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Document 62015TJ0356

Acórdão do Tribunal Geral (Quinta Secção) de 12 de julho de 2018.
República da Áustria contra Comissão Europeia.
Auxílios de Estado — Auxílio previsto pelo Reino Unido à unidade C da Central Nuclear de Hinkley Point — Contrato diferencial, acordo do secretário de Estado e garantia de crédito — Decisão que declara o auxílio compatível com o mercado interno — Artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE — Objetivo de interesse público — Promoção da energia nuclear — Necessidade de uma intervenção do Estado — Comunicação sobre as garantias — Determinação do elemento de auxílio — Proporcionalidade — Auxílio ao investimento — Auxílio ao funcionamento — Direito de apresentar observações — Procedimento de adjudicação de contratos públicos — Dever de fundamentação.
Processo T-356/15.

ECLI identifier: ECLI:EU:T:2018:439

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

12 de julho de 2018 ( *1 )

«Auxílios de Estado — Auxílio previsto pelo Reino Unido à unidade C da Central Nuclear de Hinkley Point — Contrato diferencial, acordo do secretário de Estado e garantia de crédito — Decisão que declara o auxílio compatível com o mercado interno — Artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE — Objetivo de interesse público — Promoção da energia nuclear — Necessidade de uma intervenção do Estado — Comunicação sobre as garantias — Determinação do elemento de auxílio — Proporcionalidade — Auxílio ao investimento — Auxílio ao funcionamento — Direito de apresentar observações — Procedimento de adjudicação de contratos públicos — Dever de fundamentação»

No processo T‑356/15,

República da Áustria, representada inicialmente por C. Pesendorfer e M. Klamert, e em seguida por G. Hesse e M. Fruhmann, na qualidade de agentes, assistidos por H. Kristoferitsch, avocat,

recorrente,

apoiada por:

Grão Ducado do Luxemburgo, representado por D. Holderer, na qualidade de agente, assistida por P. Kinsch, avocat,

interveniente,

contra

Comissão Europeia, representada por É. Gippini Fournier, R. Sauer, T. Maxian Rusche e P. Němečková, na qualidade de agentes,

recorrida,

apoiada por:

República Checa, representada por M. Smolek T. Müller e J. Vláčil, na qualidade de agentes,

por

República Francesa, representada inicialmente por G. de Bergues, D. Colas e J. Bousin, e em seguida por D. Colas e J. Bousin, na qualidade de agentes,

por

Hungria, representada inicialmente por M. Fehér e M. Bóra, e em seguida por B. Sonkodi, e em seguida por A. Steiner, na qualidade de agentes, assistidos por P. Nagy, avocat, e por último por M. Steiner,

por

República da Polónia, representada por B. Majczyna, na qualidade de agente,

por

Roménia, representada inicialmente por R. Radu e M. Bejenar, e em seguida por M. Bejenar e C.‑R. Canţăr, na qualidade de agentes,

por

República da Eslováquia, representada por B. Ricziová, na qualidade de agente,

e por

Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, representado inicialmente por C. Brodie e S. Brandon, seguidamente por C. Brodie, S. Simmons e M. Holt, seguidamente ainda por C. Brodie, S. Simmons e D. Robertson, depois por C. Brodie e D. Robertson, seguidamente ainda por C. Brodie, e por último por C. Brodie e Z. Lavery, na qualidade de agentes, assistidos por T. Johnston, barrister, e A. Robertson, QC,

intervenientes,

que tem por objeto um pedido baseado no artigo 263.o TFUE e destinado à anulação da Decisão (UE) 2015/658 da Comissão, de 8 de outubro de 2014, relativa à medida de auxílio SA.34947 (2013/C) (ex 2013/N) que o Reino Unido tenciona implementar para apoio à central nuclear Hinkley Point C (JO 2015, L 109, p. 44), na qual a Comissão concluiu que essa medida de auxílio era compatível com o mercado interno na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE e autorizou a sua execução,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção),

composto por: D. Gratsias, presidente, A. Dittrich (relator) e P. G. Xuereb, juízes,

secretário: N. Schall, administradora,

vistos os autos e após a audiência de 5 de outubro de 2017,

profere o presente

Acórdão

I. Antecedentes do litígio

1

Em 22 de outubro de 2013, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte notificou as medidas de apoio à central nuclear Hinkley Point C (a seguir «Hinkley Point C»). O beneficiário das medidas notificadas é a sociedade NNB Generation Company Limited (a seguir «NNBG»), uma filial da EDF Energy plc (a seguir «EDF»).

2

Em 18 de dezembro de 2013, a Comissão Europeia decidiu abrir um procedimento formal de investigação relativamente às medidas notificadas. Essa decisão foi publicada no Jornal Oficial da União Europeia em 7 de março de 2014 (JO 2014, C 69, p. 60).

3

Em 8 de outubro de 2014, a Comissão adotou a Decisão (UE) 2015/658, relativa à medida de auxílio SA.34947 (2013/C) (ex 2013/N) que o Reino Unido tenciona implementar para apoio à central nuclear Hinkley Point C (JO 2015, L 109, p. 44, a seguir «decisão impugnada»).

4

As medidas notificadas pelo Reino Unido estão descritas no n.o 2 da decisão impugnada.

5

A primeira medida notificada, que está descrita no n.o 2.1 da decisão impugnada, é um contrato diferencial. Trata‑se de um instrumento que visa garantir a estabilidade dos preços nas vendas de eletricidade da NNBG durante a fase operacional de Hinkley Point C. Aí se estipula que a NNBG venderá no mercado a eletricidade produzida na referida unidade. No entanto, o montante de receitas da NNBG será estabilizado pelo contrato diferencial. Para o efeito, o preço de exercício, que foi calculado tendo por base os custos previstos para a construção e funcionamento da NNBG e que inclui um lucro razoável, será comparado ao preço de referência, que corresponderá à média ponderada dos preços grossistas fixados pelo Reino Unido para todos os operadores apoiados por um contrato diferencial e que refletirá os preços do mercado. No caso da NNBG, o preço de referência relevante é o do mercado de carga de base, que é aplicável a todos os operadores geradores de carga de base. Quando o preço de referência for inferior ao preço de exercício, a NNBG receberá um pagamento compensatório correspondente à diferença entre estes dois preços. Este direito a um pagamento compensatório será limitado por um teto máximo de produção. Em contrapartida, quando o preço de referência for superior ao preço de exercício, a NNBG será obrigada a pagar a diferença entre esses dois preços à outra parte no contrato diferencial (a seguir «cocontratante da NNBG»). A cocontratante da NNBG será a Low Carbon Contracts Company Ltd, uma entidade que será financiada por uma obrigação legal que recai, de forma coletiva, sobre todos os fornecedores autorizados. Existirão dois mecanismos de partilha dos ganhos, o primeiro dos quais é sobre os custos de produção e o segundo refere‑se à taxa de rentabilidade dos capitais próprios. Estarão previstas duas datas de reabertura das negociações das despesas operacionais, a primeira das quais será 15 anos e a segunda 25 anos após a data de entrada em funcionamento do primeiro reator.

6

O contrato diferencial prevê, sob certas condições, uma indemnização da NNBG para determinadas alterações legislativas. Por outro lado, sob certas condições, esta receberá uma indemnização devido ao encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point por motivos políticos e devido a circunstâncias relacionadas com um seguro de responsabilidade civil contra acidentes nucleares. Em tais casos, tanto os investidores da NNBG como o Reino Unido poderão pedir a transferência da NNBG para o Governo do Reino Unido e será devida uma indemnização aos referidos investidores.

7

A segunda medida notificada, que é descrita no n.o 2.3 da decisão impugnada, é um acordo entre o secretário de Estado para a Energia e Alterações Climáticas do Reino Unido e os investidores da NNBG (a seguir «acordo do secretário de Estado»). Este acordo completa o contrato diferencial. Prevê que, se, na sequência de um encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point por motivos políticos, o cocontratante da NNBG não cumprir a sua obrigação de pagamento compensatório aos investidores da NNBG, o secretário de Estado em questão pagará a indemnização acordada aos investidores. Prevê igualmente mecanismos de partilha dos ganhos.

8

A terceira medida notificada, que é descrita no n.o 2.2 da decisão impugnada, é uma garantia de crédito do Reino Unido sobre as obrigações a emitir pela NNBG que assegura o pagamento atempado do capital em dívida e dos juros da dívida elegível, que podem atingir os 17 mil milhões de libras esterlinas (GBP). A taxa de remuneração de garantia que a Comissão autorizou na referida decisão tem um nível de 295 pontos base.

9

No n.o 7 da decisão impugnada, a Comissão afirmou que as três medidas notificadas acima referidas (a seguir «medidas em causa») constituíam um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE.

10

Nos n.os 9 e 10 da decisão impugnada, a Comissão apreciou se as medidas em causa podiam ser declaradas compatíveis com o mercado interno em aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Neste contexto, no ponto 9.1 desta decisão, afirmou que estas medidas eram compatíveis com a regulamentação atual do mercado. No ponto 9.2 da referida decisão, constatou que o objetivo de interesse público que o Reino Unido prosseguia através destas medidas era a promoção da energia nuclear e, mais especificamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear. Segundo as considerações da Comissão que constam do ponto 9.3 da mesma decisão, era necessária uma intervenção do Reino Unido para alcançar este objetivo em tempo útil. No ponto 9.4 da decisão em questão, a Comissão analisou se as medidas em causa constituíam instrumentos adequados para alcançar este objetivo e se tinham um efeito de incentivo. Nos n.os 9.5 e 9.6 da decisão, apreciou a proporcionalidade das medidas em causa e constatou que, sem prejuízo de um ajustamento da taxa de remuneração de garantia de crédito em 295 pontos base e de uma alteração dos mecanismos em matéria de partilha dos ganhos, as medidas em causa deviam ser consideradas necessárias e que, em geral, a probabilidade de distorções da concorrência é limitada e que os efeitos negativos das medidas em causa eram compensados pelos seus efeitos positivos. Foi com base nestas considerações que, no n.o 10 da decisão impugnada, a Comissão concluiu que as medidas em causa eram compatíveis com o mercado interno, nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE.

11

O artigo 1.o, primeiro parágrafo, da decisão impugnada tem a seguinte redação:

«O auxílio à [Hinkley Point C] sob a forma de um Contrato Diferencial, do Acordo do secretário de Estado e de uma garantia de crédito, bem como todos os elementos conexos que o Reino Unido tenciona aplicar, é compatível com o mercado interno na aceção do artigo 107.o, n.o 3, [alínea] c), [TFUE].»

II. Tramitação no Tribunal Geral e pedidos das partes

12

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de julho de 2015, a República da Áustria interpôs o presente recurso.

13

Em 18 de setembro de 2015, a Comissão apresentou a contestação.

14

Em 5 de novembro de 2015, a República da Áustria apresentou a réplica.

15

Em 15 de janeiro de 2016, a Comissão apresentou a tréplica.

16

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 9 de novembro de 2015, a República da Eslováquia pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão. Por Decisão do presidente de Secção de 9 de dezembro de 2015, foi admitida a intervenção desse Estado‑Membro em apoio dos pedidos da Comissão. Em 14 de março de 2016, apresentou as suas alegações de intervenção.

17

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 20 de novembro de 2015, o Grão‑Ducado do Luxemburgo pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da República da Áustria. Por Decisão do presidente de Secção de 18 de dezembro de 2015, foi admitida a intervenção do Grão‑Ducado do Luxemburgo em apoio dos pedidos da República da Áustria. Em 24 de março de 2016, apresentou as suas alegações de intervenção.

18

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de novembro de 2015, a Hungria pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão. Por Decisão do presidente de Secção de 6 de janeiro de 2016, foi admitida a intervenção desse Estado‑Membro em apoio dos pedidos da Comissão. Em 24 de março de 2016, apresentou as suas alegações de intervenção.

19

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 26 de novembro de 2015, o Reino Unido pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão. Por Decisão do presidente de Secção de 6 de janeiro de 2016, foi admitida a intervenção desse Estado‑Membro em apoio dos pedidos da Comissão. Em 23 de março de 2016, apresentou as suas alegações de intervenção.

20

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 30 de novembro de 2015, a República Francesa pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão. Por Decisão do presidente de Secção de 11 de janeiro de 2016, foi admitida a intervenção desse Estado‑Membro em apoio dos pedidos da Comissão. Em 18 de março de 2016, apresentou as suas alegações de intervenção.

21

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 2 de dezembro de 2015, a República Checa pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão. Por Decisão do presidente de Secção de 11 de janeiro de 2016, foi admitida a intervenção desse Estado‑Membro em apoio dos pedidos da Comissão. Em 24 de março de 2016, apresentou as suas alegações de intervenção.

22

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 3 de dezembro de 2015, a República da Polónia pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão. Por Decisão do Presidente de Secção de 11 de janeiro de 2016, foi admitida a intervenção desse Estado‑Membro em apoio dos pedidos da Comissão. Em 24 de março de 2016, apresentou as suas alegações de intervenção.

23

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 3 de dezembro de 2015, a Roménia pediu para intervir no presente processo em apoio dos pedidos da Comissão. Por Decisão do presidente de Secção de 11 de janeiro de 2016, foi admitida a intervenção desse Estado‑Membro em apoio dos pedidos da Comissão. Em 24 de março de 2016, apresentou as suas alegações de intervenção.

24

Em 21 de julho de 2016, a República da Áustria apresentou as suas observações sobre as alegações de intervenção da República Checa, da República Francesa, da Hungria, da República da Polónia, da Roménia, da República da Eslováquia e do Reino Unido.

25

Em 19 de julho de 2016, a Comissão apresentou as suas observações sobre as alegações de intervenção do Grão‑Ducado do Luxemburgo.

26

Sob proposta do juiz‑relator, o Tribunal Geral (Quinta Secção) decidiu dar início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 89.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, colocou questões escritas à República da Áustria, ao Reino Unido e à Comissão. Estas partes responderam a essas questões nos prazos fixados.

27

Em 14 de setembro de 2017, a Comissão apresentou uma oferta de prova a que estava anexa um documento. Essa oferta e esse documento foram juntos aos autos e as outras partes tiveram oportunidade de apresentar as suas observações sobre os mesmos.

28

Por cartas de 18 e de 28 de setembro de 2017, a República da Eslováquia e o Reino Unido apresentaram observações sobre o relatório para audiência.

29

As alegações e as respostas da Comissão, da República Checa, da República Francesa, do Grão‑Ducado do Luxemburgo, da Hungria, da República da Áustria e do Reino Unido às questões colocadas pelo Tribunal Geral foram ouvidas na audiência de 5 de outubro de 2017.

30

O Grão‑Ducado do Luxemburgo e a República da Áustria concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

anular a decisão impugnada;

condenar a Comissão nas despesas.

31

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

julgar improcedente o recurso;

condenar a República da Áustria nas despesas.

32

A República Checa e a República da Eslováquia concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

julgar improcedente o recurso;

condenar a República da Áustria nas despesas.

33

A Hungria conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:

julgar improcedente o recurso;

condenar a República da Áustria em todas as despesas relativas ao presente processo, incluindo custos administrativos e encargos com advogado.

34

A República Francesa, a República da Polónia, a Roménia e o Reino Unido concluem pedindo que o Tribunal Geral se digne:

julgar improcedente o recurso.

III. Questão de direito

35

O recurso baseia‑se em dez fundamentos.

36

Com o primeiro fundamento, a República da Áustria alega que a Comissão errou, por um lado, ao admitir a existência de um mercado distinto da energia nuclear e, por outro, ao basear‑se numa deficiência deste mercado.

37

O segundo fundamento é relativo ao caráter alegadamente errado da conclusão da Comissão segundo a qual a tecnologia utilizada em Hinkley Point C é nova.

38

O terceiro fundamento é relativo ao facto de a Comissão ter considerado incorretamente que as medidas em causa constituíam um auxílio ao investimento. Segundo a República da Áustria, estas medidas constituem auxílios ao funcionamento que são incompatíveis com o mercado interno.

39

Com o quarto fundamento, a República da Áustria alega que, contrariamente ao que afirma a Comissão, a construção de Hinkley Point C não visa realizar um objetivo de interesse «comum».

40

No âmbito do quinto fundamento, a República da Áustria defende que a Comissão não determinou de forma suficiente os elementos de auxílio incluídos nas medidas em causa.

41

O sexto fundamento visa demonstrar o caráter alegadamente errado da conclusão da Comissão segundo a qual as medidas em causa eram conformes ao princípio da proporcionalidade.

42

No âmbito do sétimo fundamento, a República da Áustria alega que o Reino Unido devia ter lançado um procedimento de adjudicação de um contrato público relativamente em Hinkley Point C.

43

Com o oitavo fundamento, a República da Áustria alega que a Comissão não respeitou a comunicação desta sobre a aplicação dos artigos [107.o] e [108.o] do Tratado [FUE] aos auxílios estatais sob forma de garantias (JO 2008, C 155, p. 10, a seguir «comunicação sobre as garantias»).

44

O nono fundamento é relativo a uma violação do dever de fundamentação.

45

O décimo fundamento respeita a uma violação do direito de audiência.

46

No presente recurso, a República da Áustria questiona a conclusão da Comissão de que as medidas em causa podiam ser declaradas compatíveis com o mercado interno na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE.

47

Nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, os auxílios destinados a facilitar o desenvolvimento de certas atividades ou regiões económicas, quando não alterem as condições das trocas comerciais de maneira que contrariem o interesse comum, podem ser considerados compatíveis com o mercado interno.

48

Como resulta da jurisprudência, para poder ser declarado compatível com o mercado interno em aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, um auxílio deve visar o desenvolvimento de uma atividade que constitua um objetivo de interesse público e deve ser adequado, necessário e não excessivo (v., neste sentido, Acórdão de 15 de junho de 2010, Mediaset/Comissão, T‑177/07, EU:T:2010:233, n.o 125).

49

Tendo em conta o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, importa começar por apreciar o quarto fundamento, relativo ao objetivo de interesse público determinado pelo Reino Unido, ou seja, a promoção da eletricidade nuclear e, mais especificamente, a construção de novas capacidades de produção de energia nuclear, e, em seguida, analisar o segundo fundamento, relativo ao caráter alegadamente errado da conclusão da Comissão segundo a qual a tecnologia utilizada em Hinkley Point C era nova, posteriormente o primeiro fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter cometido erros no que respeita à definição do mercado em causa e considerado incorretamente que existia uma deficiência de mercado, assim como os quinto e oitavo fundamentos, relativos a uma determinação insuficiente das medidas em causa e do desrespeito da comunicação sobre as garantias, e, por último, o sexto fundamento, que visa o princípio da proporcionalidade.

50

Tendo em conta o resultado da apreciação destes fundamentos, será analisado o terceiro fundamento, relativo ao facto de as medidas em causa constituírem auxílios ao funcionamento incompatíveis com o mercado interno.

51

Em seguida, serão apreciados o sétimo fundamento, relativo ao facto de o Reino Unido dever ter lançado um procedimento de adjudicação de um contrato relativamente à Hinkley Point C, e o décimo fundamento, relativo a uma violação do direito de audiência.

52

O nono fundamento, relativo a uma violação do dever de fundamentação, está dividido em seis partes, que visam as considerações da Comissão cujo mérito é posto em causa no âmbito dos primeiro a sexto fundamentos. Estas partes serão apreciadas conjuntamente com os fundamentos conexos.

53

Antes de apreciar os fundamentos invocados pela República da Áustria, importa, todavia, analisar os seus argumentos relativos à inadmissibilidade das alegações de intervenção apresentadas pela Hungria.

A. Quanto aos argumentos relativos à inadmissibilidade das alegações de intervenção apresentadas pela Hungria

54

A República da Áustria afirma que as alegações de intervenção da Hungria devem ser julgadas inadmissíveis. Em seu entender, as alegações de intervenção apenas podem ter como objeto o apoio aos pedidos de uma das partes principais. Sublinha que foi admitida a intervenção da Hungria em apoio dos pedidos da Comissão, que pede a improcedência do pedido de anulação da decisão impugnada e que esta decisão se baseia no artigo 107.o TFUE. Ora, nas referidas alegações de intervenção, a Hungria alega que o artigo 107.o TFUE não é aplicável no domínio da energia atómica. Segundo a República da Áustria, se estes argumentos fossem aceites, conduziriam à anulação da decisão impugnada. Por conseguinte, a Hungria não apoia os pedidos da Comissão.

55

A este respeito, cabe recordar que, nos termos do artigo 40.o, quarto parágrafo, do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e do artigo 142.o do Regulamento de Processo, a intervenção só pode ter por objeto apoiar, no todo ou em parte, os pedidos de uma das partes principais. No entanto, estas disposições não se opõem a que o interveniente apresente argumentos diferentes dos da parte que apoia, desde que não alterem o quadro do litígio e a intervenção tenha sempre por objetivo o apoio dos pedidos apresentados por essa parte (v., neste sentido, Acórdão de 8 de junho de 1995, Siemens/Comissão, T‑459/93, EU:T:1995:100, n.o 21).

56

No que respeita às alegações de intervenção apresentadas pela Hungria, em primeiro lugar, há que sublinhar que os pedidos deste Estado‑Membro se alinham com os da Comissão, uma vez que pede a improcedência do pedido de anulação da decisão impugnada da República da Áustria.

57

Em segundo lugar, há que observar que resulta das alegações de intervenção da Hungria que este Estado‑Membro não contesta que, nas circunstâncias do caso em apreço, a Comissão podia adotar a decisão impugnada com base no artigo 107.o TFUE.

58

Nestas circunstâncias, mesmo admitindo que se deva considerar que alguns argumentos apresentados pela Hungria, relativos à competência da Comissão para adotar decisões baseadas nos artigos 107.o e 108.o TFUE no domínio da energia nuclear, alteram o quadro do litígio, isto não justifica, contrariamente ao que alega a República da Áustria, que as alegações de intervenção da Hungria sejam julgadas inadmissíveis na íntegra.

B. Quanto ao quarto fundamento, relativo ao facto de a promoção da energia nuclear não constituir um objetivo de interesse «comum», e quanto à quinta parte do nono fundamento, relativo a uma fundamentação insuficiente da decisão impugnada

59

O quarto fundamento e a quinta parte do nono fundamento visam a conclusão da Comissão que figura nos considerandos 366 a 374 da decisão impugnada, segundo a qual o objetivo que o Reino Unido prosseguia com as medidas em causa, ou seja, o objetivo de promoção da energia nuclear, constitui um objetivo de interesse «comum».

60

Numa primeira fase, serão apreciados os argumentos que a República da Áustria apresenta no âmbito da quinta parte do nono fundamento e que visam demonstrar que a decisão impugnada não está suficientemente fundamentada no que respeita à conclusão de que o objetivo que o Reino Unido prosseguia com as medidas em causa constitui um objetivo de interesse «comum». Numa segunda fase, serão analisados os argumentos que o Grão‑Ducado do Luxemburgo e a República da Áustria desenvolvem em apoio do quarto fundamento e que visam pôr em causa o mérito das considerações da Comissão que figuram nos considerandos 366 a 374 da decisão impugnada.

1.   Quanto à quinta parte do nono fundamento, relativo a uma fundamentação insuficiente da decisão impugnada

61

No âmbito da quinta parte do nono fundamento, a República da Áustria alega que a decisão impugnada não está suficientemente fundamentada a respeito da conclusão de que o objetivo que o Reino Unido prosseguia com as medidas em causa constitui um objetivo de interesse «comum», na medida em que, na referida decisão, a Comissão não expôs de forma suficiente a articulação entre as disposições do Tratado Euratom e as regras sobre os auxílios estatais previstas no Tratado FUE. Entende que as considerações da referida instituição a este respeito são incompreensíveis e insuficientes.

62

A Comissão contesta este argumento.

63

A este respeito, a título preliminar, cabe recordar que a fundamentação exigida pelo artigo 296.o TFUE deva ser adaptada à natureza do ato em causa e deixar transparecer, de forma clara e inequívoca, o raciocínio da instituição autora do ato, de forma a permitir aos interessados conhecerem as razões da medida adotada e ao órgão jurisdicional competente exercer a sua fiscalização (Acórdão de 22 de junho de 2006, Bélgica e Forum 187/Comissão, C‑182/03 e C‑217/03, EU:C:2006:416, n.o 137). A exigência de fundamentação deve ser apreciada em função das circunstâncias do caso concreto, designadamente o conteúdo do ato, a natureza dos fundamentos invocados e o interesse que os destinatários ou outras pessoas direta e individualmente afetadas pelo ato possam ter em obter explicações. Não se exige que a fundamentação especifique todos os elementos de facto e de direito relevantes, na medida em que a questão de saber se a fundamentação de um ato satisfaz as exigências do artigo 296.o TFUE deve ser apreciada à luz não somente do seu teor mas também do seu contexto e do conjunto das normas jurídicas que regem a matéria em causa (Acórdão de 11 de julho de 2014, DTS Distribuidora de Televisión Digital/Comissão, T‑533/10, EU:T:2014:629, n.o 199).

64

É à luz desta jurisprudência que se deve apreciar se é suficiente a fundamentação da decisão impugnada relativamente à conclusão de que o objetivo que o Reino Unido prosseguia com as medidas em causa constitui um objetivo de interesse «comum».

65

A este respeito, em primeiro lugar, há que observar que é certo que, nos considerandos 366 a 374 da decisão impugnada, a Comissão não se pronunciou expressamente sobre a articulação entre as disposições do Tratado Euratom e o artigo 107.o TFUE. Todavia, deve salientar‑se que resulta, nomeadamente, do n.o 7 da referida decisão, sob a epígrafe «Existência de auxílio estatal», que a Comissão considerou que o artigo 107.o TFUE era aplicável às medidas em causa. Importa igualmente observar que, no ponto 9.2 dessa decisão, sob a epígrafe «Objetivos de interesse comum», a Comissão baseou a sua conclusão de que a promoção da energia nuclear constituía um objetivo de interesse «comum», nomeadamente, no artigo 2.o, alínea c), e no artigo 40.o do Tratado Euratom. Assim, resulta deste último número que a Comissão considerou que, no âmbito da aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, deviam ser tidas em conta as disposições do Tratado Euratom.

66

Em segundo lugar, deve recordar‑se que importa ter em conta o contexto em que se insere a decisão impugnada, do qual faz parte a prática anterior da Comissão que os Estados‑Membros são obrigados a conhecer. Ora, o critério que a Comissão seguiu na referida decisão é conforme com a sua prática anterior de, por um lado, as medidas de um Estado‑Membro que visavam o domínio regulado pelo Tratado Euratom terem que ser igualmente apreciadas à luz do artigo 107.o TFUE, visto não serem necessárias para a realização dos objetivos do Tratado Euratom ultrapassarem esses objetivos ou provocarem ou ameaçarem provocar uma distorção de concorrência no mercado interno (v., a este respeito, Decisão 2005/407/CE da Comissão, de 22 de setembro de 2004, relativa aos auxílios estatais que o Reino Unido prevê instituir a favor da British Energy plc, JO 2005, L 142, p. 26, considerando 239) e ainda de um objetivo abrangido pelo Tratado Euratom poder constituir um objetivo de interesse público na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE (v., neste sentido, Decisão 2006/643/CE da Comissão, de 4 de abril de 2006, relativa aos auxílios estatais que o Reino Unido pretende instituir tendo em vista a criação da Nuclear Decommissioning Authority, JO 2006, L 268 p. 37, considerando 162).

67

Tendo em conta estes elementos, há que concluir que resulta de forma suficientemente clara dos fundamentos da decisão impugnada que a Comissão considerou que, mesmo se as medidas em causa respeitassem à energia nuclear, na medida em que constituíam auxílios estatais, importava apreciar a sua compatibilidade com o mercado interno em aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Resulta igualmente de forma suficientemente clara dos referidos fundamentos que a Comissão considerou que, no âmbito da aplicação desta disposição, nomeadamente no que respeita à qualificação da promoção da energia nuclear como objetivo de interesse público na aceção desta disposição, deviam ser tidas em conta as disposições do Tratado Euratom. Assim, estes fundamentos permitiam à República da Áustria conhecer as justificações da referida decisão e permitem ao Tribunal Geral exercer a sua fiscalização.

68

Por conseguinte, deve ser julgada improcedente a quinta parte do nono fundamento, relativa a uma violação do dever de fundamentação.

2.   Quanto ao quarto fundamento, que visa o mérito das considerações da Comissão

69

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo apresentam argumentos que visam pôr em causa o mérito das considerações da Comissão que figuram nos considerandos 366 a 374 da decisão impugnada. Em substância, estes Estados‑Membros defendem que, contrariamente às conclusões da Comissão, a promoção da energia nuclear não responde a qualquer interesse comum.

70

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

71

Antes de apreciar os argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo que visam pôr em causa a conclusão da Comissão segundo a qual a promoção da energia nuclear constitui um objetivo de interesse «comum», importa analisar, a título preliminar, a questão de saber em que medida o artigo 107.o TFUE é aplicável às medidas relativas ao domínio da energia nuclear e em que medida devem ser tidos em conta os objetivos do Tratado Euratom no âmbito da sua aplicação.

a)   Quanto à aplicação do artigo 107.o TFUE às medidas relativas ao domínio da energia nuclear e quanto à tomada em consideração dos objetivos do Tratado Euratom no âmbito da aplicação desta disposição

72

No que respeita à aplicação do artigo 107.o TFUE às medidas relativas ao domínio da energia nuclear, cabe recordar que, nos termos do artigo 106.o‑A, n.o 3, do Tratado Euratom, as disposições do Tratado UE e do Tratado FUE não derrogam as disposições do Tratado Euratom. Por conseguinte, as disposições do Tratado Euratom constituem regras especiais em relação às disposições do Tratado FUE e, assim, derrogam estas últimas em caso de conflito.

73

Todavia, o facto de as disposições do Tratado Euratom constituírem regras especiais em relação às disposições do Tratado FUE não se opõe a que o artigo 107.o TFUE seja aplicado às medidas que prosseguem um objetivo do Tratado Euratom. Com efeito, na medida em que o Tratado Euratom não prevê regras específicas a este respeito, as disposições do Tratado FUE relativas a uma política da União podem ser aplicadas a tais medidas [v., neste sentido, Acórdãos de 29 de março de 1990,Grécia/Conselho, C‑62/88, EU:C:1990:153, n.o 17; de 12 de abril de 2005, Comissão/Reino Unido, C‑61/03, EU:C:2005:210, n.o 44; e de 4 de junho de 2015, Kernkraftwerke Lippe‑Ems, C‑5/14, EU:C:2015:354, n.os 69 à 82; v., igualmente, por analogia, Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 24].

74

Ora, há que observar que o Tratado Euratom não inclui regras exaustivas em matéria de concorrência suscetíveis de impedirem uma aplicação das regras previstas no título VII, capítulo 1, do Tratado FUE. Nomeadamente, o Tratado Euratom não prevê regras exaustivas sobre os auxílios estatais.

75

É certo que algumas disposições do Tratado Euratom, tais como o seu artigo 2.o, alínea c), e as disposições previstas no seu título II, capítulo 4, são relativas aos investimentos no domínio da energia nuclear. Todavia, estas disposições não indicam em que condições para, apesar das distorções da concorrência que causam, os auxílios estatais respeitantes a investimentos no domínio da energia nuclear podem ser considerados compatíveis com o mercado interno.

76

Por conseguinte, o artigo 107.o TFUE pode aplicar‑se às medidas em causa, mesmo que prossigam um objetivo do Tratado Euratom.

77

Esta conclusão não é posta em causa pelo artigo 106.o‑A, n.o 1, do Tratado Euratom, que enumera algumas disposições do Tratado UE e do Tratado FUE que se aplicam ao Tratado Euratom. Como resulta do segundo considerando do Protocolo n.o 2 que altera o Tratado Euratom, anexo ao Tratado de Lisboa (JO 2007, C 306, p. 199), esta disposição limita‑se a adaptar o referido tratado às novas regras fixadas pelo Tratado UE e pelo Tratado FUE, designadamente nos domínios institucional e financeiro. Em contrapartida, não pode deduzir‑se desta disposição que todas as disposições do Tratado UE e do Tratado FUE que aí não são referidas não podem ser aplicadas às medidas que prosseguem objetivos abrangidos pelo domínio do Tratado Euratom. Com efeito, tal leitura do artigo 106.o‑A, n.o 1, do Tratado Euratom não é conforme ao n.o 3 deste artigo, pelo que é possível deduzir que, em princípio, as disposições do Tratado UE e do Tratado FUE podem ser aplicadas no domínio da energia nuclear e que é apenas por o Tratado Euratom prever regras especiais que as disposições do Tratado UE e do Tratado FUE não são aplicáveis.

78

Por conseguinte, o artigo 107.o TFUE é aplicável às medidas em causa. Todavia, no âmbito da aplicação desta disposição às medidas relativas ao domínio da energia nuclear, há que ter em conta as disposições e os objetivos do Tratado Euratom.

b)   Quanto aos argumentos que visam pôr em causa a conclusão da Comissão de que a promoção da energia nuclear constitui um objetivo de interesse «comum»

79

As considerações acima expostas nos n.os 72 a 78 devem ser tidas em conta na apreciação dos argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo que visam pôr em causa a conclusão da Comissão, constante do considerando 374 da decisão impugnada, segundo a qual o objetivo de promoção da energia nuclear que o Reino Unido prosseguia com as medidas em causa, ou seja, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, constituía um objetivo de interesse «comum».

80

Em primeiro lugar, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que, se um objetivo não tem em conta os interesses justificados de um único Estado‑Membro, não pode ser qualificado de objetivo de interesse comum e sublinham igualmente que alguns Estados‑Membros sempre rejeitaram a ideia de que a construção de novos reatores nucleares constitui um objetivo de interesse comum europeu.

81

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

82

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que, nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, os auxílios destinados a facilitar o desenvolvimento de certas atividades ou regiões económicas podem ser considerados compatíveis com o mercado interno, quando não alterem as condições das trocas comerciais de maneira que contrariem o interesse comum.

83

Em segundo lugar, há que observar que é certo que, no n.o 125 do Acórdão de 15 de junho de 2010, Mediaset/Comissão (T‑177/07, EU:T:2010:233), o Tribunal Geral declarou que, para ser compatível com o mercado interno na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, um auxílio deve prosseguir um objetivo de interesse «comum» e ser adequado, necessário e não excessivo.

84

Todavia, a referência, no Acórdão de 15 de junho de 2010, Mediaset/Comissão (T‑177/07, EU:T:2010:233), à prossecução de um objetivo de interesse «comum», não pode ser entendida como uma exigência, segundo a qual apenas os objetivos que são do interesse de todos os Estados‑Membros ou da maioria destes podem ser tidos em conta no âmbito da aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE.

85

Com efeito, no âmbito da aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, há que distinguir entre, por um lado, o objetivo prosseguido por um Estado‑Membro, que pode consistir, nomeadamente, no desenvolvimento de uma atividade e, por outro, a condição de o auxílio estatal não alterar as condições das trocas comerciais de forma contrária ao interesse comum.

86

Não se pode considerar que o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE limita os objetivos que podem ser prosseguidos pelos Estados‑Membros aos que são do interesse de todos ou da maioria dos Estados‑Membros da União. A este respeito, fazendo referência a um interesse «comum» no n.o 125 do Acórdão de 15 de junho de 2010, Mediaset/Comissão (T‑177/07, EU:T:2010:233), o Tribunal Geral limitou‑se a indicar que devia tratar‑se de um interesse público e não somente de um interesse privado do beneficiário da medida de auxílio.

87

Quanto ao conceito de interesse comum referido no fim do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, cabe recordar que visa ponderar as vantagens e os inconvenientes resultantes de uma medida de auxílio e opõe‑se a que sejam autorizadas medidas que alteram as condições das trocas comerciais de maneira que contrariem o interesse comum. Assim, insere‑se numa fase posterior da apreciação efetuada no âmbito da aplicação da referida disposição. Por conseguinte, não é possível daí deduzir que os objetivos de interesse público que podem ser prosseguidos por um Estado‑Membro limitam‑se aos que são comuns a todos ou à maioria dos Estados‑Membros.

88

Estas considerações devem ser tidas em conta na leitura da conclusão da Comissão, que figura no considerando 374 da decisão impugnada, segundo a qual as medidas em causa prosseguiam um objetivo de interesse «comum». Este considerando surge no ponto 9.2 da referida decisão, na qual a Comissão se pronunciou sobre a questão de saber se a promoção da energia nuclear constituía um objetivo que podia legitimamente ser prosseguido nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Assim, no referido considerando, limitou‑se a constatar que, atendendo às disposições do Tratado Euratom, o Reino Unido tinha o direito de determinar a promoção da energia nuclear como um objetivo de interesse público na aceção da referida disposição. Em contrapartida, neste considerando, a Comissão não concluiu que esse objetivo era partilhado por todos ou pela maioria dos Estados‑Membros. Também não se pronunciou sobre a questão de saber se as medidas em causa alteravam as condições das trocas comerciais de maneira contrária ao interesse comum. Com efeito, resulta claramente da sistemática dessa decisão que a Comissão apreciou esta questão numa fase posterior, designadamente, nos pontos 9.3 a 9.6 da mesma decisão.

89

Em face destas considerações, improcede o argumento da República da Áustria de que, no considerando 374 da decisão impugnada, a Comissão não teve suficientemente em conta o facto de alguns Estados‑Membros, entre os quais a República da Áustria, sempre terem rejeitado a ideia da construção de novos reatores nucleares.

90

Em segundo lugar, a República da Áustria alega que, nos considerandos 366 a 374 da decisão impugnada, a Comissão ignorou que a necessidade de um auxílio e o seu impacto nas trocas comerciais entre Estados‑Membros deviam ser apreciados do ponto de vista da União. Neste contexto, afirma que os conceitos de interesse comum referidos no âmbito do artigo 34.o TUE e do artigo 142.o TFUE visam igualmente o interesse de todos os Estados‑Membros.

91

Estes argumentos devem ser julgados improcedentes.

92

A este respeito, basta observar que, nos considerandos 366 a 374 da decisão impugnada, a Comissão não pôs em causa o facto de que, na medida em que o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE prevê que um auxílio estatal não deve alterar as condições das trocas comerciais de maneira que contrariem o interesse comum, há que ter em conta o interesse da União e de todos os Estados‑Membros. Com efeito, nos referidos considerandos, como acima se expõe no n.o 88, a Comissão não se pronunciou sobre a ponderação dos interesses, mas unicamente sobre a questão de saber se o Reino Unido tinha o direito de determinar a promoção da energia nuclear como um objetivo de interesse público.

93

Em terceiro lugar, a República da Áustria apresenta argumentos que visam pôr em causa a conclusão da Comissão de que um Estado‑Membro pode prosseguir a promoção da energia nuclear e, mais especificamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, enquanto objetivo de interesse público na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Em primeiro lugar, entende que o artigo 2.o, alínea c), do Tratado Euratom não se dirige aos Estados‑Membros. Em segundo lugar, esta última disposição visa unicamente as instalações essenciais necessárias ao desenvolvimento da energia nuclear. Ora, Hinkley Point C não se revela uma instalação fundamental a esse nível. Em terceiro lugar, entende que o objetivo da promoção da energia nuclear já foi alcançado, uma vez que foram construídas várias centrais nucleares em toda a Europa. Em quarto lugar, a Comissão ignorou o contexto histórico do Tratado Euratom e as limitações daí decorrentes.

94

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

95

A este respeito, conforme acima se observa nos n.os 80 a 89, nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, o objetivo de interesse público prosseguido pela medida em causa não tem que constituir necessariamente um objetivo partilhado por todos ou pela maioria dos Estados‑Membros.

96

Deve igualmente ser recordado que, conforme acima exposto nos n.os 72 a 78, no âmbito da aplicação do artigo 107.o TFUE às medidas que prosseguem um objetivo do Tratado Euratom, há que ter em conta as disposições e os objetivos do Tratado Euratom. Ora, resulta do artigo 1.o, segundo parágrafo, do Tratado Euratom que a Comunidade Euratom tem por missão contribuir, pelo estabelecimento das condições necessárias à formação e ao crescimento rápidos das indústrias nucleares, para a melhoria de nível de vida nos Estados‑Membros e para o desenvolvimento das relações comerciais com outros países. Nos termos do artigo 2.o, alínea c), do Tratado Euratom, para cumprimento da sua missão, a Comunidade Euratom deve, nas condições previstas no referido tratado, facilitar os investimentos e assegurar, designadamente encorajando as iniciativas das empresas, a criação das instalações essenciais ao desenvolvimento da energia nuclear na Comunidade.

97

Tendo em conta o artigo 1.o, segundo parágrafo, e o artigo 2.o, alínea c), do Tratado Euratom, há que observar que a Comissão não cometeu um erro ao considerar que o Reino Unido tinha o direito de determinar a promoção da energia nuclear e, mais especificamente, de incentivar a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear como um objetivo de interesse público na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Com efeito, por um lado, este objetivo está relacionado com o da Comunidade Euratom que consiste em facilitar os investimentos no domínio nuclear e resulta do artigo 192.o, primeiro parágrafo, do Tratado Euratom que os Estados‑Membros devem facilitar à Comunidade Euratom o cumprimento da sua missão. Por outro, decorre do artigo 194.o, n.o 2, segundo parágrafo, TFUE que cada Estado‑Membro tem o direito de escolher entre as diferentes fontes de energia aquelas que prefere.

98

Nenhum dos argumentos apresentados pela República da Áustria é suscetível de pôr esta conclusão em causa.

99

Em primeiro lugar, a República da Áustria alega, em substância, que a Comissão ignorou o contexto histórico do Tratado Euratom e as limitações que daí decorrem. Afirma que a euforia pelo nuclear no momento da conclusão do Tratado Euratom deu lugar, atualmente, em vários Estados‑Membros, a um claro ceticismo partilhado por uma grande parte da população, que pode ir até à rejeição total e ao abandono completo desta forma de produção de energia. Contrariamente a outras disposições do direito primário, as disposições do Tratado Euratom raramente foram revistas e, por conseguinte, constituem regras anteriores ao Tratado FUE.

100

Estes argumentos devem ser julgados improcedentes.

101

Com efeito, contrariamente ao que dá a entender a República da Áustria, as disposições do Tratado Euratom estão plenamente em vigor e este Tratado não pode ser considerado uma lei anterior ao Tratado FUE. De facto, por um lado, cabe recordar que, nos termos do artigo 208.o do Tratado Euratom, este tem vigência ilimitada e que resulta do primeiro considerando do preâmbulo do Protocolo n.o 2 que altera o Tratado Euratom anexado ao Tratado de Lisboa que as disposições do Tratado Euratom continuam a produzir plenamente os seus efeitos jurídicos. Por outro, resulta deste protocolo que o Tratado de Lisboa alterou e confirmou não apenas o Tratado FUE e o Tratado UE, mas igualmente o Tratado Euratom.

102

Neste contexto, há que julgar igualmente improcedente o argumento da República da Áustria de que resulta da Declaração n.o 54 das declarações anexas à Ata Final da Conferência Intergovernamental, que aprovou o Tratado de Lisboa, que o Tratado Euratom está ultrapassado. Com efeito, o simples facto de cinco Estados‑Membros terem declarado que as disposições do Tratado Euratom não tinham sido objeto de alterações de fundo após a sua entrada em vigor e que era necessária uma atualização, não é suscetível de pôr em causa a conclusão de que as disposições do Tratado Euratom estão plenamente em vigor.

103

Por outro lado, na medida em que a República da Áustria invoca a declaração comum dos plenipotenciários sobre a aplicação do Tratado Euratom no âmbito dos atos relativos às condições de adesão do Reino da Noruega, da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia e às adaptações dos Tratados em que se fundamenta a União Europeia (JO 1994, C 241, p. 382), basta observar que resulta desta declaração que os Estados‑Membros decidem, segundo as suas próprias orientações políticas, produzir ou não produzir energia nuclear. Daqui não se pode deduzir que a promoção, por um Estado‑Membro, da energia nuclear não pode constituir um objetivo de interesse público, na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, que um Estado‑Membro pode decidir prosseguir.

104

Em segundo lugar, a República da Áustria alega que o artigo 2.o, alínea c), do Tratado Euratom visa unicamente as instalações essenciais necessárias ao desenvolvimento da energia nuclear e que o objetivo da promoção da energia nuclear já foi alcançado.

105

A este respeito, cabe recordar que a decisão impugnada se baseia no artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE e que esta disposição faz referência ao desenvolvimento de uma atividade. Ora, há que observar que a Comissão não cometeu um erro ao considerar que a construção de Hinkley Point C visava o desenvolvimento de uma atividade na aceção da referida disposição. Com efeito, nos termos do artigo 194.o, n.o 2, segundo parágrafo, TFUE, o Reino Unido tem o direito de escolher entre diferentes fontes de energia. Deve igualmente ser observado que, como resulta nomeadamente do considerando 510 da decisão impugnada e dos considerandos 6 e 7 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, a construção de Hinkley Point C visava substituir capacidades de produção de energia nuclear envelhecidas, cujo encerramento tinha sido projetado. Por outro lado, é pacífico que a tecnologia que deve ser utilizada na referida unidade é mais desenvolvida do que a utilizada nas centrais existentes.

106

Atendendo a estas considerações, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria relativo ao facto de Hinkley Point C não ser uma instalação essencial necessária ao desenvolvimento da energia nuclear e de o objetivo da promoção da energia nuclear já ter sido alcançado.

107

Em terceiro lugar, o argumento da República da Áustria de que o artigo 2.o, alínea c), do Tratado Euratom não se dirige aos Estados‑Membros deve igualmente ser julgado improcedente. A este respeito, cabe recordar que, mesmo que esta disposição não vise diretamente os Estados‑Membros, mas sim a Comunidade Euratom, o Reino Unido tinha o direito de tê‑la em conta, ao abrigo do artigo 192.o, primeiro parágrafo, do referido tratado segundo o qual os Estados‑Membros devem facilitar à Comunidade Euratom o cumprimento da sua missão.

108

Em quarto lugar, a República da Áustria afirma que, se a promoção da energia nuclear fosse considerada um objetivo de interesse público na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, seria possível justificar qualquer medida que prosseguisse este objetivo. A este respeito, basta recordar que, no considerando 374 da decisão impugnada, a Comissão se limitou a constatar que a promoção da energia nuclear constituía um objetivo de interesse público. Em contrapartida, no referido considerando, não apreciou se, à luz deste objetivo, as medidas em causa eram adequadas, necessárias e não excessivas. Com efeito, foi nos pontos 9.3 a 9.6 da referida decisão que apreciou esta questão.

109

Por conseguinte, há que julgar improcedentes todos os argumentos que visam demonstrar que as disposições do Tratado Euratom não permitem considerar que a promoção da energia nuclear, e, mais especificamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, constituem um objetivo de interesse público na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE.

110

Em quarto lugar, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo invocam a existência de um conflito entre a promoção da energia nuclear, por um lado, e os princípios da proteção do ambiente, da precaução, do poluidor‑pagador e da durabilidade, assim como alguns objetivos fixados no artigo 194.o, n.o 1, TFUE, tais como a promoção da eficiência energética, o desenvolvimento de energias novas e a promoção de redes energéticas, por outro. Segundo estes Estados‑Membros, a Comissão não devia ter dado uma prioridade incondicional ao objetivo da promoção da energia nuclear, mas devia ter tido em conta o conflito entre a promoção da energia nuclear e os princípios referidos. Neste contexto, o Grão‑Ducado do Luxemburgo menciona igualmente o risco resultante de atentados terroristas.

111

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

112

A este respeito, importa observar que, à luz dos objetivos prosseguidos pelo Tratado Euratom, não se pode considerar que os princípios invocados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo se opõem a que um Estado‑Membro determine a promoção da energia nuclear como um objetivo de interesse público na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Quanto aos princípios que estes Estados‑Membros deduzem do Tratado FUE, cabe recordar que, nos termos do artigo 106.o‑A, n.o 3, do Tratado Euratom, as disposições do Tratado UE e do Tratado FUE não derrogam as disposições do Tratado Euratom.

113

Por outro lado, o argumento da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo de que a Comissão deu prioridade incondicional ao objetivo da promoção da energia nuclear deve ser julgado improcedente. A este respeito, basta recordar que, no ponto 9.2 da decisão impugnada, a Comissão limitou‑se a constatar que a promoção da energia nuclear constituía um objetivo de interesse público na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Em contrapartida, nesta fase da sua análise, não apreciou a proporcionalidade das medidas em causa.

114

Por conseguinte, devem ser julgados improcedentes os argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo na medida em que pretendem demonstrar que a promoção da energia nuclear não pode constituir um objetivo de interesse público na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Todavia, na medida em que estes argumentos visam pôr em causa as conclusões da Comissão quanto à proporcionalidade das medidas em causa, serão tidos em conta no âmbito da apreciação do sexto fundamento, relativo a uma violação do princípio da proporcionalidade.

115

Em quinto lugar, a República da Áustria alega que resulta dos programas indicativos nucleares publicados periodicamente pela Comissão que, em conformidade com o artigo 40.o do Tratado Euratom, os investimentos na energia nuclear não podem ser qualificados de objetivos de interesse comum.

116

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

117

A este respeito, em primeiro lugar, há que observar que, atendendo à natureza dos programas indicativos nucleares (v., artigo 40.o do Tratado Euratom), as considerações acima desenvolvidas nos n.os 79 a 115, que se baseiam nas disposições do Tratado Euratom e do Tratado FUE, não podem ser postas em causa pelas conclusões da Comissão que figuram nestes programas.

118

Em segundo lugar e em qualquer caso, há que observar que não resulta de forma alguma dos programas indicativos nucleares referidos pela República da Áustria que a promoção da energia nuclear não constitui uma atividade cujo desenvolvimento não pode ser facilitado nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE.

119

Com efeito, por um lado, na medida em que a República da Áustria alega que resulta do n.o 7 do programa indicativo nuclear, de 4 de outubro de 2007, COM(2007) 565 final que cabe aos Estados‑Membros fazer, ou não, a escolha pela energia nuclear, isto confirma o direito do Reino Unido de promover esta energia (v., n.o 97, supra).

120

Por outro lado, na medida em que a República da Áustria alega que resulta da página 18 do programa indicativo nuclear, de 25 de setembro de 1996, COM(1996) 339 final, do n.o 3.3 deste programa de 13 de novembro de 2008, COM(2008) 776 final, e do n.o 4.2 do mesmo de 4 de outubro de 2007, COM(2007) 565 final, que, atendendo à competitividade da energia nuclear, nenhum auxílio estatal devia ser concedido neste domínio, basta observar que este argumento não é suscetível de pôr em causa a conclusão da Comissão de que a promoção da energia nuclear pode constituir um objetivo de interesse público na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. É unicamente suscetível de pôr em causa a conclusão da Comissão quanto à necessidade das medidas em causa. Assim, este argumento é inoperante no presente contexto, mas será tido em conta no âmbito da apreciação do primeiro fundamento, que visa as conclusões da Comissão quanto à necessidade de uma intervenção do Estado.

121

Por conseguinte, há que julgar improcedentes os argumentos baseados nos programas indicativos nucleares publicados pela Comissão.

122

Em sexto lugar, a República da Áustria alega que, na decisão impugnada, a Comissão não aprofundou as suas reflexões quanto aos objetivos de diversificação e de segurança de fornecimento. Por seu turno, o Grão‑Ducado do Luxemburgo alega que a segurança de fornecimento não é garantida, uma vez que o urânio deve ser importado de países situados fora da União.

123

A este respeito, basta observar que resulta dos considerandos 366 a 374 da decisão impugnada que a Comissão considerou a promoção da energia nuclear um objetivo de interesse público, que é suscetível de justificar por si só as medidas em causa. Em contrapartida, ao salientar, no considerando 374 da referida decisão, que a promoção da energia nuclear permitia igualmente contribuir para os objetivos de diversificação e de segurança de fornecimento, não concluiu que esses dois outros objetivos eram objetivos que permitiam por si só, e de forma autónoma, justificar as medidas em causa. Nestas circunstâncias, a Comissão não pode ser acusada de não ter aprofundado as suas reflexões relativas aos objetivos de diversificação e de segurança de fornecimento no âmbito do ponto 9.2 dessa decisão.

124

Por conseguinte, este argumento deve ser julgado improcedente.

125

Em sétimo lugar, a República da Áustria apresenta igualmente argumentos relativos, em primeiro lugar, a uma definição do mercado errada, em segundo lugar, à inexistência de uma deficiência do mercado no setor da construção e da exploração de centrais nucleares, em terceiro lugar, à qualificação das medidas em causa como auxílio ao investimento, e, em quarto lugar, ao impacto das condições das trocas comerciais entre Estados‑Membros.

126

A este respeito, basta observar que os argumentos em causa visam as etapas da apreciação que devem ser levadas a cabo em aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE que são posteriores à determinação do objetivo de interesse público prosseguido. Por conseguinte, estes argumentos não são suscetíveis de demonstrar um erro da Comissão quanto à qualificação da promoção da energia nuclear como objetivo de interesse público na aceção da referida disposição.

127

Assim, estes argumentos são inoperantes na medida em que foram invocados em apoio do presente fundamento. Todavia, o primeiro argumento, relativo a uma errada definição do mercado, e o segundo argumento, relativo à inexistência de uma deficiência de mercado, serão tidos em conta no âmbito da apreciação do primeiro fundamento, relativo ao facto de a Comissão ter admitido a existência de um mercado distinto da energia nuclear e de esse mercado da eletricidade não ser deficiente. O terceiro argumento, que visa a qualificação das medidas em causa como auxílios ao investimento, será apreciado no âmbito do terceiro fundamento, relativo ao facto de as medidas em causa deverem ter sido qualificadas como auxílios ao funcionamento. O quarto argumento, relativo ao impacto das condições das trocas comerciais entre Estados‑Membros será apreciado no âmbito do sexto fundamento, que visa demonstrar o caráter alegadamente errado da conclusão da Comissão de que as medidas em causa respeitavam o princípio da proporcionalidade.

128

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedente o quarto fundamento, sem prejuízo dos argumentos acima referidos nos n.os 114, 120 e 125.

C. Quanto ao segundo fundamento, relativo ao caráter alegadamente errado da conclusão da Comissão de que a tecnologia utilizada em Hinkley Point C era nova

129

O presente fundamento é relativo às conclusões da Comissão, que figuram no considerando 392 da decisão impugnada, segundo as quais os investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear visavam alcançar o objetivo de interesse público de promover a energia nuclear e segundo as quais esses investimentos não seriam realizados sem uma intervenção do Reino Unido.

130

A República da Áustria considera que as conclusões em causa enfermam de erros.

131

Em primeiro lugar, a República da Áustria alega que a Comissão considerou incorretamente que a tecnologia que devia ser utilizada em Hinkley Point C constituía uma tecnologia nova. Não se trata de uma tecnologia nova mas de uma tecnologia comprovada, ou seja, uma variante do reator de água pressurizada utilizada há décadas, que apresenta grandes semelhanças com vários reatores atualmente em uso.

132

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia e o Reino Unido contestam este argumento.

133

A título preliminar, há que observar que este argumento da República da Áustria se baseia na premissa de que, no considerando 392 da decisão impugnada, a Comissão concluiu que a tecnologia a utilizar em Hinkley Point C constituía uma tecnologia nova.

134

Ora, esta premissa é errada.

135

É certo que no considerando 392 da decisão impugnada, na sua versão alemã, figura a expressão «Investitionen in neue Nukleartecnologian» que remete para investimentos em novas tecnologias nucleares.

136

Todavia, como resulta da primeira página da decisão impugnada, apenas o texto em língua inglesa faz fé. Ora, no considerando 392 dessa decisão, na sua versão inglesa, figura a expressão «new nuclear investment» que remete para investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear e é mencionado que os referidos investimentos visam alcançar o objetivo de interesse público enunciado no ponto 9.2 da referida decisão e que as medidas em causa eram necessárias, atendendo, nomeadamente, a este tipo específico de investimentos. Assim, este considerando não faz referência a novas tecnologias nucleares, mas sim a investimentos nas tais novas capacidades.

137

Esta leitura do considerando 392 da decisão impugnada é, aliás, confirmada pelos considerandos 375 a 391 da referida decisão, que antecedem a conclusão que figura no seu considerando 392, nos quais a Comissão não fez qualquer referência à utilização de uma nova tecnologia nuclear.

138

Por conseguinte, o argumento da República da Áustria assenta numa leitura errada do considerando 392 da decisão impugnada e deve ser julgado improcedente.

139

Em segundo lugar, deve ser julgado improcedente o argumento da República da Áustria relativo ao facto de a Comissão não ter precisado que atividade económica na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE tinha como objetivo promover através das medidas em causa. A este respeito, basta observar que resulta de forma suficientemente clara do considerando 392 da decisão impugnada que se tratava da promoção da energia nuclear.

140

Em terceiro lugar, há que apreciar o argumento da República da Áustria relativo ao facto de que o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE e o artigo 2.o, alínea c), do Tratado Euratom exigem um desenvolvimento de atividade e que uma simples medida de substituição não preenche essa condição. Neste contexto, importa igualmente ter em conta o argumento da República da Áustria de que o artigo 6.o do Regulamento (UE) n.o 651/2014 da Comissão, de 17 de junho de 2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.o e 108.o [TFUE] (JO 2014, L 187, p. 1), as Orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia 2014‑2020 (JO 2014, C 200, p. 1) e a Comunicação da Comissão relativa ao enquadramento dos auxílios estatais à investigação, desenvolvimento e inovação (JO 2014, C 198, p. 1) se opõem a que as medidas que visam unicamente permitir que uma empresa utilize os últimos avanços técnicos ou respeite as normas de segurança ou ambientais em vigor sejam consideradas compatíveis com o mercado interno.

141

A este respeito, em primeiro lugar, no que respeita ao Regulamento n.o 651/2014, basta observar que este se limita a prever uma abordagem normalizada de isenção por categoria, mas que não vincula a Comissão no âmbito de uma apreciação individual efetuada diretamente com base no artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE.

142

Em segundo lugar, quanto às Orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia 2014‑2020 e à Comunicação da Comissão relativa ao enquadramento dos auxílios estatais à investigação, desenvolvimento e inovação, há que observar que os argumentos da República da Áustria visam, por um lado, o objetivo de ultrapassar as normas da União em matéria de proteção do ambiente e o objetivo de aumentar o nível de proteção do ambiente na falta de normas da União, que são mencionadas no n.o 18, alínea a), das referidas orientações, assim como os objetivos relativos à investigação, desenvolvimento e inovação, por outro. Ora, na decisão impugnada, a Comissão não avaliou a compatibilidade das medidas em causa no que respeita a estes objetivos. Por conseguinte, estes argumentos devem ser julgados improcedentes.

143

Em terceiro lugar, deve recordar‑se que o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE se limita a exigir que as medidas de auxílio sejam destinadas a facilitar o desenvolvimento de determinadas atividades. Por seu turno, o artigo 2.o, alínea c), do Tratado Euratom visa facilitar os investimentos e assegurar a criação das instalações essenciais necessárias ao desenvolvimento da energia nuclear na Comunidade. Nenhuma destas duas disposições exige, assim, que a existência de uma inovação tecnológica seja demonstrada.

144

Em quarto lugar, há que observar que, nas circunstâncias do caso em apreço, o objetivo de promover a energia nuclear e, mais especificamente, o de incentivar as empresas a investirem em novas capacidades de produção de energia nuclear, cumpre as exigências previstas no artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE e no artigo 2.o, alínea c), do Tratado Euratom. Contrariamente ao que afirma a República da Áustria, o facto de estas novas capacidades se destinarem a substituir capacidades de produção de energia nuclear envelhecidas não permite considerar que não existia desenvolvimento na aceção dessas disposições. Com efeito, uma vez que as centrais nucleares envelhecidas devem ser encerradas (v., considerando 510 da decisão impugnada e considerandos 6 e 7 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação), a energia nuclear no Reino Unido estaria menos desenvolvida sem investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear. Em todo caso, importa observar que é pacífico que a tecnologia a utilizar em Hinkley Point C é mais avançada do que a utilizada em centrais nucleares que esta deverá substituir. Com efeito, mesmo apesar de a República da Áustria contestar que se trata de uma tecnologia essencialmente nova, reconhece que se trata de uma tecnologia mais desenvolvida.

145

Assim, estes argumentos e, por conseguinte, o segundo fundamento na íntegra devem igualmente ser julgados improcedentes.

D. Quanto ao primeiro fundamento e às primeira e segunda partes do nono fundamento, que visam a definição de mercado efetuada, assim como as considerações da Comissão baseadas na existência de uma deficiência do mercado

146

O primeiro fundamento e as primeira e segunda partes do nono fundamento, assim como os argumentos desenvolvidos no âmbito do quarto fundamento, relativos aos programas indicativos nucleares, aos erros respeitantes à definição de mercado e à inexistência de deficiência de mercado (n.os 120 e 125, supra), visam as considerações que a Comissão desenvolveu no ponto 9.3 da decisão impugnada, onde concluiu que, sem intervenção do Estado, não seriam criadas novas capacidades de produção de energia nuclear em tempo útil.

147

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo entendem que estas considerações não são suficientemente fundamentadas e são erradas. Em substância, estes Estados‑Membros apresentam três grupos de argumentos. Em primeiro lugar, alegam que a Comissão não tinha o direito de concluir pela necessidade de uma intervenção do Reino Unido. Só na hipótese de ter constatado que o mercado de produção e de fornecimento de eletricidade liberalizado era deficiente é que podia ter declarado que as medidas em causa eram compatíveis com o mercado interno em aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Ora, as considerações da Comissão a este respeito não estão suficientemente fundamentadas e, em todo caso, são manifestamente erradas. Em segundo lugar, os referidos Estados‑Membros alegam que a Comissão se baseou incorretamente na existência de um mercado para a construção e a exploração de centrais nucleares e que não fundamentou suficientemente a decisão impugnada a este respeito. Em terceiro lugar, a República da Áustria alega que a abordagem seguida pela Comissão criou um juízo prévio favorável à energia nuclear.

1.   Quanto aos argumentos que visam pôr em causa a conclusão da Comissão quanto à necessidade de uma intervenção do Reino Unido

148

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que a Comissão não tinha o direito de concluir pela necessidade de uma intervenção do Reino Unido. Segundo estes Estados‑Membros, as medidas em causa podiam ter sido declaradas compatíveis com o mercado interno em aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE apenas na hipótese de a Comissão ter constatado que o mercado da produção e de fornecimento de eletricidade liberalizado era deficiente. Ora, a produção e o fornecimento de eletricidade podiam ter sido garantidos através de tecnologias distintas da tecnologia nuclear. Por conseguinte, a Comissão não tinha o direito de concluir por uma deficiência do mercado.

149

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a República da Eslováquia e o Reino Unido consideram que estes argumentos devem ser julgados improcedentes.

150

A título preliminar, deve recordar‑se que o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE não inclui expressamente o pressuposto da existência de uma deficiência do mercado. Com efeito, limita‑se a exigir que o auxílio vise um objetivo de interesse público e que seja adequado, necessário e não excessivo (v., n.o 48, supra). Assim, no âmbito da aplicação dessa disposição, a questão relevante é a de saber se o objetivo de interesse público prosseguido pelo Estado‑Membro é realizado sem a intervenção deste (v., neste sentido, Acórdão de 9 de junho de 2016, Magic Mountain Kletterhallen e o./Comissão, T‑162/13, não publicado, EU:T:2016:341, n.o 77).

151

Com efeito, embora a existência de uma deficiência do mercado possa constituir um elemento relevante para declarar a compatibilidade de um auxílio estatal com o mercado interno, a inexistência de uma deficiência de mercado não implica necessariamente que as condições previstas no artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE não estejam reunidas (Acórdãos de 9 de junho de 2016, Magic Mountain Kletterhallen e o./Comissão, T‑162/13, não publicado, EU:T:2016:341, n.os 78 e 79, e de 18 de janeiro de 2017, Andersen/Comissão, T‑92/11 RENV, não publicado, EU:T:2017:14, n.o 69). Por exemplo, uma intervenção do Estado pode ser considerada necessária na aceção desta disposição quando as forças do mercado não são suscetíveis de realizar por si só o objetivo de interesse público visado pelo Estado‑Membro em tempo útil, mesmo que, enquanto tal, este mercado não possa ser considerado deficiente.

152

É à luz destas considerações que devem ser apreciadas as alegações da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo que visam pôr em causa a conclusão da Comissão de que era necessária uma intervenção do Reino Unido para realizar o objetivo de interesse público que prosseguia, ou seja, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear. Estas alegações são relativas ao facto de, em primeiro lugar, a Comissão não ter apresentado as razões pelas quais se devia considerar que os investimentos em Hinkley Point C tinham uma natureza específica e exigiam uma intervenção do Estado, em segundo lugar, de as considerações da Comissão que figuram no ponto 9.3 da decisão impugnada serem afetadas por erros materiais e formais, em terceiro lugar, de a Comissão não ter apresentado as razões pelas quais os objetivos de segurança de fornecimento e de descarbonização não podiam ser alcançados sem auxílios estatais e, em quarto lugar, de a Comissão dever ter exposto com maior detalhe em que medida Hinkley Point C recorria a novas tecnologias.

a)   Quanto à alegação de fundamentação insuficiente relativa à natureza específica dos investimentos em Hinkley Point C

153

A República da Áustria alega que, no considerando 392 da decisão impugnada, a Comissão salientou o caráter específico dos investimentos em Hinkley Point C, sem, no entanto, apresentar as razões pelas quais se devia considerar que estes investimentos tinham uma natureza específica.

154

A Comissão contesta estes argumentos.

155

A este respeito, cabe recordar que, no considerando 392 da decisão impugnada, a Comissão extraiu a conclusão das considerações que desenvolveu nos considerandos 381 a 391 da referida decisão. Ora, nos considerandos 382 e 383 desta decisão, a Comissão observou, nomeadamente, que os investimentos na energia nuclear estavam sujeitos a riscos significativos, tendo em conta a combinação de elevados custos de capital inicial com longos tempos de construção e um longo período de exploração até serem recuperados os custos do investimento. Em seu entender, não existiam instrumentos financeiros baseados no mercado ou noutros tipos de contratos que permitissem cobrir esses riscos substanciais, o que era um fenómeno específico de algumas tecnologias, entre as quais a energia nuclear. Com efeito, os instrumentos disponíveis no mercado não oferecem horizontes temporais superiores a 10 ou 15 anos, quer sob a forma de contratos a longo prazo ou de instrumentos de cobertura de riscos. Neste contexto, a Comissão fez igualmente referência, nomeadamente, aos ciclos de vida extremamente longos e complexos das centrais nucleares, ao contrário da maioria das outras infraestruturas de energia, e, com efeito, ao contrário da maioria dos investimentos em infraestruturas. Em particular, salientou, antes de mais, que a construção de uma central nuclear durava normalmente oito a dez anos com custos a serem suportados antes de serem geradas quaisquer receitas e sendo os riscos assumidos unicamente pelo investidor. Em seguida, os 60 anos de vida operacional caracterizam‑se pela criação de receitas, mas estas baseiam‑se numa evolução incerta dos preços grossistas. Por outro lado, o subsequente período de desativação pode demorar 40 anos, sendo necessário provisionar fundos para o encerramento da central. Além disso, habitualmente o tratamento e armazenamento de resíduos nucleares de alto nível são efetuados no local antes de ser efetuada a transferência para um depósito, onde se espera que os resíduos fiquem armazenados durante milhares de anos. Por último, existe um risco de bloqueio que constituiu uma incerteza para os investidores privados, devido ao facto de os sucessivos governos poderem ter diferentes pontos de vista sobre a conveniência da tecnologia nuclear, tendo em conta a sua natureza controversa.

156

Há que observar que as considerações da Comissão que figuram nos considerandos 382 e 383 da decisão impugnada revelam de forma suficientemente clara as razões pelas quais, em seu entender, sem uma intervenção do Reino Unido, atendendo, nomeadamente, à inexistência de instrumentos financeiros de mercado e de outros tipos de contratos para garantir proteção contra estes riscos substanciais, os investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear não seriam realizados em tempo útil.

157

Por conseguinte, deve ser julgada improcedente a alegação de insuficiência da fundamentação que figura no considerando 392 da decisão impugnada.

b)   Quanto à alegação que visa demonstrar a existência de erros materiais e formais que afetam as considerações da Comissão expostas no ponto 9.3 da decisão impugnada

158

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo apresentam argumentos que visam demonstrar o caráter errado das considerações da Comissão, expostas no ponto 9.3 da decisão impugnada, segundo as quais, tendo em conta a inexistência de instrumentos financeiros de mercado e de outros tipos de contratos para garantir proteção contra os riscos substanciais a que estão sujeitos os investimentos na energia nuclear, era necessária uma intervenção do Estado para alcançar o objetivo da promoção da energia nuclear, e, mais especificamente, o da criação de novas capacidades de produção de energia nuclear. Segundo estes Estados‑Membros, a Comissão cometeu erros materiais e formais a este respeito.

159

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos. A Comissão alega que alguns argumentos apresentados pela República da Áustria são inadmissíveis devido ao seu caráter extemporâneo.

160

Neste contexto, cabe recordar que, na aplicação do artigo 107.o, n.o 3, TFUE, a Comissão goza de um vasto poder de apreciação cujo exercício implica apreciações complexas de ordem económica e social. A fiscalização jurisdicional aplicada ao exercício desse poder de apreciação limita‑se, assim, à verificação do cumprimento das regras processuais e de fundamentação, bem como ao controlo da exatidão material dos factos e à ausência de erro de direito, de erro manifesto na apreciação dos factos ou de desvio de poder (Acórdãos de 26 de setembro de 2002, Espanha/Comissão, C‑351/98, EU:C:2002:530, n.o 74; e de 29 de abril de 2004, Itália/Comissão, C‑372/97, EU:C:2004:234, n.o 83).

161

Todavia, embora a Comissão disponha de uma margem de apreciação em matéria económica, tal não implica que o tribunal da União se deva abster de fiscalizar a interpretação que a Comissão fez de dados de natureza económica. Com efeito, o tribunal da União deve, designadamente, verificar não só a exatidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência, mas também fiscalizar se estes elementos constituem a totalidade dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são suscetíveis de fundamentar as conclusões que deles se retiram. No entanto, no âmbito desta fiscalização, não lhe compete substituir a apreciação da Comissão, no plano económico, pela sua. Além disso, cumpre assinalar que, no caso de uma instituição dispor de um amplo poder de apreciação, o controlo do respeito de determinadas garantias processuais assume uma importância fundamental. Segundo a jurisprudência, entre estas garantias figura o dever de a instituição competente examinar com cuidado e imparcialidade todos os elementos pertinentes do caso concreto e de fundamentar a sua decisão de forma suficiente (v., Acórdão de 22 de novembro de 2007, Espanha/Lenzing, C‑525/04 P, EU:C:2007:698, n.os 56 a 58 e jurisprudência aí referida).

162

Há que ter em conta estes princípios na apreciação dos argumentos apresentados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo.

163

Em primeiro lugar, a República da Áustria alega que o simples facto de uma determinada empresa não se poder financiar no mercado não é suficiente para concluir que o objetivo de interesse público prosseguido por um Estado‑Membro não pode ser realizado sem uma intervenção deste.

164

Este argumento deve ser julgado improcedente.

165

A este respeito, basta observar que, nos considerandos 381 a 391 da decisão impugnada, a Comissão não se limita à apreciação da situação individual da NNBG ou dos investidores desta sociedade, mas pronuncia‑se de forma mais geral sobre a questão de saber se, sem uma intervenção do Reino Unido, seriam construídas novas capacidades de produção de energia nuclear neste Estado‑Membro, atendendo à inexistência de instrumentos financeiros de mercado e de outros tipos de contratos para garantir proteção contra os riscos substanciais a que estão sujeitos os investimentos na energia nuclear.

166

Em segundo lugar, a República da Áustria alega que a conclusão da Comissão, que figura nos considerandos 382 e 383 da decisão impugnada, segundo a qual não existiam instrumentos financeiros adequados para investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear, não se baseia numa apreciação suficientemente sólida e detalhada e não está suficientemente fundamentada.

167

Em primeiro lugar, a República da Áustria alega que a Comissão não teve em conta outras formas de investimento, tais como o financiamento por sindicação internacional ou os auxílios individuais que seriam concedidos por financeiros com a possibilidade de fornecer meios suficientes para tal.

168

A este respeito, cabe recordar que, nos considerandos 381 a 392 da decisão impugnada, a Comissão expôs de forma detalhada as razões pelas quais os investimentos na energia nuclear estavam sujeitos a riscos significativos e concluiu que não existiam instrumentos financeiros de mercado ou outros tipos de contratos para garantir proteção contra estes riscos. Após ter efetuado trabalhos de modelização, a Comissão concluiu, por outro lado, que, nestas circunstâncias, existia um grau elevado de incerteza quanto à realização de investimentos privados em novas capacidades de produção de energia nuclear num prazo realista.

169

Tendo em conta estes elementos, a simples evocação, pela República da Áustria, da possibilidade de um financiamento por sindicação internacional ou por auxílios individuais que poderiam ser concedidos por financeiros com a possibilidade de fornecer meios suficientes a este respeito, não é suscetível de demonstrar que estas considerações da Comissão enfermam de um erro manifesto de apreciação.

170

Com efeito, para demonstrar que a Comissão cometeu um erro manifesto na apreciação dos factos suscetível de justificar a anulação da decisão impugnada, os elementos de prova fornecidos pela recorrente devem ser suficientes para retirar plausibilidade às apreciações dos factos tomados em consideração na decisão (Acórdãos de 12 de dezembro de 1996, AIUFFASS e AKT/Comissão, T‑380/94, EU:T:1996:195, n.o 59; e de 6 de outubro de 2009, FAB/Comissão, T‑8/06, não publicado, EU:T:2009:386, n.o 78).

171

Ora, a República da Áustria não apresentou as razões pelas quais os riscos significativos a que estão sujeitos os investimentos na energia nuclear, nomeadamente devido à combinação de elevados custos de capital inicial, longos tempos de construção e um longo período de exploração até serem recuperados os custos do investimento, assim como os ciclos de vida extremamente longos e complexos, uma evolução incerta dos preços grossistas e das despesas relacionadas com a desativação, assim como o risco de bloqueio, também não se opõem a um financiamento por sindicação internacional ou a financiamentos individuais.

172

Por conseguinte, este argumento deve ser julgado improcedente.

173

Em segundo lugar, a República da Áustria alega que o problema da falta de sinais relativos aos preços a longo prazo diz igualmente respeito a outras tecnologias e, por conseguinte, deve ser considerado um dado clássico do mercado que deve ser tido em conta na apreciação do risco do projeto. Contrariamente à afirmação da Comissão, não existem sinais relativos aos preços estáveis para os futuros dez a quinze anos no mercado da eletricidade. Nas bolsas europeias de eletricidade mais líquidas, os produtos oferecidos tinham, nesse momento, uma vida útil que ia até sete anos. Mesmo no que respeita às centrais elétricas que utilizam tecnologias com uma duração de exploração menor que as centrais nucleares, uma parte significativa da sua vida útil não se encontra coberta pelos sinais relativos aos preços disponíveis.

174

A este respeito, basta observar que, mesmo admitindo que este argumento da República da Áustria fosse procedente, não seria suscetível de pôr em causa a conclusão da Comissão quanto à inexistência de instrumentos financeiros adequados para os investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear. Em contrapartida, o argumento de que, mesmo no que respeita a períodos mais curtos do que o período de dez a quinze anos que a Comissão teve em conta, não existiam sinais relativos aos preços estáveis é suscetível de reforçar as considerações da Comissão quanto à existência de fatores que se opõem a investimentos em tais novas capacidades.

175

Em terceiro lugar, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria de que, na sua análise, a Comissão não se devia ter limitado aos mercados financeiros no Reino Unido. A este respeito, importa observar que, no considerando 382 da decisão impugnada, a Comissão deu por provada a inexistência de instrumentos financeiros de mercado e de outros tipos de contratos para garantir proteção contra os riscos substanciais relativos aos investimentos nas capacidades de produção de energia nuclear. Ora, não resulta de forma alguma deste considerando que, no âmbito da sua apreciação, a Comissão se limitou aos instrumentos financeiros disponíveis no Reino Unido.

176

Em quarto lugar, a República da Áustria afirma que, a este respeito, a fundamentação da decisão impugnada não é suficiente.

177

Por um lado, a República da Áustria alega que a Comissão não indicou a razão pela qual se devem ter exclusivamente como fundamento os mercados financeiros disponíveis no Reino Unido. Este argumento deve ser julgado improcedente. Com efeito, como foi acima referido no n.o 175, assenta na premissa errada de que a Comissão se limitou aos referidos mercados financeiros.

178

Por outro lado, a República da Áustria alega que, em todo caso, nos considerandos 381 a 392 da decisão impugnada, a Comissão não referiu expressamente os mercados financeiros que teve em conta. A este respeito, há que observar que a fundamentação exposta nos referidos considerandos é suficiente para permitir a esse Estado‑Membro conhecer as justificações da medida adotada e ao Tribunal Geral exercer a sua fiscalização. Com efeito, se esse Estado‑Membro considerava que existiam instrumentos financeiros que não eram afetados pelos fatores assinalados pela Comissão, poderia ter apresentado argumentos a este respeito no processo no Tribunal Geral, o que lhe teria permitido fiscalizar o mérito dessa consideração da Comissão.

179

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedentes os argumentos que visam pôr em causa a conclusão da Comissão relativa à inexistência de instrumentos financeiros adequados.

180

Em terceiro lugar, a República da Áustria apresenta argumentos que visam pôr em causa as considerações da Comissão baseadas no risco de um bloqueio político.

181

A título preliminar, importa observar que, no considerando 384 da decisão impugnada, embora expressando uma reserva quanto à questão de saber se a situação de bloqueio que tinha identificado podia ser qualificada de deficiência de mercado, a Comissão concluiu que este risco podia «ser um fator que torna mais difícil o investimento em nova[s] [capacidades de produção de energia nuclear], em especial tendo em conta a longa duração da construção, exploração e desativação das centrais nucleares». Assim, a referida instituição concluiu que, do ponto de vista dos potenciais investidores, o risco de bloqueio político era um fator que se opunha a investimentos em tais novas capacidades.

182

Em primeiro lugar, a República da Áustria alega que uma situação de bloqueio apenas existe no caso de uma das partes num contrato de longa duração, que não é inteiramente definido no momento da sua celebração, gozar de uma margem de manobra considerável que lhe permita adotar um comportamento oportunista, enquanto a outra se obriga antecipadamente a efetuar, por exemplo, investimentos muito significativos, não transferíveis. Contrariamente às considerações da Comissão, não é isso o que sucede no caso em apreço.

183

A este respeito, importa observar que resulta dos considerandos 384 e 385 da decisão impugnada que, mesmo que todas as tecnologias pudessem, em princípio, ser afetadas por um bloqueio político, os projetos nucleares estariam normalmente mais expostos a este risco. Neste contexto, a Comissão salientou, nomeadamente, por um lado, que os sucessivos governos poderiam ter diferentes pontos de vista sobre a conveniência da tecnologia nuclear, o que poderia constituir uma incerteza para os investidores privados e, por outro, que essas incertezas eram mais importantes para a tecnologia nuclear, devido à natureza controversa desta tecnologia, ao horizonte temporal mais longo e à maior dimensão do investimento.

184

No que respeita aos argumentos apresentados pela República da Áustria, há que observar que esta se limita, por um lado, a explicar o que entende por uma situação de bloqueio e, por outro, a alegar que uma empresa que investe em capacidades de produção de energia nuclear não se encontra em tal situação.

185

Ora, deve concluir‑se que a argumentação desenvolvida pela República da Áustria não é suscetível de demonstrar que as considerações da Comissão que figuram nos considerandos 384 e 385 da decisão impugnada enfermam de erros manifestos de apreciação (v., n.os 160, 161 e 170, supra). Nomeadamente, a República da Áustria não apresenta argumentos suscetíveis de retirar plausibilidade à consideração da Comissão de que o risco acima descrito no n.o 183 constituía um fator que se opunha aos investimentos na construção e na exploração de novas centrais nucleares.

186

Por conseguinte, este argumento deve ser julgado improcedente.

187

Em segundo lugar, a República da Áustria afirma que o risco de uma alteração do quadro político não é um risco específico das centrais nucleares, mas sim um risco geral relativo aos projetos contestados na opinião pública, especialmente os que exigem recursos significativos. Assim, tal risco não pode constituir um fator que deva ser corrigido através de um auxílio estatal.

188

A este respeito, por um lado, há que observar que, nos considerandos 384 e 385 da decisão impugnada, a Comissão de nenhuma forma excluiu a possibilidade de o risco de uma alteração do quadro político existir também relativamente a outros projetos e de se opor a investimentos em tais projetos.

189

Por outro lado, há que concluir que a República da Áustria não apresenta qualquer argumento suscetível de pôr em causa a plausibilidade da consideração da Comissão de que um risco de alteração do quadro político afetaria gravemente a tecnologia nuclear, nomeadamente devido à natureza controversa dessa tecnologia, à probabilidade desse risco, à dimensão dessa alteração, que poderia incluir o abandono total da indústria nuclear, a períodos de reembolso muitos longos e a montantes muito elevados de investimentos.

190

Por conseguinte, este argumento da República da Áustria também não é suscetível de demonstrar a existência de um erro manifesto no raciocínio da Comissão.

191

Em terceiro lugar, a República da Áustria alega que, em caso de expropriação, tendo em conta a proteção dos investimentos e os direitos patrimoniais, está garantida uma indemnização financeira.

192

Por um lado, este argumento deve ser julgado improcedente na medida em que visa demonstrar que a Comissão não teve suficientemente em conta o facto de estar garantida uma indemnização financeira. Com efeito, neste contexto, importa observar que a questão de saber em que medida está garantida uma indemnização em caso de encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point foi apreciada pela Comissão. Assim, no considerando 192 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, a Comissão afirmou que o pagamento de indemnizações pelas autoridades nacionais a título de compensação por um dano causado pelas autoridades públicas não constituía um auxílio estatal na aceção do artigo 107.o, n.o 1, TFUE. Por outro lado, no considerando 322 da decisão impugnada, concluiu que os princípios gerais subjacentes ao direito do Reino Unido e da União dão origem a um direito de compensação quando tenha havido uma privação do direito de propriedade.

193

Por um lado, no caso de o argumento da República da Áustria visar demonstrar que, tendo em conta que uma indemnização financeira estava garantida, era manifestamente errado considerar que o risco de bloqueio político constituía um fator que podia ser considerado um fator que se opunha aos investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear, deve igualmente ser julgado improcedente. Com efeito, o simples facto de poder ser pedida uma indemnização com base em princípios gerais subjacentes ao direito do Reino Unido e da União não se opõe a que o risco de bloqueio político tenha um efeito dissuasivo para potenciais investidores. Atendendo aos montantes dos investimentos em causa no caso em apreço, a simples perspetiva de obter, se necessário, após um eventual litígio, uma compensação financeira de montante incerto em caso de expropriação não é suscetível de afastar completamente o obstáculo aos investimentos resultante de um risco de bloqueio político. Daqui resulta que a Comissão não cometeu um erro manifesto de apreciação ao considerar que, apesar de poder ser pedida uma indemnização, o risco de bloqueio político constituía um fator que se opunha aos investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear.

194

Em quarto lugar, a República da Áustria alega que era errado «imunizar» os operadores de Hinkley Point C contra futuras decisões políticas tomadas democraticamente. O Grão‑Ducado do Luxemburgo defende que tais decisões políticas não podem ser consideradas deficiências de mercado.

195

Na medida em que, com os seus argumentos, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo pretendem alegar que as futuras decisões políticas tomadas democraticamente não podiam ser tidas em conta no âmbito da apreciação da questão de saber se existiam fatores que se opunham aos investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear, estes argumentos devem ser julgados improcedentes. Com efeito, no âmbito desta apreciação, a Comissão podia ter em conta todos os elementos suscetíveis de impedir que, sem uma intervenção do Estado, tais novas capacidades fossem criadas pelas forças do mercado em tempo útil. Assim, não era manifestamente errado ter em conta, neste contexto, incertezas que podem resultar de um risco de bloqueio político e que, pelas razões acima referidas no n.o 189, afetariam de forma particularmente grave o domínio nuclear.

196

Na medida em que, com este argumento, a República da Áustria não se limita a pôr em causa a necessidade de uma intervenção do Reino Unido enquanto tal, mas pretende igualmente alegar a existência de uma sobrecompensação, devido ao facto de as medidas concretas, ou seja, o contrato diferencial, o acordo do secretário de Estado e a garantia de crédito, excederem o que era necessário para ultrapassar os obstáculos constatados, trata‑se de um argumento que visa as considerações da Comissão relativas ao caráter necessário das medidas em causa e que se sobrepõe aos argumentos desenvolvidos no âmbito do sexto fundamento. Por conseguinte, este argumento é inoperante no presente contexto, mas será tido em conta no âmbito da apreciação do sexto fundamento.

197

Daqui resulta que todos os argumentos que visam pôr em causa as considerações da Comissão baseados na possibilidade de uma situação de bloqueio político devem ser julgados improcedentes, sem prejuízo do argumento relativo ao respeito do princípio da proporcionalidade, que será apreciado no âmbito do sexto fundamento.

198

Em quarto lugar, a República da Áustria alega que a construção de outras centrais nucleares foi financiada sem a concessão de auxílios estatais. Neste contexto, refere, nomeadamente, a construção das centrais nucleares de Flamanville (França) e de Olkiluoto (Finlândia).

199

A título preliminar, cabe recordar que, nos considerandos 381 a 392 da decisão impugnada, a Comissão alegou que, devido ao facto de os investimentos na energia nuclear estarem sujeitos a riscos significativos e de não existirem instrumentos financeiros de mercado ou outros tipos de contratos para garantir proteção contra estes riscos, existia um grau elevado de incerteza quanto à realização de investimentos do mercado em novas capacidades de produção de energia nuclear num prazo realista. Cabe igualmente recordar que a Comissão baseou esta conclusão não apenas numa identificação de tais fatores, mas também nos trabalhos de modelização.

200

Assim, há que apreciar se o argumento da República da Áustria, relativo ao facto de centrais nucleares com o mesmo tipo de reator que devia ser utilizado em Hinkley Point C terem sido construídas em Flamanville e em Olkiluoto, sem que tenham sido concedidos auxílios estatais, é suscetível de retirar plausibilidade a estas apreciações da Comissão.

201

A este respeito, em primeiro lugar, importa observar que resulta do n.o 25 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação que, antes da adoção da decisão impugnada, já era conhecido que os projetos de construção das centrais de Flamanville e de Olkiluoto tinham gerado custos adicionais significativos.

202

Em segundo lugar, há que observar que, segundo as indicações da Comissão e da República Francesa, que não são contestadas pela República da Áustria nem pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, as decisões de investir nos projetos de construção referidos pela República da Áustria foram adotadas antes do acidente do reator nuclear de Fukushima (Japão).

203

Em terceiro lugar, deve recordar‑se que estes projetos foram concebidos em condições de enquadramento diferentes. Como a Comissão afirmou, sem impugnação especificada da República da Áustria ou do Grão‑Ducado do Luxemburgo, a decisão de investir na construção da central nuclear de Flamanville foi adotada em 2005, ou seja, antes da crise financeira mundial de 2007 e de 2008, ao passo que a decisão impugnada foi adotada após o início dessa crise. Quanto à central nuclear de Olkiluoto, cabe observar que resulta do programa indicativo nuclear de 4 de outubro de 2007 COM(2007) 565 final, que o investimento nessa central foi obtido graças à conclusão de um acordo entre os acionistas, que garante um preço fixo da energia para os proprietários investidores. Por outro lado, segundo as indicações da Comissão, que não foram impugnadas especificadamente pela República da Áustria nem pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, os acionistas dessa mesma central são essencialmente produtores de papel e a energia produzida é repartida entre os acionistas pelo custo real de produção.

204

Em quarto lugar, a Comissão alega que os preços grossistas da eletricidade na União baixaram fortemente depois das decisões de investimento na construção das centrais nucleares de Flamanville e de Olkiluoto (de 35 % a 45 % entre 2008 e 2012), o que não foi impugnado pela República da Áustria nem pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo.

205

Atendendo a estas circunstâncias, há que concluir que, por si só, o argumento de que foram construídas em Flamanville e em Olkiluoto centrais nucleares com o mesmo tipo de reator que a utilizar em Hinkley Point C, sem que tenham sido concedidos auxílios estatais, não é suscetível de retirar plausibilidade às apreciações da Comissão desenvolvidas nos considerandos 381 a 392 da decisão impugnada.

206

Por conseguinte, este argumento deve ser julgado improcedente.

207

Em quinto lugar, a República da Áustria alega que existem projetos de infraestruturas totalmente comparáveis (centrais hidráulicas, túneis, grandes organismos de investigação farmacêuticas, engenharia genética e projetos espaciais), que obrigam o operador a suportar custos de investimento elevados, prazos de construção significativos e um longo período de exploração.

208

A este respeito, importa observar, por um lado, que, nos considerandos 381 a 385 da decisão impugnada, a Comissão de nenhuma forma excluiu a possibilidade de, relativamente a outros projetos de infraestruturas, existirem igualmente existir fatores que se opunham aos investimentos.

209

Por outro lado, a mera referência ao facto de outros projetos de infraestruturas não especificados deverem igualmente suportar custos de investimento elevados, prazos de construção significativos e um longo período de exploração, não é suscetível de retirar plausibilidade às considerações da Comissão que figuram nos considerandos 381 a 392 da decisão impugnada, nas quais teve em conta, nomeadamente, os riscos inerentes à produção de energia nuclear e a inexistência de instrumentos financeiros de mercado ou de outros tipos de contratos para garantir proteção contra estes riscos. Por outro lado, cabe recordar que o risco de bloqueio político e de abandono total da tecnologia nuclear, devido à sua natureza controversa, é característico dos investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear.

210

Por conseguinte, este argumento deve igualmente ser julgado improcedente.

211

Em sexto lugar, há que apreciar os argumentos da República da Áustria relativos aos programas indicativos nucleares, apresentados no âmbito do quarto fundamento (v., n.o 120, supra). A República da Áustria alega que resulta de alguns destes programas que a energia nuclear é competitiva e que os projetos efetuados neste domínio não deveriam beneficiar de auxílios estatais. Em substância, estes argumentos visam demonstrar que, contrariamente ao que a Comissão concluiu, podiam ter sido construídas novas capacidades de produção de energia nuclear em tempo útil sem a intervenção do Reino Unido.

212

Neste contexto, importa apreciar o conteúdo dos programas indicativos nucleares que a República da Áustria refere.

213

No que respeita ao programa indicativo nuclear de 4 de outubro de 2007 COM(2007) 565 final, há que observar que é certo que no ponto 4.2 desse documento, a Comissão identificou uma tendência de, em alguns Estados‑Membros, serem geralmente construídas novas centrais nucleares sem subvenções, o que indica que a tecnologia nuclear é cada vez mais considerada competitiva. Todavia, importa igualmente observar que, no ponto 4.3 desse documento, a Comissão concluiu que existiam incertezas relativamente aos preços futuros da eletricidade, à estrutura e às condições do mercado, assim como às políticas relativas à energia e às alterações climáticas, que constituíam riscos significativos para os investimentos a longo prazo no setor da energia e afetavam, nomeadamente, a tecnologia nuclear, devido ao grande investimento em capital que a construção de uma nova central exigia e ao prazo relativamente longo até às primeiras receitas. É igualmente referido que os investidores preferem investimentos com menor duração de construção e prazo de rentabilidade mais curto. Por outro lado, nos pontos 4.2 e 4.3 do referido documento, a Comissão salientou que não dispunha de dados comprovados para a construção de novas centrais nucleares, uma vez que há mais de dez anos não era construída qualquer nova central, o que tornava difícil a estimativa precisa dos custos da última geração de reatores.

214

Quanto ao programa indicativo nuclear de 13 de novembro de 2008, COM(2008) 776 final, importa observar que é certo que no seu ponto 3.3, a Comissão considerou que era necessário garantir que, na União, os projetos no domínio da energia nuclear não beneficiam de qualquer auxílio estatal. Todavia, há que observar que, nos pontos 3.3, 3.3.1 e 3.3.2 desse programa, a Comissão salientou que os custos de uma instalação eletronuclear eram sensivelmente superiores aos de uma central térmica ou alimentada a carvão equivalente, que o montante do investimento inicial e o tempo necessário para o recuperar representavam um risco elevado para as empresas privadas e que a recente instabilidade dos mercados do crédito à escala mundial constituía um risco para os projetos de investimento de grande dimensão. Concluiu que, mesmo embora o financiamento da construção de novas centrais eletronucleares fosse da responsabilidade dos operadores privados e dos mercados de capitais, poderia justificar‑se a adoção de algumas medidas para facilitar o financiamento, tendo em conta, nomeadamente, o clima geral de investimento que se tornou mais difícil para os grandes empréstimos.

215

Daqui resulta que, contrariamente ao que dá a entender a República da Áustria, não existe contradição entre as considerações da Comissão que figuram nos programas indicativos nucleares acima referidos nos n.os 213 e 214, por um lado e as considerações da Comissão desenvolvidas no ponto 9.3 da decisão impugnada, por outro.

216

Em todo caso, cabe recordar que os programas indicativos nucleares em causa refletem a situação no momento da sua redação. Assim, não têm em conta as circunstâncias ocorridas após a sua redação, como, por exemplo, as consequências do acidente do reator nuclear de Fukushima.

217

Por conseguinte, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, o conteúdo dos programas indicativos nucleares em causa não é suscetível de demonstrar a existência de um erro manifesto de apreciação cometido pela Comissão.

218

Em sétimo lugar, a República da Áustria alega, em substância, que a Comissão cometeu um erro ao ter em conta a dimensão do projeto enquanto fator que se opõe aos investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear. Tal critério devia ter sido tido em conta no âmbito da aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea b), TFUE em aplicação da Comunicação da Comissão sobre os critérios para a análise da compatibilidade com o mercado interno dos auxílios estatais destinados a promover a realização de projetos importantes de interesse europeu comum (JO 2014, C 188, p. 4).

219

Este argumento deve igualmente ser julgado improcedente.

220

Com efeito, contrariamente ao que a República da Áustria afirma, nada se opõe a que, no âmbito da aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE e, mais especificamente, no âmbito da apreciação da questão de saber se é necessária uma intervenção do Estado, a Comissão tenha em conta a dimensão do projeto notificado.

221

Por conseguinte, sem prejuízo do argumento relativo a uma eventual sobrecompensação (v., n.o 196, supra), que será tido em conta no âmbito da apreciação do sexto fundamento, há que julgar improcedentes todos os argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo que visam pôr em causa a conclusão da Comissão de que, sem uma intervenção do Reino Unido, o objetivo prosseguido por esse Estado‑Membro, ou seja, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, não seria alcançado em tempo útil, não sendo necessário apreciar o argumento da Comissão de que alguns argumentos apresentados pela República da Áustria são inadmissíveis devido ao seu caráter extemporâneo.

c)   Quanto à alegação de que os objetivos da segurança de fornecimento e da descarbonização podiam ser alcançados sem auxílios estatais

222

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo afirmam que, contrariamente às considerações da Comissão, os objetivos de segurança de fornecimento e de descarbonização podiam ser alcançados sem as medidas em causa.

223

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos. A Comissão considera igualmente que alguns argumentos apresentados pela República da Áustria são inadmissíveis devido ao seu caráter extemporâneo.

224

A este respeito, em primeiro lugar, importa observar que a presente alegação se baseia numa premissa errada. Com efeito, a conclusão da Comissão quanto à necessidade de uma intervenção do Reino Unido não assenta na consideração de que os objetivos de segurança de fornecimento e de descarbonização não podiam ser alcançados sem auxílios de estado. Pelo contrário, como resulta dos considerandos 378 a 380 da decisão impugnada, a Comissão considerava que a realização desses objetivos não parecia justificar investimentos especificamente na produção de energia nuclear, mas sim, de forma mais geral, investimentos na produção de energia com baixo teor de carbono e em soluções de internalização da externalidade positiva da disponibilidade de eletricidade.

225

Em segundo lugar, cabe recordar que as considerações da Comissão quanto à necessidade de uma intervenção do Reino Unido desenvolvidas no ponto 9.3 da decisão impugnada se baseiam no objetivo da promoção da energia nuclear, e, mais especificamente no objetivo da criação de novas capacidades de produção de energia nuclear. Ora, conforme foi acima exposto nos n.os 153 a 221, os argumentos apresentados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo não são suscetíveis de demonstrar que estas considerações não são suficientemente fundamentadas ou que enfermam de erros materiais.

226

Por conseguinte, a alegação de que os objetivos de segurança de fornecimento e de descarbonização podiam ser alcançados sem auxílios estatais deve ser julgada improcedente, não sendo necessário apreciar o argumento da Comissão relativo ao caráter extemporâneo de alguns dos argumentos apresentados pela República da Áustria.

d)   Quanto à alegação de que a Comissão não expôs de forma suficiente em que medida Hinkley Point C recorre a novas tecnologias

227

No que respeita ao argumento relativo ao facto de que a Comissão devia ter exposto ainda mais em que medida Hinkley Point C recorre a novas tecnologias, basta recordar que este argumento assenta numa leitura errada do considerando 392 da decisão impugnada (v., n.os 131 a 138, supra). Assim, este argumento deve igualmente ser julgado improcedente.

228

Por conseguinte, improcedem todas as alegações que visam pôr em causa a conclusão da Comissão de que era necessária uma intervenção do Reino Unido para realizar o objetivo de interesse público que prosseguia.

2.   Quanto aos argumentos que visam a definição de mercado efetuada pela Comissão

229

A República da Áustria afirma que a Comissão cometeu erros relativamente à definição de mercado. Em seu entender, contrariamente ao critério seguido na decisão de abertura do procedimento formal de investigação, a referida instituição não se baseou, na decisão impugnada, no mercado liberalizado da produção e do fornecimento de eletricidade, mas sim no mercado da construção e da exploração de centrais nucleares. Assim, esta instituição não aplicou as regras relativas à definição de mercado e afastou‑se da sua prática de definição de mercado.

230

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a República da Eslováquia e o Reino Unido consideram que estes argumentos devem ser julgados improcedentes.

231

A este respeito, em primeiro lugar, importa observar que, na decisão impugnada, a Comissão identificou o mercado liberalizado da produção e do fornecimento de eletricidade como o mercado afetado pelas medidas em causa. Com efeito, no considerando 340 da referida decisão, a Comissão concluiu que as referidas medidas provocavam uma distorção da concorrência e uma alteração nas trocas comerciais, fazendo referência aos efeitos destas no mercado liberalizado da produção e do fornecimento de eletricidade. Resulta igualmente do ponto 9.6 dessa decisão que, no âmbito da ponderação das vantagens e dos inconvenientes resultantes dessas medidas, a Comissão teve em conta as distorções da concorrência e as trocas comerciais no referido mercado.

232

Por conseguinte, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria relativo ao facto de, na decisão impugnada, a Comissão se ter baseado no mercado da construção e da exploração de centrais nucleares.

233

Em segundo lugar, uma vez que os argumentos da República da Áustria visam demonstrar que a Comissão não apreciou em que medida a construção e a exploração de centrais nucleares podiam ser consideradas um mercado relevante, basta observar que, no âmbito da apreciação da questão de saber se era necessária uma intervenção do Reino Unido para alcançar o objetivo que este Estado‑Membro prosseguia, ou seja, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, a Comissão não era obrigada a pronunciar‑se sobre essa questão. Assim, estes argumentos devem igualmente ser julgados improcedentes.

234

Em terceiro lugar, no que respeita aos outros argumentos da República da Áustria que visam a definição do mercado efetuada pela Comissão, basta observar que assentam nas premissas erradas de que, na decisão impugnada, a referida instituição se baseou no mercado da construção e da exploração de centrais nucleares ou de que só podia ter declarado as medidas em causa compatíveis com o mercado interno nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE se tivesse concluído pela deficiência desse mercado. Daqui resulta que tais argumentos, bem como, por conseguinte, todos os argumentos relativos à definição de mercado devem igualmente ser julgados improcedentes.

3.   Quanto ao argumento relativo a um juízo prévio a favor da energia nuclear

235

A República da Áustria alega igualmente que a abordagem seguida pela Comissão criou um juízo prévio a favor da energia nuclear.

236

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a República da Eslováquia e o Reino Unido consideram que estes argumentos devem ser julgados improcedentes.

237

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE permite declarar um auxílio compatível com o mercado interno se este visar o desenvolvimento de uma atividade que constitui um objetivo de interesse público, for adequado, necessário e não excessivo e que, nos termos do artigo 2.o, alínea c), do Tratado Euratom e do artigo 194.o, n.o 2, segundo parágrafo, TFUE, um Estado‑Membro tem o direito de considerar que a promoção da energia nuclear constitui tal objetivo (v., n.o 97, supra).

238

Em segundo lugar, na medida em que, com o seu argumento, a República da Áustria pretende demonstrar que, atendendo aos seus efeitos sobre os investimentos em fontes de energia distintas da energia nuclear, as medidas em causa não poderiam ser consideradas proporcionadas, basta observar que este argumento visa questionar o caráter não excessivo das medidas em causa. Ora, no âmbito do ponto 9.3 da decisão impugnada, a Comissão limitou‑se a analisar se uma intervenção do Reino Unido era necessária. Daqui resulta que, no presente contexto, este argumento deve ser julgado inoperante. Todavia, será tido em conta no âmbito da apreciação do sexto fundamento, através do qual a República da Áustria pretende pôr em causa, nomeadamente, as considerações da Comissão quanto ao caráter não excessivo das referidas medidas.

239

Assim, uma vez que os argumentos da República da Áustria visam pôr em causa a conclusão da Comissão de que uma intervenção do Reino Unido era necessária, devem ser julgados improcedentes.

240

Por último, há que julgar improcedentes os argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo de que a Comissão não podia concluir pela existência de uma deficiência do mercado. A este respeito, cabe recordar que o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE não inclui uma condição expressa relativa à deficiência do mercado e que as considerações da Comissão desenvolvidas no âmbito do ponto 9.3 da decisão impugnada, cuja plausibilidade não é posta em causa pelos argumentos apresentados por estes Estados‑Membros, permitem concluir que, sem intervenção do Reino Unido, os investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear não teriam sido realizados em tempo útil. Nestas circunstâncias, mesmo admitindo que a Comissão não pudesse concluir pela existência de uma deficiência de mercado, isso não é suscetível de pôr em causa a sua conclusão de que uma intervenção do Reino Unido era necessária para alcançar o objetivo de interesse público prosseguido por este Estado‑Membro.

241

Por conseguinte, sem prejuízo da apreciação dos argumentos relativos a uma alegada imunização contra um risco de bloqueio político e ao alegado caráter excessivo das medidas em causa devido aos seus efeitos nos investimentos em fontes de energia distintas da energia nuclear (v., n.os 196 e 238, supra), que será tido em conta no âmbito da apreciação do sexto fundamento, há que julgar improcedentes o primeiro fundamento, as primeira e segunda partes do nono fundamento, baseadas na existência de uma deficiência do mercado e os argumentos apresentados no âmbito do quarto fundamento, que são relativos aos programas indicativos nucleares e que visam as considerações da Comissão sobre a definição de mercado, assim como as suas considerações respeitantes à existência de uma deficiência do mercado.

E. Quanto aos quinto e oitavo fundamentos, relativos a uma determinação insuficiente dos elementos de auxílio e a uma violação da comunicação sobre as garantias, e quanto à quarta parte do nono fundamento, relativa a uma violação do dever de fundamentação a esse respeito

242

No âmbito do quinto fundamento, a República da Áustria alega que, na decisão impugnada, a Comissão não determinou de forma suficiente os elementos de auxílio incluídos nas medidas em causa. Não os tendo determinado suficientemente, a referida instituição não podia pronunciar‑se sobre a questão de saber se podiam ser autorizados nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE.

243

Em apoio do oitavo fundamento, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que a Comissão não respeitou a comunicação sobre as garantias. Em substância, afirmam que, contrariamente ao que exige a referida comunicação, a Comissão não determinou de forma suficiente, na decisão impugnada, o elemento de auxílio incluído na garantia de crédito e que não teve em conta todos os elementos relevantes neste contexto.

244

No âmbito da quarta parte do nono fundamento, a República da Áustria afirma que a decisão impugnada não estava suficientemente fundamentada a esse respeito.

245

A Comissão, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia e a Roménia alegam que estes argumentos devem ser julgados improcedentes.

246

Em primeiro lugar, há que responder à questão de saber se e em que medida, antes de apreciar a sua compatibilidade com o mercado interno em aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, a Comissão tem de determinar o montante exato correspondente ao equivalente subvenção de uma medida de auxílio. Em segundo lugar, serão analisados os argumentos que visam demonstrar que a Comissão não determinou de forma suficiente os elementos de auxílio incluídos nas medidas em causa. Em terceiro lugar, serão apreciados os argumentos relativos a uma violação do dever de fundamentação.

1.   Quanto à questão de saber se e em que medida a Comissão tem de quantificar o equivalente subvenção de uma medida de auxílio

247

A República da Áustria alega, em substância, que só após ter quantificado o montante exato do equivalente subvenção das medidas em causa é que a Comissão se poderia pronunciar sobre a sua compatibilidade com o mercado interno em aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE.

248

A este respeito, cabe recordar que, para poder declarar uma medida de auxílio compatível com o mercado interno nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, a Comissão deve verificar se este visa um objetivo de interesse público determinado pelo Estado‑Membro e se, tendo em vista este objetivo, é adequado e necessário e que não altera as condições das trocas comerciais nem as condições da concorrência de forma excessiva atendendo às vantagens que daí resultam (v., n.o 48, supra).

249

Em contrapartida, o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE não exige expressamente que a Comissão quantifique o montante exato do equivalente subvenção resultante de uma medida de auxílio. Assim, se está em condições de concluir pelo caráter adequado, necessário e não excessivo de uma medida de auxílio sem que esse montante exato seja explicitado, não pode ser acusada de não ter procedido à quantificação do mesmo.

250

Os argumentos apresentados pela República da Áustria não são suscetíveis de pôr em causa esta leitura do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Com efeito, nem a regulamentação nem a jurisprudência invocadas por este Estado‑Membro permitem estabelecer a existência de um princípio segundo a qual a Comissão seja obrigada a quantificar o montante exato do equivalente subvenção resultante de uma medida de auxílio antes de apreciar a proporcionalidade desta à luz desta disposição.

251

Em primeiro lugar, a República da Áustria refere os artigos 7.o e 8.o do Regulamento n.o 651/2014 que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.o e 108.o TFUE, assim como dos considerandos 23 e 25 do referido regulamento. A este respeito, deve observar‑se que o artigo 7.o deste regulamento prevê as modalidades para o cálculo da intensidade de um auxílio e dos custos elegíveis. Por seu turno, o artigo 8.o do mesmo regulamento prevê uma regra de cumulação que deve ser respeitada na apreciação da questão de saber se os limiares de notificação fixados no artigo 4.o do regulamento em questão e as intensidades de auxílio máximas fixadas no capítulo III deste regulamento são respeitadas. Os considerandos 23 e 25 do regulamento em causa são relativos a estas duas disposições. Ora, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, não é possível deduzir destes artigos nem destes considerandos que só uma medida de auxílio cujo equivalente subvenção tenha sido quantificado em aplicação dessas regras pode ser declarada compatível com o mercado interno nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Com efeito, o regulamento em causa limita‑se a prever uma abordagem normalizada de isenção por categoria, mas não vincula a Comissão no âmbito de uma apreciação individual efetuada diretamente com base no artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Por conseguinte, este argumento deve ser julgado improcedente.

252

Em segundo lugar, a República da Áustria invoca o ponto 69 das Orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia 2014‑2020. A este respeito, basta observar que esse ponto se limita a indicar que um auxílio ao investimento ou à energia é considerado proporcionado se o seu montante por beneficiário se limitar ao mínimo necessário para alcançar o objetivo fixado em matéria de proteção do ambiente ou da energia. Assim, não é possível deduzir do referido número que, no âmbito da apreciação de uma medida de auxílio à luz do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, a Comissão tem de quantificar o montante exato do equivalente subvenção da medida em causa antes de apreciar a sua proporcionalidade. Refira‑se, em todo caso, que, na decisão impugnada, a Comissão teve em conta o objetivo da promoção da energia nuclear, que não é um dos objetivos dessas orientações.

253

Em terceiro lugar, no que respeita ao anexo I, parte I, do Regulamento (CE) n.o 794/2004 da Comissão, de 21 de abril de 2004, relativo à aplicação do Regulamento (CE) n.o 659/1999 do Conselho que estabelece as regras de execução do artigo 93.o do Tratado CE (JO 2004, L 140, p. 1), importa observar que inclui o modelo normalizado para a notificação de auxílios estatais e que, segundo o n.o 5 desse modelo, deve nele ser indicado o montante total do auxílio. Ora, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, não é possível daí deduzir que a Comissão não pode declarar uma medida de auxílio compatível com o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, se não tiver quantificado de forma exata o equivalente subvenção resultante dessa medida. Por conseguinte, este argumento deve ser julgado improcedente.

254

Em quarto lugar, a República da Áustria invoca o artigo 26.o do Regulamento (UE) 2015/1589 do Conselho, de 13 de julho de 2015, que estabelece as regras de execução do artigo 108.o [TFUE] (JO 2015, L 248, p. 9). A este respeito, basta observar que esta disposição limita‑se a prever uma obrigação de os Estados‑Membros comunicarem os relatórios anuais sobre todos os regimes de auxílios existentes à Comissão. No entanto, não pode inferir daí que a Comissão não se pode pronunciar sobre a compatibilidade de uma medida de auxílio com o mercado interno em aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, se não tiver quantificado o montante exato do equivalente subvenção nela incluído. Por conseguinte, este argumento deve ser julgado improcedente.

255

Em quinto lugar, em apoio do seu argumento de que a Comissão tem de quantificar o montante exato do equivalente subvenção das medidas em causa, a República da Áustria afirma que resulta da Comunicação da Comissão que altera as comunicações da Comissão sobre as Orientações da UE relativas à aplicação das regras em matéria de auxílios estatais à implantação rápida de redes de banda larga, as Orientações relativas aos auxílios estatais com finalidade regional para 2014‑2020, os Auxílios estatais a filmes e a outras obras audiovisuais, as Orientações em matéria de auxílios estatais que visam promover os investimentos de financiamento de risco e sobre as Orientações em matéria de auxílios estatais a aeroportos e companhias aéreas (JO 2014, C 198, p. 30), que, a fim de assegurar a transparência, para os auxílios que excedem 500000 euros, os Estados‑Membros são obrigados a publicar o nome do destinatário, o montante o objetivo do auxílio. A este respeito, basta observar que não se pode inferir dessa obrigação dos Estados‑Membros uma obrigação de a Comissão quantificar o montante exato do equivalente subvenção das medidas em causa. Por conseguinte, este argumento deve ser julgado improcedente.

256

Em sexto lugar, na medida em que a República da Áustria alega que a obrigação de a Comissão determinar o montante efetivo de uma medida de auxílio resulta do n.o 25 do Acórdão de 12 de outubro de 2000, Espanha/Comissão (C‑480/98, EU:C:2000:559), basta observar que tal conclusão não pode de forma alguma daí ser extraída. Com efeito, no referido número, o Tribunal de Justiça limitou‑se a recordar que nenhuma disposição do direito da União exige que a Comissão, quando ordena a restituição de um auxílio declarado incompatível com o mercado interno, fixe o montante exato do auxílio a restituir, mas que basta que a decisão da Comissão inclua indicações que permitam ao seu destinatário determinar por si só, sem dificuldade excessivas, esse montante. Por conseguinte, este argumento deve ser julgado improcedente.

257

As considerações acima desenvolvidas nos n.os 247 a 249 devem ser tidas em conta na apreciação dos argumentos da República da Áustria que visam demonstrar que a Comissão não determinou de forma suficiente os elementos de auxílio incluídos nas medidas em causa.

2.   Quanto aos argumentos que visam demonstrar que os elementos de auxílio incluídos nas medidas em causa não foram suficientemente determinados

258

Em primeiro lugar, a República da Áustria alega que, no momento da adoção da decisão impugnada, todas as modalidades das medidas em causa ainda não estavam determinadas. Em segundo lugar, tal como o Grão‑Ducado do Luxemburgo, alega que a Comissão não determinou de forma suficiente os elementos de auxílio incluídos nas diferentes medidas em causa. Em terceiro lugar, invoca que a Comissão não teve suficientemente em conta os custos relativos à gestão e ao armazenamento de resíduos nucleares. Em quarto lugar, afirma que a Comissão não teve em conta eventuais futuros auxílios estatais.

a)   Quanto ao argumento de que ainda não estavam determinadas todas as modalidades das medidas em causa no momento da adoção da decisão impugnada

259

No âmbito do quinto fundamento, a República da Áustria alega que, no momento da adoção da decisão impugnada, não estavam determinadas todas as modalidades das medidas em causa ainda, e que, em seguida, foram objeto de negociações e de adaptações adicionais.

260

A Comissão contesta estes argumentos. Alega, nomeadamente, que este argumento é inadmissível, uma vez que a República da Áustria não precisou as informações em falta.

261

A argumentação da Comissão relativa à inadmissibilidade do argumento da República da Áustria deve ser julgada improcedente.

262

Com efeito, não se pode deixar de observar que o argumento apresentado pela República da Áustria visa, nomeadamente, o facto de, à data da adoção da decisão impugnada, a Comissão ter apenas recebido as principais cláusulas de financiamento do projeto de Hinkley Point C, tais como já tinham sido acordadas pelas partes, e de não ter tido a oportunidade de apreciar os outros parâmetros do projeto (v., considerandos 73 e 551 da decisão impugnada).

263

Quanto ao mérito do argumento apresentado pela República da Áustria, deve recordar‑se que, nos termos do artigo 108.o, n.o 3, TFUE, a Comissão deve ser informada, em tempo útil, dos projetos destinados a instituir ou a alterar auxílios. Assim, as medidas de auxílio devem ser‑lhe notificadas quando ainda estão na fase de projeto, ou seja, antes de serem executadas e enquanto ainda podem ser adaptadas em função de eventuais observações da Comissão.

264

Neste contexto, importa igualmente observar que, uma vez que o artigo 108.o, n.o 3, TFUE não inclui qualquer critério formal, cabe a cada Estado‑Membro determinar em que fase do processo legislativo decide submeter o projeto de auxílio ao exame da Comissão, na condição, todavia, de esse projeto não ser posto em prática antes de a Comissão ter declarado o auxílio compatível com o mercado interno (v., neste sentido, Acórdão de 16 de setembro de 1998, Waterleiding Maatschappij/Comissão, T‑188/95, EU:T:1998:217, n.o 118).

265

No caso em apreço, a Comissão apreciou o projeto de Hinkley Point C tal como tinha sido notificado pelo Reino Unido. Neste contexto, resulta dos considerandos 73 e 551 da decisão impugnada que a referida instituição apreciou as medidas em causa tendo em conta a indicação das autoridades do Reino Unido de que as outras condições e os documentos financeiros definitivos continham cláusulas‑tipo que qualquer investidor tentaria incluir nesse tipo de projeto. Daqui resulta que a autorização dada por esta instituição apenas abrangia os elementos de auxílio tais como resultavam do referido projeto conforme lhe tinha sido notificado.

266

Quanto ao risco invocado pela República da Áustria de que o conteúdo das medidas em causa possa ainda ser alterado posteriormente, basta recordar que a autorização dada pela Comissão era apenas relativa ao projeto tal como lhe tinha sido notificado. Por conseguinte, qualquer alteração posterior suscetível de influenciar a avaliação da compatibilidade da medida de auxílio com o mercado comum deverá ser objeto de uma nova notificação à Comissão. Assim, nos considerandos 73 e 551 da decisão impugnada, a Comissão teve o cuidado de convidar as autoridades do Reino Unido a notificarem os documentos definitivos no caso de estes incluírem uma alteração das medidas em relação às que lhe foram apresentadas.

267

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedente a argumentação da República da Áustria relativa ao facto de que, em substância, uma alteração das modalidades das medidas em causa ainda era possível.

b)   Quanto aos argumentos relativos a uma determinação insuficiente dos elementos de auxílio incluídos nas medidas em causa

268

No âmbito dos quinto e oitavo fundamentos, a República da Áustria invoca argumentos que visam demonstrar que a Comissão não determinou suficientemente os elementos de auxílio incluídos nas medidas em causa. Por outro lado, a Comissão não teve em conta a cumulação destas medidas.

1) Quanto ao contrato diferencial

269

No âmbito do quinto fundamento, a República da Áustria apresenta argumentos que visam demonstrar que, na decisão impugnada, as modalidades do contrato diferencial não foram suficientemente determinadas.

270

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que o simples facto de, na decisão impugnada, a Comissão não ter quantificado o montante exato do equivalente subvenção resultante do contrato diferencial não é suscetível de demonstrar que a Comissão cometeu um erro (v., n.os 247 a 256, supra). Neste contexto, há que concluir que, em todo o caso e atendendo ao funcionamento do contrato diferencial (v., n.os 5 e 6, supra), não era possível uma quantificação exata do montante do equivalente subvenção dele resultante. Com efeito, esse montante depende da evolução do preço de referência, que corresponde ao preço do mercado. Por conseguinte, trata‑se de um preço incerto que dificilmente pode ser determinado com antecedência.

271

Em segundo lugar, importa apreciar que elementos teve a Comissão em conta quando apreciou a proporcionalidade do elemento de auxílio incluído no contrato diferencial. Neste contexto, cabe recordar que, no ponto 9.3 da decisão impugnada, a Comissão concluiu pela existência de fatores no mercado da produção e do fornecimento de eletricidade que se opunham a que fossem construídas novas capacidades de produção de energia nuclear em tempo útil. No n.o 2.1 da referida decisão, descreveu o funcionamento do contrato diferencial, que tem por efeito estabilizar os preços. Posteriormente, nos n.os 9.5.2 e 9.5.3.2 desta decisão, apreciou se o preço de exercício previsto era adequado, tendo em conta, nomeadamente, as taxas de rentabilidade que tinham sido utilizadas para determinar esse preço. Na sequência da sua análise, exigiu adaptações do mecanismo de partilha de ganhos.

272

Em terceiro lugar, no que respeita aos argumentos da República da Áustria, há que constatar que, exceto o argumento relativo ao facto de que a Comissão não quantificou o montante exato do equivalente subvenção resultante do contrato diferencial, que já foi apreciado nos n.os 247 a 256, supra, este Estado‑Membro não apresenta qualquer argumento circunstanciado suscetível de demonstrar que, com base nos elementos expostos no n.o 271, supra, a Comissão não estava em condições de controlar a proporcionalidade do elemento de auxílio incluído no contrato diferencial.

273

Em quarto lugar, na medida em que a República da Áustria alega que a Comissão devia ter apreciado o efeito de encerramento do mercado interno da eletricidade e os efeitos das medidas em causa nos preços desse mercado, há que observar que esse Estado‑Membro não apresenta qualquer argumento suscetível de demonstrar que, com base nos elementos de que a Comissão dispunha, não estava em condições de avaliar esses efeitos. Por outro lado, na medida em que este argumento visa pôr em causa a conclusão da Comissão quanto ao caráter não excessivo das medidas em causa, será tido em conta no âmbito da apreciação do sexto fundamento, relativo ao respeito do princípio da proporcionalidade.

274

Tendo em consideração o exposto, os argumentos que visam demonstrar que as modalidades do contrato diferencial não foram suficientemente determinadas devem igualmente ser julgados improcedentes.

2) Quanto às vantagens concedidas em caso de encerramento antecipado

275

No âmbito do quinto fundamento, a República da Áustria alega que, na decisão impugnada, a Comissão não determinou as vantagens que deviam ser concedidas em caso de encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point.

276

Neste contexto, cabe recordar que, como acima resulta do n.o 6, o contrato diferencial prevê que a NNBG será protegida contra algumas alterações legislativas e que será devida uma indemnização em caso de encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point por circunstâncias relacionadas com um seguro de responsabilidade civil contra acidentes nucleares. No caso desse encerramento antecipado, tanto os investidores da NNBG como o Reino Unido poderão pedir a transferência da NNBG para o Governo do Reino Unido e será devida uma indemnização aos referidos investidores. Como acima resulta do n.o 7, o acordo do secretário de Estado prevê que, se, na sequência de um encerramento antecipado por motivos políticos, o cocontratante da NNBG não cumprir a sua obrigação de pagamento compensatório aos investidores da NNBG, o secretário de Estado em questão pagar‑lhes‑á a indemnização acordada.

277

Importa igualmente observar que, como resulta dos considerandos 317 a 322 da decisão impugnada, essa indemnização consiste numa compensação quando tenha havido uma privação do direito de propriedade, baseada nos princípios gerais subjacentes ao direito do Reino Unido e ao direito da União. Na referida decisão, a Comissão considerou que, enquanto tal, o pagamento de uma indemnização com esses fundamentos e destinada a garantir aos investidores de NNBG que a sua situação não seria alterada em caso de encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point por motivos políticos, não constituía um auxílio estatal. Assim, enquanto elemento de auxílio, identificou unicamente a existência de um acordo específico, que isenta a NNBG ou os seus investidores de quaisquer taxas gastas e tempo despendido, em processos judiciais ou extrajudiciais, a fim de ver aplicados os seus direitos ao abrigo dos princípios gerais. Por outras palavras, a vantagem identificada pela Comissão limita‑se a um direito contratual específico que lhes permite obter um pagamento rápido e seguro.

278

Em primeiro lugar, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, a Comissão não pode ser acusada de não ter quantificado o elemento subvenção resultante deste acordo específico. Neste contexto, importa observar que o elemento subvenção resultante de tal acordo é difícil de quantificar. Deve igualmente ser recordado que, mesmo que a Comissão não tenha quantificado a vantagem resultante do acordo do secretário de Estado, teve‑a em conta. Com efeito, como resulta dos considerandos 337 e 479 da decisão impugnada, a referida instituição teve em conta o mecanismo de compensação por alterações legislativas que confere direito a uma compensação quando determinou as taxas de rentabilidade e o preço de exercício adequado previsto pelo contrato diferencial.

279

Em segundo lugar, é verdade que as modalidades exatas do mecanismo de compensação não eram conhecidas da Comissão no momento da adoção da decisão impugnada. Todavia, neste contexto, cabe recordar que, na decisão impugnada, a Comissão limita‑se a autorizar o projeto notificado pelo Reino Unido e que, segundo as indicações deste Estado‑Membro, esse mecanismo visava garantir aos investidores da NNBG que a sua situação não seria alterada em caso de encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point por motivos políticos. Por conseguinte, se, posteriormente à adoção da decisão impugnada, o Reino Unido decidisse pagar uma compensação superior ao montante necessário para compensar uma privação de propriedade, tratar‑se‑ia de uma vantagem que não estaria abrangida pela decisão impugnada e que, por isso, deveria ser notificada à Comissão.

280

Em terceiro lugar, a República da Áustria afirma que a Comissão não determinou suficientemente o elemento de auxílio resultante da indemnização por não ter verificado se as indemnizações previstas no âmbito do auxílio em caso de encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point se destinavam a compensar os custos de desmantelamento, de acompanhamento e outros custos semelhantes nem avaliado as vantagens resultantes do direito de transferência.

281

A este respeito, cabe recordar novamente que, segundo o projeto que o Reino Unido notificou à Comissão, a indemnização visava garantir aos investidores da NNBG que, em caso de encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point por motivos políticos, seriam indemnizados em caso de privação da sua propriedade. Daqui resulta que, no caso de a central nuclear Hinkley Point ser encerrada e de a NNBG ser transferida para o Reino Unido e de este Estado‑Membro suportar os custos de desmantelamento, de acompanhamento e outros custos semelhantes, estes deveriam ser tidos em conta no quadro da indemnização. No caso de estes custos não serem refletidos de forma suficiente no cálculo da indemnização, tratar‑se‑ia de um auxílio que o Reino Unido teria de notificar à Comissão.

282

Por conseguinte, este argumento deve ser julgado improcedente.

283

Em quarto lugar, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria de que, no âmbito da sua apreciação da compatibilidade do acordo do secretário de Estado com o mercado interno, a Comissão perdeu de vista que esse acordo não beneficiaria a NNBG, mas sim os seus investidores e que o direito à transferência não beneficiaria a NNBG, mas sim os seus proprietários. Neste contexto, basta recordar que as medidas em causa têm como objetivo criar um efeito de incentivo para os investimentos e visavam, assim, em primeira linha os investidores de NNBG, mesmo que, de um ponto de vista jurídico, tenham sido concedidos alguns direitos à NNBG. Por conseguinte, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, a Comissão não cometeu um erro a este respeito.

284

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedentes os argumentos da República da Áustria de que, na decisão impugnada, a Comissão não determinou suficientemente as vantagens que deviam ser concedidas em caso de encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point.

3) Quanto à garantia de crédito

285

No âmbito dos quinto e oitavo fundamentos, a República da Áustria alega que o elemento de auxílio incluído na garantia de crédito não foi suficientemente determinado pela Comissão. Na falta de determinação suficiente desta medida, a referida instituição não podia efetuar uma apreciação adequada da proporcionalidade desta garantia.

286

A título preliminar, cabe recordar o critério que a Comissão seguiu na decisão impugnada no que respeita à garantia de crédito.

287

Como resulta do ponto 7.8 da decisão impugnada, a Comissão considerou que o contrato diferencial, o acordo do secretário de Estado e a garantia de crédito estavam ligados, uma vez que todas essas medidas foram necessárias para a construção de Hinkley Point C. Concluiu igualmente que a garantia de crédito, tal como tinha sido notificada pelo Reino Unido, constituía um auxílio estatal.

288

Neste contexto, importa igualmente ter em conta as considerações que a Comissão desenvolveu no ponto 9.5.1 da decisão impugnada. Neste número, afirmou que a taxa de remuneração para a garantia de crédito que tinha sido notificada inicialmente pelo Reino Unido continuava abaixo da taxa de mercado que a NNBG teria de ter pago se tal garantia tivesse sido prestada no mercado.

289

No entanto, na decisão impugnada, a Comissão não autorizou a garantia de crédito tal como lhe tinha sido notificada inicialmente pelo Reino Unido. Com efeito, como resulta do ponto 9.5.3.1 da referida decisão e da descrição da garantia de crédito que a Comissão declarou compatível com o mercado interno no n.o 2.2 desta decisão, a autorização é relativa a uma garantia de crédito com uma taxa de remuneração ajustada. Segundo os considerandos 475 e 476 da mesma decisão, este ajustamento visava limitar ao mínimo o elemento de auxílio incluído na garantia de crédito.

290

No âmbito do ponto 9.5.3.1 da decisão impugnada, a Comissão afirmou que a categoria de risco BB+ ou Ba1 que o Reino Unido considerava apropriada, não refletia de forma adequada o risco a que estava exposta a garantia de crédito. Em seu entender, devia ser‑lhe atribuída a nota BB ou Ba e, para esta nota, a taxa de remuneração para a referida garantia de 250 pontos base, proposta pelo Reino Unido, devia ser ajustada num nível superior, correspondente a essa nota, ou seja, num nível de 295 pontos base. Comparou essa taxa de remuneração ajustada à taxa de remuneração de 291 pontos base, correspondente à média de 102 contratos de troca do risco de crédito de empresas europeias na categoria de risco BB. Por outro lado, comparou a taxa de remuneração de 295 pontos base com o valor médio de 286 pontos base para a categoria de risco BB e considerou que, atendendo a esta última taxa, a taxa de remuneração para tal garantia devia ser ajustada em alta, devido ao efeito de maturidade que tinha identificado.

291

Foi para responder às preocupações da Comissão que o Reino Unido aumentou a taxa de remuneração para a garantia de crédito de 250 para 295 pontos base, de modo a corresponder à taxa de remuneração que a NNBG devia ter pago no mercado privado, se tal garantia tivesse sido prestada no referido mercado. Como resulta do considerando 476 da decisão impugnada, a referida instituição considerou que este ajustamento permitia limitar ao mínimo o elemento de auxílio incluído na referida garantia.

292

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo defendem que estas considerações são erradas. Numa primeira fase, a República da Áustria alega que a Comissão não devia ter concluído que o projeto de construção e de exploração de Hinkley Point C era um projeto sólido com uma probabilidade de deficiência relativamente baixa. Numa segunda fase, alega que a Comissão devia ter determinado a categoria de risco da garantia de crédito sem ter em conta as outras medidas em causa. Numa terceira fase, tal como o Grão‑Ducado do Luxemburgo, apresenta argumentos relativos ao facto de que, na sua avaliação da garantia de crédito, a Comissão não teve suficientemente em conta os critérios previstos na comunicação sobre as garantias.

i) Quanto ao argumento de que a Comissão não devia ter concluído que o projeto de construção e de exploração de Hinkley Point C era um projeto sólido com uma probabilidade de deficiência relativamente baixa

293

A República da Áustria afirma que a Comissão não devia ter concluído que o projeto de construção e de exploração de Hinkley Point C era um projeto sólido com uma probabilidade de deficiência relativamente baixa. Tal abordagem contradiz as considerações da Comissão assentes na existência de deficiências do mercado.

294

A Comissão considera que estes argumentos devem ser julgados improcedentes.

295

A este respeito, basta observar que a nota BB ou Ba, que foi considerada adequada pela Comissão (v., considerando 465 da decisão impugnada), corresponde aos projetos com elevada taxa de risco, mas para os quais um resultado geral positivo se afigura, no entanto, provável.

296

Contrariamente ao que dá a entender a República da Áustria, a Comissão não se baseou, assim, na consideração de que o projeto incluía uma probabilidade de deficiência relativamente baixa.

297

Por conseguinte, este argumento da República da Áustria deve ser julgado improcedente.

ii) Quanto ao argumento de que a Comissão devia ter avaliado a categoria de risco da garantia de crédito sem ter em conta as outras medidas em causa

298

A República da Áustria alega que, na avaliação da garantia de crédito, a Comissão não devia ter tido em conta os efeitos das outras medidas em causa, mas que se devia ter baseado na sua conclusão que figura no considerando 390 da decisão impugnada segundo a qual, na ausência de auxílio estatal, os investimentos puramente comerciais em novas capacidades de produção de energia nuclear não teriam ocorrido.

299

A Comissão considera que estes argumentos devem ser julgados improcedentes.

300

A este respeito, importa observar que nada se opunha a que, no âmbito da apreciação da probabilidade do risco de deficiência do projeto que efetuou para determinar a taxa de remuneração para a garantia de crédito que correspondia à taxa que seria oferecida no mercado, a Comissão tivesse em conta os efeitos do contrato diferencial e do acordo do secretário de Estado. De facto, as três medidas em causa formam uma unidade e o contrato diferencial e este acordo visam justamente ultrapassar os obstáculos aos investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear constatadas pela Comissão. Ora, os efeitos destas medidas, nomeadamente o fluxo das receitas garantido pelo contrato diferencial, eram elementos relevantes para a análise da probabilidade do risco de deficiência do projeto. Em contrapartida, a abordagem seguida pela República da Áustria, segundo a qual tais elementos não são tidos em conta no âmbito desta análise, aumenta de forma excessiva o risco que deve ser considerado para a avaliação da garantia de crédito.

301

Daqui resulta que a Comissão não cometeu um erro manifesto de apreciação ao ter em conta os efeitos do contrato diferencial na apreciação da probabilidade de deficiência do projeto que efetuou no âmbito da avaliação da garantia de crédito. Por conseguinte, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria de que a Comissão não devia ter tido em conta os efeitos das outras medidas em causa na apreciação do risco de deficiência do projeto com vista à fixação de uma taxa de garantia adequada.

iii) Quanto aos argumentos relativos ao facto de a Comissão não ter tido suficientemente em conta critérios previstos na comunicação sobre as garantias

302

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo apresentam argumentos relativos ao facto de que, em substância, na avaliação da garantia de crédito, a Comissão não teve suficientemente em conta alguns critérios previstos na comunicação sobre as garantias. Neste contexto, invocam argumentos relativos a uma determinação insuficiente da duração da garantia, a uma determinação insuficiente do montante de cobertura máxima do empréstimo, ao facto de a taxa de remuneração para a garantia de crédito não ser suficientemente elevada e à existência de dificuldades financeiras por parte da EDF.

303

A Comissão, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia e a Roménia defendem que estes argumentos devem ser julgados improcedentes. Neste contexto, a Comissão afirma, nomeadamente, que, no caso em apreço, a comunicação sobre as garantias não era relevante.

304

A título preliminar, cabe recordar que, nos considerandos 336 a 339 da decisão impugnada, a Comissão considerou que a garantia de crédito constituía um auxílio estatal. A este respeito, afirmou, nomeadamente, que, atendendo à natureza sem precedente do projeto, do financiamento e da garantia para as quais não existia qualquer ponto de referência precisamente comparável, mesmo considerando que a taxa de remuneração ajustada para a garantia de crédito reduzia o auxílio ao mínimo, o preço pago pela NNBG para a referida garantia não podia ser considerado um preço de mercado, uma vez que o mercado não previa nem deveria prever qualquer mecanismo semelhante. Nenhuma das partes põe esta conclusão em causa.

305

Importa igualmente recordar que, como resulta dos considerandos 463 a 477 da decisão impugnada, a fim de responder às preocupações da Comissão relativas à subvalorização do risco ligado à garantia de crédito, o Reino Unido ajustou para 295 pontos base a taxa de remuneração para a referida garantia e a Comissão considerou que essa taxa de remuneração ajustada constituía uma aproximação correta de uma taxa de mercado hipotética para um mecanismo que não era oferecida pelo mercado.

306

Há que observar que, com os seus argumentos relativos à inobservância dos critérios previstos na comunicação sobre as garantias, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo pretendem demonstrar que a conclusão da Comissão segundo a qual a taxa de remuneração ajustada para a garantia de crédito de 295 pontos base constituía uma aproximação correta de uma taxa de mercado hipotética para um mecanismo que não era oferecido pelo mercado enferma de erros. Em substância, estes Estados‑Membros alegam que, na apreciação da questão de saber se essa taxa de remuneração constituía tal aproximação correta, a Comissão não teve em conta os critérios que um investidor numa economia de mercado teria tido em consideração, ou seja, a duração indeterminada da referida garantia, o montante excessivo da cobertura máxima do empréstimo e o facto de a EDF se deparar com dificuldades financeiras. Por outro lado, alegam que essa taxa de remuneração não era suficientemente elevada.

307

Deve igualmente observar‑se, por um lado, que a conclusão da Comissão de que uma taxa de remuneração ajustada para a garantia de crédito de 295 pontos base constituía uma aproximação correta de uma taxa de mercado hipotética se baseia na consideração de que um investidor numa economia de mercado hipotético teria exigido essa taxa de remuneração e, por outro, que os argumentos apresentados pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo e a República da Áustria visam demonstrar que tal investidor teria tido em conta elementos que a Comissão não teve em consideração e que teria exigido uma taxa de remuneração mais elevada.

308

Nestas circunstâncias, mesmo admitindo que a comunicação sobre as garantias não tivesse sido aplicável no caso em apreço, como invoca a Comissão, os argumentos destes Estados‑Membros, relativos a uma determinação insuficiente da duração da garantia, a uma determinação insuficiente do montante de cobertura máxima do empréstimo, ao facto de a taxa de remuneração para a garantia de crédito não ser suficientemente elevada e à existência de dificuldades financeiras por parte da EDF, não podem ser considerados irrelevantes apenas por, em apoio dos seus argumentos, esses Estados invocarem os critérios previstos na comunicação sobre as garantias.

309

Ora, independentemente da questão de saber se, no caso em apreço, a Comissão tinha que ter em conta os critérios previstos na comunicação sobre as garantias, os argumentos apresentados pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo e pela República da Áustria são improcedentes pelas razões apresentadas em seguida.

– Quanto à duração da garantia

310

A República da Áustria afirma que a Comissão não teve em conta o facto de a duração da garantia de crédito não estar determinada. Neste contexto, este Estado‑Membro faz referência ao critério constante do n.o 4.1, terceiro parágrafo, alínea b), da comunicação sobre as garantias.

311

A Comissão considera que esse argumento deve ser julgado improcedente.

312

A título preliminar, cabe recordar que, como resulta do n.o 3.2, alínea b), da comunicação sobre as garantias, uma das condições exigidas pelo n.o 3 da referida comunicação para que um Estado possa concluir pela inexistência de uma vantagem em aplicação desta é que a extensão da garantia seja limitada no tempo. Por outro lado, resulta do n.o 4.1, alínea b), da referida comunicação que, para calcular o equivalente subvenção incluído numa garantia em aplicação desta, a duração da garantia deve ser tida em conta. Resulta igualmente deste último número que, em princípio, a Comissão considera que as garantias ilimitadas são incompatíveis com o artigo 107.o TFUE.

313

Quanto aos argumentos apresentados pela República da Áustria, em primeiro lugar, há que julgar improcedente a sua alegação de que a garantia de crédito não estava limitada no tempo. A este respeito, basta observar que resulta do considerando 49 da decisão impugnada que esta garantia não é ilimitada, mas abrange o pagamento atempado do capital em dívida e dos juros da dívida elegível. Deve igualmente observar‑se que resulta do considerando 432 da referida decisão que o prazo da dívida garantida tem uma vida média ponderada de 27,4 anos, com prazos de obrigações que variam entre 8 e 41 anos.

314

Em segundo lugar, na medida em que, com os seus argumentos, a República da Áustria alega que, na determinação da taxa de remuneração ajustada para a garantia de crédito de 295 pontos base, a Comissão não teve suficientemente em conta a duração da referida garantia, em primeiro lugar, deve observar‑se que, no considerando 472 da decisão impugnada, a Comissão declarou que essa taxa de remuneração tinha em conta, nomeadamente, as suas preocupações quanto ao excecionalmente longo prazo de vencimento das obrigações a emitir. Em segundo lugar, há que concluir que a República da Áustria não apresenta qualquer outro argumento circunstanciado suscetível de retirar plausibilidade à conclusão da Comissão de que, atendendo ao vencimento das obrigações, essa taxa de remuneração tinha sido fixada de forma a refletir o preço que teria sido pago por um prestador de garantia numa economia de mercado.

315

Em face do exposto, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria relativo à duração da garantia.

– Quanto ao montante da cobertura do empréstimo

316

A República da Áustria afirma que a Comissão não determinou o montante da cobertura máxima do empréstimo. Neste contexto, refere o n.o 4.1, alínea c), da comunicação sobre as garantias.

317

A Comissão contesta estes argumentos.

318

A título preliminar, importa observar que, segundo o n.o 3.2, alínea c), da comunicação sobre as garantias, para que um Estado‑Membro possa excluir a existência de uma vantagem em aplicação do n.o 3 desta comunicação, em princípio, uma garantia não deve cobrir mais de 80 % do montante em dívida do empréstimo ou de outra obrigação financeira. Assim, resulta do n.o 3.2, alínea c), da referida comunicação que a Comissão considera que, quando uma garantia cobre na íntegra uma obrigação financeira, o mutuante tem menos interesse em avaliar, garantir e minimizar corretamente os riscos decorrentes dessa operação de empréstimo e, nomeadamente, em avaliar de forma adequada a fiabilidade creditícia do mutuário, e que é também possível que o garante estatal nem sempre proceda a esta apreciação do risco, por falta de meios. Por outro lado, o n.o 4.1, alínea c), da mesma comunicação prevê que este critério deve ser tido em conta no cálculo do elemento de auxílio incluído numa garantia.

319

Todavia, deve igualmente observar‑se que, segundo o n.o 3.2, alínea c), da comunicação sobre as garantias, este limiar não é aplicável às garantias que cobrem os títulos de dívida na aceção do artigo 2.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2004/109/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de dezembro de 2004, relativa à harmonização dos requisitos de transparência no que se refere às informações respeitantes aos emitentes cujos valores mobiliários estão admitidos à negociação num mercado regulamentado e que altera a Diretiva 2001/34/CE (JO 2004, L 390, p. 38), conforme alterada pela Diretiva 2008/22/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2008, que altera a Diretiva 2004/109 (JO 2008, L 76, p. 50). Segundo esta disposição, os títulos de dívida são obrigações ou outras formas de dívida titulada negociável, com exceção dos valores mobiliários que são equiparados a ações de sociedades ou que, quando convertidos ou quando exercidos os direitos por eles conferidos, dão origem a um direito de adquirir ações ou valores mobiliários equiparados a ações.

320

Em primeiro lugar, há que concluir que a garantia de crédito é relativa aos títulos emitidos em conformidade com as condições de um programa europeu de títulos de médio prazo e, assim, a títulos de dívida na aceção do artigo 2.o, n.o 1, alínea b), da Diretiva 2004/109. Por conseguinte, deve julgar‑se improcedente o argumento da República da Áustria de que a garantia de crédito não é conforme com o critério respeitante ao montante da cobertura máxima do empréstimo previsto no n.o 3.2, alínea c), e no n.o 4.1, alínea c), da comunicação sobre as garantias.

321

Em segundo lugar e em todo caso, o n.o 3.2, alínea c), da comunicação sobre as garantias não descarta que, em caso de ultrapassagem do limiar de 80 %, a existência de uma vantagem possa ser excluída. Com efeito, resulta deste número que, quando o referido limiar não é respeitado, é suposto o Estado‑Membro notificar a medida e justificar a sua afirmação de que a medida em causa não constitui um auxílio estatal. Por conseguinte, mesmo quando este limiar tenha sido ultrapassado, isto não é suficiente para considerar manifestamente errada a conclusão da Comissão de que uma taxa de remuneração ajustada para a garantia de crédito de 295 pontos base correspondia a uma taxa de remuneração que um prestador de garantia numa economia de mercado teria exigido.

322

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedente o argumento relativo à ultrapassagem do limiar referido nos n.os 3.2, alínea c), e 4.1, terceiro parágrafo, alínea c), da comunicação sobre as garantias.

– Quanto à existência das dificuldades financeiras da EDF

323

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que a Comissão devia ter tido em conta o facto de que a EDF, a sociedade‑mãe da NNBG, passava por dificuldades financeiras. Consideram que os elementos de prova que apresentaram no decurso do processo no Tribunal Geral permitem demonstrar esse facto. Segundo estes Estados‑Membros, em circunstâncias excecionais, o elemento de auxílio pode revelar‑se tão elevado como o montante efetivamente coberto pela garantia de crédito. Mesmo apesar de esses elementos de prova não terem sido apresentados no procedimento administrativo, a Comissão devia ter tido em conta os factos a que esses documentos fazem referência. Neste contexto, estes Estados‑Membros referem os n.os 3.2, alínea a), e 4.1, alínea a), da comunicação sobre as garantias.

324

A Comissão e a República Francesa consideram que estes argumentos devem ser julgados improcedentes. Neste contexto, a Comissão afirma que os documentos em que a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo se baseiam não lhe foram apresentados no procedimento administrativo, e que, por conseguinte, não tinha a que ter em conta a circunstância invocada pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo.

325

A título preliminar, há que observar que, segundo o n.o 3.2, alínea a), da comunicação sobre as garantias, uma das condições que permitem a um Estado‑Membro excluir a existência de uma vantagem em aplicação desta é a inexistência de dificuldades financeiras do mutuário e, segundo o n.o 4.1, alínea a), da referida comunicação, esse elemento deve ser tido em conta no cálculo do elemento de auxílio. Como resulta do n.o 4.1, alínea a), segundo parágrafo, a Comissão considera que, para as empresas em dificuldade, um eventual prestador de garantia numa economia de mercado, cobraria, na altura da concessão da garantia, um prémio superior, dado o risco de incumprimento previsto, e que, caso a probabilidade de o mutuário não estar em condições de reembolsar o empréstimo seja particularmente elevada, essa taxa de mercado poderá não estar disponível e, em circunstâncias excecionais, o elemento de auxílio da garantia poderá ser tão elevado como o montante efetivamente coberto pela mesma.

326

Em primeiro lugar, há que apreciar o argumento da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo de que, por a EDF ser uma empresa em dificuldade, a Comissão devia ter considerado que o elemento de auxílio incluído na garantia de crédito era tão elevado como o montante efetivamente coberto pela referida garantia.

327

Neste contexto, cabe recordar que, segundo o n.o 9 das orientações comunitárias relativas aos auxílios estatais de emergência e à reestruturação a empresas em dificuldade (JO 2004, C 244, p. 2, a seguir «orientações sobre as empresas em dificuldade»), para as quais remete a comunicação sobre as garantias, uma empresa se encontra em dificuldades financeiras quando, com os seus próprios recursos ou com os recursos que os seus proprietários, acionistas e credores estão dispostos a conceder‑lhe, é incapaz de suportar prejuízos que a condenam, na ausência de uma intervenção externa dos poderes públicos, à morte económica quase certa a curto ou médio prazo.

328

Em apoio da sua alegação de que a EDF se encontrava em dificuldades financeiras, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo apresentam os elementos de prova seguintes:

documentos de referência publicados por outra sociedade parcialmente adquirida pela EDF (a seguir «sociedade em causa») nos primeiros trimestres dos anos 2012, 2013 e 2014;

um artigo publicado em 27 de fevereiro de 2011 num sítio Internet;

um artigo publicado em 1 de março de 2012 num jornal francês;

um artigo publicado em 8 de abril de 2013 num jornal do Reino Unido;

um artigo publicado em 26 de fevereiro de 2014 num jornal económico alemão;

um artigo publicado em 6 de outubro de 2014 num jornal económico alemão;

um artigo publicado em 5 de junho de 2015 num jornal francês;

um artigo publicado em 17 de fevereiro de 2016 num jornal francês;

um artigo publicado em 18 de fevereiro de 2016 num jornal francês;

dois artigos publicados em 12 de março de 2016 num jornal económico e financeiro do Reino Unido;

um relatório especial do Tribunal de Contas francês sobre a estratégia internacional da EDF de novembro de 2015;

um artigo de uma organização independente publicado em 13 de dezembro de 2012.

329

Em primeiro lugar, no que respeita ao artigo publicado em 27 de fevereiro de 2011 num sítio Internet, há que constatar que é relativo à situação financeira da EDF e que faz referência ao endividamento desta sociedade. Todavia, tendo em conta que menciona que a referida sociedade tinha recebido a nota AA de uma agência de notação, não é possível daí deduzir que o endividamento da sociedade em questão tinha atingido tal dimensão que era previsível uma morte económica quase certa a curto ou a médio prazo. Com efeito, esta nota corresponde a uma elevada qualidade e a um investimento que, em princípio, é seguro.

330

Em segundo lugar, quanto ao artigo publicado em 8 de abril de 2013 num jornal do Reino Unido, daí apenas se pode inferir que o parceiro inicial da EDF para o projeto de Hinkley Point C tinha abandonado a energia nuclear e que, em razão da dívida da EDF no montante de 39 mil milhões de euros, não era certo que essa empresa conseguisse realizar por si só este projeto. Em contrapartida, não se inferir daí que a EDF era uma empresa em dificuldades financeiras na aceção do n.o 9 das orientações sobre as empresas em dificuldade.

331

Em terceiro lugar, no que respeita ao artigo publicado em 1 de março de 2012 num jornal francês e aos artigos publicados num jornal económico alemão em 26 de fevereiro e em 6 de outubro de 2014, importa observar que não se referem à EDF, mas à sociedade em causa. Ora, no momento da adoção da decisão impugnada, essa sociedade e a EDF eram empresas distintas e nem a República da Áustria nem o Grão‑Ducado do Luxemburgo apresentaram elementos que permitam concluir que, no momento da adoção da decisão impugnada, a Comissão sabia ou devia saber que, no futuro, a sociedade mencionada nos referidos artigos seria parcialmente adquirida pela EDF. Pelo contrário, neste contexto, há que salientar que, segundo as indicações da Comissão, que não são postas em causa pela República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo, o protocolo de acordo sobre a aquisição parcial da sociedade em causa pela EDF apenas foi assinado em 29 de julho de 2015, ou seja, após 8 de outubro de 2014, data da adoção da decisão impugnada. Por conseguinte, estes artigos não são suscetíveis de demonstrar a existência de dificuldades financeiras por parte da EDF no momento da adoção da decisão impugnada. Estas considerações valem igualmente para os documentos de referência publicados pela sociedade em causa nos primeiros trimestres dos anos 2012, 2013 e 2014, assim como para o artigo publicado no sítio Internet, na medida em que incluem informações relativas a esta última sociedade.

332

Em quarto lugar, no que respeita aos artigos publicados num jornal francês em 5 de junho de 2015, e em 17 e 18 de fevereiro de 2016, e ao artigo publicado num jornal económico e financeiro do Reino Unido em 12 de março de 2016, há que observar que foram publicados posteriormente à adoção da decisão impugnada.

333

Neste contexto, cabe recordar que a legalidade de uma decisão da Comissão em matéria de auxílios estatais deve ser apreciada em função dos elementos de informação de que a Comissão podia dispor no momento em que a tomou (Acórdão de 10 de julho de 1986, Bélgica/Comissão, 234/84, EU:C:1986:302, n.o 16). Ora, no caso em apreço, a Comissão não podia dispor destes elementos de informação, uma vez que os artigos acima referidos no n.o 332 foram publicados após a adoção da decisão impugnada e nada nos autos indica que a referida instituição podia dispor das informações que aqueles incluíam antes de adotar esta decisão.

334

Em todo caso, mesmo na hipótese de a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo terem apresentado os artigos acima referidos no n.o 328 para demonstrar a existência de circunstâncias ocorridas antes da adoção da decisão impugnada, estes não seriam suscetíveis de demonstrar que, antes da referida adoção, a EDF era uma empresa em dificuldades financeiras na aceção do n.o 9 das orientações sobre as empresas em dificuldade. Com efeito, na medida em que, nesses artigos, é feita referência ao desmantelamento da sociedade em causa e à aquisição de uma parte desta pela EDF, cabe recordar que tais eventos ocorreram posteriormente a esta adoção (v., n.o 331, supra). Por outro lado, há que observar que não se pode inferir deduzido desses artigos que, antes da adoção em questão, o endividamento da EDF tinha atingido uma dimensão tal que conduzia essa empresa, sem uma intervenção externa, a uma morte económica quase certa a curto a médio prazo.

335

Em quinto lugar, a República da Áustria alega que resulta da página 5 do relatório especial do Tribunal de Contas francês sobre a estratégia internacional da EDF de novembro de 2015 que essa sociedade se encontrava, no fim de 2009, numa «situação de fragilidade financeira» e da página 7 deste mesmo relatório que a «situação financeira [da referida sociedade era] frágil e mesmo à custa de um aumento da dívida».

336

A este respeito, basta observar que não se pode inferir do relatório especial do Tribunal de Contas francês sobre a estratégia internacional da EDF de novembro de 2015 que, à data da adoção da decisão impugnada, a EDF era uma empresa que passava por dificuldades financeiras na aceção do n.o 9 das orientações sobre as empresas em dificuldade. Com efeito, por um lado, na página 5 do referido relatório, é indicado que, «no fim de 2009, [a EDF] encontrava‑se numa situação de fragilidade financeira», mas, em seguida, é indicado que «[u]m novo ciclo, correspondente ao período [de] fiscalização [do Tribunal de Contas] se [tinha] aberto, dominado por cessões de um montante total de cerca de 13 [mil milhões de euros]». Por outro, há que constatar que a formulação que figura na página 7 deste relatório, segundo a qual «a preocupação maior do Estado acionista [tinha] sido o grupo continuar a distribuir dividendos substanciais, apesar de uma situação financeira frágil e mesmo à custa de um aumento da dívida», não demonstra que o endividamento da EDF a teria conduzido para uma morte económica quase certa a curto a médio prazo.

337

Em sexto lugar, no que respeita ao artigo de uma organização independente de 13 de dezembro de 2012, daí resulta que as despesas com a construção das centrais nucleares de Flamanville e de Olkiluoto aumentaram. Ora, antes de mais, decorre claramente da decisão impugnada que a Comissão teve em conta estas circunstâncias. Em seguida, há que constatar que não pode ser deduzido do referido artigo que a EDF ou a sociedade em causa estavam em dificuldades financeiras. Por último, no que respeita às informações deste artigo relativas a esta sociedade, basta remeter para as considerações acima desenvolvidas no n.o 331. Assim, este artigo também não é suscetível de demonstrar a existência de um erro manifesto da Comissão.

338

Os elementos de prova apresentados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo não são, por isso, suscetíveis de demonstrar que a EDF passava por dificuldades financeiras na aceção do n.o 9 das orientações sobre as empresas em dificuldade. Por conseguinte, há que julgar improcedente o argumento destes Estados‑Membros segundo o qual, devido ao facto de a EDF ser uma empresa em dificuldade, a Comissão devia ter considerado que o elemento de auxílio incluído na garantia de crédito era tão elevado como o montante efetivamente coberto pela referida garantia.

339

Em segundo lugar, na medida em que os argumentos apresentados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo visam demonstrar que, atendendo à situação financeira em que se encontrava a EDF, um investidor numa economia de mercado não teria aceitado uma taxa de remuneração para a garantia de crédito de 295 pontos base, basta observar que estes Estados‑Membros não apresentaram argumentos circunstanciados suscetíveis de demonstrar que as considerações da Comissão desenvolvidas no ponto 9.5.3.1 da decisão impugnada estavam privadas de plausibilidade. Nomeadamente, estes Estados‑Membros não apresentam qualquer argumento suscetível de demonstrar que era manifestamente errado ter como base a nota BB ou Ba, nem qualquer argumento suscetível de demonstrar que, em primeiro lugar, a comparação entre a média de 102 contratos de troca do risco de crédito de empresas europeias na categoria de risco BB, por um lado, e o valor médio de 286 pontos base para a referida categoria de risco que a Comissão tinha efetuado, por outro, ou, em segundo lugar, o ajustamento da taxa de remuneração para a referida garantia de crédito em 295 pontos base que tinha sido efetuado para responder às preocupações da Comissão (v., n.o 290, supra) estavam privados de plausibilidade.

340

Por conseguinte, há que julgar igualmente improcedentes os argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo de que a Comissão não teve em conta os critérios previstos no n.o 3.2, alínea a), e no n.o 4.1, alínea a), da comunicação sobre as garantias, não sendo necessário apreciar o argumento da Comissão de que os documentos apresentados por esses Estados‑Membros não tinham sido apresentados no procedimento administrativo.

– Quanto ao argumento de que a taxa de remuneração devia ser, no mínimo, de 400 pontos base

341

Na réplica, a República da Áustria alega que, em aplicação do n.o 3.4, alínea f), sexto parágrafo, da comunicação sobre as garantias, o prémio de risco mínimo é de 400 pontos base. A Comissão não explicou por que razão a garantia de crédito, para a qual tinha sido prevista uma taxa de remuneração ajustada de 295 pontos base, constituía um risco menor.

342

A Comissão e o Reino Unido contestam estes argumentos.

343

A este respeito, em primeiro lugar, importa observar que o critério mencionado no n.o 3.4, alínea f), sexto parágrafo, da comunicação sobre as garantias e para o qual remete o n.o 4.2 da referida comunicação, é unicamente aplicável aos regimes de garantias e não às garantias individuais. Ora, a garantia de crédito não constitui um regime de garantia na aceção do n.o 1.3, alínea a), desta comunicação.

344

Em segundo lugar e em todo caso, há que observar que, contrariamente ao que dá a entender a República da Áustria, o montante de 400 pontos base previsto no n.o 3.4, alínea f), sexto parágrafo, da comunicação sobre as garantias não visa diretamente a taxa de remuneração para a garantia. Com efeito, como resulta do n.o 3.4, alínea f), da referida comunicação, os prémios devem cobrir os riscos normais associados à concessão da garantia, os custos administrativos do regime e uma remuneração anual de um capital adequado. A remuneração anual do capital adequado é constituída por um prémio de risco, possivelmente majorado da taxa de juro sem risco. Ora, o montante de 400 pontos base referido no n.o 3.4, alínea f), sexto parágrafo, desta comunicação diz unicamente respeito ao prémio de risco normal para capitais próprios, que deve ser incluído no prémio de garantia cobrado aos beneficiários. Daqui resulta que, contrariamente ao que dá a entender a República da Áustria, a taxa de remuneração não pode ser comparada diretamente à taxa de 400 pontos base prevista no referido número.

345

Em terceiro lugar e por acréscimo, há que observar que o n.o 3.4, alínea f), sexto parágrafo, da comunicação sobre as garantias limita‑se a precisar um elemento de uma metodologia que permite a um Estado‑Membro fixar uma taxa de remuneração correspondente à que um prestador de garantia numa economia de mercado exigiria. Ora, este número não de se opõe de forma alguma a que, em vez de seguir esta metodologia, a Comissão siga uma abordagem diferente para determinar essa taxa, tomando como ponto de referência as taxas de remuneração exigidas pelos prestadores de garantia numa economia de mercado para projetos comparáveis e ajustando essas taxas tendo em conta as especificidades do projeto em causa. Por conseguinte, este número não se opõe ao critério que a Comissão seguiu no caso em apreço (v., n.o 290, supra).

346

Tendo em consideração o exposto, há que julgar igualmente improcedente o argumento de que a Comissão não teve em conta o método de cálculo referido no n.o 3.4, alínea f), sexto parágrafo, e no n.o 4.2 da comunicação sobre as garantias.

347

Os argumentos apresentados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo relativos à inobservância dos critérios previstos na comunicação sobre as garantias não são, pois, suscetíveis de demonstrar a existência de um erro manifesto que afete as considerações da Comissão que figuram nos n.os 475 e 476 da decisão impugnada, segundo as quais a taxa de remuneração ajustada para a garantia de crédito de 295 pontos base correspondia a uma taxa que a NNBG devia ter pago na hipótese de tal garantia ter sido prestada no mercado.

348

Deste modo, há que julgar improcedentes estes argumentos, não sendo necessário apreciar a questão de saber se a Comissão tinha a obrigação, no caso em apreço, de ter em conta os critérios previstos na comunicação sobre as garantias.

349

Por conseguinte, todos os argumentos relativos à garantia de crédito devem ser julgados improcedentes.

4) Quanto à cumulação das medidas em causa

350

No âmbito do quinto fundamento, a República da Áustria alega que a Comissão não teve em conta o princípio da cumulação, que exige que todas as medidas em causa sejam determináveis na sua totalidade.

351

A este respeito, em primeiro lugar, na medida em que, com este argumento, a República da Áustria afirma novamente que a Comissão tinha a obrigação de calcular o montante exato do equivalente subvenção das medidas em causa ou que não determinou suficientemente o elemento de auxílio incluído nas diferentes medidas em causa, há que julgar improcedente este argumento, remetendo para os n.os 247 a 349, supra.

352

Em segundo lugar, na medida em que, com este argumento, a República da Áustria pretende alegar que a Comissão não teve suficientemente em conta o efeito cumulativo das três medidas em causa, há que observar que este argumento visa a existência de uma sobrecompensação. Assim, será tido em conta no âmbito da apreciação do sexto fundamento, relativo à proporcionalidade das medidas em causa.

353

Por conseguinte, este argumento deve igualmente ser julgado improcedente, bem como todos os argumentos destinados a demonstrar que os elementos de auxílio incluídos nas medidas em causa não foram suficientemente determinados.

c)   Quanto aos custos relativos à gestão e ao armazenamento de resíduos nucleares

354

No âmbito do quinto fundamento, a República da Áustria alega que, na decisão impugnada, a Comissão não determinou suficientemente os custos relativos à gestão e ao armazenamento de resíduos nucleares.

355

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que a medida de auxílio declarada compatível pela Comissão é unicamente relativa ao contrato diferencial, ao acordo do secretário de Estado e à garantia de crédito. Em contrapartida, a decisão impugnada não visa um eventual auxílio estatal concedido pelo Reino Unido para cobrir as despesas relativas à gestão e ao armazenamento de resíduos nucleares.

356

Em segundo lugar, deve observar‑se que, como resulta do considerando 461 da decisão impugnada, no âmbito da sua avaliação das medidas em causa, a Comissão teve em conta as informações sobre as despesas relativas à gestão e ao armazenamento de resíduos nucleares que figuram no modelo financeiro para Hinkley Point C. Com efeito, como afirma corretamente a Comissão, como se tratava de custos que deviam ser suportados pelo operador da central, deviam ser tidos em conta no âmbito do cálculo do nível de rendimento necessário, a fim de criar um efeito de incentivo suficiente.

357

Em terceiro lugar, refira‑se que, nos considerandos 460 e 461 da decisão impugnada, a Comissão recordou expressamente que qualquer elemento de auxílio suplementar, quanto às despesas relativas à gestão e ao armazenamento de resíduos nucleares que não estava incluído nas medidas em causa, devia ser notificado separadamente.

358

Tendo em consideração estes elementos, há que concluir que a Comissão atuou em conformidade com os princípios acima recordados nos n.os 263 a 266. Assim, o argumento da República da Áustria relativo ao facto de a Comissão não ter determinado suficientemente os custos relativos à gestão e ao armazenamento de resíduos deve ser julgado improcedente.

359

Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo facto de, em 20 de julho de 2015, ou seja, posteriormente à adoção da decisão impugnada, o Reino Unido ter notificado o método de fixação de preços para os contratos de transferência de resíduos nucleares e de, por Decisão, de 9 de outubro de 2015, no processo SA.34962, Waste Contract for New Nuclear Power Stations (JO 2016, C 161, p. 1), a Comissão ter qualificado de auxílio estatal esse método e de o ter declarado compatível com o mercado interno nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Com efeito, estes factos são posteriores à adoção da decisão impugnada e, assim, não podem pôr em causa a sua legalidade (v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2014, DTS Distribuidora de Televisión Digital/Comissão, T‑533/10, EU:T:2014:629, n.o 75). Por outro lado, no caso de a República da Áustria considerar que a medida de auxílio autorizada pela Decisão de 9 de outubro de 2015 não devia ser declarada compatível com o mercado interno, cabia‑lhe invocar esses argumentos em sede de recurso dessa decisão. Em contrapartida, tais argumentos são irrelevantes para o presente recurso, que tem por objeto um pedido de anulação da decisão impugnada, que não é relativa a esse método de fixação de preços.

d)   Quanto à eventual concessão de futuros auxílios estatais

360

No âmbito do quinto fundamento, a República da Áustria alega que, no futuro, os auxílios suplementares a favor de Hinkley Point C poderiam eventualmente ser concedidos sob a forma de uma garantia pública.

361

No que respeita a este argumento, basta observar que faz referência a factos que poderiam eventualmente ocorrer após a data da adoção da decisão impugnada e que, assim, não seriam suscetíveis de pôr em causa a legalidade desta (v., n.o 359, supra). Em todo caso, na medida em que a República da Áustria considera que nenhum auxílio suplementar é compatível com o mercado interno, estes argumentos não podem ser tidos em conta no âmbito do presente recurso, que respeita unicamente a um pedido de anulação da decisão impugnada, referente às medidas em causa.

362

Por conseguinte, há que julgar improcedentes todos os argumentos destinados a demonstrar que os elementos de auxílio incluídos nas medidas em causa não foram suficientemente determinados.

3.   Quanto aos argumentos relativos a uma violação do dever de fundamentação

363

Quanto aos argumentos, relativos a uma violação do dever de fundamentação, que a República da Áustria apresenta no âmbito da quarta parte do nono fundamento, basta observar que se baseiam na premissa errada de que a Comissão estava obrigada a determinar ainda com maior detalhe as medidas em causa. Assim, estes argumentos devem ser julgados improcedentes.

364

Deve igualmente ser julgado improcedente o argumento da República da Áustria de que o método utilizado pela Comissão para definir o elemento de auxílio incluído na garantia de crédito é incompreensível. Com efeito, como já foi acima exposto nos n.os 285 a 349, resulta de forma suficientemente clara da decisão impugnada que a Comissão ajustou as modalidades da garantia de crédito notificada pelo Reino Unido de maneira a que o elemento de auxílio incluído nesta garantia fosse reduzido ao mínimo.

365

Deste modo, os argumentos relativos a uma violação do dever de fundamentação devem igualmente ser julgados improcedentes.

366

Por conseguinte, há que julgar improcedentes os quinto e oitavo fundamentos, bem como a quarta parte do nono fundamento, sem prejuízo da apreciação do argumento relativo a um efeito de encerramento do mercado interno da eletricidade e aos efeitos das medidas em causa sobre os preços neste mercado (v., n.o 273, supra) e do argumento relativo ao facto de a Comissão não ter tido suficientemente em conta o efeito cumulativo das três medidas em causa (v., n.o 352, supra), que será tido em conta no âmbito da apreciação do sexto fundamento.

F. Quanto ao sexto fundamento, à segunda alegação da terceira parte e à sexta parte do nono fundamento, relativos à fiscalização da proporcionalidade das medidas em causa

367

O sexto fundamento, a segunda alegação da terceira parte e a sexta parte do nono fundamento são relativos às considerações da Comissão desenvolvidas nos n.os 9.5 e 9.6 da decisão impugnada, segundo as quais as medidas em causa eram conformes com o princípio da proporcionalidade. No considerando 548 da referida decisão, a Comissão concluiu que, sem prejuízo de um ajustamento da taxa de remuneração para a garantia de crédito em 295 pontos base e de uma alteração dos mecanismos em matéria de partilha dos ganhos, as distorções de concorrência resultantes da entrada em funcionamento da Hinkley Point C eram reduzidas ao mínimo necessário e eram compensadas pelos efeitos positivos das medidas.

368

Numa primeira fase, há que apreciar o sexto fundamento, destinado a demonstrar a existência de erros relativos à fiscalização da proporcionalidade das medidas em causa. Numa segunda fase, serão apreciadas a segunda alegação da terceira parte e a sexta parte do nono fundamento, relativas, nomeadamente, a uma fundamentação insuficiente.

1.   Quanto ao sexto fundamento, relativo à fiscalização da proporcionalidade das medidas em causa

369

Em apoio do sexto fundamento, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo afirmam que as considerações da Comissão desenvolvidas nos n.os 9.5 e 9.6 da decisão impugnada enfermam de erros manifestos.

370

Neste contexto, a título preliminar, deve recordar‑se que, para ser compatível com o mercado interno na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, uma medida de auxílio deve ser adequada e necessária para alcançar o objetivo de interesse público prosseguido. Por outro lado, a alteração das condições das trocas comerciais e o falsear da concorrência que causa não devem ser excessivos face aos efeitos positivos que daí resultam (v., neste sentido, Acórdãos de 25 de junho de 1998, British Airways e o./Comissão, T‑371/94 e T‑394/94, EU:T:1998:140, n.os 282 e 283; e de 26 de fevereiro de 2015, França/Comissão, T‑135/12, não publicado, EU:T:2015:116, n.o 60).

371

Importa igualmente recordar que, como já foi acima exposto nos n.os 79 a 128, não apenas o Reino Unido podia escolher a tecnologia nuclear enquanto fonte de energia que devia fazer parte do seu cabaz energético, como, atendendo aos artigos 2.o, alínea c), e 192.o, primeiro parágrafo, do Tratado Euratom, tinha igualmente o direito de determinar a construção de novas capacidades de produção de energia nuclear como um objetivo de interesse público na aceção do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE.

372

No que respeita à extensão da fiscalização que o Tribunal Geral deve efetuar no presente contexto, deve sublinhar‑se que a Comissão beneficia de um amplo poder de apreciação no âmbito da aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Por conseguinte, a fiscalização efetuada pelo Tribunal Geral é limitada (v., n.os 160 e 161, supra).

373

É à luz destas considerações que se devem apreciar os argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo apresentados em apoio do sexto fundamento, que se dividem em três partes, a primeira das quais visa o caráter adequado das medidas em causa, a segunda o seu caráter necessário e a terceira a ponderação dos seus efeitos positivos e negativos.

a)   Quanto ao caráter adequado das medidas em causa

374

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo afirmam que, contrariamente ao que considerou a Comissão, as medidas em causa não eram adequadas para alcançar os objetivos de melhoria da segurança de fornecimento nem de diversificação dos fornecedores de eletricidade, nem de descarbonização.

375

Em primeiro lugar, a República da Áustria alega que as medidas em causa não são adequadas para melhorar a segurança de fornecimento e para alcançar uma diversificação dos fornecedores de eletricidade.

376

Por um lado, a República da Áustria alega, no que respeita à segurança de fornecimento, que a energia nuclear não oferece qualquer vantagem em relação a outras fontes de energia mais ecológicas e menos onerosas. Antes de mais, os Estados‑Membros são dependentes de importações quanto ao minério de urânio. Em seguida, as centrais nucleares são muito sensíveis aos aumentos de temperatura devido às suas elevadas necessidades de água fria. Por outro, as pequenas centrais elétricas descentralizadas são mais baratas e podem ser rapidamente ativadas e desativadas, o que permite uma capacidade de resposta muito maior face a uma procura de eletricidade que evolui rapidamente. Além disso, uma falha numa central elétrica pequena é muito mais controlável do que uma falha numa central nuclear. De resto, nos diferentes cenários que previu, a Comissão não teve em conta o plano de interconexão, que visa, nomeadamente, integrar as fontes de energias renováveis e as evoluções técnicas futuras. Acresce que, segundo a República da Áustria, no futuro haverá um aumento considerável das capacidades de produção de energia no Reino Unido. Por último, a Comissão não refletiu de forma suficiente sobre a possibilidade de resolver uma eventual escassez no fornecimento através do recurso a diferentes medidas de eficiência energética.

377

Por outro lado, a República da Áustria afirma que as medidas em causa não contribuem para a diversificação dos fornecedores de eletricidade, antes produzem o efeito inverso. A extensão da central nuclear Hinkley Point limita os meios públicos, reduz fortemente o orçamento alocado às energias renováveis e impede a prossecução de projetos de exploração e de desenvolvimento das fontes de energias renováveis. As referidas medidas contribuem, assim, para a perpetuação da energia nuclear à custa das energias renováveis e, por isso, para a manutenção da estrutura atual de fornecimento caracterizada pela parte significativa da energia nuclear. Por conseguinte, estas medidas são contrárias ao objetivo alegadamente prosseguido de diversificação dos fornecedores de eletricidade.

378

Em segundo lugar, a República da Áustria alega que as medidas em causa não são adequadas para alcançar o objetivo da descarbonização. A energia nuclear revela‑se fundamentalmente mais cara do que, por exemplo, a energia eólica ou a energia hidráulica. Segundo a República da Áustria, se as referidas medidas fossem consagradas a estes modos de produção elétrica, as emissões de dióxido de carbono poderiam ser reduzidas ainda mais.

379

A Comissão, a República Checa, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

380

A este respeito, cabe recordar que, no ponto 9.2 da decisão impugnada, a Comissão identificou a promoção da energia nuclear, e, mais especificamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, como objetivo de interesse público prosseguido pelas medidas em causa. Como foi exposto no âmbito do quarto fundamento, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo não apresentaram argumentos suscetíveis de pôr em causa esta conclusão.

381

Ora, há que concluir que os argumentos apresentados pela República da Áustria se limitam a pôr em causa o caráter adequado das medidas em questão no que respeita à prossecução de outros objetivos, como a melhoria da segurança de fornecimento, a diversificação de fornecedores e a descarbonização. Em contrapartida, não visam pôr em causa o caráter adequado destas medidas no que respeita ao objetivo de interesse comum estabelecido pelo Reino Unido, ou seja, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, que a Comissão teve em conta. Daqui resulta que estes argumentos apresentados pela República da Áustria não são suscetíveis de pôr em causa o mérito das considerações da Comissão relativas ao caráter adequado das referidas medidas. Por conseguinte, no presente contexto, devem ser julgados inoperantes.

382

Todavia, importa concluir que alguns dos argumentos apresentados pela República da Áustria visam, em substância, a ponderação dos efeitos positivos e dos efeitos negativos das medidas em causa efetuada pela Comissão na decisão impugnada. Estes argumentos serão tidos em conta no âmbito da apreciação da terceira parte do sexto fundamento, que visa esta ponderação.

b)   Quanto ao caráter necessário das medidas em causa

383

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que as medidas em causa vão além do necessário para a realização dos objetivos de melhoria da segurança de fornecimento, de diversificação de fornecedores e de descarbonização, assim provocando uma distorção excessiva da concorrência. O mecanismo de auxílio do contrato diferencial, que permite investir, graças ao preço base garantido, em capacidades de produção de energia nuclear, é suscetível de influenciar as condições de concorrência no mercado da energia do Reino Unido. Entendem, nomeadamente, que Hinkley Point C será incentivada a produzir mesmo quando os preços da eletricidade sejam negativos. Isto produzirá efeitos negativos nesse mercado, materializados sob a forma de disfunções e prejudicará os fornecedores alternativos de eletricidade. Os produtores de energias renováveis serão afastados do mercado, por falta de cláusulas comparáveis às que figuram do contrato diferencial.

384

Neste contexto, em primeiro lugar, a República da Áustria alega que um aumento da oferta de eletricidade produzida pelas centrais nucleares na sequência da sua subvenção influenciará a curva de mérito a favor destas, provocará disfunções no mercado da energia e poder levar à exclusão de tecnologias suscetíveis de estabilizar eficazmente as redes, nomeadamente as centrais a gás. Em seu entender, isto comprometerá a elaboração de uma combinação eficaz das capacidades de produção baseada em centrais a gás flexíveis associadas à energia eólica volátil, tornando a exploração e a manutenção de um número crescente de centrais a gás não rentáveis. Considera, com efeito, que as centrais a gás terão sérias dificuldades para se manter no mercado em 2030, ao passo que centrais nucleares subvencionadas, como Hinkley Point C, gerarão taxas de cobertura elevadas graças aos auxílios que lhes terão sido concedidos e serão incentivadas a alimentar de forma imponderada a rede durante as fases em que esta já receberá injeções significativas de eletricidade proveniente de energias renováveis. Isto compromete a segurança de fornecimento devido à previsível redução das capacidades de produção flexíveis.

385

Em segundo lugar, a República da Áustria alega que, contrariamente ao que a Comissão considera, as medidas em causa não têm o efeito de incentivo adequado para a realização de investimentos. Atendendo às repercussões destas medidas, o efeito de incentivo que a referida instituição postula a favor do beneficiário não é adequado para alcançar a finalidade pretendida. Estas medidas criam estruturas de incentivos falsas para a produção de energia elétrica, que são inclusivamente suscetíveis, em determinadas condições de mercado, de comprometer a segurança de fornecimento em vez de a garantir. Além disso, podem surgir e repercutir‑se distorções de mercado e disfunções quer no mercado nacional quer no mercado europeu da eletricidade. Antes de mais, a promoção da energia nuclear conduz a uma potencial capacidade excessiva da produção não flexível. Devido ao mecanismo de subvenção, numa situação de preços negativos, a NNBG, na sua qualidade de operador de Hinkley Point C, é incentivada economicamente, não a reduzir a quantidade de eletricidade produzida em caso de oferta excessiva, mas, pelo contrário, a continuar a sua produção para alimentar a rede, sem ter de forma alguma em conta a situação da rede. Isto tem como efeito obrigar os produtores de energias renováveis, em particular as instalações eólicas que o Reino Unido ambiciona desenvolver, a reduzir artificialmente as suas injeções, para não comprometer a estabilidade da rede. Segundo a República da Áustria, estes retirar‑se‑ão do mercado, deverão pagar preços negativos para a sua produção e perderão as suas subvenções ou a possibilidade de beneficiarem de eventuais subvenções. Em seguida, Hinkley Point C contribui diretamente para tornar ainda mais provável o cenário de preços negativos. Uma vez que, em todo caso, uma central nuclear, com ou sem auxílio estatal, apenas tem possibilidades de reação limitadas aos preços do mercado, aos picos de procura e a tudo o que pode comprometer a estabilidade da rede, uma central subvencionada através de um contrato diferencial contribui assim mais especificamente para influenciar negativamente as condições do mercado para tecnologias concorrentes e, beneficiando simultaneamente de subvenções consideráveis, pode expulsar do mercado tecnologias com custos marginais menos elevados. Por último, a República da Áustria acrescenta que o preço da eletricidade por megawatt/hora, produzida por Hinkley Point C será duas vezes mais elevado que o preço atualmente proposto no mercado.

386

Em terceiro lugar, a República da Áustria alega que as medidas em causa prejudicam excessivamente as outras tecnologias. Contrariamente às considerações da Comissão, as outras tecnologias não podem ser apoiadas de forma semelhante por contratos diferenciais. Os auxílios à produção de energia a partir de fontes de energias renováveis estão sujeitos a critérios determinados, muito restritos e claramente definidos pelo Regulamento n.o 651/2014 e pelas Orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia 2014‑2020. Ora, as referidas medidas e, em particular, o contrato diferencial não cumprem qualquer uma destas condições. Pelo contrário, estas medidas provocam inclusivamente a exclusão dos produtores de energia renovável, visto que não podem receber auxílios comparáveis aos que recebem os operadores de centrais nucleares. Além disso, tais medidas permitem à NNBG beneficiar de subvenções sem ter de forma alguma em conta a situação da rede, enquanto, por exemplo, as instalações eólicas devem fazer prevalecer a estabilidade da rede sobre as suas injeções de eletricidade e, assim, sobre a sua possibilidade de beneficiarem de eventuais subvenções.

387

A Comissão, a República Checa, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

388

A título preliminar, importa observar que os argumentos que a República da Áustria apresenta se dividem, em substância, em três alegações, sendo a primeira relativa ao facto de as medidas em causa não serem necessárias para alcançar os objetivos de melhoria da segurança de fornecimento, de diversificação de fornecedores e de descarbonização, a segunda relativa ao facto de que teriam sido suficientes centrais de dimensão mais moderada e a terceira relativa ao facto de a Comissão não ter analisado de forma suficiente o risco de sobrecompensação.

389

Em primeiro lugar, há que apreciar os argumentos da República da Áustria de que as medidas em causa não eram necessárias para alcançar os objetivos de melhoria da segurança de fornecimento, de diversificação de fornecedores e de descarbonização.

390

A este respeito, basta recordar que, na decisão impugnada, a Comissão teve em conta o objetivo de interesse público relativo à criação de novas capacidades de produção de energia nuclear (v., n.o 380, supra). Assim, os argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo de que as medidas em causa não eram necessárias para alcançar os objetivos de melhoria da segurança de fornecimento, de diversificação de fornecedores e de descarbonização não são suscetíveis de pôr em causa o mérito das considerações da Comissão. Por conseguinte, devem ser julgados improcedentes.

391

Em segundo lugar, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria de que seriam suficientes centrais mais pequenas, potencialmente modulares, uma vez que essas centrais poderiam ser ativadas mais rapidamente e uma falha numa dessas centrais seria mais controlável do que uma falha ocorrida em Hinkley Point. Com efeito, na medida em que este argumento visa centrais não nucleares, basta recordar que tais centrais não são adequadas para alcançar o objetivo de promoção da energia nuclear, prosseguido pelas medidas em causa. Quanto ao restante, basta observar que a República da Áustria não apresentou as razões pelas quais a construção de várias centrais nucleares mais pequenas destinadas a criar a mesma carga de base de energia nuclear que a central de Hinkley Point C seria suscetível de ter um efeito mais limitado nas condições das trocas comerciais e na concorrência que a construção da referida central.

392

Em terceiro lugar, a República da Áustria alega que a Comissão não teve suficientemente em conta o facto de o Reino Unido ter previsto três medidas, cujo montante individual já seria excecionalmente elevado. Na decisão impugnada, a referida instituição limitou‑se a justificar cada um dos elementos de forma separada, sem no entanto ter em conta o seu efeito cumulado. Este argumento e o argumento apresentado no âmbito do quinto fundamento, segundo os quais a Comissão não teve em conta o efeito cumulativo das medidas em causa (v., n.o 352, supra) sobrepõem‑se. Neste contexto, importa igualmente ter em conta o argumento apresentado no âmbito do primeiro fundamento, segundo o qual não era necessário «imunizar» os operadores de Hinkley Point C (v., n.o 196, supra).

393

Em primeiro lugar, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria de que a Comissão se limitou a apreciar as medidas em causa de forma individual, sem ter em conta o seu efeito cumulado. Com efeito, por um lado, resulta do considerando 337 da decisão impugnada que a Comissão considerou que essas medidas estavam interligadas. Por outro, resulta dos considerandos 407 e 479 da referida decisão que, no âmbito da apreciação da proporcionalidade das referidas medidas, a Comissão essa interligação teve em conta. Com efeito, nos referidos considerandos, a Comissão concluiu que as taxas de rentabilidade com base nas quais o preço de exercício para o contrato diferencial tinha sido calculado eram coerentes com todas as medidas que as enquadravam. Ora, o acordo do secretário de Estado e a garantia de crédito fazem parte destas medidas. Daqui resulta que, na apreciação do caráter necessário do elemento de auxílio incluído no contrato diferencial, a Comissão teve em conta os elementos de auxílio incluídos nas duas outras medidas em causa.

394

Em segundo lugar, há que observar que a República da Áustria não apresenta qualquer argumento circunstanciado suscetível de demonstrar que os elementos de auxílio incluídos nas diferentes medidas em causa são excessivos face ao objetivo de dar origem a uma decisão de investimento em novas capacidades de produção de energia nuclear.

395

Antes de mais, no que respeita à garantia de crédito, cabe recordar que a Comissão exigiu que o montante da sua comissão fosse alterado para reduzir ao mínimo o elemento de auxílio nela incluído. Neste contexto, importa igualmente recordar que a apreciação do oitavo fundamento não revelou erros manifestos da Comissão a este respeito (v., n.os 285 a 349, supra).

396

Em seguida, quanto ao acordo do secretário de Estado, deve recordar‑se que o elemento de auxílio aí incluído se limita a um direito contratual, que, em caso de encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point por motivos políticos, isenta os investidores da NNBG de taxas ou de tempo despendido que resultarem de processos em aplicação dos seus direitos, resultante dos princípios gerais que regem as compensações quando tenha havido uma privação de um direito de propriedade (v., n.o 277, supra).

397

No que respeita ao argumento da República da Áustria de que não era necessário «imunizar» a NNBG e os seus investidores contra todos os riscos jurídicos, por um lado, deve observar‑se que as medidas em causa não protegem a NNBG de todos os riscos, que se encontra exposta, nomeadamente, a um risco associado aos atrasos de construção ou de construção incompleta de Hinkley Point C, a um risco de fraco desempenho e a um risco de fraco resultado. Por outro, atendendo ao objetivo prosseguido pelas referidas medidas, que consiste em criar um efeito de incentivo para os investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear, não pode ser considerado manifestamente errado utilizar um instrumento como o acordo do secretário de Estado para conter os riscos a que tais investimentos estarão expostos, com vista a diminuir o montante do preço de exercício garantido pelo contrato diferencial.

398

Por último, no que respeita ao contrato diferencial, há que observar que a República da Áustria não apresenta qualquer argumento circunstanciado suscetível de demonstrar que a consideração da Comissão de que o preço de exercício não excedia o montante necessário para dar origem a uma decisão de investimento em Hinkley Point C era manifestamente errado. Neste contexto, cabe recordar que o preço de exercício tinha sido fixado tendo em conta as taxas de rentabilidade e que, nos n.os 9.5.3.2 e 9.5.3.3 da decisão impugnada, a Comissão considerou que, sem prejuízo de uma alteração dos mecanismos em matéria de partilha dos ganhos, estas taxas eram conformes às taxas de rentabilidade que um projeto com uma dimensão comparável à da construção de Hinkley Point C, e caracterizado por um nível de incerteza comparável, deveria poder alcançar. Ora, a República da Áustria não apresenta qualquer argumento suscetível de demonstrar que estas considerações enfermavam de erros manifestos de apreciação.

399

Daqui resulta que todos os argumentos que visam pôr em causa o caráter necessário das medidas em causa devem ser julgados improcedentes.

400

Todavia, no presente contexto, a República da Áustria apresenta igualmente argumentos que visam a ponderação dos efeitos positivos e dos efeitos negativos das medidas em causa efetuadas pela Comissão. Estes argumentos serão tidos em conta no âmbito da terceira parte do presente fundamento, relativo a esta ponderação.

c)   Quanto à ponderação dos efeitos positivos e negativos das medidas em causa

401

A terceira parte é relativa à conclusão da Comissão que figura nos considerandos 547 e 548 da decisão impugnada, segundo a qual, tendo em conta o ajustamento da taxa de remuneração da garantia de crédito e os compromissos assumidos pela EDF, o risco de distorção da concorrência provocado pelas medidas em causa era reduzido e compensado pelos seus efeitos positivos.

402

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo contestam esta conclusão. Segundo estes Estados‑Membros, os inconvenientes que resultam das medidas em causa são excessivos em relação às vantagens que proporcionam. A República da Áustria alega que, contrariamente ao que afirma a Comissão, as eventuais vantagens resultantes das referidas medidas não têm comparação com os inconvenientes que daí decorram, como, nomeadamente, a distorção de concorrência nas despesas de outros produtores de eletricidade e a criação de disfunções consideráveis no mercado da eletricidade. Em primeiro lugar, a Comissão não teve em conta os efeitos negativos destas medidas para os outros produtores de eletricidade, em particular os efeitos negativos consideráveis para os produtores de energia renovável. Acresce que tais medidas criam efeitos incitativos que provocam disfunções. Em segundo lugar, no âmbito da ponderação, a Comissão omitiu alguns aspetos essenciais que militavam igualmente contra a autorização das mesmas medidas. Em primeiro lugar, os efeitos no mercado da eletricidade não foram suficientemente analisados. Em segundo lugar, a decisão impugnada tem o valor de precedente para várias instalações nucleares que estão planificadas mas que não podem ser realizadas atualmente, uma vez que não são rentáveis sem auxílio estatal. Em terceiro lugar, as consequências consideráveis para os consumidores não foram suficientemente tidas em consideração. O mero facto de, na decisão impugnada, terem sido pouco estudadas outras soluções possíveis para a cobertura das necessidades elétricas futuras do Reino Unido, permite concluir que houve uma insuficiente consideração do bem‑estar dos consumidores. Um setor liberalizado como o da eletricidade deve, em princípio, poder funcionar sem apoio público substancial. Por conseguinte, o montante das medidas que deverão ser suportadas pelos contribuintes no Reino Unido é ainda mais surpreendente. Em quarto lugar, os efeitos no ambiente, em relação, nomeadamente, ao armazenamento de resíduos, e que respeitam igualmente ao consumidor ou ao contribuinte, não foram suficientemente tidas em consideração.

403

A Comissão, a República Checa, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

404

Os argumentos apresentados pela República da Áustria podem ser divididos em quatro grupos. Um primeiro grupo de argumentos visa pôr em causa os efeitos positivos das medidas em causa que a Comissão teve em conta. Um segundo grupo de argumentos é relativo à conclusão da Comissão de que as distorções de concorrência causadas pelas referidas medidas eram limitadas. Um terceiro grupo de argumentos respeita à ponderação dos efeitos positivos e negativos destas medidas que foi efetuada pela Comissão. Um quarto grupo de argumentos é relativo ao facto de a Comissão não ter tido em conta elementos que eram relevantes.

1) Quanto aos efeitos positivos das medidas em causa identificados pela Comissão

405

Em primeiro lugar, no que respeita aos efeitos positivos das medidas em causa identificados pela Comissão, há que observar que resulta dos considerandos 2 a 11 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação que as referidas medidas fazem parte de um conjunto de medidas de política energética adotadas pelo Reino Unido no âmbito da reforma do mercado da eletricidade. Esta estratégia pretende alcançar a segurança de fornecimento, a diversificação de fontes e a descarbonização. Como resulta dos considerandos 199 e 404 e 508 a 511 da decisão impugnada, entre 2021 e 2030, o Reino Unido terá necessidade de novas capacidades de produção de energia capazes de fornecer cerca de 60 gigawatts. Tendo em conta as previsões de encerramento de centrais nucleares e de centrais alimentadas a carvão existentes, a construção de Hinkley Point C visa limitar a queda da contribuição da energia nuclear para as necessidades totais de eletricidade. Segundo as observações da Comissão, não é possível colmatar o futuro défice de capacidades de produção de energia causado, por um lado, pelo aumento da procura e, por outro, pelo encerramento de centrais nucleares e de centrais alimentadas a carvão existentes, unicamente mediante recurso às energias renováveis. Neste contexto, a Comissão teve em conta que a energia nuclear representa um modo de fornecimento de eletricidade de base, ou seja, uma forma de produção contínua de energia, que não é intermitente, contrariamente às várias tecnologias de produção de energia a partir de fontes renováveis. A Comissão afirmou igualmente que o equivalente da potência que deveria ser fornecido por Hinkley Point C corresponde a 14 gigawatts de energia eólica terrestre ou a 11 gigawatts de energia eólica marítima e considerou que é improvável que tal capacidade seja conseguida no mesmo calendário.

406

Em segundo lugar, deve observar‑se que, embora o caráter adequado e necessário das medidas em causa deva ser apreciado à luz do objetivo de interesse público de criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, no âmbito da ponderação das vantagens e dos inconvenientes das referidas medidas, devem ser tidos em conta todos os efeitos positivos produzidos por tais novas capacidades.

407

Em terceiro lugar, quanto aos argumentos apresentados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, incluindo os apresentados em apoio das primeira e segunda parte do sexto fundamento (v., n.os 382 e 398, supra), há que observar que, em substância, estes Estados‑Membros apresentam sete alegações que visam pôr em causa as considerações da Comissão relativas aos efeitos positivos das medidas em causa. Em primeiro lugar, a República da Áustria apresenta argumentos que visam pôr em causa a existência de um futuro défice das capacidades de produção de energia no Reino Unido. Em segundo lugar, alega que o conceito de ampla carga de base constitui um anacronismo. Em terceiro lugar, tal como o Grão‑Ducado do Luxemburgo, alega que, no que respeita à energia nuclear, a segurança de fornecimento de urânio não está garantida. Em quarto lugar, afirma que as centrais nucleares são sensíveis aos aumentos de calor. Em quinto lugar, invoca as consequências de uma falha na central nuclear de Hinkley Point. Em sexto lugar, o Grão‑Ducado do Luxemburgo põe em causa a consideração da Comissão de que a energia nuclear é uma energia com baixo teor de dióxido de carbono. Em sétimo lugar, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que a construção de Hinkley Point C não estará concluída a tempo.

i) Quanto aos argumentos que visam pôr em causa a existência de um futuro défice de capacidades de produção de energia

408

A República da Áustria alega que a conclusão da Comissão relativamente à existência de um futuro défice de capacidades de produção de energia é manifestamente errada. Neste contexto, afirma que a Comissão, no âmbito dos diferentes cenários que apreciou, não teve em conta as alterações do mercado da eletricidade resultantes de medidas como os computadores inteligentes, as redes inteligentes, as casas inteligentes e as capacidades de armazenamento. Em seu entender, a Comissão também não teve suficientemente em conta a possibilidade de importar eletricidade proveniente de outros Estados‑Membros e a perspetiva de um aumento considerável das capacidades de produção de eletricidade no Reino Unido.

409

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que, em relação à existência de um futuro défice de capacidades de produção de energia, a Comissão teve em conta as previsões efetuadas pelo Reino Unido. Como resulta dos considerandos 250 a 258 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, no âmbito de tais previsões, este Estado‑Membro teve em conta o aumento de capacidades de produção distintas das capacidades de produção de energia nuclear, medidas de eficiência energética e a possibilidade de importar energia proveniente de outros Estados‑Membros através de interligações. É certo que, como resulta dos considerandos 259 a 263 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, no momento da adoção desta decisão, a Comissão tinha dúvidas quanto à análise efetuada pelo Reino Unido. Todavia, resulta do considerando 510 da decisão impugnada que, na sequência de uma apreciação aprofundada, a Comissão reconheceu a necessidade identificada pelo Reino Unido de novas capacidades de produção de energia capazes de fornecer 60 gigawatts entre 2021 e 2030. Daqui resulta que há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria de que a Comissão não teve em conta o desenvolvimento futuro do mercado da eletricidade.

410

Em segundo lugar, no que respeita ao argumento da República da Áustria, relativo ao facto de que resulta do relatório da Comissão intitulado «Investment perspetives in the electricity market» (perspetivas de investimento no mercado da eletricidade), de julho de 2015, que as capacidades de produção de energia no Reino Unido aumentarão, cabe recordar que a legalidade de uma decisão da Comissão em matéria de auxílios estatais deve ser apreciada em função dos elementos de informação de que a Comissão podia dispor no momento em que a tomou (Acórdão de 10 de julho de 1986, Bélgica/Comissão, 234/84, EU:C:1986:302, n.o 16). Ora, no caso em apreço, o relatório em que a República da Áustria se baseia foi publicado após a adoção da decisão impugnada e nada nos autos indica que a referida instituição podia dispor das informações que este relatório incluía antes de adotar tal decisão. Em todo caso, o mero argumento de que as capacidades de produção de energia a partir de fontes renováveis e, consequentemente, as capacidades intermitentes aumentaram no Reino Unido, não é suscetível de retirar plausibilidade às considerações da Comissão segundo as quais, devido a um aumento da procura e ao encerramento de centrais nucleares e de centrais alimentadas a carvão existentes, o Reino Unido deverá fazer face a um défice de capacidades de produção de energia.

411

Por conseguinte, todos os argumentos da República da Áustria que visam pôr em causa a conclusão da Comissão relativa à existência de um futuro défice de capacidades de produção de energia devem ser julgados improcedentes.

ii) Quanto aos argumentos relativos ao anacronismo do conceito de ampla carga de base

412

A República da Áustria afirma que o conceito de ampla carga de base está ultrapassado. Deve ser dada preferência às pequenas centrais flexíveis.

413

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que, no considerando 404 da decisão impugnada, a Comissão concluiu que a natureza intermitente de muitas tecnologias de energias renováveis não permitia que elas fossem uma alternativa adequada a uma tecnologia de carga de base como a energia nuclear, que o equivalente da potência que devia ser fornecido por Hinkley Point C correspondia a 14 gigawatts de energia eólica terrestre ou a 11 gigawatts de energia eólica marítima e que era improvável que tais capacidades de produção de energia eólica pudessem ser construídas no calendário previsto para a construção de Hinkley Point C.

414

Em segundo lugar, há que apreciar se os argumentos apresentados pela República da Áustria são suscetíveis de retirar plausibilidade a estas considerações.

415

Em primeiro lugar, a República da Áustria apresenta uma entrevista de 11 de setembro de 2015 do presidente diretor‑geral da empresa que gere, nomeadamente, as redes de transporte de eletricidade do Reino Unido. Afirma que resulta desta entrevista que a ideia de recorrer a grandes centrais nucleares está ultrapassada.

416

A este respeito, por um lado, importa observar que a entrevista em causa foi divulgada após a adoção da decisão impugnada e que, assim, não é suscetível de pôr em causa a sua legalidade (v., n.o 410, supra). Isto é ainda mais verdade na medida em que alguns dos entendimentos do presidente diretor‑geral da empresa têm em conta elementos novos ocorridos no decurso do ano 2015, ou seja, após a adoção da decisão impugnada.

417

Por outro lado, e em todo caso, há que observar que, na entrevista em questão, a utilidade da energia nuclear enquanto fonte fiável de produção de eletricidade não é posta em causa. Além disso, embora, nessa entrevista, a utilidade da carga de base para os consumidores seja posta em causa com base numa previsão de que o próprio consumidor produziria a eletricidade, é igualmente referido que a velocidade a que esse desenvolvimento se efetuará não é conhecida. Além disso, não é posto em causa que a carga de base continuará a ser importante para os clientes profissionais. De resto, há que sublinhar que outra previsão dessa entrevista é que a procura de eletricidade aumentará no decurso dos anos 2020. Atendendo a estas considerações e tendo em conta o direito do Reino Unido de escolher entre diferentes fontes de energia, assim como a estrutura geral do seu fornecimento energético e a ampla margem de apreciação de que dispõe a este respeito (v., n.o 372, supra), há que concluir que a entrevista em questão não é suscetível de demonstrar que as considerações da Comissão acima referidas no n.o 413 enfermam de um erro manifesto.

418

Em segundo lugar, a República da Áustria alega que, no futuro, a necessidade de recursos flexíveis aumentará em relação à necessidade de uma carga de base, invocando o relatório da Comissão intitulado «Investment perspetives in the electricity market» (perspetivas de investimento no mercado da eletricidade). A este respeito, basta recordar que, pelas razões acima referidas no n.o 410, esse relatório não é suscetível de pôr em causa a legalidade da decisão impugnada. Em todo caso, este argumento não é suscetível de retirar plausibilidade às conclusões da Comissão segundo as quais era improvável que pudessem ser criadas suficientes capacidades de produção de energias flexíveis e com baixo teor de carbono no calendário previsto para a construção de Hinkley Point C.

419

Em terceiro lugar, a República da Áustria afirma que resulta de um artigo intitulado «Will the U. S. Ever Need to Build Another Coal or Nuclear Power Plant?», publicado em 22 de abril de 2009 numa revista americana, que o presidente da Comissão Federal Americana da Regulação da Energia considerou que o conceito de carga de base pode tornar‑se anacrónico.

420

A este respeito, basta observar que, mesmo que resulte deste artigo que o presidente da Comissão Federal Americana da Regulação da Energia considerou que, no futuro, o conceito de carga de base pode tornar‑se anacrónico, há que observar que decorre igualmente do referido artigo que esta opinião está longe de ser partilhada unanimemente e que outros especialistas consideraram que a energia nuclear continuará a desempenhar um papel importante no futuro. Atendendo à ampla margem de apreciação de que dispõe o Reino Unido no que respeita à determinação do seu cabaz energético, este artigo também é suscetível de demonstrar que as considerações da Comissão acima resumidas no n.o 413 são manifestamente erradas.

421

Por conseguinte, os argumentos da República da Áustria relativos ao facto de que o conceito de ampla carga de base está ultrapassado devem ser igualmente julgados improcedentes.

iii) Quanto aos argumentos relativos ao fornecimento de urânio

422

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que as reservas de urânio conhecidas não são ilimitadas. Por outro lado, os combustíveis nucleares devem ser importados em grande parte de países cuja situação política não é estável.

423

Em primeiro lugar, importa apreciar se o argumento relativo à natureza limitada das reservas de urânio conhecidas é suscetível de pôr em causa a plausibilidade das considerações da Comissão sobre as vantagens resultantes das medidas em causa.

424

A este respeito, deve observar‑se, por um lado, que resulta do considerando 383 da decisão impugnada que a duração de exploração prevista para Hinkley Point C é de 60 anos. Por outro, segundo o resumo do «livro vermelho» publicado pela Agência internacional da Energia Atómica (AIEA) e pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) que a Comissão apresentou, as reservas de urânio são suficientes para os próximos 150 anos. Daqui resulta que o argumento relativo à natureza limitada das reservas não é suscetível de retirar plausibilidade às considerações da Comissão.

425

Esta conclusão não é posta em causa pelo argumento da República da Áustria de que resulta da página 10 do programa indicativo nuclear da Comissão, de 4 de outubro de 2007, COM(2007) 565 final, que as reservas conhecidas de urânio razoavelmente asseguradas e exploráveis a preços competitivos podem satisfazer as necessidades da indústria nuclear durante, pelo menos, 85 anos ao nível atual de consumo.

426

Com efeito, em primeiro lugar, há que constatar que este programa indicativo remete para uma previsão que figura numa versão anterior do «livro vermelho» acima referido no n.o 423, ao passo que a previsão de uma duração de 150 anos resulta de uma versão mais recente deste livro.

427

Em segundo lugar e em todo caso, mesmo admitindo que as reservas conhecidas de urânio razoavelmente asseguradas e exploráveis a preços competitivos apenas possam satisfazer as necessidades da indústria nuclear durante 85 anos ao nível atual de consumo, o referido período excede a duração de exploração prevista de Hinkley Point C e a República da Áustria não apresenta elementos circunstanciados suscetíveis de demonstrar que o desenvolvimento da energia nuclear é tal que as reservas de urânio conhecidas se irão esgotar antes do fim deste período de duração.

428

Em terceiro lugar, neste contexto, importa igualmente ter em conta a possibilidade de utilizar combustíveis já utilizados ou provenientes do desmantelamento de armas nucleares. No que respeita a esta possibilidade, a República da Áustria limita‑se a afirmar que resulta da página 18 do relatório anual de 2014 da Agência de Aprovisionamento da Euratom que os Estados‑Membros apenas garantem 21 % das capacidades de reciclagem, o que não é suficiente para responder às necessidades da União. Ora, a este respeito, basta observar que resulta das páginas 18 e 33 deste documento que, à escala mundial, existe uma capacidade excedentária de conversão e que as necessidades dos produtores de eletricidade da União estão efetivamente cobertas a curto e a médio prazo.

429

Por conseguinte, o argumento relativo à natureza limitada das reservas de urânio não é suscetível de demonstrar a existência de um erro manifesto de apreciação que afeta as considerações da Comissão.

430

Em segundo lugar, no que respeita ao argumento de que a União está fortemente dependente de importações de combustível nuclear proveniente de Estados terceiros, por um lado, cabe recordar a referida possibilidade de reciclagem dos combustíveis já utilizados ou provenientes do desmantelamento de armas nucleares e a existência de minas de urânio no território da União, mesmo que tenham uma dimensão muito limitada.

431

Por outro lado, o facto de grande parte do urânio ser importado de Estados terceiros não é suscetível de demonstrar por si só que Hinkley Point C não poderá atingir a produção de eletricidade projetada.

432

A República da Áustria alega, porém, que as referidas importações provêm em grande parte de países cuja situação política não é estável.

433

A este respeito, em primeiro lugar, há que observar que uma parte dos fornecimentos provêm do Canadá e da Austrália e que a República da Áustria não apresenta argumentos destinados a pôr em causa o caráter estável da situação política nestes países.

434

Em segundo lugar, segundo as indicações da Comissão, que remete para a página 2 do programa indicativo nuclear, de 13 de novembro de 2008, COM(2008) 776 final, as reservas de urânio encontram‑se em zonas estáveis no plano geopolítico e são bastante dispersas, o que é suscetível de dissipar o risco de eventuais problemas numa ou em várias destas zonas que causam uma escassez de urânio para os Estados‑Membros. A República da Áustria não apresenta argumentos circunstanciados suscetíveis de pôr em causa estas indicações.

435

Em terceiro lugar, neste contexto, as indicações da Comissão, que são confirmadas pelas páginas 4 e 11 da Comunicação da Comissão relativa ao Programa Indicativo Nuclear, de 4 de outubro de 2007, das quais resulta que as empresas europeias são comproprietárias de minas em Estados terceiros e que foram celebrados acordos internacionais que facilitam o comércio dos materiais e da tecnologia nucleares com a Austrália, o Canadá, os Estados Unidos, o Japão e a República do Cazaquistão devem igualmente ser tidas em conta.

436

Em quarto lugar, cabe recordar que a dependência de combustíveis importados de Estados terceiros não é uma especificidade da energia nuclear, pois existe igualmente para outras tecnologias, como as centrais a gás.

437

Assim, o argumento da República da Áustria de que uma grande parte do urânio tem que ser importada de Estados terceiros também não é suscetível de retirar plausibilidade às considerações da Comissão respeitantes aos efeitos positivos das medidas em causa.

438

Por conseguinte, todos os argumentos relativos às reservas de urânio devem ser julgados improcedentes.

439

Por último, no que respeita ao argumento de que a Comissão não devia ter privilegiado a importação de minerais de urânio provenientes de Estados terceiros em relação à importação de eletricidade proveniente de outros Estados‑Membros, há que concluir que se refere à ponderação das vantagens e dos inconvenientes das medidas em causa. Por isso, será tido em conta no âmbito da apreciação desta ponderação.

iv) Quanto ao argumento relativo à sensibilidade das centrais nucleares aos aumentos de temperatura

440

A República da Áustria alega que as centrais nucleares são bastante sensíveis aos aumentos de temperatura devido à sua elevada necessidade de água fria. Nas vagas de calor, as centrais nucleares deveriam, assim, ser desativadas.

441

Em primeiro lugar, deve observar‑se que a República da Áustria não apresenta qualquer elemento suscetível de demonstrar que, em condições climáticas normais, as centrais nucleares são particularmente sensíveis às condições meteorológicas, ao contrário de fontes de energias renováveis como a energia eólica ou a energia solar.

442

Em segundo lugar, importa apreciar se o argumento da República da Áustria relativo ao facto de as vagas de calor poderem afetar o funcionamento das centrais nucleares é suscetível de retirar plausibilidade às considerações da Comissão acima resumidas no n.o 405.

443

A República da Áustria afirma que a sensibilidade das centrais nucleares às vagas de calor resulta de um documento intitulado «Nuclear Free Local Authorities briefing» de 9 de dezembro de 2014.

444

A este respeito, há que observar que, segundo esse documento, a principal razão da falta de fiabilidade de alguns reatores nucleares está ligada ao facto de se tratar de reatores envelhecidos, cujo prazo de validade já expirou. Ora, por um lado, a construção de Hinkley Point C visa precisamente substituir as centrais nucleares envelhecidas. Por outro, importa salientar que a República da Áustria não apresenta qualquer argumento suscetível de demonstrar que Hinkley Point C, que será localizada em Somerset, no litoral do Reino Unido, pode estar particularmente exposta a vagas de calor e a problemas de arrefecimento.

445

Em todo caso, há que observar que, mesmo no caso de, em circunstâncias excecionais, o funcionamento de Hinkley Point C ser afetado por uma vaga de calor, isso não é suscetível de pôr em causa enquanto tais as capacidades de produção de energia resultantes da construção da referida unidade, que a Comissão teve em conta no âmbito das suas considerações acima resumidas no n.o 405. Neste contexto, importa igualmente ter em conta o argumento da Comissão de que as vagas de calor têm por consequência aumentar o rendimento da energia solar e que existe, assim, um certo efeito de compensação, suscetível de compensar as eventuais consequências de temperaturas muito altas na produção de energia nuclear.

446

Tendo em consideração o exposto, há que concluir que o argumento relativo aos efeitos das vagas de calor não é suscetível de demonstrar que as considerações da Comissão respeitantes aos efeitos positivos das medidas em causa enfermam de erros manifestos.

v) Quanto ao argumento relativo às possíveis consequências de falhas

447

A República da Áustria invoca as complicações que podem ser causadas por uma falha numa central nuclear e, mais particularmente, uma falha numa central com uma dimensão equivalente à da futura central nuclear Hinkley Point.

448

A este respeito, em primeiro lugar, importa observar que, por um lado, segundo as indicações da Comissão, a produção na central nuclear Hinkley Point será assegurada por vários blocos de centrais nucleares que recorrem a tecnologias diversas, o que permitirá programar os trabalhos de manutenção de forma a que a produção da carga de base seja mantida e, por outro, que a República da Áustria não apresentou argumentos suscetíveis de pôr em causa estas indicações.

449

Em segundo lugar, há que observar que o mero facto de o funcionamento de Hinkley Point C poder ser afetado por falhas ocasionais não é suscetível de pôr em causa enquanto tais as capacidades de produção de energia resultantes da referida unidade, que a Comissão teve em conta no âmbito das suas considerações acima resumidas no n.o 405.

450

Daqui decorre que o argumento relativo às possíveis consequências de falhas não é suscetível de retirar plausibilidade às conclusões da Comissão sobre as vantagens resultantes das medidas em causa.

vi) Quanto à qualificação da energia nuclear como energia com baixo teor de dióxido de carbono

451

O Grão‑Ducado do Luxemburgo alega que a conclusão da Comissão de que a energia nuclear é uma tecnologia com baixo teor de dióxido de carbono é manifestamente errada. A tecnologia nuclear provoca uma emissão de dióxido de carbono considerável, devido ao carbono produzido na extração e no tratamento do urânio e na construção e no desmantelamento de centrais nucleares.

452

A este respeito, a título preliminar, cabe recordar que, na decisão impugnada, a Comissão não identificou a descarbonização como um objetivo de interesse público suscetível de justificar de forma autónoma as medidas em causa. Todavia, como já foi acima exposto no n.o 405, no âmbito da ponderação das vantagens e dos inconvenientes das medidas em causa, teve em conta o facto de estas medidas se inserirem numa estratégia global do Reino Unido para reformar o seu mercado de eletricidade, que visa, nomeadamente, alcançar o objetivo da descarbonização. Nestas circunstâncias, há que verificar se os argumentos apresentados pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo são suscetíveis de demonstrar que a conclusão de que as medidas em causa se inserem nesta estratégia global enferma de um erro manifesto de apreciação.

453

Em substância, o Grão‑Ducado do Luxemburgo baseia os seus argumentos de que a tecnologia nuclear não é uma tecnologia com baixo teor de dióxido de carbono, num estudo publicado em 2008 e intitulado «Valuing the greenhouse gas emissions from nuclear power».

454

Em primeiro lugar, no que respeita ao conteúdo do estudo em causa, há que observar que dele não resulta que a energia nuclear é uma forma de energia com grandes emissões de carbono. Pelo contrário, como afirma corretamente a Comissão, dele decorre que a média das emissões de dióxido de carbono emitida pelas capacidades de produção de energia nuclear é de 66 g de equivalente de dióxido de carbono em relação às emissões da energia solar e da biomassa que se situam entre 13 e 41 g de equivalente de dióxido de carbono, enquanto combustíveis fósseis, tais como o gás, o petróleo, o gasóleo e o carbono se situam entre 443 e 1050 g de equivalente de dióxido de carbono.

455

Em segundo lugar, deve observar‑se que a Comissão afirma que, no futuro, a média das emissões de dióxido de carbono emitidas pelas capacidades de produção de energia nuclear diminuirá. A intensidade do carbono proveniente do consumo elétrico necessário para a extração de matérias‑primas, a construção e o desmantelamento de uma central nuclear pode diminuir, devido ao facto de esta eletricidade ser pelo menos parcialmente substituída por eletricidade que não emite ou emite menos dióxido de carbono. Estes argumentos não foram contestados pela República da Áustria nem pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo.

456

Em terceiro lugar, importa salientar que, por sua vez, a Comissão apresenta outro estudo que data de 2012 e no qual os resultados de diferentes estudos com um objeto comparável ao apresentado pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo são analisados. Ora, há que constatar que resulta da página 90 deste outro estudo, que tem menos quatro anos que o apresentado por este Estado‑Membro, que a doutrina científica considera que as emissões de dióxido de carbono causadas pela energia nuclear apenas constituem uma fração das emissões causadas pela utilização de fontes fósseis para a produção de energia e que são comparáveis às causadas pelas tecnologias renováveis.

457

Atendendo a estes elementos, há que concluir que os argumentos apresentados pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo não são suscetíveis de demonstrar que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação ao considerar que a construção de Hinkley Point C se inseria numa estratégia global do Reino Unido para reformar o seu mercado de eletricidade, que visa, nomeadamente, alcançar o objetivo da descarbonização.

vii) Quanto ao argumento de que Hinkley Point C não estará concluída a tempo

458

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam igualmente que Hinkley Point C apenas estará concluída e operacional muito depois da escassez de fornecimento prevista pelo Reino Unido.

459

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que se a NNBG não respeitar o calendário previsto arrisca perder as vantagens conferidas pelo contrato diferencial e que, por isso, é incentivada a respeitar este calendário.

460

Em segundo lugar e em todo caso, deve observar‑se que a entrada em funcionamento de Hinkley Point C está prevista para o ano de 2023. Mesmo que entrasse em funcionamento efetivo após esta data, não é de excluir que possa contribuir para satisfazer as necessidades de novas capacidades de produção de energia capazes de fornecer 60 gigawatts identificados pelo Reino Unido para o período compreendido entre 2021 a 2030.

461

Tendo em consideração o exposto, o argumento relativo ao caráter extemporâneo da conclusão da construção de Hinkley Point C deve igualmente ser julgado improcedente.

462

Por conseguinte, há que concluir que nenhum dos argumentos apresentados pela República da Áustria é suscetível de pôr em causa as conclusões da Comissão relativas aos efeitos positivos das medidas em causa.

2) Quanto aos efeitos negativos tidos em conta pela Comissão

463

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo invocam argumentos destinados a demonstrar que a conclusão da Comissão segundo a qual as distorções de concorrência causadas pelas medidas em causa eram limitadas enferma de erros manifestos de apreciação. Neste contexto, importa igualmente ter em conta os argumentos apresentados no âmbito das primeira e da segunda parte do sexto fundamento (v., n.os 382 e 398, supra), o argumento relativo ao impacto das condições das trocas comerciais entre Estados‑Membros (v., n.o 125, supra), assim como o argumento respeitante a um efeito de encerramento do mercado interno e aos efeitos das medidas em causa nos preços neste mercado, que foram desenvolvidos no âmbito do quinto fundamento (v., n.o 273, supra).

464

Numa primeira fase, a República da Áustria alega que a Comissão ignorou o facto de as medidas em causa produzirem efeitos negativos no mercado interno e no mercado da energia em particular.

465

A este respeito, cabe recordar que, no ponto 7.9 da decisão impugnada, a Comissão afirmou que as medidas em causa eram suscetíveis de falsear o jogo da concorrência no que respeitava à produção e ao fornecimento de eletricidade e de afetar o comércio entre Estados‑Membros. Considerou igualmente que as referidas medidas poderiam falsear as decisões de investimento e afastar outros possíveis investimentos. Por outro lado, no âmbito da apreciação desenvolvida no ponto 9.6 da referida decisão, identificou alguns efeitos negativos destas medidas em matéria de distorção da concorrência e de impacto das trocas comerciais entre Estados‑Membros. Todavia, no considerando 548 desta decisão, a Comissão concluiu que as distorções de concorrência que resultarão da entrada em funcionamento de Hinkley Point C seriam reduzidas ao mínimo necessário e seriam compensadas pelos efeitos positivos destas medidas. Esta conclusão assenta, nomeadamente, na apreciação que efetuou no âmbito dos pontos 9.6.1 a 9.6.5 da mesma decisão.

466

Neste contexto, importa igualmente observar que, no ponto 9.6.1 da decisão impugnada, a Comissão apreciou as distorções de investimento que serão provocadas pelas medidas em causa e o seu impacto nos fluxos comerciais. No considerando 511 da referida decisão, concluiu que as referidas medidas têm apenas um impacto insignificante nos fluxos comerciais, nos preços e nos investimentos. Esta conclusão assenta em considerações desenvolvidas no referido número, assim como numa consideração que figura no considerando 403 desta decisão.

467

Em primeiro lugar, nos considerandos 503 a 505 da decisão impugnada, a Comissão observou que uma ampla utilização dos contratos diferenciais podia interferir significativamente ou eliminar no seu todo o papel dos preços como sinais de investimento e conduzir efetivamente a uma regulação dos preços de produção de eletricidade aos níveis escolhidos pelo governo. Os contratos diferenciais obrigam os produtores a vender no mercado, preservando deste modo alguns dos incentivos que se aplicam aos operadores de mercado sem apoios. No entanto, entende que esses incentivos eram principalmente conservados ao nível operacional e não ao nível das decisões de investimento, que provavelmente serão determinadas pela estabilidade e certeza das receitas fornecidas pelo contrato diferencial. Em todo caso, as distorções do mercado decorrentes do contrato diferencial no plano operacional são muito limitadas para os produtores de energia nuclear, que têm reduzidos custos marginais de funcionamento e, por conseguinte, são suscetíveis de vender no mercado independentemente do nível de preços e ocupam as posições iniciais da curva de mérito de fornecimento.

468

Em segundo lugar, nos considerandos 506 a 508 da decisão impugnada, em termos de construção da interligação e de direção e intensidade dos fluxos comerciais, a Comissão concluiu que a construção de Hinkley Point C deveria ter um impacto mínimo nos preços grossistas do Reino Unido. Neste contexto, afirmou que a modelização das atividades empreendidas sugeria que os preços na Grã‑Bretanha diminuiriam menos de 0,5 % com o funcionamento desta central nuclear, o que, por sua vez, se traduz numa diminuição cumulativa e global nas receitas de interligação em menos de 1,7 %, até 2030. Este resultado decorre do facto de, mesmo se o custo marginal da eletricidade produzida por esta central fosse inferior ao preço das centrais existentes, a sua capacidade global constituiria uma pequena fração da capacidade global na Grã‑Bretanha, e do facto de uma diminuição dos preços grossistas e das receitas de interligação ocorrer igualmente sem a construção da referida unidade. Segundo a Comissão, este resultado baseava‑se num cenário pessimista, uma vez que, sem essa central, podia esperar‑se que o Reino Unido prosseguisse outros tipos de produção de baixo teor de carbono, na medida do possível (e não até à capacidade global fornecida por Hinkley Point C, que seria demasiado grande para substituir apenas através de fontes de baixo teor de carbono). Por conseguinte, em seu entender, era provável a ocorrência de uma diminuição dos preços grossistas e das receitas de interligação também na ausência da Hinkley Point C.

469

Em terceiro lugar, no que respeita à distorção das trocas comerciais, nos considerandos 509 e 510 da decisão impugnada, a Comissão concluiu que Hinkley Point C teria um impacto negligenciável nos preços fora da Grã‑Bretanha, que foi quantificado em 0,1 %, no máximo. Isso iria traduzir‑se numa diminuição dos fluxos transfronteiriços inferior a 1 %. Neste contexto, a Comissão afirmou igualmente que, segundo os resultados da modelização de cenários alternativos em que o projeto da central nuclear Hinkley Point não ocorreria, o desvio de investimentos alternativos seria limitado. Mais particularmente, as previsões de uma redução do fornecimento, em especial, as previsões de contração de fornecimento deixam espaço suficiente para outros produtores e tecnologias de produção entrarem e expandirem a capacidade, independentemente do investimento em Hinkley Point C, em especial, tendo em conta a calendarização do encerramento das centrais nucleares e de carvão existentes. O Reino Unido necessita que entrem em funcionamento entre 2021 e 2030 novas capacidades de produção de energia capazes de fornecer cerca de 60 gigawatts, 3,2 gigawatts dos quais serão fornecidos por Hinkley Point C. Seria impossível serem apenas as fontes de baixo teor de carbono a suprir este futuro défice de capacidade de produção de energia.

470

Em quarto lugar, no considerando 403 da decisão impugnada, a Comissão referiu que o contrato diferencial não discriminava excessivamente as outras tecnologias, uma vez que estas podiam ser apoiadas do mesmo modo pelo mesmo tipo de instrumento, no âmbito do mercado de capacidades criado pelo Reino Unido, exceto no que toca a adaptações que podem ser consideradas necessárias dadas as diferenças entre as tecnologias.

471

Daqui resulta que os argumentos apresentados pela República da Áustria de que a Comissão não teve em conta os efeitos negativos das medidas em causa no mercado interno devem ser julgados improcedentes.

472

Numa segunda fase, deve observar‑se que alguns dos argumentos apresentados pela República da Áustria visam demonstrar que a conclusão da Comissão quanto ao caráter limitado das distorções de concorrência provocadas pelas medidas em causa enferma de erros manifestos. Em primeiro lugar, a República da Áustria alega que o contrato diferencial altera a curva de mérito em prejuízo das centrais a gás. Em segundo lugar, afirma que o referido contrato provoca efeitos incitadores inadequados. Em terceiro lugar, esse contrato aumenta muito a frequência dos preços negativos. Em quarto lugar, contrariamente às considerações da Comissão, as referidas medidas conferem uma vantagem inadequada à tecnologia nuclear. Em quinto lugar, a Comissão não teve suficientemente em conta a importância das interligações das redes energéticas.

473

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

474

Em primeiro lugar, a República da Áustria alega que o contrato diferencial altera a curva de mérito em prejuízo das centrais a gás, que teriam custos marginais elevados e dificuldades para permanecer no mercado em 2030. Em seu entender, a saída do mercado das centrais a gás compromete o desenvolvimento de uma combinação eficaz das capacidades de produção assente em centrais a gás flexíveis associadas à energia eólica volátil.

475

A este respeito, a título preliminar, cabe recordar que, no âmbito da sua apreciação, a Comissão não excluiu a possibilidade de o contrato diferencial produzir efeitos no mercado da energia. Todavia, como resulta do considerando 510 da decisão impugnada, considerou que o desvio de investimentos alternativos era limitado devido ao facto, por um lado, de o Reino Unido precisar de novas capacidades de produção de eletricidade que entrem em funcionamento entre 2021 e 2030 e que sejam capazes de fornecer cerca de 60 gigawatts, 3,2 gigawatts dos quais serão fornecidos unicamente por Hinkley Point C e, por outro, de a construção desta não se traduzir numa extensão da quota de capacidade da carga de base, antes constitui um investimento de substituição que compensa parte da produção das centrais nucleares mais antigas e das centrais alimentadas a carvão que produzem a carga de base. No considerando 403 da referida decisão, teve igualmente em conta o facto de o risco de exclusão das centrais a gás ser limitado pela criação de um mercado de capacidades pelo Reino Unido, destinado a incentivar investimentos em novas centrais a gás.

476

Importa apreciar se os argumentos apresentados pela República da Áustria são suscetíveis de retirar plausibilidade a estas considerações da Comissão.

477

Segundo a República da Áustria, os efeitos nefastos do contrato diferencial nos operadores das centrais a gás e, indiretamente, nos produtores de energia eólica, são demonstrados por um estudo de maio de 2012 intitulado «Assessment of the dispatch distortions under the Feed‑in Tariff with Contract for Differences policy» (a seguir «estudo de maio de 2012»).

478

Ora, há que observar que o conteúdo do estudo de maio de 2012 não é suscetível de demonstrar que as conclusões da Comissão quanto aos efeitos limitados do desvio de investimentos alternativos são manifestamente erradas. Pelo contrário, nas páginas 12 e 13 do referido estudo, é exposto que os modelos e a análise efetuados não evidenciaram distorções significativas em razão dos contratos diferenciais para a carga de base. No que respeita às páginas 6, 7, 36 e seguintes deste estudo, nas quais a República da Áustria baseia o seu argumento, é verdade que daí resulta que a combinação de uma tecnologia inflexível como a tecnologia nuclear e de uma tecnologia intermitente como a energia eólica pode criar cenários em que a produção de energia excede a procura, o que limita a produção das centrais a gás. Todavia, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, não é possível deduzir deste estudo que a construção de Hinkley Point C causará um efeito de exclusão significativo para as centrais a gás. Pelo contrário, importa observar que resulta da página 30 do mesmo estudo que, até 2030, haverá apenas um crescimento moderado das capacidades de produção existentes de energia nuclear, enquanto a produção de energia eólica aumentará significativamente e o aumento de capacidade eólica alterará igualmente a curva de mérito em prejuízo das centrais a gás.

479

Por outro lado, há que observar que a República da Áustria não apresenta qualquer argumento suscetível de pôr em causa as considerações da Comissão baseadas no futuro défice de capacidades, no facto de a construção de Hinkley Point C constituir unicamente um investimento de substituição e na existência de um mercado criado pelo Reino Unido, destinado a incentivar investimentos em novas centrais a gás.

480

Tendo em consideração o exposto, importa concluir que os argumentos da República da Áustria relativos à alteração da curva de mérito não são suscetíveis de demonstrar que as conclusões da Comissão sobre os efeitos negativos das medidas em causa enfermam de um erro manifesto de apreciação.

481

Em segundo lugar, a República da Áustria alega que o mecanismo do contrato diferencial cria um efeito de incentivo inadequado para a NNBG. Devido ao contrato diferencial, esta é incentivada a manter as suas injeções num nível elevado, sem atender à estabilidade da rede. Por conseguinte, a promoção de energia nuclear pode conduzir a uma capacidade excedentária potencial de produção de eletricidade não flexível, o que obrigaria os produtores de energias renováveis a reduzir as suas injeções na rede, a fim de não comprometer a segurança da rede. Perderiam, por isso, as subvenções que lhes foram concedidas. Nestas circunstâncias, seria difícil outros produtores de eletricidade imporem‑se no mercado ou nele entrarem.

482

Em primeiro lugar, na medida em que a República da Áustria alega que a Comissão cometeu um erro relativamente ao efeito de incentivo das medidas em causa na criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, a sua argumentação deve ser julgada improcedente. Com efeito, esta argumentação não é suscetível de pôr em causa as considerações da Comissão, que figuram nos considerandos 393 a 406 da decisão impugnada segundo as quais estas medidas permitem resolver os principais obstáculos aos investimentos nessas novas capacidades.

483

Em segundo lugar, na medida em que a República da Áustria alega que a conclusão da Comissão de que o contrato diferencial tem apenas um impacto insignificante nos investimentos é manifestamente errada, deve igualmente julgar‑se improcedente a sua argumentação.

484

Antes de mais, cabe recordar que o fenómeno de a produção de energia eólica aumentar em certos dias de vento forte, podendo exceder a procura, pode estar diretamente associado ao caráter intermitente desta tecnologia e que o risco de tal fenómeno ocorrer aumenta em função da quota desta fonte de energia no cabaz energético. Neste contexto, há que observar que, como resulta das páginas 30 e 36 do estudo de maio de 2012, na sequência do aumento da implantação eólica até 2030, o operador da rede deverá adotar medidas para limitar a produção eólica em períodos de vento forte.

485

Em seguida, há que observar que a razão pela qual Hinkley Point C produzirá eletricidade sem ter em conta a produção de centrais eólicas reside na própria natureza da tecnologia nuclear, que constitui uma fonte de energia não flexível. Assim, contrariamente ao que dá a entender a República da Áustria, não é o contrato diferencial que pode incentivar a NNBG a manter o seu nível de produção num período de ventos fortes, mas sim razões técnicas específicas desta tecnologia.

486

Por outro lado, como resulta do considerando 14 da decisão impugnada, a NNBG poderá receber pagamentos de diferenças com base na sua produção unicamente até um teto que deverá ser definido no contrato diferencial. Por conseguinte, o referido contrato não incentivará a produção que exceda este teto.

487

Além disso, há que observar que a República da Áustria não apresenta argumentos suscetíveis de pôr em causa as considerações da Comissão de que quais as medidas em causa apenas têm um impacto insignificante nos investimentos. Como resulta dos considerandos 510 e 511 da decisão impugnada, estas considerações baseiam‑se nas previsões segundo as quais, devido à redução do fornecimento, outros produtores e outras tecnologias de produção poderão encontrar o seu espaço no mercado, assim como na constatação de que a construção de Hinkley Point C não se traduzirá numa extensão da quota de capacidade da carga de base, mas constituirá um investimento de substituição que compensará parcialmente o encerramento das centrais nucleares mais antigas e das centrais alimentadas a carvão. Neste contexto, importa igualmente ter em conta que, em caso de limitação das capacidades de produção de energia resultante de parques eólicos pelo operador da rede, existe um direito a uma compensação a título do mecanismo de equilíbrio, no caso de os preços não serem negativos.

488

Tendo em consideração o exposto, há que concluir que estes argumentos da República da Áustria não são suscetíveis de retirar plausibilidade à conclusão da Comissão quanto aos efeitos limitados das medidas em causa nos investimentos em centrais eólicas.

489

Em terceiro lugar, a República da Áustria alega que o contrato diferencial aumentará a frequência de preços negativos. Em seu entender, Hinkley Point C será especialmente incentivada a produzir quando os preços forem negativos e influenciará negativamente as condições de mercado para as tecnologias concorrentes.

490

Neste contexto, por um lado, importa assinalar que, como resulta do considerando 497 da decisão impugnada, a Comissão teve em conta o risco de a EDF poder alterar o preço de referência, propondo capacidade a um preço muito baixo, mesmo negativo. Após ter apreciado esta questão no âmbito do ponto 9.6.2 da referida decisão, considerou, todavia, que este risco era insignificante. Por outro, segundo as indicações da Comissão que figuram nos considerandos 506 a 508 desta decisão, a construção de Hinkley Point C deveria ter um impacto mínimo nos preços grossistas no Reino Unido. Neste contexto, a Comissão afirmou que os trabalhos de modelização efetuados sugeriam que os preços na Grã‑Bretanha iriam diminuir menos de 0,5 % na sequência da exploração de Hinkley Point C. Indicou igualmente que este resultado se devia ao facto de o custo marginal da eletricidade produzido por Hinkley Point C ser inferior ao preço das centrais existentes, mas que a capacidade global desta seria uma pequena fração da capacidade global na Grã‑Bretanha e que uma diminuição dos preços grossistas ocorreria igualmente na ausência de Hinkley Point C.

491

Importa apreciar se os argumentos apresentados pela República da Áustria são suscetíveis de retirar plausibilidade a estas considerações da Comissão.

492

A este respeito, há que assinalar que o único argumento que a República da Áustria apresenta neste contexto é relativo ao facto de que, segundo a página 53 do estudo de maio de 2012, um acréscimo de 3 gigawatts de capacidade nuclear à oferta inflexível de eletricidade faria duplicar a probabilidade de preços negativos, ao passo que, se a capacidade nuclear fosse 3 gigawatts mais baixa, a probabilidade de preços negativos seria reduzida em dois terços.

493

No que respeita a este argumento, há que assinalar que a República da Áustria não demonstrou que o projeto de construção de Hinkley Point C podia ser equiparado à hipótese, prevista na página 53 do estudo de maio de 2012, de serem acrescentados 3 gigawatts de capacidade nuclear. É certo que, segundo as indicações da Comissão, está previsto Hinkley Point C produzir 3,2 gigawatts. Todavia, segundo as indicações da Comissão, a construção de Hinkley Point C constitui unicamente um investimento de substituição, destinado a compensar uma parte da produção das centrais nucleares mais antigas e das centrais alimentadas a carvão que produzem a carga de base.

494

Em todo caso, numa situação como a do caso em apreço, na qual a Comissão afirma que efetuou trabalhos de modelização e concluiu, com base nestes trabalhos, que os preços no Reino Unido diminuiriam menos de 0,5 % na sequência da exploração de Hinkley Point C, mesmo que o argumento relativo ao facto de que a probabilidade de preços negativos aumentaria fosse procedente, isso não bastaria para demonstrar a existência de um erro manifesto de apreciação da Comissão. Com efeito, não pode ser deduzido do facto de a probabilidade de preços negativos aumentar que a conclusão da Comissão de que os preços na Grã‑Bretanha diminuiriam menos de 0,5 % na sequência da exploração de Hinkley Point C enferma de erro manifesto.

495

Por conseguinte, o argumento da República da Áustria relativo ao aumento da probabilidade de preços negativos deve igualmente ser julgado improcedente.

496

Em quarto lugar, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que a conclusão da Comissão, que figura no considerando 403 da decisão impugnada, segundo a qual a utilização do contrato diferencial não conduz a uma vantagem inadequada em relação às outras tecnologias, devido ao facto de as outras tecnologias poderem ser apoiadas do mesmo modo pelos contratos diferenciais, não está suficientemente demonstrada e é errada. Neste contexto, tais Estados‑Membros fazem referência ao Regulamento n.o 651/2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.o e 108.o TFUE, e às Orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia 2014‑2020.

497

Por um lado, no que respeita ao argumento da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo relativo ao Regulamento n.o 651/2014, que declara certas categorias de auxílio compatíveis com o mercado interno, em aplicação dos artigos 107.o e 108.o TFUE, basta recordar que este regulamento se limita a prever uma abordagem normalizada de isenção por categoria, mas que não vincula a Comissão no âmbito de uma apreciação individual efetuada diretamente com base no artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE (v., n.o 251, supra). O simples facto de as medidas em causa não satisfazerem as exigências previstas neste regulamento não é, assim, suscetível de demonstrar que a conclusão da Comissão no considerando 403 da decisão impugnada é manifestamente errada.

498

Por outro lado, quanto ao argumento da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo referente às Orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia 2014‑2020, refira‑se, a título preliminar que estes Estados‑Membros não alegam que a Comissão cometeu um erro ao não aplicar essas orientações às medidas em causa. Limitam‑se a criticá‑la por ter concluído, no considerando 403 da decisão impugnada, que outras tecnologias distintas da tecnologia nuclear e esta última podiam ser apoiadas do mesmo modo, mas que as condições em que os auxílios podiam ser concedidos a tecnologias distintas da tecnologia nuclear são mais exigentes do que as aplicadas pela Comissão na referida decisão à tecnologia nuclear.

499

A este respeito, basta observar que, contrariamente ao que dão a entender a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo, no considerando 403 da decisão impugnada, a Comissão não concluiu que outras tecnologias podiam ser apoiadas por contratos diferenciais que previssem condições iguais às previstas para Hinkley Point C. Com efeito, neste contexto, a Comissão limitou‑se a constatar que a utilização do instrumento que o contrato diferencial constitui não discriminava excessivamente as outras tecnologias, uma vez que este tipo de instrumento podia igualmente ser utilizado para apoiar outras tecnologias. Em contrapartida, no referido considerando, reconheceu explicitamente que podiam ser necessários ajustamentos para ter em conta as diferenças entre as tecnologias.

500

Por conseguinte, deve ser julgada improcedente a argumentação através da qual a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que a conclusão da Comissão, que figura no considerando 403 da decisão impugnada, segundo a qual a utilização do contrato diferencial não conduz a uma vantagem inadequada em relação às outras tecnologias, devido ao facto de as outras tecnologias poderem ser apoiadas do mesmo modo pelos contratos diferenciais não está suficientemente demonstrada e é errada.

501

Em quinto lugar, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que a Comissão não teve suficientemente em conta os efeitos da construção de Hinkley Point C nas interligações das redes energéticas.

502

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que, nos considerandos 506 a 509 da decisão impugnada, a Comissão concluiu que a construção e a exploração de Hinkley Point C deveriam ter um impacto mínimo nos preços grossistas no Reino Unido. Neste contexto, afirmou que os trabalhos de modelização efetuados sugeriam que os preços na Grã‑Bretanha diminuiriam menos de 0,5 % na sequência da exploração da referida central, o que, por sua vez, se traduziria numa diminuição cumulativa e global nas receitas de interligação em menos de 1,7 %, até 2030. Por conseguinte, a Comissão teve em conta os efeitos da construção e da exploração de Hinkley Point C nas interligações.

503

Em segundo lugar, embora a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo aleguem que a Comissão não teve suficientemente em conta estes efeitos, há que observar que estes Estados‑Membros não apresentam qualquer elemento suscetível de retirar plausibilidade às considerações da Comissão relativas às interligações das redes energéticas.

504

Por conseguinte, a argumentação através da qual a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que a Comissão não teve suficientemente em conta os efeitos da construção e da exploração de Hinkley Point C nas interligações das redes energéticas deve ser julgada improcedente, bem como, assim, todos os argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo que visam demonstrar que a Comissão ignorou os efeitos negativos que as medidas em causa produziriam no mercado da energia ou a dimensão destes efeitos.

3) Quanto à ponderação efetuada

505

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo apresentam diferentes argumentos que visam pôr em causa a ponderação dos efeitos positivos e dos efeitos negativos das medidas em causa que foi efetuada pela Comissão. Consideram, em substância, que os efeitos positivos das referidas medidas são inferiores aos efeitos negativos destas. Além dos efeitos negativos já referidos nos n.os 382, 384 e 400, supra, ou seja, o efeito de exclusão de outros produtores, a limitação das injeções das centrais eólicas em períodos de vento forte, os efeitos nos preços e as condições menos vantajosas dos contratos diferenciais abertos a outros produtores, a República da Áustria afirma que estas medidas têm como outro efeito negativo perpetuar a estrutura atual de fornecimento caracterizada por uma parte significativa de energia nuclear. Por outro lado, alega que a Comissão não deu atenção suficiente aos objetivos da promoção da eficiência energética e das economias de energia, do desenvolvimento das energias novas e da promoção da interligação das redes energéticas definidas no artigo 194.o, n.o 1, TFUE. Neste contexto, importa igualmente ter em conta os argumentos que visam a ponderação referidos nos n.os 238 e 439, supra, relativos ao facto de que a Comissão criou um juízo prévio a favor da energia nuclear e de que não devia ter privilegiado a importação de minerais de urânio provenientes de Estados terceiros em relação à importação de eletricidade proveniente de outros Estados‑Membros.

506

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que, nos considerandos 502 a 511 e 547 da decisão impugnada, a Comissão declarou que o risco de distorção da concorrência era limitado no que referente aos efeitos das medidas em causa nos investimentos alternativos e nos preços. Ora, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo não apresentaram argumentos suscetíveis de pôr em causa esta conclusão.

507

Em segundo lugar, quanto aos argumentos da República da Áustria relativos a uma perpetuação da estrutura atual de fornecimento, cabe recordar que, segundo as indicações da Comissão, o projeto de construção de Hinkley Point C visa unicamente impedir uma queda drástica da contribuição da energia nuclear para as necessidades totais de eletricidade. Ora, atendendo ao direito do Reino Unido de determinar o seu cabaz energético e de manter a energia nuclear como uma fonte neste cabaz, que resulta do artigo 194.o, n.o 2, segundo parágrafo, TFUE, assim como do artigo 1.o, segundo parágrafo, do artigo 2.o, alínea c), e do artigo 192.o, primeiro parágrafo, do Tratado Euratom, a decisão de manter a energia nuclear na estrutura de fornecimento não pode ser considerada manifestamente excessiva em relação aos efeitos positivos que resultam das medidas em causa.

508

Em terceiro lugar, quanto ao facto invocado pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo de que, em períodos de vento forte, as centrais eólicas são obrigadas a limitar a sua produção para não pôr em risco a estabilidade da rede, em primeiro lugar, há que assinalar que tal fenómeno resulta do caráter intermitente da tecnologia eólica. Em segundo lugar, o facto de a carga de base inflexível produzida pelas centrais nucleares ser suscetível de reforçar este efeito não basta, por si só, para demonstrar o caráter excessivo dos efeitos negativos das medidas em causa em relação aos efeitos positivos que daí resultam. Com efeito, por um lado, atendendo ao direito do Reino Unido de determinar o seu cabaz energético e de manter a energia nuclear como uma fonte de energia neste cartaz, o Reino Unido não pode ser criticado por adotar medidas necessárias para manter a energia nuclear no seu cabaz energético, mesmo que isto possa produzir efeitos negativos em relação aos produtores de energia intermitente. Por outro lado, e em todo caso, segundo as considerações da Comissão, que não foram postas em causa pelos argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo, não é possível responder ao futuro défice de capacidades de produção de energia capazes de fornecer 60 gigawatts identificado pelo Reino Unido unicamente com recurso a outras fontes com baixo teor de carbono.

509

Em quarto lugar, a República da Áustria afirma que, no âmbito da ponderação dos efeitos das medidas em causa, a Comissão não deu atenção suficiente ao objetivo de privilegiar as importações de eletricidade provenientes de outros Estados‑Membros e ao objetivo de eficácia. A este respeito, basta recordar, por um lado, que, segundo as constatações da Comissão acima resumidas nos n.os 405 e 466 a 470, o impacto das medidas em causa nas interligações continua limitado e existe um futuro défice de capacidades de produção de energia capazes de fornecer 60 gigawatts no Reino Unido, dos quais apenas 3,2 gigawatts seriam fornecidos por Hinkley Point C, e, por outro, que a plausibilidade destas constatações não foi validamente posta em causa pelos argumentos apresentados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo. Nestas circunstâncias, o argumento relativo ao facto de que a Comissão não deu atenção suficiente ao objetivo de privilegiar as importações de eletricidade provenientes de outros Estados‑Membros e ao objetivo de eficácia não é suscetível de demonstrar o caráter excessivo dos efeitos negativos das medidas em causa em relação aos efeitos positivos que daí resultam.

510

Em quinto lugar, cabe recordar que o Reino Unido tem o direito de determinar a constituição do seu cabaz energético e de manter a energia nuclear enquanto fonte desse cabaz. Atendendo a este direito, o simples facto de que, com vista a criar um efeito de incentivo para a construção de novas capacidades de produção de energia nuclear para ultrapassar os obstáculos com que se depara, o Reino Unido previu um contrato diferencial para a construção e a exploração de Hinkley Point C que inclui condições mais vantajosas que os contratos diferenciais abertos a outras tecnologias não basta, por si só, para demonstrar o caráter excessivo dos efeitos negativos das medidas em causa em relação aos efeitos positivos que daí decorrem.

511

Daqui resulta que todos os argumentos apresentados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo destinados a demonstrar que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação relativamente à ponderação dos efeitos das medidas em causa devem ser julgados improcedentes.

4) Quanto ao argumento de que a Comissão não teve em conta elementos relevantes

512

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo afirmam que, no âmbito da ponderação dos efeitos das medidas em causa, a Comissão não teve em conta elementos que teriam sido relevantes, tais como os efeitos das referidas medidas no ambiente, o risco terrorista e os custos de armazenamento dos resíduos nucleares, assim como as consequências do seu financiamento. Neste contexto, importa igualmente ter em conta os argumentos que a República da Áustria apresentou no âmbito do quarto fundamento segundo os quais, ao conferir uma prioridade incondicional ao artigo 2.o, alínea c), do Tratado Euratom, a Comissão violou os princípios da proteção do ambiente, da precaução, do poluidor‑pagador e da durabilidade (v., n.o 114, supra).

513

A Comissão, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República da Eslováquia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

514

Em primeiro lugar, importa apreciar os argumentos da República da Áustria relativos ao facto de a Comissão não ter tido suficientemente em conta os princípios da proteção do ambiente, da precaução, do poluidor‑pagador e da durabilidade.

515

A este respeito, em primeiro lugar, há que observar que, através das medidas em causa, o Reino Unido não pretendia especificamente prosseguir os princípios invocados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo. Por conseguinte, a Comissão não tinha que ter em conta os referidos princípios no âmbito da identificação das vantagens resultantes das medidas em causa.

516

Em segundo lugar, quanto aos inconvenientes das medidas em causa, cabe recordar que, no âmbito da aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, a Comissão deve ponderar as vantagens das medidas em causa e o seu impacto negativo no mercado interno. Ora, mesmo que a proteção do ambiente deva ser integrada na definição e na execução das políticas da União, designadamente as destinadas a estabelecer o mercado interno, não constitui propriamente uma das componentes deste mercado interno, definido como um espaço sem fronteiras internas no qual a livre circulação das mercadorias, das pessoas, dos serviços e dos capitais é assegurada. Por conseguinte, na identificação dos efeitos negativos das medidas em causa, a Comissão não tinha a obrigação de ter em conta até que ponto as medidas em causa são desfavoráveis à realização deste princípio (v., neste sentido, Acórdão de 3 de dezembro de 2014, Castelnou Energía/Comissão, T‑57/11, EU:T:2014:1021, n.os 189 a 191). Isto vale igualmente para os princípios da precaução, do poluidor‑pagador e da durabilidade invocados pela República da Áustria.

517

Em terceiro lugar, na medida em que, com os seus argumentos, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo pretendem demonstrar que as medidas que são contrárias ao direito da União não podem ser autorizadas pela Comissão, por um lado, importa assinalar que, exceto os princípios da proteção do ambiente, da precaução, do poluidor‑pagador e da durabilidade, estes Estados‑Membros não invocam qualquer regulamentação ambiental da União que não teria sido respeitada. Por outro, na hipótese de estes Estados‑Membros alegarem que os referidos princípios se opõem a que os auxílios estatais para apoio da construção ou da exploração de uma construção de uma central nuclear sejam concedidos, este argumento deve igualmente ser julgado improcedente, uma vez que tal interpretação não é conforme ao artigo 106.o‑A, n.o 3, do Tratado Euratom.

518

Daqui resulta que todos os argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo relativos ao facto de que a Comissão não teve suficientemente em conta os princípios da proteção do ambiente, da precaução, do poluidor‑pagador e da durabilidade devem ser julgados improcedentes.

519

Em segundo lugar, o argumento do Grão‑Ducado do Luxemburgo de que a Comissão não teve suficientemente em conta o risco resultante do terrorismo deve ser julgado improcedente por razões análogas. Com efeito, as medidas em causa não eram medidas destinadas especificamente à defesa contra o terrorismo e a proteção contra o terrorismo não constitui propriamente uma das componentes do mercado interno, definido como um espaço sem fronteiras internas no qual a livre circulação de mercadorias, de pessoas, de serviços e de capitais é assegurada. Por outro lado, há que observar que a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo não invocam qualquer regulamentação relativa à segurança de centrais nucleares que não tenha sido respeitada.

520

Em terceiro lugar, quanto ao argumento da República da Áustria de que a Comissão não teve em consideração os custos de armazenamento dos resíduos nucleares, basta remeter para a apreciação acima efetuada nos n.os 354 a 358.

521

Em quarto lugar, a República da Áustria afirma que a Comissão não teve suficientemente em conta as consequências negativas das medidas em causa em relação aos consumidores, que devem suportar o preço das referidas medidas, nomeadamente na sua qualidade de contribuintes.

522

Neste contexto, em primeiro lugar, há que precisar que, na medida em que se trata de pagamentos que devem ser efetuados com base no contrato diferencial, os consumidores não serão afetados enquanto contribuintes, uma vez que estes pagamentos são financiados pelo intermediário de uma taxa imposta aos fornecedores (v., considerando 329 da decisão impugnada). Por outro lado, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, não se pode inferir da decisão impugnada que a Comissão não teve em conta os interesses dos consumidores de eletricidade no âmbito da fiscalização da proporcionalidade. Com efeito, não só apreciou os efeitos das medidas em causa nos preços da eletricidade e considerou que não eram expectáveis efeitos significativos, mas garantiu igualmente que as referidas medidas não causam uma sobrecompensação. Assim, ajustou a taxa de remuneração para a garantia de crédito e, no considerando 491 da referida decisão, declarou explicitamente que as alterações do mecanismo de partilha dos ganhos eram suscetíveis de se traduzir em menores níveis de apoio a ser fornecido pelos fornecedores e, em última análise, por estes consumidores.

523

Em segundo lugar, quanto à garantia de crédito, resulta do considerando 339 da decisão impugnada que esta se refere aos recursos do Reino Unido. Por conseguinte, neste contexto, os consumidores podem ser afetados na sua qualidade de contribuintes. Todavia, a este respeito, cabe recordar que importa distinguir as medidas em causa por um lado, e o seu financiamento, por outro. Com efeito, as taxas que servem para financiar os auxílios não estão abrangidas pelo âmbito de aplicação das disposições do Tratado relativas aos auxílios estatais, a menos que constituam o modo de financiamento de uma medida de auxílio, de tal forma que façam parte integrante desta medida. Para que se possa considerar que uma taxa, ou uma parte de uma taxa, faz parte integrante de uma medida de auxílio, deve necessariamente existir uma relação de afetação obrigatória entre a taxa e o auxílio por força da legislação nacional pertinente, no sentido de o produto da taxa ser necessariamente destinado ao financiamento do auxílio. Se tal relação existir, o produto da taxa influencia diretamente a importância do auxílio e, por consequência, a apreciação da compatibilidade deste auxílio com o mercado interno (Acórdão de 13 de janeiro de 2005, Streekgewest, C‑174/02, EU:C:2005:10, n.os 25 e 26). Ora, importa referir, por um lado, que a decisão impugnada não inclui qualquer elemento que permita concluir pela existência de uma relação idêntica entre a garantia de crédito e o seu financiamento e, por outro, que a República da Áustria não apresenta qualquer argumento suscetível de demonstrar a existência de tal relação.

524

Por conseguinte, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria de que a Comissão não teve suficientemente em conta os efeitos das medidas para os consumidores, nomeadamente na sua qualidade de contribuintes.

525

Em quinto lugar, a República da Áustria alega que a Comissão não teve suficientemente em conta o facto de que o projeto de Hinkley Point C limitava os meios públicos e impedia a prossecução de projetos de exploração e de desenvolvimento de fontes de energias renováveis.

526

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que, nos termos do artigo 194.o, n.o 2, segundo parágrafo, TFUE, os Estados‑Membros dispõem do direito de escolher entre diferentes fontes de energia. Por conseguinte, por si só, a escolha do Reino Unido de conceder um auxílio para apoio da promoção da energia nuclear não pode ser posta em causa, apesar de isso implicar que os recursos públicos consagrados a este projeto não estejam disponíveis para outros projetos.

527

Em segundo lugar, deve observar‑se que a República da Áustria não invoca qualquer elemento para demonstrar que, devido à concessão das medidas em causa para apoio de Hinkley Point C, o Reino Unido não é capaz de cumprir as suas obrigações resultantes do direito da União no que respeita à proteção do ambiente.

528

Em terceiro lugar, cabe recordar que, no considerando 510 da decisão impugnada, a Comissão afirmou que, independentemente dos investimentos em Hinkley Point C, continuava a haver espaço suficiente no mercado para a entrada de outros produtores e de outras tecnologias de produção e para o alargamento da sua capacidade, e que, no considerando 403 da referida decisão, teve em conta que o contrato diferencial não discriminava excessivamente as outras tecnologias, uma vez que estas podiam ser apoiadas de modo suficiente pelo mesmo tipo de instrumento, no âmbito do mercado de capacidades criado pelo Reino Unido, exceto no que toca a adaptações necessárias dadas as diferenças entre as tecnologias. Importa igualmente recordar que os argumentos da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo acima analisados nos n.os 463 a 511 não são suscetíveis de demonstrar que a Comissão cometeu um erro manifesto de apreciação a este respeito.

529

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria de que a Comissão não teve suficientemente em conta o facto de que o projeto de Hinkley Point C limitava os meios públicos e impedia a prossecução de projetos de exploração e de desenvolvimento de fontes de energia renovável, bem como, assim, todos os argumentos relativos ao facto de a Comissão não ter tido em conta fatores relevantes.

530

Por conseguinte, há que julgar improcedentes todos os argumentos relativos à ponderação dos efeitos positivos e negativos das medidas em causa e, assim, o sexto fundamento na íntegra, bem como os argumentos relativos ao caráter necessário das referidas medidas apresentados no âmbito do primeiro fundamento (v., n.o 196, supra) e do quinto fundamento (v., n.os 273 e 352, supra), e os argumentos relativos a essa ponderação, apresentados no âmbito do quarto fundamento (v., n.os 114 e 125, supra) e do primeiro fundamento (v., n.o 238, supra).

2.   Quanto à segunda alegação da terceira parte e à sexta parte do nono fundamento, relativas, nomeadamente, a fundamentação insuficiente

531

No âmbito da segunda alegação da terceira parte e da sexta parte do nono fundamento, a República da Áustria apresenta argumentos relativos, em substância, a uma fundamentação insuficiente da decisão impugnada no que respeita à fiscalização da proporcionalidade das medidas em causa.

532

No âmbito da primeira alegação da sexta parte do nono fundamento, a República da Áustria alega que a fundamentação da decisão impugnada é insuficiente no que respeita às alternativas possíveis à subvenção de Hinkley Point C. Por um lado, a decisão impugnada não apresentou as propostas de produtores de energias alternativas. Por outro, esta decisão é «muda» no que se refere às medidas de economia de energia e de eficiência energética.

533

A Comissão contesta estes argumentos.

534

A este respeito, importa assinalar que resulta do ponto 9.2 da decisão impugnada que a Comissão considerou que o objetivo de interesse público prosseguido pelas medidas em causa era o da promoção da energia nuclear, e, mais especificamente, o da criação de novas capacidades de produção de energia nuclear. Assim, a razão pela qual a proposta dos fornecedores de energia alternativa não constituía uma alternativa à subvenção de Hinkley Point C decorre claramente desse ponto.

535

Além disso, no que se refere às medidas de economia de energia e de eficiência energética, basta observar que resulta dos considerandos 250 a 254 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação que o Reino Unido tinha identificado um futuro défice de capacidades de produção de eletricidade e que, no âmbito da determinação da dimensão deste futuro défice, tinha tido em conta as medidas de economia de energia e de eficiência energética. Uma vez que a Comissão se baseou, na decisão impugnada, neste futuro défice e a fundamentação da decisão de abertura do procedimento formal de investigação faz parte do contexto da decisão impugnada, a fundamentação desta não pode ser considerada insuficiente a este respeito (v., n.o 63, supra).

536

Por outro lado, no caso de a República da Áustria pretender, através da presente alegação, pôr em causa o mérito da fundamentação referida, basta recordar que essa alegação já foi apreciada e rejeitada no âmbito da apreciação do sexto fundamento.

537

Por conseguinte, a primeira alegação da sexta parte do nono fundamento deve ser julgada improcedente.

538

No âmbito da segunda alegação da sexta parte do nono fundamento, a República da Áustria alega que a Comissão não apresentou os cenários a que fez referência no considerando 416 da decisão impugnada.

539

A Comissão contesta este argumento.

540

A título preliminar, importa observar que o considerando 416 da decisão impugnada figura no ponto 9.5.1 da referida decisão, no qual a Comissão descreveu a garantia de crédito notificada pelo Reino Unido, nomeadamente, a taxa de remuneração para a referida garantia que tinha inicialmente sido prevista por este Estado‑Membro. Neste contexto, a Comissão afirmou que, nas circunstâncias do caso em apreço, podiam ser utilizados dois métodos para estabelecer uma taxa de remuneração para esta garantia correspondente às condições do mercado. Um destes métodos é o modelo dos prejuízos esperados, que relaciona o plano de negócios da empresa com a sua estrutura de capital sob diferentes cenários, tendo por resultado uma probabilidade de incumprimento.

541

A República da Áustria considera que a Comissão não apresentou esses cenários.

542

A este respeito, há que salientar que, nos considerandos 424 a 427 da decisão impugnada, a Comissão explicou, com maior detalhe, o modelo dos prejuízos esperados e um dos cenários que tinham sido previstos pelo Reino Unido neste contexto. Importa igualmente salientar que a Comissão considerou que a taxa de remuneração para a garantia de crédito notificada pelo Reino Unido não reflete a taxa correspondente às condições do mercado. Por esta razão, nos considerandos 463 a 477 da referida decisão, a Comissão expôs em que medida devia ser alterada a taxa de remuneração para a referida garantia a fim de limitar o elemento de auxílio incluído na garantia de crédito ao mínimo. Neste contexto, expôs os critérios que utilizou e os cenários que previu.

543

Tendo em conta estes elementos, a alegação de fundamentação insuficiente no que respeita ao considerando 416 da decisão impugnada deve ser julgada improcedente.

544

No âmbito da terceira alegação da sexta parte do nono fundamento, a República da Áustria alega que, no ponto 9.5.2 da decisão impugnada, a Comissão se baseou no relatório TESLA 4, mas não indicou os dados relacionados com ele. Por conseguinte, as suas considerações sobre o risco financeiro não são compreensíveis.

545

A Comissão contesta este argumento.

546

Em primeiro lugar, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria relativo a uma violação do dever de fundamentação. A este respeito, importa observar que, nos considerandos 434 a 458 da decisão impugnada, a Comissão apreciou de forma detalhada o nível do preço de exercício e das taxas de rentabilidade, com base em diferentes fontes de dados. Nos considerandos 446 e 447 da referida decisão, teve em conta o relatório TESLA 4, realizado internamente pela NNBG. Ora, há que constatar que resulta de forma suficientemente clara da versão pública desta decisão que a Comissão não revelou os dados do referido relatório a fim de proteger segredos de negócios.

547

Em segundo lugar, na hipótese de a República da Áustria pretender, com o seu argumento, pôr em causa o caráter confidencial desses dados ou a decisão da Comissão de os ocultar, basta observar que não apresenta qualquer argumento circunstanciado a este respeito.

548

Por conseguinte, a alegação relativa ao relatório TESLA 4 deve ser julgada improcedente.

549

No âmbito da quarta alegação da sexta parte do nono fundamento, a República da Áustria afirma que não é compreensível que, no ponto 9.5.3.3 da decisão impugnada, o mecanismo de partilha de ganhos tenha sido publicado e não os limiares dos ganhos de construção.

550

A Comissão contesta estes argumentos.

551

Neste contexto, importa assinalar que resulta claramente do considerando 487 da decisão impugnada que a Comissão considerou que os limiares dos ganhos de construção constituíam segredos de negócios. Por outro lado, há que observar que a República da Áustria não apresenta qualquer argumento suscetível de pôr em causa o caráter confidencial destas informações ou o mérito da decisão da Comissão de não as divulgar.

552

Por conseguinte, o argumento da República da Áustria relativo aos limiares dos ganhos de construção deve igualmente ser julgado improcedente.

553

No âmbito da quinta alegação da sexta parte do nono fundamento, a República da Áustria afirma que a fundamentação da decisão impugnada não é suficiente no que respeita às subvenções ligadas aos custos suplementares relacionados com o desmantelamento das instalações, assim como ao tratamento e ao armazenamento dos resíduos radioativos.

554

A Comissão contesta estes argumentos.

555

A este respeito, basta recordar que, como resulta dos considerandos 460 e 461 da decisão impugnada, a Comissão apenas teve em conta os elementos de custos para as despesas relacionadas com a gestão e a eliminação de resíduos e para as taxas de dívida e desativação que estavam incluídas no modelo financeiro para Hinkley Point C. Em contrapartida, a referida decisão não incide sobre os elementos de auxílio suplementares relativos a este tipo de despesas. Por conseguinte, a Comissão não tinha de fundamentar a referida decisão a este respeito.

556

No âmbito da sexta alegação da sexta parte do nono fundamento, a República da Áustria alega que a Comissão devia ter fundamentado mais a razão pela qual, contrariamente à sua prática decisória, não tinha considerado que a inexistência de concurso acentuava os efeitos das medidas em causa na concorrência.

557

A Comissão contesta estes argumentos.

558

A este respeito, importa assinalar, em primeiro lugar, que, no ponto 9.1 da decisão impugnada, a Comissão expôs as razões pelas quais considerava que a Diretiva 2004/17/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais (JO 2004, L 134, p. 1), conforme alterada, e a Diretiva 2004/18/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços (JO 2004, L 134, p. 114), conforme alterada, não eram aplicáveis às medidas em causa.

559

Em segundo lugar, nos considerandos 359 a 364 da decisão impugnada, a Comissão afirmou que o procedimento de seleção utilizado pelo Reino Unido teve por base um quadro claro, transparente e não discriminatório, que pode ser considerado equivalente a um procedimento de concurso público em termos de transparência e de não discriminação. Neste contexto, no considerando 363 da referida decisão, declarou expressamente que o Reino Unido tinha negociado com outros promotores de nova energia nuclear que não a NNBG.

560

Em terceiro lugar, há que referir que as razões pelas quais a Comissão considerou que as medidas em causa não conduziam a uma sobrecompensação resultam de forma suficiente do ponto 9.5 da decisão impugnada.

561

Tendo em conta estes elementos, a presente alegação deve ser julgada improcedente.

562

No âmbito da sétima alegação da sexta parte do nono fundamento, a República da Áustria afirma que, no considerando 389 da decisão impugnada, a Comissão concluiu por um aumento considerável do bem‑estar geral e do bem‑estar de todos os consumidores. Ora, neste contexto, a referida instituição não expôs em que medida os custos externos gerados, por exemplo, pelo tratamento e a eliminação de resíduos nucleares ou pelos riscos de acidentes, foram tidos em conta. Por outro lado, a fundamentação que figura no ponto 9.4 da referida decisão, relativa ao caráter adequado dos instrumentos, não é compreensível. Neste contexto, a Comissão não se pronunciou suficientemente sobre os efeitos das medidas em causa no mercado da eletricidade.

563

A Comissão contesta estes argumentos.

564

A este respeito, importa assinalar que, no ponto 9.3 da decisão impugnada, a Comissão se pronunciou sobre a questão de saber se uma intervenção do Reino Unido era necessária para alcançar o objetivo de interesse público que prosseguia, designadamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear e, no ponto 9.4 da referida decisão, sobre a questão de saber se as medidas em causa, nomeadamente o contrato diferencial, podiam ser consideradas instrumentos adequados para alcançar tal objetivo. Neste contexto, a Comissão teve em conta, nomeadamente, o facto de outras tecnologias poderem ser apoiadas de modo semelhante pelos contratos diferenciais e o caráter intermitente de várias tecnologias de energias renováveis. Todavia, contrariamente ao que dá a entender a República da Áustria, nos referidos pontos, não efetuou uma ponderação completa de todos os efeitos positivos e negativos relevantes destas medidas. Com efeito, efetuou tal ponderação numa fase posterior da sua apreciação, no âmbito do ponto 9.6 dessa decisão.

565

Daqui resulta que, nos pontos 9.3 e 9.4 da decisão impugnada, a Comissão não tinha que se pronunciar sobre todos os efeitos positivos e negativos das medidas em causa nem que os ponderar. Por outro lado, na medida em que, no considerando 389 da referida decisão, mencionou a melhoria do bem‑estar da sociedade em geral e de todos os consumidores, não se trata de uma conclusão resultante de tal ponderação. Nesse considerando, limitou‑se a constatar que a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear constituía um efeito positivo destas medidas.

566

Tendo em consideração o exposto, a alegação de fundamentação insuficiente dos pontos 9.3 e 9.4 da decisão impugnada deve igualmente ser julgada improcedente.

567

No âmbito da segunda alegação da terceira parte do nono fundamento, a República da Áustria alega que, no ponto 8.1.7 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, a Comissão baseou as dúvidas sérias quanto à compatibilidade das medidas em causa com o mercado interno num relatório que concluía que estas podiam conduzir a graves distorções de concorrência. Ora, na decisão impugnada, a Comissão não explicou as razões pelas quais tais dúvidas se dissiparam.

568

A Comissão contesta estes argumentos.

569

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que, como resulta do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999, as considerações da Comissão no ponto 8.1.7 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação eram avaliações preliminares (v., neste sentido, Acórdão de 1 de julho de 2009, ISD Polska e o./Comissão, T‑273/06 e T‑297/06, EU:T:2009:233, n.o 126 e jurisprudência aí referida). Por conseguinte, a fundamentação da decisão impugnada não pode ser considerada insuficiente apenas por não ser totalmente idêntica à que figura na decisão de abertura do procedimento formal de investigação. Com efeito, numa decisão adotada no termo de um procedimento formal de investigação, a Comissão não tem que apresentar uma análise que abranja todas as considerações que figuram na decisão de abertura do procedimento formal de investigação.

570

Em segundo lugar, deve ser tido em conta o facto de, na decisão impugnada, a Comissão ter apresentado as razões pelas quais, após ter efetuado uma apreciação aprofundada dos efeitos das medidas em causa na concorrência e nas trocas comerciais entre Estados‑Membros, considerava que estas medidas eram compatíveis com o mercado interno. Neste contexto, importa igualmente assinalar que as dúvidas da Comissão eram relativas às medidas tal como tinham sido notificadas pelo Reino Unido. Em contrapartida, a autorização que figura na referida decisão impugnada respeitava às medidas tal como tinham sido alteradas para ter em conta essas dúvidas.

571

Em terceiro lugar, na medida em que a República da Áustria afirma que as alterações das medidas notificadas não eram suscetíveis de afastar as dúvidas inicialmente suscitadas, há que observar que não apresenta qualquer argumento circunstanciado a este respeito.

572

Em quarto lugar e em todo caso, deve observar‑se que a Comissão indicou expressamente no considerando 402 da decisão de abertura do procedimento formal que o relatório a que é feita referência no seu ponto 8.1.7 não refletia necessariamente o seu ponto de vista.

573

Em face destas considerações, há que concluir que, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, o simples facto de a Comissão não ter exposto detalhadamente as razões pelas quais não partilhava das dúvidas que constavam do relatório referido no ponto 8.1.7 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação não implica que a fundamentação da decisão impugnada seja insuficiente.

574

Por conseguinte, a segunda alegação da terceira parte do nono fundamento e a sexta parte do nono fundamento devem ser julgadas improcedentes.

G. Quanto ao terceiro fundamento e à primeira alegação da terceira parte do nono fundamento, que visa a qualificação das medidas em causa

575

O terceiro fundamento e a primeira alegação da terceira parte do nono fundamento visam os considerandos 344 a 347 da decisão impugnada. Nos referidos considerandos, a Comissão afirmou que as medidas que envolvem um auxílio ao funcionamento eram, em princípio, incompatíveis nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, mas que as medidas em causa deviam ser consideradas equivalentes a um auxílio ao investimento, uma vez que se destinavam a permitir que a NNBG se comprometesse a investir na construção de Hinkley Point C. Neste contexto, considerou, nomeadamente, que, do ponto de vista da modelização financeira, o valor atual líquido dos pagamentos do preço de exercício podia ser considerado equivalente a um pagamento de montante fixo que permitisse à NNBG cobrir os custos da construção.

576

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo entendem que estas considerações são erradas. Numa primeira fase, alegam que a Comissão devia ter qualificado as medidas em causa como auxílios ao funcionamento incompatíveis com o mercado interno. Numa segunda fase, a República da Áustria afirma que a decisão impugnada não está suficientemente fundamentada.

1.   Quanto aos argumentos relativos à qualificação das medidas em causa

577

A República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo alegam que as medidas em causa constituem auxílios ao funcionamento, que não são compatíveis com o mercado interno. Neste contexto, importa igualmente ter em conta o argumento apresentado no âmbito do quarto fundamento, que visa a qualificação das medidas em causa como auxílio ao investimento, acima referido no n.o 125.

578

A Comissão, a República Checa, a Hungria, a República da Polónia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

579

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que, segundo jurisprudência constante, os auxílios ao funcionamento destinados à manutenção do statu quo ou a libertar uma empresa dos custos que devia normalmente suportar no âmbito da sua gestão corrente ou das suas atividades normais, não podem ser considerados compatíveis com o mercado interno (v., neste sentido, Acórdãos de 5 de Outubro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑288/96, EU:C:2000:537, n.os 88 a 91; de 19 de setembro de 2000, Alemanha/Comissão, C‑156/98, EU:C:2000:467, n.o 30, e de 21 de julho de 2011, Freistaat Sachsen e Land Sachsen‑Anhalt/Comissão, C‑459/10 P, não publicado, EU:C:2011:515, n.os 33 a 36).

580

Com efeito, tais auxílios não são suscetíveis de cumprir os requisitos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Assim, os auxílios ao funcionamento que se limitam a manter um statu quo não facilitam o desenvolvimento na aceção da referida disposição. Por sua vez, os auxílios que se limitam a diminuir as despesas correntes e habituais de exploração que uma empresa teria sempre de suportar no âmbito da sua atividade normal não podem ser entendidos no sentido de que prosseguem um objetivo de interesse público na aceção da referida disposição. Por outro lado, os auxílios através dos quais são concedidas vantagens às empresas, sem serem destinados à realização de um objetivo de interesse público prosseguido pelo Estado‑Membro que os concede e que, assim, podem ser utilizados por essas empresas para suportar os custos do seu funcionamento existente e corrente, não podem ser declarados compatíveis com o mercado interno ao abrigo dessa mesma disposição. Com efeito, tais auxílios favorecem essas empresas em relação aos seus concorrentes, sem que isso seja justificado pela realização de um objetivo de interesse público.

581

Há que observar que, na decisão impugnada, a Comissão não pôs em causa a jurisprudência acima referida no n.o 579. Pelo contrário, no considerando 344 da referida decisão, fez referência ao primeiro parágrafo do ponto 8.1 da decisão de dar início ao procedimento formal de investigação, no qual tinha citado a referida jurisprudência.

582

Em contrapartida, como resulta dos considerandos 344 a 347 da decisão impugnada, a Comissão considerou que a jurisprudência acima referida no n.o 579 não se aplicava às medidas em causa devido à especificidade do projeto e ao facto de essas medidas se destinarem a permitir que a NNBG se comprometesse a investir na construção de Hinkley Point C.

583

Contrariamente ao que afirmam a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo, esta abordagem não é errada. Com efeito, nada se opõe a que uma medida de auxílio que prossegue um objetivo de interesse público, que é adequada e necessária para alcançar esse objetivo, que não altera as condições das trocas comerciais de forma contrária ao interesse comum e que, assim, cumpre, os requisitos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, seja declarada compatível com o mercado interno ao abrigo dessa disposição, independentemente da questão de saber se deve ser qualificada de auxílio ao investimento ou de auxílio ao funcionamento. Além disso, cabe recordar que mesmo um auxílio ao funcionamento pode ser declarado compatível com o mercado interno quando esses requisitos estejam reunidos (v., neste sentido, Acórdão de 9 de junho de 2016, Magic Mountain Kletterhallen e o./Comissão, T‑162/13, não publicado, EU:T:2016:341, n.os 116 e 117).

584

Quanto às medidas em causa, em primeiro lugar, há que lembrar, por um lado, que, na decisão impugnada, a Comissão concluiu que prosseguiam um objetivo de interesse público, designadamente a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, que não poderia ser alcançado em tempo útil sem intervenção do Estado, e, por outro, que a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo não tinham apresentado argumentos suscetíveis de pôr em causa essa conclusão. Por conseguinte, as referidas medidas não podem ser consideradas auxílios que se limitam a manter um statu quo. Pelo contrário, segundo as considerações da Comissão, sem elas, nenhum investimento em novas capacidades de produção de energia nuclear seria efetuado em tempo útil.

585

Em segundo lugar, deve recordar‑se que, segundo as conclusões da Comissão, que não foram impugnadas pelos argumentos apresentados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo, as medidas em causa são adequadas e necessárias para alcançar este objetivo e não alteram as condições das trocas comerciais de forma contrária ao interesse comum. Nestas circunstâncias, as medidas em causa não podem ser consideradas auxílios que se limitam a diminuir as despesas correntes e habituais de exploração que uma empresa teria sempre de suportar no âmbito da sua atividade normal. Pelo contrário, essas medidas tinham por objetivo criar um efeito de incentivo para a construção de novas capacidades de produção de energia nuclear, diminuindo os riscos ligados aos investimentos, com vista a assegurar a rentabilidade dos mesmos.

586

Estas considerações devem ser tidas em conta na apreciação dos argumentos apresentados pela República da Áustria e pelo Grão‑Ducado do Luxemburgo. Numa primeira fase, estes Estados‑Membros invocam argumentos relativos ao contrato diferencial. Numa segunda fase, apresentam argumentos relativos ao acordo do secretário de Estado. Numa terceira fase, apresentam argumentos respeitantes à compensação prevista. Numa quarta fase, alegam que, na decisão impugnada, a Comissão devia ter distinguido claramente entre um auxílio ao funcionamento e um auxílio ao investimento.

a)   Quanto aos argumentos relativos ao contrato diferencial

587

Em primeiro lugar, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo apresentam argumentos que visam demonstrar que este contrato está indissociavelmente ligado ao funcionamento de Hinkley Point C. Neste contexto, alegam que abrange as despesas correntes da NNBG e, assim, não se limita a conceder apenas uma subvenção para a construção da unidade C da referida central, mas respeita igualmente à exploração corrente, e que a dimensão do auxílio deve depender diretamente da energia produzida.

588

A este respeito, a título preliminar, cabe recordar que uma medida de auxílio pode ser declarada compatível com o mercado interno se preencher os requisitos previstos no artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE, independentemente da sua qualificação como auxílio ao funcionamento ou como auxílio ao investimento (v., n.o 583, supra).

589

Quanto ao argumento da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo de que é impossível estabelecer uma ligação entre os pagamentos efetuados em aplicação do contrato diferencial e os investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear, basta observar que o referido contrato visa garantir rendimentos estáveis num período suficientemente longo a fim de incentivar a empresa em causa a investir os fundos necessários para a construção dessas novas capacidades. Em substância, trata‑se, assim, de um instrumento de cobertura dos riscos sob a forma de estabilizador dos preços, que oferece segurança e estabilidade dos rendimentos. Todavia, contrariamente a uma subvenção a fundo perdido, que é concedida na íntegra previamente ou em função do andamento da construção, o contrato diferencial possui um efeito de incentivo aos investimentos garantindo um nível de preço determinado e estável.

590

Neste contexto, em primeiro lugar, deve recordar‑se que, em aplicação do contrato diferencial, a NNBG receberá um pagamento apenas quando o preço de referência for inferior ao preço de exercício. Em contrapartida, quando o preço de referência for superior ao preço de exercício, a NNBG será obrigada a reembolsar a diferença entre estes dois preços (v., n.o 5, supra). Por conseguinte, mesmo que a concessão e o montante do auxílio dependam de circunstâncias que envolvem o funcionamento de Hinkley Point C e a produção de eletricidade pela referida unidade, existe uma ligação clara entre este montante e o objetivo de interesse público prosseguido. Com efeito, estas modalidades visam garantir que o montante do pagamento devido em razão do contrato diferencial corresponde ao nível que deve ser atingido para iniciar os investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear.

591

Em segundo lugar, contrariamente ao que a República da Áustria afirma, o facto de, no caso de Hinkley Point C não ser concluída, a NNBG não receber auxílios ao abrigo do contrato diferencial, não é suscetível de pôr em causa a ligação entre as medidas em questão e o objetivo de interesse público prosseguido, designadamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear. Com efeito, há que observar que, nesse caso, o objetivo de interesse público prosseguido não é alcançado. Ora, o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE não se opõe a modalidades de repartição de riscos que imputem o risco técnico da realização à empresa beneficiária.

592

Em terceiro lugar, a República da Áustria afirma que o contrato diferencial permite efetuar uma revisão do preço de exercício e que, nesse âmbito, serão tidos em conta não apenas os custos de investimento, mas igualmente os custos de exploração.

593

A este respeito, importa assinalar que o preço de exercício autorizado pela Comissão na decisão impugnada tem em conta não apenas o preço de construção de Hinkley Point C, mas igualmente os custos de exploração dessa unidade. Com efeito, esses custos influenciam a rentabilidade do projeto e têm, assim, impacto no montante que o preço de exercício deve atingir para desencadear a decisão de investimento em novas capacidades de produção de energia nuclear.

594

Daqui resulta que o facto de, após 15 e 25 anos, o preço de exercício poder ser revisto e de, no âmbito dessa revisão (v., n.o 5, supra), serem tidos em conta os elementos relativos aos custos de exploração, não é suscetível de pôr em causa a ligação entre as medidas em questão e o objetivo de interesse público prosseguido, designadamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear. Com efeito, tendo em conta que os custos de exploração com base nos quais o preço de exercício foi calculado devem ser estimados ex ante e que a duração de exploração de Hinkley Point C será bastante longa, a possibilidade de tais revisões visa atenuar os riscos relativos aos custos a longo prazo para as duas partes, com vista a aumentar ou a diminuir o montante do preço de exercício garantido pelo contrato diferencial.

595

Daqui resulta que, embora os pagamentos que serão efetuados em aplicação do contrato diferencial sejam relativos ao funcionamento de Hinkley Point C e à produção e venda de energia nuclear pela mesma, isso não é suscetível de pôr em causa a ligação entre estes pagamentos e a decisão de investimento inicial.

596

Por conseguinte, mesmo na hipótese de a NNBG utilizar parte dos pagamentos que receberá em razão do contrato diferencial para cobrir os custos de exploração corrente de Hinkley Point C, isso não é suscetível de quebrar a ligação existente entre as medidas em causa e o objetivo de interesse público prosseguido, designadamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear.

597

Por conseguinte, a argumentação da República da Áustria e do Grão‑Ducado do Luxemburgo que visa demonstrar que este contrato está indissociavelmente ligado ao funcionamento de Hinkley Point C não pode ser acolhida.

598

Em segundo lugar, a República da Áustria alega que os custos ligados à paragem de uma central nuclear, ao armazenamento de resíduos ou ainda às dívidas e ao acompanhamento de tal central constituem despesas habitualmente resultantes do funcionamento corrente de uma central nuclear. Entende que assumir custos de armazenamento de resíduos radioativos não deve, nomeadamente, ser considerado um auxílio ao investimento, mas sim um auxílio ao funcionamento.

599

Esta argumentação deve igualmente ser julgada improcedente. Com efeito, como foi acima exposto nos n.os 593 e 594, os custos ligados à paragem de uma central nuclear, ao armazenamento de resíduos ou ainda às responsabilidades e ao acompanhamento de tal central que a Comissão teve em conta na decisão impugnada (v., n.os 354 a 359, supra) tiveram influência nas taxas de rentabilidade, das quais depende a decisão de investir na construção de Hinkley Point C. Por conseguinte, a consideração desses custos no âmbito da determinação do preço de exercício não é suscetível de pôr em causa a ligação existente entre os pagamentos efetuados em aplicação do contrato diferencial, por um lado, e o objetivo de interesse público prosseguido pelo Reino Unido, designadamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, por outro.

600

Em terceiro lugar, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria de que, no considerando 358 da decisão impugnada, a própria Comissão reconheceu que o contrato diferencial constituía um auxílio ao funcionamento. A este respeito, deve observar‑se que, no considerando 358 da decisão impugnada, que figura no ponto 9.1 da referida decisão, a Comissão apreciou se as medidas em causa eram compatíveis com a regulamentação atual do mercado e afirmou que o contrato diferencial de Hinkley Point C não tinha o estatuto de contrato público ou de procedimento de adjudicação de um contrato, uma vez que se limitava a estabelecer as condições para o exercício da atividade de produção de eletricidade através de tecnologias nucleares. Ora, como foi acima exposto nos n.os 577 a 599, o simples facto de o contrato diferencial ter influência nas condições em que Hinkley Point C produzirá eletricidade nuclear não é suscetível de pôr em causa a sua compatibilidade com o mercado interno.

601

Em quarto lugar, na medida em que a República da Áustria alega que o contrato diferencial incentivará a NNBG a produzir eletricidade mesmo quando os preços forem inferiores aos custos marginais ou forem negativos, basta recordar que este argumento já foi apreciado e julgado improcedente no âmbito da análise ao sexto fundamento (v., n.os 481 a 488, supra) e que não é suscetível de pôr em causa a compatibilidade do contrato diferencial com o artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE.

602

Por conseguinte, há que julgar improcedentes todos os argumentos do Grão‑Ducado do Luxemburgo e da República da Áustria respeitantes ao contrato diferencial.

b)   Quanto aos argumentos relativos ao acordo do secretário de Estado

603

No que respeita ao acordo do secretário de Estado, a República da Áustria limita‑se a alegar que, em caso de encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point, a transferência da NNBG implicaria assumir globalmente a gestão dos materiais irradiados pelos poderes públicos. A este respeito, basta remeter para os n.os 280 a 282 e 354 a 359, supra, dos quais resulta que, na decisão impugnada, a Comissão não autoriza auxílios estatais relativos à assunção global da gestão dos materiais irradiados pelos poderes públicos em tal hipótese. Por conseguinte, este argumento deve igualmente ser julgado improcedente.

c)   Quanto aos argumentos relativos à compensação prevista nas medidas em causa

604

Em apoio do terceiro fundamento, a República da Áustria e o Grão‑Ducado do Luxemburgo invocam argumentos relativos à compensação prevista.

605

Em primeiro lugar, o Grão‑Ducado do Luxemburgo alega que o apoio ao funcionamento tem, com toda a probabilidade, um montante exorbitante. É extremamente provável que os preços do mercado para a eletricidade continuem a baixar e que o auxílio pago ao abrigo do contrato diferencial constitua uma subvenção muito alta durante os 35 anos de produção de energia, bastante superior ao previsto e avaliado aquando da implementação do mecanismo de auxílio.

606

A este respeito, importa assinalar que, em apoio do seu argumento de que o montante do auxílio pago em função do contrato diferencial é exorbitante, o Grão‑Ducado do Luxemburgo limita‑se a invocar que, muito provavelmente, os preços do mercado de eletricidade continuarão a baixar. Ora, esta circunstância não é suscetível de demonstrar por si só o caráter exorbitante dos pagamentos. Com efeito, atendendo ao objetivo de interesse público prosseguido pelo Reino Unido, designadamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear, o montante do auxílio apenas poderia ser considerado exorbitante caso fosse demonstrado que um montante inferior teria sido suficiente para dar origem a uma decisão de investimento nessas novas capacidades. Em contrapartida, o simples facto de o preço pago em função do contrato diferencial poder eventualmente ser inferior ao futuro preço do mercado não permite por si só demonstrar a existência de uma sobrecompensação. Em todo caso, neste contexto, cabe recordar a existência de duas datas previstas para uma revisão dos custos de exploração, a primeira das quais se situará 15 anos e a segunda 25 anos após a data de entrada em serviço do primeiro reator. Estas revisões permitirão aumentar ou diminuir o preço de exercício, com base nos custos de exploração reais conhecidos e nas previsões revistas destes custos, para certas rubricas de custos determinadas no contrato diferencial (v., considerando 31 da decisão impugnada). Por conseguinte, este argumento deve ser julgado improcedente.

607

Em segundo lugar, a República da Áustria alega que os custos de investimento apenas são admissíveis até à parte necessária à realização do interesse comum e que a coexistência de vários auxílios distintos permite concluir que as medidas em causa visam o funcionamento efetivo de Hinkley Point C e não a sua construção.

608

A este respeito, basta recordar que os argumentos relativos à existência de uma sobrecompensação já foram acima apreciados e julgados improcedentes nos n.os 392 a 398 e que, no presente contexto, a República da Áustria não apresenta argumentos suplementares suscetíveis de demonstrar a referida existência. Nomeadamente, este Estado‑Membro não apresenta qualquer argumento circunstanciado suscetível de demonstrar que os pagamentos que serão efetuados em aplicação do contrato diferencial excederão o nível necessário para incentivar os investimentos em novas capacidades de produção de energia nuclear. Neste contexto, importa igualmente recordar que, quando o preço de referência for superior ao preço de exercício, a NNBG terá de pagar a diferença entre estes dois preços ao seu cocontratante.

609

Por conseguinte, os argumentos que visam a compensação prevista nas medidas em causa devem igualmente ser julgados improcedentes.

d)   Quanto ao argumento de que a Comissão devia ter distinguido claramente um auxílio ao funcionamento de um auxílio ao investimento

610

A República da Áustria alega que resulta do n.o 77 do Acórdão de 26 de setembro de 2002, Espanha/Comissão (C‑351/98, EU:C:2002:530), que a Comissão devia ter distinguido claramente um auxílio ao funcionamento de um auxílio ao investimento.

611

Este argumento deve igualmente ser julgado improcedente.

612

Com efeito, como resulta claramente dos n.os 76 e 77 do Acórdão de 26 de setembro de 2002, Espanha/Comissão (C‑351/98, EU:C:2002:530), no processo que deu origem ao referido acórdão, o enquadramento comunitário dos auxílios estatais a favor do ambiente (JO 1994, C 72, p. 3) era aplicável e esse enquadramento distinguia expressamente os auxílios ao investimento, por um lado, dos auxílios ao funcionamento, por outro. Nesta situação, a Comissão, que estava vinculada pelo referido enquadramento, tinha de qualificar o auxílio em causa em função das categorias previstas por tal enquadramento.

613

Todavia, não pode ser deduzido do Acórdão de 26 de setembro de 2002, Espanha/Comissão (C‑351/98, EU:C:2002:530), que a Comissão tinha de se referir a estas categorias fora do âmbito de aplicação do enquadramento comunitário dos auxílios estatais a favor do ambiente.

614

Por conseguinte, este argumento deve igualmente ser julgado improcedente, bem como, assim, todos os argumentos que visam demonstrar que as medidas em causa são incompatíveis com o mercado interno por se tratar de auxílios ao funcionamento.

2.   Quanto ao dever de fundamentação

615

No âmbito do terceiro fundamento e da primeira alegação da terceira parte do nono fundamento, a República da Áustria afirma que a decisão impugnada não está suficientemente fundamentada no que respeita à qualificação das medidas em causa. O facto de a Comissão se ter afastado bruscamente da sua própria prática decisória sem justificação aprofundada representa uma violação do dever de fundamentação. Segundo a República da Áustria, se a Comissão pretendia exercer o seu poder de apreciação de uma forma radicalmente nova, devia ter fornecido uma justificação detalhada a este respeito. Neste contexto, alega igualmente que a Comissão não expôs de forma suficiente as razões pelas quais, após ter qualificado as referidas medidas como auxílios ao funcionamento na decisão de abertura do procedimento formal de investigação, em seguida as qualificou como auxílio ao investimento no âmbito da decisão impugnada.

616

A Comissão, a República Checa, a Hungria, a República da Polónia e o Reino Unido contestam estes argumentos.

617

Em primeiro lugar, cabe recordar que é certo que, nos considerandos 344 a 347 da decisão impugnada, a Comissão concluiu que, em princípio, os auxílios ao funcionamento não preenchiam os requisitos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Ora, neste contexto, fez referência ao ponto 8.1, primeiro parágrafo, da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, no qual mencionou a jurisprudência acima referida no n.o 579. Assim, não se pode inferir dessa consideração que a Comissão entendeu que um auxílio que prosseguia um objetivo de interesse público, que é adequado e necessário para alcançar esse objetivo e que não altera as condições das trocas comerciais de forma contrária ao interesse comum e que, por conseguinte, preenchia os requisitos previstos nessa disposição, não pode ser declarado compatível com o mercado interno em ao abrigo dessa mesma disposição. Por outro lado, nos referidos considerandos, a Comissão afirmou que as medidas em causa deviam permitir que a NNBG se comprometesse a investir na construção de Hinkley Point C, tendo em conta as características e o perfil de risco do projeto e minimizando o montante do auxílio necessário e as medidas adicionais essenciais para incentivar o investimento. Afirmou igualmente que, do ponto de vista da modelização financeira, o valor atual líquido dos pagamentos do preço de exercício podia ser considerado equivalente a um pagamento de montante fixo que permitia à NNBG cobrir os custos da construção.

618

Em segundo lugar, deve observar‑se que a fundamentação da decisão impugnada no que respeita à qualificação das medidas em causa não se limita aos considerandos 344 a 347 da referida decisão e que, no ponto 9 dessa decisão, a Comissão apresentou as razões pelas quais estavam preenchidos os requisitos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), expondo detalhadamente o objetivo prosseguido pelas medidas em causa, designadamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear (v., ponto 9.2 desta decisão), as circunstâncias que tornavam necessária uma intervenção do Estado (v., ponto 9.3 da mesmo decisão) e a proporcionalidade das referidas medidas (v., n.os 9.5 e 9.6 da decisão em questão).

619

Por conseguinte, a Comissão não violou o seu dever de fundamentação no que respeita à qualificação das medidas em causa.

620

Nenhum dos argumentos apresentados pela República da Áustria é suscetível de pôr esta conclusão em causa.

621

Em primeiro lugar, a República da Áustria alega que, uma vez que, nas Orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia 2014‑2020 e na prática decisória anterior, a Comissão consagrou o princípio de que os auxílios ao funcionamento não eram compatíveis com o mercado interno, a referida instituição devia ter exposto ainda mais as razões pelas quais se afastou deste princípio.

622

A este respeito, em primeiro lugar, cabe recordar que não se pode inferir da jurisprudência que os auxílios que preenchem os requisitos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c, TFUE não podem ser considerados compatíveis com o mercado interno, independentemente da sua qualificação como auxílios ao funcionamento ou como auxílios ao investimento (v., n.os 577 a 586, supra).

623

Em segundo lugar, há que julgar improcedentes os argumentos invocados pela República da Áustria relativos à prática anterior da Comissão.

624

Por um lado, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, o seu argumento não tem fundamento nos considerandos 396 e 397 da Decisão da Comissão de 4 de junho de 2008, relativa ao Auxílio Estatal C 41/05 concedido pela Hungria através de contratos de aquisição de energia (JO 2009, L 225, p. 53), que, aliás, eram relativos à aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea a), TFUE e não à aplicação do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. É certo que, no considerando 396 desta decisão, a Comissão considerou que algumas das subvenções em causa neste processo, que apenas seriam pagas após a entrada em funcionamento da central nuclear e que cobririam as despesas correntes, eram auxílios ao funcionamento incompatíveis com o mercado interno. Todavia, como resulta do considerando 397 desta decisão, tratava‑se de auxílios em relação aos quais as autoridades húngaras e as partes interessadas não tinham demonstrado nem a existência de desvantagens regionais relacionadas com regiões específicas, nem o respeito do princípio da proporcionalidade.

625

Por outro lado, na medida em que a República da Áustria alega que a Comissão consagrou nas Orientações relativas a auxílios estatais à proteção ambiental e à energia 2014‑2020 o princípio de que os auxílios ao funcionamento não eram compatíveis com o mercado interno, basta observar que, contrariamente ao que afirma este Estado‑Membro, não resulta das referidas orientações que os auxílios ligados ao funcionamento não podem ser considerados compatíveis com o mercado interno. Pelo contrário, resulta do n.o 3.3.2.1 dessas orientações que a Comissão considera que, sob certas condições, os auxílios que estão ligados ao funcionamento podem ser conformes ao artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Em todo caso, cabe recordar que, na decisão impugnada, a Comissão teve em conta o objetivo de promoção da energia nuclear, que não está abrangido pelos objetivos visados pelas mesmas orientações.

626

Em segundo lugar, a República da Áustria afirma que, no ponto 8.1 da sua decisão de abertura do procedimento formal de investigação, a Comissão considerou que as medidas em causa eram auxílios ao funcionamento que poderiam ser incompatíveis com o mercado interno. Devia ter exposto ainda mais as razões pelas quais já não tinha tais dúvidas no âmbito da decisão impugnada.

627

A este respeito, a título preliminar, cabe recordar que, como resulta do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999, as considerações efetuadas pela Comissão no ponto 8.1 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação são avaliações preliminares. A fundamentação da decisão impugnada não pode, assim, ser considerada insuficiente por não ser idêntica à da decisão de abertura de um procedimento formal de investigação. Por conseguinte, na decisão impugnada, que foi adotada no termo do procedimento formal de investigação, a Comissão não tinha a obrigação de apresentar uma análise que cobrisse todas as considerações que figuram na decisão de abertura do procedimento formal de investigação, à qual a República da Áustria faz referência (v., n.o 569, supra).

628

Por outro lado, cabe recordar que, como já foi acima exposto no n.o 617 e no ponto 8.1 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, a Comissão se limitou a fazer referência à jurisprudência acima mencionada no n.o 579, que visa os auxílios ao funcionamento que, pelas razões acima expostas no n.o 580, não preenchem os requisitos do artigo 107.o, n.o 3, alínea c), TFUE. Com efeito, no momento em que a Comissão adotou a decisão de abertura do procedimento formal de investigação, tinha dúvidas quanto à compatibilidade das medidas em causa com o mercado interno em virtude da referida disposição. Ora, na sequência de uma apreciação aprofundada e das alterações das medidas em causa (ajustamento da taxa de remuneração da garantia de crédito e dos mecanismos relativos à partilha de ganhos) as dúvidas da Comissão puderam ser dissipadas.

629

Por conseguinte, o argumento relativo ao ponto 8.1 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação deve igualmente ser julgado improcedente, bem como, assim, todos os argumentos relativos a uma violação do dever de fundamentação no que respeita à qualificação das medidas em causa.

630

Daqui resulta que o terceiro fundamento deve ser julgado improcedente na íntegra, assim como o argumento invocado no âmbito do quarto fundamento, que é relativo ao facto de as medidas em causa constituírem auxílios ao funcionamento incompatíveis com o mercado interno (v., n.o 125, supra), e a primeira alegação da terceira parte do nono fundamento.

H. Quanto ao sétimo fundamento, relativo, nomeadamente, às considerações da Comissão sobre a compatibilidade das medidas em causa com a regulamentação atual do mercado

631

O presente fundamento é relativo às considerações da Comissão que figuram nos considerandos 348 a 365 da decisão impugnada, nas quais a Comissão analisou se as medidas em causa eram compatíveis com a regulamentação atual do mercado.

632

Nos considerandos 350 a 358 da decisão impugnada, a Comissão afirmou, nomeadamente, que as regras de adjudicação de contratos públicos que constam da Diretiva 2004/17, relativa à coordenação dos processos de adjudicação de contratos nos setores da água, da energia, dos transportes e dos serviços postais, e da Diretiva 2004/18, relativa à coordenação dos processos de adjudicação dos contratos de empreitada de obras públicas, dos contratos públicos de fornecimento e dos contratos públicos de serviços, não eram aplicáveis às medidas em causa, uma vez que não envolviam qualquer adjudicação de contratos de fornecimento, obras ou serviços. Com base nas informações disponíveis, não era possível concluir que o contrato diferencial respeitava à aquisição de obras, serviços ou fornecimentos e que tinha, assim, o estatuto de concessão ou de contrato público. Segundo a Comissão, esse contrato não estabelecia qualquer exigência específica relativamente ao fornecimento, à entidade adjudicante ou a terceiros, de qualquer tipo de serviços, bens ou obras. As medidas em causa não previam obrigações mutuamente vinculativas com força executiva perante um tribunal. Além disso, não existia seletividade quanto ao número de produtores de eletricidade nuclear que podiam celebrar contratos diferenciais para além da que resultava do número limitado de locais disponíveis para a construção de centrais nucleares.

633

Nos considerandos 359 a 364 da decisão impugnada, a Comissão afirmou que o artigo 8.o da Diretiva 2009/72/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade e que revoga a Diretiva 2003/54/CE (JO 2009, L 211, p. 55) não tinha sido violado. Este artigo não exige o recurso a um procedimento de adjudicação por concurso mas estabelece que pode ser seguido qualquer procedimento equivalente em termos de transparência e não discriminação, com base em critérios publicados. O procedimento de seleção utilizado pelo Reino Unido para identificar um contratante pronto a investir numa nova capacidade de produção de energia nuclear e a concluir um contrato diferencial assentou num quadro claro, transparente e não discriminatório, que pode ser considerado equivalente a um procedimento de adjudicação por concurso em matéria de transparência e de não discriminação.

634

A República da Áustria entende que estas considerações são erradas.

635

Numa primeira fase, há que apreciar os argumentos da República da Áustria relativos ao facto de que o Reino Unido não abriu concurso para o projeto de Hinkley Point C. Numa segunda fase, será apreciado o argumento da República da Áustria de que o procedimento seguido pelo Reino Unido era discriminatório.

1.   Quanto aos argumentos que visam demonstrar que o Reino Unido devia ter aberto um concurso para o projeto de Hinkley Point C

636

A República da Áustria alega que, por força das Diretivas 2004/17 e 2004/18, do artigo 8.o da Diretiva 2009/72 e dos princípios da transparência, da igualdade de tratamento e da não discriminação inerentes ao Tratado FUE, o Reino Unido deveria ter aberto um procedimento de concurso público para o projeto de Hinkley Point C. Estas regras estão indissociavelmente ligadas ao objeto das medidas em causa e a sua violação obriga o Tribunal Geral a anular a decisão impugnada.

637

A Comissão, a Hungria e o Reino Unido contestam estes argumentos. Neste contexto, a Comissão afirma, nomeadamente, que a legalidade das medidas em causa não depende do respeito das disposições sobre a adjudicação de contratos públicos.

638

Numa primeira fase, serão apreciados os argumentos relativos a uma violação das Diretivas 2004/17 e 2004/18. Numa segunda fase, serão apreciados os argumentos relativos a uma violação do artigo 8.o da Diretiva 2009/72 e dos princípios da transparência, da igualdade de tratamento e da não discriminação inerentes ao Tratado FUE.

a)   Quanto aos argumentos relativos a uma violação das Diretivas 2004/17 e 2004/18

639

A República da Áustria alega que, nas circunstâncias do caso em apreço, por força das Diretivas 2004/17 e 2004/18, o Reino Unido era obrigado a abrir concurso para o projeto de Hinkley Point C. O projeto em causa constituía um contrato, um contrato público, ou, pelo menos, uma concessão na aceção das referidas diretivas. Entende que esse projeto deveria ter sido apreciado na íntegra, tendo em conta todas as fases previstas e a sua finalidade. Tal apreciação teria revelado que as medidas em causa constituíam um compromisso mútuo vinculativo relativamente ao fornecimento de uma prestação. Afirma que a construção de Hinkley Point C e a subsequente injeção de eletricidade na rede pública servem para cobrir uma necessidade concreta do Reino Unido enquanto entidade adjudicante. A contrapartida do Reino Unido seria o auxílio acordado. A República da Áustria alega que não dispõe de elementos suficientes para apreciar se as medidas em causa deviam ser qualificadas de contrato ou de concessão.

640

A Comissão, a Hungria e o Reino Unido contestam estes argumentos. Neste contexto, a Comissão alega, nomeadamente, que, de acordo com a sua Decisão 2006/211/CE, de 8 de março de 2006, que estabelece que o n.o 1 do artigo 30.o da Diretiva 2004/17 se aplica à produção de eletricidade em Inglaterra, na Escócia e no País de Gales (JO 2006, L 76, p. 6), a referida diretiva não é aplicável às medidas em causa.

641

Numa primeira fase, há que analisar os argumentos que visam demonstrar a existência de um contrato na aceção da Diretiva 2004/17 ou de um contrato público na aceção da Diretiva 2004/18.

642

A título preliminar, cabe recordar que, nos termos do artigo 1.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2004/17, os contratos de fornecimento, de empreitada de obras e de serviços são contratos a título oneroso, celebrados por escrito entre uma ou mais entidades adjudicantes e um ou mais empreiteiros, fornecedores ou prestadores de serviços. Nos termos do artigo 1.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2004/18, os contratos públicos são contratos a título oneroso, celebrados por escrito entre um ou mais operadores económicos e uma ou mais entidades adjudicantes, que têm por objeto a execução de obras, o fornecimento de produtos ou a prestação de serviços.

643

O artigo 1.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2004/17 e o artigo 1.o, n.o 2, alínea b), da Diretiva 2004/18 precisam que os contratos de empreitada de obras (Diretiva 2004/17) e os contratos de empreitada de obras públicas (Diretiva 2004/18) são contratos que têm por objeto quer a execução, quer conjuntamente a conceção e a execução, quer ainda a realização, por qualquer meio, de trabalhos relacionados com certas atividades determinadas, ou de uma obra que satisfaça as necessidades especificadas pela entidade adjudicante [Diretiva 2004/17 e Diretiva 2004/18].

644

Nos termos do artigo 1.o, n.o 2, alínea c), primeiro parágrafo, da Diretiva 2004/17 e do artigo 1.o, n.o 2, alínea c), primeiro parágrafo, da Diretiva 2004/18, os contratos de fornecimento (Diretiva 2004/17) e os contratos públicos de fornecimento (Diretiva 2004/18) têm por objeto a compra, a locação‑financeira, a locação ou a locação‑venda, com ou sem opção de compra, de produtos.

645

O artigo 1.o, n.o 2, alínea d), primeiro parágrafo, da Diretiva 2004/17 e o artigo 1.o, n.o 2, alínea d), primeiro parágrafo, da Diretiva 2004/18 precisam que os contratos de serviços (Diretiva 2004/17) e os contratos públicos de serviços (Diretiva 2004/18) são contratos que não os contratos de empreitada de obras ou de fornecimento (Diretiva 2004/17) nem os contratos de empreitada de obras públicas ou de fornecimento (Diretiva 2004/18).

646

É à luz destas disposições que importa apreciar os argumentos da República da Áustria que visam demonstrar que as medidas em causa deviam ter sido qualificadas como contrato na aceção da Diretiva 2004/17 ou como contrato público na aceção da Diretiva 2004/18.

647

Neste contexto, em primeiro lugar, importa assinalar que a garantia de crédito e o acordo do secretário de Estado não constituem nem um contrato na aceção do artigo 1.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2004/17 nem um contrato público na aceção do artigo 1.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2004/18.

648

Em segundo lugar, há que apreciar se a Comissão devia ter qualificado o contrato diferencial como contrato na aceção do artigo 1.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2004/17 ou como contrato público na aceção do artigo 1.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2004/18.

649

A este respeito, importa assinalar que, como resulta, nomeadamente, dos considerandos 219, 312, 313 e 356 da decisão impugnada, o contrato diferencial não permite que o Reino Unido exija à NNBG nem a construção de Hinkley Point C nem o fornecimento da eletricidade. O contrato diferencial não estabelece qualquer exigência específica no que respeita às obras a efetuar pela NNBG nem no que respeita à eletricidade a fornecer. No caso de a NNBG não concluir a construção da referida unidade ou não produzir eletricidade, o Reino Unido também não tem direito de indemnização por parte da NNBG. Este Estado‑Membro poderá, no entanto, rescindir o contrato diferencial unilateralmente se a construção não for concluída na data de vencimento.

650

Tendo em conta estas características do contrato diferencial, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, não pode considerar‑se que visa cobrir uma necessidade concreta do Reino Unido enquanto entidade adjudicante. Pelo contrário, o objeto do contrato diferencial é a concessão de uma subvenção, e, através dessa subvenção, o Reino Unido limita‑se a incentivar a NNBG e os seus investidores a realizar o objetivo de interesse público visado por este Estado‑Membro, designadamente, a criação de novas capacidades de produção de energia nuclear.

651

Daqui resulta que o contrato diferencial não prevê qualquer obrigação vinculativa para a NNBG relativa à execução das obras, ao fornecimento de produtos ou à prestação de serviços na aceção da Diretiva 2004/17 ou da Diretiva 2004/18. Por conseguinte, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria relativo ao facto de que as medidas em causa constituem um contrato na aceção do artigo 1.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2004/17 ou um contrato público na aceção do artigo 1.o, n.o 2, alínea a), da Diretiva 2004/18.

652

Numa segunda fase, há que apreciar o argumento da República da Áustria de que a Comissão ignorou que as medidas em causa constituíam uma concessão de obras na aceção da Diretiva 2004/17 ou uma concessão de obras públicas na aceção da Diretiva 2004/18.

653

A este respeito, cabe recordar que, nos termos do artigo 1.o, n.o 3, alínea a), da Diretiva 2004/17 e do artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 2004/18, a concessão de obras (Diretiva 2004/17) e a concessão de obras públicas (Diretiva 2004/18) são contratos com as mesmas características que um contrato de empreitada de obras (Diretiva 2004/17) ou que um contrato de empreitada de obras públicas (Diretiva 2004/18), com a exceção de a contrapartida das obras a efetuar consistir unicamente no direito de exploração da obra ou nesse direito acompanhado de um pagamento.

654

Nos termos do artigo 1.o, n.o 3, alínea b), da Diretiva 2004/17 e do artigo 1.o, n.o 4, da Diretiva 2004/18, a concessão de serviços é um contrato com as mesmas características que um contrato de serviços (Diretiva 2004/17) ou que um contrato público de serviços (Diretiva 2004/18), com a exceção de a contrapartida dos serviços a prestar consistir unicamente no direito de exploração do serviço ou quer nesse direito acompanhado de um pagamento.

655

É à luz destas disposições que devem ser apreciados os argumentos da República da Áustria que visam demonstrar que as medidas em causa deviam ter sido qualificadas de concessão de obras na aceção da Diretiva 2004/17 ou de concessão de obras públicas na aceção da Diretiva 2004/18.

656

Neste contexto, em primeiro lugar, importa assinalar que a garantia de crédito e o acordo do secretário de Estado não constituem nem uma concessão de obras na aceção do artigo 1.o, n.o 3, alínea a), da Diretiva 2004/17 nem uma concessão de obras públicas na aceção do artigo 1.o, n.o 3, da Diretiva 2004/18.

657

Em segundo lugar, deve‑se verificar se a Comissão devia ter qualificado o contrato diferencial como concessão de obras na aceção da Diretiva 2004/17 ou como concessão de obras públicas na aceção da Diretiva 2004/18.

658

Nos termos do artigo 1.o, n.o 3, alínea b), da Diretiva 2004/17 e do artigo 1.o, n.o 4, da Diretiva 2004/18, os contratos e os contratos públicos, por um lado, e as concessões, por outro, distinguem‑se unicamente no que respeita à contrapartida que é devida ao proponente. Ora, como resulta das considerações acima desenvolvidas nos n.os 648 a 650, é, nomeadamente, por o contrato diferencial não prever a obrigação de a NNBG executar as obras, fornecer os produtos ou prestar os serviços que o referido contrato não pode ser qualificado como contrato ou como contrato público. Daqui resulta que o referido contrato também não pode ser qualificado como concessão de obras na aceção da Diretiva 2004/17 ou como concessão de obras públicas na aceção da Diretiva 2004/18.

659

De resto, esta interpretação é confirmada pelo considerando 12 da Diretiva 2014/23/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de fevereiro de 2014, relativa à adjudicação de contratos de concessão (JO 2014, L 94, p. 1), do qual resulta que o simples financiamento, em particular através de subvenções, não constitui uma concessão na aceção desta diretiva.

660

Por conseguinte, há que concluir que a Comissão não cometeu um erro ao considerar que as medidas em causa não constituíam nem um contrato nem uma concessão de obras na aceção da Diretiva 2004/17 nem um contrato público nem uma concessão de obras públicas na aceção da Diretiva 2004/18.

661

Nenhum dos argumentos apresentados pela República da Áustria é suscetível de pôr em causa esta conclusão.

662

Em primeiro lugar, a República da Áustria alega que, no considerando 312 da decisão impugnada, a Comissão concluiu pela existência de obrigações contratuais da NNBG e que tais obrigações constituíam um elemento típico de um contrato público.

663

A este respeito, importa assinalar que é certo que no considerando 312 da decisão impugnada, a Comissão afirmou que o «[contrato diferencial] parec[ia] fornecer uma série de disposições rigorosas que incentivam a NNBG a cumprir as suas obrigações de acordo com o contrato». Todavia, no referido considerando e no considerando 313 da referida decisão, a Comissão concluiu igualmente que a NNBG não estava obrigada nem a construir Hinkley Point C nem a fornecer eletricidade. Por conseguinte, as obrigações contratuais que a Comissão refere no considerando 312 desta decisão não justificam a qualificação do contrato diferencial como contrato ou como concessão de obras na aceção da Diretiva 2004/17 ou como contrato público ou como concessão de obras públicas na aceção da Diretiva 2004/18.

664

Contrariamente ao que afirma a República da Áustria, também não se pode deduzir da consideração da Comissão que figura no considerando 312 da decisão impugnada, segundo a qual as disposições contratuais previstas no contrato diferencial são «as obrigações contratuais típicas que quaisquer partes contratuais tentariam incluir num acordo semelhante», que se tratava de obrigações suscetíveis de justificar a qualificação do contrato diferencial como contrato, contrato ou concessão de obras na aceção da Diretiva 2004/17 ou como contrato público ou como concessão de obras públicas na aceção da Diretiva 2004/18. Com efeito, resulta claramente deste considerando e do seu contexto que, ao referir um «acordo semelhante», a Comissão não visava a conclusão de um acordo relativo a um contrato, contrato público ou concessão, mas a conclusão de um acordo que previsse um incentivo, sob a forma de subvenção, para realização de um objetivo de interesse público. Trata‑se, assim, de obrigações que constam habitualmente de convenções de subvenção.

665

Por conseguinte, o argumento da República da Áustria relativo ao considerando 312 da decisão impugnada deve ser julgado improcedente.

666

Em segundo lugar, a República da Áustria alega que a Comissão não teve suficientemente em conta a circunstância de que seria efetivamente impossível a NNBG renunciar aos contratos em razão do montante potencial dos custos de investimento que seriam perdidos. A possibilidade teórica de uma rutura de contrato unilateral não é suscetível de excluir totalmente a aplicação das Diretivas 2004/17 e 2004/18.

667

A este respeito, importa assinalar que este argumento não é suscetível de pôr em causa a consideração acima referida no n.o 649, segundo a qual o contrato diferencial não estabelece qualquer exigência específica, nem no que respeita às obras a efetuar pela NNBG, nem no que respeita à eletricidade que deve ser produzida ou fornecida por esta. Neste contexto, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria de que se pode inferir do considerando 13 da decisão impugnada que a NNBG será obrigada a manter um nível mínimo de desempenho predeterminado, e de que, mesmo que o facto de não atingir esse nível mínimo apenas resulte numa perda dos auxílios, isto equivaleria, atendendo aos montantes consideráveis que foram investidos, a uma obrigação de construir e de explorar Hinkley Point C. Com efeito, resulta claramente deste considerando e do considerando 313 da referida decisão que a NNBG não está obrigada a assegurar um nível de produção predeterminado, uma vez que estes considerandos preveem unicamente que, se não atingir o fator de carga de 91 %, não conseguirá atingir o nível de receitas que está previsto receber do projeto. Assim, não existe qualquer obrigação contratual de a NNBG respeitar este fator de carga.

668

Ora, na falta de exigências contratuais específicas relativas às obras a efetuar pela NNBG ou à eletricidade que devia produzir ou fornecer, não se justificava a aplicação das disposições da Diretiva 2004/17 e da Diretiva 2004/18.

669

Em todo caso, na falta de uma obrigação contratual de execução de obras, de fornecimento de produtos ou de prestação de serviços na aceção da Diretiva 2004/17 ou da Diretiva 2004/18, não se pode excluir a possibilidade de, apesar dos incentivos económicos destinados a que a NNBG construísse e explorasse Hinkley Point C, essa empresa decidir não a concluir ou não a explorar, por razões económicas.

670

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria de que, efetivamente, a NNBG estava obrigada a assegurar um nível de produção.

671

Em terceiro lugar, a República da Áustria alega que as regras que regulam os contratos públicos não podem continuar a ser inaplicadas apenas por o projeto de construção e de exploração de Hinkley Point C ter sido concebido e definido de forma determinante pela EDF.

672

Este argumento deve ser julgado improcedente.

673

A este respeito, basta recordar que a Comissão não excluiu a aplicação das Diretivas 2004/17 e 2004/18 devido ao facto de o projeto de construção e de exploração de Hinkley Point C ter sido definido de forma determinante pela EDF, tendo‑as excluído, sim, por o contrato diferencial não prever uma obrigação contratual de execução de obras, de fornecimento de produtos ou de prestação de serviços na aceção das referidas diretivas.

674

Em quarto lugar, no que respeita à afirmação da República da Áustria de que não dispõe de informações suficientes para determinar se as medidas em causa devem ser qualificadas como contrato, contrato público ou concessão, basta observar que a República da Áustria dispõe de informações suficientes para se pronunciar sobre a questão de saber se o contrato diferencial prevê uma obrigação de a NNBG executar obras, fornecer produtos ou prestar serviços e que, uma vez que tal obrigação não existe, em todo caso, pelas razões acima expostas nos n.os 639 a 660, as medidas em causa não podem ser qualificadas de contrato nem de concessão de obras na aceção da Diretiva 2004/17 nem de contrato público nem de concessão de obras públicas na aceção da Diretiva 2004/18.

675

Em quinto lugar, a República da Áustria alega que a Comissão devia ter apreciado o projeto no seu todo, tendo em conta a complexidade do dispositivo contratual que envolve a construção e a exploração de Hinkley Point C. Este argumento deve ser julgado improcedente. Com efeito, na falta de uma obrigação de a NNBG executar obras, fornecer produtos ou prestar serviços, mesmo uma visão de conjunto das medidas em causa não teria permitido considerar que deviam ter sido qualificadas como contrato, contrato público ou como concessão na aceção da Diretiva 2004/17 ou da Diretiva 2004/18.

676

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedentes os argumentos da República da Áustria que visam demonstrar que a Comissão devia ter qualificado as medidas em causa como contrato ou como concessão de obras na aceção da Diretiva 2014/17 ou como contrato público ou como concessão de obras públicas na aceção da Diretiva 2014/18, sem que seja necessário apreciar o argumento da Comissão segundo o qual a Diretiva 2004/17 não é aplicável às referidas medidas, por força da Decisão 2006/211.

b)   Quanto aos argumentos relativos a uma violação do artigo 8.o da Diretiva 2009/72 e dos princípios da igualdade de tratamento, da não discriminação e da transparência inerentes ao Tratado FUE

677

A República da Áustria alega que o objeto da prestação era a construção e a exploração de Hinkley Point C, tendo, como contrapartida, o apoio financeiro do Reino Unido. Por conseguinte, por força do artigo 8.o da Diretiva 2009/72, que estabelece regras comuns para o mercado interno da eletricidade, e dos princípios da igualdade de tratamento, da não discriminação e da transparência inerentes ao Tratado FUE, o Reino Unido devia ter aberto concurso para o projeto de construção e de exploração de Hinkley Point C, formulado de modo claro, preciso e inequívoco, que incluísse todas as informações precisas relativas à tramitação do procedimento e garantisse que todos os proponentes dispunham das mesmas oportunidades. Este procedimento devia ter sido aberto, uma vez que existia um interesse transfronteiriço, mesmo que a autorização de exercer uma atividade não obrigasse o cessionário a exercer a atividade cedida. A consideração da Comissão, que figura no considerando 357 da decisão impugnada, segundo a qual o sistema do contrato diferencial seria aberto a todas as potenciais partes interessadas e, por conseguinte, não seria seletiva, não convence. A escolha da NNBG teria tido como consequência a exclusão de outros operadores da construção e da exploração de Hinkley Point C.

678

A Comissão, a Hungria e o Reino Unido contestam estes argumentos.

679

A título preliminar, importa assinalar que, com estes argumentos, a República da Áustria não contesta que existiu um procedimento de seleção. Limita‑se a alegar que o procedimento organizado pelo Reino Unido (v., n.o 633, supra) não era suficiente, uma vez que não se tratava de um concurso para a construção e a exploração de Hinkley Point C.

680

Em primeiro lugar, importa apreciar o argumento da República da Áustria relativo a uma violação do artigo 8.o da Diretiva 2009/72.

681

A este respeito, cabe recordar que, nos termos do artigo 8.o, n.o 1, primeiro período, da Diretiva 2009/72, os Estados‑Membros devem, no interesse da segurança do fornecimento, garantir a possibilidade de criar novas capacidades ou medidas de eficiência energética/gestão da procura através da abertura de concursos ou de qualquer outro procedimento equivalente em termos de transparência e não discriminação, com base em critérios publicados.

682

Há que observar que o artigo 8.o, n.o 1, primeiro período, da Diretiva 2009/72 não exige necessariamente que um Estado‑Membro abra um concurso, permitindo‑lhe igualmente seguir outro procedimento, se tal for efetuado com base de critérios publicados e se for equivalente a um concurso em matéria de transparência e de não discriminação. Assim, este artigo não se opõe a que, em vez de abrir um concurso, um Estado‑Membro opte pelo instrumento que constitui uma subvenção que visa incentivar as empresas a realizar um objetivo de interesse público determinado.

683

Deste modo, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, o artigo 8.o, n.o 1, primeiro período, da Diretiva 2009/72 não exige que a construção e a exploração de Hinkley Point C sejam necessariamente objeto de um concurso.

684

Por conseguinte, o argumento da República da Áustria relativo a uma violação do artigo 8.o da Diretiva 2009/72 deve ser julgado improcedente.

685

Em segundo lugar, há que apreciar o argumento da República da Áustria relativo a uma violação dos princípios da igualdade de tratamento, da não discriminação e da transparência inerentes ao Tratado FUE.

686

Neste contexto, há que recordar que os princípios da igualdade de tratamento, da não discriminação e da transparência são aplicáveis aos contratos públicos, às concessões, às autorizações exclusivas e às licenças exclusivas concedidas por uma autoridade pública e em relação aos quais o legislador da União não precisou regras especiais. Com efeito, quando tais contratos ou tais direitos são atribuídos, os princípios da igualdade de tratamento, da transparência e da não discriminação exigem que os Estados‑Membros garantam um grau de publicidade adequado que permita a abertura do procedimento de seleção à concorrência, bem como o controlo da imparcialidade dos procedimentos de adjudicação (v., neste sentido, Acórdãos de 7 de dezembro de 2000, Telaustria e Telefonadress, C‑324/98, EU:C:2000:669, n.o 62; de 3 de junho de 2010, Sporting Exchange, C‑203/08, EU:C:2010:307, n.o 41; e de 14 de novembro de 2013, Belgacom, C‑221/12, EU:C:2013:736, n.o 28).

687

Todavia, neste contexto, há que lembrar que os princípios da igualdade de tratamento, da não discriminação e da transparência não exigem necessariamente que seja aberto concurso para um determinado projeto (v., neste sentido, Acórdão de 3 de junho de 2010, Sporting Exchange, C‑203/08, EU:C:2010:307, n.o 41). Deste modo, não limitam o direito de um Estado‑Membro escolher entre um contrato público e a concessão de uma subvenção que visa incentivar as empresas a realizar um objetivo de interesse público determinado.

688

Assim, há que julgar improcedente o argumento da República da Áustria relativo a uma violação dos princípios da igualdade de tratamento, da não discriminação e da transparência, sem que seja necessário apreciar a questão de saber se as medidas em causa podem ser equiparadas a uma autorização ou a uma licença exclusiva na aceção da jurisprudência acima referida no n.o 686.

689

Por conseguinte, improcedem todos os argumentos da República da Áustria que visam demonstrar que o Reino Unido devia ter aberto concurso para o projeto de Hinkley Point C, sem que seja necessário apreciar a questão de saber se uma violação das Diretivas 2004/17 e 2004/18, do artigo 8.o da Diretiva 2009/72 ou dos princípios da transparência, da igualdade de tratamento e da não discriminação inerentes ao Tratado FUE poderia ter posto em causa a legalidade da decisão impugnada.

2.   Quanto ao argumento relativo ao caráter discriminatório do contrato diferencial

690

No âmbito do sétimo fundamento, a República da Áustria invoca um argumento relativo ao considerando 549 da decisão impugnada. No referido considerando, a Comissão afirmou, no que se refere à conformidade das medidas em causa com os artigos 30.o e 110.o TFUE, que, enquanto o contrato diferencial não fosse disponibilizado a produtores de eletricidade situados fora da Grã‑Bretanha, o Reino Unido se tinha obrigado a ajustar a forma como eram calculadas as dívidas dos fornecedores de eletricidade no respeitante aos pagamentos do contrato diferencial de modo a que a eletricidade elegível gerada através de energia nuclear na União, mas não na Grã‑Bretanha e fornecida a clientes na Grã‑Bretanha, não fosse incluída nas quotas de mercado dos fornecedores. Neste contexto, a Comissão afirmou que o Reino Unido iria eliminar essa isenção a partir do momento em que os produtores de outros Estados‑Membros se pudessem candidatar a um contrato diferencial.

691

A República da Áustria alega que resulta do considerando 549 da decisão impugnada que o sistema de contratos diferenciais era discriminatório, uma vez que não estava aberto aos produtores de eletricidade situados fora do Reino Unido.

692

A Comissão contesta este argumento.

693

A este respeito, em primeiro lugar, importa assinalar que, como resulta dos considerandos 359 a 364 da decisão impugnada, o procedimento de seleção que o Reino Unido seguiu para identificar o contratante pronto a investir numa nova capacidade nuclear no Reino Unido estava aberto aos criadores, produtores e investidores de outros Estados‑Membros. Assim, não existia discriminação em função da nacionalidade a este respeito.

694

Em segundo lugar, na medida em que a República da Áustria pretende alegar que o instrumento que constitui o contrato diferencial ainda não estava aberto aos produtores de eletricidade situados fora da Grã‑Bretanha, importa igualmente julgar improcedente o referido argumento. A este respeito, deve recordar‑se que a construção e a exploração de uma central nuclear visa a produção de energia de base com vista a garantir a segurança de fornecimento. Nestas circunstâncias, o Reino Unido não pode ser criticado por exigir que tal central seja construída na Grã‑Bretanha, a fim de evitar que seja limitada pelas capacidades físicas das interligações.

695

Por conseguinte, todos os argumentos desenvolvidos no âmbito do sétimo fundamento devem ser julgados improcedentes.

I. Quanto ao décimo fundamento, relativo a uma violação do direito de apresentar observações nos termos do artigo 108.o, n.o 2, TFUE e do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999

696

A República da Áustria alega que a Comissão violou o artigo 108.o, n.o 2, TFUE e o artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999, que impõem à Comissão o dever de dar aos interessados a possibilidade de apresentarem as suas observações. Os Estados‑Membros dispõem, assim, de um direito subjetivo de serem ouvidos no âmbito do procedimento formal de investigação. Dispõem do direito de ser associados ao procedimento administrativo numa medida adequada tendo em conta as circunstâncias do caso em apreço. A decisão de abertura deve permitir que as partes interessadas participem de forma eficaz no procedimento formal de investigação, no qual têm a possibilidade de apresentar os seus argumentos.

697

A República da Áustria alega que, atendendo ao facto de que, no momento em que pôde apresentar as suas observações, o montante do auxílio e as suas modalidades concretas ainda não tinham sido fixadas, não estava em condições de se pronunciar de modo suficiente e adequado sobre as diferentes medidas concretamente previstas. Em seu entender, se dispusesse de informações suplementares e exatas quanto à extensão e às modalidades das medidas previstas, podia ter apresentado argumentos suplementares e sólidos sobre as dúvidas que as referidas medidas lhe suscitavam.

698

A Comissão e a Hungria afirmam que estes argumentos devem ser julgados improcedentes. A Comissão alega, nomeadamente, que a República da Áustria se limita a fazer referência à decisão impugnada, e não à decisão de abertura do procedimento formal de investigação.

699

A este respeito cabe recordar que, nos termos do artigo 108.o, n.o 2, primeiro parágrafo, TFUE, quando a Comissão decide dar início a um procedimento formal de investigação, tem de notificar os interessados para apresentarem as suas observações.

700

Como resulta da jurisprudência, o artigo 108.o, n.o 2, primeiro parágrafo, TFUE tem como objetivo, por um lado, obrigar a Comissão a proceder de modo a que todas as pessoas potencialmente interessadas sejam avisadas e tenham oportunidade de fazer valer os seus argumentos e, por outro, permitir à Comissão ficar completamente esclarecida sobre a totalidade dos dados do caso antes de tomar a sua decisão (Acórdão de 25 de junho de 1998, British Airways e o./Comissão, T‑371/94 e T‑394/94, EU:T:1998:140, n.o 58).

701

Neste contexto, cabe recordar que a jurisprudência reconhece às partes interessadas essencialmente o papel de fontes de informação para a Comissão no âmbito do procedimento administrativo iniciado ao abrigo do artigo 108.o, n.o 2, TFUE. Daí resulta que os interessados, longe de poderem invocar os direitos de defesa reconhecidos às pessoas contra quem está aberto um procedimento, gozam exclusivamente do direito a ser associados ao procedimento administrativo na medida adequada, tendo em conta as circunstâncias do caso concreto (Acórdãos de 25 de junho de 1998, British Airways e o./Comissão, T‑371/94 e T‑394/94, EU:T:1998:140, n.os 59 e 60; e de 30 de novembro de 2009, França e France Télécom/Comissão, T‑427/04 e T‑17/05, EU:T:2009:474, n.o 147).

702

Com efeito, no procedimento relativo à fiscalização dos auxílios de Estado, as partes interessadas têm apenas a faculdade de enviar à Comissão todas as informações destinadas a esclarecer esta instituição na sua ação futura, não podendo exigir a participação num debate contraditório com a Comissão, como o que é aberto ao referido Estado‑Membro (Acórdão de 15 de novembro de 2011, Comissão e Espanha/Government of Gibraltar e Reino Unido, C‑106/09 P e C‑107/09 P, EU:C:2011:732, n.o 181).

703

Além disso, resulta da jurisprudência que a Comissão não pode ser obrigada a apresentar uma análise cabal da medida em causa na sua comunicação relativa à abertura do procedimento formal de investigação. Em contrapartida, é necessário que a Comissão defina suficientemente o âmbito da sua investigação, para não esvaziar de sentido o direito dos interessados a apresentarem as suas observações (Acórdão de 30 de novembro de 2009, France e France Télécom/Comissão, T‑427/04 e T‑17/05, EU:T:2009:474, n.o 148).

704

Por sua vez, o artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999 sob a epígrafe «Procedimento formal de investigação» prevê que a decisão de dar início a um procedimento formal de investigação resumirá os elementos relevantes em matéria de facto e de direito, incluirá uma apreciação preliminar da Comissão quanto à natureza de auxílio da medida proposta, indicará os elementos que suscitam dúvidas quanto à sua compatibilidade com o mercado interno e incluirá um convite ao Estado‑Membro em causa e a outras partes interessadas para apresentarem as suas observações num prazo fixado.

705

A decisão de abertura deve dar às partes interessadas a oportunidade de participarem eficazmente no procedimento formal de investigação, no qual terão a possibilidade de apresentar os seus argumentos. Para o efeito, basta que as partes interessadas conheçam o raciocínio que levou a Comissão a considerar provisoriamente que a medida em causa podia constituir um auxílio novo incompatível com o mercado interno (Acórdão de 12 de maio de 2011, Région Nord‑Pas‑de‑Calais e Communauté d’agglomération du Douaisis/Comissão, T‑267/08 e T‑279/08, EU:T:2011:209, n.o 81).

706

Contudo, o direito de informação que assiste aos interessados não excede o direito de ser ouvido pela Comissão. Em especial, não pode ser estendido ao direito geral de se pronunciar sobre todos as questões potencialmente capitais suscitadas no decurso do procedimento formal de investigação (Acórdão de 30 de novembro de 2009, France e France Télécom/Comissão, T‑427/04 e T‑17/05, EU:T:2009:474, n.o 149).

707

É à luz do exposto que se devem apreciar os argumentos apresentados pela República da Áustria de que a Comissão não respeitou o seu direito de apresentar observações, uma vez que, na decisão de abertura do procedimento formal de investigação, não tinha determinado suficientemente as medidas em causa.

708

A título preliminar, importa assinalar que, em apoio do presente fundamento, a República da Áustria remete para os considerandos 16, 73 e 551 da decisão impugnada. Ora, por si só, a remissão para as considerações que figuram na decisão impugnada não é suscetível de demonstrar que a Comissão não respeitou o direito da República de a Áustria apresentar observações. Com efeito, o artigo 108.o, n.o 2, TFUE e o artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999 são relativos ao direito de os interessados apresentarem as suas observações no decurso do procedimento administrativo, pelo que a questão decisiva no presente contexto consiste em saber se a decisão de abertura do procedimento formal de investigação incluía elementos suficientes. Em contrapartida, a questão de saber se a decisão impugnada, que foi adotada na sequência do procedimento administrativo, inclui elementos suficientes, não é diretamente relevante no presente contexto.

709

Todavia, resulta de forma suficientemente clara dos argumentos da República da Áustria que este Estado‑Membro alega, em substância, que a decisão de abertura do procedimento formal de investigação não incluía elementos suficientes para lhe permitir exercer o seu direito de apresentar observações de forma útil e que esta falta de elementos se refletia igualmente na decisão impugnada.

710

Em primeiro lugar, a República da Áustria invoca argumentos que visam demonstrar que a decisão de abertura do procedimento formal de investigação não incluía informações suficientes para lhe permitir exercer o seu direito de apresentar as suas observações de forma efetiva.

711

Em primeiro lugar, a República da Áustria alega que certas questões relativas ao contrato diferencial continuavam suspensas. Assim, a natureza do mecanismo do contrato diferencial e, em particular, os critérios de cálculo do diferencial, nomeadamente, o preço de exercício, ainda não tinham sido fixados.

712

A este respeito, antes de mais, importa assinalar que a Comissão descreveu o contrato diferencial nos considerandos 43 a 49 e 53 a 89 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação. Como resulta do considerando 67 da referida decisão, antes da notificação das medidas em causa, o Reino Unido e a EDF acordaram os elementos essenciais deste, nomeadamente, no que respeita ao preço de exercício, à duração do contrato e à taxa de rentabilidade interna. Estes elementos foram comunicados às partes interessadas. Com efeito, resulta do considerando 70 desta decisão que o preço de exercício previsto pelo Reino Unido seria fixado em 92,50 GBP por MWh e resulta do considerando 78 da mesma decisão que estava previsto os pagamentos durarem 35 anos. No considerando 71 da decisão em questão, é indicado que a taxa de rentabilidade interna após imposto, com base na qual o défice de financiamento foi calculado, correspondia a uma margem compreendida entre 9,75 e 10,15 % e, no âmbito da comunicação da decisão em causa no Jornal Oficial, é precisado que correspondia a 9,87 %. No considerando 72 desta mesma decisão, é referido que a diferença entre o preço de exercício e o preço de referência tinha sido calculada a fim de variar entre 3,5 e 9 mil milhões de GBP, em função do preço do carbono no Reino Unido. Neste contexto, importa igualmente ter em conta o considerando 361 da decisão em causa, do qual resulta que o montante global do auxílio dependia das hipóteses consideradas para os futuros preços grossistas e para a taxa de atualização, e atingia, segundo diferentes cenários, 4,78 mil milhões de GBP, 11,17 mil milhões de GBP ou 17,62 mil milhões de GBP. A este respeito, cabe recordar que o montante total do auxílio dependia do preço de referência, que é um preço de mercado, cujo montante futuro é difícil de prever.

713

Em seguida, devem ser tidos em conta, nomeadamente, os considerandos 126 a 145, assim como 163 a 178 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, relativos à qualificação do contrato diferencial como auxílio estatal. Neste contexto, a Comissão descreveu em detalhe o funcionamento do referido contrato.

714

Por último, importa assinalar que, nos considerandos 349 a 362 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, a Comissão afirmou que, com base nas informações de que dispunha, não podia concluir que o contrato diferencial era uma medida de auxílio proporcionada. Neste contexto, expôs de forma detalhada os fatores que tornam difícil a determinação do preço de exercício adequado e a rentabilidade do projeto de Hinkley Point C.

715

Tendo em conta estes elementos, há que concluir que, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, as indicações que figuram na decisão de abertura do procedimento formal de investigação, relativas ao montante do elemento de auxílio incluído no contrato diferencial, às modalidades deste e às dúvidas da Comissão, eram suficientes para permitir à República da Áustria exercer o seu direito de apresentar as suas observações.

716

Em segundo lugar, no que respeita à garantia de crédito, a República da Áustria alega que a referida garantia foi descrita de forma extremamente vaga e indeterminada, uma vez que a Comissão se limitou a indicar que esta garantia estava ligada ao crédito que a NNBG obteria efetivamente e que o seu montante global poderia atingir 17,6 mil milhões de GBP.

717

A este respeito, importa assinalar que é certo que na descrição da garantia de crédito que figura nos considerandos 50 a 52 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, a Comissão se limitou a indicar que os detalhes da referida garantia ainda não estavam determinados, mas que esta garantia estaria indubitavelmente ligada ao montante do crédito efetivamente obtido pela NNBG.

718

Todavia, neste contexto, importa igualmente ter em conta os considerandos 146 e 147 e 179 a 187 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, nos quais a Comissão se pronunciou sobre a qualidade de auxílio estatal desta medida. Neste contexto, a Comissão afirmou que, segundo as indicações do Reino Unido, a garantia de crédito não constituía um auxílio estatal, uma vez que seria fornecida em condições de mercado e respeitaria a comunicação sobre as garantias, nomeadamente no que se refere ao seu preço. Indicou igualmente que não estava convencida de que o método que o Reino Unido propôs para determinar o preço dessa garantia fosse suscetível de garantir que esse preço corresponderia a um preço oferecido por um investidor privado. A este respeito, indicou que alguns dos elementos do método proposto não correspondiam ao critério que um investidor privado teria seguido. Por outro lado, nos considerandos 342 a 348 da referida decisão, afirmou que, atendendo a estes elementos, não podia excluir a possibilidade de a concessão da garantia em questão ser suscetível de conduzir a uma sobrecompensação.

719

Tendo em conta estes elementos, há que concluir que, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, as indicações relativas à garantia de crédito, que figuravam na decisão de abertura do procedimento formal de investigação, eram suficientemente precisas para permitir à República da Áustria exercer o seu direito de apresentar as suas observações.

720

Em terceiro lugar, no que respeita à compensação por encerramento antecipado da central nuclear Hinkley Point, a República da Áustria alega que as indicações na decisão de abertura do procedimento formal de investigação se limitavam à informação de que os proprietários tinham direito a uma compensação, mas que o nível e as circunstâncias exatas desta indemnização ainda estavam em negociação e ainda não eram inteiramente conhecidos.

721

A este respeito, importa ter em conta os considerandos 47 e 48 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, dos quais resulta que o acordo do secretário de Estado é relativo à eventualidade de um encerramento da central nuclear no seguimento de uma decisão política. Aí é exposto que, em tais circunstâncias, por um lado, os investidores da NNBG teriam direito a uma compensação, cujo nível e a dimensão ainda não estavam precisados e, por outro, teriam o direito de transferir a NNBG para o Reino Unido, que, por sua vez, teria o direito de exigir que a NNBG lhe fosse transferida.

722

Por outro lado, há que ter em conta os considerandos 192 a 195 da decisão de abertura do procedimento formal de investigação, relativos à qualificação de tal indemnização como auxílio estatal. Neste contexto, a Comissão afirmou que uma indemnização destinada a compensar um dano causado pelas autoridades públicas não constituía um auxílio estatal. Todavia, referiu que, antes de chegar a uma conclusão definitiva a este respeito, necessitava de mais informações sobre a questão de saber se a indemnização prevista resultava de um princípio geral e se estava igualmente disponível para outros operadores presentes no mercado que se encontrassem numa situação semelhante.

723

Tendo em conta estes elementos, importa assinalar que a decisão de abertura do procedimento formal de investigação incluía informações suficientes para permitir à República da Áustria exercer o seu direito de apresentar observações. Neste contexto, cabe recordar que, como acima resulta dos n.os 275 a282, o único elemento de auxílio identificado pela Comissão na decisão impugnada relativo ao acordo do secretário de Estado era o direito a um pagamento rápido e seguro. Em contrapartida, na referida decisão, a Comissão não autoriza elementos de auxílio que pudessem resultar das modalidades de cálculo da indemnização.

724

Em quarto lugar, deve recordar‑se que, como foi acima exposto nos n.os 247 a 362, a Comissão podia adotar a decisão impugnada, mesmo que ainda não tivesse conhecimento de todas as cláusulas relativas ao financiamento de Hinkley Point C, uma vez que estas cláusulas ainda não tinha sido acordadas pelas partes. Daqui resulta que, contrariamente ao que afirma a República da Áustria, o facto de as cláusulas concretas também serem conhecidas na fase da decisão de abertura do procedimento formal de investigação não pode esvaziar de sentido o seu direito de apresentar as suas observações.

725

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedentes os argumentos da República da Áustria relativos ao facto de que a decisão de abertura do procedimento formal de investigação não incluía informações suficientes para lhe permitir exercer de forma efetiva o seu direito de ser associada ao referido procedimento.

726

Em segundo lugar, improcede o argumento da República da Áustria de que, em determinadas situações, a Comissão tem de informar novamente os interessados.

727

Neste contexto, há que recordar que o procedimento formal de investigação permite aprofundar e esclarecer as questões suscitadas na decisão de dar início a este procedimento e deve permitir ao Estado‑Membro que notificou o projeto adaptá‑lo em função de eventuais observações da Comissão. Por conseguinte, qualquer divergência entre este e a decisão final não pode, em si, ser considerada constitutiva de um vício que afete a legalidade desta última (Acórdão de 4 de setembro de 2009, Itália/Comissão, T‑211/05, EU:T:2009:304, n.o 55). Apenas uma alteração que afeta a natureza das medidas em causa pode, assim, dar origem a uma obrigação para a Comissão de informar as partes interessadas novamente.

728

Ora, há que observar que a República da Áustria não invoca qualquer alteração nem mesmo qualquer precisão resultante do procedimento formal de investigação e que pudesse ter dado origem a tal obrigação.

729

Em terceiro lugar e em todo caso, mesmo na hipótese de a Comissão não ter respeitado o direito da República da Áustria de apresentar as suas observações, o presente fundamento não poderia ser acolhido. Com efeito, uma violação deste direito apenas pode levar a uma anulação se, sem essa irregularidade, o procedimento pudesse ter conduzido a um resultado diferente (Acórdão de 12 de maio de 2011, Région Nord‑Pas‑de‑Calais e Communauté d’agglomération du Douaisis/Comissão, T‑267/08 e T‑279/08, EU:T:2011:209, n.o 85). Ora, não se pode deixar de observar que a República da Áustria não apresenta qualquer elemento cuja consideração pela Comissão pudesse ter alterado a conclusão a que esta chegou na decisão impugnada.

730

Em face destas considerações, há que julgar integralmente improcedente o décimo fundamento.

J. Quanto ao nono fundamento, relativo a uma fundamentação insuficiente

731

O nono fundamento é relativo a uma violação do dever de fundamentação.

732

Neste contexto, cabe recordar que o nono fundamento está dividido em seis partes, que visam os elementos da decisão impugnada que são igualmente visados por outros fundamentos e já foram apreciados conjuntamente com esses fundamentos (v., supra, no que respeita à primeira parte, n.o 234, no que respeita à segunda parte, n.os 153 a 157, no que respeita às primeira e segunda alegações da terceira parte, n.os 626 a 629 e n.os 567 a 574, no que respeita à quarta parte, n.os 363 a 366, no que respeita à quinta parte, n.os 61 a 68 e no que respeita à sexta parte, n.os 532 a 566).

733

Daqui resulta que o nono fundamento deve igualmente ser julgado improcedente na íntegra.

734

Em face destas considerações, há que negar provimento ao recurso.

Quanto às despesas

735

Nos termos do artigo 134.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a República da Áustria sido vencida, há que condená‑la nas despesas da Comissão, em conformidade com o pedido desta.

736

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, os Estados‑Membros que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas. Por conseguinte, por um lado, o Grão‑Ducado do Luxemburgo e, por outro, a República Checa, a República Francesa, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República da Eslováquia e o Reino Unido suportarão as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Quinta Secção)

decide:

 

1)

É negado provimento ao recurso.

 

2)

A República da Áustria suportará as suas próprias despesas e as despesas efetuadas pela Comissão Europeia.

 

3)

A República Checa, a República Francesa, o Grão‑Ducado do Luxemburgo, a Hungria, a República da Polónia, a Roménia, a República Eslovaca e o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte suportarão as suas próprias despesas.

 

Gratsias

Dittrich

Xuereb

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 12 de julho de 2018.

Assinaturas

Índice

 

I. Antecedentes do litígio

 

II. Tramitação no Tribunal Geral e pedidos das partes

 

III. Questão de direito

 

A. Quanto aos argumentos relativos à inadmissibilidade das alegações de intervenção apresentadas pela Hungria

 

B. Quanto ao quarto fundamento, relativo ao facto de a promoção da energia nuclear não constituir um objetivo de interesse «comum», e quanto à quinta parte do nono fundamento, relativo a uma fundamentação insuficiente da decisão impugnada

 

1. Quanto à quinta parte do nono fundamento, relativo a uma fundamentação insuficiente da decisão impugnada

 

2. Quanto ao quarto fundamento, que visa o mérito das considerações da Comissão

 

a) Quanto à aplicação do artigo 107.o TFUE às medidas relativas ao domínio da energia nuclear e quanto à tomada em consideração dos objetivos do Tratado Euratom no âmbito da aplicação desta disposição

 

b) Quanto aos argumentos que visam pôr em causa a conclusão da Comissão de que a promoção da energia nuclear constitui um objetivo de interesse «comum»

 

C. Quanto ao segundo fundamento, relativo ao caráter alegadamente errado da conclusão da Comissão de que a tecnologia utilizada em Hinkley Point C era nova

 

D. Quanto ao primeiro fundamento e às primeira e segunda partes do nono fundamento, que visam a definição de mercado efetuada, assim como as considerações da Comissão baseadas na existência de uma deficiência do mercado

 

1. Quanto aos argumentos que visam pôr em causa a conclusão da Comissão quanto à necessidade de uma intervenção do Reino Unido

 

a) Quanto à alegação de fundamentação insuficiente relativa à natureza específica dos investimentos em Hinkley Point C

 

b) Quanto à alegação que visa demonstrar a existência de erros materiais e formais que afetam as considerações da Comissão expostas no ponto 9.3 da decisão impugnada

 

c) Quanto à alegação de que os objetivos da segurança de fornecimento e da descarbonização podiam ser alcançados sem auxílios estatais

 

d) Quanto à alegação de que a Comissão não expôs de forma suficiente em que medida Hinkley Point C recorre a novas tecnologias

 

2. Quanto aos argumentos que visam a definição de mercado efetuada pela Comissão

 

3. Quanto ao argumento relativo a um juízo prévio a favor da energia nuclear

 

E. Quanto aos quinto e oitavo fundamentos, relativos a uma determinação insuficiente dos elementos de auxílio e a uma violação da comunicação sobre as garantias, e quanto à quarta parte do nono fundamento, relativa a uma violação do dever de fundamentação a esse respeito

 

1. Quanto à questão de saber se e em que medida a Comissão tem de quantificar o equivalente subvenção de uma medida de auxílio

 

2. Quanto aos argumentos que visam demonstrar que os elementos de auxílio incluídos nas medidas em causa não foram suficientemente determinados

 

a) Quanto ao argumento de que ainda não estavam determinadas todas as modalidades das medidas em causa no momento da adoção da decisão impugnada

 

b) Quanto aos argumentos relativos a uma determinação insuficiente dos elementos de auxílio incluídos nas medidas em causa

 

1) Quanto ao contrato diferencial

 

2) Quanto às vantagens concedidas em caso de encerramento antecipado

 

3) Quanto à garantia de crédito

 

i) Quanto ao argumento de que a Comissão não devia ter concluído que o projeto de construção e de exploração de Hinkley Point C era um projeto sólido com uma probabilidade de deficiência relativamente baixa

 

ii) Quanto ao argumento de que a Comissão devia ter avaliado a categoria de risco da garantia de crédito sem ter em conta as outras medidas em causa

 

iii) Quanto aos argumentos relativos ao facto de a Comissão não ter tido suficientemente em conta critérios previstos na comunicação sobre as garantias

 

— Quanto à duração da garantia

 

— Quanto ao montante da cobertura do empréstimo

 

— Quanto à existência das dificuldades financeiras da EDF

 

— Quanto ao argumento de que a taxa de remuneração devia ser, no mínimo, de 400 pontos base

 

4) Quanto à cumulação das medidas em causa

 

c) Quanto aos custos relativos à gestão e ao armazenamento de resíduos nucleares

 

d) Quanto à eventual concessão de futuros auxílios estatais

 

3. Quanto aos argumentos relativos a uma violação do dever de fundamentação

 

F. Quanto ao sexto fundamento, à segunda alegação da terceira parte e à sexta parte do nono fundamento, relativos à fiscalização da proporcionalidade das medidas em causa

 

1. Quanto ao sexto fundamento, relativo à fiscalização da proporcionalidade das medidas em causa

 

a) Quanto ao caráter adequado das medidas em causa

 

b) Quanto ao caráter necessário das medidas em causa

 

c) Quanto à ponderação dos efeitos positivos e negativos das medidas em causa

 

1) Quanto aos efeitos positivos das medidas em causa identificados pela Comissão

 

i) Quanto aos argumentos que visam pôr em causa a existência de um futuro défice de capacidades de produção de energia

 

ii) Quanto aos argumentos relativos ao anacronismo do conceito de ampla carga de base

 

iii) Quanto aos argumentos relativos ao fornecimento de urânio

 

iv) Quanto ao argumento relativo à sensibilidade das centrais nucleares aos aumentos de temperatura

 

v) Quanto ao argumento relativo às possíveis consequências de falhas

 

vi) Quanto à qualificação da energia nuclear como energia com baixo teor de dióxido de carbono

 

vii) Quanto ao argumento de que Hinkley Point C não estará concluída a tempo

 

2) Quanto aos efeitos negativos tidos em conta pela Comissão

 

3) Quanto à ponderação efetuada

 

4) Quanto ao argumento de que a Comissão não teve em conta elementos relevantes

 

2. Quanto à segunda alegação da terceira parte e à sexta parte do nono fundamento, relativas, nomeadamente, a fundamentação insuficiente

 

G. Quanto ao terceiro fundamento e à primeira alegação da terceira parte do nono fundamento, que visa a qualificação das medidas em causa

 

1. Quanto aos argumentos relativos à qualificação das medidas em causa

 

a) Quanto aos argumentos relativos ao contrato diferencial

 

b) Quanto aos argumentos relativos ao acordo do secretário de Estado

 

c) Quanto aos argumentos relativos à compensação prevista nas medidas em causa

 

d) Quanto ao argumento de que a Comissão devia ter distinguido claramente um auxílio ao funcionamento de um auxílio ao investimento

 

2. Quanto ao dever de fundamentação

 

H. Quanto ao sétimo fundamento, relativo, nomeadamente, às considerações da Comissão sobre a compatibilidade das medidas em causa com a regulamentação atual do mercado

 

1. Quanto aos argumentos que visam demonstrar que o Reino Unido devia ter aberto um concurso para o projeto de Hinkley Point C

 

a) Quanto aos argumentos relativos a uma violação das Diretivas 2004/17 e 2004/18

 

b) Quanto aos argumentos relativos a uma violação do artigo 8.o da Diretiva 2009/72 e dos princípios da igualdade de tratamento, da não discriminação e da transparência inerentes ao Tratado FUE

 

2. Quanto ao argumento relativo ao caráter discriminatório do contrato diferencial

 

I. Quanto ao décimo fundamento, relativo a uma violação do direito de apresentar observações nos termos do artigo 108.o, n.o 2, TFUE e do artigo 6.o, n.o 1, do Regulamento n.o 659/1999

 

J. Quanto ao nono fundamento, relativo a uma fundamentação insuficiente

 

Quanto às despesas


( *1 ) Língua do processo: alemão.

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