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Document 62019CC0019

Conclusões do advogado-geral G. Hogan apresentadas em 14 de janeiro de 2020.
État belge contra Pantochim SA.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pela Cour de cassation (Bélgica).
Reenvio prejudicial — Assistência mútua em matéria de cobrança de créditos — Diretiva 76/308/CEE — Artigos 6, n.o 2, e 10.o — Diretiva 2008/55/CE — Artigos 6.o, segundo parágrafo, e 10.o — Crédito fiscal do Estado‑Membro requerente cobrado pelo Estado‑Membro requerido — Qualidade desse crédito — Conceito de “privilégio” — Compensação legal entre o referido crédito e uma dívida fiscal do Estado‑Membro requerido.
Processo C-19/19.

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2020:2

 CONCLUSÕES DO ADVOGADO‑GERAL

GERARD HOGAN

apresentadas em 14 de janeiro de 2020 ( 1 )

Processo C‑19/19

Estado belga

contra

Pantochim SA, em liquidação

[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Cour de cassation (Tribunal de Cassação, Bélgica)]

«Pedido de decisão prejudicial — Diretiva 76/308/CEE Assistência mútua em matéria de cobrança de créditos — Diretiva 2008/55/CE — Artigos 6.o e 10.o — Diretiva 2010/24/EU — Artigo 13.o, n.o 1 — Compensação do crédito fiscal cobrado em nome do Estado‑Membro requerente com o crédito fiscal do Estado‑Membro requerido — Qualidade do crédito cobrado — Interpretação do termo “privilégio”»

I. Introdução

1.

O presente pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 6.o, n.o 2, e do artigo 10.o da Diretiva 76/308/CEE do Conselho, de 15 de março de 1976, relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos resultantes de operações que fazem parte do sistema de financiamento do Fundo Europeu de Orientação e Garantia Agrícola (FEOGA), bem como de direitos niveladores agrícolas e de direitos aduaneiros ( 2 ), bem como do artigo 6.o, segundo parágrafo, e o artigo 10.o da Diretiva 2008/55/CE do Conselho, de 26 de maio de 2008, relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a certas quotizações, direitos, impostos e outras medidas ( 3 ).

2.

O pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe o État belge (Estado belga) à sociedade Pantochim SA, em liquidação. No essencial, as questões colocadas referem‑se à questão de saber se um crédito fiscal detido pela Pantochim para com o Estado belga pode ser compensado com um crédito de imposto sobre o valor acrescentado (a seguir «IVA») detido pelo Estado alemão para com a mesma sociedade. O Estado alemão tinha solicitado assistência ao Estado belga com base na Diretiva 76/308, tal como transposta pelo direito belga, para a cobrança da dívida em causa.

3.

Proponho‑me revisitar os factos do processo em apreço, mas antes de mais é necessário expor o quadro jurídico pertinente.

II. Quadro jurídico

A.   Direito da União

1. Diretiva 76/308

4.

O artigo 6.o da Diretiva 76/308, na sua versão original, dispõe:

«1.   A pedido da autoridade requerente, a autoridade requerida procederá, de acordo com as disposições legislativas, regulamentares ou administrativas aplicáveis à cobrança de créditos similares constituídos no Estado‑Membro onde ela tem a sua sede, à cobrança dos créditos que sejam objeto de um título executivo.

2.   Para o efeito, qualquer crédito que seja objeto de um pedido de cobrança é considerado como um crédito do Estado‑Membro onde a autoridade requerida tem a sua sede, […]»

5.

O artigo 10.o da Diretiva 76/308, na sua versão original, dispõe:

«Os créditos a cobrar não gozam de qualquer privilégio no Estado‑Membro onde a autoridade requerida tem a sua sede.»

2. Diretiva 2008/55

6.

O considerando 1 da Diretiva 2008/55 dispõe:

«A Diretiva 76/308/CEE do Conselho, de 15 de março de 1976, relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a certas quotizações, direitos, impostos e outras medidas, foi por várias vezes alterada de modo substancial, sendo conveniente, por uma questão de lógica e clareza, proceder à codificação da referida diretiva.»

7.

O artigo 6.o da Diretiva 2008/55 dispõe:

«A pedido da autoridade requerente, a autoridade requerida procederá, de acordo com as disposições legislativas, regulamentares ou administrativas aplicáveis à cobrança de créditos similares constituídos no Estado‑Membro onde ela tem a sua sede, à cobrança dos créditos que sejam objeto de um título executivo.

Para o efeito, qualquer crédito que seja objeto de um pedido de cobrança é considerado como um crédito do Estado‑Membro onde a autoridade requerida tem a sua sede, […]»

8.

O artigo 10.o da Diretiva 2008/55 dispõe:

«Não obstante o segundo parágrafo do artigo 6.o, os créditos a cobrar não beneficiam necessariamente dos privilégios de créditos análogos gerados no Estado‑Membro em que a autoridade requerida tem a sua sede.»

3. Diretiva 2010/24/UE

9.

A Diretiva 2008/55 foi revogada com efeitos a 1 de janeiro de 2012 pelo artigo 29.o da Diretiva 2010/24/UE, de 16 de março de 2010, relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a impostos, direitos e outras medidas ( 4 ).

10.

O artigo 10.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24 dispõe:

«A pedido da autoridade requerente, a autoridade requerida cobra os créditos que sejam objeto de um título executivo no Estado‑Membro requerente.»

11.

O artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24 dispõe:

«Para efeitos da cobrança no Estado‑Membro requerido, todos os créditos que sejam objeto de um pedido de cobrança devem ser tratados como créditos do Estado‑Membro requerido, salvo disposição em contrário da presente diretiva. A autoridade requerida faz uso das competências e dos procedimentos previstos pelas disposições legislativas, regulamentares ou administrativas do Estado‑Membro requerido aplicáveis aos créditos relativos aos mesmos impostos ou direitos ou, na sua ausência, a impostos ou direitos similares, salvo disposição em contrário da presente diretiva.»

[…]

O Estado‑Membro requerido não é obrigado a conceder aos créditos de outros Estados‑Membros as preferências concedidas a créditos similares nele constituídos, salvo acordo em contrário entre os Estados‑Membros em causa ou disposição em contrário na legislação do Estado‑Membro requerido. Um Estado‑Membro que conceda preferências a créditos de outro Estado‑Membro não pode recusar conceder as mesmas preferências a créditos da mesma natureza ou de natureza similar dos demais Estados‑Membros, nas mesmas condições.

[…]»

12.

O artigo 13.o, n.o 5, da Diretiva 2010/24 dispõe:

«Sem prejuízo do disposto no n.o 1 do artigo 20.o, a autoridade requerida remete à autoridade requerente os montantes cobrados referentes ao crédito e os juros a que se referem os n.os 3 e 4.»

B.   Direito belga

13.

O artigo 12.o da loi du 20 juillet 1979 concernant l’assistance mutuelle en matière de recouvrement des créances relatives à certaines cotisations, droits, taxes et autres mesures (Lei de 20 de julho de 1979 relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a certas quotizações, direitos, impostos e outras medidas) (Moniteur belge de 30 de agosto de 1979, p. 9457, a seguir «Lei de 20 de julho de 1979») dispõe:

«A autoridade belga requerida efetua as cobranças solicitadas pela autoridade estrangeira requerente como se de créditos constituídos no Reino [da Bélgica] se tratasse.»

14.

O artigo 15.o da referida lei dispõe:

«Os créditos a cobrar não gozam de nenhum privilégio.»

15.

O artigo 334.o da loi‑programme du 27 décembre 2004 (Moniteur belge de 31 de dezembro de 2004, p. 87006, a seguir «Lei‑programa de 27 de dezembro de 2004»), na redação em vigor até 7 de janeiro de 2009, dispõe:

«Qualquer quantia a reembolsar ou a pagar a um devedor com base nas disposições legais em matéria de impostos sobre o rendimento, impostos equiparados estes, imposto sobre o valor acrescentado, […] pode ser destinada, sem formalidades, pelo funcionário competente ao pagamento […] dos impostos sobre os rendimentos, dos impostos equiparados a estes, do imposto sobre o valor acrescentado, […] quando estes últimos não sejam ou tenham deixado de ser contestados.

O parágrafo anterior continua a ser aplicável em caso de penhora, cessão, transferência ou quando existam créditos concorrentes ou processos de insolvência.»

16.

O artigo 334.o, primeiro parágrafo da Lei‑programa de 27 de dezembro de 2004 na redação que lhe foi dada pelo artigo 194.o da loi‑programme du 22 décembre 2008 (Moniteur belge de 29 de dezembro de 2008, p. 68649, a seguir «Lei‑programa de 22 de dezembro de 2008») e antes da sua alteração pela loi du 25 décembre 2016 (Lei de 25 de dezembro de 2016), aplicável aos factos a partir de 8 de janeiro de 2009, dispõe:

«Qualquer quantia a reembolsar ou a ser paga a uma pessoa, […] no âmbito da aplicação das leis fiscais da competência do Service public fédéral Finances (Serviço Público Federal de Finanças), quer a cobrança e a recuperação sejam asseguradas por esse serviço público federal […] pode ser destinada, sem formalidades e a critério do funcionário competente, ao pagamento das quantias devidas por essa pessoa nos termos das leis fiscais em causa ou à regularização de créditos fiscais ou não fiscais cuja aplicação e cobrança sejam asseguradas pelo Serviço Público Federal de Finanças […]. Esse pedido é limitado ao montante não contestado da dívida relativa a essa pessoa.

O parágrafo anterior continua a ser aplicável em caso de penhora, cessão, transferência ou quando existam créditos concorrentes ou processos de insolvência.»

III. Litígio no processo principal e questões prejudiciais

17.

A Pantochim é uma sociedade anónima que foi colocada em situação de liquidação em 26 de junho de 2001 por decisão do tribunal de commerce de Charleroi (Tribunal de Comércio de Charleroi, Bélgica). No decurso dessa liquidação, a Pantochim pagou integralmente a dívida privilegiada de IVA detida pelo Estado belga.

18.

O Estado belga declarou igualmente, no decurso do processo de liquidação, uma dívida no montante de 634275,50 euros, acrescido de juros, a título de IVA, detida pelo Estado alemão. Esta dívida de IVA específica (a seguir «dívida de IVA alemão») foi admitida no passivo a título de dívida não garantida. Decorre do pedido de decisão prejudicial que o Estado alemão solicitou assistência com base na Diretiva 76/308, conforme transposta pelo direito belga, para a cobrança da dívida de IVA em causa.

19.

A questão que agora nos ocupa surge porque a Pantochim detém um crédito fiscal significativo para com o Estado belga. Quando o Estado belga indicou que tencionava compensar a sua dívida fiscal à Pantochim com a dívida de IVA alemão, com base no artigo 334.o da Lei‑programa de 27 de dezembro de 2004, os liquidatários da Pantochim reagiram intentando uma ação contra o Estado belga. O tribunal de première instance du Hainaut, division Mons (Tribunal de Primeira Instância de Hainaut, juízo de Mons, Bélgica) decidiu que o Estado belga não estava autorizado a compensar as dívidas em causa. Em sede de recurso, a Cour d’appel de Mons (Tribunal de Recurso de Mons, Bélgica), por Acórdão de 27 de junho de 2016, confirmou aquela decisão e condenou o Estado belga a pagar à Pantochim o montante de 502991,47 euros, acrescido de juros.

20.

O Estado belga interpôs então um recurso sobre uma questão de direito na Cour de cassation (Tribunal de Cassação, Bélgica). Este Estado considerou que a Cour d’appel de Mons (Tribunal de Recurso de Mons) violou, nomeadamente, o artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 76/308, ao impedi‑lo de cobrar a dívida do Estado alemão como se fosse sua. Além disso, o Estado belga não considera que a compensação de dívidas nos termos do artigo 334.o da Lei‑programa de 27 de dezembro de 2004 seja um «privilégio» na aceção do artigo 10.o da Diretiva 76/308.

21.

Aquele tribunal destacou uma série de conclusões da Cour d’appel de Mons (Tribunal de Recurso de Mons) que são contestadas pelo Estado belga.

22.

Em primeiro lugar, a Cour d’appel de Mons (Tribunal de Recurso de Mons) considerou que «o artigo 334.o da [Lei‑programa] não exclui expressamente as disposições do Código Civil relativas à compensação» que exigem «a existência de duas dívidas recíprocas […] que devem existir entre as mesmas pessoas que atuem na mesma qualidade». A Cour d’appel de Mons (Tribunal de Recurso de Mons) declarou que «mesmo que o crédito do Estado alemão possa ser cobrado como um crédito próprio do Estado belga, continua a ser um crédito desse Estado» de forma que «uma compensação legal não é possível uma vez que as dívidas recíprocas não existem entre as mesmas pessoas, querendo o Estado belga compensar a sua dívida para com [a sociedade Pantochim] com a dívida [da sociedade Pantochim] para com o Estado alemão». Aquele tribunal indicou, além disso, que «mesmo que se deva considerar a compensação fiscal uma compensação sui generis», ainda assim o artigo 334.o da Lei‑programa «não torna o benefício da compensação extensivo a outros créditos que não sejam os do Estado belga».

23.

Em segundo lugar, a Cour d’appel de Mons (Tribunal de Recurso de Mons) considerou que as disposições das diretivas não alteram o que precede, uma vez que, embora «prevejam, é certo, que os créditos para os quais é solicitada a assistência mútua sejam cobrados como um crédito do Estado requerido e da mesma forma», não deixa de ser verdade que «os créditos a cobrar só beneficiam dos privilégios dos créditos análogos constituídos no Estado‑Membro onde a autoridade requerida tem a sua sede se a legislação desse Estado‑Membro ou uma convenção entre o Estado requerente e o Estado requerido o previr». A Cour d’appel de Mons (Tribunal de Recurso de Mons) acrescentou que «na falta de definição na diretiva, o termo “privilégio” deve ser entendido no seu sentido comum de vantagem ou de prerrogativa».

24.

Nestas circunstâncias, a Cour de Cassation (Tribunal de Cassação) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça da União Europeia as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve a disposição nos termos da qual os créditos que sejam objeto de um pedido de cobrança “é considerado como um crédito do Estado‑Membro onde a autoridade requerida tem a sua sede”, tal como previsto no artigo 6.o, [segundo parágrafo], da [Diretiva 2008/55], que substitui o artigo 6.o, n.o 2, da [Diretiva 76/308], ser interpretada no sentido de que o crédito do Estado requerente é equiparado ao do Estado requerido, pelo que o crédito do Estado requerente adquire a qualidade de crédito do Estado requerido?

2)

Deve o termo “privilégio” utilizado no artigo 10.o da Diretiva [2008/55], e antes da codificação pelo artigo 10.o da Diretiva [76/308], ser entendido como um direito preferencial ligado ao crédito que lhe confere um direito de prioridade sobre os outros créditos em caso de concurso, ou como qualquer mecanismo que tenha por efeito obter, em caso de concurso, um pagamento preferencial do crédito?

3)

Deve considerar‑se que a faculdade de que dispõe a administração fiscal para proceder, nas condições previstas no artigo 334.o da Lei‑programa de 27 de [dezembro] de 2004, a uma compensação em caso de concurso constitui um privilégio na aceção do artigo 10.o das diretivas acima referidas?»

IV. Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

25.

A Pantochim, os Governos belga e espanhol e a Comissão Europeia apresentaram observações escritas. O Tribunal de Justiça decidiu pronunciar‑se sem realização de audiência.

V. Análise

A.   Considerações preliminares

26.

Nas questões prejudiciais que submeteu ao Tribunal de Justiça a título prejudicial, a Cour de cassation (Tribunal de Cassação) cita certas disposições da Diretiva 76/308 e da Diretiva 2008/55. Não é feita qualquer referência à Diretiva 2010/24. Antes de analisar as questões prejudiciais, considero que é necessário, em primeiro lugar, determinar qual a diretiva aplicável ratione temporis. Isto é importante porque existem algumas diferenças entre a redação do artigo 6.o, n.o 2, da Diretiva 76/308, do artigo 6.o, segundo parágrafo, da Diretiva 2008/55 e do artigo 10.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24 e do artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24, embora tenham, evidentemente, um âmbito de aplicação equivalente. O mesmo não pode dizer‑se, no entanto, do artigo 10.o da Diretiva 76/308 ( 5 ), do artigo 10.o da Diretiva 2008/55 e do artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 ( 6 ).

27.

No n.o 20 do Acórdão de 1 de julho de 2004, Tsapalos e Diamantakis (C‑361/02 e C‑362/02, EU:C:2004:401), o Tribunal de Justiça declarou que visto que a Diretiva 76/308 apenas regula o reconhecimento e a execução de determinadas categorias de créditos constituídos noutro Estado‑Membro, sem prever regras relativas à sua constituição ou ao seu alcance, deve considerar‑se que as disposições dessa diretiva são simples regras processuais. Na minha opinião, esta declaração do Tribunal também se aplica à Diretiva 2008/55 e à Diretiva 2010/24.

28.

Segundo jurisprudência constante, as regras processuais aplicam‑se a todos os litígios pendentes no momento em que as mesmas entram em vigor, o que, pelo contrário, não acontece com as normas substantivas, que são habitualmente interpretadas no sentido de não se aplicarem a situações estabelecidas anteriormente à sua entrada em vigor ( 7 ).

29.

O artigo 29.o da Diretiva 2010/24 estabelece que a Diretiva 2008/55 é revogada com efeitos a partir de 1 de janeiro de 2012 e que as referências à Diretiva 2008/55 revogada devem entender‑se como sendo feitas à Diretiva 2010/24 ( 8 ). A Diretiva 2010/24 não prevê disposições transitórias.

30.

Por conseguinte, considero que é a Diretiva 2010/24, e não a Diretiva 76/308 ou a Diretiva 2008/55, que se aplica ao processo que se encontra pendente no órgão jurisdicional de reenvio.

B.   Primeira questão

31.

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 — que prevê que «todos os créditos que sejam objeto de um pedido de cobrança devem ser tratados como créditos do Estado‑Membro requerido» — deve ser interpretado no sentido de que o crédito do Estado requerente (no presente processo, a Alemanha) adquire a qualidade de crédito do Estado requerido (no presente processo, a Bélgica).

32.

É jurisprudência constante que a Diretiva 76/308 estabeleceu regras comuns no que se refere à assistência mútua com o objetivo de garantir a cobrança de créditos relativos a certos direitos, quotizações e impostos ( 9 ). Esta afirmação também se aplica à Diretiva 2010/24 ( 10 ). Com efeito, a Diretiva 2010/24 visa alargar o âmbito de aplicação da Diretiva 76/308, conforme codificada pela Diretiva 2008/55, a créditos que não estavam anteriormente abrangidos por essas diretivas, a fim de melhor salvaguardar os interesses financeiros dos Estados‑Membros e a neutralidade do mercado interno, bem como conferir maior eficácia à assistência mútua. Em suma, tendo em conta o número crescente de pedidos de assistência, a Diretiva 2010/24 procura, em geral, facilitar e promover essa assistência mútua ( 11 ).

33.

O artigo 1.o da Diretiva 2010/24 dispõe que esta diretiva estabelece as regras nos termos das quais os Estados‑Membros devem prestar assistência à cobrança, num Estado‑Membro, de quaisquer créditos referidos no artigo 2.o constituídos noutro Estado‑Membro. O artigo 2.o, n.o 1, alínea a), prevê que o pedido de assistência pode ser feito em relação à cobrança de, designadamente, todos os impostos e direitos, independentemente da sua natureza, cobrados por um Estado‑Membro ou em seu nome, ou em nome da União ( 12 ). Em conformidade com o artigo 10.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24, uma autoridade requerida de um Estado‑Membro cobra, a pedido da autoridade requerente de outro Estado‑Membro, os créditos que sejam objeto de um título executivo no Estado‑Membro requerente.

34.

No n.o 48 do Acórdão de 26 de abril de 2018, Donnellan (C‑34/17, EU:C:2018:282), o Tribunal de Justiça declarou que, em conformidade com o artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24, o crédito objeto de um pedido de cobrança é tratado do mesmo modo que um crédito do Estado‑Membro requerido, «uma vez que este é levado a fazer uso das competências e dos procedimentos previstos pelas disposições legislativas, regulamentares ou administrativas aplicáveis aos créditos relativos aos impostos ou direitos idênticos ou semelhantes no seu ordenamento jurídico» ( 13 ).

35.

É, no entanto, importante sublinhar os limites destas observações no Acórdão de 26 de abril de 2018, Donnellan (C‑34/17, EU:C:2018:282). Resulta claramente dos termos desse acórdão que o Tribunal de Justiça se referia nesse caso às obrigações processuais do Estado requerido. Considero, por conseguinte, que embora o artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 exija que os créditos de um Estado‑Membro requerente sejam considerados, do ponto de vista processual, similares ( 14 ) aos do Estado‑Membro requerido, existem, no entanto, limites ao âmbito desta disposição específica. Concretamente, esse crédito não adquire, de um ponto de vista substantivo, a qualidade de um crédito que possa ser reclamado pelo Estado‑Membro requerido.

36.

É o que resulta claramente da redação e do contexto do próprio artigo 13.o, n.o 1. Assim, por exemplo, o artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 dispõe que «[o] Estado‑Membro requerido não é obrigado a conceder aos créditos de outros Estados‑Membros as preferências concedidas a créditos similares nele constituídos, salvo acordo em contrário entre os Estados‑Membros em causa ou disposição em contrário na legislação do Estado‑Membro requerido» ( 15 ). Tal é suficiente, por si só, para demonstrar que os créditos do Estado‑Membro requerido são tratados de forma bastante distinta e autónoma dos créditos do Estado‑Membro requerente. À sua maneira, daqui resultam igualmente os limites da ficção prevista no artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24, uma vez que, efetivamente, se o crédito do Estado requerente devesse para esse efeito ser tratado de forma materialmente idêntica, por parte do Estado requerido, o terceiro parágrafo desta diretiva seria desprovido de objeto e inútil.

37.

Por conseguinte, na minha opinião, o efeito da Diretiva 2010/24 é que o Estado‑Membro requerido atua como agente em nome do Estado‑Membro requerente para efeitos de execução do crédito deste último ( 16 ). No entanto, na ausência de qualquer cessão específica do crédito ao Estado‑Membro requerido — e não há qualquer indicação de que tal tenha ocorrido no presente caso — o crédito continua a ser do Estado‑Membro requerente ( 17 ).

38.

Com efeito, importa recordar que em conformidade com o artigo 1.o da Diretiva 2010/24, o papel do Estado‑Membro requerido consiste em assistir o Estado‑Membro requerente na cobrança do crédito deste último. Por conseguinte, concordo com a afirmação do Governo espanhol ( 18 ) de que o crédito do Estado‑Membro requerente não pode ser equiparado ao do Estado‑Membro requerido e que o crédito do Estado‑Membro requerente não adquire a natureza de crédito do Estado‑Membro requerido ( 19 ).

39.

A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou recentemente, no n.o 40 do Acórdão de 14 de março de 2019, Metirato (C‑695/17, EU:C:2019:209) que «na falta de determinação, pela Diretiva 2010/24, das modalidades de conservação dos montantes cobrados pelo Estado‑Membro requerido antes da sua transferência para o Estado‑Membro requerente, esta é da competência dos Estados‑Membros, desde que a obrigação de transferir os montantes cobrados e os juros aplicáveis seja respeitada» ( 20 ).

40.

À luz do que precede, considero que o artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24, que prevê que «todos os créditos que sejam objeto de um pedido de cobrança devem ser tratados como créditos do Estado‑Membro requerido» deve ser interpretado simplesmente no sentido de que este último Estado‑Membro é obrigado a fazer uso dos poderes e procedimentos previstos nas disposições legislativas, regulamentares ou administrativas aplicáveis aos créditos relativos a impostos ou direitos idênticos ou similares no seu ordenamento jurídico. Resulta claramente da leitura conjugada do primeiro e do terceiro parágrafos do artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24 que o crédito do Estado‑Membro requerente não adquire, todavia, para este efeito, a natureza de crédito substantivo do Estado‑Membro requerido.

C.   Segunda questão

41.

Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pede, em substância, ao Tribunal de Justiça que verifique se o termo «privilégio» que figura no artigo 10.o da Diretiva 76/308 e no artigo 10.o da Diretiva 2008/55 deve ser interpretado no sentido de que se refere a um direito preferencial ligado a um crédito que lhe confere um direito de prioridade sobre os outros créditos em caso de concurso, ou como qualquer mecanismo que tenha por efeito obter, em caso de concurso, um pagamento preferencial do crédito.

42.

Como indiquei no n.o 30 destas conclusões, considero que é a Diretiva 2010/24, e não a Diretiva 76/308 ou a Diretiva 2008/55, que se aplica ao processo pendente no órgão jurisdicional de reenvio. Por conseguinte, o órgão jurisdicional de reenvio pede uma interpretação do artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24. A este respeito, interroga‑se se o termo «privilégio» deve ser entendido como direito preferencial ligado ao crédito que lhe confere um direito de prioridade sobre os outros créditos em caso de concurso, ou como qualquer mecanismo que tenha por efeito obter, em caso de concurso, um pagamento preferencial do crédito. Apesar da linguagem formal desta questão, o órgão jurisdicional de reenvio não indicou, a meu ver, em que medida, no seu ordenamento jurídico, existe uma diferença prática entre estas duas alternativas.

43.

Irei, portanto, examinar esta questão em abstrato, centrando‑me na linguagem utilizada pela própria diretiva.

44.

Note‑se que a versão em língua inglesa do artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 não faz referência ao termo «privilégio» ( 21 ). Pelo contrário, dispõe que o Estado‑Membro requerido não é obrigado a conceder aos créditos de outros Estados‑Membros as preferências ( 22 ) concedidas a créditos similares nele constituídos, salvo acordo em contrário entre os Estados‑Membros em causa ou disposição na legislação do Estado‑Membro requerido ( 23 ).

45.

Resulta de jurisprudência constante que a necessidade de uma aplicação uniforme do direito da União e o princípio da igualdade exigem que os termos de uma disposição do direito da União que não contenha uma remissão expressa para o direito dos Estados‑Membros devem normalmente ser objeto de uma interpretação autónoma e uniforme, que deve ser procurada tendo em conta o contexto da disposição e o objetivo prosseguido pela regulamentação em causa ( 24 ). Além disso, não existindo uma definição do termo «preferências» (e/ou «privilèges» na versão em língua francesa ( 25 )) na Diretiva 2010/24, o significado e o alcance desse termo deve determinar‑se tendo em conta o contexto geral ( 26 ) em que ele é utilizado e o seu sentido habitual na linguagem comum ( 27 ).

46.

O termo «preferências», que aparece apenas no considerando 14 e no terceiro parágrafo do artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24, não é definido pela lei e não é feita referência ao direito dos Estados‑Membros para efeitos da definição deste termo. O considerando 14 da Diretiva 2010/24 dispõe, em substância, que o exercício pelo Estado‑Membro requerido das competências que lhe são conferidas pela sua legislação nacional em matéria de créditos relativos a impostos ou direitos iguais ou similares «não deverá, regra geral, aplicar‑se às preferências atribuídas a créditos constituídos no Estado‑Membro requerido. Todavia, deverá ser prevista a possibilidade de tornar as preferências extensivas a créditos de outros Estados‑Membros com base num acordo entre os Estados‑Membros em causa» ( 28 ).

47.

O artigo 13.o da Diretiva 2010/24 intitula‑se «Execução do pedido de cobrança». O primeiro parágrafo do artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24 prevê, em substância, que a autoridade requerida deve fazer uso das competências e dos procedimentos previstos pelas disposições legislativas, regulamentares ou administrativas desse Estado‑Membro para a cobrança dos créditos objeto de um pedido de cobrança. Para o efeito, esses créditos devem ser tratados como créditos do Estado‑Membro requerido, salvo disposição em contrário da referida diretiva.

48.

Na minha opinião, o artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 não está redigido sob a forma de exceção ou derrogação ao primeiro parágrafo do mesmo: refere‑se antes a algo distinto das competências e procedimentos aplicáveis à execução de um pedido de cobrança. À luz do contexto geral e da redação dessa disposição, considero que, em determinadas circunstâncias, a mesma estende direitos ou benefícios adicionais concedidos em relação à execução dos créditos do Estado‑Membro requerido aos créditos do Estado‑Membro requerente, para além das competências e procedimentos referidos no artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24. Como já referi, tudo isto reforça a conclusão relativa à primeira questão de que o pedido do Estado requerente não deve ser tratado de um ponto de vista substantivo como se fosse um pedido apresentado pelo Estado requerido porque, repito, tudo isto seria desnecessário se o pedido gozasse dessa natureza substantiva.

49.

Dada a forma ampla e sem qualificação como o termo «preferências» surge no artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24, considero que esse termo se refere a qualquer mecanismo que, em caso de concurso de créditos, resulte no pagamento preferencial do crédito do Estado‑Membro requerido. Tal incluiria — mas não se limitaria — aos direitos preferenciais ou de prioridade concedidos aos créditos do Estado‑Membro requerido relativamente à ordem ou graduação do seu pagamento, tendo em conta o regime de insolvência desse Estado‑Membro ( 29 ). Por conseguinte, o Estado‑Membro requerido pode — mas não é obrigado a — conceder esses direitos preferenciais ou de prioridade em relação aos créditos dos Estados‑Membros requerentes da forma prevista no artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 ( 30 ).

D.   Terceira questão

50.

Com esta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se a possibilidade de compensação de créditos em caso de concurso de créditos nas condições previstas por uma disposição de direito nacional, como o artigo 334.o da Lei‑programa de 27 de dezembro de 2004 ou o artigo 194.o da Lei‑programa de 22 de dezembro de 2008, deve ser considerada uma preferência na aceção do artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24.

51.

Tal como a Comissão referiu nas suas observações escritas, a competência geral de compensação de créditos recíprocos faz parte das competências e procedimentos previstos na legislação nacional para a cobrança de créditos. Esta competência de compensação aplica‑se, assim, não só em relação aos créditos do Estado‑Membro requerido (neste caso, o Estado belga), mas também em relação aos créditos de outros credores em que existam créditos recíprocos ( 31 ). Considero, por conseguinte, que a competência para compensar créditos recíprocos está, em princípio, abrangida pelo artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 ( 32 ). Assim, por exemplo, se a Pantochim e o Estado alemão tiverem créditos recíprocos, estes poderão, em princípio — desde que esta e todas as outras condições exigidas pelo direito belga sejam satisfeitas —, ser compensados entre si.

52.

O pedido de decisão prejudicial não esclarece talvez suficientemente se o artigo 334.o da Lei‑programa de 27 de dezembro de 2004 ou o artigo 194.o da Lei‑programa de 22 de dezembro de 2008 derrogam as regras gerais de compensação previstas no Código Civil belga. Sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional nacional, estas regras gerais parecem exigir a existência de créditos recíprocos ou mútuos entre as mesmas pessoas agindo na mesma qualidade. Por conseguinte, não é claro se os créditos do Estado‑Membro requerido (neste caso, o Estado belga) abrangidos pelo âmbito de aplicação do artigo 2.o da Diretiva 2010/24 são tratados de forma diferente dos créditos de outros credores no que diz respeito à aplicação das regras da compensação.

53.

Com efeito, no pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio invocou extratos do Acórdão da Cour d'appel de Mons (Tribunal de Recurso de Mons), de 27 de junho de 2016, que consideravam que nem a Lei‑programa de 27 de dezembro de 2004 nem a Lei‑programa de 22 de dezembro de 2008 derrogam as regras gerais de compensação previstas no Código Civil belga que, como já referi, exigem créditos recíprocos entre as mesmas pessoas. Além disso, segundo a Cour d'appel de Mons (Tribunal de Recurso de Mons), ainda que o crédito do Estado alemão pudesse ser recuperado como uma dívida do Estado belga, continua a ser uma dívida do Estado alemão e, na ausência de dívidas recíprocas, não pode ser feita uma compensação.

54.

No seu pedido de decisão prejudicial, o órgão jurisdicional de reenvio invocou igualmente determinados argumentos do Estado belga no processo de recurso que lhe foi submetido. A este respeito, o órgão jurisdicional de reenvio declarou que o Estado belga alegou que a Lei‑programa de 27 de dezembro de 2004 e a Lei‑programa de 22 de dezembro de 2008 preveem um regime sui generis de compensação que não exige a reciprocidade entre as dívidas e os créditos em matéria fiscal. O Estado belga alegou que, assim, é autorizada uma compensação relativamente a esses créditos, sujeita a um pedido de cobrança nos termos da Diretiva 2010/24.

55.

Nas suas observações escritas apresentadas ao Tribunal de Justiça, o Governo belga alega que a terceira questão é inadmissível, uma vez que o órgão jurisdicional de reenvio não explicou as regras de compensação previstas no Código Civil belga e não explicou o mecanismo de compensação previsto na Lei‑programa de 27 de dezembro de 2004 e na Lei‑programa de 22 de dezembro de 2008.

56.

Não sem alguma hesitação, vejo‑me forçado a concordar com esta argumentação. Na falta de uma verdadeira explicação no pedido de decisão prejudicial ou mesmo no processo no Tribunal de Justiça sobre o funcionamento do alegado mecanismo sui generis e, sendo esse o caso, sobre se e em que medida difere das regras gerais de compensação previstas no Código Civil belga, não estou em condições de analisar de forma adequada se esse mecanismo é abrangido pelo conceito de «competências e […] procedimentos» previsto no artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 ou se, pelo contrário, constitui uma preferência na aceção do terceiro parágrafo desse mesmo artigo.

57.

O Governo belga alega, a título subsidiário em relação à sua argumentação de inadmissibilidade, que o mecanismo sui generis apenas simplifica o processo de recuperação e não deve, portanto, ser considerado um privilégio (preferência).

58.

Se o Tribunal de Justiça considerar que a terceira questão é admissível e se, como alega o Governo belga, o mecanismo em causa se limitar a simplificar o procedimento de cobrança e não conceder direitos preferenciais ou de prioridade relativamente à ordem ou graduação do pagamento dos seus créditos ou preferir de algum outro modo o Estado belga enquanto credor, então ( 33 ), na minha opinião, esse mecanismo é abrangido pelas competências e procedimentos referidos no artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24.

59.

Tudo isto equivale a dizer que um Estado‑Membro teria a possibilidade de prever nas suas regras nacionais de cobrança de dívidas uma competência geral de compensação para todas as dívidas e de prescindir do requisito de reciprocidade, independentemente da identidade do credor. Se tal fosse efetivamente o efeito da Lei‑programa de 27 de dezembro de 2004 e da Lei‑programa de 22 de dezembro de 2008 — uma questão que compete inteiramente aos órgãos jurisdicionais nacionais apreciar e determinar — então esta competência reforçada de compensação deveria ser considerada como fazendo parte das «competências e […] procedimentos» gerais previstas pelo direito nacional em matéria de insolvência, na forma prevista no artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24.

60.

Por outro lado, é de notar que a Comissão alega que o mecanismo em causa parece conceder um direito preferencial de pagamento ao Estado belga que derroga o regime comum de compensação e, como tal, deve ser considerado um privilégio (preferência) para efeitos do artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/34 ( 34 ). Embora seja de lamentar que a questão deva ser tratada com base numa hipótese pura, se o efeito da Lei‑programa de 27 de dezembro de 2004 e da Lei‑programa de 22 de dezembro de 2008 fosse conferir ao Estado belga um direito de compensação preferencial ou reforçado a favor do Estado belga, de que outros credores não beneficiariam ao dispensar o requisito da reciprocidade da dívida, tal constituiria, em minha opinião, uma «preferência» na aceção do artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24.

61.

É certo que, mesmo que fosse esse o caso, isso em si em nada alteraria o facto de o artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 prever igualmente que os Estados‑Membros requeridos não devem conceder esses direitos preferenciais a créditos similares do Estado‑Membro requerente a não ser que tal tenha sido especificamente acordado pelos Estados‑Membros em causa ou que tais direitos preferenciais sobre os créditos do Estado‑Membro requerente estejam previstos na legislação do Estado‑Membro requerido.

62.

Sem prejuízo de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, resulta do processo no Tribunal de Justiça e, em especial, do artigo 15.o da Lei de 20 de julho de 1979 ( 35 ), que, segundo o ordenamento jurídico belga, os créditos de um Estado‑Membro requerente não beneficiam efetivamente de tal preferência ou privilégio ( 36 ).

63.

Além disso, na ausência de qualquer formulação nesse sentido, o terceiro parágrafo, à semelhança do primeiro parágrafo, do artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24 não altera a natureza nem implica a transferência do crédito do Estado‑Membro requerente para o Estado‑Membro requerido. Por conseguinte, tais preferências não podem levar a que o crédito do Estado‑Membro requerente adquira o estatuto de crédito do Estado‑Membro requerido. Considero igualmente, por razões de clareza, que, à luz do objetivo da Diretiva 2010/24, que consiste em assegurar, designadamente, que o Estado‑Membro requerido auxilie o Estado‑Membro requerente na cobrança dos seus créditos, a concessão de preferências ao abrigo do artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 deve operar em benefício e não em detrimento do Estado‑Membro requerente.

VI. Conclusão

64.

Atendendo às considerações que antecedem, proponho que as questões submetidas pela Cour de cassation (Tribunal de Cassação, Bélgica) sejam respondidas da seguinte forma:

O artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24/UE do Conselho, de 16 de março de 2010, relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a impostos, direitos e outras medidas que prevê que «todos os créditos que sejam objeto de um pedido de cobrança devem ser tratados como créditos do Estado‑Membro requerido» deve ser interpretado no sentido de que este último Estado‑Membro é obrigado a utilizar as competências e os procedimentos previstos pelas disposições legislativas, regulamentares ou administrativas aplicáveis aos créditos relativos a impostos ou direitos idênticos ou similares no seu ordenamento jurídico. O artigo 13.o, n.o 1, primeiro e terceiro parágrafos, da Diretiva 2010/24 deve ser interpretado no sentido de que o crédito do Estado‑Membro requerente não adquire, todavia, a qualidade de crédito em termos substantivos do Estado‑Membro requerido.

O termo «preferências» que figura no artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo da Diretiva 2010/24, refere‑se a qualquer mecanismo que, em caso de concurso de créditos, resulte no pagamento preferencial do crédito do Estado‑Membro requerido. Tal inclui, entre outros, os direitos preferenciais ou de prioridade concedidos aos créditos do Estado‑Membro requerido relativamente à ordem ou graduação do seu pagamento, tendo em conta o regime de insolvência desse Estado‑Membro. O Estado‑Membro requerido pode — mas não é obrigado a — conceder esses direitos preferenciais ou prioritários em relação aos créditos dos Estados‑Membros requerentes.

A competência geral para efetuar compensação de créditos recíprocos ao abrigo do direito nacional faz parte das competências e procedimentos previstos pelo direito nacional para a cobrança não só dos créditos do Estado‑Membro requerido, mas também dos créditos de outros credores, quando existam créditos recíprocos e sejam, em princípio, abrangidos pelo artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24.

Um mecanismo que se limita a simplificar o procedimento de cobrança e não concede direitos preferenciais ou de prioridade relativamente à ordem ou à graduação do pagamento dos créditos do Estado‑Membro requerido é abrangido pelas competências e procedimentos referidos no artigo 13.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 2010/24.

O artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 não altera a natureza nem implica a transferência do crédito do Estado‑Membro requerente para o Estado‑Membro requerido. À luz do objetivo da Diretiva 2010/24, que consiste, designadamente, em garantir que o Estado‑Membro requerido assista o Estado‑Membro requerente na cobrança dos créditos deste, as preferências previstas no artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 devem ser concedidas em benefício e não em detrimento do Estado‑Membro requerente.


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) JO 1976, L 73, p. 18.

( 3 ) JO 2008, L 150, p. 28.

( 4 ) JO 2010, L 84, p. 1.

( 5 ) Na sua versão original.

( 6 ) O Tribunal de Justiça já declarou, no n.o 72 do Acórdão de 29 de abril de 2004, Comissão/Conselho (C‑338/01, EU:C:2004:253) que «[q]uanto ao artigo 10.o da Diretiva 76/308, que dispunha que os créditos a cobrar não gozavam de qualquer privilégio no Estado‑Membro onde a autoridade requerida tinha a sua sede, dispõe, na sua versão resultante da [Diretiva 2001/44/CE do Conselho,de 15 de junho de 2001, que altera a Diretiva 76/308 (JO 2001, L 175, p. 17)] que esses créditos não beneficiam necessariamente dos privilégios de créditos análogos gerados no Estado‑Membro em que a autoridade requerida tem a sua sede. Esta modificação constitui uma alteração substancial no tratamento de créditos visados pela Diretiva 76/308, na medida em que equivale a uma inversão do princípio até então aplicável, a saber, que esses créditos não beneficiavam de qualquer privilégio no Estado requerente». O sublinhado é meu.

( 7 ) Acórdão de 1 de julho de 2004, Tsapalos e Diamantakis (C‑361/02 e C‑362/02, EU:C:2004:401, n.o 19). No n.o 42 das suas observações, a Comissão afirma que, dado que o pedido de decisão prejudicial não indica a data do pedido de cobrança apresentado pelo Estado alemão, não é possível determinar qual das três diretivas é aplicável no processo principal. A Pantochim e os Governos belga e espanhol fazem referência tanto à Diretiva 76/308 como à Diretiva 2008/55.

( 8 ) A Diretiva 76/308 foi revogada pelo artigo 25.o da Diretiva 2008/55, com efeitos a partir de 30 de junho de 2008. V. artigo 26.o da Diretiva 2008/55.

( 9 ) Acórdão de 18 de outubro de 2012, X (C‑498/10, EU:C:2012:635, n.o 44 e jurisprudência referida).

( 10 ) Segundo o considerando 1 da Diretiva 2010/24, «[a] assistência mútua entre Estados‑Membros em matéria de cobrança recíproca dos respetivos créditos e dos da União respeitantes a determinados impostos e outras medidas contribui para o bom funcionamento do mercado interno. Garante a neutralidade fiscal e tem permitido que os Estados‑Membros procedam à abolição de medidas de proteção discriminatórias destinadas a evitar a fraude e as perdas orçamentais». V., também, Acórdão de 26 de abril de 2018, Donnellan (C‑34/17, EU:C:2018:282, n.o 42).

( 11 ) V., nesse sentido, Acórdão de 14 de março de 2019, Metirato (C‑695/17, EU:C:2019:209, n.o 29). V., também, considerando 4 da Diretiva 2010/24, que prevê que «[p]ara melhor salvaguardar os interesses financeiros dos Estados‑Membros e a neutralidade do mercado interno, é necessário que o âmbito da assistência mútua à cobrança seja extensivo a créditos respeitantes a impostos e direitos ainda não abrangidos pela assistência mútua à cobrança, enquanto que, para fazer face ao aumento dos pedidos de assistência e obter melhores resultados, é necessário conferir maior eficácia à assistência à cobrança e facilitar a sua utilização prática. Para atingir esses objetivos, são necessárias adaptações importantes, pelo que uma simples modificação da atual Diretiva 2008/55/CE não seria suficiente. Essa diretiva deverá por conseguinte ser revogada e substituída por um novo instrumento jurídico, assente nos resultados da Diretiva 2008/55/CE mas estabelecendo sempre que necessário regras mais claras e mais precisas».

( 12 ) Note‑se que a Diretiva 79/1071/CEE do Conselho, de 6 de dezembro de 1979, que altera a Diretiva 76/308 (JO 1979, L 331, p. 10) alargou o âmbito de aplicação da Diretiva 76/308, estendendo‑o a créditos relativos a IVA.

( 13 ) V., também, por analogia, relativamente à Diretiva 76/308, Acórdão de 14 de janeiro de 2010, Kyrian (C‑233/08, EU:C:2010:11, n.o 43).

( 14 ) A possibilidade de o Estado‑Membro requerido recusar prestar assistência ao Estado‑Membro requerente é muito limitada. V. Acórdão de 26 de abril de 2018, Donnellan (C‑34/17, EU:C:2018:282, n.os 49 a 51).

( 15 ) O sublinhado é meu.

( 16 ) O Estado‑Membro requerido deve, em princípio, solicitar o pagamento dos seus custos no âmbito de um pedido de cobrança ao devedor em causa e não ao Estado‑Membro requerente. Nos termos do artigo 20.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24, «[…] a autoridade requerida procura recuperar junto da pessoa em causa e conservar as despesas relacionadas com a cobrança em que tenha incorrido, nos termos das disposições legislativas e regulamentares do Estado‑Membro requerido».

( 17 ) No seu Acórdão de 14 de março de 2019, Metirato (C‑695/17, EU:C:2019:209, n.os 33 e 34), o Tribunal de Justiça observou que o artigo 14.o da Diretiva 2010/24 prevê uma repartição das competências entre as instâncias do Estado‑Membro requerente e as do Estado‑Membro requerido. Assim, os litígios relativos ao crédito devem ser submetidos aos tribunais do Estado‑Membro requerente, enquanto as medidas de execução tomadas no Estado‑Membro requerido devem ser submetidas aos tribunais deste último. Segundo o Tribunal de Justiça, esta repartição de competências é o corolário do facto de o crédito e os títulos executivo que permitem a execução da sua cobrança serem constituídos com base no direito em vigor no Estado‑Membro requerente, ao passo que as medidas de execução são adotadas no Estado‑Membro requerido, nos termos das disposições de direito aplicáveis neste último. Esta repartição de competências é, a meu ver, indicativa do facto de a Diretiva 2010/24 conter regras processuais e não regras substantivas que regem, designadamente, a natureza ou a titularidade de um crédito.

( 18 ) V. n.o 27 das suas observações escritas.

( 19 ) A Pantochim considera que o Estado‑Membro requerido age em nome do Estado‑Membro requerente. V. p. 8 das suas observações escritas. O Governo belga afirma, nos n.os 18 e 21 das suas observações escritas, que o crédito do Estado‑Membro requerente adquire a natureza de crédito do Estado‑Membro requerido e que o crédito do Estado‑Membro requerente é plenamente equiparável ao do Estado‑Membro requerido.

( 20 ) O sublinhado é meu. V. artigo 13.o, n.o 5, da Diretiva 2010/24. Gostaria de salientar que, embora o Tribunal de Justiça no seu Acórdão de 14 de março de 2019, Metirato (C‑695/17, EU:C:2019:209) tenha seguido, em grande medida, as conclusões do advogado‑geral M. Bobek no processo Metirato (EU:C:2018:944), não utilizou a expressão «assimilação integral dos créditos» utilizada nas conclusões do advogado‑geral para referir o princípio consagrado pelo artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24 que exige que os créditos objeto de um pedido de cobrança sejam tratados como se fossem créditos do Estado‑Membro requerido.

( 21 ) A versão em língua francesa do artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 refere‑se tanto a «préférences» como a «privilèges». O terceiro parágrafo do artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24 das versões linguísticas espanhola, checa, dinamarquesa, alemã, estónia, italiana, letã, lituana, húngara, maltesa, neerlandesa, polaca, portuguesa, romena, eslovaca, eslovena e sueca utilizam o mesmo termo ou um termo quase equivalente em todo o texto. Esse termo corresponde a «preferências», «privilégios», «prioridade (direito)» ou «prerrogativas».

( 22 ) Considero que o termo «preferências» no terceiro parágrafo do artigo 13.o, n.o 1, da Diretiva 2010/24 é, de facto, sinónimo do termo «privilégio» que figura no artigo 10.o da Diretiva 76/308 e no artigo 10.o da Diretiva 2008/55. Deve sublinhar‑se, no entanto, que o âmbito de aplicação dos próprios artigos é bastante diferente e que o seu conteúdo evoluiu ao longo do tempo. V. artigo 1.o, n.o 9, da Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera a Diretiva 76/308/CEE relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos resultantes de operações que fazem parte do sistema de financiamento do Fundo Europeu de Orientação e Garantia Agrícola (FEOGA), bem como de direitos niveladores agrícolas e de direitos aduaneiros, e créditos relativos ao imposto sobre o valor acrescentado e a certos impostos especiais de consumo (98/C 269/06), COM(1998) 364 final, apresentada pela Comissão, que se refere a «preferências» em vez de «privilégios». O texto que acabou por ser adotado, a saber, a Diretiva 2001/44, refere‑se a «privilégios».

( 23 ) A Pantochim (p. 10 das suas observações escritas), o Governo espanhol (n.o 31 das suas observações escritas) e a Cour d’appel de Mons (Tribunal de Recurso de Mons) consideram que «privilégio» se refere a uma vantagem ou prerrogativa. O Governo belga alega que o termo «privilégio» deve ser entendido como o direito preferencial ligado a um crédito que confere um direito de prioridade sobre outros créditos em caso de concurso (n.o 40 das suas observações). A Comissão considera que deve ser entendido como um direito de pagamento prioritário ligado a um crédito (n.o 32 das suas observações escritas).

( 24 ) Acórdão de 16 de novembro de 2017, Kozuba Premium Selection (C‑308/16, EU:C:2017:869, n.o 38 e jurisprudência referida).

( 25 ) Realço novamente que considero que estes termos são sinónimos.

( 26 ) A proposta da Comissão que resultou na adoção da Diretiva 2010/24 não se refere a preferências mas a privilégios. V. considerando 13 e artigo 22.o, n.o 2, da Proposta de Diretiva do Conselho relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a impostos, taxas, direitos e outras medidas (COM/2009/0028 final) (a seguir «Proposta de Diretiva 2010/24»). Essa disposição da proposta prevê com efeito, que ao responder a um pedido de assistência relativo a um crédito abrangido pelo âmbito de aplicação da diretiva, a autoridade requerida deve fazer uso não só das competências, mas também dos privilégios concedidos aos créditos constituídos no Estado‑Membro requerido. A história legislativa da Diretiva 2010/24 não esclarece por que razão o termo «privilégio» foi alterado para «preferência» nas diferentes versões linguísticas e qual foi o objetivo, caso tenha existido, dessa alteração.

( 27 ) Acórdão de 4 de maio de 2006, Massachusetts Institute of Technology (C‑431/04, EU:C:2006:291, n.o 17 e jurisprudência referida).

( 28 ) V., em sentido contrário, artigo 22.o, n.o 2, da Proposta de Diretiva 2010/24.

( 29 ) A este respeito, gostaria de salientar que a aplicação da Diretiva 2010/24 não se limita aos casos de insolvência do devedor do Estado‑Membro requerente. O âmbito de aplicação da Diretiva 2010/24 abrange todos os créditos previstos no seu artigo 2.o, sob reserva, nomeadamente, de uma série de limites às obrigações da autoridade requerida previstas no artigo 18.o da referida diretiva.

( 30 ) O artigo 13.o, n.o 1, terceiro parágrafo, da Diretiva 2010/24 prevê igualmente que um Estado‑Membro que conceda preferências aos créditos de outro Estado‑Membro não pode recusar conceder as mesmas preferências a créditos da mesma natureza ou de natureza similar dos demais Estados‑Membros, nas mesmas condições. Assim, quando o Estado‑Membro requerido concede preferências aos créditos de outro Estado‑Membro, estas devem ser concedidas numa base de igualdade com os créditos de todos os outros Estados‑Membros. Dado que essas preferências podem funcionar em desvantagem de outros credores, considero que essas preferências devem ser conferidas por lei de forma transparente, a fim de que os outros credores sejam notificados das mesmas.

( 31 ) Cabe, obviamente, ao órgão jurisdicional de reenvio determinar as regras de direito belga em matéria de compensação.

( 32 ) V., nesse sentido, n.o 50 das observações escritas da Comissão. Além disso, embora não seja aplicável ratione temporis à liquidação da Pantochim, o artigo 6.o do Regulamento (CE) n.o 1346/2000 do Conselho, de 29 de maio de 2000, relativo aos processos de insolvência (JO 2000, L 160, p. 1), tem a epígrafe «Compensação», e o seu n.o 1 prevê que «[a] abertura do processo de insolvência não afeta o direito de um credor a invocar a compensação do seu crédito com o crédito do devedor, desde que essa compensação seja permitida pela lei aplicável ao crédito do devedor insolvente». O artigo 43.o desse regulamento intitulado «Aplicação temporal» prevê que «[o] disposto no presente regulamento é aplicável apenas aos processos de insolvência abertos posteriormente à sua entrada em vigor. Os atos realizados pelo devedor antes da entrada em vigor do presente regulamento continuam a ser regidos pela legislação que lhes era aplicável no momento em que foram praticados». O Regulamento n.o 1346/2000 entrou em vigor em 31 de maio de 2002. V. artigo 47.o desse regulamento. O Regulamento n.o 1346/2000 foi revogado pelo Regulamento (UE) 2015/848 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de maio de 2015, relativo aos processos de insolvência ( JO 2015, L 141, p. 19). V., igualmente, o artigo 9.o, n.o 1, do Regulamento 2015/848 no que respeita à compensação, que é muito semelhante ao artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1346/2000. Nos termos do artigo 84.o, n.o 1, do Regulamento 2015/848, o disposto nesse«regulamento é aplicável apenas aos processos de insolvência abertos após 26 de junho de 2017. Os atos praticados pelo devedor antes dessa data continuam a ser regidos pela lei que lhes era aplicável no momento em que foram praticados».

( 33 ) Uma situação que deve ser verificada pelo órgão jurisdicional de reenvio.

( 34 ) A Comissão considera que compete ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar se o mecanismo de compensação em causa constitui uma preferência. V. n.o 47 das observações escritas da Comissão.

( 35 ) V., igualmente, artig 20.o, n.o 1, da Loi transposant la Directive 2010/24/UE du Conseil du 16 mars 2010 concernant l’assistance mutuelle en matière de recouvrement des créances relatives aux taxes, impôts, droits et autres mesures du 9 janvier 2012 (Lei que transpõe a Diretiva 2010/24/UE do Conselho, de 16 de março de 2010, relativa à assistência mútua em matéria de cobrança de créditos respeitantes a impostos, direitos e outras medidas) que prevê igualmente, sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, que os créditos estrangeiros para os quais é solicitada assistência não gozam de qualquer privilégio.

( 36 ) O Governo belga declarou igualmente no n.o 51 das suas observações escritas ao Tribunal de Justiça que as pretensões de um Estado‑Membro requerente não beneficiam de qualquer «privilégio».

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