR não prejudica o resultado desse procedimento. Por conseguinte, no âmbito do referido procedimento, só as medidas que fixam definitivamente a posição da Comissão ou do Conselho no termo desse mesmo procedimento constituem atos recorríveis, com exclusão das medidas intermédias cujo objetivo é preparar a decisão final.

58

Por último, quanto ao argumento que figura nos n.os 122, 124 e 140 do acórdão recorrido, relativo ao direito de recurso previsto no artigo 86.o do Regulamento MUR contra as decisões do CUR, a Comissão recorda que as disposições deste regulamento não podem alterar o sistema de recursos previsto pelos Tratados.

59

A SFL e o CUR opõem‑se a esta argumentação. Sustentam que o Tribunal Geral declarou, com razão, que o programa de resolução controvertido constitui um ato recorrível que produz efeitos jurídicos autónomos.

60

Antes de mais, salientam que, nos termos, nomeadamente, do artigo 7.o, do artigo 18.o, n.o 1, e do artigo 20.o do Regulamento MUR, o CUR é responsável pelo planeamento, pela conceção e pela adoção do programa de resolução. Em contrapartida, segundo o artigo 18.o, n.o 7, deste regulamento, lido em conjugação com os seus considerandos 24 e 26, o papel da Comissão e do Conselho limita‑se à participação no procedimento de resolução e a controlar os aspetos discricionários do programa de resolução. A este respeito, a SFL precisa que, na falta de objeções suscitadas pela Comissão ou pelo Conselho no prazo de vinte e quatro horas após a transmissão do programa de resolução, este entra em vigor. Além disso, na hipótese de a Comissão ou o Conselho estarem em desacordo com o programa de resolução concebido pelo CUR, cabe a este último tomar a decisão final em conformidade com as suas orientações.

61

O CUR sustenta que, embora o artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento MUR reserve a responsabilidade jurídica e política dos aspetos discricionários do programa de resolução à Comissão ou, se for caso disso, ao Conselho, atribui expressamente os outros elementos do programa de resolução ao CUR. O papel destas instituições consiste em aprovar ou rejeitar o programa de resolução, mas, em nenhum caso, conceber, elaborar ou aplicar esse programa. O legislador da União confiou à agência especializada que constitui o CUR a tarefa de realizar as avaliações muito técnicas que pressupõe a adoção de um programa de resolução. O CUR é responsável quer pelo planeamento, pela conceção e pela adoção das medidas de resolução quer pelo acompanhamento da sua aplicação pelas autoridades nacionais. Nestas condições, não lhe pode ser recusado o direito de defender um programa de resolução, sob pena de violar os seus direitos de defesa.

62

Em seguida, a SFL e o CUR sustentam que a apreciação de que a decisão do CUR põe termo ao procedimento e deve, portanto, ser considerada como ato recorrível em caso de resolução de uma instituição financeira não entra em contradição com a jurisprudência decorrente do Acórdão Meroni/Alta Autoridade. Com efeito, o Regulamento MUR evita uma «verdadeira transferência da responsabilidade» na aceção dessa jurisprudência, assegurando que a Comissão e, se for caso disso, o Conselho possam controlar ou mesmo opor‑se a qualquer elemento discricionário da decisão de resolução. Segundo o CUR, não existe nenhuma contradição entre, por um lado, o direito de interpor recurso contra o CUR, enquanto autor do programa de resolução, e, por outro, o facto de a Comissão e, se for caso disso, o Conselho estarem envolvidos na decisão sobre esse programa de resolução, bem como o facto de este não poder entrar em vigor se essas instituições a tal se opuserem. Em todo o caso, o CUR considera que o poder de adotar todas as decisões de resolução, que lhe é conferido ao abrigo do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento MUR, não constitui uma competência que o Tratado atribui à Comissão e que esta teria decidido delegar, mas uma competência criada pelo legislador da União neste regulamento.

63

Por último, a SFL salienta que os considerandos 90 e 120 do Regulamento MUR e os artigos 7.o, 20.o e 86.o deste regulamento fazem referência aos poderes do CUR, precisando que as decisões que adota podem ser objeto de fiscalização jurisdicional no Tribunal de Justiça. Assim, o artigo 86.o, n.o 2, do referido regulamento prevê essa fiscalização de todas as decisões do CUR que, como as relativas aos programas de resolução, não podem ser objeto de recurso perante a Câmara de Recurso. A argumentação contrária da Comissão está em contradição com esses considerandos e artigos do mesmo regulamento e constitui, por conseguinte, uma interpretação contra legem.

– Apreciação do Tribunal de Justiça

64

O primeiro fundamento tem por objeto a questão de saber se o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao declarar, nos n.os 116 a 120, 127, 137, 149 e 150 do acórdão recorrido, que o programa de resolução controvertido é um ato recorrível, na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE.

65

Segundo jurisprudência constante, podem ser objeto de um recurso de anulação, nos termos do no artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE, lido em conjugação com o primeiro parágrafo, quaisquer disposições ou medidas adotadas pelas instituições, pelos órgãos ou pelos organismos da União, independentemente da sua forma, que se destinem a produzir efeitos jurídicos vinculativos suscetíveis de afetar os interesses de uma pessoa singular ou coletiva, modificando de forma caracterizada a sua situação jurídica. Para determinar se um ato produz esses efeitos e é, por conseguinte, suscetível de ser objeto desse recurso, há que atender à substância desse ato e apreciar esses efeitos à luz de critérios objetivos, como o conteúdo do referido ato, tendo em conta, sendo caso disso, o contexto da sua adoção e os poderes da instituição, do órgão ou do organismo que dele é autor (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de novembro de 1981, IBM/Comissão, 60/81, EU:C:1981:264, n.o 9; de 6 de maio de 2021, ABLV Bank e o./BCE, C‑551/19 P e C‑552/19 P, EU:C:2021:369, n.os 39 e 41; e de 12 de julho de 2022, Nord Stream 2/Parlamento e Conselho, C‑348/20 P, EU:C:2022:548, n.os 62 a 64 e jurisprudência referida).

66

No que respeita, em primeiro lugar, ao conteúdo do programa de resolução controvertido, é verdade que este enuncia, antes de mais, nos seus artigos 1.o a 4.o, que o CUR «decide» colocar o Banco Popular sob resolução pelo facto de as condições enunciadas no artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento MUR estarem preenchidas, em seguida, determina, nos seus artigos 5.o a 7.o, os instrumentos de resolução que devem ser aplicados e, por último, indica, nos seus artigos 9.o e 10.o, que caberá ao FROB tomar todas as medidas necessárias para proceder à execução dessa decisão e que essa execução será seguida pelo CUR.

67

Todavia, o artigo 12.o, n.o 1, do programa de resolução controvertido prevê que este «entrará em vigor» em 7 de junho de 2017, e não, como concluiu erradamente o Tribunal Geral no n.o 117 do acórdão recorrido, que «entrou em vigor» nessa data. Por outro lado, o artigo 13.o deste programa enuncia que este é dirigido ao FROB e lhe será notificado após a sua aprovação pela Comissão ou pelo Conselho.

68

Resulta das indicações referidas no número precedente que o programa de resolução controvertido adotado pelo CUR através da Decisão SRB/EES/2017/08 na sua sessão executiva de 7 de junho de 2017, que constitui o ato recorrido perante o Tribunal Geral no presente processo, ainda não tinha sido aprovado, o que confirma o facto, salientado nos n.os 77 e 78 do acórdão recorrido, que, após a sua adoção, foi notificada à Comissão em 7 de junho de 2017 às 5 h 13 para efeitos da respetiva aprovação, a qual se realizou no mesmo dia às 6 h 30. Também resulta dessas indicações que a entrada em vigor deste programa e, portanto, a produção por este dos respetivos efeitos jurídicos vinculativos dependiam da sua aprovação.

69

Em segundo lugar, quanto ao contexto de adoção do programa de resolução controvertido, há que salientar que, conforme indica o seu preâmbulo, este tem por base jurídica o Regulamento MUR, em especial o seu artigo 18.o O regime instituído por este regulamento baseou‑se na constatação, enunciada, em substância, nos seus considerandos 24 e 26, que o exercício de poderes de resolução previstos pelo referido regulamento insere‑se na política da União em matéria de resolução, que apenas as instituições da União podem definir, e que existe uma margem de apreciação na adoção de cada programa de resolução específico, dado o impacto considerável das decisões de resolução sobre a estabilidade financeira dos Estados‑Membros e da União, bem como sobre a soberania orçamental dos Estados‑Membros. Resulta destes considerandos que o legislador da União considerou necessário, por esses motivos, prever a participação adequada do Conselho e da Comissão, a saber, uma participação que reforça a necessária independência operacional do CUR, respeitando simultaneamente os princípios de delegação de poderes nas agências estabelecidos no Acórdão Meroni/Alta Autoridade e recordados no Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Parlamento e Conselho (C‑270/12, EU:C:2014:18).

70

Nestes acórdãos, o Tribunal de Justiça, no essencial, declarou que as consequências de uma delegação de poderes são muito diferentes, consoante esta vise, por um lado, poderes executivos claramente delimitados e cuja utilização seja, portanto, suscetível de um controlo rigoroso à luz de critérios objetivos fixados pela autoridade delegante, ou, por outro, um «poder discricionário, que implica uma ampla liberdade de apreciação suscetível de traduzir, pela respetiva utilização, uma verdadeira política económica» (v., neste sentido, Acórdãos Meroni/Alta Autoridade, pp. 43, 44 e 47, e de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Parlamento e Conselho, C‑270/12, EU:C:2014:18, n.o 41).

71

Uma delegação do primeiro tipo não é suscetível de alterar sensivelmente as consequências provocadas pelo exercício dos poderes que ela implica, ao passo que uma delegação do segundo tipo, ao substituir as escolhas da autoridade delegante pelas da autoridade delegatária, opera uma «verdadeira transferência da responsabilidade» (Acórdãos Meroni/Alta Autoridade, p. 43, e de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Parlamento e Conselho, C‑270/12, EU:C:2014:18, n.o 42). No processo que deu origem ao Acórdão Meroni/Alta Autoridade, o Tribunal de Justiça declarou que a delegação de poderes em causa nesse processo, uma vez que consentia aos organismos em causa uma «liberdade de apreciação que implicava um amplo poder discricionário», não podia ser considerada compatível com os «requisitos do Tratado», precisando que, ao reservar‑se apenas a faculdade de recusar a sua aprovação às decisões desses organismos, a Alta Autoridade não tinha mantido poderes suficientes para evitar essa transferência da responsabilidade (v., neste sentido, Acórdão Meroni/Alta Autoridade, p. 47).

72

Resulta das considerações que figuram na página 44 do Acórdão Meroni/Alta Autoridade que a jurisprudência decorrente desse acórdão assenta na premissa de que o equilíbrio dos poderes, característico da estrutura institucional da União, constitui uma garantia fundamental conferida pelos Tratados e que a delegação de um amplo poder discricionário viola esta garantia, uma vez que confia esse poder a autoridades diferentes das estabelecidas pelos Tratados para assegurar e controlar o seu exercício no âmbito das respetivas competências. Tendo em conta as considerações que figuram nas páginas 43 e 46 desse acórdão, o amplo poder discricionário, a que se refere esta jurisprudência, incide, nomeadamente, sobre as questões fundamentais do domínio político em causa, que implicam uma ampla margem de apreciação para conciliar diversos objetivos por vezes contraditórios.

73

Resulta mais especificamente da referida jurisprudência que a aplicabilidade dos princípios de delegação dos poderes às agências estabelecidos por esta não depende do caráter individual ou geral dos atos que as agências estão habilitadas a adotar, mas apenas da questão de saber se a delegação incide sobre um amplo poder discricionário ou, pelo contrário, sobre poderes executivos enquadrados de forma precisa (v., neste sentido, Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Parlamento e Conselho, C‑270/12, EU:C:2014:18, n.os 54, 65 e 66).

74

Ora, como resulta dos considerandos 24 e 26 do Regulamento MUR, o regime instituído por este regulamento visa concretizar os princípios enunciados no Acórdão Meroni/Alta Autoridade e recordados no Acórdão de 22 de janeiro de 2014, Reino Unido/Parlamento e Conselho (C‑270/12, EU:C:2014:18).

75

É verdade que, nos termos do artigo 7.o, n.o 2, do Regulamento MUR, o CUR é responsável por adotar todas as decisões relacionadas com a resolução, nomeadamente, para as instituições financeiras e para os grupos considerados significativos para a estabilidade financeira na União, bem como para outros grupos transfronteiriços. Para esse efeito, o artigo 18.o, n.os 1 e 6, do Regulamento MUR dispõe que o CUR só adota um programa de resolução em relação a essas entidades e grupos se, após receção da comunicação da avaliação do BCE quanto à situação ou risco de insolvência da entidade em causa ou por sua própria iniciativa, considerar que se verificam as condições de resolução especificadas no artigo 18.o, n.o 1, alíneas a) a c), deste regulamento. Estas condições dizem respeito à situação ou risco de insolvência da entidade, à inexistência de medidas alternativas em relação à resolução, bem como à necessidade desta no interesse público.

76

Quando estas condições estiverem satisfeitas, o CUR adota, com base no artigo 18.o, n.o 6, do Regulamento MUR, um programa de resolução que coloca a entidade em causa sob resolução e determina a aplicação à entidade dos instrumentos de resolução referidos no artigo 22.o, n.o 2, desse regulamento, bem como a utilização do Fundo Único de Resolução. O artigo 22.o, n.o 4, do referido regulamento precisa que estes instrumentos podem, com exceção do instrumento de segregação de ativos, ser aplicados isoladamente ou combinados entre si para cumprir os objetivos da resolução especificados no artigo 14.o do mesmo regulamento, de acordo com os princípios da resolução especificados no artigo 15.o deste último.

77

Todavia, embora as disposições referidas nos dois números anteriores confiram ao CUR um amplo poder de apreciação quanto à questão de saber se e por que meios a entidade em causa deve ser objeto de um procedimento de resolução, esse poder está, nos termos do artigo 18.o, n.os 1 e 4 a 6, do Regulamento MUR, enquadrado por critérios e condições objetivos que delimitam o âmbito de ação do CUR e que dizem respeito tanto às condições como aos instrumentos de resolução. Além disso, esse regulamento prevê a participação da Comissão e do Conselho no processo conducente à adoção de um programa de resolução, que deve, para entrar em vigor, receber o aval da Comissão e, se for caso disso, do Conselho.

78

Assim, segundo o artigo 30.o, n.os 1 e 2, do Regulamento MUR, o CUR informa a Comissão de qualquer ação por si adotada em preparação de um processo de resolução e procede ao intercâmbio, com a Comissão e o Conselho, de todas as informações necessárias para o exercício das suas funções. Nos termos do artigo 43.o, n.o 3, deste regulamento, a Comissão designa um representante habilitado a participar nas reuniões das sessões plenárias e das sessões executivas do CUR, na qualidade de observador permanente, e este representante tem o direito de participar nos debates e tem acesso a todos os documentos.

79

Por outro lado, o artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento MUR enuncia, no seu primeiro parágrafo, que o CUR deve transmitir à Comissão o programa de resolução imediatamente após a sua adoção e, nos segundo e terceiro parágrafos, que, no prazo de 24 horas a contar dessa transmissão, a Comissão aprova o programa de resolução ou apresenta objeções sobre os aspetos discricionários desse programa, com exceção dos relacionados com o cumprimento do critério do interesse público e com o montante previsto para a utilização do Fundo Único de Resolução. Quanto a estes últimos aspetos discricionários, este terceiro parágrafo precisa que a Comissão pode, no prazo de doze horas a contar da referida transmissão, propor ao Conselho que formule objeções. Por último, o artigo 18.o, n.o 7, quinto parágrafo, do Regulamento MUR estabelece que o programa de resolução só pode entrar em vigor se não tiverem sido formuladas objeções pelo Conselho ou pela Comissão no prazo de 24 horas após a sua transmissão pelo CUR.

80

Assim, as disposições do artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento MUR subordinam a entrada em vigor do programa de resolução à sua aprovação pela Comissão, na falta de objeções por parte desta ou do Conselho. Quando a Comissão aprova um tal programa, deve então assumir plenamente as responsabilidades que lhe foram confiadas pelos Tratados.

81

Resulta dos n.os 75 a 80 do presente acórdão que as disposições do artigo 18.o do Regulamento MUR, com base nas quais o programa de resolução controvertido foi adotado, são suscetíveis de evitar uma «transferência da responsabilidade», na aceção da jurisprudência decorrente do Acórdão Meroni/Alta Autoridade. Com efeito, ao mesmo tempo que confiam ao CUR o poder de apreciar se as condições de adoção de um programa de resolução estão reunidas no caso vertente e o de determinar os instrumentos necessários para efeitos de um tal programa, essas disposições conferem à Comissão ou, se for caso disso, ao Conselho a responsabilidade pela apreciação final dos aspetos discricionários do programa de resolução que fazem parte da política da União em matéria de resolução das instituições de crédito e que, como resulta do artigo 14.o dos considerandos 24, 26 e 62 do Regulamento MUR, implicam uma ponderação de objetivos e de interesses diversos, relativos à preservação da estabilidade financeira da União e da integridade do mercado interno, à tomada em consideração da soberania orçamental dos Estados‑Membros e à proteção dos interesses dos acionistas e dos credores.

82

No que respeita, em terceiro lugar, aos poderes do CUR, importa salientar que a interpretação feita pelo Tribunal Geral nos n.os 129 e 130 do acórdão recorrido, segundo a qual um programa de resolução pode produzir efeitos jurídicos vinculativos independentemente da decisão de aprovação pela Comissão, viola tanto os poderes conferidos ao CUR pelo Regulamento MUR como a jurisprudência decorrente do Acórdão Meroni/Alta Autoridade.

83

Com efeito, embora os artigos 7.o e 18.o desse regulamento prevejam que o CUR é responsável pela elaboração e adoção de um programa de resolução, não lhe conferem por essa razãoo poder de adotar um ato que produza efeitos jurídicos autónomos. No âmbito do procedimento de resolução, tal como resulta do artigo 18.o do Regulamento MUR, a aprovação da Comissão constitui, como o Tribunal Geral salientou com razão no n.o 128 do acórdão recorrido, um elemento indispensável para a entrada em vigor do programa de resolução.

84

Esta aprovação é, também, decisiva para o conteúdo do programa de resolução em causa.

85

Com efeito, embora o artigo 18.o, n.o 7, do Regulamento MUR permita à Comissão aprovar esse programa sem ter formulado objeções sobre os aspetos discricionários do mesmo nem proposto ao Conselho que as formule, permite igualmente que a Comissão e o Conselho substituam a apreciação do CUR pela sua própria apreciação quanto a esses aspetos discricionários, apresenta objeções a seu respeito, caso em que o CUR é obrigado, por força do sétimo parágrafo desse artigo 18.o, n.o 7, a alterar, no prazo de oito horas, esse programa de acordo com as razões expostas pela Comissão ou pelo Conselho, e isto para que o referido programa entre em vigor.

86

Importa ainda salientar que, como resulta do artigo 18.o, n.o 8, deste regulamento, uma oposição do Conselho baseada no facto de o critério do interesse público não ser cumprido tem por efeito impedir, em definitivo, a resolução, ao abrigo do referido regulamento, da entidade em causa, devendo essa entidade ser liquidada de forma ordenada em conformidade com o direito nacional aplicável.

87

No presente processo, através da sua Decisão 2017/1246, a Comissão aprovou o programa de resolução controvertido. Como esta salientou expressamente no considerando 4 dessa decisão, ao aprovar este programa, a Comissão expressou que «concorda» com o conteúdo deste e com «os motivos, invocados pelo CUR, pelos quais a resolução é necessária para a defesa do interesse público». A este respeito, como a Comissão salientou na audiência, os aspetos discricionários de um programa de resolução, que se referem quer à instituição das condições de resolução quer à determinação dos instrumentos de resolução, estão indissociavelmente ligados aos aspetos mais técnicos da resolução. Contrariamente ao que o Tribunal Geral sustentou no n.o 137 do acórdão recorrido, não se pode, portanto, distinguir entre esses aspetos discricionários e esses aspetos técnicos, para efeitos de determinar o ato recorrível no contexto de um programa de resolução aprovado no seu conjunto pela Comissão.

88

Assim, apenas mediante a decisão de aprovação da Comissão é que a medida de resolução adotada pelo CUR no programa de resolução controvertido foi definitivamente fixada e que esta medida produziu efeitos jurídicos vinculativos, pelo que, tendo em conta, nomeadamente, os princípios enunciados no Acórdão Meroni/Alta Autoridade, é a Comissão, e não o CUR, que deve responder pela referida medida de resolução perante o juiz da União.

89

Resulta assim do seu conteúdo, do contexto da sua adoção e dos poderes do CUR que o programa de resolução controvertido não produziu efeitos jurídicos vinculativos suscetíveis de afetar os interesses de uma pessoa coletiva ou singular, pelo que não constitui um ato suscetível de ser objeto de um recurso de anulação ao abrigo do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE.

90

As considerações expostas pelo Tribunal Geral nos n.os 121 a 123 do acórdão recorrido não são suscetíveis de pôr em causa a apreciação que precede.

91

A este respeito, contrariamente ao que o Tribunal Geral declarou nesses números, não se pode deduzir do artigo 86.o, n.os 1 e 2, do Regulamento MUR que o programa de resolução controvertido pode ser objeto de recurso de anulação. Com efeito, como salienta a Comissão, as disposições de um regulamento não podem alterar o sistema de recursos previsto pelo Tratado FUE. Além disso, resulta dos próprios termos dessas disposições do Regulamento MUR que os recursos que visam devem ser interpostos no Tribunal de Justiça «ao abrigo do artigo 263.o [TFUE]», o que pressupõe que respeitem a condição, que ali figura, relativo ao caráter recorrível do ato impugnado.

92

É certo que, nos n.os 56 e 66 do Acórdão de 6 de maio de 2021, ABLV Bank e o./BCE (C‑551/19 P e C‑552/19 P, EU:C:2021:369), o Tribunal de Justiça declarou, em substância, que um programa de resolução pode, enquanto resultado final do processo complexo de resolução, ser objeto de fiscalização jurisdicional perante o juiz da União. Todavia, no processo que deu origem a esse acórdão, o Tribunal de Justiça foi chamado a apreciar a legalidade de uma decisão do Tribunal Geral que declarou inadmissíveis recursos de anulação interpostos, não desse programa, mas dos atos preparatórios do BCE que declararam a existência de uma situação ou de um risco de insolvência de entidades, na aceção do artigo 18.o, n.o 1, do Regulamento MUR. As considerações expostas nesses n.os 56 e 66 devem, assim, ser lidas à luz da jurisprudência constante do Tribunal de Justiça relativa aos processos complexos segundo a qual, perante atos cuja elaboração se efetua em várias etapas processuais, só constitui, em princípio, um ato suscetível de ser objeto de um recurso de anulação a medida que, no termo do processo, fixa definitivamente a posição da instituição, do órgão ou do organismo da União competente, com exclusão das medidas intermédias cujo objetivo é preparar essa medida definitiva e que não produzem efeitos jurídicos autónomos (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de novembro de 1981, IBM/Comissão, 60/81, EU:C:1981:264, n.o 10; de 3 de junho de 2021, Hungria/Parlamento, C‑650/18, EU:C:2021:426, n.os 43 e 46; e de 22 de setembro de 2022, IMG/Comissão, C‑619/20 P e C‑620/20 P, EU:C:2022:722, n.o 103).

93

Perante um tal procedimento complexo, os atos adotados no decurso das etapas preparatórias da adoção do ato definitivo não podem, quando não produzem efeitos jurídicos autónomos, ser objeto de um recurso de anulação.

94

Contrariamente ao que o Tribunal Geral declarou nos n.os 122 a 124 do acórdão recorrido, não se pode, portanto, deduzir do artigo 86.o do Regulamento MUR e do Acórdão de 6 de maio de 2021, ABLV Bank e o./BCE (C‑551/19 P e C‑552/19 P, EU:C:2021:369), que o programa de resolução controvertido é um ato suscetível de ser objeto de um recurso de anulação no Tribunal Geral, apesar de não ter constituído o resultado final do procedimento de resolução em causa, uma vez que este só se materializou na aprovação desse programa pela Comissão, e que, como resulta da análise que precede, não produziu efeitos jurídicos autónomos.

95

Também não podem pôr em causa a apreciação que precede as considerações expostas pelo Tribunal Geral nos n.os 146 e 147 do acórdão recorrido, segundo as quais a falta de reconhecimento do caráter recorrível do programa de resolução controvertido conduz a uma violação do direito das recorrentes em primeira instância a uma proteção jurisdicional efetiva.

96

Com efeito, uma decisão de aprovação da Comissão como a Decisão 2017/1246 apresenta, por seu turno, as características de um ato suscetível de ser objeto de um recurso de anulação ao abrigo do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE. Ora, no âmbito de um recurso de anulação de uma tal decisão, as pessoas singulares ou coletivas em causa podem invocar a ilegalidade do programa de resolução que essa instituição aprovou, conferindo‑lhe, assim, efeitos jurídicos vinculativos, o que é suscetível de lhes garantir uma proteção jurisdicional suficiente v., neste sentido, Acórdão de 13 de outubro de 2011, Deutsche Post e Alemanha/Comissão (C‑463/10 P e C‑475/10 P, EU:C:2011:656, n.os 53 e jurisprudência referida). A este respeito, importa precisar que, como resulta dos n.os 87 e 88 do presente acórdão, considera‑se que a Comissão, através dessa aprovação, faz seus os elementos e os fundamentos contidos nesse programa, pelo que deve, se for caso disso, responder perante o juiz da União.

97

Decorre de todas as considerações precedentes que o programa de resolução controvertido não constitui um ato recorrível, na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE.

98

Por conseguinte, há que anular o acórdão recorrido na parte em que declarou admissível o recurso de anulação deste programa.

Quanto ao segundo e terceiro fundamentos

99

Uma vez que o acórdão recorrido foi anulado com base no primeiro fundamento, não é necessário examinar o segundo e terceiro fundamentos do presente recurso.

Quanto ao recurso no Tribunal Geral

100

Em conformidade com o artigo 61.o, primeiro parágrafo, segundo período, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, este último pode, em caso de anulação da decisão do Tribunal Geral, decidir definitivamente o litígio, se este estiver em condições de ser julgado.

101

É o que acontece no caso vertente, uma vez que o Tribunal de Justiça dispõe de todos os elementos necessários para se pronunciar sobre a admissibilidade do recurso em primeira instância.

102

Pelos motivos expostos nos n.os 66 a 97 do presente acórdão, o programa de resolução controvertido não constitui um ato recorrível, na aceção do artigo 263.o, quarto parágrafo, TFUE.

103

Nestas circunstâncias, há que julgar inadmissível o recurso interposto no Tribunal Geral pela Fundación e pela SFL.

Quanto às despesas

104

Em conformidade com o disposto no artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas.

105

O artigo 138.o, n.o 1, deste regulamento, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral nos termos do artigo 184.o, n.o 1, deste regulamento, dispõe que a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

106

No caso em apreço, tendo a SFL sido vencida no presente recurso, deve, tendo em conta os pedidos da Comissão, ser condenada a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas por esta instituição no âmbito deste processo. Tendo a Fundación e a SFL sido vencidas no processo em primeira instância, devem, em conformidade com os pedidos do CUR e do Banco Santander, ser condenadas a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pelo CUR e pelo Banco Santander no âmbito deste último processo.

107

O artigo 138.o, n.o 3, do mesmo regulamento, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, deste, dispõe que, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma das partes suporta as suas próprias despesas. Tendo o CUR sido vencido quanto à admissibilidade do recurso, o único em causa no presente recurso, suportará as suas próprias despesas relativas ao presente recurso.

108

Nos termos do artigo 140.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, deste, os Estados‑Membros e as instituições que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas. Por conseguinte, o Reino de Espanha, o Parlamento e o Conselho, intervenientes em primeira instância, suportarão as suas próprias despesas relativas ao processo em primeira instância, bem como as despesas relativas ao presente recurso. A Comissão suportará, enquanto interveniente no processo em primeira instância, as suas próprias despesas referentes a esse processo.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

 

1)

O Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 1 de junho de 2022, Fundación Tatiana Pérez de Guzmán el Bueno e SFL/CRU (T‑481/17, EU:T:2022:311) é anulado na parte em que declara admissível o recurso de anulação, interposto pela Fundación Tatiana Pérez de Guzmán el Bueno e pela Stiftung für Forschung und Lehre (SFL), da Decisão SRB/EES/2017/08 do Conselho Único de Resolução, de 7 de junho de 2017, com respeito à adoção de um programa de resolução em relação ao Banco Popular Español, S.A.

 

2)

O recurso de anulação, interposto pela Fundación Tatiana Pérez de Guzmán el Bueno e pela Stiftung für Forschung und Lehre (SFL), da Decisão SRB/EES/2017/08 é julgado inadmissível.

 

3)

A Fundación Tatiana Pérez de Guzmán el Bueno e a Stiftung für Forschung und Lehre (SFL) são condenadas a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas do Conselho Único de Resolução (CUR) e do Banco Santander SA, relativas ao processo em primeira instância. A SFL suporta as suas próprias despesas, bem como as despesas da Comissão Europeia relativas ao presente recurso de decisão do Tribunal Geral.

 

4)

O Conselho Único de Resolução suporta as suas próprias despesas relativas ao presente recurso de decisão do Tribunal Geral.

 

5)

O Reino de Espanha, o Parlamento Europeu e o Conselho da União Europeia suportam as suas próprias despesas relativas ao processo em primeira instância e ao presente recurso de decisão do Tribunal Geral. A Comissão Europeia suporta as suas próprias despesas relativas ao processo em primeira instância.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: espanhol.

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