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Document 62015CJ0248

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 26 de janeiro de 2017.
Maxcom Ltd contra City Cycle Industries.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Dumping — Regulamento de Execução (UE) n.o 501/2013 — Importações de bicicletas da Indonésia, da Malásia, do Sri Lanca e da Tunísia — Extensão a estas importações do direito antidumping definitivo instituído sobre as importações de bicicletas originárias da República Popular da China — Regulamento (CE) n.o 1225/2009 — Artigo 13.o — Evasão — Artigo 18.o — Falta de colaboração — Prova — Conjunto de indícios concordantes — Falta de fundamentação — Violação de direitos processuais.
Processos apensos C-248/15 P, C-254/15 P e C-260/15 P.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2017:62

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

26 de janeiro de 2017 ( *1 )

«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Dumping — Regulamento de Execução (UE) n.o 501/2013 — Importações de bicicletas da Indonésia, da Malásia, do Sri Lanca e da Tunísia — Extensão a estas importações do direito antidumping definitivo instituído sobre as importações de bicicletas originárias da República Popular da China — Regulamento (CE) n.o 1225/2009 — Artigo 13.o — Evasão — Artigo 18.o — Falta de colaboração — Prova — Conjunto de indícios concordantes — Falta de fundamentação — Violação de direitos processuais»

Nos processos apensos C‑248/15 P, C‑254/15 P e C‑260/15 P,

que têm por objeto três recursos de uma decisão do Tribunal Geral, nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interpostos, respetivamente, em 27 de maio, 29 de maio e 1 de junho de 2015,

Maxcom Ltd, com sede em Plovdiv (Bulgária), representada por L. Ruessmann, avocat, e J. Beck, solicitor,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

City Cycle Industries, com sede em Colombo (Sri Lanca), representada por T. Müller‑Ibold, Rechtsanwalt, e F.‑C. Laprévote, avocat,

recorrente em primeira instância,

Conselho da União Europeia, representado inicialmente por S. Boelaert e, em seguida, por H. Marcos Fraile e B. Driessen, na qualidade de agentes, assistidos por R. Bierwagen e C. Hipp, Rechtsanwälte,

recorrido em primeira instância,

Comissão Europeia, representada por J.‑F. Brakeland e M. França, na qualidade de agentes,

interveniente em primeira instância (C‑248/15 P),

e

Comissão Europeia, representada por J.‑F. Brakeland e M. França, na qualidade de agentes,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

City Cycle Industries, com sede em Colombo, representada por T. Müller‑Ibold, Rechtsanwalt, e F.‑C. Laprévote, avocat,

recorrente em primeira instância,

Conselho da União Europeia, representado inicialmente por S. Boelaert, e em seguida por H. Marcos Fraile e B. Driessen, na qualidade de agentes, assistidos por R. Bierwagen e C. Hipp, Rechtsanwälte,

recorrido em primeira instância,

Maxcom Ltd, com sede em Plovdiv, representada por L. Ruessmann, avocat, e J. Beck, solicitor,

interveniente em primeira instância (C‑254/15 P),

e

Conselho da União Europeia, representado inicialmente por S. Boelaert, e em seguida por H. Marcos Fraile e B. Driessen, na qualidade de agentes, assistidos por R. Bierwagen e C. Hipp, Rechtsanwälte,

recorrente,

sendo as outras partes no processo:

City Cycle Industries, com sede em Colombo, representada por T. Müller‑Ibold, Rechtsanwalt, e F.‑C. Laprévote, avocat,

recorrente em primeira instância,

Comissão Europeia, representada por J.‑F. Brakeland e M. França, na qualidade de agentes,

interveniente em primeira instância,

Maxcom Ltd, com sede em Plovdiv, representada por L. Ruessmann, avocat, e J. Beck, solicitor,

interveniente em primeira instância (C‑260/15 P),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: T. von Danwitz, presidente de secção, E. Juhász, C. Vajda, K. Jürimäe (relatora) e C. Lycourgos, juízes,

advogado‑geral: P. Mengozzi,

secretário: V. Giacobbo‑Peyronnel, administradora,

vistos os autos e após a audiência de quinta‑feira, 2 de junho de 2016,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 22 de setembro de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

Com os presentes recursos, a Maxcom Ltd, o Conselho da União Europeia e a Comissão Europeia pedem a anulação do acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 19 de março de 2015, City Cycle Industries/Conselho (T‑413/13, não publicado, a seguir «acórdão recorrido», EU:T:2015:164), no qual este anulou o artigo 1.o, n.os 1 e 3, do Regulamento de Execução (UE) n.o 501/2013 do Conselho, de 29 de maio de 2013, que torna extensivo o direito antidumping definitivo instituído pelo Regulamento de Execução (UE) n.o 990/2011 sobre as importações de bicicletas originárias da República Popular da China às importações de bicicletas expedidas da Indonésia, da Malásia, do Sri Lanca e da Tunísia, independentemente de serem ou não declaradas originárias da Indonésia, da Malásia, do Sri Lanca e da Tunísia (JO 2013, L 153, p. 1, a seguir «regulamento controvertido»), na parte que diz respeito à City Cycle Industries (a seguir «City Cycle»).

Quadro jurídico

2

À data dos factos na origem do litígio, as disposições que regiam a adoção de medidas antidumping pela União Europeia constavam do Regulamento (CE) n.o 1225/2009 do Conselho, de 30 de novembro de 2009, relativo à defesa contra as importações objeto de dumping dos países não‑membros da Comunidade Europeia (JO 2009, L 343, p. 51; retificação no JO 2010, L 7, p. 22), conforme alterado pelo Regulamento (UE) n.o 1168/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012 (JO 2012, L 344, p. 1) (a seguir «regulamento de base»).

3

O artigo 13.o deste regulamento, intitulado «Evasão», tinha a seguinte redação:

«1.   A aplicação dos direitos antidumping instituídos nos termos do presente regulamento pode ser tornada extensiva às importações provenientes de países terceiros de produtos similares, ligeiramente modificados ou não, assim como às importações de produtos similares ligeiramente modificados, provenientes do país sujeito às medidas, ou de partes desses produtos, sempre que se verifique uma evasão às medidas em vigor. Os direitos antidumping que não excedam o direito antidumping residual instituído em conformidade como o artigo 9.o, n.o 5, podem ser tornados extensivos às importações efetuadas por empresas que beneficiem de direitos individuais nos países sujeitos a medidas, sempre que se verifique uma evasão às medidas em vigor. Entende‑se por evasão uma alteração dos fluxos comerciais entre os países terceiros e a Comunidade ou entre empresas do país sujeito às medidas e a Comunidade, resultante de práticas, processos ou operações insuficientemente motivadas ou sem justificação económica que não seja a instituição do direito, e quando houver elementos que demonstrem que há prejuízo ou que estão a ser neutralizados os efeitos corretores do direito no que se refere aos preços e/ou às quantidades do produto similar, bem como quando houver elementos de prova, se necessário em conformidade com o disposto no artigo 2.o, da existência de dumping relativamente aos valores normais anteriormente apurados para o produto similar.

Por práticas, processos ou operações referidas no primeiro parágrafo entende‑se, designadamente, a ligeira modificação do produto em causa para possibilitar a sua classificação em códigos aduaneiros que não estejam normalmente sujeitos a medidas, desde que tal modificação não altere as suas características essenciais; a expedição do produto sujeito a medidas através de países terceiros; por práticas, processos ou operações referidas no primeiro parágrafo entende‑se, designadamente, a ligeira modificação do produto em causa para possibilitar a sua classificação em códigos aduaneiros que não estejam normalmente sujeitos a medidas, desde que tais modificações não alterem as suas características essenciais; a expedição do produto sujeito a medidas através de países terceiros; a reorganização pelos exportadores ou pelos produtores das respetivas estruturas e circuitos de venda no país sujeito a medidas de tal modo que os seus produtos sejam exportados para a Comunidade por intermédio de produtores que beneficiem de uma taxa do direito individual inferior à aplicável aos produtos dos fabricantes; e, nas circunstâncias previstas no n.o 2, a montagem de partes no âmbito de uma operação de montagem na Comunidade ou num país terceiro.

2.   Considera‑se que uma operação de montagem na Comunidade ou num país terceiro constitui uma evasão às medidas em vigor sempre que:

a)

A operação tenha começado ou aumentado substancialmente desde o início do inquérito antidumping, ou imediatamente antes dessa data, e as partes em causa sejam provenientes do país sujeito às medidas; e

b)

As partes representam pelo menos 60% do valor total das partes do produto montado, não podendo, no entanto, em caso algum considerar‑se que existe evasão quando o valor acrescentado das partes, durante a operação de montagem ou de fabrico, for superior a 25% do custo de produção; e

c)

Os efeitos corretores do direito estejam a ser neutralizados em termos de preços e/ou de quantidades do produto similar montado e houver elementos de prova de dumping relativamente aos valores normais anteriormente apurados para os produtos similares ou análogos.

3.   Será iniciado um inquérito nos termos do presente artigo por iniciativa da Comissão, ou a pedido de um Estado‑Membro ou de qualquer parte interessada, com base em elementos de prova suficientes sobre os fatores referidos no n.o 1. O inquérito é iniciado após consulta do comité consultivo, através de um regulamento da Comissão, que pode igualmente instruir as autoridades aduaneiras para tornarem obrigatório o registo das importações em conformidade com o n.o 5 do artigo 14.o, ou para exigirem garantias. Os inquéritos são efetuados pela Comissão, que pode ser assistida pelas autoridades aduaneiras, devendo estar concluídos no prazo de nove meses. Se os factos, tal como definitivamente estabelecidos, justificarem a prorrogação das medidas, o Conselho deve prorrogá‑las, deliberando sob proposta da Comissão, após consulta do comité consultivo. A proposta é aprovada pelo Conselho, exceto se este, deliberando por maioria simples, decidir rejeitá‑la no prazo de um mês a contar da data da sua apresentação pela Comissão. A prorrogação produz efeitos a contar da data em que o registo foi tornado obrigatório nos termos do n.o 5 do artigo 14.o ou em que foram exigidas garantias. As disposições do presente regulamento relativas aos procedimentos de início e de tramitação dos inquéritos são aplicáveis no termos do presente artigo.

4.   As importações não são sujeitas ao registo nos termos do artigo 14.o, n.o 5, nem são objeto de medidas, sempre que forem realizadas por empresas que beneficiam de isenção. Os pedidos de isenção, devidamente apoiados por elementos de prova, devem ser apresentados dentro dos prazos estabelecidos no regulamento da Comissão que dá início ao inquérito. Sempre que uma prática, processo ou operação que constitua uma evasão ocorra fora da Comunidade, podem ser concedidas isenções aos produtores do produto em causa que possam demonstrar que não estão ligados a nenhum produtor sujeito a medidas e relativamente aos quais tenha sido estabelecido que não estão envolvidos em práticas de evasão na aceção dos n.os 1 e 2 do presente artigo. Sempre que uma prática, processo ou operação de evasão se verificar na Comunidade, podem ser concedidas isenções aos importadores que possam demonstrar que não estão ligados a produtores sujeitos a medidas.

Essas isenções são concedidas por uma decisão da Comissão após consulta do comité consultivo, ou por uma decisão do Conselho que imponha medidas, e permanecem em vigor durante o período e nas condições fixadas na decisão.

[…]»

4

O artigo 18.o do referido regulamento previa:

«1.   Quando uma parte interessada recusar o acesso às informações necessárias ou não as facultar nos prazos previstos no presente regulamento, ou impedir de forma significativa o inquérito, podem ser estabelecidas, com base nos dados disponíveis, conclusões provisórias ou finais, positivas ou negativas.

[…]

6.   Se uma parte interessada não colaborar ou se colaborar apenas parcialmente, estando, desse modo, a ocultar informações pertinentes, o resultado pode ser menos favorável para essa parte do que se tivesse efetivamente colaborado.»

Antecedentes dos litígios e regulamento controvertido

5

Os antecedentes do litígio estão expostos nos n.os 1 a 28 do acórdão recorrido. Para as necessidades do presente processo podem ser resumidos como segue.

6

Em 14 de agosto de 2012, a Comissão recebeu um pedido apresentado pela Federação Europeia dos Fabricantes de Bicicletas (EBMA), em nome de três produtores de bicicletas da União, em que era convidada a investigar uma eventual evasão, através de importações de bicicletas provenientes da Indonésia, da Malásia, do Sri Lanca e da Tunísia, às medidas antidumping instituídas pelo Regulamento de Execução (UE) n.o 990/2011 do Conselho, de 3 de outubro de 2011, que institui um direito antidumping definitivo sobre as importações de bicicletas originárias da República Popular da China na sequência de um reexame da caducidade em conformidade com o artigo 11.o, n.o 2, do Regulamento (CE) n.o 1225/2009 (JO 2011, L 261, p. 2).

7

Em 25 de setembro de 2012, a Comissão adotou o Regulamento (UE) n.o 875/2012, que inicia um inquérito relativo a uma eventual evasão às medidas antidumping instituídas pelo Regulamento de Execução (UE) n.o 990/2011 do Conselho, sobre as importações de bicicletas originárias da República Popular da China através de importações de bicicletas expedidas da Indonésia, da Malásia, do Sri Lanca e da Tunísia, independentemente de serem ou não declaradas originárias da Indonésia, da Malásia, do Sri Lanca e da Tunísia, e que torna obrigatório o registo destas importações (JO 2012, L 258, p. 21).

8

Em 26 de setembro de 2012, a Comissão informou a City Cycle, sociedade com sede no Sri Lanca que exporta bicicletas para a União, do início desse inquérito e transmitiu‑lhe um formulário de isenção a título do artigo 13.o, n.o 4, do regulamento de base. A City Cycle foi convidada a responder a esse formulário o mais tardar em 2 de novembro de 2012. Esta sociedade entregou a sua resposta à Comissão em 30 de outubro de 2012.

9

Em 21 de janeiro de 2013, a Comissão procedeu a uma visita de verificação nas instalações da City Cycle.

10

Em 31 de janeiro de 2013, a Comissão informou a City Cycle da sua intenção de aplicar o artigo 18.o do regulamento de base.

11

Em 21 de março de 2013, a Comissão enviou à City Cycle, bem como às autoridades cingalesas e chinesas, o documento de informação geral que continha as suas conclusões relativas a operações de transbordo e de montagem e no qual manifestava a sua intenção de propor a extensão das medidas antidumping instituídas sobre as importações de bicicletas originárias da China às importações provenientes do Sri Lanca. Nesse documento, aquela instituição indeferiu igualmente o pedido de isenção da City Cycle.

12

Em 29 de maio de 2013, o Conselho adotou o regulamento controvertido.

13

Nos considerandos 35 a 42 desse regulamento, o Conselho indicou, em substância, no que respeita ao grau de colaboração das sociedades cingalesas, que, das seis empresas cingalesas que tinham apresentado um pedido de isenção a título do artigo 13.o, n.o 4, do regulamento de base, apenas três haviam colaborado. Relativamente a estas três sociedades, visto que uma delas retirara o seu pedido de isenção e as outras duas não tinham colaborado de forma satisfatória, as conclusões a seu respeito basearam‑se nos dados disponíveis, em conformidade com o artigo 18.o do regulamento de base.

14

No considerando 58 do referido regulamento, o Conselho concluiu pela existência de uma alteração da configuração dos fluxos comerciais entre o Sri Lanca e a União, na aceção do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base.

15

Nos considerandos 77 a 82 do regulamento controvertido, o Conselho analisou a natureza das práticas de evasão que estão na origem dessa alteração da configuração dos fluxos comerciais entre aquele país terceiro e a União.

16

Quanto às práticas de transbordo, os considerandos 77 a 79 desse regulamento enunciam:

«(77)

As exportações das empresas do Sri Lanca que colaboraram inicialmente ascenderam a 69% do total das exportações do Sri Lanca para a União no [período de referência]. Em relação a três das seis empresas que colaboraram inicialmente, o inquérito não revelou quaisquer práticas de transbordo. Quanto às restantes exportações, tal como se refere nos considerandos 35 a 42, não houve colaboração.

(78)

Por conseguinte, tendo em conta a alteração dos fluxos comerciais entre o Sri Lanca e a União referida no considerando 58, na aceção do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base, e o facto de nem todos os produtores‑exportadores cingaleses se terem dado a conhecer e/ou terem colaborado no inquérito, pode concluir‑se que as exportações provenientes destes produtores‑exportadores se devem a práticas de transbordo.

(79)

Por conseguinte, confirma‑se a existência de transbordo dos produtos de origem chinesa através do Sri Lanca.»

17

Nos considerandos 81 e 82 do referido regulamento, o Conselho indicou que a existência de operações de montagem, na aceção do artigo 13.o, n.o 2, do regulamento de base, não tinha sido dado como provada.

18

Nos considerandos 92, 96 e 110 do mesmo regulamento, o Conselho constatou, primeiro, a falta de motivos ou de outra justificação económica para além da intenção de evitar as medidas antidumping em vigor, segundo, a neutralização dos efeitos corretores destas medidas, e, terceiro, a existência de dumping relativamente ao valor normal anteriormente apurado.

19

Nestas condições, o Conselho concluiu, no considerando 115 do regulamento controvertido, pela existência de uma evasão, na aceção do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base, mediante operações de transbordo através do Sri Lanca.

20

Nos termos do artigo 1.o, n.o 1, do regulamento controvertido, o direito antidumping definitivo de 48,5%, previsto no artigo 1.o, n.o 2, do Regulamento de Execução n.o 990/2011, foi tornado extensivo às importações de bicicletas expedidas do Sri Lanca, independentemente de serem ou não declaradas originárias deste país. O artigo 1.o, n.o 3, do referido regulamento prevê a cobrança do direito tornado extensivo sobre essas mesmas importações registadas em conformidade com o Regulamento n.o 875/2012.

Tramitação do processo no Tribunal Geral e acórdão recorrido

21

Por petição entregue na Secretaria do Tribunal Geral em 9 de agosto de 2013, a City Cycle interpôs um recurso de anulação do artigo 1.o, n.os 1 e 3, do regulamento controvertido, na parte em que estas disposições lhe dizem respeito.

22

Por requerimento separado apresentado na Secretaria do Tribunal Geral, a City Cycle pediu que o processo fosse sujeito à tramitação acelerada prevista no artigo 76.o‑A do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, na sua versão em vigor no momento da tramitação do processo nesse órgão jurisdicional. O pedido de tratamento segundo tramitação acelerada foi deferido por decisão da Sétima Secção do Tribunal Geral em 8 de outubro de 2013.

23

Por requerimento apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 17 de outubro de 2013, a Comissão pediu para intervir em apoio dos pedidos do Conselho. O presidente da Sétima Secção do Tribunal Geral deferiu o pedido da Comissão por despacho de 11 de novembro de 2013. Todavia, tendo em conta o artigo 76.o‑A, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, na sua versão em vigor no momento da tramitação do processo nesse órgão jurisdicional, a Comissão não foi autorizada a apresentar alegações de intervenção.

24

Por requerimento apresentado Secretaria do Tribunal Geral em 19 de março de 2014, a Maxcom pediu para intervir em apoio dos pedidos do Conselho. A Sétima Secção do Tribunal Geral deferiu este pedido por despacho de 16 de julho de 2014.

25

Em 25 de junho de 2014, a Comissão pediu para ser autorizada a apresentar alegações de intervenção ao abrigo do artigo 64.o do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, na sua versão em vigor no momento da tramitação do processo nesse órgão jurisdicional. O Tribunal Geral indeferiu este pedido.

26

A City Cycle invocou cinco fundamentos de recurso. O primeiro fundamento era relativo à violação do artigo 13.o, n.o 1, e do artigo 18.o, n.o 1, do regulamento de base. Na primeira parte deste fundamento, a City Cycle contestava a conclusão do Conselho relativa à existência de uma alteração dos fluxos comerciais. Na segunda parte do referido fundamento, a City Cycle questionava a constatação do Conselho, nomeadamente no considerando 78 do regulamento controvertido, relativo à realização de operações de transbordo. O segundo fundamento era relativo à violação do artigo 18.o do regulamento de base, do princípio da proporcionalidade e do dever de fundamentação. Este fundamento dirigia‑se contra a constatação do Conselho relativa à falta de colaboração da City Cycle. O terceiro fundamento era relativo a violações dos princípios da diligência, da boa administração, assim como do artigo 18.o, n.o 4, do regulamento de base e dos direitos de defesa da City Cycle. Pretendia demonstrar que o Conselho, por um lado, não a tinha informado de forma adequada que pretendia indeferir o seu pedido de isenção e, por outro, não lhe tinha concedido um acesso completo ao dossiê. O quarto fundamento era relativo a uma violação do princípio da igualdade de tratamento. A City Cycle afirmava ter sofrido um tratamento discriminatório relativamente a um dos seus concorrentes que utilizava o mesmo modelo comercial. O quinto fundamento era relativo a uma violação do artigo 13.o, n.o 1, do referido regulamento e do princípio da igualdade de tratamento. Dirigia‑se contra as constatações do Conselho relativas à existência de dumping.

27

Na audiência no Tribunal Geral, a Comissão questionou a admissibilidade do recurso na íntegra, alegando que a City Cycle não era nem um produtor nem um exportador cingalês, mas um simples prestador local que atuava por conta de uma empresa chinesa.

28

No acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou improcedentes os argumentos da Comissão relativos à admissibilidade do recurso. Quanto ao mérito, julgou improcedente a primeira parte do primeiro fundamento, bem como o segundo, terceiro, quarto e quinto fundamentos de recurso invocados pela City Cycle.

29

Em contrapartida, julgou procedente a segunda parte do primeiro fundamento. Em apoio desta parte do fundamento, a City Cycle invocava, nomeadamente, uma primeira alegação, relativa a um erro de apreciação de que enfermava o considerando 78 do regulamento controvertido. A este respeito, o Tribunal Geral analisou, em primeiro lugar, nos n.os 82 a 97 do acórdão recorrido, os elementos comunicados pela City Cycle no decurso do inquérito. Concluiu que estes elementos não permitiam demonstrar que esta sociedade era efetivamente um exportador de bicicletas de origem cingalesa ou que satisfazia os critérios previstos no artigo 13.o, n.o 2, do regulamento de base.

30

Em segundo lugar, no n.o 98 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral declarou que, nessa medida, o Conselho não dispunha de nenhum indício para concluir validamente, no considerando 78 do regulamento controvertido, que a City Cycle efetuava operações de transbordo.

31

Em terceiro lugar, no n.o 99 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral considerou que, na verdade, não era possível excluir que, de entre a totalidade das práticas, dos processos ou das operações em relação aos quais não existia um motivo suficiente ou outra justificação económica para além da instituição do direito antidumping inicial, na aceção do artigo 13.o, n.o 1, segundo parágrafo, do regulamento de base, a City Cycle tivesse realizado operações de transbordo. Todavia, segundo esse órgão jurisdicional, o facto de esta não ter conseguido demonstrar que era efetivamente um produtor de bicicletas cingalês ou que respondia aos critérios do artigo 13.o, n.o 2, do regulamento de base não permitia ao Conselho concluir, na falta de outras informações, pela existência de transbordos efetuados pela City Cycle, uma vez que esta possibilidade não resultava minimamente do regulamento de base ou da jurisprudência.

32

Assim, o Tribunal Geral concluiu que a segunda parte do primeiro fundamento devia ser julgada procedente, sem que fosse necessário apreciar as outras alegações apresentadas pela City Cycle.

33

Por conseguinte, o Tribunal Geral anulou o artigo 1.o, n.os 1 e 3, do regulamento controvertido na parte que diz respeito à City Cycle.

Pedidos das partes e tramitação do processo no Tribunal de Justiça

34

Com o seu recurso no processo C‑248/15 P, a Maxcom pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido no que diz respeito à segunda parte do primeiro fundamento;

julgar integralmente improcedente o primeiro fundamento invocado pela City Cycle no Tribunal Geral; e

condenar a City Cycle nas despesas efetuadas pela Maxcom no âmbito do presente recurso e da sua intervenção no Tribunal Geral.

35

Com o seu recurso no processo C‑254/15 P, a Comissão pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido, negar provimento ao recurso em primeira instância e condenar a City Cycle nas despesas, e,

a título subsidiário, remeter o processo ao Tribunal Geral para reapreciação e reservar para final a decisão quanto às despesas das duas instâncias.

36

Com o seu recurso no processo C‑260/15 P, o Conselho pede que o Tribunal de Justiça se digne:

anular o acórdão recorrido, negar provimento ao recurso em primeira instância e condenar a City Cycle nas despesas efetuadas pelo Conselho nas duas instâncias, e,

a título subsidiário, remeter o processo ao Tribunal Geral para reapreciação e reservar para final a decisão quanto às despesas das duas instâncias.

37

Nos seus articulados de resposta, apresentados nos processos apensos C‑248/15 P, C‑254/15 P e C‑260/15 P, a City Cycle pede que o Tribunal de Justiça se digne:

negar integralmente provimento aos recursos contra o acórdão recorrido;

a título subsidiário, anular parcialmente o artigo 1.o, n.os 1 e 3, do regulamento controvertido, na medida em que estas disposições tornam o direito antidumping instituído sobre as importações de bicicletas originárias da China extensivo à City Cycle e indeferem o pedido de isenção por ela apresentado;

condenar a Maxcom, o Conselho e a Comissão nas despesas efetuadas pela City Cycle no âmbito das duas instâncias; e

tomar todas as outras medidas que o Tribunal de Justiça considerar adequadas.

38

Por decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 4 de agosto de 2015, os processos C‑248/15 P C‑254/15 P e C‑260/15 P foram apensados para efeitos das fases escrita e oral, bem como do acórdão.

Quanto aos presentes recursos

39

Os fundamentos invocados nos três recursos sobrepõem‑se em larga medida e podem, em substância, ser reunidos em quatro grupos.

40

Primeiro, a Comissão alega que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao não apreciar a admissibilidade do recurso da City Cycle. Segundo, a Maxcom, o Conselho e a Comissão alegam que o Tribunal Geral cometeu diferentes erros de direito na aplicação do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base. Terceiro, o Conselho e a Comissão alegam que o acórdão recorrido está ferido de falta de fundamentação e de fundamentação contraditória. O Conselho alega igualmente que o Tribunal Geral desvirtuou os factos sujeitos à sua apreciação. Quarto, a Comissão alega que o Tribunal Geral violou os seus direitos processuais.

Quanto ao fundamento relativo a um erro de direito que consiste no facto de o Tribunal Geral não ter apreciado a admissibilidade do recurso

Argumentos das partes

41

A Comissão censura o Tribunal Geral por não ter examinado a admissibilidade do recurso, na medida em que, em resposta aos argumentos suscitados por ela na audiência, o Tribunal Geral se limitou a declarar, primeiro, no n.o 43 do acórdão recorrido, que, enquanto interveniente, a Comissão não tinha qualidade para suscitar a inadmissibilidade do recurso, segundo, no n.o 44 daquele acórdão, que o fundamento havia sido aduzido numa fase particularmente tardia do processo judicial, e, terceiro, no mesmo n.o 44, que a Comissão tinha emitido simples conjeturas na audiência sem apresentar elementos de prova.

42

Ora, de acordo com a Comissão, primeiro, a decisão do Tribunal Geral de não examinar a admissibilidade do recurso contradiz a jurisprudência do Tribunal de Justiça, segundo a qual a inadmissibilidade deve ser suscitada oficiosamente pelo juiz da União. Segundo, o facto de a Comissão apenas ter podido suscitar uma exceção de inadmissibilidade na audiência resultou da decisão do Tribunal Geral de não a autorizar a apresentar alegações de intervenção. Terceiro, a Comissão sublinha que o Tribunal Geral devia saber, com base nos elementos dos autos, que a City Cycle não tinha demonstrado ser um produtor ou um exportador de bicicletas.

43

A City Cycle contesta os argumentos da Comissão.

Apreciação do Tribunal de Justiça

44

Importa salientar que o Tribunal Geral começou por indicar, nos n.os 42 e 43 do acórdão recorrido, que, na medida em que, por um lado, era interveniente em apoio dos pedidos do Conselho e, por outro, este último não havia concluído pela inadmissibilidade do recurso, a Comissão não tinha qualidade para suscitar uma exceção de inadmissibilidade e o Tribunal Geral não estava obrigado a apreciá‑la. Seguidamente, no n.o 44 desse acórdão, o Tribunal Geral declarou que a Comissão havia emitido simples conjeturas a este respeito. Por último, no mesmo n.o 44, aquele órgão jurisdicional observou que essas conjeturas tinham sido formuladas numa fase particularmente tardia do processo.

45

Assim, não é verdade que o Tribunal Geral não apreciou a admissibilidade do recurso, como sustenta a Comissão. O Tribunal Geral examinou os argumentos da Comissão segundo os quais a City Cycle não era nem um produtor nem um exportador cingalês, mas um prestador local que agia por conta de uma empresa chinesa. No termo desse exame, sublinhou que esses argumentos, invocados na audiência, não se baseavam em nenhum elemento de prova novo respeitante às relações entre a City Cycle e a empresa chinesa em causa, e, portanto, consistiam em simples conjeturas. Portanto, julgou improcedente a exceção de inadmissibilidade suscitada pela Comissão.

46

Por conseguinte, não se pode considerar que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito ao não apreciar a admissibilidade do recurso de anulação. Como tal, o presente fundamento deve ser julgado improcedente.

Quanto aos fundamentos relativos a erros de direito na aplicação do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base

Argumentos das partes

47

O segundo grupo de fundamentos é dirigido contra os n.os 98 e 99 do acórdão recorrido. A Maxcom, o Conselho e a Comissão consideram, em substância, que estes números enfermam de erros de direito, na medida em que o Tribunal Geral não aplicou corretamente o artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base.

48

Em primeiro lugar, a Maxcom e a Comissão censuram o Tribunal Geral por ter declarado que o Conselho não podia concluir pela existência de transbordos efetuados pela City Cycle com base na constatação de que esta última não era um verdadeiro produtor de bicicletas cingalês e de que não efetuava operações de montagem para além dos limiares fixados no artigo 13.o, n.o 2, do regulamento de base. Ora, primeiro, segundo a Maxcom, em condições como as que estão em causa no presente processo, em que a City Cycle importou peças de origem chinesa e exportou bicicletas para a União sem provar que é um produtor ou que as suas operações de montagem excedem os limiares fixados no artigo 13.o, n.o 2, deste regulamento, é possível concluir pela existência de operações de transbordo. Segundo, a Maxcom considera que o Tribunal Geral «recompensa» a City Cycle por ter fornecido informações incompletas, contraditórias e inverificáveis. Terceiro, a Maxcom indica que a apreciação do Tribunal Geral não é conforme nem com a finalidade do regulamento de base nem com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça segundo a qual as instituições da União encarregadas da condução dos inquéritos antidumping e da adoção de medidas antidumping (a seguir «instituições da União») gozam de um amplo poder discricionário no âmbito dos inquéritos antidumping.

49

Em segundo lugar, o Conselho e a Comissão sustentam que o Tribunal Geral exigiu, erradamente, às instituições da União que demonstrem que cada produtor‑exportador no país objeto do inquérito efetua práticas de transbordo, e, deste modo, inverteu o ónus da prova. Com efeito, primeiro, o artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base impõe às instituições da União que procedam a uma análise ao nível do país, e não ao nível dos exportadores individuais, cabendo esta última análise aos produtores‑exportadores. Segundo, essa interpretação esvazia totalmente de sentido o artigo 13.o, n.o 4, do regulamento de base. Terceiro, o Tribunal Geral confundiu o conceito de «prática de evasão» com uma das suas manifestações, a saber, o transbordo. Quarto, a exigência de uma constatação individual de transbordo colide com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, segundo a qual as instituições da União dispõem de uma ampla margem de discrição para estabelecer a existência de uma evasão. Quinto, o Tribunal Geral adotou, no âmbito da apreciação dos diferentes fundamentos de anulação que lhe foram submetidos, interpretações manifestamente contraditórias do conceito de «prática de evasão».

50

Em terceiro lugar, a Maxcom, o Conselho e a Comissão sustentam que, mesmo que as conclusões do Conselho relativas à existência de transbordo estivessem erradas, a anulação do regulamento controvertido não se justificava. Com efeito, segundo a Maxcom, de acordo com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, um erro de direito só justifica a anulação do ato em causa se, na inexistência desse erro, o resultado da avaliação global tivesse sido diferente. Além disso, o Conselho e a Comissão recordam que o acórdão recorrido põe em causa o considerando 78 desse regulamento, no qual o Conselho concluiu que, uma vez que nem todos os produtores‑exportadores cingaleses se tinham dado a conhecer ou tinham colaborado no inquérito, as exportações provenientes destes produtores‑exportadores se deviam a práticas de transbordo. Decorre, assim, deste considerando que a constatação da existência de práticas de transbordo através do Sri Lanca não se baseia unicamente na conclusão de que a City Cycle efetuava essas práticas. Por conseguinte, a Comissão sustenta que, mesmo que tivesse cometido um erro de direito ao afirmar que a City Cycle estava envolvida em operações de transbordo, o Conselho podia concluir, com base em elementos de prova relativos aos outros produtores‑exportadores cingaleses e à alteração da configuração dos fluxos comerciais, que eram efetuados transbordos no Sri Lanca.

51

A City Cycle contesta a admissibilidade destes argumentos, na medida em que põem em causa a conclusão do Tribunal Geral de que não havia prova suficiente da existência de operações de transbordo da sua parte, pelo que dizem respeito a uma apreciação factual. A City Cycle contesta igualmente estes argumentos quanto ao mérito.

Apreciação do Tribunal de Justiça

– Quanto à admissibilidade

52

Importa recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, este não é competente para a apreciação de factos nem, em princípio, para examinar as provas que o Tribunal Geral considerou determinantes no apuramento de tais factos. Com efeito, quando essas provas tiverem sido obtidas regularmente e os princípios gerais de direito e as normas processuais aplicáveis em matéria de ónus e de produção da prova tiverem sido respeitados, cabe exclusivamente ao Tribunal Geral apreciar o valor a atribuir às provas que lhe foram submetidas. Essa apreciação não constitui, por isso, exceto em caso de desvirtuação desses elementos, uma questão de direito sujeita, enquanto tal, à fiscalização do Tribunal de Justiça.

53

Todavia, a alegada inobservância das regras aplicáveis em matéria de prova constitui uma questão de direito que é admissível na fase do recurso de uma decisão do Tribunal Geral (acórdão de 10 de julho de 2008, Bertelsmann e Sony Corporation of America/Impala, C‑413/06 P, EU:C:2008:392, n.o 44).

54

Ora, nas alegações que invocam em apoio do presente grupo de fundamentos, a Maxcom, o Conselho e a Comissão censuram, em substância, o Tribunal Geral por ter ignorado as regras relativas ao ónus da prova bem como ao nível de prova exigido para demonstrar a existência de uma evasão, nos termos do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base. Por conseguinte, o argumento da City Cycle relativo à inadmissibilidade do presente grupo de fundamentos não pode ser julgado procedente.

– Quanto ao mérito

i) Observações preliminares

55

As alegações aduzidas pela Maxcom, o Conselho e a Comissão no âmbito do presente grupo de fundamentos têm por objeto a questão do ónus da prova bem como a do nível de prova exigido em matéria de evasão, em circunstâncias em que uma parte dos produtores‑exportadores em causa não colaborou, ou não colaborou de forma satisfatória, no inquérito.

56

A este respeito, cabe recordar desde logo que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, no domínio da política comercial comum, e particularmente em matéria de medidas de defesa comercial, as instituições da União dispõem de um amplo poder de apreciação em razão da complexidade das situações económicas, políticas e jurídicas que devem examinar. A fiscalização jurisdicional de tal apreciação, deve, assim, ser limitada à verificação do respeito das regras processuais, da exatidão material dos factos tomados em consideração na opção impugnada, da ausência de erro manifesto na apreciação destes factos e da inexistência de desvio de poder (acórdão de 16 de fevereiro de 2012, Conselho e Comissão/Interpipe Niko Tube e Interpipe NTRP, C‑191/09 P e C‑200/09 P, EU:C:2012:78, n.o 63 e jurisprudência aí referida).

57

Seguidamente, quanto ao ónus da prova da evasão, nos termos do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base, a existência de uma evasão está provada quando preenchidos quatro requisitos. Primeiro, deve existir uma alteração da configuração dos fluxos comerciais entre um país terceiro e a União. Segundo, esta alteração deve decorrer de práticas, processos ou operações para os quais não exista um motivo suficiente ou outra justificação económica para além da instituição do direito. Terceiro, devem existir elementos que demonstrem que a indústria da União sofre um prejuízo ou que os efeitos corretivos do direito antidumping estão comprometidos. Quarto, devem existir elementos de prova de um dumping.

58

Nos termos do artigo 13.o, n.o 3, desse regulamento, incumbe à Comissão dar início a um inquérito com base em elementos de prova que deixem transparecer, à primeira vista, a existência de práticas de evasão. Segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, esta disposição estabelece o princípio de que o ónus da prova de uma evasão cabe às instituições da União (v., neste sentido, acórdão de 4 de setembro de 2014, Simon, Evers & Co., C‑21/13, EU:C:2014:2154, n.o 35).

59

Além disso, decorre dos termos e da economia do artigo 13.o, do regulamento de base que, para demonstrar a existência de uma evasão, compete a essas instituições procederem a uma análise global no que respeita ao país terceiro visado pelo inquérito relativo à evasão no seu todo. Ao invés, para demonstrar a existência dessa evasão, não lhes compete procederem a uma análise da situação de cada produtor‑exportador individual, cabendo esta análise aos referidos produtores‑exportadores individuais, no âmbito dos pedidos formulados ao abrigo do artigo 13.o, n.o 4, desse regulamento.

60

Com efeito, o artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base dispõe que, quando provada uma evasão a medidas antidumping, estas medidas podem, nomeadamente, ser tornadas extensivas às importações de produtos semelhantes provenientes de países terceiros. Além disso, o artigo 13.o, n.o 4, deste regulamento prevê a possibilidade de os produtores‑exportadores estabelecidos nesse país terceiro obterem isenções se apresentarem um pedido neste sentido, não estiverem ligados a nenhum produtor‑exportador sujeito às referidas medidas e tiverem demonstrado que não estavam envolvidos em práticas de evasão. Esta disposição precisa que os pedidos de isenção devem ser devidamente apoiados por elementos de prova.

61

Assim, como sublinham o Conselho e a Comissão, nos termos do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base, às instituições da União cabe demonstrar a existência de uma evasão às medidas antidumping em relação à totalidade do referido país terceiro, ao passo que a cada produtor‑exportador individual cabe demonstrar que a sua situação específica justifica a concessão de uma isenção ao abrigo do artigo 13.o, n.o 4, deste regulamento.

62

Por último, quanto ao nível de prova exigido para demonstrar uma evasão na hipótese de colaboração insuficiente ou inexistente de uma parte dos produtores‑exportadores, importa recordar que nenhuma disposição do regulamento de base confere à Comissão, no âmbito de um inquérito relativo à existência de uma evasão, o poder de obrigar os produtores ou os exportadores visados por uma queixa a participarem nesse inquérito ou a prestarem esclarecimentos. Por conseguinte, a Comissão está dependente da colaboração voluntária das partes interessadas para lhe fornecerem as informações necessárias (acórdão de 4 de setembro de 2014, Simon, Evers & Co., C‑21/13, EU:C:2014:2154, n.o 32).

63

Esta é a razão pela qual o legislador da União previu, no artigo 18.o, n.o 1, do regulamento de base, que, quando uma parte interessada recusar o acesso às informações necessárias, não as facultar, ou impedir de forma significativa o inquérito, podem ser estabelecidas, com base nos dados disponíveis, conclusões provisórias ou finais, positivas ou negativas (acórdão de 4 de setembro de 2014, Simon, Evers & Co., C‑21/13, EU:C:2014:2154, n.o 33).

64

Além disso, o artigo 18.o, n.o 6, desse mesmo regulamento precisa que, se uma parte interessada não colaborar, ou colaborar apenas parcialmente, estando, desse modo, a ocultar informações pertinentes, o resultado poderá ser menos favorável para essa parte do que se tivesse colaborado.

65

Em circunstâncias que se caracterizavam por uma total falta de colaboração dos produtores‑exportadores, o Tribunal de Justiça entendeu que, embora o regulamento de base, e especialmente o seu artigo 13.o, n.o 3, estabelecesse o princípio segundo o qual o ónus da prova de uma evasão cabe às instituições da União, os n.os 1 e 6 do artigo 18.o deste regulamento visavam claramente flexibilizar esse ónus, ao prever que essas instituições podem basear as conclusões de um inquérito relativo à existência de uma evasão nos dados disponíveis e que as partes que não colaboraram correm o risco de ficar numa situação menos favorável do que se tivessem colaborado no referido inquérito (v., neste sentido, acórdão de 4 de setembro de 2014, Simon, Evers & Co., C‑21/13, EU:C:2014:2154, n.o 35).

66

O Tribunal de Justiça precisou a este respeito que resulta do artigo 18.o do regulamento de base que o legislador da União não pretendeu estabelecer uma presunção legal que permita deduzir diretamente da falta de colaboração das partes interessadas ou visadas a existência de uma evasão, dispensando, por conseguinte, as instituições da União do ónus da prova. Todavia, tendo em conta a possibilidade de estabelecer conclusões, inclusive definitivas, com base nos dados disponíveis e de tratar a parte que não colabora, ou que colabora apenas parcialmente, de maneira menos favorável do que se tivesse colaborado, é evidente que as instituições da União se podem basear num conjunto de indícios concordantes que permitam concluir pela existência de uma evasão na aceção do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base (acórdão de 4 de setembro de 2014, Simon, Evers & Co., C‑21/13, EU:C:2014:2154, n.o 36).

67

Qualquer outra solução poderia comprometer a eficácia das medidas de defesa comercial da União sempre que as instituições da União fossem confrontadas com a falta de colaboração no âmbito de um inquérito destinado a provar uma evasão (acórdão de 4 de setembro de 2014, Simon, Evers & Co., C‑21/13, EU:C:2014:2154, n.o 37).

68

No caso vertente, a falta de colaboração não diz respeito à totalidade, mas apenas a uma parte dos produtores‑exportadores. Ora, por um lado, o enunciado do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base não obsta a que as instituições da União Europeia possam declarar a existência de uma evasão às medidas antidumping com base num conjunto de indícios concordantes, na hipótese de os produtores‑exportadores que representem uma parte significativa das importações do produto em causa na União não terem colaborado, ou não terem colaborado de forma suficiente, no inquérito. Por outro lado, a necessidade de garantir a eficácia das medidas de defesa comercial justifica igualmente, em circunstâncias como as do caso vertente, que as referidas instituições estejam autorizadas a basear‑se nesse conjunto de indícios concordantes para concluir pela existência de uma evasão, na aceção desta disposição.

69

Embora as instituições da União estejam autorizadas a basear‑se nesse conjunto de indícios, nos termos do artigo 13.o, n.os 1 e 3, do regulamento de base, esses indícios devem demonstrar que os quatro requisitos enunciados no n.o 57 do presente acórdão estão preenchidos. Assim, no que diz respeito ao segundo destes requisitos, as instituições devem dispor de elementos que demonstrem que a alteração da configuração dos fluxos comerciais decorre de práticas, operações ou processos para os quais não exista um motivo suficiente ou outra justificação económica para além da instituição do direito.

ii) Quanto aos erros de direito na aplicação do regime jurídico do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base

70

É à luz das considerações anteriores que se deve determinar se, como sustentam a Maxcom, o Conselho e a Comissão, o raciocínio do Tribunal Geral peca por erros de direito na aplicação do artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base, na medida em que o Tribunal Geral declarou, no n.o 99 do acórdão recorrido, que o Conselho não podia concluir pela existência de transbordos por parte da City Cycle, e, seguidamente, deu provimento ao recurso e anulou o artigo 1.o, n.os 1 e 3, do regulamento controvertido na parte que diz respeito a esta sociedade.

71

Em substância, a Maxcom, o Conselho e a Comissão alegam, primeiro, que, ao contrário do que o Tribunal Geral afirmou, o Conselho pôde deduzir, acertadamente, no considerando 78 do regulamento controvertido, a existência dessas operações de transbordo a partir da constatação de que a City Cycle não era um verdadeiro produtor de bicicletas cingalês e não realizava operações de montagem para além dos limites fixados no artigo 13.o, n.o 2, do regulamento de base. Segundo, censuram o Tribunal Geral por ter exigido às instituições da União que demonstrem que cada produtor‑exportador do país objeto do inquérito realiza operações de transbordo, e, deste modo, ter invertido o ónus da prova. Terceiro, afirmam que, mesmo que as conclusões do Conselho relativas à existência de transbordos estivessem erradas, a anulação do regulamento controvertido não se justificava.

72

Com estes argumentos, a Maxcom, o Conselho e a Comissão põem em causa os n.os 98 e 99 do acórdão recorrido, em que o Tribunal Geral declarou, por um lado, que o Conselho não dispunha de qualquer indício para afirmar, no considerando 78 do regulamento controvertido, que a City Cycle efetuava operações de transbordo. Por outro lado, sublinhou que o facto de a City Cycle não ter conseguido demonstrar que era efetivamente um produtor de bicicletas cingalês ou que satisfazia os critérios previstos no artigo 13.o, n.o 2, do regulamento de base não permitia ao Conselho concluir, na falta de outras informações, que a City Cycle efetuava operações de transbordo.

73

Ao invés do que decorre tanto dos argumentos da Maxcom, do Conselho e da Comissão como do acórdão recorrido, o considerando 78 do regulamento controvertido não contém nenhuma análise individual de eventuais práticas de evasão por parte da City Cycle.

74

Assim, o referido considerando está incluído numa secção desse regulamento, intitulada «Transbordo», consagrada ao segundo dos quatro requisitos descritos no n.o 57 do presente acórdão. Nessa secção, o Conselho começou por indicar, no considerando 77 do regulamento controvertido, que, relativamente a três das seis empresas que tinham inicialmente colaborado no inquérito, este não revelara quaisquer práticas de transbordo. Relativamente às restantes exportações para a União, o Conselho precisou que não havia obtido colaboração. Seguidamente, no considerando 78 deste regulamento, o Conselho salientou, por um lado, que a alteração dos fluxos comerciais entre o Sri Lanca e a União havia sido estabelecida no considerando 58 e, por outro, que nem todos os produtores‑exportadores cingaleses se tinham dado a conhecer e/ou colaborado. Concluiu daí que as exportações provenientes destes produtores‑exportadores para a União se «deviam» a práticas de transbordo. Por último, no considerando 79 do mesmo regulamento, o Conselho declarou que se confirmava a existência de práticas de transbordo de produtos de origem chinesa através do Sri Lanca.

75

Por conseguinte, a conclusão relativa à existência de operações de transbordo diz respeito a todos os produtores‑exportadores que recusaram colaborar, e assenta numa dupla constatação, a saber, por um lado, a existência de uma alteração da configuração dos fluxos comerciais e, por outro, a falta de colaboração de uma parte dos produtores‑exportadores.

76

Ora, como decorre dos princípios enunciados nos n.os 65 a 69 do presente acórdão, essa dupla constatação não permitia concluir nem que a City Cycle estava envolvida em operações de transbordo enquanto produtor‑exportador individual, nem que essas práticas existiam à escala do Sri Lanca.

77

Com efeito, por um lado, embora as instituições da União estejam autorizadas, em caso de colaboração insuficiente, a basear‑se num conjunto de indícios concordantes para concluir pela existência de uma evasão, não existe nenhuma presunção legal que permita deduzir diretamente a existência dessa evasão a partir da falta de colaboração de uma parte interessada. Além disso, estas instituições devem dispor de indícios que provem que cada um dos quatro requisitos da existência de uma evasão, enunciados no n.o 57 do presente acórdão, está preenchido, incluindo o requisito relativo ao facto de a alteração da configuração dos fluxos comerciais decorrer de práticas de evasão. Conclui‑se que o Conselho não podia deduzir validamente a existência de práticas de transbordo a partir da simples falta de colaboração de uma parte dos produtores‑exportadores.

78

Por outro lado, uma vez que a alteração da configuração dos fluxos comerciais é o primeiro dos quatro requisitos que têm de ser preenchidos para demonstrar validamente a existência de uma evasão, o Conselho não se podia basear na constatação dessa existência como indício de que o segundo desses quatro requisitos, de acordo com o qual esta alteração deve decorrer de práticas de evasão, estava satisfeito.

79

Portanto, na medida em que a dupla constatação levada a cabo pelo Conselho no considerando 78 do regulamento controvertido não lhe permitia concluir validamente nem pelo envolvimento da City Cycle, enquanto produtor‑exportador, em operações de transbordo, nem pela existência dessas práticas no Sri Lanca, o Tribunal Geral não cometeu um erro de direito ao considerar, no n.o 99 do acórdão recorrido, que o Conselho não tinha podido concluir validamente pela existência de transbordos por parte da City Cycle, e ao dar provimento ao recurso e anular o artigo 1.o, n.os 1 e 3, do regulamento controvertido na parte que diz respeito a esta sociedade.

80

Além disso, contrariamente ao que afirmam o Conselho e a Comissão, nada no acórdão recorrido permite considerar que o Tribunal Geral pretendeu exigir às instituições da União que demonstrem que cada produtor‑exportador do país objeto do inquérito efetua operações de transbordo. Com efeito, ao declarar que o Conselho não podia concluir pela existência de transbordos por parte da City Cycle e ao anular parcialmente o regulamento controvertido, o Tribunal Geral limitou‑se a extrair as consequências do facto de as informações de que o Conselho dispunha, tal como descritas no considerando 78 do regulamento controvertido, não lhe permitirem concluir pela existência de operações de transbordo à escala do país e não constituírem uma base factual para implicar a City Cycle nessas operações.

81

Atendendo às considerações anteriores, o segundo grupo de fundamentos deve ser julgado improcedente.

Quanto aos fundamentos relativos a uma falta de fundamentação, a uma fundamentação contraditória e a uma desvirtuação dos factos

Argumentos das partes

82

No terceiro grupo de fundamentos, a Maxcom, o Conselho e a Comissão sustentam que o Tribunal Geral não cumpriu o seu dever de fundamentação. O Conselho invoca igualmente uma desvirtuação, pelo Tribunal Geral, dos factos submetidos à sua apreciação.

83

Em primeiro lugar, o Conselho e a Comissão sustentam que o acórdão recorrido não está suficientemente fundamentado, uma vez que o Tribunal Geral não explica o motivo pelo qual o Conselho violou o artigo 13.o, n.o 1, do regulamento de base. Com efeito, por um lado, os n.os 98 e 99 desse acórdão não permitem compreender se o erro imputado ao Conselho é um simples erro de apreciação ou um erro manifesto de apreciação. Por outro lado, o Tribunal Geral não explica os motivos pelos quais os elementos de prova submetidos à sua apreciação, incluindo os dados disponíveis, não lhe permitiam concluir que a City Cycle realizava atividades de transbordo.

84

Em segundo lugar, a Maxcom e a Comissão alegam que a fundamentação do acórdão recorrido é contraditória. Primeiro, a Maxcom alega que as conclusões que figuram nos n.os 98 e 99 do acórdão recorrido são contrariadas pelas conclusões do Tribunal Geral relativas ao segundo fundamento do recurso da City Cycle, em particular as considerações que figuram nos n.os 131 e 135 desse acórdão, segundo as quais o Tribunal Geral, por um lado, indicou que as informações fornecidas pela City Cycle eram insuficientes e, por outro, julgou improcedente a alegação de que o Conselho tinha violado o artigo 18.o do regulamento de base, o princípio da proporcionalidade e o dever de fundamentação no que respeita à constatação de falta de colaboração da City Cycle. Segundo, a Comissão afirma que decorre do n.o 97 do acórdão recorrido que os elementos de prova fornecidos pela City Cycle não permitiam demonstrar que era efetivamente um exportador de origem cingalesa ou que satisfazia os critérios previstos no artigo 13.o, n.o 2, do regulamento de base. A este respeito, a Comissão pergunta como é possível que estes elementos de prova, se indicam que a City Cycle cometeu uma evasão através de práticas de montagem, não demonstrem que está igualmente envolvida em operações transbordo. Terceiro, a Comissão censura o Tribunal Geral por ter afirmado, por um lado, que o Conselho não dispunha de nenhum indício que permitisse concluir que a City Cycle estava envolvida nessas operações de transbordo e, por outro, que existia um vasto corpo de dados disponíveis que permitia concluir pela existência de uma evasão pela City Cycle, no n.o 131 do acórdão recorrido.

85

Em terceiro lugar, o Conselho afirma que o Tribunal Geral desvirtuou os factos submetidos à sua apreciação. Primeiro, uma vez que o transbordo havia sido devidamente demonstrado ao nível do país e que a City Cycle não tinha direito a uma isenção, a única conclusão que o Tribunal Geral poderia ter retirado daí era que a City Cycle realizava operações de transbordo. Segundo, esta desvirtuação resulta igualmente dos n.os 83, 94, 97, 109, 112 e 121 do acórdão recorrido, relativos ao pedido de isenção da City Cycle, que excluem que esta tenha satisfeito os requisitos que devem estar preenchidos para que a montagem no país visado pelo inquérito confira aos produtos uma origem local.

86

A City Cycle contesta estes argumentos.

Apreciação do Tribunal de Justiça

87

Em primeiro lugar, quanto ao argumento relativo à insuficiência da fundamentação, cabe recordar que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a fundamentação de um acórdão deve evidenciar de forma clara e inequívoca o raciocínio do Tribunal Geral, de forma a permitir aos interessados conhecer as razões da decisão tomada e ao Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização jurisdicional (acórdão de 10 de abril de 2014, Areva e o./Comissão, C‑247/11 P e C‑253/11 P, EU:C:2014:257, n.o 54).

88

A este respeito, por um lado, a circunstância de os n.os 98 e 99 do acórdão recorrido não indicarem se o erro cometido pelo Conselho é um simples erro de apreciação ou um erro manifesto de apreciação não pode, em caso algum, conduzir à anulação do acórdão recorrido.

89

Importa recordar que o Tribunal de Justiça declarou que a fiscalização, pelo Tribunal Geral, dos elementos probatórios em que as instituições da União se baseiam para as suas conclusões não constitui uma nova apreciação dos factos que substitui a dessas instituições. Essa fiscalização não se sobrepõe ao amplo poder de apreciação destas instituições no domínio da política comercial, antes se limita a referir se esses elementos são suscetíveis de sustentar as conclusões a que chegaram as instituições. Com efeito, cabe ao Tribunal Geral verificar não só a exatidão material dos elementos de prova invocados, a sua fiabilidade e a sua coerência, mas também se estes elementos constituem a totalidade dos dados pertinentes que devem ser tomados em consideração para apreciar uma situação complexa e se são suscetíveis de fundamentar as conclusões que deles se retiram (v., neste sentido, acórdão de 7 de abril de 2016, ArcelorMittal Tubular Products Ostrava e o./Hubei Xinyegang Steel, C‑186/14 P e C‑193/14 P, EU:C:2016:209, n.os 35 e 36 e jurisprudência aí referida).

90

Ora, no caso vertente, como decorre do n.o 79 do presente acórdão, o Tribunal Geral constatou, sem cometer um erro de direito, que os elementos em que o Conselho baseou a sua conclusão relativa à existência de práticas de transbordo à escala do Sri Lanca não eram suscetíveis de sustentar esta conclusão. À luz da jurisprudência citada no número anterior do presente acórdão, decorre implícita mas necessariamente do n.o 98 do acórdão recorrido que o Tribunal Geral estabeleceu, nesse mesmo número, um erro manifesto de apreciação.

91

Por outro lado, quanto ao facto de o Tribunal Geral não explicar as razões pelas quais os elementos de prova produzidos perante ele não permitiam concluir que a City Cycle tinha realizado operações de transbordo, basta referir que esse argumento carece de suporte factual, uma vez que o Tribunal Geral explicou essas razões. Assim, o Tribunal Geral indicou, nos n.os 98 e 99 do acórdão recorrido, por um lado, que o Conselho não dispunha de nenhum indício que lhe permitisse chegar a tal conclusão, e, por outro, que a referida conclusão não podia ser deduzida da circunstância de a sociedade não ter demonstrado que era efetivamente um exportador de origem cingalesa ou que respondia aos critérios previstos pelo artigo 13.o, n.o 2, do regulamento de base.

92

Conclui‑se que o argumento relativo à insuficiência de fundamentação do acórdão recorrido deve ser julgado improcedente.

93

Em segundo lugar, no que respeita à existência de alegadas contradições no acórdão recorrido, cabe referir, primeiro, que as conclusões que figuram nos n.os 98 e 99 do acórdão recorrido não são, de modo algum, contrariadas pelas conclusões relativas ao segundo fundamento, nas quais o Tribunal Geral, por um lado, indicou que as informações fornecidas pela City Cycle eram insuficientes e, por outro, julgou improcedente a alegação de que o Conselho tinha violado o artigo 18.o do regulamento de base, o princípio da proporcionalidade e o dever de fundamentação no que respeita à constatação de falta de colaboração da City Cycle. Com efeito, como decorre do n.o 66 do presente acórdão, embora, em caso de colaboração insuficiente, as instituições da União estejam autorizadas a basear‑se num conjunto de indícios concordantes que permitam concluir pela existência de uma evasão, não existe nenhuma presunção legal que permita deduzir diretamente a existência dessa evasão da falta de colaboração de uma parte interessada.

94

Segundo, no que respeita ao argumento relativo ao n.o 97 do acórdão recorrido e ao facto de os elementos de prova indicarem que a City Cycle cometeu uma evasão às medidas antidumping através de práticas de montagem, basta observar que o acórdão recorrido não contém nenhuma constatação relativa à existência de operações de montagem por esta sociedade, pelo que este argumento não tem suporte factual.

95

Terceiro, quanto à alegada contradição entre as considerações segundo as quais, por um lado, o Conselho não dispunha de nenhum indício que permitisse concluir que a City Cycle estava envolvida em operações de transbordo, e, por outro, existia um vasto corpo de dados disponíveis que permitiam chegar a esta conclusão, impõe‑se referir que este argumento assenta numa leitura errada do acórdão recorrido. Com efeito, no n.o 131 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral julgou improcedente uma alegação da City Cycle relativa a uma violação do dever de fundamentação pelo Conselho na medida em que este não tinha explicado qual a natureza dos dados disponíveis, na aceção do artigo 18.o, n.o 1, do regulamento de base, que tivera em conta. Portanto, ao contrário do que afirma a Comissão, o Tribunal Geral não concluiu, de modo algum, naquele número que os dados disponíveis permitiam concluir pela existência de uma evasão. Assim, não se verifica nenhuma contradição entre as considerações que figuram nos n.os 131 e 135 do acórdão recorrido.

96

Por conseguinte, o argumento segundo o qual a fundamentação do acórdão recorrido é contraditória deve ser julgado improcedente.

97

Em terceiro lugar, no que respeita à desvirtuação dos factos invocada pelo Conselho, importa referir, primeiro, que, ao invés do que esta instituição sustenta, decorre do n.o 79 do presente acórdão que não se pode considerar que ficou devidamente demonstrada a existência de transbordo à escala do país. Segundo, embora sustente que essa desvirtuação decorre igualmente das considerações do acórdão recorrido relativas ao pedido de isenção do City Cycle, as quais excluem que esta sociedade tenha satisfeito os requisitos que deviam estar preenchidos para que a montagem no país visado pelo inquérito conferisse aos produtos uma origem local, o Conselho não precisa em que medida o Tribunal Geral tinha desvirtuado os factos submetidos à sua apreciação. Por conseguinte, este argumento do Conselho deve ser julgado improcedente.

98

Portanto, o argumento relativo à existência de uma desvirtuação dos factos bem como o terceiro grupo de fundamentos devem ser julgados improcedentes na totalidade.

Quanto ao fundamento da Comissão relativo a uma violação dos seus direitos processuais

Argumentos das partes

99

A Comissão alega que o Tribunal Geral violou os seus direitos processuais, na medida em que lhe proibiu apresentar alegações de intervenção. A este respeito, desde logo, esta instituição recorda que o Tribunal entendeu deferir o pedido de tramitação acelerada, que, nos termos do artigo 76.o‑A, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, na sua versão em vigor no momento da tramitação do processo nesse órgão jurisdicional, exclui todas as intervenções escritas da Comissão. Ora, a decisão daquele órgão jurisdicional de deferir o benefício desse tipo de tramitação carece de justificação. Assim, o Tribunal Geral demorou 19,3 meses para proferir o seu acórdão, quando a duração média de um processo nesse órgão jurisdicional era de 23,4 meses em 2014.

100

Seguidamente, a Comissão precisa que, quando se tornou evidente que processo era muito mais complexo do que o Tribunal Geral tinha previsto, pediu autorização para apresentar alegações de intervenção, no âmbito de uma medida de organização do processo. Ora, esse pedido tinha sido indeferido, em 9 de julho de 2014, sem nenhuma justificação. Além disso, tendo em conta a duração efetiva do processo no Tribunal Geral, a recusa persistente deste último em autorizar a Comissão a apresentar observações escritas não se tinha justificado pela necessidade de acelerar o tratamento do processo.

101

Por último, a Comissão considera que as constatações do Tribunal Geral que, segundo ela, constituem erros de direito estão relacionadas com as suas atividades de inquérito. Essas constatações teriam sido diferentes se tivesse sido autorizada a expressar a sua posição antes da audiência.

102

A City Cycle contesta estes argumentos.

Apreciação do Tribunal de Justiça

103

Em primeiro lugar, quanto ao argumento relativo à oportunidade da decisão do Tribunal Geral de conceder o benefício da tramitação acelerada, em conformidade com o artigo 76.o‑A, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, na sua versão em vigor no momento da tramitação do processo nesse órgão jurisdicional, importa sublinhar que, nos termos do artigo 116.o, n.o 3, do Regulamento de Processo, o interveniente aceita o processo no estado em que este se encontra no momento da sua intervenção.

104

Ora, no caso vertente, a Comissão entregou o seu pedido de intervenção na Secretaria do Tribunal Geral em 17 de outubro de 2013, quando o pedido de tramitação acelerada formulado pela City Cycle tinha sido deferido por decisão de 8 de outubro de 2013.

105

Por conseguinte, a Comissão estava obrigada a aceitar o processo no estado em que se encontrava no momento da sua intervenção e não podia contestar a decisão de julgar segundo tramitação acelerada.

106

Em segundo lugar, no que respeita à recusa oposta pelo Tribunal Geral ao pedido de medidas de organização do processo apresentado pela recorrente, recorde‑se que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o Tribunal Geral é, em princípio, o único juiz da eventual necessidade de completar os elementos de informação de que dispõe sobre os processos que lhe são submetidos (v. acórdão de 9 de junho de 2016, PROAS/Comissão, C‑616/13 P, EU:C:2016:415, n.o 66 e jurisprudência aí referida). O caráter probatório ou não dos elementos dos autos é do foro da sua apreciação soberana dos factos, que escapa à fiscalização do Tribunal de Justiça em sede de recurso, salvo no caso de desvirtuação dos elementos de prova apresentados no Tribunal Geral ou quando a inexatidão material dos factos apurados por este último resulta dos documentos juntos aos autos (v., neste sentido, acórdão de 28 de janeiro de 2016, Heli‑Flight/AESA, C‑61/15 P, não publicado, EU:C:2016:59, n.o 94 e jurisprudência aí referida).

107

Ora, no caso vertente, a Comissão não invoca uma desvirtuação dos elementos de prova apresentados no Tribunal Geral ou uma inexatidão material dos factos apurados por este último. Conclui‑se que a Comissão não pode contestar validamente a recusa oposta pelo Tribunal Geral ao seu pedido de medidas de organização do processo.

108

Em terceiro lugar, embora afirme que as constatações do Tribunal Geral teriam sido diferentes se tivesse sido autorizada a expressar a sua posição antes da audiência, a Comissão não precisa nem quais são as constatações do Tribunal Geral por ela visadas nem as razões pelas quais essas constatações teriam sido diferentes.

109

Consequentemente, o presente fundamento deve ser julgado improcedente.

110

Face às considerações anteriores, há que negar provimentos aos presentes recursos.

Quanto às despesas

111

Nos termos do artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso for julgado improcedente, este decidirá sobre as despesas. Por força do disposto no artigo 138.o, n.o 1, desse regulamento, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do seu artigo 184.o, n.o 1, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido.

112

Uma vez que a Maxcom, o Conselho e a Comissão foram vencidos e que a City Cycle pediu a sua condenação nas despesas, há que condená‑los nas despesas em primeira instância no processo T‑413/13, bem como nas despesas nos presentes recursos.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) decide:

 

1)

É negado provimento aos recursos nos processos C‑248/15 P, C‑254/15 P e C‑260/15 P.

 

2)

A Maxcom Ltd, o Conselho da União Europeia e a Comissão Europeia suportarão, além das suas próprias despesas, as despesas efetuadas pela City Cycle Industries em primeira instância no processo T‑413/13, bem como nos presentes recursos.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

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