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Document 62016CJ0405

Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 28 de março de 2019.
República Federal da Alemanha contra Comissão Europeia.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Auxílios concedidos por certas disposições da lei alemã conforme alterada relativa às fontes de energia renováveis (EEG de 2012) — Auxílio para apoiar os produtores de eletricidade EEG e sobretaxa EEG reduzida para os grandes consumidores de energia — Decisão que declara os auxílios parcialmente incompatíveis com o mercado interno — Conceito de “auxílio de Estado” — Vantagem — Recursos estatais — Controlo público dos recursos — Medida equiparável a um imposto sobre o consumo de eletricidade.
Processo C-405/16 P.

Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2019:268

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

28 de março de 2019 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Auxílios de Estado — Auxílios concedidos por certas disposições da lei alemã conforme alterada relativa às fontes de energia renováveis (EEG de 2012) — Auxílio para apoiar os produtores de eletricidade EEG e sobretaxa EEG reduzida para os grandes consumidores de energia — Decisão que declara os auxílios parcialmente incompatíveis com o mercado interno — Conceito de “auxílio de Estado” — Vantagem — Recursos estatais — Controlo público dos recursos — Medida equiparável a um imposto sobre o consumo de eletricidade»

No processo C‑405/16 P,

que tem por objeto um recurso de uma decisão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 19 de julho de 2016,

República Federal da Alemanha, representada por T. Henze e R. Kanitz, na qualidade de agentes, assistidos por T. Lübbig, Rechtsanwalt,

recorrente,

sendo a outra parte no processo:

Comissão Europeia, representada por K. Herrmann e T. Maxian Rusche, na qualidade de agentes,

recorrida em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: M. Vilaras (relator), presidente da Quarta Secção, exercendo funções de presidente da Terceira Secção, J. Malenovský, L. Bay Larsen, M. Safjan, D. Šváby, juízes,

advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Com o presente recurso, a República Federal da Alemanha pede a anulação do Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 10 de maio de 2016, Alemanha/Comissão (T‑47/15, EU:T:2016:281 a seguir «acórdão recorrido»), que negou provimento ao seu recurso baseado no artigo 263.o TFUE, destinado à anulação da Decisão (UE) 2015/1585 da Comissão, de 25 de novembro de 2014, relativa ao regime de auxílio SA.33995 (2013/C) (ex 2013/NN) [concedido pela Alemanha para apoiar a eletricidade produzida a partir de fontes renováveis e os grandes consumidores de energia] (JO 2015, L 250, p. 122, a seguir «decisão controvertida»).

Antecedentes do litígio e decisão controvertida

2

Em 28 de julho de 2011, o legislador alemão adotou a Gesetz zur Neuregelung des Rechtsrahmens für die Förderung der Stromerzeugung aus erneuerbaren Energien (Lei relativa à nova regulamentação do quadro jurídico da promoção da eletricidade produzida a partir de energias renováveis) (BGBl. 2011 I, p. 1634, a seguir «Lei EEG de 2012»). Esta lei, que esteve em vigor de 1 de janeiro de 2012 a 31 de julho de 2014, tinha por objetivo aumentar, no fornecimento de eletricidade, a quota de eletricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis e de gás de extração (a seguir «eletricidade EEG»).

3

As principais características do regime estabelecido pela Lei EGG de 2012 são expostas nos n.os 4 a 12 do acórdão recorrido do seguinte modo:

«4 Em primeiro lugar, os operadores de rede de todos os níveis de tensão (a seguir “[O]R”) que assegurem o fornecimento geral de eletricidade estão obrigados, primeiro, a ligar às suas redes as instalações produtoras de eletricidade EEG na sua área de atividade (§§ 5 a 7 da Lei EEG de 2012), segundo, a injetar essa eletricidade na sua rede, a transportá‑la bem como a distribuí‑la com prioridade (§§ 8 a 12 da Lei EEG de 2012) e, terceiro, a pagar aos operadores dessas instalações uma remuneração calculada em função de tarifas fixadas pela lei, tendo em conta a natureza da eletricidade em causa e a potência autorizada ou instalada da instalação em causa (§§ 16 a 33 da Lei EEG de 2012). Alternativamente, os operadores de instalações produtoras de eletricidade EEG têm o direito de, por um lado, comercializar toda ou parte dessa eletricidade diretamente junto de terceiros e, por outro, exigir que o [O]R a que tenha sido ligada uma instalação na inexistência dessa comercialização direta lhes pague um prémio de mercado com base no montante da remuneração que seria devida em caso de ligação (§§ 33 a 33 da Lei EEG de 2012). Na prática, é dado assente que estas obrigações sobre os operadores de rede de distribuição local de baixa ou média tensão (a seguir «ORD»).

5 Em segundo lugar, os ORD são obrigados a transferir a eletricidade EEG para os operadores de rede de transporte inter‑regional de alta e de muito alta tensão situados a montante (a seguir “ORT”) (§ 34 da Lei EEG de 2012). Em contrapartida desta obrigação, os ORT têm de pagar aos ORD o equivalente das remunerações e dos prémios de mercado pagos por estes últimos aos operadores de instalações (§ 35 da Lei EEG de 2012).

6 Em terceiro lugar, a Lei EEG de 2012 prevê um mecanismo, denominado “compensação à escala federal”, das quantidades de eletricidade EEG que cada ORT injeta na sua rede, por um lado, e dos montantes pagos em contrapartida aos ORD, por outro (§ 36 da Lei EEG de 2012). Na prática, cada ORT que tenha injetado e pago uma quantidade de eletricidade EEG superior à eletricidade fornecida pelos fornecedores de eletricidade aos clientes finais situados na sua zona pode invocar, relativamente aos outros ORT, um direito de compensação correspondente a essa diferença. Desde os anos 2009/2010, a referida compensação já não é feita de uma forma real (troca de fluxos de eletricidade EEG), mas de uma forma financeira (compensação dos custos correspondentes). Três dos quatro ORT visados por este dispositivo de compensação são empresas privadas (Amprion GmbH, TenneT TSO GmbH e 50Hertz Transmission GmbH), sendo o quarto uma empresa pública (Transnet BW GmbH).

7 Em quarto lugar, os ORT são obrigados a comercializar a eletricidade EEG que injetam na sua rede no mercado à vista da eletricidade (§ 37, n.o 1, da Lei EEG de 2012). Se o preço assim obtido não lhes permitir cobrir o encargo financeiro que lhes é imposto pela obrigação legal de remunerar essa eletricidade às tarifas fixadas pela lei, têm o direito de exigir, em condições definidas pelo poder regulamentar, que os fornecedores que abastecem os clientes finais lhes paguem a diferença, proporcionalmente às quantidades vendidas. Este mecanismo é chamado de “redução da sobretaxa EEG” (§ 37, n.o 2, da Lei EEG de 2012). O montante da sobretaxa EEG pode, todavia, ser reduzido em 2 cêntimos de euro por quilowatt‑hora (KWh) em certos casos (§ 39 da Lei EEG de 2012). Para beneficiar dessa redução, qualificada pela Lei EGG de 2012 de “limitação da sobretaxa EEG”, mas igualmente conhecida pelo nome de “privilégio eletricidade verde”, os fornecedores de eletricidade têm, nomeadamente, de demonstrar, antes de mais, que pelo menos 50 % da eletricidade que fornecem aos seus clientes é eletricidade EEG, seguidamente, que pelo menos 20 % desta eletricidade provém da energia eólica ou da energia solar e, por último, que é objeto de comercialização direta aos seus clientes.

8 […]

9 Em quinto lugar, é dado assente que, embora a Lei EEG de 2012 não obrigue os fornecedores de eletricidade a repercutir a sobretaxa EEG nos clientes finais, também não os proíbe de o fazer. É igualmente dado assente que os fornecedores, que têm de pagar, eles próprios, essa sobretaxa aos ORT, a repercutem, na prática, nos seus clientes, como, de resto, confirmou a República Federal da Alemanha na audiência. As modalidades segundo as quais a referida sobretaxa deve ser indicada na fatura que lhes é enviada estão previstas pela Lei EGG de 2012 (§ 53 da Lei EEG de 2012), assim como as condições em que esses clientes devem ser informados da proporção de energias renováveis, subvencionadas segundo a lei relativa às energias renováveis, que lhes é fornecida (§ 54 da Lei EEG de 2012).

10 Além disso, a Lei EEG de 2012 prevê igualmente um regime de compensação especial, nos termos do qual o [I]nstituto [F]ederal da [E]conomia e do [C]ontrolo das [E]xportações (Bundesamt für Wirtschaft und Ausfuhrkontrolle, a seguir “BAFA”) estipula anualmente um limite máximo para a parte da sobretaxa EEG suscetível de ser repercutida pelos fornecedores de eletricidade em duas categorias determinadas de clientes, a saber, por um lado, as “empresas eletrointensivas do setor produtivo” (a seguir “EEI”) e, por outro, as “empresas ferroviárias”, na sequência de um pedido que estas devem apresentar até 30 de junho do ano anterior, com o objetivo de reduzir os seus custos de eletricidade e, desse modo, preservar a sua competitividade (§ 40 da Lei EEG de 2012).

11 A Lei EEG de 2012 precisa as condições que dão direito a este regime, o procedimento que deve ser seguido pelas empresas elegíveis, as modalidades de determinação do limite máximo caso a caso e os efeitos das decisões tomadas a este respeito pelo BAFA (§§ 41 a 44 da Lei EEG de 2012). A Lei EEG de 2012 prevê, em particular, que, para as empresas do setor produtivo cujos custos de consumo de eletricidade representem, pelo menos, 14 % do seu valor acrescentado bruto e cujo consumo seja de, pelo menos, 1 gigawatt‑horas (GWh), esse limite máximo é fixado em 10 % da sobretaxa EEG para a parte do seu consumo compreendida entre 1 GWh e 10 GWh, em 1 % dessa sobretaxa para a parte do seu consumo compreendida entre 10 GWh e 100 GWh, e em 0,05 cêntimos de euro por KWh a partir daí. A Lei EGG de 2012 dispõe igualmente que, para as empresas do setor produtivo cujos custos de consumo de eletricidade representem, pelo menos, 20 % do seu valor acrescentado bruto e cujo consumo seja de, pelo menos, 100 GWh, a sobretaxa EEG está limitada a 0,05 cêntimos de euro por KWh desde o primeiro quilowatt‑hora. A Lei EEG de 2012 precisa, além disso, que os fornecedores de eletricidade devem informar as empresas que dispõem de um limite máximo da sobretaxa EEG, primeiro, da parte de energias renováveis, que beneficiam de um auxílio ao abrigo da lei relativa às energias renováveis, que lhes é fornecida, segundo, da composição do cabaz energético global, e, terceiro, para as empresas privilegiadas a título da lei relativa às energias renováveis, da composição do cabaz energético que lhes é servido (§ 54 da Lei EEG de 2012).

12 Em sexto lugar, a Lei EEG de 2012 impõe um conjunto de obrigações de informação e de publicação aos operadores de instalações, aos [O]R e aos fornecedores de eletricidade, em particular perante os ORT e a [A]gência [F]ederal das [R]edes (Bundesnetzagentur, a seguir “BNetzA”), aos quais se junta uma série de obrigações de transparência, que pesam especificamente sobre os ORT (§§ 45 a 51 da Lei EEG de 2012). A referida lei precisa igualmente os poderes de vigilância e de controlo de que dispõe a BNetzA relativamente aos ORD e aos ORT (§ 61 da Lei EEG de 2012).»

4

Após ter decidido, em 18 de dezembro de 2013, dar início ao procedimento formal de exame relativamente às medidas contidas na Lei EGG de 2012, a Comissão Europeia adotou a decisão controvertida, em 25 de novembro de 2014.

5

Na referida decisão, a Comissão considera que a Lei EGG de 2012 inclui dois tipos de vantagens seletivas com a qualificação de auxílios de Estado, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, a saber, por um lado, o apoio à produção de eletricidade a partir de fontes de energia renováveis e de gás de extração, que garantia aos produtores de eletricidade EEG, através dos preços de compra e os prémios de mercado, um preço para a eletricidade mais elevado do que o preço do mercado, e, por outro, o regime de compensação especial, nos termos do qual os grandes consumidores de energia podiam reduzir a sobretaxa EEG (artigo 3.o da decisão controvertida).

6

O dispositivo da decisão controvertida tem a seguinte redação:

«Artigo 1.o

O auxílio estatal para apoiar a produção de eletricidade a partir de fontes de energia renováveis e de gás de extração, incluindo o seu mecanismo de financiamento, concedido com base na [Lei EGG 2012], ilegalmente concedido pela Alemanha em violação do artigo 108.o, n.o 3, [TFUE], é compatível com o mercado interno, sob reserva da execução, pela Alemanha, do compromisso previsto no anexo I.

[…]

Artigo 3.o

1.   O auxílio estatal constituído por reduções da sobretaxa para o financiamento do apoio à eletricidade produzida a partir de fontes renováveis […] nos anos de 2013 e 2014 a favor dos grandes consumidores de energia […], ilegalmente concedido pela Alemanha em violação do artigo 108.o, n.o 3, [TFUE], é compatível com o mercado interno na medida em que se inclua numa das quatro categorias definidas no presente número.

[…]

2.   Qualquer auxílio que não se encontre abrangido pelo disposto no n.o 1 é incompatível com o mercado interno.»

Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

7

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 2 de fevereiro de 2015, a República Federal da Alemanha interpôs um recurso de anulação da decisão controvertida, invocando três fundamentos que o Tribunal Geral julgou sucessivamente improcedentes no acórdão recorrido.

8

O Tribunal Geral julgou improcedente, nos n.os 33 a 42 do acórdão recorrido, o primeiro fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter cometido erros manifestos de apreciação na sua avaliação do papel do Estado no funcionamento da Lei EGG de 2012. O Tribunal Geral declarou, nomeadamente, no n.o 40 do acórdão recorrido, que as medidas em causa tinham sido instituídas por lei e que eram, por isso, imputáveis ao Estado alemão.

9

O Tribunal Geral julgou igualmente improcedentes, nos n.os 49 a 70 do acórdão recorrido, os diferentes argumentos apresentados pela República Federal da Alemanha no âmbito do seu segundo fundamento, relativo à inexistência de uma vantagem relacionada com o regime de compensação especial. Sublinhou, no n.o 44 do acórdão recorrido, que este fundamento se referia exclusivamente à própria existência de uma vantagem a favor das EEI, sem suscitar a questão da seletividade dessa vantagem nem a da existência de uma vantagem relacionada com o regime de apoio em benefício dos produtores de eletricidade EEG. Declarou, nomeadamente no n.o 55 do acórdão recorrido, que o regime de compensação especial instaurava uma vantagem a favor das EEI, na medida em que as libertava de um encargo que, normalmente, deveriam suportar.

10

Por último, o Tribunal Geral julgou improcedente, nos n.os 81 a 129 do acórdão recorrido, as diferentes partes do terceiro fundamento invocado pela República Federal da Alemanha, relativo à inexistência de uma vantagem financiada através de recursos estatais. Assim, declarou que a Comissão teve razão ao considerar que o sistema instituído pela Lei EGG de 2012, ou seja, tanto o regime de apoio aos produtores de eletricidade EEG como o regime de compensação especial a favor das EEI, implicavam a utilização de recursos estatais, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

11

No caso em apreço, após uma breve recapitulação, nos n.os 81 a 83 do acórdão recorrido, da jurisprudência pertinente do Tribunal de Justiça relativa ao conceito de recursos estatais, e nomeadamente do Acórdão de 16 de maio de 2002, França/Comissão (C‑482/99, EU:C:2002:294, n.o 37), o Tribunal Geral, antes de mais, resumiu a decisão controvertida nos n.os 84 a 90 do acórdão recorrido.

12

Em seguida, o Tribunal Geral examinou, nos n.os 91 a 129 do acórdão recorrido, a questão de saber se a Comissão tinha considerado acertadamente que a Lei EGG de 2012 envolvia recursos estatais, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

13

A este respeito, observou, a título preliminar, no n.o 92 do acórdão recorrido, que «a sobretaxa EEG, cobrada e administrada pelos ORT, se destin[ava], in fine, a cobrir os custos gerados pelos preços de compra e o prémio de mercado previstos pela Lei EEG de 2012 e que garantem aos produtores de eletricidade EEG um preço para a eletricidade que produzem mais elevado do que o preço do mercado», de modo que «de[via] considerar‑se que a sobretaxa EEG proce[dia], a título principal, da implementação de uma política de apoio aos produtores de eletricidade EEG estabelecida, por lei, pelo Estado».

14

Por último, dedicou‑se a demonstrar que a Comissão não cometeu um erro, por um lado, ao basear‑se em três séries de considerações, desenvolvidas nos n.os 93 a 110 do acórdão recorrido, resumidas nos n.os 111 e 112 desse acórdão, e, por outro, refutando, nos n.os 113 a 126 do acórdão recorrido, os argumentos invocados pela República Federal da Alemanha.

15

Os n.os 111 e 112 do acórdão recorrido estão redigidos nos seguintes termos:

«111 Nestas circunstâncias, deve considerar‑se que a Comissão teve razão ao afirmar, no considerando 138 da decisão impugnada, lido em conjugação com os considerandos 98 a 137 da referida decisão, que a vantagem prevista pelas disposições dos §§ 16 a 33 i da Lei EGG de 2012 a favor dos produtores de eletricidade EEG, através dos preços de compra e dos prémios de mercado, se assemelhava, no caso vertente, a uma imposição fixada pelas autoridades do [Estado] que envolve recursos [estatais], na medida em que este último organizava uma transferência de recursos financeiros através da legislação e estabelecia os fins para os quais esses recursos financeiros podiam ser utilizados.

112 Esta conclusão vale igualmente para a vantagem a favor dos grandes consumidores de energia que são as EEI, na medida em que o mecanismo de compensação previsto pela Lei EGG de 2012 constitui, como a Comissão acertadamente referiu no considerando 114 da decisão impugnada, um encargo adicional para os ORT. Com efeito, qualquer redução do montante da sobretaxa EEG tem, precisamente, por consequência reduzir os montantes cobrados junto das EEI pelos fornecedores de eletricidade, e conduz a perdas de receitas para os ORT. Todavia, essas perdas são seguidamente recuperadas junto de outros fornecedores e, de facto, junto de outros clientes finais, a fim de compensar as perdas assim incorridas, como, de resto, afirmou a República Federal da Alemanha na audiência em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal Geral. Assim, o consumidor final médio na Alemanha participa, de uma certa forma, na subvenção das EEI que beneficiam de um limite máximo da sobretaxa EEG. Aliás, a circunstância de os consumidores finais de eletricidade que não são EEI terem de suportar os custos adicionais gerados pelo limite máximo da sobretaxa EEG de que estas últimas beneficiam constitui, ela também, mais um indício, quando analisado com as considerações precedentes, de que os fundos gerados pela sobretaxa EEG são, de facto, recursos especiais, equivalentes a um imposto sobre o consumo de eletricidade, cuja utilização para fins estritamente determinados foi prevista antecipadamente pelo legislador alemão no âmbito da implementação de uma política pública e não de uma iniciativa privada.»

16

O Tribunal Geral concluiu a sua análise nos n.os 127 e 128 do acórdão recorrido, que têm a seguinte redação:

«127 Decorre desta análise que os mecanismos resultantes da Lei EGG de 2012 procedem, a título principal, da implementação de uma política pública de apoio aos produtores de eletricidade EEG estabelecida, através da Lei EGG de 2012, pelo Estado, e que, primeiro, os fundos gerados pela sobretaxa EEG e administrados coletivamente pelos ORT se mantêm sob a influência dominante dos poderes públicos, segundo, os montantes em causa, gerado pela sobretaxa EEG, são fundos que envolvem um recurso estatal, equiparáveis a um imposto, e, terceiro, as competências e missões atribuídos aos ORT permitem concluir que estes últimos não atuam por conta própria e livremente, mas como gestores, equiparados a uma entidade que executa uma concessão estatal, de um auxílio concedido através de fundos estatais.

128 Decorre das considerações precedentes que a Comissão teve razão ao considerar, na decisão impugnada, que a Lei EGG de 2012 envolvia recursos estatais na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.»

Pedidos das partes e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

17

A República Federal da Alemanha pede ao Tribunal de Justiça que se digne:

a título principal, anular o acórdão recorrido na íntegra e dar provimento ao seu recurso interposto contra a decisão controvertida;

a título subsidiário, remeter o processo ao Tribunal Geral;

condenar a Comissão Europeia nas despesas.

18

A Comissão pede ao Tribunal de Justiça que se digne:

declarar o primeiro fundamento inadmissível e, a título subsidiário, julgá‑lo improcedente;

declarar o segundo fundamento parcialmente inadmissível e, a título subsidiário, parcialmente inoperante e, em todo o caso, improcedente;

julgar o terceiro fundamento improcedente;

condenar a República Federal da Alemanha nas despesas do processo.

19

Por decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 25 de outubro de 2017, a instância foi suspensa no presente processo, nos termos do artigo 55.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, até à prolação do Acórdão de 25 de julho de 2018, Georgsmarienhütte e o. (C‑135/16, EU:C:2018:582).

Quanto ao presente recurso

20

A República Federal da Alemanha invoca três fundamentos de recurso, os dois primeiros, relativos a uma violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, e o terceiro, relativo a uma violação do dever de fundamentação dos acórdãos. A Comissão alega que os dois primeiros fundamentos são, a título principal, inadmissíveis e, a título subsidiário, inoperantes e, em todo o caso, improcedentes, e que o terceiro fundamento é improcedente.

Quanto ao primeiro fundamento, relativo a uma violação do artigo 107.o, n.o 1, TFUE no que respeita à utilização de recursos estatais

Argumentos das partes

21

Com o seu primeiro fundamento, que se subdivide em duas partes, a República Federal da Alemanha alega, em substância, que, ao concluir que o sistema da sobretaxa EEG implicava a concessão de uma vantagem através de recursos estatais ou, pelo menos, imputável ao Estado, o Tribunal Geral cometeu erros de direito na interpretação e na aplicação do critério relativo à concessão de uma vantagem através de recursos estatais, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

22

Em termos muitos gerais, o referido Estado‑Membro considera, a título preliminar, que o Tribunal de Geral, na sua apreciação da utilização de recursos estatais e para concluir que os ORT eram serviços designados para exercer um eventual poder de disposição e de controlo estatal sobre as receitas provenientes da sobretaxa EEG, não fez uma diferenciação suficiente dos papéis que o Estado pode desempenhar na qualidade de poder legislativo, por um lado, e de poder executivo, por outro.

23

Com a primeira parte do seu primeiro fundamento, que visa principalmente o n.o 93 do acórdão recorrido, a República Federal da Alemanha alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de apreciação do papel desempenhado pelos ORT no sistema da sobretaxa EEG.

24

Recorda que, nesse n.o 93, o Tribunal Geral declarou, por um lado, que a Lei EGG de 2012 conferia aos ORT uma série de obrigações e de prerrogativas no que respeita à aplicação dos mecanismos que estabelecia, pelo que eram o ponto central no funcionamento do sistema previsto pela Lei EGG. Por outro lado, o Tribunal Geral declarou que os fundos gerados pela sobretaxa EEG não eram transferidos diretamente dos consumidores finais para os produtores de eletricidade, mas necessitavam da intervenção de intermediários, encarregados da sua cobrança e da sua gestão, que os referidos fundos não eram integrados diretamente no orçamento geral dos ORT nem deixados à sua disposição, de modo que eram administrados coletivamente pelos ORT e permaneciam sob a influência dominante dos poderes públicos.

25

Ao descrever o funcionamento do mecanismo de repartição estabelecido pela Lei EGG de 2012, e posteriormente ao comparar a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a República Federal da Alemanha tenta demonstrar sucessivamente, em primeiro lugar, que o mecanismo estabelecido pela Lei EGG de 2012 não tinha nenhuma relação com o orçamento do Estado ou de uma instituição pública, em segundo lugar, que os eventuais direitos de acesso ou de controlo exercidos pelo Estado sobre os ORT não implicavam nenhum controlo estatal dos recursos EEG e, em terceiro lugar, que não existia nenhum imposto nem nenhuma renúncia a receitas estatais.

26

Assim, em primeiro lugar, a apreciação do mecanismo de repartição da EEG não permitia de modo algum concluir pela utilização de recursos estatais ou de recursos imputáveis ao Estado, como o Tribunal de Justiça declarou nos seus Acórdãos de 13 de março de 2001, PreussenElektra (C‑379/98, EU:C:2001:160), de 16 de maio de 2002, França/Comissão (C‑482/99, EU:C:2002:294), e de 17 de julho de 2008, Essent Netwerk Noord e o. (C‑206/06, EU:C:2008:413).

27

Segundo esta jurisprudência, as taxas, os impostos e os direitos caracterizam‑se pelo facto de as receitas geradas deverem, de uma forma ou de outra, e direta ou indiretamente, voltar ao orçamento do Estado ou de uma entidade pública. Ora, os recursos recebidos pelos ORT para cobrir os custos da comercialização da eletricidade EEG não diminuem em nada, nem direta ou indiretamente, os recursos estatais. São os participantes na cadeia de abastecimento que suportam esses os custos em troca da qualidade «renovável» da eletricidade e os compensam no âmbito da economia privada.

28

Por conseguinte, o Estado não beneficia de qualquer acesso a essas receitas e não encarregou por delegação os ORT de desempenharem uma missão de serviço público. Estes últimos não recebem a sobretaxa EEG por conta do Estado, de modo que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao considerar que eram praticamente titulares de concessões estatais. Ao adotar essa qualificação jurídica incorreta da missão dos ORT, o Tribunal Geral aplicou erradamente o conceito de controlo e imputabilidade do comportamento dos ORT ao Estado.

29

A sobretaxa EEG não é objeto de uma atribuição ao orçamento federal nem ao de uma instituição pública, o que demonstra o mecanismo de compensação dos custos dos ORT. Com efeito, estes últimos estabeleciam o montante dessa sobretaxa comparando as receitas e os custos, sendo certo que as receitas superiores ou inferiores seriam objeto de compensação entre os ORT no ano seguinte, sem fazer parte do orçamento de uma entidade pública. As receitas excedentárias não são transferidas para o orçamento do Estado e as despesas excedentárias não são compensadas por este último orçamento.

30

Em última análise, é juridicamente errado partir do princípio, como fez o Tribunal Geral no n.o 83 do acórdão recorrido, de que os montantes pertinentes «[se mantêm]» à disposição das «autoridades nacionais competentes», ou ainda, como fez no n.o 94 do acórdão recorrido, que os fundos administrados coletivamente pelos ORT permanecem sob a influência dominante dos poderes públicos.

31

Além disso, o Tribunal Geral conferiu, no n.o 117 do referido acórdão, uma importância preponderante ao facto de que os fundos recebidos pelos ORT devem ser geridos numa conta separada, sujeita ao controlo das instâncias estatais. Ora, os ORT mantêm contas separadas por razões de transparência e para evitar práticas abusivas, e não para permitir ao Estado‑Membro em causa gerir ativos especiais pertencentes a empresas.

32

Em segundo lugar, o Tribunal Geral também cometeu um erro de direito ao concluir que as missões de vigilância e de controlo da regularidade e da legalidade dos atos praticados pelos operadores privados do mercado, atribuídas às autoridades estatais, implicavam um controlo estatal dos recursos EEG.

33

Os mecanismos previstos pela Lei EGG, que correspondem aos critérios desenvolvidos pelo Tribunal de Justiça no seu Acórdão de 30 de maio de 2013, Doux Élevage e Coopérative agricole UKL‑ARREE (C‑677/11, EU:C:2013:348, n.o 38), são consagrados ao controlo do bom funcionamento do sistema de repartição e do respeito da vontade do legislador, mas não criam uma possibilidade importante de orientação ou de influência para as instâncias estatais, que permita considerar que existe «exercício de um controlo estatal». Com efeito, estas últimas apenas dispõem da possibilidade de adotar medidas disciplinares ou de instaurar processos de contraordenação contra operadores privados que violem a Lei EGG de 2012 e não têm competências que lhes permitam dispor dos recursos dos referidos operadores influenciando os pagamentos e os fluxos financeiros.

34

O próprio pagamento pelos OR da remuneração EEG não está sujeito a controlo estatal. São os OR que adotam sozinhos a decisão de pagar ou não essa remuneração e que fixam o respetivo montante. Do mesmo modo, a cobrança da sobretaxa EEG só está sujeita a uma vigilância limitada, uma vez que os ORT são os únicos que decidem se a exigem ou não. Contrariamente ao que o Tribunal Geral afirmou no n.o 125 do acórdão recorrido, os ORT não são estritamente controlados pelas autoridades administrativas alemãs competentes, e nomeadamente pela BNetzA, cuja missão de controlo consistia, no essencial, em assegurar a correta aplicação das disposições relativas à sobretaxa EEG. A BNetzA não dispõe do direito de determinar o montante da sobretaxa EEG, uma vez que este é calculado pelos ORT sob a sua própria responsabilidade.

35

A exigência legal de um sistema abstrato de cálculo bem como as obrigações de transparência e os direitos de vigilância que esta implicava servem apenas para impedir o enriquecimento sem causa de um operador ao longo das etapas da cadeia de repercussão, dado que a proteção contra os abusos deve ser exercida nos tribunais cíveis, no âmbito das relações de direito privado existentes entre os participantes. Os referidos participantes não gozavam de uma delegação ou concessão estatal e não tinham a possibilidade de encarregar uma autoridade administrativa de reivindicar os seus direitos.

36

Em terceiro lugar, a sobretaxa EEG não é um imposto e, por conseguinte, a sua limitação não constituía uma renúncia a recursos estatais. O Tribunal Geral cometeu, de facto, um erro de direito ao concluir, no n.o 95 do acórdão recorrido, que, na medida em que os consumidores finais eram obrigados a pagar um suplemento de preço, a sobretaxa EEG constituía um encargo imposto unilateralmente pelo Estado no âmbito da sua política de apoio aos produtores de eletricidade EEG, equiparável, nos seus efeitos, a um imposto sobre o consumo de eletricidade na Alemanha. Com efeito, a mera circunstância de o mecanismo de repartição da EEG permitir repercutir nos consumidores finais de eletricidade os pagamentos que devem ser feitos aos operadores de instalações não permite concluir pela existência de um imposto.

37

A sobretaxa EEG implica um aumento do preço de compra de natureza privada que os fornecedores de eletricidade pagam em contrapartida da qualidade «verde» da eletricidade e implica, assim, uma relação de prestação/contrapartida, contrariamente a um imposto, que é cobrado de forma vinculativa e sem contrapartida. Além disso, a jurisprudência do Tribunal de Justiça exige, para que um imposto possa ser qualificado de auxílio de Estado, a existência de uma relação de afetação obrigatória entre o imposto e o auxílio, que não existe no caso da sobretaxa EEG. Esta última não constitui uma receita do Estado‑Membro, determinada de forma abstrata. A Lei EEG de 2012 constitui, assim, a continuação da Stromeinspeisungsgesetz (Lei relativa ao abastecimento da rede pública de eletricidade através de fontes de energia renováveis, BGBl. 1990 I, p. 2633), que o Tribunal de Justiça não qualificou de auxílio no seu Acórdão de 13 de março de 2001, PreussenElektra (C‑379/98, EU:C:2001:160), a única diferença entre estes regimes resulta do facto de os fornecedores de eletricidade comprarem a um preço fixo (sobretaxa EEG) já não eletricidade física, mas o caráter renovável desta última.

38

Em última análise, as características essenciais de um imposto não se verificam, na medida em que, em primeiro lugar, a Lei EEG não obriga os fornecedores de eletricidade a faturar essa sobretaxa aos seus clientes, em segundo lugar, a repercussão da referida sobretaxa, que os fornecedores de eletricidade incluem como parte do preço de venda, não pode ser exigida por meios de direito público, mas apenas através de uma ação civil, e, em terceiro lugar, o «rendimento» gerado pela mesma sobretaxa é integrado no património geral dos fornecedores de eletricidade, sem que as instâncias estatais possam exercer uma influência na gestão ou utilização desses fundos.

39

Com a segunda parte do seu primeiro fundamento, a República Federal da Alemanha sustenta que o Tribunal Geral cometeu igualmente um erro ao não ter em conta que, no sistema instituído pela Lei EGG de 2012, o reconhecimento da concessão de um auxílio através de recursos estatais dependia de forma decisiva do papel dos fornecedores de eletricidade, que no caso em apreço não foi suficientemente tido em consideração.

40

Em primeiro lugar, embora o Tribunal Geral tenha corretamente contestado que a Lei EGG de 2012 não obriga os fornecedores de eletricidade a repercutir a sobretaxa EEG nos clientes finais, sem, contudo, o proibir, não teve, contudo, em conta o papel destes últimos ao concluir, nos n.os 95 e seguintes do acórdão recorrido, que esta sobretaxa era, de facto, um imposto que não podia ser analisado como um recurso próprio dos ORT, a que o Estado‑Membro simplesmente deu uma utilização específica mediante uma medida legislativa.

41

Em segundo lugar, o Tribunal Geral não teve em conta o facto de que o papel e a missão dos fornecedores de eletricidade estão menos regulados pela lei do que os ORT. Os referidos fornecedores não são obrigados a manter contas separadas nem a assegurar que seja feita uma separação dos patrimónios, na medida em que a sobretaxa EEG devia ser considerada uma parte normal das suas receitas. Não estão sujeitos a nenhuma exigência legal de comportamento em matéria de preços ou de utilização dos recursos. Não é exercido nenhum controlo estatal sobre as suas relações com os seus clientes, alegados financiadores do regime de auxílios impugnado pela Comissão e pelo Tribunal Geral. A sobretaxa EEG e a sua eventual repercussão nos consumidores finais pelos fornecedores de eletricidade inserem‑se numa relação comercial entre empresas privadas ou particulares sem intervenção de uma autoridade pública. O facto de os fundos em causa não serem transferidos diretamente dos consumidores para os produtores de eletricidade, mas necessitarem da intervenção de intermediários encarregados da sua cobrança e da sua gestão, não é relevante para a sua qualificação de recursos privados.

42

Em terceiro lugar, embora o Tribunal Geral tenha apreciado de forma suficientemente aprofundada o papel dos fornecedores de eletricidade, devia ter concluído que o Estado não tinha acesso aos recursos EEG. Tanto mais que a relação entre o fornecedor de energia e os consumidores finais é de natureza puramente privada. O Tribunal Geral não teve em conta o alcance do conceito de controlo e, como tal, violou o artigo 107.o, n.o 1, TFUE ao qualificar de «controlo estatal» a atividade de uma empresa privada, apesar de esta não estar sujeita a nenhuma obrigação legal de cobrança da sobretaxa EEG, que o montante da referida sobretaxa a repercutir, se for caso disso, também não está sujeito a exigências legais, que as autoridades não podem influenciar a fixação dos preços pelos fornecedores de eletricidade, que o volume de negócios dos fornecedores que pode incluir o pagamento da sobretaxa é integrado no seu património e que as instâncias estatais não podem ter influência na utilização, por estes, desses recursos.

43

A Comissão alega, a título principal, que o primeiro fundamento da República Federal da Alemanha é inadmissível e, a título subsidiário, que é parcialmente inoperante e, em qualquer caso, improcedente.

Apreciação do Tribunal de Justiça

– Quanto à admissibilidade do fundamento na sua totalidade

44

A Comissão alega que o primeiro fundamento invocado pela República Federal da Alemanha é inadmissível na sua totalidade, na medida em que não critica a interpretação jurídica do conceito de controlo estatal adotada pelo Tribunal Geral no acórdão recorrido, mas as constatações relativas ao direito nacional realizadas por este, que estão compreendidas na apreciação dos factos.

45

Esta argumentação não pode ser acolhida.

46

Com efeito, embora seja verdade que a República Federal da Alemanha se baseia nos termos da Lei EGG de 2012 para invocar os seus diferentes argumentos, não é menos verdade que, no âmbito da primeira parte do seu primeiro fundamento, alega, no essencial, que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito, uma vez que fez uma interpretação demasiado extensiva do conceito de controlo estatal, nomeadamente ao qualificar os montantes gerados pela sobretaxa EEG de fundos que envolvem um recurso estatal equiparável a um imposto, por um lado, e ao concluir pela existência de um controlo público do Estado‑Membro sobre os referidos fundos através dos ORT, por outro.

47

Assim sendo, o primeiro fundamento é admissível.

– Quanto à primeira parte do primeiro fundamento, relativa ao erro cometido pelo Tribunal Geral na apreciação do papel desempenhado pelos ORT no sistema da sobretaxa EEG

48

A este propósito, há que recordar que, para que as vantagens possam ser qualificadas de «auxílios», na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, devem, por um lado, ser concedidas direta ou indiretamente através de recursos estatais e, por outro, ser imputáveis ao Estado (v. Acórdão de 13 de setembro de 2017, ENEA, C‑329/15, EU:C:2017:671, n.o 20 e jurisprudência referida).

49

Em primeiro lugar, para apreciar a imputabilidade de uma medida ao Estado, importa examinar se as autoridades públicas estiveram implicadas na adoção dessa medida (Acórdãos de 2 de fevereiro de 1988, Kwekerij van der Kooy e o./Comissão, 67/85, 68/85 e 70/85, EU:C:1988:38, n.o 35; de 19 de dezembro de 2013, Association Vent De Colère! e o., C‑262/12, EU:C:2013:851, n.os 17 e 18; e de 13 de setembro de 2017, ENEA, C‑329/15, EU:C:2017:671, n.o 21).

50

No caso em apreço, o Tribunal Geral constatou, no n.o 40 do acórdão recorrido, que os mecanismos de apoio e de compensação em causa no presente processo foram instituídos pela Lei EGG de 2012, pelo que devem ser considerados imputáveis ao Estado.

51

Ora, embora a República Federal da Alemanha evoque várias vezes a questão da imputabilidade das medidas em causa ao Estado no seu recurso, não contestou formalmente a constatação assim efetuada pelo Tribunal Geral e nem sequer invocou a existência de um erro de direito cometido por este último a este respeito. Por conseguinte, os argumentos apresentados a este propósito devem, em todo o caso, conforme alegou a Comissão, ser julgados inadmissíveis.

52

Em segundo lugar, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que a proibição enunciada no artigo 107.o, n.o 1, TFUE abrange tanto os auxílios concedidos diretamente pelo Estado ou mediante recursos estatais como também os atribuídos por organismos públicos ou privados instituídos ou designados pelo Estado para os gerir (Acórdãos de 22 de março de 1977, Steinike & Weinlig, 78/76, EU:C:1977:52, n.o 21; de 13 de março de 2001, PreussenElektra, C‑379/98, EU:C:2001:160, n.o 58; e de 13 de setembro de 2017, ENEA, C‑329/15, EU:C:2017:671, n.o 23 e jurisprudência referida).

53

A distinção feita nessa disposição entre os «auxílios concedidos pelos Estados» e os concedidos «através de recursos estatais» não significa que todas as vantagens conferidas por um Estado constituam auxílios, quer sejam ou não financiados por meio de recursos estatais, apenas pretendendo incluir nesse conceito tanto as vantagens conferidas diretamente pelo Estado como as conferidas através de um organismo público ou privado, designado ou instituído por esse Estado (Acórdãos de 13 de março de 2001, PreussenElektra, C‑379/98, EU:C:2001:160, n.o 58, e de 30 de maio de 2013, Doux Élevage e Coopérative agricole UKL‑ARREE, C‑677/11, EU:C:2013:348, n.o 26).

54

Com efeito, o direito da União não pode permitir que se contornem as disposições em matéria de auxílios de Estado através da simples criação de instituições autónomas incumbidas de distribuir auxílios (Acórdãos de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.o 23, e de 9 de novembro de 2017, Comissão/TV2/Danmark, C‑656/15 P, EU:C:2017:836, n.o 45).

55

Resulta igualmente de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que não é necessário provar, em todos os casos, que houve uma transferência de recursos estatais para que a vantagem concedida a uma ou mais empresas possa ser considerada um auxílio de Estado na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE (Acórdãos de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.o 36, e de 30 maio de 2013, Doux Élevage e Coopérative agricole UKL‑ARREE, C‑677/11, EU:C:2013:348, n.o 34).

56

Assim, o Tribunal de Justiça declarou que uma medida que consiste, designadamente, na obrigação de compra de energia pode ser abrangida pelo conceito de «auxílio», não obstante não comportar uma transferência de recursos estatais (Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Association Vent De Colère! e o., C‑262/12, EU:C:2013:851, n.o 19, e de 13 de setembro de 2017, ENEA, C‑329/15, EU:C:2017:671, n.o 24).

57

Com efeito, o artigo 107.o, n.o 1, TFUE abrange todos os meios pecuniários que as autoridades públicas podem efetivamente utilizar para apoiar empresas, não sendo relevante que esses meios pertençam ou não de modo permanente ao património do Estado. Mesmo quando as quantias correspondentes à medida em causa não estejam de modo permanente na posse do Tesouro Público, o facto de estarem constantemente sob controlo público, e portanto à disposição das autoridades nacionais competentes, é suficiente para que sejam qualificadas de «recursos estatais» (Acórdãos de 16 de maio de 2002, França/Comissão, C‑482/99, EU:C:2002:294, n.o 37, e de 13 de setembro de 2017, ENEA, C‑329/15, EU:C:2017:671, n.o 25 e jurisprudência referida).

58

Mais precisamente, o Tribunal de Justiça declarou que os fundos alimentados por contribuições obrigatórias impostas pela legislação de um Estado, geridas e repartidas de acordo com essa legislação, podem ser considerados recursos estatais na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, mesmo que sejam geridos por entidades distintas da autoridade pública (Acórdãos de 2 de julho de 1974, Itália/Comissão, 173/73, EU:C:1974:71, n.o 35, e de 19 de dezembro de 2013, Association Vent De Colère! e o., C‑262/12, EU:C:2013:851, n.o 25).

59

O elemento decisivo, a este respeito, reside no facto de essas entidades serem mandatadas pelo Estado para gerirem recursos estatais, e não estarem simplesmente vinculadas por uma obrigação de compra através dos seus próprios recursos financeiros (v., neste sentido, Acórdãos de 17 de julho de 2008, Essent Netwerk Noord e o., C‑206/06, EU:C:2008:413, n.o 74; de 19 de dezembro de 2013, Association Vent De Colère! e o., C‑262/12, EU:C:2013:851, n.os 30 e 35; e de 13 de setembro de 2017, ENEA, C‑329/15, EU:C:2017:671, n.os 26 e 30).

60

Não obstante, há que recordar igualmente que, para demonstrar se a vantagem concedida ao beneficiário onera o orçamento de Estado, há que verificar se existe uma ligação suficientemente direta entre, por um lado, essa vantagem e, por outro, uma diminuição do referido orçamento, ou mesmo um risco económico suficientemente concreto de encargos que o onerem (v., neste sentido, Acórdãos de 8 setembro de 2011, Comissão/Países Baixos, C‑279/08 P, EU:C:2011:551, n.o 111; de 19 de março de 2013, Bouygues e Bouygues Télécom/Comissão e o. e Comissão/França e o., C‑399/10 P e C‑401/10 P, EU:C:2013:175, n.o 109; de 9 de outubro de 2014, Ministerio de Defensa e Navantia, C‑522/13, EU:C:2014:2262, n.o 47; e de 16 de abril de 2015, Trapeza Eurobank Ergasias, C‑690/13, EU:C:2015:235, n.o 19).

61

É à luz destes elementos que há que examinar a primeira parte do primeiro fundamento invocado pela República Federal da Alemanha, no âmbito do qual alega que o Tribunal Geral cometeu erros de direito ao concluir, em primeiro lugar, que o mecanismo instituído pela Lei EGG de 2012 implicava uma relação com o orçamento do Estado ou de uma instituição pública, em segundo lugar, que as missões de vigilância e de controlo confiadas às autoridades estatais implicavam um controlo público dos recursos EEG e, em terceiro lugar, que a sobretaxa EEG era um imposto e a fixação de limite máximo dessa sobretaxa uma renúncia a recursos estatais.

62

A este respeito, há que salientar que a conclusão do Tribunal Geral, no n.o 128 do acórdão recorrido, segundo a qual a Comissão considerou acertadamente, na decisão controvertida, que a Lei EGG de 2012 envolvia recursos estatais, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, baseia‑se nas constatações efetuadas nos n.os 92 a 126 desse acórdão e resumidas no n.o 127 do mesmo. No referido número, o Tribunal Geral salientou que os mecanismos resultantes da Lei EGG de 2012 procedem, a título principal, da implementação de uma política pública de apoio aos produtores de eletricidade EEG estabelecida, através da Lei EGG de 2012, pelo Estado. Seguidamente, indicou, primeiro, que os fundos gerados pela sobretaxa EEG e administrados coletivamente pelos ORT se mantêm sob a influência dominante dos poderes públicos, segundo, que os montantes em causa, gerados pela sobretaxa EEG, são fundos que envolvem um recurso estatal, equiparáveis a um imposto, e, terceiro, que as competências e missões atribuídas aos ORT permitem concluir que estes últimos não atuam por conta própria e livremente, mas como gestores, equiparados a uma entidade que executa uma concessão estatal, de um auxílio concedido através de fundos estatais.

63

Ora, a afirmação do Tribunal Geral segundo a qual, em substância, os mecanismos resultantes da Lei EGG de 2012 procedem da implementação de uma política pública de apoio aos produtores de eletricidade EEG estabelecida pelo Estado limita‑se a reiterar a conclusão, já enunciada no n.o 40 do acórdão recorrido, de que estes mecanismos devem ser considerados imputáveis ao Estado. Assim, como resulta da jurisprudência referida no n.o 48 do presente acórdão, este elemento, embora seja necessário para se poder qualificar as vantagens resultantes dos mecanismos instituídos pela Lei EGG de 2012 de «auxílios», na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, não é, por si só, suficiente para se poder aceitar essa qualificação. Com efeito, há que demonstrar que as vantagens em causa são concedidas direta ou indiretamente através de recursos estatais.

64

Consequentemente, há que analisar se o Tribunal Geral podia, sem cometer um erro de direito, concluir, com base nos restantes três elementos mencionados no n.o 127 do acórdão recorrido e recordados no n.o 62 do presente acórdão, que os fundos gerados pela sobretaxa EEG constituíam recursos estatais.

65

No que diz respeito à afirmação segundo a qual os montantes gerados pela sobretaxa EEG são fundos que envolvem um recurso estatal, equiparáveis a um imposto, há que recordar que, no n.o 105 da decisão controvertida, a Comissão qualificou essa sobretaxa de «imposto especial» (special levy, na versão na língua original dessa decisão).

66

O Tribunal Geral salientou, no n.o 95 do acórdão recorrido, que «os fornecedores de eletricidade repercut[iam], na prática, o encargo financeiro resultante da sobretaxa EEG nos clientes finais», que essa repercussão devia «ser considerada uma consequência prevista e organizada pelo legislador alemão» e que o suplemento de preço ou custo adicional que os consumidores finais de eletricidade estão, de facto, obrigados a «pagar» era «um encargo imposto unilateralmente pelo Estado no âmbito da sua política de apoio aos produtores de eletricidade EEG […] equiparável, do ponto de vista dos seus efeitos, a um imposto sobre o consumo de eletricidade na Alemanha».

67

Foi com base nestas considerações que o Tribunal Geral afirmou no n.o 96 do acórdão recorrido, remetendo «por analogia» para o Acórdão de 17 de julho de 2008, Essent Newerk Noord e o. (C‑206/06, EU:C:2008:413, n.o 66), que os montantes gerados pela sobretaxa EEG eram fundos que envolviam recursos estatais equiparáveis a um imposto, tendo esta afirmação sido reiterada no n.o 127 do acórdão recorrido.

68

Todavia, no n.o 66 do Acórdão de 17 de julho de 2008, Essent Netwerk Noord e o. (C‑206/06, EU:C:2008:413), o Tribunal de Justiça, para a qualificação de «imposto» do suplemento do preço imposto aos compradores de eletricidade em causa no referido processo, remeteu para o n.o 47 desse acórdão. A conclusão enunciada neste último número, segundo a qual o suplemento em questão deve ser qualificado de imposição, baseava‑se, nomeadamente, no facto, referido pelo Tribunal de Justiça no n.o 45 desse acórdão, de esse suplemento do preço constituir um encargo unilateralmente imposto por lei, que os consumidores estavam obrigados a pagar.

69

Ora, as constatações feitas pelo Tribunal de Geral no n.o 95 do acórdão recorrido não permitiam estabelecer uma analogia entre esse suplemento de preço e a sobretaxa EEG.

70

Com efeito, como o Tribunal Geral recordou nos n.os 7 a 9 do acórdão recorrido, a sobretaxa EEG representa a eventual diferença entre o preço obtido pelos ORT no mercado à vista da eletricidade EEG que injetam na sua rede e o encargo financeiro que lhes impõe a obrigação legal de remunerar essa eletricidade às tarifas fixadas pela lei, diferença que os ORT têm o direito de exigir aos fornecedores que abastecem os clientes finais. Em contrapartida, a Lei EGG de 2012 não obriga os referidos fornecedores a repercutir nos clientes finais os montantes pagos a título da sobretaxa EEG.

71

O facto, constatado pelo Tribunal Geral no n.o 95 do acórdão recorrido, de, «na prática», o encargo financeiro resultante da sobretaxa EEG ser repercutido nos clientes finais e, por conseguinte, ser «equiparável, do ponto de vista dos seus efeitos, a um imposto sobre o consumo de eletricidade», não é suficiente para que se conclua que a sobretaxa EEG tinha as mesmas características que o suplemento do preço da eletricidade examinada pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 17 de julho de 2008, Essent Netwerk Noord e o. (C‑206/06, EU:C:2008:413).

72

Por conseguinte, há que verificar se os outros dois elementos, mencionados pelo Tribunal Geral no n.o 127 do acórdão recorrido e recordados no n.o 62 do presente acórdão, lhe permitem, contudo, concluir que os fundos gerados pela sobretaxa EEG constituíam recursos estatais, na medida em que se mantinham sob controlo público e, por conseguinte, à disposição das autoridades públicas, na aceção da jurisprudência referida no n.o 57 do presente acórdão. Nesse caso, é irrelevante que a sobretaxa EEG possa, ou não, ser qualificada de «imposto».

73

No entanto, há que constatar que o Tribunal Geral não provou nem que o Estado detinha um poder de disposição sobre os fundos gerados pela sobretaxa EEG nem sequer que exercia um controlo público sobre os ORT encarregados de gerir esses fundos.

74

Com efeito, em primeiro lugar, o Tribunal de Geral considerou que os fundos gerados pela sobretaxa EEG não se mantinham à disposição do Estado, mas apenas sob a influência dominante dos poderes públicos, na medida em que eram administrados coletivamente pelos ORT, podendo estes últimos ser coletivamente equiparados a uma entidade que executa uma concessão estatal. A este respeito, o Tribunal Geral limitou‑se a constatar que os fundos resultantes da sobretaxa EEG, por um lado, eram geridos para fins de interesse público pelos ORT, segundo as modalidades previamente definidas pelo legislador e, por outro, eram afetados ao financiamento dos regimes de apoio e de compensação, com exclusão de qualquer outro fim.

75

Ora, sem que seja necessário pronunciar‑se sobre a justeza da qualificação de concessão estatal adotada pelo Tribunal Geral, há que observar que, embora os elementos assim acolhidos evidenciem, na verdade, a origem legal do apoio à eletricidade EEG estabelecido pela Lei EGG de 2012 e, portanto, uma influência certa do Estado sobre os mecanismos instituídos pela Lei EGG de 2012, esses elementos não são, contudo, suficientes para que se possa concluir que o Estado tinha, contudo, poder para dispor dos fundos geridos e administrados pelos ORT.

76

Em particular, o facto de os fundos resultantes da sobretaxa EEG serem afetados exclusivamente ao financiamento dos regimes de apoio e de compensação, nos termos das disposições da Lei EGG de 2012, não implica que o Estado possa dispor dos mesmos, na aceção da jurisprudência referida no n.o 57 do presente acórdão. Este princípio legal de afetação exclusiva dos fundos provenientes da sobretaxa EEG tende antes a demonstrar, na falta de qualquer elemento em sentido contrário, que o Estado não podia precisamente dispor desses fundos, ou seja, decidir uma afetação diferente da prevista pela Lei EGG de 2012.

77

Em segundo lugar, o Tribunal Geral não demonstrou que os ORT se mantinham sob controlo público nem sequer que estavam sujeitos a um controlo público.

78

A este respeito, há que salientar que o Tribunal Geral efetivamente se esforçou em demonstrar, nos n.os 105 a 110 do acórdão recorrido, que os ORT, encarregados de gerir o sistema de ajuda à produção de eletricidade EEG, eram controlados de várias formas nessa missão.

79

Antes de mais, o Tribunal Geral constatou, no n.o 106 do acórdão recorrido, que os ORT não podiam utilizar os fundos resultantes da sobretaxa EEG para fins diferentes dos previstos pelo legislador. Em seguida, salientou no n.o 107 do acórdão recorrido, que os ORT estavam sujeitos à obrigação de gerir esses fundos numa conta comum específica e acrescentou que o cumprimento desta obrigação era objeto de controlo por instâncias estatais nos termos do § 61 da Lei EGG de 2012, sem todavia se pronunciar sobre a natureza e o alcance desse controlo. Por último, o Tribunal Geral expôs, nos n.os 108 a 110 do acórdão recorrido, que as instâncias estatais, neste caso, a BNetzA, exerciam um controlo estrito a múltiplos níveis sobre os atos dos ORT, garantido, nomeadamente que comercializam a eletricidade EEG em conformidade com o § 37 da Lei EGG de 2012 e determinam, fixam, publicam e cobram aos fornecedores de eletricidade a sobretaxa EEG no respeito das prescrições legislativas e regulamentares.

80

Ora, ainda que os elementos assim acolhidos permitam efetivamente concluir que as autoridades públicas exercem um controlo da boa execução da Lei EGG de 2012, não permitem, em contrapartida, concluir pela existência de um controlo público sobre os próprios fundos gerados pela sobretaxa EEG.

81

De resto, o Tribunal Geral concluiu a sua análise, no n.o 110 do acórdão recorrido, ao declarar que este controlo, que se inscrevia na lógica geral da estrutura de conjunto prevista pela Lei EGG de 2012, corroborava a conclusão, resultante da análise das missões e das obrigações dos ORT, de que estes últimos não atuam por conta própria e livremente, mas sim como gestores de um auxílio concedido através de fundos estatais. Acrescentou que, mesmo admitindo que esse controlo não tenha efeitos diretos sobre a gestão diária dos fundos em causa, se tratava de um elemento adicional destinado a assegurar que a ação dos ORT se mantinha circunscrita no quadro previsto pela Lei EGG de 2012. Por último, constatou, no n.o 118 do acórdão recorrido, que a inexistência de acesso efetivo do Estado aos recursos gerados pela sobretaxa EEG, no sentido de que não transitam pelo orçamento estatal, é irrelevante em termos da influência dominante do Estado na utilização desses recursos e da capacidade deste último para decidir, a montante, graças à adoção da Lei EGG de 2012, os objetivos a prosseguir e a utilização dos referidos recursos na sua totalidade.

82

É certo que, como o Tribunal Geral salientou no n.o 125 do acórdão recorrido, e como foi recordado no n.o 58 do presente acórdão, o Tribunal de Justiça teve a oportunidade de declarar que os fundos alimentados por contribuições obrigatórias impostas pela legislação de um Estado‑Membro, geridas e repartidas de acordo com essa legislação, podem ser considerados recursos estatais, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE, mesmo que sejam geridos por entidades distintas da autoridade pública (Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Association Vent De Colère! e o., C‑262/12, EU:C:2013:851, n.o 25).

83

No entanto, a solução adotada pelo Tribunal de Justiça neste último processo baseava‑se em dois elementos essenciais, que não se verificam no presente processo.

84

Com efeito, o Tribunal de Justiça teve o cuidado de salientar, por um lado, que a legislação nacional em causa no processo que deu origem a esse acórdão tinha instituído um princípio de cobertura integral da obrigação de compra pelo Estado francês, que o obrigava a um apuramento do passado e a uma cobertura integral dos custos adicionais impostos às empresas, no caso de o montante das contribuições cobradas aos consumidores finais de eletricidades ser insuficiente para cobrir esses custos adicionais (Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Association Vent De Colère! e o., C‑262/12, EU:C:2013:851, n.o 26). Ao fazê‑lo, o Tribunal de Justiça salientou a existência de um nexo entre a vantagem em causa e uma diminuição, pelo menos potencial, do orçamento de Estado.

85

Nos n.os 28 a 33 do Acórdão de 19 de dezembro de 2013, Association Vent De Colère! e o. (C‑262/12, EU:C:2013:851), o Tribunal de Justiça constatou, por outro lado, que as quantias destinadas a compensar os custos adicionais resultantes da obrigação de compra que impende sobre as empresas eram confiadas à Caisse des dépôts et consignations, ou seja, a uma pessoa coletiva de direito público mandatada pelo Estado francês para assegurar a prestação de serviços de gestão administrativa, financeira e contabilística por conta da Commission de régulation de l’énergie, autoridade administrativa independente, responsável por garantir o bom funcionamento do mercado da eletricidade e do gás em França, de modo que se devia considerar que essas quantias se mantinham sob controlo público.

86

Há, por isso, que concluir que os outros elementos referidos pelo Tribunal Geral no n.o 127 do acórdão recorrido também não permitiam concluir que os fundos gerados pela sobretaxa EEG eram recursos estatais.

87

Resulta do conjunto das considerações que precedem que a primeira parte do primeiro fundamento invocado pela República Federal da Alemanha é procedente e que, sem que seja necessário examinar a segunda parte do primeiro fundamento e os outros dois fundamentos do recurso, o acórdão recorrido deve ser anulado.

Quanto ao recurso no Tribunal Geral

88

Em conformidade com o artigo 61.o, primeiro parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, quando o recurso for julgado procedente, o Tribunal de Justiça anula a decisão do Tribunal Geral. Se o litígio estiver em condições de ser julgado, o Tribunal de Justiça pode decidi‑lo definitivamente.

89

No caso em apreço, o Tribunal de Justiça dispõe dos elementos necessários para decidir definitivamente sobre o recurso de anulação da decisão controvertida interposto pela República Federal da Alemanha no Tribunal Geral.

90

A este respeito, basta salientar que, pelos motivos enunciados nos n.os 48 a 87 do presente acórdão, a Comissão não demonstrou que as vantagens previstas pela Lei EGG de 2012, a saber, o regime de apoio à produção de eletricidade a partir de fontes de energia renováveis e de gás de extração financiado pela sobretaxa EEG e o regime de compensação especial relativo à sua redução para os grandes consumidores de energia, implicavam recursos estatais e constituíam, assim, auxílios de Estado, na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

91

Por conseguinte, há que julgar procedente terceiro fundamento invocado pela República Federal da Alemanha no âmbito do seu recurso interposto em primeira instância no Tribunal Geral, relativo à inexistência de uma vantagem financiada através de recursos estatais, e anular a decisão controvertida.

Quanto às despesas

92

Por força do disposto no artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso de uma decisão do Tribunal Geral for julgado procedente e o Tribunal de Justiça decidir definitivamente o litígio, decidirá igualmente sobre as despesas.

93

De acordo com o artigo 138.o, n.o 1, deste regulamento, aplicável ao processo de recurso por força do artigo 184.o, n.o 1, do referido regulamento, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

94

Tendo a República Federal da Alemanha pedido a condenação da Comissão e tendo esta sido vencida nos seus fundamentos, há que condená‑la nas despesas incorridas quer no processo de recurso quer no processo em primeira instância.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) decide:

 

1)

O Acórdão do Tribunal Geral da União de 10 de maio de 2016, Alemanha/Comissão (T‑47/15, EU:T:2016:281), é anulado.

 

2)

A Decisão (UE) 2015/1585 da Comissão, de 25 de novembro de 2014, relativa ao regime de auxílio SA.33995 (2013/C) (ex 2013/NN) [concedido pela Alemanha para apoiar a eletricidade produzida a partir de fontes renováveis e os grandes consumidores de energia], é anulada.

 

3)

A Comissão Europeia é condenada nas despesas incorridas quer no presente recurso quer no processo em primeira instância.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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