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Document 62019CC0322

Conclusões do advogado-geral J. Richard de la Tour apresentadas em 3 de setembro de 2020.
KS e MHK contra The International Protection Appeals Tribunal e o. e R.A.T. e D.S. contra Minister for Justice and Equality.
Pedidos de decisão prejudicial apresentados pela High Court (Irlanda) e pelo International Protection Appeals Tribunal.
Reenvio prejudicial — Controlos nas fronteiras, asilo e imigração — Proteção internacional — Normas para o acolhimento dos requerentes de proteção internacional — Diretiva 2013/33/UE — Nacional de um Estado terceiro que se deslocou de um Estado‑Membro da União Europeia para outro, mas que só requereu proteção internacional neste último — Decisão de transferência para o primeiro Estado‑Membro — Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Acesso ao mercado de trabalho como requerente de proteção internacional.
Processos apensos C-322/19 e C-385/19.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2020:642

 CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

JEAN RICHARD DE LA TOUR

apresentadas em 3 de setembro de 2020 ( 1 )

Processos apensos C‑322/19 e C‑385/19

K.S.,

M.H.K.

contra

The International Protection Appeals Tribunal,

The Minister for Justice and Equality,

Ireland and the Attorney General (C‑322/19)

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela High Court (Tribunal Superior, Irlanda)]

e

R.A.T.,

D.S.

contra

Minister for Justice and Equality (C‑385/19)

[pedido de decisão prejudicial apresentado pelo International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional, Irlanda)]

«Reenvio prejudicial — Política de asilo — Diretiva 2013/33/UE — Normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional — Artigo 15.o — Acesso ao mercado de trabalho — Condições de acesso — Interpretação da condição relativa à qualidade de “requerente” — Interpretação da condição relativa à inexistência de atraso imputável ao requerente — Requerentes em relação aos quais tenha sido adotada uma decisão de transferência em aplicação do Regulamento (UE) n.o 604/2013 — Legislação nacional que priva os requerentes dessa qualidade em virtude da adoção de tal decisão — Admissibilidade»

I. Introdução

1.

Nos presentes processos, pede‑se ao Tribunal de Justiça para precisar as modalidades de acolhimento de um requerente de proteção internacional (a seguir «requerente») relativamente ao qual uma autoridade nacional adotou uma decisão de transferência para o Estado‑Membro que identificou como responsável pela análise desse pedido (a seguir «Estado‑Membro responsável») em aplicação do Regulamento (UE) n.o 604/2013 ( 2 ).

2.

Em particular, as questões prejudiciais têm por objeto o acesso ao mercado de trabalho, que é uma condição de acolhimento prevista no artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33/UE ( 3 ). Segundo esta disposição, os Estados‑Membros devem assegurar que o requerente tenha acesso ao mercado de trabalho no prazo máximo de nove meses a contar da apresentação do pedido, se a autoridade competente não tiver tomado uma decisão em primeira instância e esse atraso não puder ser imputado ao requerente.

3.

Ora, a legislação irlandesa em causa prevê que a adoção de uma decisão de transferência destinada a um requerente tem o efeito de privar o interessado dessa qualidade, bem como do direito de requerer a autorização de trabalho que lhe está associada ( 4 ).

4.

Em conformidade com o pedido do Tribunal de Justiça, as presentes conclusões limitar‑se‑ão à análise das principais questões de direito novas que se colocam no caso vertente.

5.

A primeira questão é relativa à determinação dos beneficiários da medida prevista no artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33 e tem por objeto, nomeadamente, a interpretação do conceito de «requerente» nos termos do direito de acesso ao mercado de trabalho previsto nesta disposição. Esta questão, que se insere na linha do Acórdão de 27 de setembro de 2012, Cimade e GISTI ( 5 ), visa determinar se, nos termos dessa disposição, um Estado‑Membro pode recusar o acesso ao mercado de trabalho a um requerente em relação ao qual tenha sido adotada uma decisão de transferência.

6.

Nas presentes conclusões, explicarei as razões por que a adoção de uma decisão de transferência destinada a um requerente não pode ter o efeito de o privar dessa qualidade e dos direitos a ela associados.

7.

A segunda questão é relativa à natureza dos comportamentos suscetíveis de ter causado um atraso imputável ao requerente na aceção do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33. O Tribunal de Justiça é chamado a declarar se uma autoridade nacional pode imputar ao requerente o atraso resultante da aplicação do procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável, privando‑o assim do acesso ao mercado de trabalho, com o fundamento, primeiro, de que não apresentou o seu pedido de proteção internacional no Estado‑Membro de primeira entrada irregular ou, em caso de estada regular, no Estado‑Membro de estada e, segundo, de que interpôs recurso judicial da decisão de transferência adotada a seu respeito em aplicação do Regulamento n.o 604/2013.

8.

Nas presentes conclusões, irei expor as razões por que, na situação atual dos textos do sistema europeu comum de asilo (SECA), nenhuma destas circunstâncias pode ser considerada como tendo causado um atraso imputável ao requerente na aceção do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33, suscetível de o privar do acesso ao mercado de trabalho no Estado‑Membro de acolhimento.

II. Quadro jurídico

A.   Direito da União

9.

Nos termos do artigo 78.o TFUE, o sistema europeu comum de asilo é composto por vários textos, nomeadamente, a Diretiva 2011/95/UE ( 6 ), que estabelece as condições de concessão de proteção internacional, a Diretiva 2013/32/UE ( 7 ), que especifica as modalidades processuais de análise de um pedido de proteção internacional, a Diretiva 2013/33, cuja interpretação é aqui solicitada e que estabelece as normas de acolhimento dos requerentes de proteção internacional, e o Regulamento (CE) n.o 604/2013, que especifica os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável.

1. Diretiva 2011/95

10.

Nos termos do seu artigo 1.o, o objetivo da Diretiva 2011/95 é, nomeadamente, estabelecer as normas relativas às condições a preencher pelos nacionais de países terceiros ou por apátridas para poderem beneficiar de proteção internacional.

11.

O artigo 4.o desta diretiva, sob a epígrafe «Apreciação dos factos e circunstâncias», prevê, nos seus n.os 1 e 2:

«1.   Os Estados‑Membros podem considerar que incumbe ao requerente apresentar o mais rapidamente possível todos os elementos necessários para justificar o pedido de proteção internacional. Incumbe ao Estado‑Membro apreciar, em cooperação com o requerente, os elementos pertinentes do pedido.

2.   Os elementos mencionados no n.o 1 consistem nas declarações do requerente e em toda a documentação de que o requerente disponha sobre a sua idade, história pessoal, incluindo a dos familiares pertinentes, identidade, nacionalidade(s), país(es) e local(is) de residência anteriores, pedidos de asilo anteriores, itinerários, documentos de viagem e os motivos pelos quais solicita proteção internacional.»

2. Diretiva 2013/32

12.

A Diretiva 2013/32 tem por objetivo estabelecer as regras e as garantias processuais aplicáveis à apreciação de um pedido de proteção internacional.

13.

O artigo 2.o, alínea p), desta diretiva define a expressão «permanência no Estado‑Membro» como «a permanência no território do Estado‑Membro em que o pedido de proteção internacional foi apresentado ou esteja a ser apreciado […]».

14.

Nos termos do capítulo II da referida diretiva, intitulado «Princípios e garantias fundamentais», o artigo 9.o, n.o 1, prevê que «[o]s requerentes são autorizados a permanecer no Estado‑Membro, unicamente para efeitos do processo, até à pronúncia de uma decisão pelo órgão de decisão nos termos dos procedimentos em primeira instância contemplados no capítulo III».

15.

O artigo 13.o da Diretiva 2013/32, que enuncia as «[o]brigações dos requerentes», dispõe:

«1.   Os Estados‑Membros devem impor aos requerentes a obrigação de cooperar com as autoridades competentes, a fim de determinar a respetiva identidade e outros elementos referidos no artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva [2011/95]. Os Estados‑Membros podem impor aos requerentes outras obrigações de cooperação com as autoridades competentes, desde que sejam necessárias à tramitação do pedido.

2.   Em especial, os Estados‑Membros podem prever que:

a)

Os requerentes devam contactar as autoridades competentes ou comparecer pessoalmente junto destas, imediatamente ou em momento determinado;

b)

Os requerentes devam entregar os documentos em sua posse relevantes para a apreciação do pedido, como os passaportes;

c)

Os requerentes devam informar, logo que possível, as autoridades competentes sobre o seu local de residência ou a sua morada atual e comunicar‑lhes qualquer alteração desses dados, o mais rapidamente possível […];

d)

As autoridades competentes possam revistar o requerente e os objetos que transportar […];

e)

As autoridades competentes possam tirar fotografias do requerente; e

f)

As autoridades competentes possam gravar as declarações orais do requerente, desde que este seja previamente informado desse facto.»

16.

No capítulo III da Diretiva 2013/32, o artigo 31.o, n.o 3, tem a seguinte redação:

«Os Estados‑Membros asseguram a conclusão do procedimento de apreciação no prazo de seis meses a contar da apresentação do pedido.

No caso de um pedido sujeito o procedimento estabelecido no Regulamento [n.o 604/2013], o prazo de seis meses começa a contar do momento em que o Estado‑Membro responsável pela sua análise for determinado, nos termos desse regulamento, e o requerente se encontrar no território desse Estado‑Membro e tiver sido tomado a cargo pela autoridade competente.

Os Estados‑Membros podem prorrogar o prazo de seis meses fixado no presente número por um período que não exceda outros nove meses, no caso de:

[…]

c)

O atraso poder ser claramente atribuído ao facto de o requerente não cumprir as suas obrigações ao abrigo do artigo 13.o

[…]»

17.

O artigo 32.o desta diretiva, sob a epígrafe «Pedidos infundados», dispõe, no seu n.o 1:

«[O]s Estados‑Membros só podem considerar um pedido infundado se o órgão de decisão verificar que o requerente não preenche as condições para beneficiar do estatuto de proteção internacional nos termos da Diretiva [2011/95].»

18.

O artigo 33.o da Diretiva 2013/32, sob a epígrafe «Inadmissibilidade dos pedidos», prevê, no seu n.o 1, que «[a]lém dos casos em que um pedido não é apreciado em conformidade com o Regulamento [n.o 604/2013], os Estados‑Membros não são obrigados a analisar se o requerente preenche as condições para beneficiar de proteção internacional, em conformidade com a Diretiva [2011/95], quando o pedido for considerado não admissível nos termos do presente artigo».

19.

O artigo 33.o, n.o 2, desta diretiva contém uma lista exaustiva de casos em que os Estados‑Membros podem considerar um pedido inadmissível.

3. Diretiva 2013/33

20.

Em conformidade com o seu artigo 1.o, a Diretiva 2013/33 tem por objetivo estabelecer normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional nos Estados‑Membros.

21.

Os considerandos 8, 11, 12, 13, 23 e 35 desta diretiva enunciam:

«(8)

No intuito de garantir a igualdade de tratamento dos requerentes em toda a União [Europeia], a presente diretiva deverá aplicar‑se a todas as fases e todos os tipos de procedimentos relativos a pedidos de proteção internacional, a todos os locais e instalações de acolhimento de requerentes, e enquanto estes sejam autorizados a permanecer no território dos Estados‑Membros na qualidade de requerentes.

[…]

(11)

Deverão ser estabelecidas normas relativas às condições de acolhimento dos requerentes que sejam suficientes para lhes garantir um nível de vida digno e condições de vida equiparáveis em todos os Estados‑Membros.

(12)

A harmonização das condições de acolhimento dos requerentes deverá contribuir para limitar os movimentos secundários dos requerentes influenciados pela diversidade das condições de acolhimento.

(13)

A fim de garantir a igualdade de tratamento de todos os requerentes de proteção internacional, bem como a coerência com o atual acervo da União em matéria de asilo […], é conveniente alargar o âmbito da presente diretiva a fim de abranger os requerentes de proteção subsidiária.

[…]

(23)

A fim de promover a autossuficiência dos requerentes e limitar as grandes discrepâncias entre Estados‑Membros, é essencial estabelecer normas claras sobre o acesso dos requerentes ao mercado de trabalho.

[…]

(35)

A presente diretiva respeita os direitos fundamentais e os princípios reconhecidos, nomeadamente, pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia [ ( 8 )]. Em especial, a presente diretiva procura assegurar o respeito integral pela dignidade humana e promover a aplicação dos artigos 1.o, 4.o, 6.o, 7.o, 18.o, 21.o, 24.o e 47.o da referida Carta e deverá ser aplicada em conformidade.»

22.

O artigo 2.o da Diretiva 2013/33, sob a epígrafe «Definições», dispõe:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

[…]

b)

“Requerente”, um nacional de um país terceiro ou um apátrida que apresentou um pedido de proteção internacional que ainda não foi objeto de decisão definitiva;

[…]

f)

“Condições de acolhimento”, o conjunto de medidas tomadas pelos Estados‑Membros a favor dos requerentes nos termos da presente diretiva;

g)

“Condições materiais de acolhimento”, as condições de acolhimento que compreendem o alojamento, a alimentação e o vestuário, fornecidos em espécie ou sob a forma de subsídios ou de cupões, ou uma combinação dos três, e subsídios para despesas diárias;

[…]»

23.

Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, da referida diretiva, esta «é aplicável a todos os nacionais de países terceiros e apátridas que apresentem um pedido de proteção internacional no território de um Estado‑Membro […], enquanto lhes for permitido permanecer nesse território na qualidade de requerentes».

24.

No capítulo II da referida diretiva, intitulado «Disposições gerais relativas às condições de acolhimento», o artigo 15.o — cuja interpretação se pretende aqui — tem a seguinte redação:

«1.   Os Estados‑Membros asseguram que os requerentes têm acesso ao mercado de trabalho pelo menos nove meses a contar da data de apresentação do pedido de proteção internacional, se a autoridade competente não tiver tomado uma decisão em primeira instância e esse atraso não puder ser imputado ao requerente.

2.   Os Estados‑Membros decidem em que condições concedem ao requerente de asilo acesso ao mercado de trabalho, nos termos do direito nacional, garantindo ao mesmo tempo o acesso efetivo dos requerentes ao referido mercado.

Por razões de política laboral, os Estados‑Membros podem dar prioridade aos cidadãos da União e aos nacionais dos Estados partes no Acordo sobre o Espaço Económico Europeu e a nacionais de países terceiros que sejam residentes legais.

3.   Nos casos em que o recurso de uma decisão negativa, proferida num procedimento regular, tenha efeito suspensivo, o acesso ao mercado de trabalho não é retirado durante o procedimento de recurso enquanto não tiver sido notificado o seu indeferimento.»

4. Regulamento n.o 604/2013

25.

Em conformidade com o seu artigo 1.o, o objetivo do Regulamento n.o 604/2013 é estabelecer os critérios e mecanismos para a determinação do Estado‑Membro responsável.

26.

Os considerandos 11, 12 e 19 deste regulamento enunciam:

«(11)

A Diretiva [2013/33] deverá ser aplicável ao procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável, tal como previsto no presente regulamento, dentro dos limites de aplicação dessa diretiva.

(12)

A Diretiva [2013/32] deverá ser aplicável em complemento e sem prejuízo das disposições relativas às garantias processuais regidas pelo presente regulamento, dentro dos limites de aplicação dessa diretiva.

[…]

(19)

A fim de garantir a proteção efetiva dos direitos das pessoas em causa, deverão ser previstas garantias legais e o direito efetivo de recurso contra as decisões de transferência para o Estado‑Membro responsável, nos termos, nomeadamente, do artigo 47.o da [Carta]. A fim de garantir o respeito do direito internacional, o direito efetivo de recurso contra essas decisões deverá abranger a análise da aplicação do presente regulamento e da situação jurídica e factual no Estado‑Membro para o qual o requerente é transferido.»

27.

No capítulo II do Regulamento n.o 604/2013, intitulado «Princípios gerais e garantias», o artigo 3.o, n.o 1, dispõe que «[o]s Estados‑Membros analisam todos os pedidos de proteção internacional apresentados por nacionais de países terceiros ou por apátridas no território de qualquer Estado‑Membro, inclusive na fronteira ou nas zonas de trânsito. Os pedidos são analisados por um único Estado‑Membro, que será aquele que os critérios enunciados no capítulo III designarem como responsável».

28.

No capítulo VI deste regulamento, intitulado «Procedimentos de tomada e retomada a cargo», o artigo 20.o, n.o 1, dispõe que «[o] processo de determinação do Estado‑Membro responsável tem início a partir do momento em que um pedido de proteção internacional é apresentado pela primeira vez a um Estado‑Membro».

29.

Na secção IV deste capítulo, intitulada «Garantias processuais», o artigo 26.o, n.o 1, do referido regulamento dispõe, nomeadamente, que, «[c]aso o Estado‑Membro requerido aceite a tomada ou retomada a cargo de um requerente […], o Estado‑Membro requerente deve notificar a pessoa em causa da decisão da sua transferência para o Estado‑Membro responsável e, se for caso disso, da decisão de não analisar o seu pedido de proteção internacional».

30.

O artigo 27.o do Regulamento n.o 604/2013, sob a epígrafe «Vias de recurso», enuncia:

«1.   O requerente […] tem direito a uma via de recurso efetiva, sob a forma de recurso ou de pedido de revisão, de facto e de direito, da decisão de transferência, para um órgão jurisdicional.

[…]

3.   Para efeitos de recursos ou de pedidos de revisão de decisões de transferência, os Estados‑Membros devem prever na sua legislação nacional que:

a)

O recurso ou o pedido de revisão confira à pessoa em causa o direito de permanecer no Estado‑Membro em causa enquanto se aguarda o resultado do recurso […]»

B.   Direito irlandês

31.

Na sequência da aplicação do artigo 4.o do Protocolo n.o 21, Relativo à Posição do Reino Unido e da Irlanda em Relação ao Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça ( 9 ), o European Communities (Reception Conditions) Regulations 2018 [Regulamento de 2018 Relativo às Comunidades Europeias (Condições de Acolhimento)] (a seguir «Regulamento de 2018») transpôs para o direito irlandês as disposições da Diretiva 2013/33, com efeitos a partir de 30 de junho de 2018.

32.

O artigo 2.o do Regulamento de 2018 prevê, nos seus n.os 2 e 3:

«2.   Para efeitos do presente regulamento, quando uma decisão de transferência, na aceção do [European Union (Dublin System) Regulations 2018 ( 10 )], tiver sido adotada em relação a um requerente, então, a partir da data de notificação dessa decisão nos termos da regra 5, n.o 2, do presente regulamento, a pessoa em causa:

a)

Perde o estatuto de requerente e

b)

É considerada beneficiária mas não requerente.

3.   Para efeitos do presente regulamento, uma pessoa que, nos termos do artigo 16.o, n.o 2, do [Regulamento de 2018 Relativo à União Europeia (Sistema de Dublim)], tenha interposto um recurso no International Protection Appeals Tribunal [Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional, Irlanda], relativamente ao qual este ainda não tenha tomado uma decisão, será considerada beneficiária mas não requerente.»

33.

O artigo 11.o, n.os 3 e 4, do Regulamento de 2018, que implementa o artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33, dispõe:

«3.   Um requerente pode apresentar um pedido de autorização de trabalho:

[…]

b)

Não antes de oito meses após a apresentação do seu pedido [de proteção internacional].

4.   O Minister for Justice and Equality [Ministro da Justiça e da Igualdade] pode […] conceder uma autorização [de acesso ao mercado de trabalho] ao requerente se:

a)

Sob reserva do n.o 6, tiver decorrido um período de nove meses sobre a data da apresentação do pedido e, nessa data, ainda não tiver sido tomada qualquer decisão em primeira instância sobre o pedido de proteção apresentado pelo requerente e

b)

A situação referida acima na alínea a) não puder ser imputada, no todo ou em parte, ao requerente.»

III. Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

34.

As questões prejudiciais submetidas, por um lado, pela High Court (Tribunal Superior, Irlanda), no processo The International Protection Appeals Tribunal e o. (C‑322/19), e, por outro, pelo International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional), no processo Minister for Justice and Equality (C‑385/19) foram apresentadas no âmbito de litígios entre nacionais de países terceiros e o Ministro da Justiça e da Igualdade relativamente à legalidade de decisões de recusa em lhes conceder uma autorização de acesso ao mercado de trabalho na qualidade de requerentes de proteção internacional cuja transferência para outro Estado‑Membro foi solicitada em aplicação do Regulamento n.o 604/2013.

35.

Por Decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 14 de junho de 2019, esses dois processos foram apensos para efeitos da fase escrita, da fase oral e do acórdão.

A.   Processo C‑322/19

36.

K.S. deixou o Paquistão, em fevereiro de 2010, e deslocou‑se para o Reino Unido, Estado‑Membro onde não apresentou um pedido de proteção internacional. Em maio de 2015, deslocou‑se para a Irlanda, onde apresentou tal pedido. Na sequência da decisão da sua transferência para o Reino Unido, de 9 de março de 2016, o interessado interpôs recurso da mesma para o Refugee Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para os Refugiados, Irlanda), que negou provimento ao recurso em 17 de agosto de 2016. K.S. interpôs então recurso judicial para a High Court (Tribunal Superior), o qual tem efeito suspensivo.

37.

M.H.K., por sua vez, deixou o Bangladexe e deslocou‑se para o Reino Unido em 24 de outubro de 2009. Depois de a sua autorização de residência ter caducado nesse Estado‑Membro e antes de ser tomada uma decisão sobre o seu pedido de prorrogação dessa autorização, deslocou‑se para a Irlanda, em 4 de setembro de 2014, onde apresentou um pedido de proteção internacional em 16 de fevereiro de 2015. Na sequência da decisão da sua transferência para o Reino Unido, de 25 de novembro de 2015, M.H.K. interpôs recurso da mesma para o Refugee Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para os Refugiados), que negou provimento ao recurso em 30 de março de 2016. O interessado interpôs então recurso judicial para a High Court (Tribunal Superior), invocando o artigo 17.o do Regulamento n.o 604/2013. Este processo continua pendente e tem efeito suspensivo.

38.

K.S. e M.H.K. apresentaram pedidos de autorização de acesso ao mercado de trabalho ao abrigo do artigo 11.o, n.o 3, do Regulamento de 2018 junto do Labour Market Access Unit of the Department of Justice and Equality (Unidade de Acesso ao Mercado de Trabalho do Ministério da Justiça e da Igualdade, Irlanda). Na sequência do indeferimento dos pedidos, cada um dos interessados interpôs recurso, a que foi negado provimento. Interpuseram recurso desta decisão para o International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional). Por Acórdão de 11 de setembro de 2018, este último confirmou a decisão de indeferimento dirigida a K.S., com o fundamento de que, nos termos da legislação nacional em causa, os requerentes sujeitos a um procedimento de transferência nos termos do Regulamento n.o 604/2013 não têm direito de aceder ao mercado de trabalho. Num Acórdão de 17 de outubro de 2018, o International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional) também negou provimento ao recurso interposto por M.H.K., declarando, nomeadamente, que o acesso ao mercado de trabalho não se insere no âmbito das «condições materiais de acolhimento». K.S. e M.H.K. interpuseram então recurso judicial desses acórdãos para a High Court (Tribunal Superior).

39.

Este órgão jurisdicional decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Quando, ao interpretar um instrumento do direito da União aplicável num determinado Estado‑Membro, um instrumento que não se aplica nesse Estado‑Membro é adotado ao mesmo tempo, pode ter se em conta este último instrumento para interpretar o primeiro?

2)

O artigo 15.o da Diretiva [2013/33] aplica‑se a uma pessoa relativamente à qual foi adotada uma decisão de transferência ao abrigo do Regulamento Dublim III, Regulamento [n.o 604/2013]?

3)

Ao aplicar o artigo 15.o da Diretiva [2013/33], pode um Estado‑Membro adotar uma medida geral nos termos da qual se imputa de facto aos requerentes que devem ser transferidos ao abrigo do Regulamento [n.o 604/2013] qualquer atraso na adoção de uma decisão de transferência ou posterior a esta?

4)

Quando um requerente deixa um Estado‑Membro sem aí ter requerido proteção internacional, e se desloca para outro Estado‑Membro onde apresenta um pedido de proteção internacional e é objeto de uma decisão adotada nos termos do Regulamento [n.o 604/2013], com base na qual é transferido para o primeiro Estado‑Membro, o atraso que daí decorre na tramitação do pedido de proteção pode ser imputado ao requerente para efeitos do artigo 15.o da Diretiva [2013/33]?

5)

Quando um requerente é objeto de uma decisão de transferência para outro Estado‑Membro ao abrigo do Regulamento [n.o 604/2013] mas essa transferência sofre um atraso devido à interposição de recurso pelo requerente, que tem por consequência suspender a transferência por força de uma decisão de suspensão da instância do órgão jurisdicional, pode o atraso que daí decorre na tramitação do pedido de proteção internacional ser imputado, ao requerente para efeitos do artigo 15.o da Diretiva [2013/33], de um modo geral ou em especial, quando se determina no processo que o recurso judicial é desprovido de fundamento, manifestamente ou não, ou constitui um uso indevido do processo?»

B.   Processo C‑385/19

40.

R.A.T., cidadã iraquiana, apresentou um pedido de proteção internacional na Irlanda, em 7 de março de 2018. Por carta de 2 de outubro de 2018, foi informada de que tinha sido tomada a seu respeito uma decisão de transferência para o Reino Unido, em aplicação do Regulamento n.o 604/2013. Em 18 de outubro de 2018, recorreu assim desta decisão para o International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional). Este recurso continua pendente.

41.

D.S., cidadão iraquiano, explicou que tinha deixado o Iraque, em 1 de agosto de 2015, para se deslocar para a Áustria, atravessando a Turquia e, depois, a Grécia. Deixou a Áustria, antes de ser tomada uma decisão sobre o seu pedido de proteção internacional naquele país. D.S. apresentou um novo pedido de proteção internacional na Irlanda, em 8 de fevereiro de 2016. As autoridades irlandesas tomaram a decisão da sua transferência para a Áustria, nos termos do artigo 18.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 604/2013. D.S. interpôs recurso desta decisão para o International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional), a que foi negado provimento. Interpôs então recurso judicial para a High Court (Tribunal Superior), que continua pendente.

42.

R.A.T. e D.S. solicitaram a concessão de acesso ao mercado de trabalho nos termos do artigo 11.o, n.o 3, do Regulamento de 2018. Os pedidos foram indeferidos com o fundamento de que, tendo sido sujeitos a uma decisão de transferência para outro Estado‑Membro nos termos do Regulamento n.o 604/2013, já não dispunham da qualidade de requerentes, devendo agora ser qualificados de beneficiários na aceção do referido regulamento. Por conseguinte, não lhes podia ser concedida uma autorização de acesso ao mercado de trabalho irlandês. R.A.T. e D.S. recorreram então destas decisões para o International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional).

43.

Este órgão jurisdicional decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

O artigo 15.o da Diretiva [2013/33] prevê a existência de diferentes categorias de “requerente[s]”?

2)

Na aceção do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva [2013/33], que tipo de comportamento permitirá considerar que o atraso é imputável ao requerente?»

IV. Análise

44.

Antes de proceder ao exame das questões prejudiciais, penso que é útil fazer algumas observações preliminares.

A.   Observações preliminares

45.

A primeira observação diz respeito ao alcance das presentes conclusões. De acordo com o pedido do Tribunal de Justiça, estas conclusões centrar‑se‑ão em duas problemáticas expostas nas questões segunda a quinta do processo C‑322/19 e nas duas questões do processo C‑385/19.

46.

A primeira problemática diz respeito à determinação dos destinatários do direito de acesso ao mercado de trabalho previsto no artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33. Enquanto, na sua segunda questão no processo C‑322/19, a High Court (Tribunal Superior) pergunta ao Tribunal de Justiça se um requerente em relação ao qual foi adotada uma decisão de transferência goza do direito de acesso ao mercado de trabalho, o International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional) pergunta, por seu lado, na sua primeira questão no processo C‑385/19, se é possível distinguir entre várias categorias de requerentes no contexto dessa disposição.

47.

A segunda problemática diz respeito às circunstâncias em que um Estado‑Membro pode imputar ao requerente o atraso na apreciação do seu pedido de proteção internacional, na aceção do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33, se esse atraso resultar do procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável, negando‑lhe, assim, o acesso ao mercado de trabalho. Enquanto o International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional), na sua segunda questão no processo C‑385/19, pede ao Tribunal de Justiça para precisar a natureza dos comportamentos suscetíveis de dar origem a tal atraso, a High Court (Tribunal Superior), nas suas quarta e quinta questões no processo C‑322/19, questiona‑se a propósito de dois comportamentos específicos que poderão constituir um atraso imputável ao requerente, a saber, por um lado, quando o requerente não tiver apresentado o seu pedido no Estado‑Membro em que tenha entrado pela primeira vez de forma irregular ou, se se encontrar legalmente num Estado‑Membro, nesse Estado‑Membro — caso em que a análise do seu pedido exige um procedimento de (re)tomada a cargo e, se for caso disso, de transferência do interessado para esse Estado — e, por outro, quando o requerente tiver interposto recurso judicial da decisão da sua transferência, adotada em aplicação do Regulamento n.o 604/2013.

48.

A análise destas questões exige que se tenham em conta outras normas de direito da União para além das expressamente referidas nas decisões de reenvio e, em particular, as regras materiais e processuais estabelecidas pelo legislador da União nas Diretivas 2011/95 e 2013/32.

B.   Determinação dos beneficiários do acesso ao mercado de trabalho na aceção do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33

49.

A High Court (Tribunal Superior), com a sua segunda questão no processo C‑322/19, e o International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional), com a sua primeira questão no processo C‑385/19, perguntam ao Tribunal de Justiça, em substância, se um Estado‑Membro em cujo território foi apresentado um pedido de proteção internacional é obrigado a conceder o acesso ao mercado de trabalho a um requerente relativamente ao qual as suas autoridades adotaram uma decisão de transferência para o Estado‑Membro que identificaram como responsável em aplicação do Regulamento n.o 604/2013.

50.

A resposta a esta questão é claramente afirmativa. Baseia‑se numa interpretação literal, sistemática e teleológica do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33, bem como nos princípios estabelecidos pelo Tribunal de Justiça no Acórdão Cimade e GISTI. Recordo que, no caso que deu origem a esse acórdão, foi perguntado ao Tribunal de Justiça se um Estado‑Membro, tendo recebido um pedido de proteção internacional na sua fronteira ou no seu território, era obrigado a conceder a um requerente as condições mínimas de acolhimento previstas na Diretiva 2003/9/CE ( 11 ) se decidisse, nos termos do Regulamento n.o 343/2003, solicitar a outro Estado‑Membro que retomasse a cargo o interessado enquanto Estado‑Membro responsável. As disposições em causa no processo que deu origem ao Acórdão Cimade e GISTI eram, em substância, idênticas àquelas cuja interpretação é aqui solicitada. Os processos são, no entanto, diferentes em dois aspetos. Em primeiro lugar, o acesso ao mercado de trabalho é uma condição de acolhimento que não é mínima ou material na aceção das Diretivas 2003/9 e 2013/33. Com efeito, o direito de aceder ao mercado de trabalho não visa satisfazer uma necessidade essencial ou vital do requerente. Em segundo lugar, o procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável encontra‑se, nos processos principais, numa fase mais avançada do que no processo que deu origem ao Acórdão Cimade e GISTI, uma vez que, nos processos principais, já foi adotada uma decisão de transferência relativamente aos interessados.

1. Interpretação literal do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33

51.

Em primeiro lugar, resulta da redação do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33, que o acesso ao mercado de trabalho do Estado‑Membro de acolhimento deve caber ao «requerente».

52.

O conceito de «requerente» está definido no artigo 2.o, alínea b), desta diretiva como sendo «um nacional de um país terceiro ou um apátrida que apresentou um pedido de proteção internacional que ainda não foi objeto de decisão definitiva».

53.

Deve notar‑se, a título preliminar, que o legislador da União refere‑se aqui à definição do conceito de «requerente» que é comum a todos os textos que compõem o SECA ( 12 ). Com efeito, no atual estado do direito da União, nenhum dos instrumentos que compõem este sistema estabelece uma definição específica nem, de resto, um estatuto jurídico específico para o requerente ao abrigo de um procedimento de (re)tomada a cargo e de transferência nos termos do Regulamento n.o 604/2013. No Acórdão Cimade e GISTI, o Tribunal de Justiça já declarou, atendendo aos termos dos artigos 2.o e 3.o da Diretiva 2003/9, que existe apenas uma categoria de requerentes de proteção internacional, composta por todos os nacionais de países terceiros e apátridas que apresentam um pedido de asilo ( 13 ).

54.

No que respeita à definição do conceito de «requerente» que figura no artigo 2.o, alínea b), da Diretiva 2013/33, sublinho, em primeiro lugar, que, ao utilizar, na versão em língua francesa, o pronome indefinido «tout [ressortissant de pays tiers ou tout apatride]» e, na versão em língua inglesa, o artigo indefinido «a [third‑country national or a stateless person]», o legislador da União demonstra que nenhum nacional de um país terceiro ou apátrida é, a priori, excluído do estatuto de requerente. Embora, em seguida, exija que o requerente tenha apresentado um pedido de proteção internacional, deve notar‑se que, para efeitos de cumprimento deste requisito, não exige que esse pedido seja apresentado ao Estado‑Membro responsável na aceção do Regulamento n.o 604/2013 ( 14 ). Finalmente, noto que, de acordo com esta definição, o interessado mantém o seu estatuto enquanto «[o seu pedido de proteção internacional] ainda não [tiver sido] objeto de decisão definitiva». Segundo o Tribunal de Justiça, o interessado só perde, portanto, a qualidade de requerente depois de ter sido adotada uma decisão definitiva ( 15 ). Isto implica que uma autoridade administrativa e, se for caso disso, uma autoridade judicial tenham tomado uma decisão definitiva sobre o reconhecimento do estatuto de beneficiário de proteção internacional.

55.

Ora, a decisão de transferência adotada com base no artigo 26.o do Regulamento n.o 604/2013 não constitui uma decisão que seja uma «decisão definitiva» sobre o pedido de proteção internacional, a única suscetível de resultar na perda da qualidade de requerente.

56.

Como o Tribunal de Justiça salientou no Acórdão de 31 de maio de 2018, Hassan ( 16 ), a decisão de transferência está abrangida pelo mecanismo específico estabelecido pelo Regulamento n.o 604/2013 para efeitos de determinação do Estado‑Membro responsável e por um regime processual rigoroso estabelecido nos artigos 26.o e 27.o deste regulamento.

57.

A decisão de transferência não é uma decisão sobre a admissibilidade do pedido nem uma decisão sobre o mérito do pedido. Com efeito, resulta do artigo 33.o da Diretiva 2013/32 que, se o pedido não for analisado nos termos do Regulamento n.o 604/2013 — o que acontece quando é adotada uma decisão de transferência nos termos do artigo 26.o, n.o 1, deste regulamento —, o Estado‑Membro não pode considerar este pedido inadmissível ( 17 ). Também não é obrigado a verificar se o requerente preenche as condições exigidas para a concessão de proteção internacional ( 18 ). Com efeito, a adoção de uma decisão de transferência implica que a responsabilidade por essa análise seja transferida para as autoridades do Estado‑Membro designado como responsável ( 19 ).

58.

À luz destes elementos, na medida em que a decisão de transferência não constitui uma decisão definitiva sobre um pedido de proteção internacional, a sua adoção não pode ter como consequência privar o interessado da qualidade de «requerente» na aceção do artigo 2.o, alínea b), da Diretiva 2013/33 e dos direitos associados a essa qualidade.

59.

Em segundo lugar, resulta dos termos do artigo 15.o, n.o 1, da referida diretiva que o requerente deve ter acesso ao mercado de trabalho num prazo máximo de nove meses a contar da data de apresentação do seu pedido, até à adoção de uma «decisão em primeira instância» pela autoridade competente. Por outro lado, de acordo com o artigo 15.o, n.o 3, da referida diretiva, o período durante o qual o requerente pode beneficiar desse acesso estende‑se, em caso de recurso de uma decisão negativa, até lhe ser notificada a negação de provimento ao recurso.

60.

O legislador da União não define o conceito de «decisão em primeira instância» na Diretiva 2013/33. Para o efeito, deve ser feita referência às disposições do capítulo III da Diretiva 2013/32. Resulta das disposições enunciadas nos seus artigos 32.o e 33.o que a decisão em primeira instância é uma decisão pela qual a autoridade responsável pela determinação decide sobre a admissibilidade do pedido de proteção internacional ou sobre o mérito. Ora, recordo que, ao adotar uma decisão de transferência, a autoridade nacional competente não decide sobre uma coisa nem sobre a outra. Além disso, saliento que, quando essa autoridade acompanha a decisão de transferência com a decisão de não analisar o pedido de proteção internacional, esta última decisão também não está abrangida pelos casos em que os Estados‑Membros podem considerar um pedido inadmissível na aceção do artigo 33.o da Diretiva 2013/32. Neste contexto, nem a decisão de transferência adotada nos termos do artigo 26.o, n.o 1, do Regulamento n.o 604/2013 nem, se for caso disso, a decisão pela qual a autoridade nacional competente decide não analisar o pedido de proteção internacional constituem uma «decisão em primeira instância» na aceção do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33, única que pode pôr termo ao direito de acesso ao mercado de trabalho previsto nesta disposição.

61.

Nestas circunstâncias, a adoção de uma decisão de transferência não pode ter como consequência privar o interessado da sua qualidade de requerente e do seu direito de acesso ao mercado de trabalho, previsto no artigo 15.o, n.o 1, da referida diretiva.

62.

Isto implica que se considera que beneficia do direito de acesso ao mercado de trabalho na aceção do artigo 15.o, n.o 1, da referida diretiva a pessoa que apresente um pedido de proteção internacional às autoridades de um Estado‑Membro, mesmo que este não seja responsável pela análise do pedido e não se tenha pronunciado sobre a sua admissibilidade ou mérito.

2. Sistemática do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33

63.

Em primeiro lugar, sublinho que o âmbito de aplicação da Diretiva 2013/33, definido no seu artigo 3.o, n.o 1, é extensível a «todos os nacionais de países terceiros e apátridas que apresentem um pedido de proteção internacional no território de um Estado‑Membro […], enquanto lhes for permitido permanecer nesse território na qualidade de requerentes» ( 20 ).

64.

A condição de que o requerente deve estar autorizado a permanecer no território é necessária, tendo em conta o objetivo desta diretiva. Com efeito, de acordo com o seu artigo 1.o, esta tem por objetivo estabelecer «normas em matéria de acolhimento dos requerentes». Ora, o acolhimento só pode ter lugar no Estado‑Membro em cujo território o requerente se encontra e está autorizado a permanecer em virtude da apresentação de um pedido de proteção internacional.

65.

Sublinho que a expressão «[p]ermanência no Estado‑Membro» é definida no artigo 2.o, alínea p), da Diretiva 2013/32 e deve ser interpretada como a «permanência no território do Estado‑Membro em que o pedido de proteção internacional foi apresentado ou esteja a ser apreciado». Como o Tribunal de Justiça declarou no Acórdão Cimade e GISTI, isto implica que o requerente está autorizado a permanecer não só no território do Estado‑Membro em que o seu pedido será analisado, mas também no do Estado‑Membro em que o pedido foi apresentado ( 21 ).

66.

A condição de que o requerente deve estar autorizado a permanecer no território garante assim que as condições de acolhimento sejam concedidas, independentemente da fase do procedimento de análise do pedido. É este o sentido, nomeadamente, do considerando 8 da Diretiva 2013/33, por força do qual, no intuito de garantir a igualdade de tratamento dos requerentes em toda a União, esta diretiva «deverá aplicar‑se a todas as fases e todos os tipos de procedimentos relativos a pedidos de proteção internacional, a todos os locais e instalações de acolhimento de requerentes, e enquanto estes sejam autorizados a permanecer no território dos Estados‑Membros na qualidade de requerentes».

67.

Ora, o procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável nos termos do Regulamento n.o 604/2013 é, pela sua própria natureza, um «procedimento relativo aos pedidos de proteção internacional». Trata‑se de um procedimento administrativo cujo objeto, nos termos do artigo 1.o do referido regulamento, consiste em estabelecer os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável.

68.

Assim, em conformidade com o artigo 20.o, n.o 1, do referido regulamento, o processo de determinação do Estado‑Membro responsável inicia‑se a partir do momento em que tal pedido de proteção internacional seja apresentado pela primeira vez a um Estado‑Membro. No considerando 11 do Regulamento n.o 604/2013, o legislador da União acrescenta que «[a] Diretiva [2013/33] deverá ser aplicável ao procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável, tal como previsto [neste] regulamento». Ora, o procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável tem lugar, na prática, enquanto o requerente se encontra no território do Estado‑Membro de acolhimento. A fim de garantir a igualdade de tratamento pretendida pelo legislador da União, é portanto essencial que o requerente em relação ao qual tenha sido adotada uma decisão de transferência beneficie das condições de acolhimento previstas na Diretiva 2013/33. O artigo 27.o, n.o 3, alínea a), do Regulamento n.o 604/2013 confere expressamente ao requerente em relação ao qual tal decisão tenha sido adotada «o direito de permanecer no Estado‑Membro em causa», no caso de ter interposto recurso dessa decisão, até à conclusão do seu recurso.

69.

Assim, o requerente em apreço está efetivamente abrangido pelo âmbito de aplicação da Diretiva 2013/33, pelo que, a priori, não pode ser excluído do benefício das condições de acolhimento previstas nesta diretiva.

70.

Foi neste sentido que o Tribunal de Justiça decidiu no Acórdão Cimade e GISTI. Com efeito, declarou que «só a transferência efetiva do requerente […] pelo Estado‑Membro requerente põe termo à análise do pedido […] por este Estado e à sua responsabilidade relativa à concessão das condições mínimas de acolhimento» ( 22 ). Esta jurisprudência é aplicável em termos idênticos à concessão das condições de acolhimento, para além das condições materiais, como o acesso ao mercado de trabalho. Com efeito, a condição de que o requerente deve estar autorizado a permanecer no território aplica‑se indistintamente de acordo com a natureza das necessidades que o legislador da União pretende satisfazer.

71.

Em segundo lugar, sublinho que, em conformidade com o artigo 15.o, n.o 2, da Diretiva 2013/33, os Estados‑Membros devem definir as condições de acesso ao mercado de trabalho, de acordo com o princípio da efetividade.

72.

Embora o legislador da União estabeleça, nos artigos 17.o, 18.o e 20.o da referida diretiva, disposições relativamente precisas no que se refere às condições de concessão, limitação e retirada das condições materiais de acolhimento, cumpre notar que não prevê disposições análogas no que se refere às condições de acesso ao mercado de trabalho ( 23 ). Assim, deixa ao critério dos Estados‑Membros a decisão, em conformidade com as respetivas legislações nacionais, sobre as condições em que concedem esse acesso.

73.

Observo, no entanto, que o legislador da União estabelece duas reservas.

74.

Em primeiro lugar, embora os Estados‑Membros possam introduzir condições diferentes das expressamente mencionadas no artigo 15.o, n.o 1, da referida diretiva, devem, no entanto, garantir o acesso efetivo ao mercado de trabalho. Por outras palavras, na falta de regras fixadas pelo direito da União, as condições estabelecidas por cada Estado‑Membro para o acesso a esse mercado não devem tornar impossível na prática ou excessivamente difícil o exercício desse direito conferido pela ordem jurídica da União ( 24 ). Neste contexto, uma regra nacional destinada a privar o requerente dessa qualidade pelo facto de estar sujeito a um procedimento de transferência parece ser contrária ao princípio estabelecido pelo legislador da União, na medida em que impede o requerente de beneficiar dos direitos que, no entanto, estão associados a esse estatuto.

75.

Em segundo lugar, embora os Estados‑Membros possam, por razões relacionadas com a sua política de emprego, dar prioridade a determinadas categorias da população, tal só se pode aplicar a cidadãos da União, nacionais do Espaço Económico Europeu e nacionais de países terceiros em situação regular. Decorre do artigo 15.o, n.o 2, da Diretiva 2013/33 que os motivos relacionados com a política nacional de emprego não permitem, portanto, distinguir os requerentes consoante o pedido seja analisado pelo Estado‑Membro de acolhimento ou pelo Estado‑Membro que as autoridades nacionais competentes tenham designado como responsável à luz dos critérios estabelecidos no Regulamento n.o 604/2013.

76.

Por conseguinte, o contexto e a economia geral da Diretiva 2013/33 militam igualmente a favor de uma interpretação do artigo 15.o, n.o 1, da mesma diretiva segundo a qual a adoção de uma decisão de transferência não pode ter como consequência privar o interessado da sua qualidade de requerente e do direito de acesso ao mercado de trabalho que lhe é concedido ao abrigo dessa disposição.

77.

Creio que a finalidade desta diretiva e a obrigação de respeitar os direitos fundamentais sustentam esta interpretação.

3. Análise teleológica da Diretiva 2013/33

78.

Em conformidade com o considerando 35 da Diretiva 2013/33, os direitos fundamentais constituem o quadro de referência dentro do qual são estabelecidas normas para o acolhimento do requerente. As disposições que figuram no capítulo II da referida diretiva destinam‑se assim a garantir a proteção efetiva do requerente no Estado‑Membro de acolhimento, assegurando que as suas necessidades sejam satisfeitas no respeito dos seus direitos fundamentais, em particular a sua dignidade, que seja contínua e garanta a igualdade de tratamento.

79.

As condições de acolhimento previstas na Diretiva 2013/33 dizem respeito, antes de mais, à satisfação das necessidades essenciais e imediatas do requerente. Estas condições são definidas no artigo 2.o, alínea g), desta diretiva através do vocábulo «condições materiais de acolhimento» (alojamento, alimentação, vestuário e subsídios para despesas diárias). O Tribunal de Justiça declarou no Acórdão Cimade e GISTI que o requerente não pode ser privado deste direito, mesmo durante um período temporário após a apresentação do seu pedido e antes da transferência efetiva, sob pena, nomeadamente, de não se observar a finalidade da Diretiva 2003/9 e os requisitos do artigo 1.o da Carta, segundo o qual a dignidade humana deve ser respeitada e protegida ( 25 ).

80.

As condições de acolhimento previstas na Diretiva 2013/33 destinam‑se, além disso, a satisfazer as restantes necessidades do requerente durante a sua permanência no território do Estado‑Membro de acolhimento, que pode estender‑se por um período prolongado. Embora estas condições não se destinem a satisfazer as suas necessidades vitais, destinam‑se a garantir o respeito pelos direitos fundamentais consagrados na Carta, como a unidade familiar (artigo 7.o da Carta e artigo 12.o da Diretiva 2013/33), a proteção da criança (artigo 24.o da Carta e artigo 23.o da Diretiva 2013/33), o direito à educação e à formação profissional (artigo 14.o da Carta e artigos 14.o e 16.o da Diretiva 2013/33), o acesso aos cuidados de saúde (artigo 35.o da Carta e artigos 13.o e 19.o da Diretiva 2013/33), ou ainda o direito ao trabalho (artigo 15.o da Carta e artigo 15.o da Diretiva 2013/33). Deste modo, o acesso ao mercado de trabalho deve permitir, tal como a escolaridade dos menores, satisfazer necessidades objetivas do requerente durante a sua estada no Estado‑Membro de acolhimento.

81.

Por conseguinte, um Estado‑Membro não pode privar o requerente do benefício dessa condição de acolhimento sem correr o risco de não respeitar os objetivos da Diretiva 2013/33 e os direitos fundamentais que lhe são conferidos pela Carta.

82.

Em primeiro lugar, os considerandos 11 e 23 da Diretiva 2013/33 exprimem claramente a intenção do legislador da União de garantir ao requerente um nível de vida digno durante a sua estada no Estado‑Membro de acolhimento e de promover a sua autossuficiência.

83.

O direito ao trabalho, consagrado em numerosos instrumentos internacionais e regionais relativos aos direitos humanos ( 26 ), desempenha um papel não só na realização pessoal do indivíduo e na sua integração social e económica na sociedade, mas também na preservação da sua dignidade.

84.

Na sua nota de 2007 sobre a Integração dos Refugiados na União Europeia, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados sublinha a independência, o reconhecimento e o estatuto social que o requerente adquire através da atividade profissional ( 27 ). No seu comentário geral n.o 18 sobre o direito ao trabalho ( 28 ), o Conselho Económico e Social das Nações Unidas, por sua vez, sublinha que este direito, embora não deva ser entendido como um direito absoluto e incondicional à obtenção de emprego ( 29 ), é indispensável para o exercício de outros direitos humanos, é inseparável e integrante da dignidade humana e contribui tanto para a sobrevivência do indivíduo como para a da sua família e, na medida em que o trabalho seja livremente escolhido ou aceite, para a sua realização na comunidade ( 30 ). Por esta razão, de acordo com o Conselho Económico e Social das Nações Unidas, o acesso ao emprego deve ser garantido, especialmente aos indivíduos e grupos desfavorecidos e marginalizados, de modo a permitir‑lhes uma existência digna ( 31 ). Esta é também uma das razões por que a Supreme Court (Supremo Tribunal), num Acórdão de 30 de maio de 2017 ( 32 ), considerou inconstitucional a legislação irlandesa anterior, ao abrigo da qual nenhum requerente podia aceder ao mercado de trabalho antes de ter sido tomada uma decisão sobre o seu pedido ( 33 ). Este processo dizia respeito à situação de um requerente birmanês, a quem tinha sido negado o acesso ao mercado de trabalho, apesar de o seu pedido ter estado em análise durante oito anos. Durante este período, o requerente tinha recebido condições materiais de acolhimento, bem como um subsídio de 19 euros por semana. O Supremo Tribunal declarou que, ao proibir de forma absoluta o acesso ao mercado de trabalho, mesmo não havendo limite temporal no procedimento de análise de um pedido de proteção internacional, tal legislação causava danos ao indivíduo que a Constituição pretendia justamente evitar ( 34 ).

85.

Do lado do requerente, o trabalho contribui assim, claramente, para a preservação da sua dignidade, uma vez que os rendimentos desse emprego lhe permitem não só prover às suas próprias necessidades, mas também ter alojamento fora das estruturas de acolhimento, onde pode acolher a sua família, se necessário. Não há dúvida de que, no contexto da natureza forçada da migração e das experiências frequentemente traumáticas a ela associadas, a recusa de exercício de qualquer atividade profissional ao requerente pode agravar a vulnerabilidade do requerente, a precariedade da sua situação e, por vezes, o isolamento e a exclusão social a que já está sujeito, tanto mais que o período de espera pode ser de vários meses. Neste contexto, é de salientar que o requerente em relação ao qual é iniciado um procedimento de (re)tomada a cargo, e, se for caso disso, de transferência, se encontra em última análise numa situação mais precária do que aquela em que se encontra a pessoa que está dispensada do mesmo. Tenho aqui em conta os prazos particularmente longos envolvidos nos procedimentos de (re)tomada a cargo e de transferência, que variam entre seis e dezoito meses, de acordo com o artigo 29.o do Regulamento n.o 604/2013. Tenho igualmente em consideração o número real de transferências realizadas em relação às decisões de transferências notificadas ( 35 ). Assim, em 2012, o Tribunal de Justiça já salientou no Acórdão Cimade e GISTI que o procedimento previsto no Regulamento n.o 343/2003 podia, em determinados casos, conduzir a que o requerente nunca chegue a ser transferido para o Estado‑Membro requerido, mas permaneça no Estado‑Membro em que apresentou o seu pedido de proteção internacional ( 36 ). Os relatórios sobre a aplicação do Regulamento n.o 604/2013 revelam o mesmo ( 37 ).

86.

Tendo em conta estes atrasos, a exclusão do requerente do mercado de trabalho é, além disso, suscetível de conduzir a um risco acrescido de fuga — que poderia, aliás, diminuir com o acesso ao emprego — e a um aumento do emprego irregular, quando os Estados‑Membros tentam, com toda a razão, combater estes fenómenos e os abusos que eles provocam.

87.

Além disso, é importante sublinhar que, no caso de o requerente não dispor de recursos financeiros próprios, a sua exclusão do acesso ao mercado de trabalho tem como consequência que o Estado‑Membro de acolhimento é obrigado a garantir‑lhe um nível de vida digno, proporcionando‑lhe, nomeadamente, condições materiais de acolhimento nas condições previstas nos artigos 17.o a 20.o da Diretiva 2013/33. Esse acolhimento mobiliza recursos materiais, financeiros e humanos. Neste contexto, é evidente que a concessão de acesso ao mercado de trabalho alivia a pressão migratória, bem como os encargos sociais e financeiros para o Estado‑Membro de acolhimento, permitindo a este último concentrar os esforços de assistência nas categorias de requerentes mais vulneráveis.

88.

Por outro lado, numa situação que se caracterize por um fracasso sistémico das condições de acolhimento, a exclusão dos requerentes do acesso ao mercado de trabalho regular poderia expor o Estado‑Membro a um risco de violação dos princípios consagrados nos artigos 1.o e 4.o da Carta. Foi neste sentido que o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem decidiu no Acórdão de 11 de dezembro de 2014, AL.K. c. Grécia ( 38 ). Nesse processo, o requerente alegava que a República Helénica não lhe tinha proporcionado condições de acolhimento dignas e que o tinha impedido de melhorar as suas condições de vida, nomeadamente, recusando‑lhe a concessão de uma autorização de trabalho. No seu acórdão, o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem reconheceu que a violação do direito de acesso ao mercado de trabalho, tendo em conta os obstáculos administrativos e também práticos decorrentes do contexto geral de crise económica, conjugada com a falta de alojamento nas estruturas de acolhimento, pode constituir um tratamento degradante na aceção do artigo 3.o da Convenção para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais ( 39 ).

89.

Atendendo a estes elementos, não se justifica privar o requerente, em relação ao qual tenha sido adotada uma decisão de transferência, do acesso ao mercado de trabalho enquanto lhe for permitido permanecer no território do Estado‑Membro de acolhimento.

90.

Em segundo lugar, o SECA, no qual a Diretiva 2013/33 e o Regulamento n.o 604/2013 estão integrados, baseia‑se, em conformidade com o artigo 67.o, n.o 2 e o artigo 80.o TFUE, numa política comum que deve ser equitativa para os nacionais de países terceiros ( 40 ). Com exceção das disposições relativas às pessoas vulneráveis, o legislador da União deixa bem claro na Diretiva 2013/33 a sua intenção de assegurar a igualdade de tratamento de todos os requerentes, uniformizando e harmonizando o seu estatuto e os direitos e obrigações a ele associados. Inclui, assim, no âmbito dos beneficiários das normas de acolhimento pessoas que solicitam proteção subsidiária, que não estavam abrangidas pelas disposições anteriores da Diretiva 2003/9 ( 41 ).

91.

No considerando 5 da Diretiva 2013/33, o legislador da União recorda as ambições do Programa de Estocolmo, que consiste em conceder aos requerentes um nível de tratamento equivalente no que respeita às condições de acolhimento, independentemente do Estado‑Membro em que tenham apresentado o seu pedido. O objetivo é, por conseguinte, garantir‑lhes, tal como se sublinha no considerando 11 da referida diretiva, condições de vida comparáveis em todos os Estados‑Membros e, como se refere desta vez no considerando 12 da mesma, reduzir o risco de «movimentos secundários» motivados pela diversidade das condições de acolhimento.

92.

O considerando 8 da Diretiva 2013/33 é igualmente bastante esclarecedor quando afirma que, no intuito de garantir a igualdade de tratamento dos requerentes em toda a União, esta diretiva deve aplicar‑se a todas as fases e todos os tipos de procedimentos relativos a pedidos de proteção internacional, a todos os locais e instalações de acolhimento e enquanto os requerentes estejam autorizados a permanecer no território dos Estados‑Membros nesta qualidade.

93.

Atendendo a este objetivo e aos termos em que é expresso, não há dúvida de que o legislador da União não pretendeu introduzir um sistema de direitos de geometria variável e, mais particularmente, uma diferença de tratamento em matéria de acolhimento entre os nacionais de países terceiros cujos pedidos são analisados pelo Estado‑Membro de acolhimento e aqueles cujos pedidos serão examinados pelo Estado‑Membro designado como responsável nos termos do Regulamento n.o 604/2013. As necessidades de um requerente autorizado a permanecer no território do Estado‑Membro de acolhimento são as mesmas, consoante este aguarde uma decisão definitiva sobre o seu pedido de proteção internacional ou aguarde a sua transferência efetiva para o Estado‑Membro responsável. Neste contexto, não seria objetivo nem sequer razoável privar o segundo da possibilidade de trabalhar legalmente e de se sustentar, ainda que a duração da sua estada no território do Estado‑Membro de acolhimento possa ser superior à duração da estada do primeiro. Com efeito, devem ser tidos em conta os prazos para o procedimento de (re)tomada a cargo e de transferência previstos nos artigos 21.o a 25.o e no artigo 29.o do Regulamento n.o 604/2013, bem como a situação, frequente, em que a transferência não é efetuada nos prazos previstos. Neste caso, recordo que o Estado‑Membro responsável é dispensado da sua obrigação e o Estado‑Membro requerente, que não é outro senão o Estado‑Membro de acolhimento, torna‑se então responsável pela análise do pedido de proteção internacional ( 42 ).

94.

Atendendo a todos estes elementos sou, portanto, de opinião que o artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33 deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro que conduz a recusar ao requerente o acesso ao mercado de trabalho pelo facto de a autoridade nacional competente ter adotado a decisão de o transferir para o Estado‑Membro que identificou como responsável em aplicação do artigo 26.o Regulamento n.o 604/2013.

95.

A adoção de tal decisão não pode ter por efeito privar o nacional de país terceiro ou apátrida que tenha apresentado um pedido de proteção internacional ao Estado‑Membro de acolhimento da sua qualidade de requerente ou dos direitos a ela associados.

C.   Alcance da condição relativa ao atraso imputável ao requerente

96.

Com a quarta e a quinta questão submetidas pela High Court (Tribunal Superior) no processo C‑322/19 e com a segunda questão submetida pelo International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional) no processo C‑385/19, o Tribunal de Justiça é chamado, em substância, a especificar a natureza dos comportamentos suscetíveis de constituir um atraso imputável ao requerente, na aceção do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33.

97.

Em especial, a High Court (Tribunal Superior) pergunta ao Tribunal de Justiça se, nos termos desta disposição, o requerente pode ser responsabilizado pelo atraso resultante, primeiro, do facto de não ter apresentado o seu pedido de proteção internacional no primeiro Estado‑Membro de entrada ou no Estado‑Membro de estada — caso em que a análise do seu pedido requer a instauração de um procedimento de (re)tomada a cargo e, eventualmente, de transferência para esse Estado — e, segundo, do facto de ter interposto recurso judicial da decisão de transferência a que foi sujeito.

98.

Esta questão convida o Tribunal de Justiça a determinar o alcance de uma das condições previstas no artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33 para que o requerente possa beneficiar do acesso ao mercado de trabalho. Com efeito, recordo que por força desta disposição os Estados‑Membros devem assegurar que esse acesso seja concedido ao requerente num prazo máximo de nove meses a contar da data de apresentação do pedido quando «a autoridade competente não tiver tomado uma decisão em primeira instância e esse atraso não puder ser imputado ao requerente».

99.

Sublinho que a redação do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33 não especifica as circunstâncias em que se pode considerar que o atraso na adoção de uma decisão em primeira instância é imputável ao requerente. Além disso, a análise da sistemática em que esta disposição se insere e da finalidade desta diretiva também não permite determinar a natureza destas circunstâncias. Quer pelo seu título e preâmbulo quer pelo seu conteúdo e finalidade, esta diretiva não pretende estabelecer as regras processuais aplicáveis à adoção de uma decisão em primeira instância ou estabelecer as obrigações que incumbem, neste contexto, ao requerente.

100.

Por conseguinte, deve ser feita referência às regras processuais previstas na Diretiva 2013/32, bem como à finalidade prosseguida por essas regras.

101.

O capítulo II da Diretiva 2013/32, intitulado «Princípios e garantias fundamentais», e o capítulo III da mesma, intitulado «Procedimentos em primeira instância», estabelecem os direitos e obrigações do requerente no âmbito do processo de adoção de uma decisão em primeira instância. O artigo 31.o, n.o 3, terceiro parágrafo, alínea c), da referida diretiva contém assim uma referência expressa às circunstâncias em que uma autoridade nacional pode imputar ao requerente o atraso na adoção de uma decisão em primeira instância. Com efeito, esta disposição prevê que os Estados‑Membros podem prorrogar por mais nove meses o prazo de seis meses para a adoção de uma decisão em primeira instância quando «o atraso [puder] ser claramente atribuído ao facto de o requerente não cumprir as suas obrigações ao abrigo do artigo 13.o [da diretiva]» ( 43 ).

102.

O artigo 13.o da Diretiva 2013/32 tem por epígrafe «Obrigações dos requerentes». Decorre do n.o 1 do mesmo artigo que o requerente tem a obrigação de cooperar com a autoridade nacional competente para determinar a sua identidade e os restantes elementos referidos no artigo 4.o, n.o 2, da Diretiva 2011/95, ou seja, idade, história pessoal, incluindo a dos familiares pertinentes, nacionalidade(s), país(es) e local(is) de residência anteriores, pedidos de asilo anteriores, itinerários, documentos de viagem e motivos pelos quais solicita proteção internacional. Estes são elementos essenciais e necessários para a avaliação dos factos e circunstâncias a ser realizada pela autoridade nacional competente para analisar o pedido de proteção internacional. Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, essa obrigação de cooperação implica que o requerente forneça, tanto quanto possível, os documentos comprovativos solicitados e, sendo caso disso, as explicações e informações solicitadas ( 44 ).

103.

No artigo 13.o da Diretiva 2013/32, o legislador da União permite que os Estados‑Membros concretizem esta cooperação estabelecendo outras obrigações para o requerente, «desde que sejam necessárias à tramitação do pedido» ( 45 ). Segundo o legislador da União, estes últimos podem, nomeadamente, exigir que o requerente contacte ou compareça junto da autoridade nacional competente, entregue os documentos necessários à apreciação do seu pedido, comunique o seu endereço e quaisquer alterações ao mesmo, ou permitir que as autoridades competentes o revistem, o fotografem ou gravem as suas declarações ( 46 ).

104.

Embora os Estados‑Membros disponham, portanto, de uma margem de apreciação, cumpre notar que as obrigações impostas ao requerente se devem inscrever no âmbito da cooperação prevista no artigo 4.o da Diretiva 2011/95. Devem também permitir avaliar e recolher os elementos mais relevantes a fim de determinar a necessidade de proteção internacional do requerente e recolher todas as informações necessárias para avaliar a credibilidade deste e o mérito do seu pedido. Tratando‑se de um pedido de concessão do estatuto refugiado, o objetivo é determinar, em conformidade com o artigo 2.o, alínea d), da Diretiva 2011/95 e com base em informações muito concretas, se o receio do indivíduo de ser perseguido em caso de regresso ao seu país de origem é objetivamente fundado. Tratando‑se de um pedido de proteção subsidiária, a finalidade é apreciar, à luz do artigo 2.o, alínea f), dessa diretiva, se há motivos significativos para crer que o interessado correria um risco real de sofrer ofensas graves se fosse enviado para o seu país de origem. Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, da referida diretiva, o ónus da prova cabe ao requerente. Com efeito, este último é obrigado a apresentar, o mais rapidamente possível, todos os elementos necessários para apoiar o seu pedido.

105.

Tendo em conta estes elementos, concluo que as obrigações do requerente a que o legislador da União se refere para efeitos da adoção de uma decisão em primeira instância no artigo 13.o, bem como no artigo 31.o, n.o 3, terceiro parágrafo, alínea c), da Diretiva 2013/32, devem ser entendidas como estando circunscritas à apreciação da admissibilidade e do mérito do pedido de proteção internacional.

106.

Por conseguinte, proponho que se responda à segunda questão submetida pelo International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional) que, no contexto da aplicação do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33, um Estado‑Membro só pode imputar ao requerente o atraso na adoção de uma decisão em primeira instância na medida em que o requerente não tenha cumprido as obrigações de cooperação que lhe incumbem por força do artigo 13.o da Diretiva 2013/32.

107.

Importa agora determinar se, como sustenta a High Court (Tribunal Superior) na sua decisão de reenvio, um Estado‑Membro pode imputar esse atraso ao facto de, em primeiro lugar, o requerente não ter apresentado o seu pedido de proteção internacional no primeiro Estado‑Membro de entrada ou de estada e de, em segundo, ter interposto recurso judicial da decisão de transferência a que foi sujeito.

108.

No estado atual dos textos que compõem o SECA, entendo que nenhuma destas circunstâncias pode ser considerada a causa de um atraso imputável ao requerente na aceção do artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33, suscetível de o privar do acesso ao mercado de trabalho do Estado‑Membro de acolhimento ( 47 ).

109.

Com efeito, nenhuma destas circunstâncias constitui prova de incumprimento das obrigações que lhe incumbem no âmbito do procedimento de determinação do estatuto de beneficiário de proteção internacional.

110.

Os supostos incumprimentos referidos pela High Court (Tribunal Superior) ocorrem, na realidade, no procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável estabelecido pelo Regulamento n.o 604/2013. Ora, o referido regulamento não exige que o nacional de país terceiro ou apátrida apresente um pedido de proteção internacional no primeiro Estado‑Membro de entrada ou no Estado‑Membro de estada nem que renuncie ao seu direito de recorrer aos tribunais a fim de garantir a celeridade do procedimento.

111.

A interpretação sugerida pela High Court (Tribunal Superior) é, portanto, contrariada pelos termos, economia e objetivo do Regulamento n.o 604/2013.

112.

Em primeiro lugar, como acabo de referir, nenhuma disposição deste regulamento cria uma obrigação por parte do nacional de país terceiro ou apátrida de apresentar um pedido de proteção internacional no primeiro Estado‑Membro de entrada ou no Estado‑Membro de estada. Embora a Comissão proponha introduzir essa obrigação no quadro da reformulação do sistema de Dublim, a fim de combater os movimentos secundários dos requerentes ( 48 ), esta proposta, que foi feita em 2016, ainda não foi adotada. No estado atual do direito da União, e como o Tribunal de Justiça salientou no seu Acórdão de 7 de junho de 2016, Ghezelbash ( 49 ), o Regulamento n.o 604/2013 estabelece, por conseguinte, um conjunto de medidas para envolver o requerente no processo de determinação do Estado‑Membro responsável. Logo que um pedido seja apresentado pela primeira vez num Estado‑Membro, os artigos 4.o e 5.o do referido regulamento exigem assim que as autoridades nacionais competentes, por um lado, o informem, por escrito e numa língua que este compreenda, dos vários mecanismos instituídos pelo referido regulamento e, em particular, dos critérios de determinação do Estado‑Membro responsável e da ordem pela qual devem ser aplicados e, por outro, que organizem uma entrevista pessoal ( 50 ). Como demonstra a ordem pela qual os critérios de responsabilidade são estabelecidos no capítulo III do Regulamento n.o 604/2013, o primeiro Estado‑Membro de entrada ou o Estado‑Membro de estada não é necessariamente o Estado‑Membro responsável se se verificar, por exemplo, que os membros da família do requerente estão estabelecidos noutro Estado‑Membro ou se tal não for do interesse superior do menor em causa ( 51 ).

113.

Consequentemente, «a aplicação regular e ordenada» do Regulamento n.o 604/2013 referida pela High Court (Tribunal Superior) na sua decisão de reenvio não exige que o nacional de país terceiro ou apátrida apresente o seu pedido de proteção internacional no primeiro Estado‑Membro em cujo território tenha entrado a partir de um país terceiro ou em cujo território tenha permanecido.

114.

Nestas circunstâncias, o Estado‑Membro de acolhimento não pode imputar ao requerente o atraso causado pelo procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável, recusando‑lhe o acesso ao mercado de trabalho previsto no artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33.

115.

Em segundo lugar, deve chegar‑se à mesma conclusão à luz da interpretação sugerida pela High Court (Tribunal Superior), segundo a qual um Estado‑Membro poderá imputar ao requerente o atraso causado pelo recurso interposto da decisão de transferência a que foi sujeito.

116.

O Tribunal de Justiça já tratou longamente do alcance do direito de recurso previsto no Regulamento n.o 604/2013 no seu Acórdão de 7 de junho de 2016, Ghezelbash ( 52 ), bem como nos seus Acórdãos de 25 de outubro de 2017, Shiri ( 53 ), de 31 de maio de 2018, Hassan ( 54 ), e de 2 de abril de 2019, H. e R. ( 55 ), para os quais remeto. No contexto destas conclusões, parece‑me suficiente recordar que o legislador da União acompanhou a adoção do Regulamento n.o 604/2013 com medidas destinadas a reforçar as garantias processuais concedidas ao requerente ao abrigo do sistema de Dublim ( 56 ) e, em particular, a proteção judicial de que goza nos termos do artigo 47.o da Carta ( 57 ).

117.

Recordo que, nos termos desta disposição, toda a pessoa cujos direitos e liberdades garantidos pela ordem jurídica da União tenham sido violados tem direito a uma ação perante um tribunal ( 58 ). Os Estados‑Membros são, assim, obrigados a estabelecer os recursos jurídicos necessários e a respeitar os direitos de defesa dos destinatários de decisões que afetem significativamente os seus interesses ( 59 ). Ora, é o caso da decisão de transferência.

118.

O direito de interpor um recurso jurisdicional dessa decisão é, em primeiro lugar, estabelecido no artigo 4.o, n.o 1, alínea d), do Regulamento n.o 604/2013 ( 60 ). Este princípio está depois consagrado no artigo 27.o, n.o 1, deste regulamento. Finalmente, o seu alcance é especificado pelo legislador da União no considerando 19 do referido Regulamento e pelo Tribunal de Justiça na jurisprudência citada nas notas 52 a 59 das presentes conclusões.

119.

A este respeito, o Tribunal de Justiça recordou que «o legislador da União não quis sacrificar a proteção jurisdicional dos requerentes de proteção internacional em prol da referida exigência de celeridade [no tratamento dos pedidos de proteção internacional]» ( 61 ). Quanto ao risco de a conclusão do procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável poder ser excessivamente atrasada pelo exercício da fiscalização jurisdicional, considerou que o risco era limitado, tendo em contas as disposições expressamente previstas no Regulamento n.o 604/2013 ( 62 ).

120.

Por conseguinte, parece‑me evidente que o Estado‑Membro em que foi apresentado um pedido de proteção internacional não pode dissuadir o requerente de exercer o direito de recurso que lhe é expressamente conferido tanto pela Carta como pelo referido regulamento, imputando‑lhe o atraso resultante do processo jurisdicional e privando‑o do nível de acolhimento previsto no artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33.

121.

Tal ação desconsideraria não só o direito do requerente a uma proteção jurisdicional efetiva, mas também o seu direito a um acolhimento digno e respeitador dos seus direitos fundamentais, como já afirmei previamente.

122.

Em terceiro e último lugar, gostaria de salientar que, caso um Estado‑Membro considere que os requerentes estão a utilizar o seu direito de recurso de forma fraudulenta ou excessiva para atrasar o procedimento de transferência a que estão sujeitos, tal não justificaria a adoção de uma medida que imputasse o atraso na adoção de uma decisão em primeira instância de uma maneira generalizada a todos os requerentes.

123.

Recordo que, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, na inexistência de uma disposição expressa na regulamentação da União, o facto de um Estado‑Membro ser confrontado com um elevado número de casos de abuso de direito ou de fraude cometidos por nacionais de países terceiros não pode justificar a adoção de uma medida que assenta em considerações de prevenção geral, com exclusão da apreciação específica do comportamento próprio da pessoa em questão. O Tribunal de Justiça considera, com efeito, que a adoção de medidas com um objetivo de prevenção geral de casos frequentes de abuso de direito ou de fraude implicaria que o simples facto de pertencer a um determinado grupo de pessoas permitiria aos Estados‑Membros recusar o reconhecimento de um direito expressamente conferido pelo direito da União ( 63 ).

124.

Assim, o Tribunal de Justiça considera que cabe ao órgão jurisdicional nacional provar o abuso de direito, estabelecendo a existência de dois elementos. O primeiro elemento exige a demonstração da existência de um conjunto de circunstâncias objetivas das quais resulte que, apesar do respeito formal das condições previstas na regulamentação da União, o objetivo prosseguido por essa regulamentação não foi alcançado. Por sua vez, o segundo elemento implica provar que o interessado é motivado pelo desejo de obter uma vantagem resultante da regulamentação da União, criando artificialmente as condições necessárias para a obter ( 64 ).

125.

Atendendo a todas estas considerações, entendo, portanto, que o artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33 deve ser interpretado no sentido de que um Estado‑Membro só pode imputar ao recorrente o atraso na adoção de uma decisão em primeira instância na medida em que este não tenha cumprido as obrigações de cooperação que lhe incumbem por força do artigo 13.o da Diretiva 2013/32.

126.

Nestas condições, um Estado‑Membro não pode imputar ao requerente o atraso resultante do procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável, nem por não ter apresentado o seu pedido de proteção internacional no primeiro Estado‑Membro de entrada ou, em caso de estada regular, no Estado‑Membro de estada, nem por ter interposto recurso judicial da decisão de transferência adotada a seu respeito em aplicação do artigo 26.o do Regulamento n.o 604/2013.

V. Conclusão

127.

Atendendo às considerações precedentes, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à segunda questão prejudicial submetida pela High Court (Tribunal Superior, Irlanda) no processo The International Protection Appeals Tribunal e o. (C‑322/19) e à primeira questão prejudicial submetida pelo International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional, Irlanda) no processo Minister for Justice and Equality (C‑385/19), do seguinte modo:

1)

O artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional, deve ser interpretado no sentido de que se opõe à legislação de um Estado‑Membro que conduz a recusar a um requerente de proteção internacional o acesso ao mercado de trabalho pelo facto de a autoridade nacional competente ter adotado uma decisão de transferência a seu respeito em aplicação do artigo 26.o do Regulamento (UE) n.o 604/2013, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida.

2)

A adoção de tal decisão não pode ter por efeito privar o nacional do país terceiro ou o apátrida que tenha apresentado um pedido de proteção internacional ao Estado‑Membro de acolhimento da sua qualidade de requerente de proteção internacional ou dos direitos a ela associados.

128.

Além disso, proponho ao Tribunal de Justiça que responda à quarta e à quinta questão prejudicial submetidas pela High Court (Tribunal Superior) no processo The International Protection Appeals Tribunal e o. (C‑322/19) e à segunda questão prejudicial submetida pelo International Protection Appeals Tribunal (Tribunal de Recurso para a Proteção Internacional) no processo do Minister for Justice and Equality (C‑385/19), do seguinte modo:

1)

O artigo 15.o, n.o 1, da Diretiva 2013/33 deve ser interpretado no sentido de que um Estado‑Membro só pode imputar ao requerente de proteção internacional o atraso na adoção de uma decisão em primeira instância na medida em que este não tenha cumprido as obrigações de cooperação que lhe incumbem por força do artigo 13.o da Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional.

2)

Nestas condições, um Estado‑Membro não pode imputar ao requerente de proteção internacional o atraso resultante do procedimento de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise do seu pedido de proteção internacional nem com o fundamento de que não apresentou o seu pedido de proteção internacional no primeiro Estado‑Membro de entrada ou, em caso de estada regular, no Estado‑Membro de estada, nem com o fundamento de que interpôs recurso judicial da decisão de transferência adotada a seu respeito em aplicação do artigo 26.o do Regulamento n.o 604/2013.


( 1 ) Língua original: francês.

( 2 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida (JO 2013, L 180, p. 31). Este regulamento substituiu o Regulamento (CE) n.o 343/2003 do Conselho, de 18 de fevereiro de 2003, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de asilo apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro (JO 2003, L 50, p. 1).

( 3 ) Diretiva 2013/33/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 96; retificação no JO 2015, L 100, p. 81).

( 4 ) A legislação anterior, que proibia de uma maneira absoluta um requerente de entrar no mercado de trabalho antes de ser tomada uma decisão sobre o seu pedido, foi julgada contrária à Constituição irlandesa, pela Supreme Court (Supremo Tribunal, Irlanda), num Acórdão de 30 de maio de 2017, n.o 31 e 56/2016 (v., a este respeito, n.o 84 das presentes conclusões).

( 5 ) C‑179/11, a seguir «Acórdão Cimade e GISTI, EU:C:2012:594.

( 6 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de dezembro de 2011, que estabelece normas relativas às condições a preencher pelos nacionais de países terceiros ou por apátridas para poderem beneficiar de proteção internacional, a um estatuto uniforme para refugiados ou pessoas elegíveis para proteção subsidiária e ao conteúdo da proteção concedida (JO 2011, L 337, p. 9).

( 7 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional (JO 2013, L 180, p. 60).

( 8 ) A seguir «Carta».

( 9 ) JO 2016, C 202, p. 295.

( 10 ) Regulamento de 2018 Relativo à União Europeia (Sistema de Dublim).

( 11 ) Diretiva do Conselho de 27 de janeiro de 2003, que estabelece normas mínimas em matéria de acolhimento dos requerentes de asilo nos Estados‑Membros (JO 2003, L 31, p. 18), a qual foi substituída pela Diretiva 2013/33.

( 12 ) V., a este respeito, o artigo 2.o, alínea i), da Diretiva 2011/95, artigo 2.o, alínea c), da Diretiva 2013/32 e artigo 2.o, alínea c), do Regulamento n.o 604/2013.

( 13 ) V. Acórdão Cimade e GISTI (n.o 40).

( 14 ) V., a este respeito, Cimade e GISTI (n.o 40).

( 15 ) V., a este respeito, Acórdãos Cimade e GISTI (n.o 53) e de 19 de junho de 2018, Gnandi (C‑181/16, EU:C:2018:465, n.o 63).

( 16 ) C‑647/16, EU:C:2018:368, n.os 41 e segs.

( 17 ) No artigo 33.o, n.o 2, da Diretiva 2013/32, o legislador da União enumera exaustivamente os casos em que os Estados‑Membros podem considerar um pedido inadmissível. Ora, noto que a situação em que o pedido de proteção internacional não é analisado nos termos do Regulamento n.o 604/2013 não está incluída nessa lista.

( 18 ) V., a este respeito, artigo 33.o, n.o 1, da Diretiva 2013/32.

( 19 ) O artigo 18.o, n.o 2, do Regulamento n.o 604/2013 exige que este último analise ou finalize a análise do pedido de proteção internacional, assegurando assim a continuidade do procedimento de análise.

( 20 ) O sublinhado é meu.

( 21 ) V. Acórdão Cimade e GISTI (n.o 48).

( 22 ) V. Acórdão Cimade e GISTI (n.o 55).

( 23 ) Sobre as circunstâncias em que um Estado‑Membro pode limitar ou retirar condições materiais de acolhimento, v. Acórdão de 12 de novembro de 2019, Haqbin (C‑233/18, EU:C:2019:956).

( 24 ) V., por analogia, o Acórdão de 20 de outubro de 2016, Danqua (C‑429/15, EU:C:2016:789, n.o 29 e jurisprudência referida).

( 25 ) V. Acórdão Cimade e GISTI (n.o 56).

( 26 ) V., por exemplo, o artigo 23.o da Declaração Universal dos Direitos do Homem, adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, ou o artigo 6.o do Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 16 de dezembro de 1966, e que entrou em vigor em 3 de janeiro de 1976, que consagra o direito ao trabalho nestes termos, no seu n.o 1: «Os Estados Partes no presente Pacto reconhecem o direito ao trabalho, que inclui o direito de todos à oportunidade de ganhar a sua vida através do trabalho que livremente escolheram ou aceitam, e tomarão as medidas apropriadas para salvaguardar este direito». V., também, artigo 1.o da Carta Social Europeia, assinada em Turim, em 18 de outubro de 1961, bem como o preâmbulo da Convenção n.o 168 Relativa à Promoção do Emprego e Proteção contra o Desemprego da Organização Internacional do Trabalho, adotada em Genebra, em 21 de junho de 1988, e, no que diz respeito aos refugiados, artigos 17.o a 19.o da Convenção Relativa ao Estatuto dos Refugiados, assinada em Genebra, em 28 de julho de 1951 (Recueil des traités des Nations unies, vol. 189, p. 150, n.o 2545, 1954).

( 27 ) Note on the integration of Refugees in the European Union, disponível em: https://www.unhcr.org/protection/integration/463b462c4/note‑integration‑refugees‑european‑union.html (n.o 14)

( 28 ) O direito ao trabalho, comentário geral n.o 18, adotado em 24 de novembro de 2005, artigo 6.o do Pacto Internacional de Direitos Económicos, Sociais e Culturais, disponível em http://docstore.ohchr.org/SelfServices/FilesHandler.ashx?enc=4slQ6QSmlBEDzFEovLCuW1a0Szab0oXTdImnsJZZVQfUKxXVisd7Dae%2FCu%2B13J253bHC9qqkloiEoXmdKX6hxKmueE3OfasXtvIBCDyulRlnte7Ne6tr02OMha%2FfFY7J. A seguir «comentário geral n.o 18».

( 29 ) N.o 6 do comentário geral n.o 18.

( 30 ) N.o 1 do comentário geral n.o 18.

( 31 ) N.o 31, alínea a), do comentário geral n.o 18.

( 32 ) V. nota 4 das presentes conclusões.

( 33 ) V., em especial, n.os 19 a 21 desse acórdão.

( 34 ) V. n.o 20 do referido acórdão.

( 35 ) V. estatísticas apresentadas em setembro de 2019 pelo Eurostat, «Dublin statistics on countries responsible for asylum application», em particular sob o título «Implement implemented transfers within the Dublin procedure», disponível em: https://ec.europa.eu/eurostat/statistics‑explained/index.php/Dublin_statistics_on_countries_responsible_for_asylum_application#Implemented_transfers_within_the_Dublin_procedure.

( 36 ) V. Acórdão Cimade e GISTI (n.o 45).

( 37 ) V. resultados das avaliações referidas no âmbito da proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou um apátrida, de 4 de maio de 2016 [COM(2016) 270 final], em que a Comissão Europeia sublinha que, em 2014, apenas cerca de um quarto do número total dos pedidos de (re)tomada a cargo aceites deram realmente origem a uma transferência física (p. 11).

( 38 ) CE:ECHR:2014:1211JUD006354211, § 56 a 60.

( 39 ) Assinada em Roma, em 4 de novembro de 1950.

( 40 ) Em conformidade com o artigo 67.o, n.o 2, TFUE, a União desenvolve uma política comum em matéria de asilo que se baseia na solidariedade entre os Estados‑Membros. O artigo 80.o TFUE estabelece que a política de asilo da União é regida pelo princípio da solidariedade e da partilha equitativa das responsabilidades entre os Estados‑Membros.

( 41 ) V. considerando 13 da Diretiva 2013/33.

( 42 ) V., a este respeito, artigo 29.o, n.o 2, do Regulamento n.o 604/2013.

( 43 ) O sublinhado é meu.

( 44 ) V. Acórdão de 14 de setembro de 2017, K. (C‑18/16, EU:C:2017:680, n.o 38).

( 45 ) Artigo 13.o, n.o 1, desta diretiva.

( 46 ) Artigo 13.o, n.o 2, da referida diretiva.

( 47 ) No âmbito da sua proposta de regulamento referida na nota 37 das presentes conclusões, a Comissão propõe a introdução de um novo artigo 4.o, intitulado «Obrigações do requerente», que estabeleceria, no n.o 1, a obrigação do requerente de apresentar o seu pedido, ou no Estado‑Membro em que tenha entrado pela primeira vez de forma irregular, ou, se se encontrar legalmente num Estado‑Membro, nesse Estado‑Membro (v., também, explicações sobre a introdução desta nova obrigação na página 16 da proposta). A violação desta obrigação implicaria, nos termos do novo artigo 5.o, n.o 3, do regulamento alterado, a impossibilidade de beneficiar da condição de acolhimento prevista no artigo 15.o da Diretiva 2013/33 em qualquer Estado‑Membro diferente daquele em que o requerente é obrigado a estar presente.

( 48 ) V. nota 37 das presentes conclusões.

( 49 ) C‑63/15, EU:C:2016:409, n.os 46 a 48.

( 50 ) O artigo 4.o do Regulamento n.o 604/2013 tem por epígrafe «Direito à informação». Dispõe, nomeadamente, no seu n.o 1: «Após a apresentação de um pedido de proteção internacional, na aceção do artigo 20.o, n.o 2, num Estado‑Membro, as suas autoridades competentes informam o requerente da aplicação do presente regulamento e, em especial, dos seguintes elementos: a) os objetivos do presente regulamento e as consequências da apresentação de um novo pedido num Estado‑Membro diferente […]; b) Os critérios de determinação do Estado‑Membro responsável, hierarquia desses critérios durante as diversas etapas do procedimento e a duração das mesmas […]; c) A entrevista pessoal nos termos do artigo 5.o e a possibilidade de informar da presença de membros da família, de familiares ou de outros parentes nos Estados‑Membros […]; d) A possibilidade de contestar uma decisão de transferência […]». O artigo 5.o do Regulamento n.o 604/2013, por sua vez, que tem por epígrafe «Entrevista individual», tem a seguinte redação: «1. A fim de facilitar o processo de determinação do Estado‑Membro responsável, o Estado‑Membro que procede à determinação realiza uma entrevista pessoal com o requerente. A entrevista deve permitir, além disso, que o requerente compreenda devidamente as informações que lhe são facultadas nos termos do artigo 4.o […] 3. A entrevista pessoal deve realizar‑se em tempo útil e, de qualquer forma, antes de ser adotada qualquer decisão de transferência do requerente para o Estado‑Membro responsável nos termos do artigo 26.o, n.o 1 […]»

( 51 ) Nos termos do artigo 7.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 604/2013, o Estado‑Membro ao qual tenha sido apresentado um pedido de proteção internacional deve, com efeito, aplicá‑los pela ordem em que são apresentados nesse capítulo, com base na situação existente no momento em que o requerente apresentou o seu primeiro pedido a um Estado‑Membro.

( 52 ) C‑63/15, EU:C:2016:409, n.os 30 e segs.

( 53 ) C‑201/16, EU:C:2017:805, n.os 36 e segs.

( 54 ) C‑647/16, EU:C:2018:368, n.o 56 e jurisprudência referida.

( 55 ) C‑582/17 e C‑583/17, EU:C:2019:280, n.os 38 a 42 e jurisprudência referida.

( 56 ) V, a este respeito, Acórdão de 7 de junho de 2016, Ghezelbash (C‑63/15, EU:C:2016:409, n.o 57). V., também, neste sentido, proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado‑Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados‑Membros por um nacional de um país terceiro ou um apátrida [COM(2008) 820 final], em especial, na parte 3 da exposição de motivos, n.o 3, intitulada «Salvaguardas jurídicas para as pessoas abrangidas pelo procedimento de Dublim» (p. 8), bem como o n.o 6, intitulado «Pressão extraordinária ou nível de proteção não adequado» (em particular, p. 12).

( 57 ) V., a este respeito, Acórdão de 31 de maio de 2018, Hassan (C‑647/16, EU:C:2018:368, n.os 57 e 58 e jurisprudência referida).

( 58 ) V. Acórdãos de 19 de março de 2020, Bevándorlási és Menekültügyi Hivatal (Tompa) (C‑564/18, EU:C:2020:218, n.o 60 e jurisprudência referida), e de 14 de maio de 2020, Országos Idegenrendészeti Főigazgatóság Dél‑alföldi Regionális Igazgatóság (C‑924/19 PPU e C‑925/19 PPU, EU:C:2020:367, n.o 127 e jurisprudência referida).

( 59 ) V., neste sentido, Acórdão de 26 de julho de 2017, Sacko (C‑348/16, EU:C:2017:591, n.os 29, 30 e 33 e jurisprudência referida).

( 60 ) V. nota 50 das presentes conclusões.

( 61 ) V., a este respeito, Acórdão de 31 de maio de 2018, Hassan (C‑647/16, EU:C:2018:368, n.o 57 e jurisprudência referida).

( 62 ) V, a este respeito, Acórdão de 7 de junho de 2016, Ghezelbash (C‑63/15, EU:C:2016:409, n.o 58).

( 63 ) V., a este respeito, Acórdão de 18 de dezembro de 2014, McCarthy e o. (C‑202/13, EU:C:2014:2450, n.os 55 e 56).

( 64 ) V. Acórdãos de 14 de dezembro de 2000, Emsland‑Stärke (C‑110/99, EU:C:2000:695, n.os 52 a 54), e de 18 de dezembro de 2014, McCarthy e o. (C‑202/13, EU:C:2014:2450, n.o 54 e jurisprudência referida).

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