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Document 62019CJ0928

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 2 de setembro de 2021.
European Federation of Public Service Unions (EPSU) contra Comissão Europeia.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Direito institucional — Política social — Artigos 154.o e 155.o TFUE — Diálogo entre os parceiros sociais ao nível da União Europeia — Informação e consulta dos funcionários e agentes das administrações dos governos centrais dos Estados‑Membros — Acordo celebrado entre os parceiros sociais — Pedido conjunto das partes signatárias desse acordo com vista à sua aplicação ao nível da União — Recusa da Comissão Europeia de submeter ao Conselho da União Europeia uma proposta de decisão — Grau de fiscalização jurisdicional — Dever de fundamentação da decisão de recusa.
Processo C-928/19 P.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2021:656

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

2 de setembro de 2021 ( *1 )

[Texto retificado por Despacho de 29 de setembro de 2021]

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Direito institucional — Política social — Artigos 154.o e 155.o TFUE — Diálogo entre os parceiros sociais ao nível da União Europeia — Informação e consulta dos funcionários e agentes das administrações dos governos centrais dos Estados‑Membros — Acordo celebrado entre os parceiros sociais — Pedido conjunto das partes signatárias desse acordo com vista à sua aplicação ao nível da União — Recusa da Comissão Europeia de submeter ao Conselho da União Europeia uma proposta de decisão — Grau de fiscalização jurisdicional — Dever de fundamentação da decisão de recusa»

No processo C‑928/19 P,

que tem por objeto um recurso de um acórdão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 19 de dezembro de 2019,

European Federation of Public Service Unions (EPSU), com sede em Bruxelas (Bélgica), representada por R. Arthur, solicitor, e K. Apps, barrister,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

Jan Willem Goudriaan, residente em Bruxelas, representado por R. Arthur, solicitor, e K. Apps, barrister,

recorrente em primeira instância,

Comissão Europeia, representada por I. Martínez del Peral, M. Kellerbauer e B.‑R. Killmann, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, R. Silva de Lapuerta, vice‑presidente, A. Prechal, M. Vilaras, E. Regan, N. Piçarra e A. Kumin, presidentes de secção, E. Juhász, M. Safjan, S. Rodin, F. Biltgen, K. Jürimäe, C. Lycourgos, P. G. Xuereb e N. Jääskinen (relator), juízes,

advogado‑geral: P. Pikamäe,

secretário: M. Longar, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 26 de outubro de 2020,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 20 de janeiro de 2021,

profere o presente

Acórdão

1

Com o seu recurso, a European Federation of Public Service Unions (EPSU) pede a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 24 de outubro de 2019, EPSU e Goudriaan/Comissão (T‑310/18, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2019:757), pelo qual este negou provimento ao recurso de anulação da Decisão da Comissão Europeia de 5 de março de 2018 (a seguir «decisão controvertida») que recusou apresentar ao Conselho da União Europeia uma proposta de decisão de aplicação ao nível da União do acordo intitulado «Quadro geral para a informação e consulta dos funcionários e [dos] agentes das administrações dos governos centrais [dos Estados‑Membros]», celebrado entre a Delegação Sindical da Administração Nacional e Europeia (DSANE) e os Empregadores da Administração Pública Europeia (EAPE) (a seguir «acordo em causa»).

Quadro jurídico

2

Nos termos do artigo 151.o TFUE:

«A União [Europeia] e os Estados‑Membros, tendo presentes os direitos sociais fundamentais, tal como os enunciam a Carta Social Europeia, assinada em Turim, em 18 de outubro de 1961, e a Carta Comunitária dos Direitos Sociais Fundamentais dos Trabalhadores, de 1989, terão por objetivos a promoção do emprego, a melhoria das condições de vida e de trabalho, de modo a permitir a sua harmonização, assegurando simultaneamente essa melhoria, uma proteção social adequada, o diálogo entre parceiros sociais, o desenvolvimento dos recursos humanos, tendo em vista um nível de emprego elevado e duradouro, e a luta contra as exclusões.

Para o efeito, a União e os Estados‑Membros desenvolverão ações que tenham em conta a diversidade das práticas nacionais, em especial no domínio das relações contratuais, e a necessidade de manter a capacidade concorrencial da economia da União.

A União e os Estados‑Membros consideram que esse desenvolvimento decorrerá não apenas do funcionamento do mercado interno, que favorecerá a harmonização dos sistemas sociais, mas igualmente dos processos previstos nos Tratados e da aproximação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas.»

3

Em conformidade com o artigo 152.o, primeiro parágrafo, TFUE:

«A União reconhece e promove o papel dos parceiros sociais ao nível da União, tendo em conta a diversidade dos sistemas nacionais. A União facilita o diálogo entre os parceiros sociais, no respeito pela sua autonomia.»

4

O artigo 153.o, n.o 1, alínea e), TFUE prevê:

«1.   A fim de realizar os objetivos enunciados no artigo 151.o, a União apoiará e completará a ação dos Estados‑Membros nos seguintes domínios:

[…]

e)

Informação e consulta dos trabalhadores;

[…]»

5

O artigo 154.o TFUE estabelece:

«1.   À Comissão caberá promover a consulta dos parceiros sociais ao nível da União e tomar todas as medidas necessárias para facilitar o seu diálogo, assegurando um apoio equilibrado às partes.

2.   Para o efeito, antes de apresentar propostas no domínio da política social, a Comissão consultará os parceiros sociais sobre a possível orientação da ação da União.

3.   Se, após essa consulta, a Comissão considerar desejável uma ação da União, consultará os parceiros sociais sobre o conteúdo da proposta prevista. Estes enviarão à Comissão um parecer ou, quando adequado, uma recomendação.

4.   Por ocasião das consultas a que se referem os n.os 2 e 3, os parceiros sociais podem informar a Comissão do seu desejo de dar início ao processo previsto no artigo 155.o A duração deste não pode exceder nove meses, salvo prorrogação decidida em comum por esses parceiros sociais e pela Comissão.»

6

O artigo 155.o TFUE dispõe:

«1.   O diálogo entre os parceiros sociais ao nível da União pode conduzir, se estes o entenderem desejável, a relações contratuais, incluindo acordos.

2.   Os acordos celebrados ao nível da União serão aplicados, quer de acordo com os processos e práticas próprios dos parceiros sociais e dos Estados‑Membros quer, nas matérias abrangidas pelo artigo 153.o, a pedido conjunto das partes signatárias, com base em decisão adotada pelo Conselho, sob proposta da Comissão. O Parlamento Europeu é informado dessa adoção.

O Conselho delibera por unanimidade sempre que o acordo em questão contiver uma ou mais disposições relativas a um dos domínios em relação aos quais por força do n.o 2 do artigo 153.o, seja exigida a unanimidade.»

Antecedentes do litígio e decisão controvertida

7

Os antecedentes do litígio constam dos n.os 1 a 6 do acórdão recorrido e podem, para efeitos do presente processo, ser resumidos da seguinte forma.

8

Através do Documento de Consulta C(2015) 2303 final, de 10 de abril de 2015, intitulado «Primeira fase de consulta dos parceiros sociais nos termos do artigo [154.o TFUE] a respeito da consolidação das diretivas da União sobre a informação e consulta dos trabalhadores», a Comissão convidou os parceiros sociais, com base no artigo 154.o, n.o 2, TFUE, a pronunciarem‑se sobre a possível orientação de uma ação da União para consolidação da Diretiva 98/59/CE do Conselho, de 20 de julho de 1998, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes aos despedimentos coletivos (JO 1998, L 225, p. 16), da Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados‑Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos (JO 2001, L 82, p. 16), e da Diretiva 2002/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2002, que estabelece um quadro geral relativo à informação e à consulta dos trabalhadores na Comunidade Europeia — Declaração Conjunta do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão sobre representação dos trabalhadores (JO 2002, L 80, p. 29) (a seguir, conjuntamente, «diretivas sobre a informação e a consulta dos trabalhadores»). Essa consulta incidia, nomeadamente, sobre a eventual extensão do âmbito de aplicação dessas diretivas sobre a informação e a consulta dos trabalhadores aos funcionários e aos agentes das administrações públicas dos governos centrais dos Estados‑Membros.

9

Em 2 de junho de 2015, os parceiros sociais com assento no Comité de diálogo social para as administrações dos governos centrais, a saber, por um lado, a DSANE e, por outro, os EAPE, informaram, com base no artigo 154.o, n.o 4, TFUE, a Comissão da sua vontade de negociar e celebrar um acordo com base no artigo 155.o, n.o 1, TFUE.

10

Em 21 de dezembro de 2015, a DSANE e os EAPE assinaram o acordo em causa.

11

Por carta de 1 de fevereiro de 2016, a DSANE e os EAPE pediram em conjunto à Comissão que apresentasse ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação do acordo em causa ao nível da União, com base no artigo 155.o, n.o 2, TFUE.

12

Em 5 de março de 2018, a Comissão adotou a decisão controvertida, pela qual recusou apresentar ao Conselho essa proposta de decisão.

13

Na decisão controvertida, em primeiro lugar, a Comissão declarou, em substância, que as administrações dos governos centrais dos Estados‑Membros estavam sob a autoridade desses governos, que exerciam prerrogativas de poder público e que a sua estrutura, organização e funcionamento eram inteiramente da competência dos Estados‑Membros. Em segundo lugar, a Comissão observou que já existiam em muitos Estados‑Membros disposições que asseguravam um certo grau de informação e de consulta dos funcionários e dos agentes dessas administrações. Em terceiro lugar, a Comissão considerou que a importância das mesmas administrações dependia do grau de centralização ou de descentralização dos Estados‑Membros, de modo que, se o acordo em causa fosse aplicado através de uma decisão do Conselho, o nível de proteção dos funcionários e dos agentes em causa variaria consideravelmente consoante os Estados‑Membros.

Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

14

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 15 de maio de 2018, a EPSU, associação que agrupa organizações sindicais europeias representativas dos trabalhadores dos serviços públicos e que criou a DSANE conjuntamente com a Confederação Europeia dos Sindicatos independentes (CESI), e Jan Willem Goudriaan, secretário‑geral da EPSU (a seguir, conjuntamente, «recorrentes em primeira instância»), pediram a anulação da decisão controvertida.

15

Em apoio do seu recurso, os recorrentes em primeira instância invocaram dois fundamentos. Com o seu primeiro fundamento, relativo a um erro de direito quanto ao alcance dos poderes da Comissão, alegaram, em substância, que, por força do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, a Comissão não podia recusar apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação do acordo em causa ao nível da União. O seu segundo fundamento era relativo ao caráter insuficiente e manifestamente errado dos motivos da decisão controvertida.

16

[Conforme retificado por Despacho de 29 de setembro de 2021] Com o acórdão recorrido, o Tribunal Geral negou provimento ao recurso dos recorrentes em primeira instância na sua totalidade e condenou cada parte a suportar as suas próprias despesas.

17

Em especial, no que respeita ao exame do referido recurso quanto ao mérito, o Tribunal Geral julgou improcedente o primeiro fundamento, efetuando, nomeadamente, nos n.os 49 a 90 do acórdão recorrido, uma interpretação literal, contextual e teleológica do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, para daí concluir que as instituições da União não são obrigadas a dar seguimento a um pedido conjunto, apresentado pelas partes signatárias de um acordo, destinado à aplicação desse acordo ao nível da União. Em seguida, examinou, nos n.os 91 a 102 desse acórdão, as regras, os princípios e os objetivos da União invocados pelos recorrentes em primeira instância em apoio da sua interpretação desta disposição. O Tribunal Geral concluiu, no n.o 104 do referido acórdão, que, ao recusar apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação do acordo em causa ao nível da União, a Comissão não tinha cometido um erro de direito quanto ao alcance dos seus poderes.

18

No que respeita ao segundo fundamento do recurso, o Tribunal Geral analisou, nos n.os 106 a 140 do acórdão recorrido, o cumprimento pela Comissão, na decisão controvertida, do dever de fundamentação previsto no artigo 296.o TFUE e a procedência dos motivos dessa decisão. Após ter considerado que a decisão controvertida devia ser objeto de fiscalização restrita, o Tribunal Geral entendeu que a decisão controvertida cumpria o dever de fundamentação previsto no artigo 296.o TFUE e que os três motivos da referida decisão contestados eram procedentes.

Pedidos das partes no Tribunal de Justiça

19

Com o seu recurso, a EPSU pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido;

anular a decisão controvertida; e

condenar a Comissão nas despesas do processo em primeira instância e do presente recurso.

20

A Comissão pede que o Tribunal de Justiça se digne:

negar provimento ao recurso; e

condenar a EPSU nas despesas.

21

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal de Justiça em 2 de março de 2020, J. Goudriaan informou o Tribunal de Justiça de que não pretendia ser parte no processo de recurso.

Quanto ao presente recurso

22

Em apoio do seu recurso, a EPSU invoca quatro fundamentos.

23

Há que examinar sucessivamente o segundo, primeiro, terceiro e quarto fundamentos de recurso.

Quanto ao segundo fundamento, relativo a um erro de direito na aplicação dos artigos 154.o e 155.o TFUE

Argumentos das partes

24

Com o segundo fundamento de recurso, a EPSU alega que as interpretações literal, contextual e teleológica dos artigos 154.o e 155.o TFUE efetuadas pelo Tribunal Geral estão viciadas de erros de direito no que respeita, nomeadamente, aos poderes conferidos à Comissão no procedimento relativo à aplicação dos acordos celebrados entre os parceiros sociais ao nível da União nos termos do artigo 155.o, n.o 2, TFUE. A este respeito, a EPSU sustenta, em substância, que, por força desta última disposição, a menos que se demonstre uma insuficiente representatividade das partes signatárias de um acordo ou a ilegalidade das cláusulas desse acordo, a Comissão é obrigada a deferir um pedido conjunto dessas partes signatárias com vista à aplicação ao nível da União do referido acordo e a apresentar ao Conselho uma proposta de decisão para esse efeito.

25

No que respeita, em primeiro lugar, à interpretação literal do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, a EPSU sustenta que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito nos n.os 49 a 63 do acórdão recorrido. A este respeito, alega que os termos «shall be implemented», utilizados na versão inglesa desta disposição, exprimem a obrigação de a Comissão apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação ao nível da União do acordo celebrado entre os parceiros sociais em causa. A EPSU sustenta igualmente que o facto de os dois métodos de aplicação de um acordo entre parceiros sociais nos termos do artigo 155.o, n.o 2, TFUE terem sido agrupados na mesma frase não atenua o caráter vinculativo das obrigações das instituições no âmbito do segundo procedimento, dado que quem escolhe o método a adotar são os parceiros sociais e não as instituições.

26

No que respeita, em segundo lugar, às interpretações contextual e teleológica do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, a EPSU alega que o Tribunal Geral cometeu erros de direito nos n.os 34, 62, 63, 69 a 82, 87, 89, 93 a 100 e 109 do acórdão recorrido.

27

Primeiro, a EPSU alega, em substância, que o Tribunal Geral ampliou erradamente o papel da Comissão em detrimento do dos parceiros sociais e do Conselho no âmbito do procedimento previsto nos artigos 154.o e 155.o TFUE.

28

Segundo, a EPSU contesta a interpretação efetuada pelo Tribunal Geral, nos n.os 74 a 77, 87 e 96 do acórdão recorrido, relativa à tramitação do procedimento previsto nos artigos 154.o e 155.o TFUE.

29

Terceiro, a EPSU sustenta que o Tribunal Geral, nos n.os 74 a 76 do acórdão recorrido, interpretou erradamente o n.o 84 do Acórdão de 17 de junho de 1998, UEAPME/Conselho (T‑135/96, EU:T:1998:128), do qual resulta que os poderes da Comissão no âmbito do procedimento previsto nos artigos 154.o e 155.o TFUE se limitam à fiscalização da representatividade dos parceiros sociais signatários do acordo em causa e à fiscalização da legalidade das cláusulas deste acordo, uma vez que, nesse acórdão, não é, em contrapartida, mencionada nenhuma fiscalização da oportunidade de apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação do referido acordo ao nível da União.

30

Quarto, a EPSU alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, nos n.os 82 e 94 a 98 do acórdão recorrido, na sua definição do papel do Parlamento no âmbito do procedimento previsto nos artigos 154.o e 155.o TFUE relativamente ao papel reservado aos parceiros sociais. A este respeito, a EPSU, baseando‑se, nomeadamente, no n.o 89 do Acórdão de 17 de junho de 1998, UEAPME/Conselho (T‑135/96, EU:T:1998:128), alega que os poderes do Parlamento e dos parceiros sociais são diferentes e complementares.

31

A Comissão refuta as alegações da EPSU e subscreve a interpretação dos artigos 154.o e 155.o TFUE, bem como do Acórdão de 17 de junho de 1998, UEAPME/Conselho (T‑135/96, EU:T:1998:128), adotada pelo Tribunal Geral.

Apreciação do Tribunal de Justiça

32

Em primeiro lugar, no que respeita às alegações da EPSU relativas a uma interpretação literal errada do artigo 155.o, n.o 2, TFUE cometida pelo Tribunal Geral, há que salientar que resulta da redação desta disposição que a aplicação dos acordos celebrados entre parceiros sociais ao nível da União ocorre quer de acordo com os processos e práticas próprios destes e dos Estados‑Membros quer, nas matérias abrangidas pelo artigo 153.o TFUE, a pedido conjunto das partes signatárias desses acordos, com base em decisão adotada pelo Conselho, sob proposta da Comissão.

33

Assim, como o Tribunal Geral salientou com razão, no n.o 59 do acórdão recorrido, a utilização das fórmulas imperativas «intervient», na versão francesa do artigo 155.o, n.o 2, primeiro parágrafo, TFUE, ou «shall be implemented», na versão inglesa desta disposição, pode ter por função precisar que um acordo celebrado ao nível da União entre os parceiros sociais deve obrigatoriamente ser aplicado através de um dos dois processos alternativos, a saber, de acordo com os processos e práticas próprios dos parceiros sociais ou dos Estados‑Membros ou, nas matérias abrangidas pelo artigo 153.o TFUE, segundo um procedimento específico conducente à adoção de um ato da União.

34

Em especial, no que respeita à aplicação de tal acordo ao nível da União, há que salientar que o artigo 155.o, n.o 2, primeiro parágrafo, TFUE se limita a dispor que essa aplicação pode assumir a forma da adoção de uma decisão do Conselho tomada a pedido conjunto das partes signatárias do acordo em causa e sob proposta da Comissão, sem indicar se esta última é obrigada a apresentar tal proposta ao Conselho.

35

Daqui resulta que o Tribunal Geral não pode ser criticado por ter declarado, no n.o 60 do acórdão recorrido, que as fórmulas imperativas utilizadas na versão em língua francesa do artigo 155.o, n.o 2, primeiro parágrafo, TFUE «intervient» e na versão em língua inglesa desta disposição «shall be implemented» não permitem, por si só, concluir que a Comissão é obrigada a apresentar ao Conselho uma proposta de decisão quando lhe é submetido um pedido conjunto nesse sentido pelas partes signatárias de um acordo.

36

Esta conclusão não pode ser posta em causa pela argumentação, de resto não sustentada, da EPSU, segundo a qual o facto de, no artigo 155.o, n.o 2, TFUE, serem mencionados na mesma frase os dois procedimentos previstos para a aplicação de um acordo entre parceiros sociais não é suscetível de atenuar o caráter vinculativo das obrigações das instituições da União decorrentes do segundo procedimento. A este respeito, importa salientar, em especial, que a EPSU não indica as razões pelas quais do facto de a escolha inicial entre os procedimentos alternativos mencionados nessa frase competir aos parceiros sociais resulta que as fórmulas imperativas em causa visam especificamente o segundo procedimento, de modo que a Comissão é obrigada a apresentar tal proposta ao Conselho.

37

Por outro lado, foi com razão que o Tribunal Geral considerou, no n.o 62 do acórdão recorrido, que a interpretação literal do artigo 155.o, n.o 2, TFUE preconizada pelos recorrentes em primeira instância implicaria, além da obrigação de a Comissão, em qualquer circunstância, apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação ao nível da União do acordo celebrado entre os parceiros sociais, a obrigação de o Conselho aplicar esse acordo e adotar a decisão em causa.

38

Ora, há que salientar que a EPSU admite que a Comissão tem o direito de não apresentar tal proposta ao Conselho em determinadas circunstâncias, em caso de falta de representatividade dos parceiros sociais signatários do acordo em causa ou de ilegalidade das cláusulas desse acordo. Em especial, no que respeita ao Conselho, admitir a interpretação literal preconizada pelos recorrentes em primeira instância privaria de efeito útil o segundo parágrafo do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, que prevê que o Conselho delibera por unanimidade sobre a proposta da Comissão quando o acordo em questão contém disposições relativas a certos domínios, o que não teria nenhum sentido se o Conselho estivesse obrigado a adotar a decisão proposta pela Comissão.

39

Por último, há que salientar que o Tribunal Geral, no n.o 63 do acórdão recorrido, considerou que a interpretação defendida pelos recorrentes em primeira instância implicaria que, quando os parceiros sociais não apresentem um pedido conjunto de aplicação de um acordo ao nível da União, os parceiros sociais e os Estados‑Membros são obrigados a aplicar esse acordo ao seu nível de acordo com os seus processos e práticas próprios, o que seria contrário à intenção dos onze Estados‑Membros signatários do Acordo sobre a política social celebrado entre os Estados‑Membros da Comunidade Europeia com exceção do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte (JO 1992, C 191, p. 91). Ora, embora a EPSU afirme, no seu recurso, que o Tribunal Geral fez uma interpretação incorreta do contexto factual admitido pela EAPE, há que constatar que este argumento não está fundamentado de forma nenhuma e também não põe em causa a conclusão do Tribunal Geral, no mesmo número do acórdão recorrido, relativa à Declaração n.o 2 anexa a esse acordo.

40

Por conseguinte, o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito no âmbito da interpretação literal do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, que põe em evidência que as fórmulas imperativas utilizadas nas versões em língua francesa e inglesa visam unicamente exprimir o caráter exclusivo dos dois procedimentos alternativos previstos nesta disposição, o que é, por outro lado, corroborado por várias outras versões linguísticas desta disposição, como foi salientado pelo advogado‑geral no n.o 49 das suas conclusões.

41

Em segundo lugar, no que respeita às alegações da EPSU relativas à interpretação contextual e teleológica errada do artigo 155.o, n.o 2, TFUE realizada pelo Tribunal Geral, a EPSU sustenta, primeiro, que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, nos n.os 34, 63 a 81 e 93 do acórdão recorrido, na sua interpretação do artigo 17.o, n.os 1 e 2, TUE, porquanto entende que esta disposição geral não pode ampliar as competências da Comissão para além dos limites estabelecidos nos artigos 154.o e 155.o TFUE, uma vez que estes artigos constituem uma lex specialis.

42

Ora, há que salientar que a EPSU não explica as razões pelas quais os artigos 154.o e 155.o TFUE devem ser considerados uma lex specialis em relação ao artigo 17.o, n.os 1 e 2, TUE. Limita‑se a afirmar que o artigo 17.o TUE não pode prevalecer sobre os artigos 154.o e 155.o TFUE.

43

Por outro lado, também não resulta desses números do acórdão recorrido que o Tribunal Geral se tenha afastado dos artigos 154.o e 155.o TFUE para aplicar o artigo 17.o TUE em vez dessas disposições. Pelo contrário, o Tribunal Geral considerou corretamente, no n.o 93 do acórdão recorrido, que, «ao fazer uma apreciação da oportunidade de aplicar, a nível da União, um acordo celebrado pelos parceiros sociais, a Comissão [se limita] a exercer as prerrogativas que lhe confere o artigo 155.o, n.o 2, primeiro parágrafo, TFUE, conjugado com o artigo 17.o, n.os 1 a 3, TUE».

44

De resto, importa salientar que o poder de propor a aplicação, ao nível da União, de um acordo celebrado entre parceiros sociais, na aceção do artigo 155.o, n.o 2, primeiro parágrafo, TFUE, se insere no âmbito dos poderes conferidos pelos Tratados à Comissão, nomeadamente no artigo 17.o TUE.

45

A este respeito, os poderes conferidos pelos Tratados à Comissão consistem, nomeadamente, em promover, nos termos do artigo 17.o, n.o 1, TUE, o interesse geral da União e tomar, se necessário, iniciativas adequadas para esse efeito.

46

No domínio específico da política social, o título X da terceira parte do Tratado FUE tem designadamente por finalidade, como recordou o advogado‑geral no n.o 73 das suas conclusões, promover o papel dos parceiros sociais e facilitar o diálogo entre eles, no respeito pela sua autonomia, e o artigo 154.o, n.o 1, TFUE dispõe que a Comissão tem, nomeadamente, por missão promover a consulta dos parceiros sociais ao nível da União. Além disso, no contexto específico da aplicação de acordos celebrados entre parceiros sociais ao nível da União, o artigo 155.o, n.o 2, TFUE conferiu aos parceiros sociais um direito comparável àquele de que dispõem de forma mais geral, por força, respetivamente, dos artigos 225.o e 241.o TFUE, o Parlamento e o Conselho de solicitar à Comissão que apresente propostas adequadas para efeitos da aplicação dos Tratados.

47

Todavia, com os termos «sob proposta da Comissão», o artigo 155.o, n.o 2, TFUE confere a esta instituição uma competência específica que, mesmo que só possa ser exercida na sequência de um pedido conjunto dos parceiros sociais, se assemelha, uma vez feito esse pedido, ao poder de iniciativa geral previsto no artigo 17.o, n.o 2, TUE para a adoção dos atos legislativos, uma vez que a existência de uma proposta da Comissão é uma condição prévia à adoção de uma decisão pelo Conselho ao abrigo desta disposição. Esta competência insere‑se no âmbito da missão atribuída à Comissão no artigo 17.o, n.o 1, TUE, que consiste, no presente contexto, em apreciar, tendo em conta o interesse geral da União, a oportunidade de apresentar uma proposta ao Conselho com base num acordo celebrado entre parceiros sociais com vista à sua aplicação ao nível da União.

48

A este respeito, cumpre igualmente recordar que, nos termos do artigo 13.o, n.o 2, TUE, cada instituição da União atua dentro dos limites das atribuições que lhe são conferidas pelos Tratados, em conformidade com os procedimentos, condições e finalidades que estes estabelecem. Essa disposição traduz o princípio do equilíbrio institucional, característico da estrutura institucional da União, que implica que cada uma das instituições exerça as suas competências com respeito pelas das outras (Acórdão de 14 de abril de 2015, Conselho/Comissão, C‑409/13, EU:C:2015:217, n.o 64 e jurisprudência referida). Ora, o poder de iniciativa da Comissão previsto no artigo 17.o, n.o 2, TUE constitui uma das expressões deste princípio (Acórdão de 19 de dezembro de 2019, Puppinck e o./Comissão, C‑418/18 P, EU:C:2019:1113, n.o 60). O mesmo sucede, no contexto particular da aplicação de acordos celebrados entre parceiros sociais ao nível da União, com a competência específica conferida à Comissão pelo artigo 155.o, n.o 2, TFUE.

49

Assim, a interpretação do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, preconizada pela EPSU, poria em causa o referido equilíbrio e poderia entravar a realização pela Comissão da sua missão, recordada no n.o 45 do presente acórdão, que consiste em promover o interesse geral da União, em conformidade com o artigo 17.o, n.o 1, TUE. Com efeito, esta interpretação teria por resultado fazer prevalecer os interesses dos parceiros sociais signatários de um acordo sobre a função de promoção do interesse geral da União de que a Comissão está investida.

50

Por último, importa recordar que, nos termos do artigo 17.o, n.o 3, terceiro parágrafo, TUE, «[a] Comissão exerce as suas responsabilidades com total independência», «os membros da Comissão não solicitam nem aceitam instruções de nenhum Governo, instituição, órgão ou organismo». Ora, como foi corretamente considerado pelo Tribunal Geral no n.o 78 do acórdão recorrido, uma interpretação do artigo 155.o, n.o 2, TUE segundo a qual a Comissão estaria obrigada, no exercício do seu poder de iniciativa, a apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação ao nível da União do acordo celebrado entre os parceiros sociais seria contrária ao princípio da independência da Comissão no exercício das suas responsabilidades, tal como consagrado no artigo 17.o, n.o 3, terceiro parágrafo, TUE.

51

Esta conclusão não pode ser posta em causa pela argumentação da EPSU segundo a qual a independência da Comissão é preservada, uma vez que esta instituição pode, em todo o caso, apresentar ao Conselho a sua posição através de uma «exposição de motivos». Com efeito, a exposição de motivos que acompanha uma proposta da Comissão apenas indica os motivos que justificam essa proposta.

52

Tendo em conta todas as considerações anteriores, há que salientar que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito, nos n.os 34, 63 a 81 e 93 do acórdão recorrido, na sua interpretação do artigo 17.o, n.os 1 a 3, TUE. Com efeito, o Tribunal Geral não ampliou o papel da Comissão em detrimento do dos parceiros sociais e do Conselho no âmbito do procedimento previsto nos artigos 154.o e 155.o TFUE.

53

Segundo, no que respeita à argumentação da EPSU de que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito nos n.os 74 a 77 e 87 do acórdão recorrido ao considerar que, uma vez que os parceiros sociais tenham celebrado um acordo, a Comissão «recupera o controlo do procedimento» para avaliar a oportunidade de apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação esse acordo ao nível da União, há que salientar que a EPSU se limita a censurar o Tribunal Geral por ter efetuado essa interpretação tendo em conta apenas a redação do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, sem tomar em consideração o objeto e o contexto dos artigos 154.o e 155.o TFUE.

54

A este respeito, importa observar que as considerações formuladas pelo Tribunal Geral no n.o 74 do acórdão recorrido resultam precisamente da análise efetuada por este, nos n.os 71 a 73 desse acórdão, no que respeita ao papel respetivo das instituições e dos parceiros sociais no âmbito das fases distintas, previstas nos artigos 154.o e 155.o TFUE, de consulta, de negociação e de aplicação ao nível da União dos acordos celebrados no domínio da política social.

55

Assim, o Tribunal Geral salientou com razão que, na fase de consulta iniciada pela Comissão e regida pelo artigo 154.o, n.os 2 e 3, TFUE, os parceiros sociais podem informar a Comissão do seu desejo de dar início ao procedimento previsto no artigo 155.o TFUE. Em seguida, durante a fase de negociação, os parceiros sociais podem, como previsto no artigo 155.o, n.o 1, TFUE, estabelecer relações contratuais, incluindo a celebração de acordos. Por último, dá‑se início à fase de aplicação do acordo em conformidade com um dos dois procedimentos previstos no artigo 155.o, n.o 2, TFUE. Em especial, no que respeita ao procedimento que permite a aplicação do acordo ao nível da União, esta disposição prevê expressamente que a decisão do Conselho é tomada «sob proposta da Comissão» e concretiza, no âmbito do processo não legislativo que institui, o poder de iniciativa da Comissão em conformidade com o artigo 17.o, n.o 2, TUE.

56

Daqui resulta que, para chegar à conclusão visada, no n.o 74 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral, nos n.os 71 a 73 desse acórdão, não se baseou exclusivamente na redação do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, mas teve igualmente em conta o contexto formado pelos artigos 154.o e 155.o TFUE e pelo artigo 17.o, n.o 2, TUE, considerados no seu conjunto, contexto esse que confirma, como constatado nos n.os 45 a 49 do presente acórdão, que, embora a iniciativa da fase de negociação e a celebração de um acordo incumbam exclusivamente aos parceiros sociais interessados, no âmbito da fase de aplicação desse acordo, com base no artigo 155.o, n.o 2, TFUE, compete à Comissão examinar se deve apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação desse acordo ao nível da União, recuperando assim a Comissão o controlo do procedimento.

57

Por conseguinte, há que afastar a argumentação da EPSU segundo a qual o Tribunal Geral cometeu um erro de direito no acórdão recorrido, ao considerar que, uma vez que os parceiros sociais celebraram um acordo e pediram a sua aplicação ao nível da União, a Comissão «recupera o controlo do procedimento».

58

Terceiro, a EPSU alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito no acórdão recorrido, na medida em que uma interpretação no sentido de que a Comissão exerce um poder discricionário de natureza «política» relativamente à oportunidade de apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação ao nível da União dos acordos celebrados entre parceiros sociais equivaleria a pôr em causa a autonomia destes últimos e a alterar a natureza do processo previsto no artigo 155.o TFUE, em violação dos direitos fundamentais reconhecidos aos parceiros sociais. A Comissão ocupa assim um «terceiro assento à mesa de negociações» e o Conselho está privado da possibilidade de exercer o seu poder de adotar ou não o texto do acordo celebrado entre os parceiros sociais cuja aplicação ao nível da União se pretende ao abrigo do artigo 155.o, n.o 2, TFUE.

59

Tal argumentação também não pode ser acolhida, uma vez que a EPSU faz uma interpretação errada desta última disposição no que respeita à articulação entre a fase de negociação e a fase de aplicação dos acordos negociados e celebrados pelos parceiros sociais ao nível da União.

60

É certo que o artigo 151.o, primeiro parágrafo, TFUE prevê que o «diálogo entre parceiros sociais» constitui um dos objetivos da União. Por outro lado, como salientado no n.o 46 do presente acórdão, as disposições do título X da terceira parte do Tratado FUE, relativas à «política social», têm por finalidade promover o papel dos parceiros sociais e facilitar o diálogo entre estes últimos, no respeito pela sua autonomia.

61

Esta autonomia, consagrada no artigo 152.o, primeiro parágrafo, TFUE, implica, como o Tribunal Geral salientou com razão no n.o 86 do acórdão recorrido, que, na fase de negociação de um acordo pelos parceiros sociais, que «incumbe exclusivamente» a estes últimos, estes possam dialogar e agir livremente, sem receber ordens ou instruções de ninguém, nomeadamente dos Estados‑Membros ou das instituições da União.

62

Ora, a existência dessa autonomia, que caracteriza a fase de negociação de um eventual acordo entre parceiros sociais, não significa que a Comissão deva apresentar automaticamente ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação, ao nível da União, de tal acordo a pedido conjunto desses parceiros, uma vez que isso equivaleria a reconhecer aos parceiros sociais um poder de iniciativa próprio que não lhes pertence.

63

Com efeito, como resulta do declarado nos n.os 47 a 49 do presente acórdão, se fosse essa a consequência da existência da referida autonomia, o equilíbrio institucional resultante dos artigos 154.o e 155.o TFUE seria alterado, conferindo aos parceiros sociais um poder em relação à Comissão, de que nem o Parlamento nem o Conselho dispõem.

64

Assim, o Tribunal Geral considerou acertadamente, no n.o 87 do acórdão recorrido, que, uma vez que parceiros sociais negociaram e celebraram livremente um acordo e as partes signatárias desse acordo pediram conjuntamente a sua aplicação ao nível da União, a Comissão «dispõe de novo do direito de intervir e recupera o controlo do procedimento», ao abrigo do artigo 155.o, n.o 2, TFUE.

65

Admitir a interpretação da EPSU equivaleria, assim, a confundir a fase de negociação do acordo em causa, no âmbito da qual os parceiros sociais gozam de total autonomia, que, no caso em apreço, foi respeitada, com a fase de aplicação deste acordo ao nível da União, no âmbito da qual estes já não intervêm, uma vez que, como o Tribunal Geral recordou no n.o 74 do acórdão recorrido, por força do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, «o Conselho atua sob proposta da Comissão».

66

Daqui resulta que o Tribunal Geral considerou acertadamente, no n.o 90 do acórdão recorrido, que o objetivo de promoção do papel dos parceiros sociais e do diálogo entre estes últimos, no respeito pela sua autonomia, previsto no Tratado FUE, não implica que a Comissão seja obrigada a dar seguimento a um pedido conjunto apresentado pelas partes signatárias de um acordo destinado à aplicação desse acordo ao nível da União ao abrigo do artigo 155.o, n.o 2, TFUE.

67

Por outro lado, importa recordar a importância primordial, no direito da União, do direito de negociar e celebrar convenções coletivas, o qual está consagrado no artigo 28.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (v., neste sentido, Acórdão de 15 de julho de 2010, Comissão/Alemanha, C‑271/08, EU:C:2010:426, n.o 37). No caso em apreço, este direito fundamental foi respeitado no âmbito da fase de negociação pelos parceiros sociais do acordo em causa. Por conseguinte, a EPSU não pode alegar que a interpretação do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, adotada pelo Tribunal Geral, que reconhece a existência de um poder decisório da Comissão na fase de aplicação do acordo em causa, na situação em que os parceiros sociais optam por submeter a esta instituição um pedido destinado a realizar essa aplicação ao nível da União, viola os direitos fundamentais destes últimos.

68

Tal alegação não pode, por maioria de razão, ser acolhida na medida em que, por força do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, a aplicação dos acordos celebrados ao nível da União pode, de qualquer modo, ocorrer de acordo com os processos e práticas próprios dos parceiros sociais e dos Estados‑Membros.

69

Em todo o caso, há que observar que a argumentação pela qual a EPSU critica o Tribunal Geral por se ter afastado, sem razão, da sua própria jurisprudência resultante do Acórdão de 17 de junho de 1998, UEAPME/Conselho (T‑135/96, EU:T:1998:128), pelo facto de resultar desse acórdão que os poderes da Comissão no âmbito da fase de aplicação de um acordo celebrado entre parceiros sociais ao nível da União, com base no artigo 155.o, n.o 2, TFUE, estão limitados à fiscalização da representatividade dos parceiros sociais signatários desse acordo e da legalidade do referido acordo, mas não se estendem à fiscalização da oportunidade de apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação desse acordo, assenta numa leitura errada do referido acórdão e, por conseguinte, é improcedente.

70

Com efeito, no Acórdão de 17 de junho de 1998, UEAPME/Conselho (T‑135/96, EU:T:1998:128), o Tribunal Geral, depois de ter salientado no seu n.o 84, que a Comissão recupera, após um pedido conjunto dos parceiros sociais de aplicação de um acordo ao nível da União, o controlo do procedimento, declarou expressamente, no n.o 85 desse acórdão, que a Comissão, no momento em que dispõe de novo do direito de intervir no desenrolar do procedimento, deve «designadamente» examinar a representatividade dos signatários do acordo, não tendo assim o Tribunal Geral excluído, de modo algum, que a Comissão dispunha de outras competências. Por outro lado, uma vez que a questão da apreciação, por esta instituição, da oportunidade da aplicação do acordo ao nível da União não se colocou no processo que deu origem ao referido acórdão, o Tribunal Geral não tinha de abordar este aspeto.

71

Daqui resulta que, contrariamente ao que afirma a EPSU, a expressão «se deve» utilizada no n.o 84 do Acórdão de 17 de junho de 1998, UEAPME/Conselho (T‑135/96, EU:T:1998:128), não pode ser interpretada no sentido de que limita os poderes conferidos à Comissão no âmbito da fase de aplicação de um acordo ao nível da União apenas à fiscalização da representatividade dos parceiros sociais e da legalidade das cláusulas do acordo.

72

Quarto, no que respeita à argumentação da EPSU no sentido de que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito nos n.os 82 e 94 a 98 do acórdão recorrido, no que respeita à definição do papel do Parlamento no âmbito do procedimento previsto nos artigos 154.o e 155.o TFUE em relação ao reservado aos parceiros sociais, há que salientar que, com esta argumentação, a EPSU contesta, na realidade, as considerações do Tribunal Geral expostas no n.o 82 do acórdão recorrido, sem formular a mínima crítica no que respeita às desenvolvidas nos n.os 94 a 98 desse acórdão, relativas ao princípio da democracia, consagrado no artigo 10.o, n.os 1 e 2, TUE, e ao pretenso princípio de «subsidiariedade horizontal».

73

No que respeita ao n.o 82 do acórdão recorrido, na medida em que os recorrentes em primeira instância alegavam que os parceiros sociais têm o poder de obrigar a Comissão a apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação dos seus acordos ao nível da União, o Tribunal Geral salientou com razão que, se tal interpretação fosse acolhida, os parceiros sociais exerceriam uma maior influência no conteúdo dos atos jurídicos adotados em matéria de política social, com base nos artigos 154.o e 155.o TFUE, do que a que poderia ser exercida pelo Parlamento, que, em aplicação do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, deve ser simplesmente informado antes da adoção dos atos jurídicos.

74

Por outro lado, o Tribunal Geral considerou acertadamente que a interpretação defendida pelos recorrentes em primeira instância teria por resultado que os parceiros sociais teriam o poder de obrigar a Comissão a agir no domínio da política social, ao passo que o artigo 225.o TFUE confere simplesmente ao Parlamento o direito de solicitar à Comissão que lhe submeta «todas as proposta adequadas sobre as questões que se lhe afigure requererem a elaboração de atos da União para efeitos de aplicação dos Tratados» e, caso a Comissão não apresente uma proposta, o direito de que esta o informe dos motivos para tal. Do mesmo modo, nos termos do artigo 241.o TFUE, o Conselho pode simplesmente solicitar à Comissão que proceda a todos os estudos que ele considere oportunos para realização dos objetivos comuns e que lhe submeta todas as propostas adequadas e, caso a Comissão não apresente uma proposta, tem o direito de que esta o informe dos motivos para tal. Esta conclusão não pode ser posta em causa pela argumentação da EPSU segundo a qual os parceiros sociais negoceiam, redigem e aprovam o texto do acordo em causa de forma autónoma e o Parlamento participa sempre nesse procedimento, uma vez que a Comissão é obrigada a informá‑lo.

75

Resulta de todas as considerações precedentes que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito no que respeita às interpretações literal, contextual e teleológica do artigo 155.o, n.o 2, TFUE e também não alterou o equilíbrio institucional resultante dos artigos 154.o e 155.o TFUE, contrariamente ao que sustenta a EPSU.

76

Esta conclusão não pode ser posta em causa pela argumentação geral da EPSU segundo a qual o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao não aplicar os princípios enunciados no n.o 70 do Acórdão de 14 de abril de 2015, Conselho/Comissão (C‑409/13, EU:C:2015:217).

77

A este respeito, importa recordar que, no n.o 70 do Acórdão de 14 de abril de 2015, Conselho/Comissão (C‑409/13, EU:C:2015:217), o Tribunal de Justiça declarou que o poder de iniciativa legislativa reconhecido à Comissão no artigo 17.o, n.o 2, TUE e no artigo 289.o TFUE implica que cabe a esta instituição decidir apresentar, ou não, uma proposta de ato legislativo, salvo no caso de estar obrigada a tal, por força do direito da União.

78

É certo que decorre do Acórdão de 14 de abril de 2015, Conselho/Comissão (C‑409/13, EU:C:2015:217), que existem situações previstas nos Tratados em que a Comissão é obrigada a apresentar uma proposta legislativa.

79

Todavia, a EPSU não fundamenta a sua argumentação segundo a qual, por força da jurisprudência resultante desse acórdão, a aplicação, ao nível da União, de um acordo celebrado entre os parceiros sociais nos termos do artigo 155.o, n.o 2, TFUE constitui uma situação deste tipo. Com efeito, limita‑se a afirmar que, por força desta disposição, a Comissão é obrigada a apresentar tal proposta e que cabe ao Conselho decidir, à luz do texto do acordo celebrado entre os parceiros sociais cuja aplicação ao nível da União é pretendida, se há que adotar esta proposta. Por conseguinte, esta argumentação deve ser afastada.

80

À luz das considerações precedentes, o segundo fundamento de recurso deve ser julgado globalmente improcedente.

Quanto ao primeiro fundamento, relativo a um erro de direito no que respeita à natureza legislativa dos atos jurídicos adotados com base no artigo 155.o, n.o 2, TFUE

Argumentos das partes

81

Com o primeiro fundamento de recurso, a EPSU alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito nos n.os 69, 73, 89, 96 e 100 do acórdão recorrido ao considerar que os atos jurídicos adotados por decisão do Conselho, nos termos do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, não são de natureza legislativa.

82

A este respeito, a EPSU alega, em primeiro lugar, que as «consequências» das diretivas adotadas por decisão do Conselho ao abrigo do artigo 155.o, n.o 2, TFUE não são diferentes das consequências das diretivas adotadas ao abrigo do artigo 153.o TFUE.

83

Em segundo lugar, a EPSU sustenta que, nos n.os 69 e 89 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral colocou a tónica na natureza da fase de aplicação do acordo em causa, com base no artigo 155.o, n.o 2, TFUE, e na qualificação do ato adotado ao abrigo desta disposição, e não nas «consequências substanciais» deste último. Por outro lado, sustenta que a conclusão do Tribunal Geral, formulada no n.o 96 do acórdão recorrido, é incompatível, por um lado, com as medidas adotadas nos termos do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, que conservam a sua natureza legislativa, e, por outro, com a jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa às diretivas adotadas no domínio da política social.

84

Em terceiro lugar, a EPSU alega que a fase de aplicação de um acordo celebrado entre parceiros sociais ao nível da União com base no artigo 155.o, n.o 2, TFUE constitui um «processo legislativo especial» na aceção do artigo 289.o, n.o 2, TFUE. Em seu entender, a referência ao Acórdão de 6 de setembro de 2017, Eslováquia e Hungria/Conselho (C‑643/15 e C‑647/15, EU:C:2017:631), efetuada pelo Tribunal Geral no n.o 69 do acórdão recorrido, não é pertinente e não pode privar as medidas adotadas em aplicação do artigo 155.o, n.o 2, TFUE da sua natureza «essencialmente legislativa».

85

A Comissão sustenta que o primeiro fundamento de recurso deve ser julgado inoperante e, em todo o caso, improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

86

A título preliminar, importa recordar que, no n.o 69 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral salientou, no âmbito da sua interpretação contextual do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, que, uma vez que esta disposição não contém nenhuma referência expressa ao «processo legislativo ordinário» ou ao «processo legislativo especial», na aceção do artigo 289.o, n.os 1 e 2, TFUE, a fase de aplicação, ao nível da União, dos acordos celebrados entre parceiros sociais não constitui um «processo legislativo» na aceção desta última disposição, e as medidas adotadas no termo desta fase não constituem «atos legislativos» na aceção do artigo 289.o, n.o 3, TFUE.

87

A este respeito, há que salientar que a questão da natureza legislativa dos atos jurídicos adotados ao abrigo do artigo 155.o, n.o 2, TFUE é distinta da do poder que a Comissão detém para decidir da oportunidade de apresentar ao Conselho uma proposta de aplicação, ao nível da União, dos acordos celebrados entre parceiros sociais.

88

Com efeito, como salientou o advogado‑geral no n.o 72 das suas conclusões, o alcance desse poder é o mesmo independentemente de o ato cuja proposta é apresentada ao Conselho com vista à sua adoção ser de natureza legislativa ou não.

89

Daqui decorre que o primeiro fundamento do recurso deve ser julgado improcedente.

Quanto ao terceiro fundamento, relativo a um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral na apreciação do grau da sua fiscalização jurisdicional

Argumentos das partes

90

Com o terceiro fundamento de recurso, a EPSU alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, nos n.os 31 a 33, 78, 79, 109 a 112, 122 e 133 do acórdão recorrido, ao limitar a intensidade da fiscalização jurisdicional exercida sobre a decisão controvertida em razão, por um lado, da sua natureza política e, por outro, do risco de comprometer a independência da Comissão.

91

A este respeito, a EPSU observa que a interpretação do Tribunal Geral segundo a qual a Comissão dispõe de um amplo poder de apreciação de natureza política para decidir apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação do acordo celebrado entre parceiros sociais ao nível da União assenta numa interpretação errada das disposições do Tratado FUE, do contexto e do objeto destas últimas, bem como do Acórdão de 17 de junho de 1998, UEAPME/Conselho (T‑135/96, EU:T:1998:128). Segundo a EPSU, antes de a Comissão apresentar ao Conselho a proposta de decisão de aplicação desse acordo ao nível da União, o papel desta não é, com efeito, político, mas «essencialmente jurídico».

92

Por outro lado, a EPSU alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, no n.o 112 do acórdão recorrido, ao «estabelecer paralelos» com o Acórdão de 23 de abril de 2018, One of Us e o./Comissão (T‑561/14, EU:T:2018:210), proferido em matéria de iniciativa de cidadania europeia. Segundo a EPSU, o procedimento previsto nos artigos 154.o e 155.o TFUE não se assemelha ao procedimento de iniciativa cidadania europeia, uma vez que, por um lado, esta não constitui um procedimento de negociação coletiva nem o exercício de um direito fundamental consagrado no artigo 28.o da Carta dos Direitos Fundamentais e, por outro, as entidades que iniciam esse procedimento não participam na elaboração do texto da proposta legislativa.

93

A Comissão refuta a argumentação da EPSU. Em especial, sustenta que o Tribunal Geral considerou corretamente que a intensidade da sua fiscalização jurisdicional sobre a decisão controvertida era limitada, em aplicação de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça.

Apreciação do Tribunal de Justiça

94

No âmbito do terceiro fundamento de recurso, a EPSU censura, em substância, o Tribunal Geral por ter cometido um erro de direito no que respeita à intensidade da sua fiscalização jurisdicional sobre a decisão controvertida e refere os n.os 31 a 33, 78, 79, 109 a 112, 122 e 133 do acórdão recorrido.

95

A este respeito, resulta, em substância, dos n.os 62 e 64 do presente acórdão que a Comissão não é obrigada a apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação, ao nível da União, do acordo celebrado entre parceiros sociais, ao abrigo do artigo 155.o, n.o 2, TFUE, uma vez que esta instituição dispõe de uma margem de apreciação para decidir da oportunidade de apresentar ao Conselho tal proposta.

96

Ora, como o Tribunal Geral salientou corretamente nos n.os 110 e 111 do acórdão recorrido, resulta de jurisprudência constante que, quando uma instituição deve realizar apreciações complexas, a fiscalização jurisdicional se limita, em princípio, à verificação da observância das regras processuais e de fundamentação, bem como à fiscalização da exatidão material dos factos tomados em consideração e à fiscalização da inexistência de erro de direito, de erro manifesto na apreciação dos factos ou de desvio de poder (v. Acórdão de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.o 143 e jurisprudência referida). Esta limitação da fiscalização jurisdicional impõe‑se particularmente quando as instituições da União são levadas, como no caso em apreço, por um lado, a ter em conta interesses potencialmente divergentes, como, nomeadamente, o interesse geral da União e o dos parceiros sociais e, por outro, a tomar decisões que implicam escolhas políticas (v., neste sentido, Acórdãos de 5 de outubro de 1994, Alemanha/Conselho, C‑280/93, EU:C:1994:367, n.o 91, e de 14 de julho de 2005, Rica Foods/Comissão, C‑40/03 P, EU:C:2005:455, n.o 55 e jurisprudência referida).

97

A argumentação da EPSU não pode pôr em causa as apreciações do Tribunal Geral relativas ao grau da sua fiscalização jurisdicional sobre a decisão controvertida.

98

No que respeita, em primeiro lugar, à argumentação da EPSU segundo a qual o poder de apreciação de que dispõe a Comissão para decidir apresentar ao Conselho uma proposta de decisão de aplicação de um acordo celebrado entre parceiros sociais ao nível da União não é de natureza política, mas «essencialmente jurídica», importa salientar que, efetivamente, a Comissão efetua uma apreciação jurídica quando é levada a examinar a representatividade das partes signatárias desse acordo e a legalidade das cláusulas deste, em conformidade com o artigo 155.o, n.o 2, TFUE. Todavia, como foi acertadamente salientado pelo Tribunal Geral no n.o 79 do acórdão recorrido, quando os parceiros sociais interessados apresentam à Comissão um pedido de aplicação, ao nível da União, do referido acordo, a Comissão deve igualmente apreciar a oportunidade, tendo em conta, nomeadamente, considerações de ordem política, económica e social, da sua eventual aplicação ao nível da União.

99

Em segundo lugar, a argumentação da EPSU no sentido de que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, no n.o 112 do acórdão recorrido, ao «estabelecer paralelos» com o Acórdão de 23 de abril de 2018, One of Us e o./Comissão (T‑561/14, EU:T:2018:210), proferido em matéria de iniciativa de cidadania europeia, não pode levar à anulação do acórdão recorrido, uma vez que, como resulta dos fundamentos precedentes, o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito ao limitar a sua fiscalização da legalidade da decisão controvertida.

100

Tendo em conta as considerações precedentes, há que concluir que o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao considerar que a intensidade da sua fiscalização jurisdicional sobre a decisão controvertida era limitada no caso em apreço.

101

Por conseguinte, o terceiro fundamento de recurso deve ser julgado improcedente.

Quanto ao quarto fundamento, relativo a um erro de direito no que respeita à legalidade dos motivos da decisão controvertida

Argumentos das partes

102

Com o quarto fundamento de recurso, a EPSU alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, nos n.os 116 a 140 do acórdão recorrido, ao considerar que os motivos em que se baseia a decisão controvertida não eram «incorretos, irrelevantes e insuficientes».

103

Em primeiro lugar, a EPSU alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, no n.o 118 do acórdão recorrido, ao considerar que a fundamentação da decisão controvertida era suficiente, em conformidade com o artigo 296.o TFUE, para permitir conhecer as justificações subjacentes à apreciação da Comissão. A este respeito, a EPSU sustenta que os motivos expostos na decisão controvertida estão incorretos e que essas justificações não correspondem às invocadas no decurso do procedimento que precedeu a adoção dessa decisão.

104

Em segundo lugar, a EPSU sustenta que o Tribunal Geral cometeu vários erros na análise dos motivos, nos n.os 130, 131, 133 e 136 do acórdão recorrido, porquanto esses motivos são «materialmente inexatos [e/]ou irrelevantes». Além disso, o Tribunal Geral não teve em conta, nos n.os 136 e 138 do acórdão recorrido, o facto de a Comissão não ter indicado na decisão controvertida, por um lado, as razões pelas quais não realizou uma «análise de impacto», contrariamente ao que tinha anunciado na sua correspondência com a EPSU, e, por outro, as razões que justificavam que se afastasse das comunicações que tinha publicado na matéria. Em especial, a EPSU critica o Tribunal Geral por ter declarado, no n.o 138 do acórdão recorrido, que os recorrentes em primeira instância não tinham especificado que disposição obrigava a Comissão a efetuar tal «análise [de impacto]» antes de se recusar fazer uso do seu poder de iniciativa, apesar de essas comunicações terem criado uma «expectativa legítima» nos recorrentes em primeira instância que tornava obrigatória a realização de um «controlo jurídico» e de uma «análise de impacto».

105

Em terceiro lugar, a EPSU contesta a interpretação efetuada pelo Tribunal Geral, nos n.os 131 e 132 do acórdão recorrido, no que respeita à jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa às diretivas sobre a informação e a consulta dos trabalhadores.

106

A Comissão sustenta que o quarto fundamento de recurso deve ser julgado improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

107

O quarto fundamento de recurso divide‑se, em substância, em duas partes, relativas, a primeira, a um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral quanto ao respeito, por parte da Comissão, do dever de fundamentação da decisão controvertida e, a segunda, a um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral no que se refere ao mérito desta.

– Quanto à primeira parte do quarto fundamento de recurso, relativa a um erro de direito quanto ao respeito, por parte da Comissão, do dever de fundamentação

108

Antes de mais, importa recordar que, segundo jurisprudência constante, o dever de fundamentação previsto no artigo 296.o TFUE constitui uma formalidade essencial que deve ser distinguida da questão do mérito da fundamentação, o qual tem a ver com a legalidade do ato controvertido. Nesta perspetiva, a fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE deve ser adaptada à natureza do ato em causa e revelar, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição autora do ato, de modo a permitir aos interessados conhecerem as justificações da medida adotada e à jurisdição competente exercer a sua fiscalização (v. Acórdão de 14 de outubro de 2010, Deutsche Telekom/Comissão, C‑280/08 P, EU:C:2010:603, n.o 130 e jurisprudência referida).

109

Em seguida, segundo jurisprudência igualmente constante, recordada pelo Tribunal Geral no n.o 115 do acórdão recorrido, a exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente do conteúdo do ato controvertido, da natureza dos motivos invocados e do interesse que os destinatários ou outras pessoas direta e individualmente afetadas pelo ato podem ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito pertinentes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada à luz não só do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (Acórdão de 1 de julho de 2008, Chronopost e La Poste/UFEX e o., C‑341/06 P e C‑342/06 P, EU:C:2008:375, n.o 88 e jurisprudência referida).

110

A este respeito, a EPSU alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, no n.o 118 do acórdão recorrido, ao considerar que os destinatários da decisão controvertida, a saber, a DSANE e os EAPE, tinham podido conhecer as justificações dessa decisão.

111

No caso em apreço, o Tribunal Geral recordou, no n.o 116 do acórdão recorrido, os três motivos em que a decisão controvertida se baseava e que foram reproduzidos no n.o 13 do presente acórdão. No n.o 117 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral recordou o contexto em que essa decisão tinha sido tomada. O Tribunal Geral salientou que a Comissão tinha consultado os parceiros sociais interessados sobre a oportunidade de uma ação da União relativa à informação e à consulta dos funcionários e dos agentes das administrações dos governos centrais e que fora precisamente na sequência dessa consulta que os parceiros sociais tinham negociado e assinado o acordo em causa. Assim, tendo em conta os motivos da decisão controvertida e o contexto em que essa decisão foi tomada, o Tribunal Geral não cometeu nenhum erro de direito ao considerar, no n.o 118 do acórdão recorrido, que a referida decisão tinha sido suficientemente fundamentada à luz do artigo 296.o TFUE, de modo que, por um lado, os seus destinatários, a saber, a DSANE e os EAPE, tinham podido conhecer as três justificações em que se baseava a apreciação da Comissão e contestá‑las e, por outro, o Tribunal Geral pôde proceder à fiscalização dessas justificações.

112

Com efeito, como salientou o advogado‑geral no n.o 104 das suas conclusões, a decisão controvertida destina‑se aos parceiros sociais que celebraram o acordo em causa, os quais, tanto em razão da sua posição como das trocas de correspondência e das consultas prévias levadas a cabo pela Comissão, já tinham conhecimento do contexto em que essa decisão de recusa tinha sido adotada.

113

Nestas condições, a argumentação segundo a qual o Tribunal Geral considerou erradamente que a fundamentação da decisão controvertida era suficiente e que os destinatários dessa decisão podiam, assim, conhecer as justificações da mesma deve ser julgada improcedente.

114

Daqui resulta que o Tribunal Geral considerou corretamente, no n.o 119 do acórdão recorrido, que a decisão controvertida cumpria o dever de fundamentação previsto no artigo 296.o TFUE.

115

Por conseguinte, a primeira parte do quarto fundamento de recurso deve ser julgada improcedente.

– Quanto à segunda parte do quarto fundamento de recurso, relativa a um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral no que se refere ao mérito da fundamentação da decisão controvertida

116

Quanto ao mérito da fundamentação da decisão controvertida, a EPSU considera que os motivos invocados na referida decisão são materialmente inexatos e/ou irrelevantes.

117

Em primeiro lugar, a EPSU alega, no que diz respeito aos n.os 130 e 136 do acórdão recorrido que visam o primeiro desses motivos, que o raciocínio do Tribunal Geral é inexato de facto e de direito, uma vez que já são aplicáveis aos funcionários e agentes das administrações dos governos centrais dos Estados‑Membros numerosas diretivas e que nada permitia à Comissão sugerir que a adoção pelo Conselho da decisão de aplicação do acordo em causa ao nível da União teria sido suscetível de alterar a estrutura, a organização e o funcionamento dessas administrações sem ter realizado uma «análise de impacto».

118

A este respeito, há que salientar, antes de mais, que, na medida em que a EPSU procura pôr em causa as constatações factuais efetuadas pelo Tribunal Geral enquanto tais, sem invocar uma desvirtuação dos factos a este respeito, esta é inadmissível (v., neste sentido, Acórdão de 16 de dezembro de 2020, Conselho e o./K. Chrysostomides & Co. e o., C‑597/18 P, C‑598/18 P, C‑603/18 P e C‑604/18 P, EU:C:2020:1028, n.o 128 e jurisprudência referida).

119

De resto, quanto à argumentação segundo a qual não foi realizada nenhuma «análise de impacto» do acordo em causa, há que salientar que a EPSU não explica de que modo essa «análise de impacto» era necessária para determinar se a aplicação do acordo em causa ao nível da União era suscetível de ter incidência no funcionamento das administrações dos governos centrais dos Estados‑Membros, e, portanto, não identificou um erro de direito cometido pelo Tribunal Geral.

120

No que respeita ao segundo motivo da decisão controvertida, a EPSU alega que o Tribunal Geral não tomou em consideração o facto de o acordo em causa conter uma cláusula denominada de «não regressão» que confere aos interessados direitos mais amplos do que os já reconhecidos em certos Estados‑Membros e impede a revogação desses direitos em caso de mudança de governo.

121

A este respeito, por um lado, a EPSU não explica em que medida a não tomada em consideração do facto de o acordo em causa conter tal cláusula de «não regressão» implica que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito no n.o 131 do acórdão recorrido. Por outro lado, e em todo o caso, há que salientar que a EPSU não invoca qualquer desvirtuação da constatação efetuada pelo Tribunal Geral nesse n.o 131, relativa à afirmação da Comissão de que 22 Estados‑Membros já dispunham de regras relativas à informação e consulta dos funcionários e agentes das administrações dos governos centrais em 2014.

122

No que se refere ao terceiro motivo da decisão controvertida, a EPSU sustenta que, no n.o 133 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral não teve em conta a natureza setorial do acordo em causa nem a representatividade dos parceiros sociais interessados. Segundo a EPSU, os EAPE são o parceiro social das administrações dos governos centrais dos Estados‑Membros, de modo que o acordo em causa dizia respeito aos governos centrais e não aos governos locais destes. Acresce que o acordo em causa não afeta a estrutura dos governos centrais dos Estados‑Membros, uma vez que apenas tem por objeto os direitos à informação e à consulta dos funcionários e agentes dessas administrações.

123

Importa salientar que não é o n.o 133 do acórdão recorrido, mas o n.o 132 desse acórdão, que visa especificamente o exame do terceiro motivo da decisão controvertida. Ora, no referido n.o 132, o Tribunal Geral efetuou uma apreciação factual segundo a qual a aplicação do acordo em causa ao nível da União afetaria de forma muito variável os Estados‑Membros, em função do seu grau de centralização ou descentralização. Esta conclusão permitiu ao Tribunal Geral salientar que nada impedia a Comissão de ter em conta esta última circunstância para considerar que a aplicação do acordo em causa ao nível da União não era desejável. Uma vez que a EPSU não invocou a desvirtuação dos factos tomados em consideração para esta apreciação factual, a sua argumentação relativa ao terceiro motivo da decisão controvertida não pode ser examinada pelo Tribunal de Justiça.

124

Resulta das considerações precedentes que a argumentação da EPSU relativa ao facto de os motivos invocados na decisão controvertida serem inexatos ou irrelevantes deve ser rejeitada.

125

No que respeita, em segundo lugar, à argumentação do EPSU no sentido de que o Tribunal Geral não teve em conta, no acórdão recorrido, o facto de que a Comissão, após ter anunciado na sua correspondência que seria realizada uma «análise de impacto», ou mesmo que esta estava em curso, não indicou na decisão controvertida as razões pelas quais não tinha realizado essa análise, há que salientar que o Tribunal Geral considerou, no n.o 138 do acórdão recorrido, que os recorrentes em primeira instância não tinham especificado que disposição obrigava a Comissão a efetuar tal «análise de impacto» antes de recusar a exercer o seu poder de iniciativa e, consequentemente, julgou a sua argumentação improcedente. Por conseguinte, a EPSU não pode alegar que o Tribunal Geral se absteve de tomar em conta essas considerações no acórdão recorrido. Além disso, na medida em que a EPSU não invocou uma pretensa violação da sua confiança legítima em primeira instância em razão das referidas considerações, como salientou o advogado‑geral no n.o 107 das suas conclusões, não pode invocar essa argumentação pela primeira vez no âmbito do presente recurso, a qual é, portanto, inadmissível.

126

Em terceiro lugar, a EPSU critica o Tribunal Geral por ter declarado, no n.o 138 do acórdão recorrido, que as comunicações publicadas em matéria de política social pela Comissão não tinham criado uma «expectativa legítima» nos recorrentes em primeira instância, tornando em particular obrigatória a realização de um «controlo jurídico» e de uma «análise de impacto» e por não ter justificado o facto de se ter afastado dessas comunicações, ao passo que a EPSU tinha legitimamente a expectativa de que a Comissão as seguisse. A este respeito, há que salientar que este número do acórdão recorrido não diz respeito às comunicações publicadas pela Comissão no domínio da política social, mas à «análise de impacto» que esta instituição anunciou na sua correspondência.

127

Na medida em que a EPSU pretende, com esta argumentação, invocar uma pretensa violação da sua confiança legítima que o Tribunal Geral deveria ter declarado, devido ao facto de a Comissão se ter afastado das referidas comunicações, há que salientar que a EPSU extraiu vários argumentos específicos dessas comunicações no âmbito do seu primeiro fundamento em primeira instância, relativo a uma pretensa violação do artigo 155.o, n.o 2, TFUE e a uma falta de competência, partindo assim da premissa de que a Comissão estava obrigada a respeitar essas comunicações. Por conseguinte, ao invocar perante o Tribunal de Justiça uma violação da sua confiança legítima no facto de a Comissão respeitar os compromissos assumidos nas suas próprias comunicações, a EPSU desenvolveu a argumentação que já tinha apresentado em primeira instância.

128

É verdade que, ao adotar regras de conduta e ao anunciar, através da sua publicação, que as aplicará no futuro aos casos por elas abrangidos, uma instituição autolimita‑se no exercício do seu poder de apreciação e não pode desrespeitar essas regras sob pena de poder ser sancionada, eventualmente, por violação de princípios gerais do direito, como a igualdade de tratamento ou a proteção da confiança legítima.

129

Todavia, tratando‑se, como no caso em apreço, do exercício de uma competência, conferida à Comissão por uma disposição de direito primário, de apresentar ou não ao Conselho uma proposta que constitui uma condição prévia à adoção de uma decisão por esta última instituição, não se pode considerar, na falta de um compromisso expresso e unívoco por sua parte, tendo em conta, nomeadamente, a importância do equilíbrio institucional de que essa competência faz parte, recordada no n.o 48 do presente acórdão, que a Comissão se autolimitou no exercício dessa competência, ao comprometer‑se a examinar exclusivamente certas considerações específicas antes de apresentar a sua proposta, transformando assim essa competência discricionária em competência vinculada, uma vez preenchidos certos requisitos. Ora, não resulta dos argumentos apresentados pela EPSU no caso em apreço que a Comissão tenha assumido esse compromisso, nas comunicações invocadas, no que respeita ao exercício da competência que lhe confere o artigo 155.o, n.o 2, TFUE.

130

Em quarto lugar, no que respeita à argumentação da EPSU no sentido de que o Tribunal Geral efetuou, nos n.os 131 e 132 do acórdão recorrido, uma interpretação errada da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa às diretivas sobre a informação e a consulta dos trabalhadores, uma vez que «já existe uma disparidade entre governo local e governo central», há que julgá‑la manifestamente inadmissível na medida em que não visa especificamente o erro de direito que alegadamente vicia esses números do acórdão recorrido (v., neste sentido, Acórdão de 23 de janeiro de 2019, Deza/ECHA, C‑419/17 P, EU:C:2019:52, n.o 94).

131

Por conseguinte, a segunda parte do quarto fundamento de recurso deve ser julgada improcedente, bem como o quarto fundamento de recurso na sua totalidade.

132

Em face de todas estas considerações, há que negar integralmente provimento ao recurso.

Quanto às despesas

133

Por força do artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, se o recurso for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decidirá sobre as despesas.

134

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, aplicável ao processo de recurso de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, do mesmo regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

135

Tendo a EPSU sido vencida, há que condená‑la a suportar, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela Comissão, em conformidade com os pedidos desta.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A European Federation of Public Service Unions (EPSU) é condenada a suportar, além das suas próprias despesas, as efetuadas pela Comissão Europeia.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

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