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Document 62019CJ0245

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 6 de outubro de 2020.
État luxembourgeois contra B et État luxembourgeois contra B e o.
Pedidos de decisão prejudicial apresentados pela Cour administrative (Luxemburgo).
Reenvio prejudicial — Diretiva 2011/16/UE — Cooperação administrativa no domínio da fiscalidade — Artigos 1.o e 5.o — Obrigação de prestar informações à autoridade competente de um Estado‑Membro que atua na sequência de um pedido de troca de informações da autoridade competente de outro Estado‑Membro — Pessoa detentora das informações cuja prestação é ordenada pela autoridade competente do primeiro Estado‑Membro — Contribuinte visado pelo inquérito na origem do pedido da autoridade competente do segundo Estado‑Membro — Terceiros com quem esse contribuinte mantém relações jurídicas, bancárias, financeiras ou, de um modo mais geral, económicas — Tutela jurisdicional — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 47.o — Direito à ação — Artigo 52.o, n.o 1 — Restrição — Base jurídica — Respeito pelo conteúdo essencial do direito à ação — Existência de um meio processual que permite aos interessados em causa obter a fiscalização efetiva de todas as questões de facto e de direito relevantes, bem como uma tutela jurisdicional efetiva dos direitos que o direito da União lhes garante — Objetivo de interesse geral reconhecido pela União — Combate à fraude e à evasão fiscais internacionais — Proporcionalidade — Natureza “previsivelmente relevante” das informações visadas pela imposição de prestação de informações — Fiscalização jurisdicional — Alcance — Elementos pessoais, temporais e materiais a tomar em consideração.
Processos apensos C-245/19 e C-246/19.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2020:795

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

6 de outubro de 2020 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Diretiva 2011/16/UE — Cooperação administrativa no domínio da fiscalidade — Artigos 1.o e 5.o — Obrigação de prestar informações à autoridade competente de um Estado‑Membro que atua na sequência de um pedido de troca de informações da autoridade competente de outro Estado‑Membro — Pessoa detentora das informações cuja prestação é ordenada pela autoridade competente do primeiro Estado‑Membro — Contribuinte visado pelo inquérito na origem do pedido da autoridade competente do segundo Estado‑Membro — Terceiros com quem esse contribuinte mantém relações jurídicas, bancárias, financeiras ou, de um modo mais geral, económicas — Tutela jurisdicional — Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia — Artigo 47.o — Direito à ação — Artigo 52.o, n.o 1 — Restrição — Base jurídica — Respeito pelo conteúdo essencial do direito à ação — Existência de um meio processual que permite aos interessados em causa obter a fiscalização efetiva de todas as questões de facto e de direito relevantes, bem como uma tutela jurisdicional efetiva dos direitos que o direito da União lhes garante — Objetivo de interesse geral reconhecido pela União — Combate à fraude e à evasão fiscais internacionais — Proporcionalidade — Natureza “previsivelmente relevante” das informações visadas pela imposição de prestação de informações — Fiscalização jurisdicional — Alcance — Elementos pessoais, temporais e materiais a tomar em consideração»

Nos processos apensos C‑245/19 e C‑246/19,

que têm por objeto pedidos de decisão prejudicial apresentados, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo, Luxemburgo), por Decisões de 14 de março de 2019, que deram entrada no Tribunal de Justiça em 20 de março de 2019, nos processos

État luxembourgeois

contra

B (C‑245/19),

e

État luxembourgeois

contra

B,

C,

D,

F. C.,

sendo interveniente:

A (C‑246/19),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, R. Silva de Lapuerta, vice‑presidente, J.‑C. Bonichot, A. Arabadjiev, E. Regan e S. Rodin, presidentes de secção, M. Ilešič, J. Malenovský (relator), D. Šváby, F. Biltgen, K. Jürimäe, C. Lycourgos, A. Kumin, N. Jääskinen e N. Wahl, juízes,

advogado‑geral: J. Kokott,

secretário: M.‑A. Gaudissart, secretário adjunto,

vistos os autos e após a audiência de 26 de maio de 2020,

vistas as observações apresentadas:

em representação de B, C, D e F. C., por C. Henlé, avocate,

em representação do Governo luxemburguês, inicialmente por D. Holderer e T. Uri, e em seguida por este último, na qualidade de agentes,

em representação do Governo belga, por S. Baeyens, P. Cottin e J.‑C. Halleux, na qualidade de agentes,

em representação do Governo helénico, por A. Dimitrakopoulou, M. Tassopoulou e G. Konstantinos, na qualidade de agentes,

em representação do Governo espanhol, por S. Jiménez García, na qualidade de agente,

em representação do Governo francês, inicialmente por A. Alidière, E. de Moustier, D. Colas e E. Toutain, e em seguida por A. Alidière, E. de Moustier e E. Toutain, na qualidade de agentes,

em representação do Governo polaco, por B. Majczyna, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, inicialmente por N. Gossement, H. Kranenborg, W. Roels e P. J. O. Van Nuffel, e em seguida por estes três últimos, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 2 de julho de 2020,

profere o presente

Acórdão

1

Os pedidos de decisão prejudicial têm por objeto a interpretação, por um lado, dos artigos 7.o, 8.o e 47.o, bem como do artigo 52.o, n.o 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») e, por outro, do artigo 1.o, n.o 1, e do artigo 5.o da Diretiva 2011/16/UE do Conselho, de 15 de fevereiro de 2011, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade e que revoga a Diretiva 77/799/CEE (JO 2011, L 64, p. 1, e retificação no JO 2013, L 162, p. 15), conforme alterada pela Diretiva 2014/107/UE do Conselho, de 9 de dezembro de 2014 (JO 2014, L 359, p. 1) (a seguir «Diretiva 2011/16»).

2

Estes pedidos foram apresentados no âmbito de dois litígios que opõem o État luxembourgeois (Estado luxemburguês), respetivamente, à sociedade B, no primeiro deles, e às sociedades B, C e D, bem como a F. C., no segundo, relativamente a duas decisões do directeur de l’administration des contributions directes (diretor da Administração dos Impostos Diretos, Luxemburgo) que ordenam, respetivamente, à sociedade B e ao banco A a prestação de determinadas informações, na sequência de pedidos de troca de informações entre Estados‑Membros em matéria fiscal.

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva 2011/16

3

Os considerandos 1, 2, 9 e 27 da Diretiva 2011/16 referem:

«(1)

Na era da globalização, é cada vez mais necessária a assistência mútua entre Estados‑Membros no domínio da fiscalidade. A mobilidade dos contribuintes, o número de operações transfronteiriças e a internacionalização dos instrumentos financeiros conhecem uma evolução considerável, dificultando o correto estabelecimento pelos Estados‑Membros dos impostos devidos. Estas dificuldades crescentes afetam o funcionamento dos sistemas fiscais e acarretam um fenómeno de dupla tributação, que incita à fraude e à evasão fiscais […]

(2)

Assim, um Estado‑Membro não pode gerir o seu sistema de tributação interno, nomeadamente no que respeita à fiscalidade direta, sem dispor de informações provenientes de outros Estados‑Membros. A fim de obviar aos efeitos negativos deste fenómeno, é indispensável desenvolver uma nova cooperação administrativa entre as administrações fiscais dos Estados‑Membros. É necessário dispor de instrumentos que permitam instaurar a confiança entre Estados‑Membros, mediante o estabelecimento de regras, obrigações e direitos idênticos para todos os Estados‑Membros.

[…]

(9)

Os Estados‑Membros deverão trocar informações sobre casos concretos sempre que tal lhes seja solicitado por outro Estado‑Membro e deverão proceder aos inquéritos necessários à obtenção de tais informações. A norma da “relevância previsível” destina‑se a permitir a troca de informações em matéria fiscal em toda a medida do possível e, simultaneamente, a clarificar que os Estados‑Membros não podem efetuar investigações aleatórias nem pedir informações de utilidade duvidosa relativamente à situação tributária de determinado contribuinte. […]

[…]

(27)

As trocas de informações abrangidas pela presente diretiva ficam sujeitas às disposições de execução da Diretiva 95/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de outubro de 1995, relativa à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados [(JO 1995, L 281, p. 31)] […]. Todavia, convém prever limitações para certos direitos e obrigações previstos pela Diretiva [95/46], a fim de salvaguardar os interesses a que se refere a alínea e) do n.o 1 do artigo 13.o da referida diretiva. Esta limitação é necessária e proporcionada tendo em conta as potenciais perdas de receitas para os Estados‑Membros e a importância crucial das informações abrangidas pela presente diretiva para a eficácia do combate à fraude.»

4

O artigo 1.o da Diretiva 2011/16, sob a epígrafe «Objeto», enuncia, no seu n.o 1:

«A presente diretiva estabelece as regras e os procedimentos ao abrigo dos quais os Estados‑Membros devem cooperar entre si tendo em vista a troca de informações previsivelmente relevantes para a administração e a execução da legislação interna dos Estados‑Membros respeitante aos impostos a que se refere o artigo 2.o»

5

O artigo 5.o desta diretiva, sob a epígrafe «Procedimento de troca de informações a pedido», tem a seguinte redação:

«A pedido da autoridade requerente, a autoridade requerida comunica à autoridade requerente todas as informações a que se refere o n.o 1 do artigo 1.o de que disponha ou que obtenha na sequência de inquéritos administrativos.»

6

O artigo 7.o da referida diretiva prevê que as informações a que se refere o artigo 5.o devem ser comunicadas o mais rapidamente possível e, salvo em casos especiais, no prazo de dois meses ou seis meses, consoante a autoridade requerida já disponha, ou não, das informações solicitadas.

7

O artigo 25.o da Diretiva 2011/16, sob a epígrafe «Proteção de dados», dispõe, no seu n.o 1:

«As trocas de informações ao abrigo da presente diretiva estão sujeitas às disposições de execução da Diretiva [95/46]. Contudo, para efeitos da correta aplicação da presente diretiva, os Estados‑Membros devem limitar o âmbito das obrigações e dos direitos previstos no artigo 10.o, no n.o 1 do artigo 11.o e nos artigos 12.o e 21.o da Diretiva [95/46] na medida em que tal seja necessário para salvaguardar os interesses a que se refere a alínea e) do n.o 1 do artigo 13.o da referida diretiva.»

Diretiva 95/46

8

O artigo 10.o, o artigo 11.o, n.o 1, e os artigos 12.o e 21.o da Diretiva 95/46 preveem, o primeiro, as modalidades de informação das pessoas singulares que sejam objeto de um tratamento de dados pessoais no caso de recolha desses dados junto dessas pessoas; o segundo, as modalidades de informação das pessoas singulares no caso de os referidos dados não terem sido recolhidos junto delas; o terceiro, o direito de acesso das referidas pessoas singulares aos dados em causa; e, o quarto, a publicidade do tratamento de dados pessoais.

9

O artigo 13.o, n.o 1, alínea e), desta diretiva prevê que os Estados‑Membros podem tomar medidas legislativas destinadas a restringir o alcance das obrigações e direitos previstos, nomeadamente, no artigo 10.o, no artigo 11.o, n.o 1, nos artigos 12.o e 21.o da referida diretiva sempre que tal restrição constitua uma medida necessária à proteção de um interesse económico ou financeiro importante de um Estado‑Membro ou da União, incluindo nos domínios monetário, orçamental ou fiscal.

10

O artigo 22.o da mesma diretiva enuncia:

«Sem prejuízo de quaisquer garantias graciosas […] previamente a um recurso contencioso, os Estados‑Membros estabelecerão que qualquer pessoa poderá recorrer judicialmente em caso de violação dos direitos garantidos pelas disposições nacionais aplicáveis ao tratamento em questão.»

Regulamento (UE) 2016/679

11

A Diretiva 95/46 foi revogada, com efeitos a partir de 25 de maio de 2018, pelo Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46 (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados) (JO 2016, L 119, p. 1, e retificação no JO 2018, L 127, p. 2), cujo artigo 1.o, sob a epígrafe «Objeto e objetivos», precisa, nomeadamente, que estabelece as regras relativas à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e que defende os direitos e as liberdades fundamentais das pessoas singulares, nomeadamente o seu direito à proteção dos dados pessoais. Por outro lado, o artigo 94.o, n.o 2, deste regulamento precisa que as remissões para a Diretiva 95/46 são consideradas remissões para o referido regulamento.

12

Os artigos 13.o, 14.o e 15.o do Regulamento 2016/679 reproduzem, respetivamente, alterando‑as, as disposições que figuravam anteriormente no artigo 10.o, no artigo 11.o, n.o 1, e no artigo 12.o da Diretiva 95/46.

13

O artigo 23.o, n.o 1, alínea e), do referido regulamento, que reproduz, alterando‑a, a disposição que figurava anteriormente no artigo 13.o, n.o 1, alínea e), desta diretiva, enuncia que o direito da União e o direito dos Estados‑Membros podem limitar por medida legislativa o alcance das obrigações e dos direitos previstos, nomeadamente, nos artigos 13.o a 15.o do mesmo regulamento, desde que tal limitação respeite a essência dos direitos e liberdades fundamentais e constitua uma medida necessária e proporcionada numa sociedade democrática para assegurar, designadamente, objetivos importantes do interesse público geral, nomeadamente um interesse económico ou financeiro importante da União ou de um Estado‑Membro, incluindo nos domínios monetário, orçamental ou fiscal, da saúde pública e da segurança social.

14

O artigo 79.o, n.o 1, do Regulamento 2016/679, que reproduz, alterando‑o, o artigo 22.o da Diretiva 95/46, prevê que, sem prejuízo de qualquer outra via de recurso administrativo ou extrajudicial, todas as pessoas singulares afetadas por um tratamento de dados pessoais têm direito à ação judicial se considerarem ter havido violação dos direitos que lhes assistem nos termos desse regulamento, na sequência de um tratamento desse tipo de dados efetuado em violação do referido regulamento.

Direito luxemburguês

Lei de 29 de março de 2013

15

O artigo 6.o da loi du 29 mars 2013 portant transposition de la directive 2011/16 et portant 1) modification de la loi générale des impôts, 2) abrogation de la loi modifiée du 15 mars 1979 concernant l’assistance administrative internationale en matière d’impôts directs [Lei de 29 de março de 2013, que Transpõe a Diretiva 2011/16 e que 1) Altera a Lei Geral dos Impostos, 2) Revoga a Lei de 15 de março de 1979 alterada, relativa à Assistência Administrativa Internacional em Matéria de Impostos Diretos] (Mémorial A 2013, p. 756), dispõe:

«A pedido da autoridade requerente, a autoridade requerida luxemburguesa comunica‑lhe as informações previsivelmente relevantes para a administração e a execução da legislação interna do Estado‑Membro requerente relativa aos impostos […], de que disponha ou que obtenha na sequência de inquéritos administrativos.»

Lei de 25 de novembro de 2014

16

A loi du 25 novembre 2014 prévoyant la procédure applicable à l’échange de renseignements sur demande en matière fiscale et modifiant la loi du 31 mars 2010 portant approbation des conventions fiscales et prévoyant la procédure y applicable en matière d’échange de renseignements sur demande (Lei de 25 de novembro de 2014, que Prevê o Procedimento Aplicável à Troca de Informações a Pedido em Matéria Fiscal e Altera a Lei de 31 de março de 2010, que Aprova as Convenções Fiscais e Prevê o Procedimento aí Aplicável em Matéria de Troca de Informações a Pedido) (Mémorial A 2014, p. 4170, a seguir «Lei de 25 de novembro de 2014») é aplicável, nomeadamente, aos pedidos de troca de informações previstos no artigo 6.o da Lei de 29 de março de 2013, mencionada no número precedente do presente acórdão.

17

Nos termos do artigo 2.o da Lei de 25 de novembro de 2014:

«(1)   As administrações tributárias podem solicitar ao respetivo detentor todo o tipo de informações necessárias à efetivação da troca de informações, conforme previsto nas [c]onvenções e nas [l]eis.

(2)   O detentor das informações tem a obrigação de prestar as informações solicitadas, na sua totalidade, de forma precisa e sem alteração, no prazo de um mês a contar da notificação da decisão que ordena a prestação dessas informações. Esta obrigação compreende a transmissão, sem alteração, dos documentos sobre os quais as informações se baseiam.

[…]»

18

O artigo 3.o desta lei, na sua versão aplicável aos litígios nos processos principais, previa:

«(1)   A Administração Tributária competente deve verificar a regularidade formal do pedido de troca de informações. Considera‑se formalmente regular o pedido de troca de informações que contenha a indicação do fundamento jurídico e da autoridade requerente competente e as restantes indicações previstas nas [c]onvenções e nas leis.

[…]

(3)   Se a Administração Tributária competente não dispuser das informações solicitadas, o seu diretor ou representante deve notificar, por carta registada dirigida ao detentor das informações, a decisão em que ordena a prestação das informações solicitadas. A notificação da decisão ao detentor das informações solicitadas vale como notificação a toda a pessoa nela designada.

[…]»

19

O artigo 5.o, n.o 1, da referida lei enuncia:

«Se as informações solicitadas não forem prestadas no prazo de um mês a contar da notificação da decisão que ordena que sejam prestadas, é aplicável ao detentor das informações uma coima fiscal até 250000 euros. O montante da coima é fixado pelo diretor da Administração Tributária competente ou pelo seu representante.»

20

O artigo 6.o da mesma lei, na sua versão aplicável aos litígios nos processos principais, tinha a seguinte redação:

«(1)   Não é admissível recurso do pedido de troca de informações nem da decisão que as ordena, previstos no artigo 3.o, n.os 1 e 3.

(2)   O detentor das informações pode interpor recurso das decisões mencionadas no artigo 5.o para o tribunal administratif [Tribunal Administrativo]. […] O recurso tem efeito suspensivo. […]

[…]»

Lei de 1 de março de 2019

21

A loi du 1er mars 2019 portant modification de la loi du 25 novembre 2014 prévoyant la procédure applicable à l’échange de renseignements sur demande en matière fiscale (Lei de 1 de março de 2019, que Altera a Lei de 25 de novembro de 2014, que Prevê o Procedimento Aplicável ao Intercâmbio de Informações a Pedido em Matéria Fiscal) (Mémorial A 2019, p. 112, a seguir «Lei de 1 de março de 2019»), entrou em vigor em 9 de março de 2019.

22

O artigo 3.o, n.o 1, da Lei de 25 de novembro de 2014, conforme alterada pela Lei de 1 de março de 2019, dispõe:

«A Administração Tributária competente deve verificar a regularidade formal do pedido de troca de informações. Considera‑se formalmente regular o pedido de troca de informações que contenha a indicação do fundamento jurídico e da autoridade requerente competente e as restantes indicações previstas nas [c]onvenções e nas leis. A Administração Tributária competente deve certificar‑se de que as informações solicitadas satisfazem plenamente o critério da relevância previsível no que diz respeito à identidade da pessoa visada pelo pedido de troca de informações e à do detentor das informações, bem como às exigências do procedimento tributário em questão.»

23

O artigo 6.o, n.o 1, da Lei de 25 de novembro de 2014, conforme alterada pela Lei de 1 de março de 2019, enuncia:

«O detentor das informações pode interpor recurso de anulação para o tribunal administratif [Tribunal Administrativo] da decisão que ordena a prestação de informações prevista no artigo 3.o, n.o 3. […]»

Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

24

Cada um dos litígios nos processos principais tem origem num pedido de troca de informações dirigido pela Administração Tributária do Reino de Espanha à Administração Tributária do Grão‑Ducado do Luxemburgo, para a obtenção de informações relativas a F. C., uma pessoa singular residente em Espanha, visada, na qualidade de contribuinte, por um inquérito que tem por objeto determinar a sua situação à luz da legislação fiscal nacional.

Processo C‑245/19

25

Em 18 de outubro de 2016, a Administração Tributária espanhola dirigiu à Administração Tributária luxemburguesa um primeiro pedido de troca de informações a respeito de F. C.

26

Em 16 de junho de 2017, o diretor da Administração dos Impostos Diretos deu seguimento a esse pedido, tendo enviado à sociedade B uma decisão em que lhe ordenava que prestasse informações relativas ao período de 1 de janeiro de 2011 a 31 de dezembro de 2014 sobre os seguintes elementos:

contratos celebrados pela sociedade B com as sociedades E e F relativamente aos direitos de F. C.;

qualquer outro contrato celebrado, quer durante o período em questão, quer anteriormente ou posteriormente a esse período, mas com produção de efeitos neste e relativo a F. C.;

todas as faturas emitidas ou recebidas relativamente a esses contratos, bem como o seu modo de cobrança e pagamento;

detalhes das contas bancárias e das instituições financeiras em que estão depositados os fundos de tesouraria contabilizados no balanço.

27

Por outro lado, esta decisão continha a referência de que, nos termos do artigo 6.o da Lei de 25 de novembro de 2014, era irrecorrível.

28

Por petição apresentada na Secretaria do tribunal administratif (Tribunal Administrativo, Luxemburgo) em 17 de julho de 2017, a sociedade B interpôs um recurso destinado a obter, a título principal, a alteração da referida decisão e, a título subsidiário, a sua anulação.

29

Por Sentença de 26 de junho de 2018, o tribunal administratif (Tribunal Administrativo) declarou‑se competente para conhecer deste recurso, na parte relativa à anulação da decisão de 16 de junho de 2017, e anulou‑a parcialmente. No que respeita à sua competência, considerou que o artigo 6.o, n.o 1, da Lei de 25 de novembro de 2014 não estava em conformidade com o artigo 47.o da Carta, na medida em que excluía a possibilidade de um recurso judicial contra uma decisão que ordena a prestação de informações à Administração Tributária, pelo que esta disposição não deveria ser aplicada. No que respeita ao mérito, considerou que algumas das informações solicitadas pelo diretor da Administração dos Impostos Diretos não eram previsivelmente relevantes para o inquérito conduzido pela Administração Tributária espanhola, pelo que a Decisão de 16 de junho de 2017 devia ser anulada na parte em que ordenou à sociedade B que prestasse essas informações.

30

Por petição apresentada na Secretaria da Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo, Luxemburgo) em 24 de julho de 2018, o Estado luxemburguês interpôs recurso dessa sentença.

31

No âmbito desse recurso, alega que o artigo 6.o, n.o 1, da Lei de 25 de novembro de 2014 não viola o artigo 47.o da Carta, dado que não se opõe a que o destinatário de uma decisão em que lhe é ordenado que preste informações à Administração Tributária e que detenha as informações solicitadas possa, no caso de não ter dado cumprimento a essa decisão e de lhe ter sido aplicada uma sanção com esse fundamento, impugnar essa decisão no âmbito de um recurso judicial que, a título subordinado, possa intentar contra essa sanção, nos termos do artigo 6.o, n.o 2, dessa lei. Consequentemente, o tribunal administratif (Tribunal Administrativo) afastou erradamente a aplicação do artigo 6.o, n.o 1, da referida lei e declarou‑se competente para conhecer do recurso de anulação que lhe foi apresentado. Além disso, esse tribunal considerou erradamente que algumas das informações referidas na Decisão de 16 de junho de 2017 não eram previsivelmente relevantes, na aceção da Diretiva 2011/16.

32

Na decisão de reenvio, a Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo) pergunta, em primeiro lugar, se os artigos 8.o, 7.o, 47.o e 52.o da Carta impõem que seja reconhecido ao destinatário de uma decisão que lhe ordena que preste à Administração Tributária as informações de que é detentor o direito de interpor um recurso, a título principal, dessa decisão, em complemento da possibilidade, para tal destinatário, de contestar, a título subordinado, a referida decisão, no caso de não a cumprir e de lhe ser posteriormente aplicada uma sanção com esse fundamento, nos termos da Lei de 25 de novembro de 2014, conforme interpretada à luz do Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund (C‑682/15, EU:C:2017:373).

33

Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em caso de resposta afirmativa a esta primeira questão, qual o alcance da fiscalização que o juiz pode ser convidado a efetuar, no âmbito desse recurso judicial, sobre a natureza previsivelmente relevante das informações em causa, à luz dos artigos 1.o e 5.o da Diretiva 2011/16.

34

Nestas circunstâncias, a Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Devem os artigos 7.o e 8.o, e 52.o, n.o 1, da Carta […], eventualmente lidos em conjugação com o artigo 47.o [desta], ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação […] de um Estado‑Membro que, no âmbito do regime processual em matéria de troca de informações a pedido, instituído, nomeadamente, a fim de dar execução à Diretiva 2011/16 […], exclui qualquer ação, nomeadamente de natureza [judicial], por parte do terceiro detentor das informações, contra uma decisão através da qual a autoridade competente desse Estado‑Membro o obrigue a fornecer‑lhe informações destinadas a dar seguimento a um pedido de troca de informações emanado de outro Estado‑Membro?

2)

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, devem os artigos 1.o, n.o 1, e 5.o da Diretiva 2011/16 ser interpretados, eventualmente tendo em conta o caráter evolutivo da interpretação do artigo 26.o do Modelo de Convenção Fiscal da [Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos (OCDE) relativo ao rendimento e à fortuna], no sentido de que um pedido de troca de informações, juntamente com uma decisão de injunção da autoridade competente do Estado‑Membro requerido que lhe dá seguimento, satisfazem o critério de inexistência de falta manifesta de relevância previsível quando o Estado‑Membro requerente indica a identidade do contribuinte em causa, o período a que se refere o inquérito no Estado‑Membro requerente e a identidade do detentor das informações visadas, embora solicite informações relativas a contratos, bem como às faturações e aos pagamentos correspondentes, não especificados mas definidos por critérios relativos, primeiro, ao facto de terem sido celebrados pelo detentor das informações identificado, segundo, à sua aplicabilidade durante os anos fiscais em causa no inquérito das autoridades do Estado requerente, e, terceiro, à sua relação com o contribuinte em causa identificado?»

Processo C‑246/19

35

Em 16 de março de 2017, a Administração Tributária espanhola enviou à Administração Tributária luxemburguesa um segundo pedido de troca de informações relativo a F. C.

36

Em 29 de maio de 2017, o diretor da Administração dos Impostos Diretos deu seguimento a este pedido, tendo enviado ao banco A uma decisão em que lhe ordenava que prestasse informações relativas ao período de 1 de janeiro de 2011 a 31 de dezembro de 2014 sobre os documentos e elementos seguintes:

o(s) nome(s) do(s) titular(es) atual/atuais de determinada conta bancária;

o(s) nome(s) da(s) pessoa(s) autorizada(s) a realizar operações nessa conta;

o(s) nome(s) da(s) pessoa(s) que abriu/abriram a referida conta;

os extratos da mesma conta durante o período em causa;

o(s) beneficiário efetivo(s) da conta em questão;

a questão de saber se foi aberta outra conta bancária após 31 de dezembro de 2014 no banco A e se os fundos depositados nela provêm de uma conta aberta anteriormente nesse banco;

os extratos de todos os ativos financeiros detidos por F. C. na sociedade B, na sociedade D ou em qualquer outra sociedade controlada por F. C. durante o período em causa; e

extratos dos ativos financeiros onde F. C. aparece como beneficiário efetivo durante esse período.

37

Por outro lado, esta decisão continha a referência de que, nos termos do artigo 6.o, n.o 1, da Lei de 25 de novembro de 2014, era irrecorrível.

38

Por petição apresentada na Secretaria do tribunal administratif (Tribunal Administrativo) em 17 de julho de 2017, as sociedades B, C e D, bem como F. C., interpuseram recurso, pedindo, a título principal, a alteração daquela decisão e, a título subsidiário, a sua anulação.

39

Por Sentença de 26 de junho de 2018, o tribunal administratif (Tribunal Administrativo) declarou‑se competente para conhecer deste recurso, na parte em que visa a anulação da Decisão de 29 de maio de 2017, e anulou parcialmente esta última com fundamentos análogos aos resumidos no n.o 29 do presente acórdão.

40

Por petição apresentada na Secretaria da Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo) em 24 de julho de 2018, o Estado luxemburguês interpôs recurso daquela sentença.

41

Na sua decisão de reenvio, a Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo) interroga‑se de modo semelhante ao resumido nos n.os 32 e 33 do presente acórdão, sublinhando simultaneamente o facto de o processo C‑246/19 não ter origem em recursos interpostos pelo destinatário de uma decisão que lhe ordena que preste à Administração Tributária de um Estado‑Membro as informações de que é detentora, como no caso do processo C‑245/19, mas por pessoas assumindo outras qualidades, nomeadamente, por um lado, a de um contribuinte que é alvo de um inquérito por parte da Administração Tributária de outro Estado‑Membro e, por outro, a de terceiros com quem esse contribuinte mantém relações jurídicas, bancárias, financeiras ou, de um modo mais geral, económicas.

42

Nestas circunstâncias, a Cour administrative (Supremo Tribunal Administrativo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Devem os artigos 7.o e 8.o, e 52.o, n.o 1, da Carta, eventualmente lidos em conjugação com o artigo 47.o [desta], ser interpretados no sentido de que se opõem a uma legislação […] de um Estado‑Membro que, no âmbito do regime processual em matéria de troca de informações a pedido, instituído, nomeadamente, a fim de dar execução à Diretiva 2011/16 […], exclui qualquer ação, nomeadamente de natureza [judicial], por parte [do contribuinte visado por um inquérito noutro Estado‑Membro] e do terceiro detentor das informações, contra uma decisão através da qual a autoridade competente [do primeiro] Estado‑Membro obrigue [esse detentor] a fornecer‑lhe informações destinadas a dar seguimento a um pedido de troca de informações emanado de outro Estado‑Membro?

2)

Em caso de resposta afirmativa à primeira questão, devem os artigos 1.o, n.o 1, e 5.o da Diretiva 2011/16 ser interpretados, eventualmente tendo em conta o caráter evolutivo da interpretação do artigo 26.o do Modelo de Convenção Fiscal da OCDE [relativo ao rendimento e à fortuna], no sentido de que um pedido de troca de informações, juntamente com uma decisão de injunção da autoridade competente do Estado‑Membro requerido que lhe dá seguimento, satisfazem o critério de inexistência de falta manifesta de relevância previsível quando o Estado‑Membro requerente indica a identidade do contribuinte em causa, o período a que se refere o inquérito no Estado‑Membro requerente e a identidade do detentor das informações visadas, embora solicite informações relativas a contratos, bem como às faturações e aos pagamentos correspondentes, não especificados mas definidos por critérios relativos, primeiro, ao facto de terem sido celebrados pelo detentor das informações identificado, segundo, à sua aplicabilidade durante os anos fiscais em causa no inquérito das autoridades do Estado requerente, e, terceiro, à sua relação com o contribuinte em causa identificado?»

43

Por Decisão do presidente do Tribunal de Justiça 3 de maio de 2019, os processos C‑245/19 e C‑246/19 foram apensados para efeitos das fases escrita e oral e do acórdão a proferir.

Quanto às questões prejudiciais

Quanto às primeiras questões nos processos C‑245/19 e C‑246/19

Observações preliminares

44

Com as suas primeiras questões nos processos C‑245/19 e C‑246/19, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 47.o da Carta, conjugado com os artigos 7.o e 8.o, bem como com o artigo 52.o, n.o 1, desta, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que a legislação de um Estado‑Membro que concretiza o procedimento de troca de informações a pedido, instituído pela Diretiva 2011/16, exclua que uma decisão, através da qual a autoridade competente desse Estado‑Membro obriga a pessoa que detenha informações a prestar‑lhas para poder dar seguimento a um pedido de troca de informações emanado da autoridade competente de outro Estado‑Membro, possa ser objeto de recursos interpostos, em primeiro lugar, por essa pessoa, em segundo lugar, pelo contribuinte visado nesse Estado‑Membro por um inquérito na origem desse pedido e, em terceiro lugar, por terceiros a quem as informações em causa dizem respeito.

45

Conforme resulta do artigo 51.o, n.o 1, da Carta, as suas disposições têm por destinatários os Estados‑Membros apenas quando apliquem o direito da União.

46

Constitui tal aplicação do direito da União, geradora da aplicabilidade da Carta, a adoção, por um Estado‑Membro, de uma legislação que especifica as modalidades do procedimento de troca de informações a pedido, instituída pela Diretiva 2011/16 (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund, C‑682/15, EU:C:2017:373, n.os 34 a 37), nomeadamente quando prevê a possibilidade de a autoridade competente tomar uma decisão que obrigue a pessoa que detenha informações a prestar‑lhas.

47

O artigo 47.o da Carta enuncia, no seu primero parágrafo, que toda a pessoa cujos direitos e liberdades garantidos pelo direito da União tenham sido violados tem direito a uma ação perante um tribunal, nas condições previstas neste artigo. A este direito corresponde a obrigação dirigida aos Estados‑Membros pelo artigo 19.o, n.o 1, segundo parágrafo, TUE de estabelecerem as vias de recurso necessárias para assegurar uma tutela jurisdicional efetiva nos domínios abrangidos pelo direito da União.

48

Os artigos 7.o e 8.o da Carta consagram, o primeiro, o direito ao respeito pela vida privada e familiar e, o segundo, o direito à proteção dos dados pessoais.

49

Nenhum destes três direitos fundamentais constitui uma prerrogativa absoluta, devendo, com efeito, cada um deles ser tomado em consideração relativamente à sua função na sociedade (v., no que respeita ao direito à ação, Acórdão de 18 de março de 2010, Alassini e o., C‑317/08 a C‑320/08, EU:C:2010:146, n.o 63 e jurisprudência referida, e, no que diz respeito aos direitos ao respeito pela vida privada e à proteção dos dados pessoais, Acórdão de 16 de julho de 2020, Facebook Ireland e Schrems, C‑311/18, EU:C:2020:559, n.o 172 e jurisprudência referida).

50

Assim, quando, num determinado caso concreto, estivermos perante vários direitos garantidos pela Carta suscetíveis de conflituar entre si, a necessária conciliação desses direitos, visando assegurar o justo equilíbrio da proteção associada a cada um deles, pode conduzir a que lhes seja imposta uma restrição (v., neste sentido, Acórdãos de 29 de janeiro de 2008, Promusicae, C‑275/06, EU:C:2008:54, n.os 63 a 65, e de 27 de março de 2014, UPC Telekabel Wien, C‑314/12, EU:C:2014:192, n.o 46).

51

Por outro lado, o artigo 52.o, n.o 1, da Carta prevê que podem ser introduzidas restrições ao exercício dos direitos e liberdades garantidos por esta, desde que, em primeiro lugar, essas restrições estejam previstas na lei; em segundo lugar, respeitem o conteúdo essencial dos direitos e das liberdades em causa; e, em terceiro lugar, que, na observância do princípio da proporcionalidade, sejam necessárias e correspondam efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União ou à necessidade de proteção dos direitos e liberdades de terceiros.

52

No caso em apreço, porém, os três direitos fundamentais em presença não são suscetíveis de conflituar entre si, mas destinam‑se a ser aplicados complementarmente. Com efeito, o caráter efetivo da proteção que o artigo 47.o da Carta é suposto conceder ao titular do direito garantido por este só pode manifestar‑se e ser apreciado em relação a direitos materiais, como os previstos nos artigos 7.o e 8.o da Carta.

53

Mais concretamente, decorre das primeiras questões nos processos C‑245/19 e C‑246/19, lidas à luz da fundamentação que lhes está subjacente, que o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o artigo 47.o da Carta deve ser interpretado no sentido de que uma legislação nacional pode privar a pessoa que detém informações, o contribuinte objeto de um investigação fiscal e os terceiros a quem essas informações dizem respeito da possibilidade de interporem um recurso judicial contra uma decisão que ordene a prestação de tais informações à Administração Tributária, decisão que o órgão jurisdicional considera suscetível de prejudicar os direitos garantidos a essas diversas pessoas pelos artigos 7.o e 8.o da Carta.

Quanto ao direito à ação garantido pelo artigo 47.o da Carta

54

Como resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o direito à ação é invocável exclusivamente com base no artigo 47.o da Carta, não sendo necessário concretizar o seu conteúdo através de outras disposições do direito da União ou de disposições do direito interno dos Estados‑Membros (Acórdãos de 17 de abril de 2018, Egenberger, C‑414/16, EU:C:2018:257, n.o 78, e de 29 de julho de 2019, Torubarov, C‑556/17, EU:C:2019:626, n.o 56).

55

Assim sendo, o reconhecimento desse direito num determinado caso pressupõe, como resulta do artigo 47.o, primeiro parágrafo, da Carta, que a pessoa que o invoca beneficie dos direitos ou liberdades garantidos pelo direito da União.

– Quanto ao direito à ação da pessoa que detém informações a quem a autoridade competente decide ordenar lhe sejam prestadas

56

Como resulta da enunciação do órgão jurisdicional de reenvio, resumida no n.o 26 do presente acórdão, e das disposições nacionais referidas nos n.os 17 a 19 deste acórdão, a pessoa que detém as informações em causa nos processos principais é uma pessoa coletiva a quem a autoridade nacional competente dirigiu uma decisão em que ordena lhe sejam prestadas essas informações, cujo incumprimento é passível da aplicação de uma sanção.

57

No que respeita, em primeiro lugar, à questão de saber se deve ser reconhecido a essa pessoa o direito à ação garantido pelo artigo 47.o da Carta perante tal decisão, importa, antes de mais, salientar que resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que a proteção das pessoas singulares ou coletivas contra intervenções arbitrárias ou desproporcionadas do poder público na sua esfera de atividade privada constitui um princípio geral do direito da União (Acórdãos de 21 de setembro de 1989, Hoechst/Comissão, 46/87 e 227/88, EU:C:1989:337, n.o 19, e de 13 de setembro de 2018, UBS Europe e o., C‑358/16, EU:C:2018:715, n.o 56).

58

Ora, essa proteção pode ser invocada por uma pessoa coletiva, enquanto direito garantido pelo direito da União, na aceção do artigo 47.o, primeiro parágrafo, da Carta, para contestar na justiça um ato lesivo, como seja uma ordem para a prestação de informações ou uma sanção aplicada pelo incumprimento dessa ordem (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund, C‑682/15, EU:C:2017:373, n.os 51 e 52).

59

Daqui resulta que deve ser reconhecido a uma pessoa coletiva, a quem a autoridade nacional competente tenha dirigido uma decisão em que ordene a prestação de informações como as que estão em causa nos processos principais, o direito à ação garantido pelo artigo 47.o da Carta, perante tal decisão.

60

Em segundo lugar, no que respeita à questão de saber se uma legislação nacional pode restringir o exercício desse direito, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o exercício do direito à ação perante um tribunal, consagrado no artigo 47.o da Carta, pode ser restringido pelo legislador da União ou, na falta de regulamentação da União na matéria, pelos Estados‑Membros, se forem cumpridos os requisitos previstos no artigo 52.o, n.o 1, da Carta (v., neste sentido, Acórdão de 15 de setembro de 2016, Star Storage e o., C‑439/14 e C‑488/14, EU:C:2016:688, n.os 46 e 49).

61

No caso em apreço, não resulta de nenhuma das disposições da Diretiva 2011/16, cuja aplicação é assegurada pela legislação em causa nos processos principais, que o legislador da União tenha pretendido restringir o exercício do direito à ação perante uma decisão que ordene a prestação de informações como as que estão em causa nos processos principais.

62

Por outro lado, o artigo 25.o, n.o 1, da Diretiva 2011/16 remete para a regulamentação da União relativa ao tratamento de dados pessoais, ao prever que as trocas de informações ao abrigo dessa diretiva estão sujeitas às disposições da Diretiva 95/46, que, conforme referido no n.o 11 do presente acórdão, foi revogada e substituída, com efeitos a partir de 25 de maio de 2018, ou seja, após a adoção das decisões em causa nos processos principais, pelo Regulamento 2016/679, cujo objetivo consiste, nomeadamente, em assegurar e clarificar o direito à proteção dos dados pessoais garantido pelo artigo 8.o da Carta.

63

Ora, o artigo 22.o da Diretiva 95/46, reproduzido, em substância, pelo artigo 79.o do Regulamento 2016/679, sublinha que qualquer pessoa deve ter direito a uma ação judicial no caso de violação dos direitos que lhe são garantidos pelas disposições aplicáveis ao tratamento desses dados.

64

Daqui resulta que o próprio legislador da União não restringiu o exercício do direito à ação consagrado no artigo 47.o da Carta e que os Estados‑Membros podem restringir esse exercício, desde que cumpram os requisitos estabelecidos no artigo 52.o, n.o 1, da Carta.

65

Como recordado no n.o 51 do presente acórdão, essa disposição exige, nomeadamente, que qualquer restrição ao exercício dos direitos e liberdades garantidos pela Carta respeite o seu conteúdo essencial.

66

A este respeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o conteúdo essencial do direito à ação consagrado no artigo 47.o da Carta inclui, entre outros elementos, o de o titular desse direito poder aceder a um tribunal competente que assegure o respeito pelos direito que o direito da União lhe garante e, para o efeito, examine todas as questões de facto e de direito pertinentes para o litígio que é chamado a decidir (v., neste sentido, Acórdãos de 6 de novembro de 2012, Otis e o., C‑199/11, EU:C:2012:684, n.o 49, e de 12 de dezembro de 2019, Aktiva Finants, C‑433/18, EU:C:2019:1074, n.o 36). Além disso, para aceder a tal tribunal, essa pessoa não pode ser forçada a violar uma norma ou uma obrigação legal e a expor‑se à sanção associada a essa infração (v., neste sentido, Acórdãos de 1 de abril de 2004, Comissão/Jégo‑Quéré, C‑263/02 P, EU:C:2004:210, n.o 35; de 13 de março de 2007, Unibet, C‑432/05, EU:C:2007:163, n.o 64; e de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho, C‑583/11 P, EU:C:2013:625, n.o 104).

67

No caso vertente, resulta claramente da enunciação do órgão jurisdicional de reenvio, resumida no n.o 32 do presente acórdão, que, tendo em conta a legislação em causa nos processos principais, só se a pessoa a quem foi dirigida uma decisão que ordena sejam prestadas informações como as que estão em causa nos processos principais a não tiver cumprido, por um lado, e, por outro, lhe tiver posteriormente sido aplicada uma sanção com esse fundamento é que tem a possibilidade de contestar, a título subordinado, essa decisão, no âmbito do recurso que pode interpor contra essa sanção.

68

Daqui decorre que, perante uma decisão arbitrária ou desproporcionada que ordene a prestação de informações, essa pessoa não pode ter acesso a um tribunal, a não ser que infrinja essa decisão ao recusar‑se a cumprir a ordem nela contida e se exponha, assim, à sanção associada ao não cumprimento da mesma. Consequentemente, não se pode considerar que essa pessoa goze de uma tutela jurisdicional efetiva.

69

Nestas circunstâncias, deve considerar‑se que uma legislação nacional como a que está em causa nos processos principais, que exclui a possibilidade de a pessoa que detém informações, a quem a autoridade nacional competente dirija uma decisão que ordena a prestação dessas informações, interponha um recurso judicial dessa decisão, não respeita o conteúdo essencial do direito à ação garantido pelo artigo 47.o da Carta e que, consequentemente, o seu artigo 52.o, n.o 1, se opõe a essa legislação.

– Quanto ao direito à ação do contribuinte visado pelo inquérito na origem da decisão que ordena a prestação das informações

70

Como decorre da enunciação do órgão jurisdicional de reenvio, resumida no n.o 24 do presente acórdão, o contribuinte em causa nos processos principais é uma pessoa singular residente num Estado‑Membro diferente daquele a que pertence a autoridade que adotou as decisões que ordenam a prestação das informações em causa nos processos principais e que, nesse Estado‑Membro, é objeto de um inquérito que visa determinar a sua situação nos termos da legislação fiscal desse Estado‑Membro.

71

Por outro lado, a redação das decisões que ordenam a prestação de informações em causa nos processos principais, vertida nos n.os 26 e 36 do presente acórdão, mostra que as informações que essas decisões ordenam sejam prestadas à autoridade que as adotou dizem respeito a contas bancárias e a ativos financeiros de que essa pessoa seria titular ou beneficiária, bem como a diversas operações jurídicas, bancárias, financeiras ou, de um modo mais geral, económicas que possam ter sido efetuadas por essa pessoa ou por terceiros agindo em seu nome ou no seu interesse.

72

Em primeiro lugar, no que diz respeito à questão de saber se, perante tais decisões, deve ser reconhecido a essa pessoa o direito à ação consagrado no artigo 47.o da Carta, deve notar‑se que essa pessoa é evidentemente titular, por um lado, do direito ao respeito pela vida privada, garantido pelo artigo 7.o da Carta, e, por outro lado, do direito à proteção dos dados pessoais, garantido pelo seu artigo 8.o, n.o 1, o qual está estreitamente ligado, no caso das pessoas singulares, ao direito ao respeito pela sua vida privada [Acórdãos de 9 de novembro de 2010, Volker und Markus Schecke e Eifert, C‑92/09 e C‑93/09, EU:C:2010:662, n.o 47, e de 18 de junho de 2020, Comissão/Hungria (Transparência associativa), C‑78/18, EU:C:2020:476, n.os 123 e 126].

73

Além disso, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que a prestação de informações relativas a uma pessoa singular identificada ou identificável a um terceiro, incluindo a uma autoridade pública, bem como a medida que impõe ou permite essa prestação, constituem, sem prejuízo da sua eventual justificação, ingerências no direito dessa pessoa ao respeito pela sua vida privada e no seu direito à proteção dos dados pessoais que lhe dizem respeito, independentemente da questão de saber se essas informações têm, ou não, caráter sensível e qualquer que seja a sua utilização ulterior, exceto se a referida prestação de informações ocorrer com observância das disposições do direito da União e, sendo caso disso, das disposições de direito interno previstas para o efeito [v., neste sentido, Acórdãos de 18 de junho de 2020, Comissão/Hungria (Transparência associativa), C‑78/18, EU:C:2020:476, n.os 124 e 126, e de 16 de julho de 2020, Facebook Ireland e Schrems, C‑311/18, EU:C:2020:559, n.o 171 e jurisprudência referida].

74

Assim, a prestação à autoridade nacional competente de informações relativas a uma pessoa singular identificada ou identificável, como as informações referidas no n.o 71 do presente acórdão, e a medida que, à semelhança das decisões referidas no mesmo número, impõe essa prestação são suscetíveis de violar o direito ao respeito pela vida privada da pessoa em causa e o seu direito à proteção dos dados pessoais que lhe dizem respeito.

75

Por conseguinte, deve ser reconhecido a um contribuinte como o visado no n.o 70 do presente acórdão o direito à ação garantido pelo artigo 47.o da Carta perante uma decisão que ordena a prestação de informações como as que estão em causa nos processos principais.

76

Em segundo lugar, no que respeita à questão de saber se pode haver uma restrição ao exercício desse direito, nos termos do artigo 52.o, n.o 1, da Carta, que exclua que essa pessoa possa interpor um recurso judicial contra essa decisão, importa recordar que tal restrição deve, em primeiro lugar, ser prevista por lei, o que implica, nomeadamente, como resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, que a sua base jurídica deve definir, de forma clara e precisa, o seu alcance (Acórdãos de 17 de dezembro de 2015, WebMindLicenses, C‑419/14, EU:C:2015:832, n.o 81, e de 8 de setembro de 2020, Recorded Artists Actors Performers, C‑265/19, EU:C:2020:677, n.o 86).

77

No caso vertente, a redação da legislação nacional em causa nos processos principais mostra que esse requisito está preenchido.

78

Em segundo lugar, deve ser respeitado o conteúdo essencial do direito à ação, devendo esse requisito ser apreciado, nomeadamente, à luz dos elementos enunciados no n.o 66 do presente acórdão.

79

A este respeito, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que esse requisito não implica, enquanto tal, que o titular desse direito disponha de um recurso judicial que tenha por objeto, a título principal, a impugnação de uma determinada medida, desde que, por outro lado, existam, nos diversos órgãos jurisdicionais nacionais competentes, uma ou várias vias de recurso que lhe permitam obter, a título subordinado, a fiscalização judicial dessa medida que assegure o respeito pelos direitos e liberdades que o direito da União lhe garante, sem que, para o efeito, se tenha de expor ao risco de lhe ser aplicada uma sanção no caso de incumprimento da medida em causa (v., neste sentido, Acórdãos de 13 de março de 2007, Unibet, C‑432/05, EU:C:2007:163, n.os 47, 49, 53 a 55, 61 e 64, e de 21 de novembro de 2019, Deutsche Lufthansa, C‑379/18, EU:C:2019:1000, n.o 61).

80

No caso em apreço, deve salientar‑se, a este respeito, que a situação do contribuinte visado por um inquérito é diferente da da pessoa que detém informações relativas ao contribuinte. Com efeito, como se afirmou no n.o 68 do presente acórdão, esta última, na impossibilidade de interpor um recurso judicial de uma decisão que lhe é dirigida e lhe impõe uma obrigação legal de prestar as informações em causa, ficaria privada de qualquer tutela jurisdicional efetiva. Em contrapartida, o contribuinte visado não é destinatário de tal decisão e não está sujeito a qualquer obrigação legal por parte deste último, nem, portanto, ao risco de lhe ser aplicada uma sanção em caso de incumprimento da mesma. Por conseguinte, esse contribuinte não é obrigado a colocar‑se numa situação ilegal para poder exercer o seu direito à ação, pelo que a jurisprudência citada no segundo período do n.o 66 do presente acórdão não lhe é aplicável.

81

Por outro lado, uma decisão que ordena a prestação de informações como as que estão em causa nos processos principais é tomada no contexto da fase preliminar do inquérito relativo ao contribuinte em causa, durante o qual são recolhidas informações relativas à sua situação fiscal e que não têm natureza contraditória. Com efeito, apenas a fase subsequente do referido inquérito, que se inicia com o envio ao contribuinte em causa de uma proposta de retificação ou uma liquidação adicional, tem, por um lado, natureza contraditória, o que significa que permite a esse contribuinte exercer o seu direito a ser ouvido (v., neste sentido, Acórdão de 22 de outubro de 2013, Sabou, C‑276/12, EU:C:2013:678, n.os 40 e 44) e, por outro, é suscetível de conduzir a uma decisão de retificação ou de liquidação adicional dirigida ao referido contribuinte.

82

Ora, esta última decisão constitui um ato em relação ao qual o contribuinte que dele é destinatário deve ter direito à ação, o que pressupõe que o tribunal a quem o litígio foi apresentado seja competente para examinar todas as questões de direito e de facto relevantes para a resolução desse litígio, como referido no n.o 66 do presente acórdão, e, em especial, para verificar se as provas em que esse ato se baseia não foram obtidas nem utilizadas em violação dos direitos e liberdades garantidos ao interessado pelo direito da União (v., por analogia, Acórdão de 17 de dezembro de 2015, WebMindLicenses, C‑419/14, EU:C:2015:832, n.os 87 a 89).

83

Por conseguinte, quando uma decisão que ordena a prestação de informações como as que estão em causa nos processos principais leva a autoridade nacional que solicitou essas informações a adotar uma decisão de retificação ou de liquidação adicional baseada, a título probatório, nas referidas informações, o contribuinte visado pelo inquérito tem a possibilidade de contestar, a título subordinado, a primeira dessas decisões e os requisitos de obtenção e utilização das provas recolhidas graças a essa decisão, no âmbito do recurso que pode interpor contra a segunda dessas decisões.

84

Consequentemente, deve considerar‑se que uma legislação nacional como a que está em causa nos processos principais não prejudica o conteúdo essencial do direito à ação garantido ao contribuinte visado. Além disso, não restringe o acesso desse contribuinte aos recursos previstos no artigo 79.o, n.o 1, do Regulamento 2016/679, que reproduz, com alterações, o artigo 22.o da Diretiva 95/46, se esse contribuinte considerar que os direitos que este regulamento lhe confere foram violados em resultado do tratamento dos dados pessoais que lhe dizem respeito.

85

Em terceiro lugar, conforme enunciado no n.o 51 do presente acórdão, tal legislação nacional deve, na observância do princípio da proporcionalidade, ser necessária e corresponder efetivamente a um objetivo de interesse geral reconhecido pela União. Há, portanto, que verificar sucessivamente se essa legislação corresponde a um objetivo de interesse geral reconhecido pela União e, em caso afirmativo, se observa o princípio da proporcionalidade (v., neste sentido, Acórdãos de 5 de julho de 2017, Fries, C‑190/16, EU:C:2017:513, n.o 39, e de 12 de julho de 2018, Spika e o., C‑540/16, EU:C:2018:565, n.o 40).

86

A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio sublinha que a legislação em causa nos processos principais transpõe a Diretiva 2011/16, cujo considerando 27 prevê que sejam introduzidas limitações necessárias e proporcionadas à proteção das pessoas singulares no tocante ao tratamento dos dados pessoais que lhes dizem respeito, conforme garantido pela Diretiva 95/46, cujos considerandos 1 e 2 enunciam que o seu objetivo é contribuir para o combate à fraude e à evasão fiscais internacionais, reforçando a cooperação entre as autoridades nacionais competentes neste domínio.

87

Ora, este objetivo constitui um objetivo de interesse geral reconhecido pela União, na aceção do artigo 52.o, n.o 1, da Carta [v., neste sentido, Acórdãos de 22 de outubro de 2013, Sabou, C‑276/12, EU:C:2013:678, n.o 32; de 17 de dezembro de 2015, WebMindLicenses, C‑419/14, EU:C:2015:832, n.o 76; e de 26 de fevereiro de 2019, X (Sociedades intermediárias estabelecidas em países terceiros), C‑135/17, EU:C:2019:136, n.os 74 e 75], suscetível de permitir uma restrição ao exercício dos direitos garantidos pelos seus artigos 7.o, 8.o e 47.o, considerados individualmente ou em conjunto.

88

Daqui resulta que o objetivo prosseguido pela legislação nacional em causa nos processos principais constitui um objetivo de interesse geral reconhecido pela União.

89

Esse objetivo de combate à fraude e à evasão fiscais internacionais encontra tradução, nomeadamente, nos artigos 5.o a 7.o da Diretiva 2011/16, através da instituição de um procedimento de troca de informações a pedido que permite às autoridades nacionais competentes cooperar eficaz e rapidamente entre si com o objetivo de obter informações no contexto de inquéritos instaurados contra este ou aquele contribuinte (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund, C‑682/15, EU:C:2017:373, n.os 46, 47 e 77).

90

Ora, o interesse associado à eficácia e à rapidez dessa cooperação, que concretiza o objetivo do combate à fraude e à evasão fiscais internacionais subjacente à Diretiva 2011/16, impõe nomeadamente o cumprimento de todos os prazos previstos no artigo 7.o desta diretiva.

91

Atendendo a esta situação, uma legislação nacional que exclui a possibilidade de interposição de recurso judicial de uma decisão que ordena a prestação de informações como as que estão em causa nos processos principais pelo contribuinte visado pela investigação na origem do pedido de troca de informações e que levou a autoridade nacional competente a adotar essa decisão deve ser considerada adequada para alcançar o objetivo do combate à fraude e à evasão fiscais internacionais prosseguido pela Diretiva 2011/16 e necessária à realização desse objetivo.

92

Além disso, essa legislação não se afigura desproporcionada, uma vez que, por um lado, tal decisão não sujeita o contribuinte visado a qualquer obrigação legal nem ao risco de incorrer numa sanção e, por outro, o contribuinte tem a possibilidade de contestar essa decisão, a título subordinado, no contexto de um recurso interposto da decisão subsequente de retificação ou de liquidação adicional.

93

Nestas circunstâncias, deve considerar‑se que o artigo 47.o da Carta, conjugado com os artigos 7.o e 8.o, bem como com o artigo 52.o, n.o 1, desta, não se opõe a que uma legislação nacional como a que está em causa nos processos principais exclua a possibilidade de uma decisão, através da qual a autoridade competente de um Estado‑Membro obriga a pessoa que detenha informações a prestar‑lhas para poder dar seguimento a um pedido de troca de informações emanado da autoridade competente de outro Estado‑Membro, poder ser objeto de um recurso judicial interposto pelo contribuinte visado, nesse outro Estado‑Membro, pelo inquérito na origem ao pedido.

– Quanto ao direito à ação dos terceiros interessados

94

Como decorre dos n.os 26, 36 e 71 do presente acórdão, os terceiros interessados a quem o órgão jurisdicional de reenvio se refere são pessoas coletivas com as quais o contribuinte visado pelo inquérito na origem às decisões que ordenaram a prestação das informações em causa nos processos principais mantém ou é suscetível de manter relações jurídicas, bancárias, financeiras ou, de um modo mais geral, económicas.

95

Em primeiro lugar, importa determinar se, numa situação como a que está em causa nos processos principais, deve ser reconhecido a esses terceiros o direito à ação consagrado no artigo 47.o da Carta.

96

A este respeito, deve observar‑se que, à semelhança de uma pessoa coletiva detentora de informações a quem a autoridade nacional competente dirija uma decisão que ordena a prestação dessas informações, esses terceiros podem invocar a proteção de que goza qualquer pessoa singular ou coletiva, por força do princípio geral de direito da União evocado no n.o 57 do presente acórdão, contra intervenções arbitrárias ou desproporcionadas do poder público na sua esfera de atividade privada, mesmo que não se possa considerar que a prestação a uma autoridade pública de informações jurídicas, bancárias, financeiras ou, de um modo mais geral, económicas que lhes digam respeito afeta o núcleo dessa atividade [v., neste sentido, TEDH, 16 de junho de 2015 (déc.), Othymia Investments BV c. Países Baixos, CE:ECHR:2015:0616DEC007529210, § 37; 7 de julho de 2015, M. N. e o. c. San Marino, CE:ECHR:2015:0707JUD002800512, §§ 51 e 54; e de 22 de dezembro de 2015, G.S. B. c. Suíça, CE:ECHR:2015:1222JUD002860111, §§ 51 e 93].

97

Portanto, deve ser reconhecido a esses terceiros o direito à ação perante uma decisão que ordene a prestação de informações que possam violar o seu direito a tal proteção.

98

Em segundo lugar, no que respeita à questão de saber se o exercício do direito à ação garantido aos terceiros interessados relativamente às informações em causa pode ser de tal forma restringido que só possa haver interposição de um recurso judicial perante tal decisão, deve salientar‑se, em primeiro lugar, que a legislação nacional em causa nos processos principais define, de forma clara e precisa, a restrição que impõe ao exercício desse direito.

99

Em segundo lugar, no que se refere ao requisito relativo ao respeito pelo conteúdo essencial do direito à ação, é importante notar que os terceiros interessados relativamente às informações em causa, ao contrário da pessoa detentora dessas informações a quem a autoridade competente de um Estado‑Membro tenha dirigido uma decisão que ordena a prestação dessas informações, não estão sujeitos nem à obrigação legal de prestar essas informações nem, por conseguinte, ao risco de lhes ser aplicada uma sanção em caso de incumprimento de tal obrigação legal. Por conseguinte, não lhes é aplicável a jurisprudência referida no segundo período do n.o 66 do presente acórdão.

100

Por outro lado, é verdade que a prestação a uma autoridade pública de informações relativas a esses terceiros, pelo destinatário de uma decisão que lhe ordena que as preste a essa autoridade pública, é suscetível de violar o direito à proteção desses terceiros contra intervenções arbitrárias ou desproporcionadas das autoridades públicas na sua esfera de atividade privada e, ao fazê‑lo, de lhes causar um dano.

101

Todavia, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a possibilidade de um determinado interessado intentar uma ação judicial para que seja declarado que os direitos que lhe são garantidos pelo direito da União foram violados e obter uma indemnização pelos danos causados por essa violação garante‑lhe uma tutela jurisdicional efetiva, desde que o tribunal chamado a pronunciar‑se tenha a possibilidade de fiscalizar o ato ou a medida na origem dessa violação e desse dano (v., neste sentido, Acórdão de 13 de março de 2007, Unibet, C‑432/05, EU:C:2007:163, n.o 58).

102

Daí resulta, no caso em apreço, que o respeito pelo conteúdo essencial do direito à ação não impõe que interessados como os terceiros relativamente às informações em causa tenham, apesar de não estarem sujeitos à obrigação legal de prestar essas informações nem, portanto, ao risco de lhes ser aplicada uma sanção pelo não cumprimento dessa obrigação legal, a possibilidade, além disso, de interpor um recurso judicial contra a decisão que ordena a prestação das referidas informações.

103

Em terceiro lugar, deve recordar‑se que a legislação nacional em causa nos processos principais prossegue um objetivo de interesse geral reconhecido pela União, como enunciado nos n.os 86 a 88 do presente acórdão.

104

Quanto ao requisito relativo ao caráter necessário e proporcional dessa legislação à luz de tal objetivo, deve considerar‑se, como decorre dos n.os 90 a 92 do presente acórdão, que o mesmo se encontra preenchido, tendo em conta, por um lado, os prazos a respeitar para garantir a eficácia e rapidez do procedimento de troca de informações que concretiza o objetivo de combate à fraude e evasão fiscais internacionais, subjacente à Diretiva 2011/16, e, por outro, a possibilidade de os interessados intentarem uma ação judicial para que seja declarada a violação dos direitos que lhes são garantidos pelo direito da União e para a reparação do dano causado por essa violação.

105

À luz de todas as considerações precedentes, há que responder às primeiras questões nos processos C‑245/19 e C‑246/19 que o artigo 47.o da Carta, conjugado com os artigos 7.o e 8.o, bem como com o artigo 52.o, n.o 1, desta, deve ser interpretado no sentido de que:

se opõe a que a legislação de um Estado‑Membro que concretiza o procedimento de troca de informações a pedido instituído pela Diretiva 2011/16 exclua que uma decisão através da qual a autoridade competente desse Estado‑Membro obriga a pessoa que detenha informações a prestar‑lhas para poder dar seguimento a um pedido de troca de informações emanado da autoridade competente de outro Estado‑Membro possa ser objeto de um recurso interposto por essa pessoa; e

não se opõe a que tal legislação exclua que essa decisão possa ser objeto de recursos interpostos pelo contribuinte visado, no outro Estado‑Membro, pelo inquérito na origem do referido pedido, bem como pelos terceiros interessados relativamente às informações em causa.

Quanto à segunda questão no processo C‑245/19

106

Tendo em conta as respostas dadas às primeiras questões nos processos C‑245/19 e C‑246/19 e a circunstância de as segundas questões nesses processos só terem sido submetidas para o caso de as primeiras serem respondidas afirmativamente, há apenas que responder à segunda questão no processo C‑245/19.

107

Com esta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 1.o, n.o 1, e o artigo 5.o da Diretiva 2011/16 devem ser interpretados no sentido de que uma decisão através da qual a autoridade competente de um Estado‑Membro obriga a pessoa que detenha informações a prestar‑lhas para poder dar seguimento a um pedido de troca de informações emanado da autoridade competente de outro Estado‑Membro deve ser considerada, juntamente com esse pedido, como incidindo sobre informações que não se afiguram, de forma manifesta, desprovidas de relevância previsível, desde que indique a identidade da pessoa que detém as informações em causa, a do contribuinte visado pelo inquérito na origem do pedido de troca de informações e o período abrangido por este, e que diga respeito a contratos, faturação e pagamentos que, embora não estando identificados de um modo preciso, estão delimitados através de critérios relativos, em primeiro lugar, ao facto de terem sido respetivamente celebrados ou efetuados pelo detentor; em segundo lugar, à circunstância de terem ocorrido no período abrangido por esse inquérito; e, em terceiro lugar, ao facto de estarem relacionados com o contribuinte visado.

108

O artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2011/16 prevê que os Estados‑Membros devem cooperar entre si tendo em vista a troca de informações previsivelmente relevantes para a administração e a execução da sua legislação interna em matéria fiscal.

109

Por sua vez, o artigo 5.o dessa diretiva enuncia que, a pedido da autoridade nacional que pretende lhe sejam comunicadas essas informações, denominada «autoridade requerente», a autoridade a quem esse pedido é dirigido, denominada «autoridade requerida», lhas comunica, se for caso disso, depois de as ter obtido na sequência de uma investigação.

110

A expressão «previsivelmente relevantes» constante do artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2011/16 visa, como o Tribunal de Justiça já referiu, permitir à autoridade requerente solicitar e obter todas as informações que possa razoavelmente considerar relevantes para efeitos da sua investigação, sem contudo a autorizar a extravasar de forma manifesta o âmbito desta nem a impor encargos excessivos à autoridade requerida (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund, C‑682/15, EU:C:2017:373, n.os 63 e 66 a 68).

111

Além disso, esta expressão deve ser interpretada à luz do princípio geral de direito da União relativo à proteção das pessoas singulares ou coletivas contra intervenções arbitrárias ou desproporcionadas do poder público na sua esfera privada de atividade, referido no n.o 57 do presente acórdão.

112

A esse respeito, deve observar‑se que, embora a autoridade requerente, que tem a direção do inquérito na origem do pedido de troca de informações, tenha margem de apreciação na avaliação, de acordo com as circunstâncias do caso, da relevância previsível das informações solicitadas, não pode, no entanto, solicitar à autoridade requerida informações sem qualquer relevância para essa investigação (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund, C‑682/15, EU:C:2017:373, n.os 70 e 71).

113

Assim, uma decisão que ordenasse a prestação de informações através da qual a autoridade requerida desse cumprimento a um pedido de troca de informações da autoridade requerente destinado a que fosse efetuada uma pesquisa de informações aleatória, tal como referido no considerando 9 da Diretiva 2011/16, equivaleria a uma intervenção arbitrária ou desproporcionada do poder público.

114

Daí decorre que informações solicitadas para efeitos dessa pesquisa «aleatória» não podem, em caso algum, ser consideradas «previsivelmente relevantes», na aceção do artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2011/16.

115

A este respeito, a autoridade requerida deve verificar se a fundamentação do pedido de troca de informações que lhe foi dirigido pela autoridade requerente é suficiente para demonstrar que as informações em questão não se afiguram desprovidas de relevância previsível tendo em conta a identidade do contribuinte visado pelo inquérito na origem desse pedido, as necessidades desse inquérito e, caso seja necessário obter as informações em causa junto da pessoa que as possua, a identidade dessa pessoa (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund, C‑682/15, EU:C:2017:373, n.os 76, 78, 80 e 82).

116

Por outro lado, no caso de essa pessoa ter interposto recurso da decisão que ordena a prestação de informações que lhe foi dirigida, o órgão jurisdicional competente deve fiscalizar se a fundamentação dessa decisão e do pedido em que a mesma se baseia é suficiente para demonstrar que as informações em causa não se afiguram, de forma manifesta, desprovidas de relevância previsível tendo em conta a identidade do contribuinte visado, a da pessoa que detém essas informações e as necessidades do inquérito em causa (v., neste sentido, Acórdão de 16 de maio de 2017, Berlioz Investment Fund, C‑682/15, EU:C:2017:373, n.o 86).

117

É, portanto, à luz destes elementos que importa determinar se uma decisão que ordena a prestação de informações como a que está na origem do litígio no processo C‑245/19, juntamente com o pedido de troca de informações em que essa decisão se baseia, diz respeito a informações que não se afiguram, de forma manifesta, desprovidas de relevância previsível.

118

A este respeito, deve notar‑se que tal decisão, juntamente com tal pedido, diz claramente respeito a informações que não se afiguram, de forma manifesta, desprovidas de relevância previsível, na medida em que a decisão indica a identidade do contribuinte visado pelo inquérito na origem de tal pedido, o período abrangido por tal inquérito e a identidade da pessoa que detém as informações relativas aos contratos, faturação e pagamentos celebrados ou efetuados durante esse período e relativos ao contribuinte em questão.

119

As dúvidas do órgão jurisdicional de reenvio provêm, porém, do facto de essa decisão, juntamente com esse pedido, dizer respeito a contratos, faturação e pagamentos que não são identificados com precisão.

120

Deve observar‑se, por um lado, que essa decisão, juntamente com esse pedido, diz indubitavelmente respeito a informações que não se afiguram, de forma manifesta, desprovidas de relevância previsível, na medida em que se refere a contratos, faturas e pagamentos que foram celebrados ou efetuados durante o período abrangido pelo inquérito, pela pessoa que detém informações a esse respeito e são relativos ao contribuinte visado pela investigação.

121

Por outro lado, importa recordar que tanto a referida decisão como o referido pedido ocorreram, como resulta do n.o 81 do presente acórdão, durante a fase preliminar do mencionado inquérito, cujo objetivo é recolher informações em relação às quais a autoridade requerente não tem, supostamente, um conhecimento preciso e completo.

122

Nestas circunstâncias, afigura‑se ser previsível que algumas das informações objeto da decisão que ordena a prestação de informações na origem do litígio no processo C‑245/19, juntamente com o pedido de troca de informações em que se baseia, acabem por se revelar, no final do inquérito conduzido pela autoridade requerente, irrelevantes à luz dos resultados desse inquérito.

123

Todavia, tendo em conta as apreciações constantes dos n.os 118 e 120 do presente acórdão, esta situação não pode implicar que, para efeitos da fiscalização referida nos n.os 115 e 116 desse acórdão, se considere que as informações em causa se afiguram, de forma manifesta, desprovidas de relevância previsível e, por conseguinte, não cumprem os requisitos decorrentes do artigo 1.o, n.o 1, e do artigo 5.o da Diretiva 2011/16.

124

À luz de todas as considerações precedentes, há que responder à segunda questão no processo C‑245/19 que o artigo 1.o, n.o 1, e o artigo 5.o da Diretiva 2011/16 devem ser interpretados no sentido de que uma decisão através da qual a autoridade competente de um Estado‑Membro obriga a pessoa que detenha informações a prestar‑lhas para poder dar seguimento a um pedido de troca de informações emanado da autoridade competente de outro Estado‑Membro deve ser considerada, juntamente com esse pedido, como incidindo sobre informações que não se afiguram, de forma manifesta, desprovidas de relevância previsível, desde que indique a identidade da pessoa que detém as informações em causa, a do contribuinte visado pelo inquérito na origem do pedido de troca de informações e o período abrangido por este, e que diga respeito a contratos, faturação e pagamentos que, embora não estando identificados de um modo preciso, estão delimitados através de critérios relativos, em primeiro lugar, ao facto de terem sido respetivamente celebrados ou efetuados pelo detentor; em segundo lugar, à circunstância de terem ocorrido no período abrangido por esse inquérito; e, em terceiro lugar, ao facto de estarem relacionados com o contribuinte visado.

Quanto às despesas

125

Revestindo os processos, quanto às partes nas causas principais, a natureza de incidentes suscitados perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:

 

1)

O artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, conjugado com os artigos 7.o e 8.o, bem como com o artigo 52.o, n.o 1, desta, deve ser interpretado no sentido de que:

se opõe a que a legislação de um Estado‑Membro que concretiza o procedimento de troca de informações a pedido instituído pela Diretiva 2011/16/UE do Conselho, de 15 de fevereiro de 2011, relativa à cooperação administrativa no domínio da fiscalidade e que revoga a Diretiva 77/799/CEE, conforme alterada pela Diretiva 2014/107/UE do Conselho, de 9 de dezembro de 2014, exclua que uma decisão através da qual a autoridade competente desse Estado‑Membro obriga a pessoa que detenha informações a prestar‑lhas para poder dar seguimento a um pedido de troca de informações emanado da autoridade competente de outro Estado‑Membro possa ser objeto de um recurso interposto por essa pessoa; e

não se opõe a que tal legislação exclua que essa decisão possa ser objeto de recursos interpostos pelo contribuinte visado, no outro Estado‑Membro, pelo inquérito na origem do referido pedido, bem como pelos terceiros interessados relativamente às informações em causa.

 

2)

O artigo 1.o, n.o 1, e o artigo 5.o da Diretiva 2011/16, conforme alterada pela Diretiva 2014/107, devem ser interpretados no sentido de que uma decisão através da qual a autoridade competente de um Estado‑Membro obriga a pessoa que detenha informações a prestar‑lhas para poder dar seguimento a um pedido de troca de informações emanado da autoridade competente de outro Estado‑Membro deve ser considerada, juntamente com esse pedido, como incidindo sobre informações que não se afiguram, de forma manifesta, desprovidas de relevância previsível, desde que indique a identidade da pessoa que detém as informações em causa, a do contribuinte visado pelo inquérito na origem do pedido de troca de informações e o período abrangido por este, e que diga respeito a contratos, faturação e pagamentos que, embora não estando identificados de um modo preciso, estão delimitados através de critérios relativos, em primeiro lugar, ao facto de terem sido respetivamente celebrados ou efetuados pelo detentor; em segundo lugar, à circunstância de terem ocorrido no período abrangido por esse inquérito; e, em terceiro lugar, ao facto de estarem relacionados com o contribuinte visado.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: francês.

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