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Document 62015CC0002(01)

Conclusões da advogada-geral E. Sharpston apresentadas em 21 de dezembro de 2016.
Parecer proferido nos termos do artigo 218.°, n.° 11, TFUE.
Parecer proferido nos termos do artigo 218.°, n.° 11, TFUE — Acordo de Comércio Livre entre a União Europeia e a República de Singapura — Acordo “nova geração” negociado após a entrada em vigor dos Tratados UE e FUE — Competência para celebrar o acordo — Artigo 3.°, n.° 1, alínea e), TFUE — Política comercial comum — Artigo 207.°, n.° 1, TFUE — Comércio de mercadorias e serviços — Investimentos estrangeiros diretos — Contratos públicos — Aspetos comerciais da propriedade intelectual — Concorrência — Comércio com os Estados terceiros e desenvolvimento sustentável — Proteção social dos trabalhadores — Proteção do ambiente — Artigo 207.°, n.° 5, TFUE — Serviços no domínio dos transportes — Artigo 3.°, n.° 2, TFUE — Acordo internacional suscetível de afetar regras comuns ou de alterar o seu alcance — Regras de direito derivado da União em matéria de livre prestação de serviços no domínio dos transportes — Investimentos estrangeiros diferentes de investimentos diretos — Artigo 216.° TFUE — Acordo necessário para alcançar um dos objetivos dos Tratados — Livre circulação de capitais e de pagamentos entre Estados‑Membros e Estados terceiros — Sucessão de tratados em matéria de investimento — Substituição dos acordos de investimento entre os Estados‑Membros e a República de Singapura — Disposições institucionais do acordo — Resolução de litígios entre investidores e o Estado — Resolução de litígios entre as Partes.
Parecer 2/15.

Court reports – general ; Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:992

CONCLUSÕES DA ADVOGADA-GERAL

ELEANOR SHARPSTON

apresentadas em 21 de dezembro de 2016 ( 1 )

Parecer 2/15

Pedido de parecer apresentado pela Comissão Europeia

«Pedido de parecer nos termos do artigo 218.o, n.o 11, TFUE — Celebração do Acordo de Comércio Livre entre a União Europeia e a República de Singapura — Repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros»

Índice

 

1. 

A Comissão Europeia solicita um parecer ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 218.o, n.o 11, TFUE, sobre a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros no que diz respeito à celebração do Acordo de comércio livre que a União Europeia projeta celebrar com a República de Singapura (a seguir «EUSFTA») ( 2 ). O texto do EUSFTA negociado pela Comissão prevê que este deve ser celebrado como um acordo entre a União Europeia e a República de Singapura (a seguir «Singapura»), sem a participação dos Estados‑Membros. A Comissão pergunta ao Tribunal de Justiça se esta abordagem está correta.

2. 

A Comissão alega que a União Europeia dispõe de competência exclusiva para celebrar o EUSFTA. Afirma que a maior parte desse acordo é abrangida pela competência que o artigo 207.o TFUE confere à UE no domínio da política comercial comum, que é uma competência exclusiva (artigo 3.o, n.o 1, alínea e), TFUE), e que a competência exclusiva da União Europeia para celebrar outras partes do acordo decorre de um ato legislativo que lhe confere poderes para o fazer (primeiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE) ou do facto de a celebração do EUSFTA ser suscetível de afetar regras comuns ou alterar o seu alcance (terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE). O Parlamento Europeu concorda, de um modo geral, com a Comissão. Todas as outras partes no presente processo que apresentaram observações contrapõem que a União Europeia não pode celebrar o referido acordo sozinha porque determinadas partes do EUSFTA são abrangidas pela competência partilhada entre a União Europeia e os Estados‑Membros, se não mesmo pela competência exclusiva dos Estados‑Membros. Daqui decorre que os Estados‑Membros devem ser igualmente partes no EUSFTA.

3. 

O EUSFTA faz parte de uma nova geração de acordos de comércio e investimento negociados ou em processo de negociação entre a União Europeia e parceiros comerciais de outras regiões do mundo. Não se trata de um «acordo homogéneo»: não abrange um domínio ou um assunto específico nem prossegue um único objetivo. Procura alcançar, em especial, a liberalização do comércio e do investimento e garante determinadas normas de proteção de forma a conciliar objetivos económicos e não económicos. Embora se baseie em regras existentes, constantes dos acordos da Organização Mundial do Comércio (a seguir «OMC») ( 3 ), o EUSFTA amplia igualmente essas regras e abrange matérias que (ainda) não fazem parte desses acordos.

4. 

Para determinar se a União Europeia pode celebrar o EUSFTA sem os Estados‑Membros, é necessário, antes de mais, compreender claramente as matérias que este acordo abrange e os objetivos que prossegue ( 4 ). Essa compreensão servirá depois de base para a aplicação das diversas regras do Tratado relativas à atribuição de competências à União Europeia e à natureza dessas competências. Ao fazê‑lo, há que aplicar as regras estabelecidas no artigo 3.o, n.o 1, TFUE (relativo à competência exclusiva expressa) antes de aplicar as regras previstas no artigo 3.o, n.o 2, TFUE (relativo à competência exclusiva implícita ( 5 )) e, se for caso disso, no artigo 4.o TFUE (relativo à competência partilhada).

O EUSFTA

5.

Em dezembro de 2006, a Comissão recomendou ao Conselho da União Europeia que a autorizasse a negociar um acordo de comércio livre com os países da Associação das Nações do Sudeste Asiático («ASEAN»), em nome da Comunidade Europeia e dos Estados‑Membros. Em abril de 2007, o Conselho autorizou a Comissão a iniciar as negociações. As negociações relativas a um acordo entre regiões revelaram‑se difíceis e foram, por conseguinte, suspensas. A Comissão sugeriu então que se avançasse com acordos de comércio livre bilaterais com os países relevantes da ASEAN, começando por Singapura. Em dezembro de 2009, o Conselho, baseando‑se nas diretrizes de negociação que emitira para as negociações com a ASEAN, autorizou a Comissão a negociar um acordo de comércio com Singapura. Essas negociações tiveram início em março de 2010. Em setembro de 2011, o Conselho modificou as diretrizes de negociação de forma a acrescentar o investimento à lista de tópicos previstos. Nessa ocasião, o Conselho declarou que o objetivo era que o capítulo do acordo relativo ao investimento abrangesse domínios de competência partilhada, como o investimento de carteira ( 6 ), a resolução de litígios bem como a propriedade e a expropriação.

6.

Em 20 de setembro de 2013, a União Europeia (por intermédio da Comissão) e Singapura rubricaram o texto do EUSFTA (o que significa que o aceitaram como definitivo), com exceção do capítulo relativo ao investimento. O texto foi disponibilizado ao público no mesmo dia.

7.

Quando se tornou claro que esse texto previa a assinatura e a celebração do EUSFTA pela União Europeia sem a participação dos Estados‑Membros, o Comité da Política Comercial (um comité designado pelo Conselho nos termos do artigo 207.o, n.o 3, TFUE) submeteu a questão, em fevereiro de 2014, ao Comité de Representantes Permanentes («COREPER»). O Comité da Política Comercial convidou o COREPER a confirmar o procedimento de assinatura e a de celebração do EUSFTA e solicitou‑lhe que convidasse a Comissão, enquanto negociador em nome da União Europeia e dos Estados‑Membros, a adaptar o texto ao caráter misto desse tipo de acordo. O COREPER referiu que existia um claro consenso entre as delegações no sentido de que o EUSFTA devia ser assinado e celebrado como um acordo misto, o que significa que tanto a União Europeia como os Estados‑Membros deviam ser partes nesse acordo.

8.

As negociações sobre o capítulo relativo ao investimento ficaram concluídas em outubro de 2014. Em junho de 2015, a Comissão enviou ao Comité da Política Comercial o texto consolidado do capítulo relativo ao investimento e referiu que o acordo já tinha sido rubricado na íntegra.

9.

O EUSFTA é constituído por um preâmbulo, dezassete capítulos, um protocolo e cinco memorandos de entendimento.

10.

O capítulo um («Objetivos e definições gerais») dispõe que o EUSFTA tem como objetivos criar uma zona de comércio livre nos termos do artigo XXIV do GATT de 1994 ( 7 ) e do artigo V do GATS ( 8 ), bem como liberalizar e facilitar o comércio e o investimento entre as Partes, em conformidade com o disposto no EUSFTA.

11.

O capítulo dois («Tratamento nacional e acesso ao mercado das mercadorias») começa por reiterar a obrigação das Partes de concederem o tratamento nacional ( 9 ) nos termos do artigo III do GATT de 1994 (que esse capítulo incorpora no EUSFTA). Estabelece igualmente obrigações relativas a medidas não pautais. Outras disposições dizem respeito à disponibilização e intercâmbio de informações, de notificações e de verificações, bem como à aplicação das medidas abrangidas.

12.

O capítulo três («Recursos em matéria comercial») estabelece obrigações relativas, por um lado, a medidas antidumping e de compensação e, por outro lado, a dois tipos de salvaguardas (medidas globais de salvaguarda e medidas bilaterais de salvaguarda).

13.

O capítulo quatro («Obstáculos técnicos ao comércio») tem como objetivo facilitar e intensificar o comércio de mercadorias entre as Partes mediante a criação de um quadro para a prevenção, a identificação e a eliminação de obstáculos técnicos desnecessários ao comércio abrangido pelo Acordo OTC (que faz parte integrante do EUSFTA).

14.

O capítulo cinco («Medidas sanitárias e fitossanitárias») tem como objeto a) proteger a vida e a saúde das pessoas e dos animais e preservar os vegetais nos respetivos territórios das partes, facilitando ao mesmo tempo o comércio entre as Partes no domínio das medidas sanitárias e fitossanitárias («MSF»); b) colaborar para a prossecução da aplicação do Acordo sobre a Aplicação de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias («Acordo MSF»); e c) prever uma forma de melhorar a comunicação, a cooperação e a resolução de questões relativas à aplicação das MSF que afetam o comércio entre as Partes.

15.

No capítulo seis («Alfândegas e facilitação do comércio»), as Partes reconhecem a importância das questões aduaneiras e da facilitação do comércio no contexto evolutivo do comércio mundial e reforçam a sua cooperação nesta área. Este capítulo estabelece os princípios nos quais devem assentar as disposições e os procedimentos aduaneiros das Partes.

16.

Os objetivos do capítulo sete («Obstáculos não pautais ao comércio e investimentos na produção de energia renovável») são promover, desenvolver e aumentar a produção de energia a partir de fontes renováveis e fontes não fósseis sustentáveis («energia verde»), em especial através da facilitação do comércio e do investimento. Este capítulo aplica‑se às medidas que podem afetar o comércio e o investimento entre as Partes no que respeita à produção de energia verde, mas não aos produtos a partir dos quais a energia é gerada.

17.

No capítulo oito («Serviços, estabelecimento e comércio eletrónico»), as Partes reafirmam os respetivos compromissos nos termos do Acordo OMC ( 10 ). Este capítulo estabelece as disposições necessárias à liberalização progressiva e recíproca do comércio de serviços, ou seja, a prestação transfronteiras de serviços com origem no território de uma parte e com destino ao território da outra parte e no território de uma parte a um consumidor de serviços da outra parte, ao estabelecimento, e à presença temporária de pessoas singulares por motivos profissionais. Aborda o comércio eletrónico separadamente. Contém igualmente disposições relativas à regulamentação interna de serviços de informática, serviços postais, serviços de telecomunicações, serviços financeiros e serviços de transporte marítimo internacional.

18.

O capítulo nove («Investimento») é constituído por duas partes.

19.

A secção A contém as disposições materiais sobre proteção dos investimentos. Para efeitos deste capítulo, entende‑se por «investimento»«todo o tipo de ativos que possuem as características de um investimento, tais como a afetação de capitais ou de outros recursos, a expectativa de ganhos ou lucros, a assunção de risco e uma determinada duração». Os principais requisitos dizem respeito ao tratamento nacional, ao tratamento justo e equitativo, bem como à plena proteção e segurança, assim como à indemnização por perdas devido a situações de guerra ou outro conflito armado, revolução, estado de emergência nacional, rebelião, insurreição ou motim no território da outra Parte. A secção A dispõe igualmente que nenhuma das Partes deve, direta ou indiretamente, nacionalizar, expropriar ou sujeitar a medidas com efeito equivalente à nacionalização ou expropriação os investimentos dos investidores da outra Parte abrangidos por essa secção, salvo se se verificarem determinadas condições. Além disso, cada Parte deve permitir que todas as transferências relacionadas com um investimento abrangido pelo capítulo nove sejam efetuadas numa moeda livremente convertível, sem restrições nem atrasos. Quando o EUSFTA entrar em vigor, os acordos bilaterais entre Estados‑Membros e Singapura constantes do anexo 9‑D deixam de produzir efeitos e devem ser anulados e substituídos pelo EUSFTA.

20.

A secção B institui um mecanismo de «resolução de litígios entre investidores e o Estado» («RLIE»). Este mecanismo, que pode incluir a arbitragem, aplica‑se aos litígios que oponham um nacional de uma Parte à outra Parte devido a um tratamento (incluindo uma omissão) que o demandante considere contrário às disposições da secção A e que lhe tenha alegadamente provocado prejuízos ou danos ou à sua empresa estabelecida localmente. Uma disposição separada refere que, em princípio, cada Parte se deve abster de conceder proteção diplomática ou apresentar um pedido a nível internacional relativo a um litígio que um dos seus investidores e a outra Parte aceitaram submeter ou submeteram a arbitragem em aplicação da secção B do capítulo nove.

21.

O capítulo dez («Contratos Públicos») é aplicável a qualquer medida respeitante aos contratos abrangidos pelo acordo, ou seja, todos os contratos públicos adjudicados por uma entidade referida no acordo, cujo valor seja superior a um determinado limiar.

22.

O capítulo onze («Propriedade intelectual») estabelece direitos e obrigações no que diz respeito a sete categorias de direitos de propriedade intelectual que são igualmente abrangidas pelo acordo TRIPS e a uma categoria que não é abrangida por esse acordo, designadamente os direitos de proteção das variedades vegetais. A estrutura desta secção é semelhante à do Acordo TRIPS: cada subsecção aborda um direito de propriedade intelectual abrangido pelo EUSFTA e contém igualmente direitos e obrigações previstos noutros acordos multilaterais (alguns dos quais integram o Acordo TRIPS, outros não).

23.

O capítulo doze («Concorrência e questões conexas») centra‑se na importância de uma concorrência livre e não distorcida nas relações comerciais entre as Partes. Estabelece princípios relativos a atividades antitrust e concentrações, empresas públicas, empresas que beneficiam de direitos especiais ou exclusivos, bem como a monopólios estatais e subvenções.

24.

O capítulo treze («Comércio e desenvolvimento sustentável») diz respeito ao compromisso assumido pelas Partes no sentido de desenvolverem e promoverem o comércio internacional e as suas relações comerciais e económicas bilaterais de modo a contribuir para o desenvolvimento sustentável. As obrigações principais impõem a cada Parte que estabeleça os seus próprios níveis de proteção em matéria de ambiente e de trabalho e que adote ou altere as respetivas legislações e políticas aplicáveis em conformidade, de acordo com os princípios das normas internacionalmente reconhecidas ou dos acordos nos quais sejam partes. Este capítulo inclui igualmente outras obrigações relativas ao comércio de madeira e de produtos conexos, bem como de produtos da pesca, assim como disposições específicas aplicáveis à resolução de litígios.

25.

O capítulo catorze («Transparência») impõe certas obrigações às Partes a fim de que instaurem um quadro normativo transparente e previsível para os operadores económicos, forneçam esclarecimentos e prevejam disposições melhoradas para efeitos de transparência, de consulta, e de uma melhor administração das medidas de aplicação geral. Essas obrigações aplicam‑se, em princípio, sem prejuízo de regras mais específicas constantes de outros capítulos do EUSFTA.

26.

O capítulo quinze («Resolução de litígios») define as regras de aplicação geral destinadas à prevenção e à resolução de quaisquer diferendos que possam ocorrer entre as Partes sobre a interpretação e a aplicação do EUSFTA, e à obtenção, na medida do possível, de uma solução mutuamente acordada. As várias fases do procedimento de resolução de litígios são: pedido de realização de consultas (pedido de) constituição de um painel de arbitragem, emissão de um relatório intercalar e adoção da decisão final. Outras disposições regulam o procedimento de execução e as medidas destinadas a garantir o cumprimento da decisão.

27.

O capítulo dezasseis («Mecanismo de mediação») estabelece um mecanismo de mediação com o objetivo de facilitar a procura de uma solução mutuamente acordada através de um procedimento abrangente e rápido, com a assistência de um mediador. Salvo disposição em contrário, este capítulo é aplicável a qualquer medida abrangida pelo âmbito de aplicação do EUSFTA que possa afetar negativamente o comércio e o investimento entre as Partes.

28.

O capítulo dezassete («Disposições institucionais, gerais e finais») contém três categorias de disposições. A primeira categoria cria uma estrutura institucional constituída por vários comités nos quais as Partes se devem reunir para supervisionar e facilitar a aplicação e a execução do EUSFTA. A segunda categoria abrange a tomada de decisões, as alterações, a entrada em vigor, o efeito direto, a adesão, a aplicação territorial do EUSFTA, os vários anexos e outros textos que fazem parte integrante do EUSFTA e as versões do texto do EUSFTA que fazem fé. A terceira categoria diz respeito a aspetos de direito material, que incluem a fiscalidade, a balança de transações correntes e a circulação de capitais, os fundos soberanos, as restrições destinadas à salvaguarda do equilíbrio da balança de pagamentos e as exceções por razões de segurança.

29.

Em anexo ao texto dos capítulos do EUSFTA encontra‑se um protocolo sobre as regras de origem e os memorandos de entendimento relativos ao artigo 17.6 (fiscalidade), à remuneração dos árbitros, a disposições suplementares em matéria aduaneira, ao reconhecimento mútuo dos programas relativos aos operadores económicos autorizados e aos condicionalismos específicos de Singapura em matéria de espaço ou de acesso aos recursos naturais.

30.

O anexo às presentes conclusões inclui um resumo mais pormenorizado do EUSFTA. A finalidade desse anexo não é resumir todos os aspetos do EUSFTA, mas sim fornecer um resumo dos principais pontos que são relevantes para as presentes conclusões. Tanto a descrição do pedido e as observações das partes no presente processo como a minha análise do pedido devem ser lidas juntamente com esse anexo.

Direito da União

Tratado da União Europeia

31.

O artigo 5.o TUE estabelece o princípio da atribuição, de acordo com o qual as competências não atribuídas à União Europeia nos Tratados pertencem aos Estados‑Membros ( 11 ). O artigo 5.o, n.o 2, TUE dispõe que «[…] a União atua unicamente dentro dos limites das competências que os Estados‑Membros lhe tenham atribuído nos Tratados para alcançar os objetivos fixados por estes últimos» e que «[a]s competências que não sejam atribuídas à União nos Tratados pertencem aos Estados‑Membros».

32.

O artigo 21.o, n.o 2, TUE refere‑se aos princípios que a União Europeia deve respeitar e aos objetivos que deve prosseguir na definição e prossecução de políticas comuns e ações. Os mesmos princípios e objetivos são aplicáveis à elaboração e à execução da ação externa da União Europeia e das suas outras políticas nos seus aspetos externos (artigo 21.o, n.o 3, TUE). Esses objetivos incluem «[i]ncentivar a integração de todos os países na economia mundial, inclusivamente através da eliminação progressiva dos obstáculos ao comércio internacional» [artigo 21.o, n.o 2, alínea e), TUE)] e «[c]ontribuir para o desenvolvimento de medidas internacionais para preservar e melhorar a qualidade do ambiente e a gestão sustentável dos recursos naturais à escala mundial, a fim de assegurar um desenvolvimento sustentável» [artigo 21.o, n.o 2, alínea f), TUE].

Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia

33.

O artigo 2.o TFUE dispõe, em especial:

«1.   Quando os Tratados atribuam à União competência exclusiva em determinado domínio, só a União pode legislar e adotar atos juridicamente vinculativos; os próprios Estados‑Membros só podem fazê‑lo se habilitados pela União ou a fim de dar execução aos atos da União.

2.   Quando os Tratados atribuam à União competência partilhada com os Estados‑Membros em determinado domínio, a União e os Estados‑Membros podem legislar e adotar atos juridicamente vinculativos nesse domínio. Os Estados‑Membros exercem a sua competência na medida em que a União não tenha exercido a sua [ ( 12 ) ]. Os Estados‑Membros voltam a exercer a sua competência na medida em que a União tenha decidido deixar de exercer a sua.

[…]»

34.

O artigo único do Protocolo n.o 25 ( 13 ) relativo ao exercício das competências partilhadas dispõe: «Relativamente ao n.o 2 do artigo 2.o [TFUE], referente às competências partilhadas, quando a União toma medidas num determinado domínio, o âmbito desse exercício de competências apenas abrange os elementos regidos pelo ato da União em causa e, por conseguinte, não abrange o domínio na sua totalidade».

35.

O artigo 3.o, n.o 1, TFUE descreve os domínios nos quais a União Europeia dispõe de competência exclusiva, designadamente:

«a)

União aduaneira;

[…]

d)

Conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da política comum das pescas;

e)

Política comercial comum.»

36.

Nos termos do artigo 3.o, n.o 2, TFUE, a União Europeia dispõe igualmente de competência exclusiva para celebrar acordos internacionais «quando tal celebração esteja prevista num ato legislativo da União [primeiro pressuposto], seja necessária para lhe dar a possibilidade de exercer a sua competência interna [segundo pressuposto], ou seja suscetível de afetar regras comuns ou de alterar o alcance das mesmas [terceiro pressuposto]».

37.

O artigo 4.o TFUE diz respeito às competências partilhadas e dispõe:

«1.   A União dispõe de competência partilhada com os Estados‑Membros quando os Tratados lhe atribuam competência em domínios não contemplados nos artigos 3.° e 6.° [ ( 14 ) ].

2.   As competências partilhadas entre a União e os Estados‑Membros aplicam‑se aos principais domínios a seguir enunciados:

a)

Mercado interno;

b)

Política social, no que se refere aos aspetos definidos no presente Tratado;

[…]

d)

Agricultura e pescas, com exceção da conservação dos recursos biológicos do mar;

e)

Ambiente;

[…]

g)

Transportes;

[…]

i)

Energia;

[…]»

38.

De acordo com o artigo 9.o TFUE, que faz parte das disposições de aplicação geral, na definição e execução das suas políticas e ações, a União Europeia «tem em conta as exigências relacionadas com a promoção de um nível elevado de emprego [e] a garantia de uma proteção social adequada […]».

39.

O artigo 11.o TFUE (que faz igualmente parte das disposições de aplicação geral) dispõe que «[a]s exigências em matéria de proteção do ambiente devem ser integradas na definição e execução das políticas e ações da União, em especial com o objetivo de promover um desenvolvimento sustentável».

40.

O título I da parte V do TFUE, que inclui os artigos 205.° a 207.° TFUE, contém disposições gerais relativas à ação externa da União Europeia.

41.

O artigo 206.o TFUE dispõe que, «[c]om a instituição de uma união aduaneira nos termos dos artigos 28.° a 32.°, a União contribui, no interesse comum, para o desenvolvimento harmonioso do comércio mundial, para a supressão progressiva das restrições às trocas internacionais e aos investimentos estrangeiros diretos e para a redução das barreiras alfandegárias e de outro tipo».

42.

O artigo 207.o, n.o 1, TFUE dispõe:

«A política comercial comum assenta em princípios uniformes, designadamente no que diz respeito às modificações pautais, à celebração de acordos pautais e comerciais sobre comércio de mercadorias e serviços, e aos aspetos comerciais da propriedade intelectual, ao investimento estrangeiro direto, à uniformização das medidas de liberalização, à política de exportação, bem como às medidas de defesa comercial, tais como as medidas a tomar em caso de dumping e de subsídios. A política comercial comum é conduzida de acordo com os princípios e objetivos da ação externa da União.»

43.

De acordo com o artigo 207.o, n.o 5, TFUE, «[a] negociação e celebração de acordos internacionais no domínio dos transportes estão sujeitas às disposições do título VI da parte III [que incluem as disposições relativas à política comum de transportes] e do artigo 218.o».

44.

O artigo 207.o, n.o 6, TFUE dispõe que «[o] exercício das competências atribuídas pelo presente artigo no domínio da política comercial comum não afeta a delimitação de competências entre a União e os Estados‑Membros, nem conduz à harmonização das disposições legislativas ou regulamentares dos Estados‑Membros, na medida em que os Tratados excluam essa harmonização».

45.

O artigo 216.o TFUE precisa em que condições a União Europeia pode celebrar acordos internacionais com um ou mais países terceiros. Nos termos do artigo 216.o, n.o 1, TFUE, pode fazê‑lo «quando os Tratados o prevejam [primeiro pressuposto] ou quando a celebração de um acordo seja necessária para alcançar, no âmbito das políticas da União, um dos objetivos estabelecidos pelos Tratados [segundo pressuposto] ou quando tal celebração esteja prevista num ato juridicamente vinculativo da União [terceiro pressuposto] ou seja suscetível de afetar normas comuns ou alterar o seu alcance [quarto pressuposto]». O artigo 216.o, n.o 2, TFUE dispõe que tais acordos vinculam as instituições da União e os Estados‑Membros.

46.

O artigo 218.o TFUE estabelece as regras processuais aplicáveis, inter alia, à negociação, à assinatura e à celebração de acordos internacionais:

«1.   Sem prejuízo das disposições específicas do artigo 207.o, os acordos entre a União e países terceiros ou organizações internacionais são negociados e celebrados de acordo com o processo a seguir enunciado.

2.   O Conselho autoriza a abertura das negociações, define as diretrizes de negociação, autoriza a assinatura e celebra os acordos.

3.   A Comissão […] apresenta recomendações ao Conselho, que adota uma decisão que autoriza a abertura das negociações […].

4.   O Conselho pode endereçar diretrizes ao negociador e designar um comité especial, devendo as negociações ser conduzidas em consulta com esse comité.

5.   O Conselho, sob proposta do negociador, adota uma decisão que autoriza a assinatura do acordo e, se for caso disso, a sua aplicação provisória antes da respetiva entrada em vigor.

6.   O Conselho, sob proposta do negociador, adota uma decisão de celebração do acordo.

[…]

11.   Qualquer Estado‑Membro, o Parlamento Europeu, o Conselho ou a Comissão podem obter o parecer do Tribunal de Justiça sobre a compatibilidade de um projeto de acordo com os Tratados. Em caso de parecer negativo do Tribunal, o acordo projetado não pode entrar em vigor, salvo alteração deste ou revisão dos Tratados.»

Pedido de parecer apresentado ao Tribunal de Justiça

47.

Por petição de 10 de julho de 2015, a Comissão apresentou ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 218.o, n.o 11, TFUE, um pedido de parecer sobre a seguinte questão:

«A União tem a competência necessária para assinar e celebrar por si só o [EUSFTA]? Mais concretamente:

Que disposições do acordo são da competência exclusiva da União?

Que disposições do acordo se inserem na competência partilhada da União?

Existe alguma disposição do acordo que seja da competência exclusiva dos Estados‑Membros?»

48.

O Conselho, o Parlamento e os Governos de todos os Estados‑Membros, com exceção da Bélgica, da Croácia, da Estónia e da Suécia, apresentaram observações escritas sobre o pedido da Comissão. Em 12 e 13 de setembro de 2016, realizou‑se uma audiência na qual participaram a Comissão, o Conselho, o Parlamento e os Governos austríaco, belga, checo, dinamarquês, finlandês, francês, alemão, grego, irlandês, italiano, lituano, neerlandês, polaco, romeno, esloveno e espanhol.

Questões suscitadas pelo pedido de parecer da Comissão

49.

O pedido de parecer da Comissão é manifestamente admissível, uma vez que o EUSFTA ainda não foi celebrado, sendo, por isso, um acordo «projetado» na aceção do artigo 218.o, n.o 11, TFUE. No essencial, o pedido é constituído por duas partes.

50.

A primeira parte diz respeito à questão de saber se a União Europeia pode assinar e celebrar o EUSFTA sozinha, ou seja, sem a participação dos Estados‑Membros.

51.

A segunda parte coloca a questão de saber que disposições do EUSFTA são abrangidas pela competência exclusiva da União Europeia, pela competência partilhada da União Europeia e pela competência exclusiva dos Estados‑Membros.

52.

Se o Tribunal de Justiça considerar que a resposta à primeira parte do pedido deve ser afirmativa porque o EUSFTA é integralmente abrangido pela competência externa exclusiva da União Europeia (com base no artigo 3.o, n.o 1, TFUE ou no artigo 3.o, n.o 2, TFUE), não é necessário examinar a segunda parte. Nesse caso, o EUSFTA deve ser celebrado apenas pela União Europeia.

53.

Se a União Europeia não dispuser de competência exclusiva no que diz respeito à totalidade do EUSFTA, a situação é mais complicada. Se a competência para celebrar o EUSFTA for em parte exclusiva da União Europeia (por força do artigo 3.o TFUE) e em parte partilhada (nos termos do artigo 4.o TFUE), quem pode (ou deve) assinar este acordo ( 15 )?

54.

Nesta fase, devo explicar a forma como entendo que os sistemas de competência interna e externa se relacionam entre si.

55.

Os artigos 2.° a 4.° TFUE devem ser lidos à luz dos artigos 4.° e 5.° TUE. Devem igualmente ser lidos tendo em conta a sua localização, logo no início do TFUE («Parte I — Os Princípios»; «Título I — As categorias e os domínios de competências da União») e no contexto das disposições que lhes antecederam, nas versões anteriores dos Tratados.

56.

Neste ponto, é importante recordar as versões do que veio a ser o TFUE, tal como resultaram dos Tratados de Maastricht (1992), Amesterdão (1997) e Nice (2001). Em especial, o artigo 3.o‑B do Tratado CE, conforme alterado pelo Tratado sobre a União Europeia de Maastricht [que passou a artigo 5.o CE (Amesterdão e, posteriormente, Nice)], continha, nos três parágrafos que o constituíam, uma análise da competência que incluía, sucessivamente, os princípios da atribuição, da subsidiariedade e da proporcionalidade ( 16 ). Durante esse período, não existia, contudo, uma lista pormenorizada de competências. O Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa, que não chegou a ser celebrado, teria introduzido tal lista; e o conteúdo e os elementos essenciais do que passou a figurar nos artigos 2.°, 3.° e 4.° TFUE foram retirados, mais ou menos diretamente, do projeto de Constituição e inseridos pelo Tratado de Lisboa ( 17 ).

57.

Essas versões anteriores revelam claramente que esta parte inicial do que constitui atualmente o TFUE não versa sobre as relações externas enquanto tais. Ela incide sobre a questão constitucional fundamental da repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros que a constituem, a saber, o princípio da atribuição de competências. São atribuídas competências à União Europeia essencialmente com o objetivo de lhe permitir legislar em vários domínios da atividade política e económica no território da União Europeia. Trata‑se de uma visão eurocêntrica do mundo (e não de uma «Weltanschauung»). Trata‑se de estabelecer o equilíbrio desejado entre a autoridade central (supranacional) unificadora instituída pelos Tratados e os Estados‑Membros, ainda soberanos, que constituem a União Europeia (os «Herren der Verträge»). A repartição de competências na qual assenta todo o projeto da União Europeia deve deixar claro quem tem competência para agir em domínios específicos. A perspetiva primordial é «quem tem competência para agir no território da União Europeia: a União Europeia ou os Estados‑Membros?» Dito isto, a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros terá também, necessariamente, implicações no exercício da competência externa.

58.

Qual foi o efeito das modificações introduzidas pelo Tratado de Lisboa?

59.

As competências constantes de uma lista pequena e exaustiva de domínios são irrevogavelmente (salvo alteração do Tratado) atribuídas à União Europeia (artigo 3.o, n.o 1, TFUE). No entanto, a maioria dos domínios de competência consta da lista dos «principais domínios» — ou seja, de uma lista não exaustiva — de competências partilhadas (artigo 4.o, n.o 2, TFUE). Uma competência definida como «partilhada» nunca se transforma numa competência a priori exclusiva da UE, na aceção do artigo 3.o, n.o 1, TFUE. É verdade que, se a União Europeia, exercendo o seu direito de preempção que lhe confere o artigo 2.o, n.o 2, TFUE (que abordarei em seguida), tiver efetivamente chamado a si essa matéria, esta última torna‑se um domínio no qual a União Europeia dispõe de facto de competência exclusiva. Contudo, a diferença entre as competências a priori exclusivas que são conferidas à UE pelo artigo 3.o, n.o 1, TFUE, por um lado, e as competências que se tornam de facto competências exclusivas da UE através do mecanismo previsto no artigo 2.o, n.o 2, TFUE ( 18 ), por outro lado, é esta: uma competência a priori exclusiva da UE nunca pode (salvo alteração ao Tratado) ser convertida numa competência não exclusiva da UE. Em contrapartida, é teoricamente possível que um domínio abrangido por legislação da UE adotada no exercício do direito de preempção, ao abrigo do artigo 2.o, n.o 2, TFUE, possa ser recuperado pelos Estados‑Membros. Basta que o legislador da UE decida deixar de legislar e revogue a legislação da UE existente nesse domínio.

60.

Além disso, as competências partilhadas nos termos do artigo 4.o TFUE são indissociáveis de uma (outra) disposição do Tratado, que atribui à União Europeia uma competência que não é nem uma competência exclusiva (artigo 3.o TFUE) nem uma competência de acompanhamento (artigo 6.o TFUE: «competência para desenvolver ações destinadas a apoiar, coordenar ou completar a ação dos Estados‑Membros»). Tal acontece porque o artigo 4.o, n.o 1, TFUE prevê que «[a União Europeia] dispõe de competência partilhada com os Estados‑Membros quando os Tratados lhe atribuam competência em domínios não contemplados nos artigos 3.° e 6.°» ( 19 ). Assim, o artigo 4.o TFUE determina a existência de várias competências que são partilhadas entre a União Europeia e os Estados‑Membros.

61.

O artigo 2.o TFUE aborda seguidamente vários aspetos do exercício de competências. Em especial, a segunda frase do artigo 2.o, n.o 2, enuncia o «direito de preempção» da União Europeia. Esta disposição confere à União Europeia o direito de optar por exercer uma das competências partilhadas elencadas. Na medida em que o faça (mas apenas nessa medida), os Estados‑Membros deixam de poder exercer a sua competência partilhada nesse aspeto específico. Assim, o Protocolo n.o 25 dispõe expressamente que, «quando a [União Europeia] toma medidas num determinado domínio, o âmbito desse exercício de competências apenas abrange os elementos regidos pelo ato da [UE] em causa e, por conseguinte, não abrange o domínio na sua totalidade». O direito de preempção previsto no artigo 2.o, n.o 2, TFUE é expressamente definido como reversível. Se a União Europeia deixar de agir relativamente a uma parte específica de determinada competência partilhada, essa competência é recuperada pelos Estados‑Membros. E a soma das partes deve corresponder sempre ao todo — qualquer competência exercida num domínio partilhado é exercida ou pela União Europeia ou pelos Estados‑Membros. Não pode ficar num limbo entre um lado e o outro.

62.

Grande parte do exercício de competências da União Europeia continua a dizer respeito ao que acontece «internamente» — ou seja, no território da União Europeia. Determinados aspetos da repartição de competências continuam necessariamente a ter implicações na ação externa. Tal acontece tanto em domínios nos quais a União Europeia dispõe de competência exclusiva como em domínios de competência partilhada. À medida que é desenvolvida, essa ação externa deve respeitar a repartição de competências acordada entre a União Europeia e os Estados‑Membros que a constituem. Estes princípios devem ser respeitados em todas as ações, externas ou internas, desenvolvidas pela União Europeia ( 20 ).

63.

A competência em matéria de união aduaneira e a competência em matéria de política comercial comum (ambas elencadas como competências exclusivas da União Europeia no artigo 3.o, n.o 1, TFUE) são reconhecidas e formuladas de modo detalhado no artigo 206.o TFUE (união aduaneira) e no artigo 207.o TFUE (política comercial comum), na parte V do TFUE, intitulada «A ação externa da União». A política comercial comum é um dos raros exemplos de uma competência puramente externa da UE. Embora o artigo 207.o, n.o 2, TFUE habilite o Parlamento Europeu e o Conselho a estabelecerem, por meio de regulamentos adotados de acordo com o processo legislativo ordinário, as medidas que definem o quadro em que é executada a política comercial comum, tais regulamentos são medidas de ação externa (destinadas a regulamentar, através de atos legislativos da UE, o comércio com Estados terceiros). A competência interna equivalente é a competência em matéria de aproximação das legislações, prevista nos artigos 114.° e 115.° TFUE, para regulamentar o mercado interno, que o artigo 4.o, n.o 2, alínea a), TFUE define como uma competência partilhada.

64.

Ao contrário do artigo 3.o, n.o 1, TFUE, que não se refere expressamente à competência externa, o artigo 3.o, n.o 2, TFUE indica as circunstâncias em que a União Europeia «dispõe […] de competência exclusiva para celebrar acordos internacionais». Os quatro ( 21 ) pressupostos previstos pelos autores do projeto de Tratado («quando tal celebração esteja prevista num ato legislativo da [União Europeia]», «[quando tal celebração] seja necessária para [dar à União Europeia] a possibilidade de exercer a sua competência interna», «ou [na medida em que tal celebração] seja suscetível de afetar regras comuns ou de alterar o alcance das mesmas») refletem e, em grande medida, codificam a jurisprudência anterior do Tribunal de Justiça ( 22 ). De igual modo, o artigo 216.o TFUE (que contém as disposições específicas que determinam quando a União Europeia «pode celebrar acordos com um ou mais países terceiros ou organizações internacionais») reflete e codifica a jurisprudência do Tribunal de Justiça sobre a existência de uma competência externa da UE; está diretamente ligado à repartição de competências estabelecida nos artigos 2.° a 4.° TFUE. O artigo 216.o, n.o 1, TFUE determina a existência da competência externa da UE, mas não a sua natureza exclusiva — esta é determinada pelo artigo 3.o, n.os 1 e 2, TFUE.

65.

Neste contexto, passo a analisar a competência externa de forma mais pormenorizada.

66.

Em relação à política comercial comum, o artigo 3.o, n.o 1, alínea e), TFUE prevê que a União Europeia dispõe de competência exclusiva neste domínio. O artigo 207.o TFUE indica claramente que a política comercial comum «assenta [na] […] celebração de acordos pautais e comerciais sobre [vários domínios]». O primeiro pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, prevê que a União Europeia pode celebrar acordos internacionais «quando os Tratados o prevejam». Portanto, desde que uma determinada matéria seja abrangida pela política comercial comum (uma questão delicada à qual dedico grande parte da análise efetuada nas presentes conclusões), a União Europeia terá competência externa exclusiva para celebrar um acordo internacional relativo a essa matéria. Outras competências exclusivas elencadas no artigo 3.o, n.o 1, TFUE podem estar relacionadas com outros pressupostos visados no artigo 216.o, n.o 1, TFUE, nomeadamente o segundo pressuposto («quando a celebração de um acordo seja necessária para alcançar, no âmbito das políticas da [União Europeia], um dos objetivos estabelecidos pelos Tratados»).

67.

Se um dos pressupostos visados no artigo 3.o, n.o 2, TFUE se verificar e a União Europeia dispuser de competência externa em conformidade com as regras específicas do artigo 216.o, n.o 1, TFUE, que lhe conferem competência para celebrar acordos internacionais, essa competência externa será exclusiva. Analisemos cada um dos pressupostos, de forma sucinta, separadamente.

68.

Em primeiro lugar, podemos identificar um «ato juridicamente vinculativo da [UE]» no qual esteja previsto que a União Europeia celebra esse acordo internacional (terceiro pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE)? Se assim for, e caso se trate de um «ato legislativo da [União Europeia]» (primeiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE) ( 23 ), a competência externa da UE daí decorrente será exclusiva ( 24 ).

69.

Em segundo lugar, é a celebração de um acordo internacional «necessária para alcançar, no âmbito das políticas da [União Europeia], um dos objetivos estabelecidos pelos Tratados» (segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE)? Se assim for, e se uma competência interna da União Europeia não puder, pura e simplesmente, ser exercida na prática sem que exista também uma componente externa (segundo pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE), a competência externa da UE daí decorrente será igualmente exclusiva. Como demonstra a jurisprudência anterior ao Tratado de Lisboa, tais situações são raras, mas possíveis ( 25 ).

70.

Por último, será que a atividade legislativa da UE tem sido abundante ao ponto de a União Europeia ter atualmente competência externa exclusiva por força da jurisprudência relativa ao «efeito AETR» codificado ( 26 )? A demonstração de que a celebração de um acordo internacional é «suscetível de afetar normas comuns ou alterar o seu alcance» ( 27 ) satisfaz automaticamente os requisitos do quarto pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE e do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE; e a União Europeia disporá assim de competência externa exclusiva.

71.

Se a União Europeia não dispuser de competência externa exclusiva nos termos do artigo 3.o TFUE, dispõe de uma competência externa partilhada nos termos dos artigos 2.° e 4.° TFUE (relativos à competência partilhada) e do artigo 216.o TFUE (que atribui competência externa); ou não existe nenhuma competência externa da EU para além de uma eventual competência externa de acompanhamento ( 28 )? Neste caso, a situação é mais complicada.

72.

Em primeiro lugar, é necessário verificar se existe de facto uma competência partilhada nos termos do artigo 4.o TFUE. Partindo do princípio de que a resposta a esta questão é «sim», há que olhar para o artigo 216.o, n.o 1, TFUE a fim de determinar se um dos pressupostos nele visados e que atribuem à União Europeia competência para celebrar acordos internacionais se verifica. Uma vez que, nesta hipótese, não existe competência externa exclusiva nos termos do artigo 3.o, n.o 2, TFUE, é provável que o primeiro, segundo e terceiro pressupostos daquela disposição sejam relevantes. A conjugação do artigo 4.o TFUE e do artigo 216.o, n.o 1, TFUE cria as condições necessárias para a existência de competência externa partilhada da UE. E quanto ao seu exercício?

73.

Neste contexto, é necessário regressar ao artigo 2.o, n.o 2, TFUE e ao direito de preempção da União Europeia. Se a União Europeia não optar por exercer esse direito, a competência externa — tal como a competência interna — será exercida pelos Estados‑Membros e, consequentemente, estes (e não a União Europeia) serão competentes para negociar, assinar e celebrar um acordo internacional cujo objeto está abrangido por esse domínio de competência partilhada. Contudo, o texto do artigo 2.o, n.o 2, TFUE pode ser interpretado no sentido de que permite que a União Europeia exerça o seu direito de preempção em relação quer à competência externa quer à competência interna.

74.

Aceitar esta premissa não implica que a União Europeia disponha de um direito ilimitado de invocar uma competência externa em qualquer domínio de competência partilhada elencado no artigo 4.o, independentemente de ter ou não optado por exercer esse direito internamente. Na audiência, o Conselho salientou que o exercício pela União Europeia ou pelos Estados‑Membros da competência externa para celebrar um determinado acordo internacional num domínio de competência partilhada é «uma opção política». A meu ver, as garantias jurídicas que sustentam essa opção política residem nos procedimentos detalhados que estão expostos no artigo 218.o TFUE. O artigo 218.o, n.o 2, dispõe que «[o] Conselho autoriza a abertura das negociações, define as diretrizes de negociação, autoriza a assinatura e celebra os acordos». Os números seguintes referem que a abertura das negociações (artigo 218.o, n.o 3, TFUE), a assinatura do acordo (artigo 218.o, n.o 5, TFUE) e a sua celebração (artigo 218.o, n.o 6, TFUE) requerem diferentes decisões do Conselho — ou seja, decisões dos Estados‑Membros, agindo na qualidade de membros do Conselho, que autorizem a instituição da UE adequada a agir. Ao longo de todo o procedimento, o Conselho delibera por maioria qualificada, exceto no que diz respeito a determinados domínios nos quais seja exigida a unanimidade (artigo 218.o, n.o 8, TFUE); e a celebração do acordo, na medida em que traduz o exercício da competência externa da UE, exige também a aprovação ou, pelo menos, a consulta do Parlamento Europeu [artigo 218.o, n.o 6, alíneas a) e b), TFUE, respetivamente].

75.

Daqui decorre que um acordo internacional relativo a domínios de competência externa partilhada que venha a ser assinado apenas pela União Europeia é totalmente diferente, em termos conceptuais, de um acordo internacional que apenas abranja domínios de competência externa exclusiva da União Europeia. No primeiro caso, os Estados‑Membros, em conjunto (agindo na qualidade de membros do Conselho), podem acordar que caberá à União Europeia agir ou indicar que continuarão a exercer uma competência externa individual. No segundo caso, não têm essa opção, uma vez que a União Europeia já dispõe de competência externa exclusiva.

76.

Se um acordo internacional for assinado simultaneamente pela União Europeia e pelos Estados‑Membros que a constituem, tanto a União Europeia como os Estados‑Membros serão, à luz do direito internacional, partes nesse acordo. Isso terá consequências, em especial em termos de responsabilidade em caso de violação do acordo e do direito de ação relativamente a essa violação. Por uma questão de transparência dentro da União Europeia, e no interesse do país terceiro (ou dos países terceiros) com o qual o acordo internacional foi celebrado, é desejável que essas decisões refiram muito claramente os aspetos específicos da competência partilhada que os Estados‑Membros (agindo na qualidade de membros do Conselho) acordaram que seriam exercidos pela União Europeia, por um lado, e aqueles que (ainda) seriam exercidos pelos Estados‑Membros, por outro. Uma declaração de competências anexada ao acordo em questão também não seria, na minha opinião, supérflua.

77.

Por último, quando um acordo internacional for assinado simultaneamente pela União Europeia e pelos seus Estados‑Membros, cada Estado‑Membro permanece livre, nos termos do direito internacional, para pôr termo a esse acordo em conformidade com o procedimento de revogação que for adequado nos termos desse acordo. Afinal, participou nesse acordo na qualidade de Estado parte soberano, e não como mero apêndice da União Europeia (e o facto de a União Europeia poder ter desempenhado o papel principal na negociação do acordo é, para este efeito, irrelevante). Contudo, se o Estado‑Membro adotar essa decisão, resulta do artigo 216.o, n.o 2, TFUE que — à luz do direito da União — permanece vinculado nos domínios do acordo celebrados no âmbito da competência da UE (porque se trata de um Estado‑Membro da UE), a menos ou até que a União Europeia ponha termo ao acordo ( 29 ). A capacidade de o Estado‑Membro agir de forma independente enquanto ator de direito internacional reflete o facto de que conserva a sua competência internacional; o facto de o Estado‑Membro permanecer parcialmente vinculado pelo acordo mesmo que lhe ponha termo na qualidade de ator de direito internacional não decorre do direito internacional, mas sim do direito da União.

78.

A situação é diferente quando os Estados‑Membros dispõem de competência exclusiva no que se refere a uma ou a várias partes de um acordo internacional (e as restantes partes do acordo sejam abrangidas pela competência exclusiva ou partilhada da União Europeia): nesse caso, tanto os Estados‑Membros como a União Europeia devem celebrar o acordo ( 30 ).

79.

Contudo, partindo sempre do princípio de que é necessário que o Tribunal de Justiça responda à segunda parte do pedido, será necessário que determine quem dispõe de competência em relação a todas e a cada uma das disposições do EUSFTA?

80.

Na minha opinião, a resposta é negativa.

81.

No parecer 2/00, o Tribunal de Justiça deixou claro que, partindo do princípio de que a competência para celebrar um acordo internacional é partilhada entre a União Europeia e os seus Estados‑Membros, o alcance preciso tanto das competência exclusivas da União Europeia como das competências partilhadas (ou exclusivas) dos Estados‑Membros no que diz respeito a determinado acordo não pode, enquanto tal, refletir‑se na competência da União Europeia para celebrar esse acordo nem, de um modo mais geral, na validade material ou na regularidade formal da decisão da União Europeia de o celebrar ( 31 ). O objetivo do processo previsto no artigo 218.o, n.o 11, TFUE é concretamente evitar as dificuldades que poderiam surgir, tanto ao nível internacional como ao nível da União, se a decisão de celebrar o acordo fosse considerada inválida ( 32 ). Não compete ao Tribunal de Justiça, no âmbito desse processo, fornecer orientações específicas sobre quem dispõe de competência em relação a todas e a cada uma das disposições do acordo em causa e quem deve ser responsável pelo cumprimento das obrigações internacionais que este acarreta ( 33 ).

82.

Ao invés, para responder à segunda parte do pedido da Comissão, procurarei determinar relativamente a que partes do EUSFTA a União Europeia dispõe de competência exclusiva (com base no artigo 3.o, n.o 1, TFUE ou no artigo 3.o, n.o 2, TFUE), se há partes em relação às quais a competência é partilhada com os Estados‑Membros (com base no artigo 4.o TFUE), e se existem ainda outras partes relativamente às quais a União Europeia não dispõe de competência. O EUSFTA é um acordo muito heterogéneo. Tal significa que a análise para determinar a competência e a sua natureza (exclusiva ou partilhada) terá necessariamente (consoante o contexto) de incidir num capítulo individual ou em grupos de capítulos do EUSFTA, numa parte ou em várias partes desse acordo ou, ocasionalmente, numa disposição individual.

83.

Não obstante o facto de o pedido dizer respeito apenas à repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros, algumas observações escritas (especialmente as do Conselho) indicam que o procedimento segundo o qual a Comissão negociou o EUSFTA e se propõe agora assiná‑lo pode igualmente suscitar uma questão. Embora as diretrizes de negociação previssem a negociação de um acordo misto, a Comissão negociou o EUSFTA como um acordo apenas entre a União Europeia e Singapura. Terá a Comissão desrespeitado desse modo o artigo 218.o, n.o 4, TFUE e o princípio da cooperação leal estabelecido no artigo 13.o, n.o 2, TUE?

84.

Na minha opinião, não é necessário nem adequado, no âmbito do presente processo, tomar posição sobre essa questão. O procedimento segundo o qual o EUSFTA foi negociado não afeta, enquanto tal, a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros para a sua celebração. Por conseguinte, não se insere no âmbito do pedido da Comissão. O incumprimento das regras do direito da União relativas ao modo de proceder também não afeta (em princípio) a validade do acordo à luz do direito internacional ( 34 ). Por conseguinte, não voltarei a abordar esta questão.

85.

É igualmente importante ter presente que o pedido da Comissão não diz respeito à compatibilidade material (de qualquer parte) do EUSFTA com os Tratados. Assim, não é pedido ao Tribunal de Justiça que analise, por exemplo, a compatibilidade de um mecanismo de RLIE com os Tratados. Esse tipo de resolução de litígios aparece não apenas no EUSFTA mas igualmente noutros acordos em matéria de comércio e investimento já negociados ou em negociação pela União Europeia. No presente processo, a questão respeitante ao mecanismo de RLIE (e a outras formas de resolução de litígios previstas no EUSFTA) consiste apenas em saber «quem pode decidir». Por conseguinte, a minha análise no presente parecer não prejudica eventuais questões (se existirem) referentes à compatibilidade material do EUSFTA, incluindo as disposições relativas ao mecanismo de RLIE, com os Tratados ( 35 ).

86.

Por último (e obviamente), o meu parecer no presente processo restringe‑se ao EUSFTA. Assim, não prejudica a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros no que diz respeito a outros acordos em matéria de comércio e investimento.

87.

No resto das presentes conclusões, começarei por expor os princípios fundamentais que regem a repartição de competências externas entre a União Europeia e os Estados‑Membros e a base jurídica da ação da União. Em seguida, analisarei as características essenciais da competência exclusiva expressa da União Europeia no domínio da política comercial comum (artigo 207.o, n.o 1, TFUE), a sua competência exclusiva implícita (artigo 3.o, n.o 2, TFUE) e a sua competência partilhada (artigo 4.o TFUE) no domínio da ação externa. É neste contexto geral que abordarei, por fim, a repartição de competências no que diz respeito às matérias abrangidas pelo EUSFTA.

Repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros e base jurídica para a celebração do EUSFTA

88.

Na audiência, tornou‑se claro que o Conselho e vários Estados‑Membros consideram que se deve começar por estabelecer a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros no que diz respeito ao EUSFTA antes de se determinar, subsequentemente, em que base jurídica deve assentar a decisão da União Europeia de assinar e celebrar o EUSFTA.

89.

Não é, manifestamente, sobre esta segunda questão que o Tribunal de Justiça foi chamado a pronunciar‑se. Contudo, na minha opinião, o Conselho e alguns Estados‑Membros não estão a compreender a relação entre os princípios que regem a repartição de competências (externas) e os que regem a escolha da base jurídica da ação da UE.

90.

A União Europeia apenas dispõe de competências de atribuição ( 36 ). Por conseguinte, deve associar qualquer ato que adote a uma disposição do Tratado que a habilite a aprovar esse ato ( 37 ). Essa base jurídica deve ser estabelecida com fundamento em elementos objetivos, suscetíveis de fiscalização jurisdicional, que incluam a finalidade e o conteúdo do ato ( 38 ).

91.

No parecer 1/08, o Tribunal de Justiça explicou que o caráter, exclusivo ou não, da competência da União Europeia para efeitos da celebração de acordos e a base jurídica a que se deve recorrer para esse mesmo efeito constituem duas questões intimamente ligadas ( 39 ). Com efeito, a questão de saber se a União Europeia dispõe sozinha da competência para celebrar um acordo ou se tal competência é partilhada com os Estados‑Membros depende, designadamente, do alcance das disposições da UE suscetíveis de atribuir às instituições da UE o poder de participar em tal acordo ( 40 ).

92.

Apurar se a União Europeia tem efetivamente competência para agir num determinado domínio (e, portanto, identificar a base jurídica para tal ação) é, por conseguinte, uma condição prévia para determinar a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros, em conformidade com os artigos 3.° e 4.° TFUE, no que diz respeito a uma ação externa específica ( 41 ).

93.

Na identificação da base jurídica, decorre de jurisprudência assente que, quando um acordo da União Europeia tenha mais do que uma finalidade ou inclua duas ou mais componentes, das quais uma é identificável como principal ou preponderante, enquanto a(s) outra(s) é (são) apenas acessória(s) ou de âmbito extremamente limitado, a celebração desse acordo pela União Europeia deve assentar apenas numa base jurídica, ou seja, a exigida pela finalidade ou componente principal ou preponderante ( 42 ). Assim, se a finalidade preponderante do EUSFTA for prosseguir a política comercial comum e se for adequado considerar que os outros aspetos desse acordo constituem o complemento necessário dessa componente principal ou são de âmbito extremamente limitado, a base jurídica material para a celebração desse acordo é o artigo 207.o, n.o 1, TFUE ( 43 ). Nesse caso, decorre do artigo 3.o, n.o 1, alínea e), TFUE que a União Europeia dispõe de competência exclusiva para celebrar o EUSFTA ( 44 ).

94.

Por outro lado, se o Tribunal de Justiça concluir que o EUSFTA tem simultaneamente várias finalidades ou várias componentes que estão indissociavelmente ligadas, sem que uma seja acessória da outra, de modo que diferentes disposições do Tratado são aplicáveis, o ato da União Europeia de celebração desse acordo deve assentar nas diferentes bases jurídicas correspondentes ( 45 ).

95.

É neste contexto que passo a abordar o âmbito da política comercial comum na aceção do artigo 207.o TFUE.

Artigo 207.o, n. os 1, 5 e 6, TFUE

96.

O Tribunal de Justiça já deixara claro que a União Europeia dispunha de competência exclusiva no domínio da política comercial comum muito antes da entrada em vigor do artigo 3.o, n.o 1, alínea e), TFUE, que passou a confirmar expressamente a competência exclusiva da União Europeia nesse domínio. Assim, no seu primeiro parecer emitido com base no (atual) artigo 218.o, n.o 11, TFUE, o Tribunal de Justiça declarou que a competência exclusiva no domínio da política comercial comum se justificava porque permitir que os Estados‑Membros exercessem competências concorrentes nesse domínio «equivaleria a reconhecer que os Estados‑Membros podem adotar, nas relações com os países terceiros, posições divergentes das que a [União Europeia] entende assumir, e este facto acabaria por falsear o funcionamento institucional, abalar as relações de confiança dentro da [União Europeia] e impedir que esta desempenhe a sua tarefa na defesa do interesse comum» ( 46 ). Este raciocínio inscreve‑se na lógica da criação da união aduaneira prevista no Tratado de Roma. Internamente, essa união consiste na proibição total, entre os Estados‑Membros, dos direitos aduaneiros de importação e de exportação ou dos encargos de efeito equivalente ( 47 ). Ao mesmo tempo, os Tratados incumbem a União Europeia e as suas instituições da missão de defenderem os interesses comerciais da União Europeia externamente. Permitir que os Estados‑Membros conduzam as suas próprias políticas comerciais com o exterior (e, portanto, prossigam os seus próprios interesses nesse contexto) em paralelo com as ações da União Europeia poderia obviamente comprometer essa função essencial.

97.

No presente processo, a Comissão convida o Tribunal de Justiça a rever a sua jurisprudência anterior relativa ao âmbito da política comercial comum. Até que ponto o âmbito dessa política foi alargado na sequência das alterações introduzidas pelo Tratado de Lisboa (em especial, no que diz respeito aos aspetos comerciais da propriedade intelectual, ao investimento estrangeiro direto, ao comércio de serviços, à exceção relacionada com o domínio dos transportes, enunciada no artigo 207.o, n.o 5, TFUE, e aos limites decorrentes do artigo 207.o, n.o 6, TFUE)?

98.

Alguns Estados‑Membros referiram que, na sequência do parecer 1/94 do Tribunal de Justiça, já não é adequado considerar que a política comercial comum como «dinâmica».

99.

Não estou convencido de que seja especialmente útil discutir a questão de saber se a política comercial comum é ou não «dinâmica». O importante é que o artigo 207.o, n.o 1, TFUE deve ser interpretado de forma a respeitar a redação dessa disposição e a garantir que a União Europeia é capaz de conduzir uma política comercial comum eficaz num ambiente comercial internacional que está em permanente evolução.

100.

Concordo com o ponto de vista expresso pelo advogado‑geral N. Wahl no âmbito do processo de parecer 3/15, de que, uma vez que as práticas, os padrões e as tendências comerciais evoluem ao longo do tempo, o objeto das trocas comerciais internacionais não pode ser determinado em abstrato nem identificado de forma estática e rígida ( 48 ). Contudo, o que deve ser considerado «política comercial» ou «política de investimento» nas relações internacionais e o que constitui a política comercial comum, nos termos do direito da União, não é necessariamente o mesmo.

101.

O Tribunal de Justiça salientou igualmente a necessidade de garantir a eficácia da política comercial comum da União Europeia. No parecer 1/78, o Tribunal de Justiça explicou que deixaria de ser possível conduzir utilmente qualquer política comercial comum se a União Europeia não pudesse recorrer também a meios de ação para além dos instrumentos destinados a produzir efeitos apenas sobre os aspetos tradicionais do comércio externo. Uma «política comercial» assim entendida estaria votada a tornar‑se insignificante ao longo do tempo ( 49 ), impedindo assim, gradualmente, a União Europeia de desempenhar o seu papel como parceira no comércio internacional, quer através de relações bilaterais com países terceiros quer através de ações multilaterais ( 50 ). Por conseguinte, a política comercial comum não se restringe às medidas que prosseguem objetivos comerciais. Pode englobar medidas que prossigam objetivos que não sejam meramente comerciais, como o desenvolvimento ( 51 ), a política externa e de segurança ( 52 ) ou a proteção do ambiente e da saúde humana ( 53 ), sempre desde que essas medidas tenham também efeitos diretos e imediatos no comércio. A interação entre a política comercial comum e os (outros) princípios e objetivos da ação externa da União Europeia é expressamente reconhecida na última frase do artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

102.

Contudo, tal não significa que o âmbito da política comercial comum não tenha limites. O facto de uma matéria ser abordada num acordo de comércio (e investimento) também não é suficiente para que essa matéria seja abrangida pela política comercial comum. Acordos ou disposições que outros intervenientes no âmbito do direito internacional possam conceber como parte do comércio ou da política comercial não são necessariamente abrangidos pela definição de «política comercial comum» constante dos Tratados. Na definição dessa política, o Tribunal de Justiça está vinculado pela letra dos artigos 206.° e 207.° TFUE.

103.

O importante para efeitos do artigo 207.o TFUE é que a ação (interna ou externa) da União Europeia esteja especificamente relacionada com o comércio internacional, ou seja, o comércio com países terceiros (e não o comércio no mercado interno) ( 54 ), na medida em que se destine essencialmente a promover, facilitar ou regular as trocas comerciais e tenha efeitos diretos e imediatos no comércio ( 55 ). Assim, o simples facto de um ato da União Europeia poder ter implicações no comércio internacional não é suficiente para que esse ato seja abrangido pela política comercial comum.

104.

Na distinção entre os compromissos (internacionais) abrangidos pelo âmbito da política comercial comum e os que têm como objetivo primordial melhorar o funcionamento do mercado interno, é importante determinar se o objetivo do acordo consiste essencialmente em alargar, para além do território da União Europeia, a aproximação das legislações dos Estados‑Membros que já foi «amplamente realizada» pelo direito derivado da UE relativo ao comércio no mercado interno ( 56 ). Se assim for, pode presumir‑se que esse acordo procura promover o comércio internacional, pelo que a sua celebração é abrangida pelo âmbito da política comercial comum. Em contrapartida, quando essa aproximação «interna» seja precisamente o objeto do acordo, a finalidade preponderante deste é melhorar o funcionamento do mercado interno, pelo que não é abrangido pelo âmbito da política comercial comum, mesmo que tenha efeitos sobre o comércio internacional ( 57 ).

105.

Algumas partes receiam, quer em geral quer no quadro de um capítulo específico do EUSFTA, que a interpretação ampla feita pela Comissão do âmbito da política comercial comum na sequência da entrada em vigor do Tratado de Lisboa seja contrária ao artigo 207.o, n.o 6, TFUE.

106.

Na minha opinião, o artigo 207.o, n.o 6, TFUE diz respeito apenas ao exercício das competências atribuídas à União Europeia pelo artigo 207.o, n.o 1, TFUE. Pressupõe que essa competência foi estabelecida. Assim, não pode alterar a competência externa exclusiva da União Europeia nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE. O artigo 207.o, n.o 6, TFUE impõe dois limites, ainda que o segundo se afigure como uma aplicação do primeiro.

107.

Em primeiro lugar, o exercício da competência no domínio da política comercial comum não pode afetar a delimitação de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros. Na minha opinião, essa primeira restrição constitui uma expressão do princípio da atribuição estabelecido no artigo 2.o, n.os 1 e 2, TFUE e desenvolvido posteriormente na Declaração n.o 18 sobre a delimitação de competências ( 58 ). Por outras palavras, o exercício da competência exclusiva da União Europeia no domínio da política comercial comum não pode alterar ou afetar de qualquer outro modo as disposições do Tratado relativas à repartição de competências noutros domínios não abrangidos pelo âmbito dessa competência (como, por exemplo, o comércio no mercado interno). A minha interpretação é reforçada pelo artigo 207.o, n.o 2, TFUE, que prevê uma base jurídica para a adoção das «[…] medidas que definem o quadro em que é executada a política comercial comum», em vez de prever que a União Europeia dispõe de competência exclusiva relativamente a todas as medidas que possam ter de ser adotadas com vista ao cumprimento de obrigações decorrentes de um acordo celebrado pela União Europeia no exercício da sua competência exclusiva no domínio da política comercial comum.

108.

Assim, por exemplo, o exercício pela União Europeia da sua competência exclusiva nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE no que diz respeito à totalidade do acordo TRIPS ( 59 ) não significa que a UE seja competente para regular todas e cada uma das matérias abrangidas por esse acordo no mercado interno. Tal exercício também não pode alterar a repartição de competências externas entre os Estados‑Membros e a União Europeia no que diz respeito aos direitos de propriedade intelectual em geral.

109.

Em contrapartida, não interpreto a primeira restrição no sentido de que o exercício da competência da União Europeia no domínio da política comercial comum depende da questão de saber se é outra a base jurídica da competência interna da União Europeia ou se exerceu essa competência ( 60 ). Em especial, a insistência no paralelismo entre o aspeto externo da política comercial comum e o aspeto interno de outras políticas da UE não encontra apoio noutras partes do artigo 207.o TFUE. Assim, o artigo 207.o, n.o 4, TFUE confirma expressamente que a política comercial comum pode incluir o comércio de serviços culturais e audiovisuais e o comércio de serviços sociais, educativos e de saúde. Contudo, as competências internas da União Europeia no domínio da saúde pública são limitadas, uma vez que apenas complementam a ação dos Estados‑Membros ( 61 ). Além disso, a ação da UE deve respeitar as responsabilidades dos Estados‑Membros no que se refere à definição das respetivas políticas de saúde, bem como à organização e prestação de serviços de saúde e de cuidados médicos ( 62 ).

110.

A segunda restrição imposta pelo artigo 207.o, n.o 6, TFUE consiste em que o exercício das competências no domínio da política comercial comum não pode conduzir à harmonização das disposições legislativas ou regulamentares dos Estados‑Membros na medida em que os Tratados excluam essa harmonização. Como o artigo 207.o, n.o 4, TFUE confirma expressamente, esta restrição não significa que a política comercial comum não possa abranger o comércio em matérias relativamente às quais outras disposições do Tratado excluam a harmonização (como, por exemplo, em matéria de política social, educação, saúde pública ou cultura) ( 63 ). Significa antes que, através do exercício das suas competências nos termos do artigo 207.o TFUE, a União Europeia não pode agir de forma a contornar a proibição de harmonização prevista nos Tratados. Esta limitação é, portanto, uma aplicação específica da primeira restrição.

111.

O presente processo de parecer exige igualmente que o Tribunal de Justiça interprete o artigo 207.o, n.o 5, TFUE, em especial em relação aos compromissos em matéria de transportes previstos no capítulo oito do EUSFTA («Serviços, estabelecimento e comércio eletrónico») ( 64 ). De acordo com esta disposição, a negociação e a celebração de acordos internacionais no domínio dos transportes estão sujeitas às disposições do título VI da parte III do TFUE, ou seja, às disposições do Tratado relativas à política de transportes da União Europeia. Por conseguinte, tais acordos não são abrangidos pelo âmbito da política comercial comum.

112.

Esta exceção não é nova. Os Tratados sempre mantiveram a política de transportes fora da política comercial comum. De facto, foi esta exceção que levou o Tribunal de Justiça a estabelecer, no seu acórdão AETR, o princípio das competências externas exclusivas implícitas, em oposição à competência exclusiva expressa no domínio da política comercial comum ( 65 ).

113.

Embora o acórdão AETR diga respeito a um acordo que estabelecia normas de segurança, o Tribunal de Justiça considerou, no parecer 1/94, que não havia motivos para concluir de forma diferente em relação aos acordos comerciais que também incidam sobre os transportes, como o GATS ( 66 ). Confirmou «[a] ideia subjacente [ao acórdão AETR] de que os acordos internacionais em matéria de transportes não são abrangidos [pela política comercial comum]» ( 67 ). Esta posição permaneceu inalterada no Tratado de Nice ( 68 ) e no Tratado de Lisboa ( 69 ). Por conseguinte, no que diz respeito ao comércio internacional de serviços de transportes, os Tratados procuram «manter um paralelismo de princípio entre a competência interna exercida pela adoção unilateral de regras [da UE] e a competência externa exercida mediante a celebração de acordos internacionais, radicando ambas […] no título do Tratado específico da política comum de transportes» ( 70 ).

114.

É por esta razão que a aplicação do artigo 207.o, n.o 5, TFUE não se restringe aos acordos internacionais exclusiva ou predominantemente relacionados com o comércio de serviços de transporte. Como o Tribunal de Justiça sustentou no parecer 1/08, concluir de forma diferente significaria que as disposições de um acordo internacional com um objeto rigorosamente idêntico fariam parte ora da política de transportes ora da política comercial, em função da mera circunstância de as partes no acordo terem decidido apenas tratar do comércio dos serviços de transportes, ou terem acordado tratar simultaneamente desse comércio e do comércio de outro tipo de serviços ou de todos eles ( 71 ).

115.

Não obstante o âmbito alargado do artigo 207.o, n.o 5, TFUE, considero que a expressão «acordos internacionais no domínio dos transportes» não deve significar que qualquer acordo aplicável aos transportes (ou seja, no essencial, ao serviço de transporte de mercadorias ou de pessoas, efetuado por um ou mais meios de transporte, de um lugar para outro) deva ser excluído da política comercial comum. O facto de atos de alcance geral poderem, na prática, ser igualmente aplicáveis aos transportes não aciona necessariamente a exceção prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE. Um acordo internacional «no domínio dos transportes» é sobretudo um acordo que contém disposições relativas especificamente aos transportes. Tal explica por que razão, no parecer 1/08, o Tribunal de Justiça centrou a sua atenção nos compromissos específicos setoriais (e nos compromissos horizontais aplicáveis para além desses compromissos) e concluiu que as condições para a aplicação da exceção prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE estavam reunidas.

116.

O presente processo mostra que subsistem dúvidas quanto ao âmbito do artigo 207.o, n.o 5, TFUE. As questões a respeito dos compromissos relativos ao comércio de serviços de transporte incluem a questão de saber se a exceção prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE abrange o estabelecimento (tal como definido no EUSFTA), ainda que este não seja regido pelo título VI da parte III do TFUE, e se os serviços «acessórios» dos serviços de transporte são abrangidos pela exceção. Abordarei estas questões na minha análise do capítulo oito do EUSFTA ( 72 ).

Artigo 3.o, n.o 2, TFUE

117.

Quando a União Europeia não disponha de competência exclusiva expressa nos termos do artigo 3.o, n.o 1, TFUE para celebrar um acordo internacional pode, todavia, dispor de competência externa exclusiva implícita com base no artigo 3.o, n.o 2, TFUE. Os dois números do artigo 3.o TFUE dizem especificamente respeito à repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros. Contudo, ao contrário do artigo 3.o, n.o 1, TFUE, o artigo 3.o, n.o 2, TFUE diz respeito apenas à competência externa. No entanto, os vários pressupostos que estabelece implicam, necessariamente, algum exercício de competência interna.

118.

A Comissão baseia‑se em dois pressupostos visados no artigo 3.o, n.o 2, TFUE para demonstrar a existência de competência externa exclusiva da União Europeia.

119.

No que diz respeito a uma parte do capítulo oito, relativo a serviços, estabelecimento e comércio eletrónico ( 73 ), a Comissão baseia‑se no primeiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE, de acordo com o qual a União Europeia dispõe de competência exclusiva «quando tal celebração esteja prevista num ato legislativo da União». De acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, a lógica subjacente a esta disposição é que podem existir situações nas quais, embora os próprios Tratados não estabeleçam uma competência externa da União Europeia, as regras comuns adotadas pelas instituições estabelecem essa competência ao impor a celebração de acordos internacionais ( 74 ). Nessas situações, a União Europeia adquire competência exclusiva decorrente de regras comuns ( 75 ), porque permitir que os Estados‑Membros celebrem os seus próprios acordos internacionais poderia comprometer a ação externa concertada nos domínios abrangidos por essas regras da UE ( 76 ).

120.

No que diz respeito a outras partes do EUSFTA ( 77 ), a Comissão baseia‑se no terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE. De acordo com o mesmo, a União Europeia dispõe de competência exclusiva para celebrar um acordo internacional «quando tal celebração […] seja suscetível de afetar regras comuns ou de alterar o alcance das mesmas». Este pressuposto corresponde ao critério estabelecido pelo Tribunal de Justiça no acórdão AETR para definir «a natureza dos compromissos internacionais que os Estados‑Membros estão proibidos de assumir fora do quadro das instituições da União, quando as regras comuns da UE tenham sido adotadas para alcançar os fins do Tratado» ( 78 ).

121.

O chamado «princípio AETR» fornece uma base que permite que a União Europeia disponha de competência exclusiva implícita para celebrar um acordo internacional. Foi originalmente desenvolvido tomando em consideração, por um lado, a exigência de direito primário de que os Estados‑Membros tomem todas as medidas adequadas para garantir o cumprimento das suas obrigações decorrentes dos Tratados ou resultantes das atos das instituições e, por outro, o dever dos Estados‑Membros de se absterem de tomar quaisquer medidas suscetíveis de pôr em perigo a realização dos objetivos dos Tratados ( 79 ). Assim, a União Europeia dispõe de competência externa exclusiva quando exista o risco de os Estados‑Membros, agindo fora do quadro das instituições da UE, assumirem compromissos internacionais que afetem regras comuns ou que alterem o seu âmbito. Tal violaria as regras estabelecidas nos Tratados para execução das políticas da UE e seria, por conseguinte, suscetível de pôr em causa a própria essência do processo de integração da União.

122.

A jurisprudência do Tribunal de Justiça fornece algumas orientações sobre como verificar se os requisitos do terceiro pressuposto estão preenchidos. Deve efetuar‑se uma análise específica da relação entre o acordo internacional projetado e o direito da União em vigor nesse momento. Para efeitos dessa análise, e tendo em conta o princípio da atribuição, cabe à parte que reivindica a competência externa exclusiva demonstrá‑lo ( 80 ).

123.

A primeira etapa dessa análise consiste em definir o domínio a que o acordo internacional diz respeito, de forma a identificar as regras comuns relevantes. O objeto do acordo pode ser determinado tomando em consideração o conteúdo e a finalidade do acordo. A este respeito, embora seja possível, quando se analisa os chamados acordos homogéneos, considerar que o acordo abrange, na sua totalidade, «um domínio» e, em seguida, verificar se as regras comuns realizam uma harmonização completa desse domínio ou se esse domínio está em grande parte coberto por essas regras comuns ( 81 ), essa abordagem não é facilmente transponível para um acordo como o EUSFTA, que regula vários «domínios» nos vários capítulos ou partes que o compõem.

124.

Os argumentos da Comissão no presente processo suscitam uma questão inédita. É o terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE aplicável apenas quando já tenham sido adotadas «regras comuns» pelas instituições da UE no exercício das competências legislativas da União Europeia, ou as próprias disposições do Tratado podem constituir igualmente, em determinadas condições, «regras comuns»? A Comissão alega que a competência exclusiva da União Europeia no que diz respeito às disposições do EUSFTA relativas a tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto decorre das «regras comuns» constantes do próprio artigo 63.o TFUE. Abordarei esta questão quando analisar a secção A do capítulo nove do EUSFTA ( 82 ).

125.

A segunda etapa consiste em identificar as regras comuns que existem nesse domínio. Contudo, não é necessário existir uma concordância total entre o âmbito do acordo internacional e as regras comuns ( 83 ). Pode ser suficiente que o domínio no qual o acordo internacional se integra esteja em grande parte coberto por essas regras comuns ( 84 ). As regras comuns relevantes podem incluir não apenas legislação aplicável ao domínio específico abrangido pelo acordo mas igualmente legislação que tenha um âmbito de aplicação mais alargado ( 85 ). Também não é relevante que tais regras comuns (não) se encontrem num único instrumento jurídico da UE ( 86 ).

126.

As regras comuns não são apenas as regras que regulam situações que envolvem um elemento externo à UE e que têm, portanto, uma dimensão externa ( 87 ). Na identificação das regras comuns, é necessário ter em conta quer o direito da União atualmente em vigor quer as perspetivas de evolução dessas regras quando as mesmas sejam previsíveis no momento da análise ( 88 ).

127.

Os argumentos das partes no presente processo quanto à questão de saber quais as regras comuns relevantes para a aplicação do princípio AETR aos domínios dos serviços de transporte e dos tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto indicam que existem vários equívocos em relação às «regras comuns». O presente processo proporciona ao Tribunal de Justiça uma oportunidade de fornecer esclarecimentos necessários ( 89 ).

128.

A terceira etapa consiste na análise do (eventual) impacto da celebração do acordo internacional nas regras comuns relevantes. Não é necessário demonstrar que tal impacto existe: o risco de as regras comuns poderem ser afetadas ou de o seu alcance poder ser alterado é suficiente ( 90 ). Tal risco existe quando os compromissos previstos no acordo internacional se insiram no âmbito de aplicação das regras comuns ( 91 ). Não é necessário demonstrar a existência de uma possível contradição, ou seja, de um conflito entre o acordo internacional e as regras comuns ( 92 ).

129.

Quando as regras comuns harmonizem totalmente o domínio regulado pelo acordo internacional ( 93 ), a competência exclusiva para celebrar esse acordo é facilmente estabelecida. Presume‑se que as regras harmonizadas são afetadas pelos compromissos internacionais decorrentes da celebração desse acordo.

130.

Quando a harmonização seja apenas parcial, o facto de um acordo internacional [ou parte(s) desse acordo] dizer respeito a um domínio que está «em grande parte coberto» por regras da UE não permite, por si só, concluir automaticamente que a União Europeia dispõe de competência exclusiva para negociar esse acordo internacional na sua totalidade (ou a parte relevante desse acordo), sem analisar se o princípio AETR se aplica. Tudo depende do conteúdo dos compromissos assumidos e da sua eventual ligação com regras da União Europeia ( 94 ).

131.

O Protocolo n.o 25 relativo ao exercício das competências partilhadas não põe em causa os princípios que acabei de enunciar. Esse protocolo diz apenas respeito ao artigo 2.o, n.o 2, TFUE. O seu único objetivo é definir o âmbito do exercício pela União Europeia de uma competência partilhada com os Estados‑Membros. Esse protocolo deixa claro que o âmbito do exercício dessa competência «apenas abrange os elementos regidos pelo ato da União [Europeia] em causa e, por conseguinte, não abrange o domínio na sua totalidade». Por conseguinte, o Protocolo n.o 25 não pode ser interpretado no sentido de que limita o âmbito da competência externa exclusiva da União Europeia nos casos a que se refere o artigo 3.o, n.o 2, TFUE, como esclarece a jurisprudência ( 95 ).

132.

Neste contexto, passo a analisar a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros no que diz respeito ao EUSFTA.

Objetivos do EUSFTA e definições gerais relevantes para o EUSFTA (capítulo um do EUSFTA ( 96 ) )

Argumentos

133.

A Comissão afirma que o capítulo um é integralmente abrangido pela política comercial comum. De acordo com a Comissão, os objetivos gerais referidos nos artigos 1.1 e 1.2. do EUSFTA inserem‑se, em grande medida, no âmbito dos objetivos da política comercial comum estabelecidos no artigo 206.o TFUE. Os objetivos do EUSFTA são apenas ligeiramente mais amplos do que os da política comercial comum. Quando for esse o caso, tais objetivos inserem‑se, todavia, no âmbito dos objetivos do TFUE (em especial os que são enunciados nos artigos 63.°, n.o 1, 91.° e 100.° TFUE).

134.

As outras partes no presente processo não apresentaram argumentos específicos em relação ao capítulo um.

Análise

135.

Na minha opinião, a União Europeia dispõe de competência exclusiva, com base no artigo 207.o, n.o 1, TFUE, para decidir criar uma zona de comércio livre em conformidade com o artigo XXIV do GATT de 1994 e o artigo V do GATS ( 97 ) e para acordar que o EUSFTA tem como objetivos liberalizar e facilitar o comércio e o investimento. Tais matérias são claramente abrangidas pela política comercial comum.

136.

Além disso, as disposições que elencam as definições de uma forma geral aplicáveis são meramente acessórias. Essas disposições não são suscetíveis de alterar a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros no que diz respeito às restantes disposições do EUSFTA.

137.

Por conseguinte, concluo que o capítulo um é integralmente abrangido pela competência exclusiva da União Europeia nos termos do artigo 207.o TFUE.

Comércio de mercadorias (capítulos dois a seis do EUSFTA ( 98 )e Protocolo n.o 1 do EUSFTA ( 99 ) )

Argumentos

138.

A Comissão afirma que os capítulos dois a seis são integralmente abrangidos pela política comercial comum.

139.

A Comissão alega que todas as disposições incluídas no capítulo dois se referem especificamente ao comércio internacional de mercadorias, uma vez que se destinam à liberalização do comércio de mercadorias entre as Partes e têm um efeito direto e imediato sobre ele. Tal verifica‑se tanto no que diz respeito às disposições desse capítulo em matéria de direitos aduaneiros, aos quais o artigo 207.o, n.o 1, TFUE faz referência, como no que diz respeito às disposições não pautais, que reproduzem, integram por remissão e/ou aprofundam as atuais disposições do GATT de 1994 e dos outros acordos multilaterais relativos ao comércio de mercadorias (e que, como o Tribunal de Justiça declarou no parecer 1/94, são automaticamente abrangidas pelo âmbito da política comercial comum).

140.

A Comissão apresenta argumentos semelhantes relativamente ao capítulo três (o artigo 207.o, n.o 1, TFUE abrange «medidas de defesa comercial, tais como as medidas a tomar em caso de dumping e de subsídios»), ao capítulo quatro (porque visa facilitar o comércio de mercadorias mediante a criação de um quadro para a prevenção, identificação e eliminação de obstáculos desnecessários ao comércio, no âmbito do Acordo OTC) e ao capítulo cinco (porque visa minimizar os efeitos negativos das MSF sobre o comércio). O Acordo sobre a aplicação do artigo VI do Acordo Geral sobre Pautas («Acordo antidumping»), o Acordo sobre as subvenções e as medidas de compensação («Acordo SMC»), o Acordo sobre as medidas de salvaguarda, o Acordo OTC e o Acordo MSF fazem todos parte dos acordos multilaterais relativos ao comércio de mercadorias, que, segundo o parecer 1/94, se inserem no âmbito da política comercial comum.

141.

Por último, o capítulo seis também está especificamente relacionado com o comércio internacional porque visa facilitar o comércio de mercadorias e assegurar controlos aduaneiros eficazes. A Comissão acrescenta que a maior parte das disposições deste capítulo corresponde às disposições mais pormenorizadas sobre o mesmo assunto incluídas no Acordo relativo à facilitação do comércio, aprovado pela OMC, que agora se tornou parte integrante do anexo 1‑A ao Acordo OMC ( 100 ). Segundo a Comissão, nem os Estados‑Membros nem as outras instituições contestam a competência exclusiva da União Europeia no que diz respeito a esse novo acordo da OMC.

142.

O Parlamento concorda, no essencial, com a posição da Comissão.

143.

Embora nem o Conselho nem quase nenhum Estado‑Membro tenham apresentado argumentos específicos em relação aos capítulos dois a seis, um Estado‑Membro afirma que a competência exclusiva da União Europeia não abrange a cooperação aduaneira prevista na segunda frase do artigo 6.1, n.o 1, do EUSFTA. O artigo 206.o TFUE refere apenas a instituição de uma união aduaneira nos termos dos artigos 28.° a 32.° TFUE. Por conseguinte, não abrange o artigo 33.o TFUE, que proporciona uma base jurídica para a adoção de «medidas destinadas a reforçar a cooperação aduaneira entre os Estados‑Membros e entre estes e a Comissão». Além disso, decorre do artigo 6.o, alínea g), TFUE e é confirmado pelo artigo 197.o, n.o 2, TFUE (única disposição do título XXIV, com a epígrafe «Cooperação administrativa») que, no que diz respeito à cooperação administrativa, a União Europeia apenas tem competência para apoiar, coordenar ou completar a ação dos Estados‑Membros.

Análise

144.

Os capítulos dois a seis dispõem sobre vários aspetos da regulação do comércio de mercadorias. As matérias abrangidas por estes capítulos e o tipo de obrigações que preveem correspondem, em certa medida, a determinados acordos da OMC no domínio do comércio de mercadorias.

145.

Antes da entrada em vigor do Tratado de Lisboa, a política comercial comum já abrangia o comércio de mercadorias. No parecer 1/94, o Tribunal de Justiça concluiu que a (então) Comunidade Europeia dispunha, nos termos do artigo 113.o do Tratado CE, de competência exclusiva para celebrar «os Acordos Multilaterais sobre o Comércio de Mercadorias», ou seja, os acordos incluídos no anexo 1‑A ao Acordo OMC (a seguir «acordos do anexo 1‑A») ( 101 ). Este anexo engloba o GATT de 1994 e outros 12 acordos. O Tribunal de Justiça concluiu que todos os acordos incluídos no anexo 1‑A eram abrangidos pela política comercial comum, sem analisar cada um deles individualmente ( 102 ). Este foi o motivo pelo qual se considerou que todos estavam especificamente ligados ao comércio internacional na medida em que se destinavam essencialmente a promover, facilitar ou regular as trocas comerciais e tinham efeitos diretos e imediatos no comércio. A maior parte dos acordos constantes do anexo 1‑A do Acordo OMC incluem obrigações relativas, inter alia, ao acesso ao mercado, ao tratamento nacional e outras formas de regulamentação interna, à transparência, ao recurso judicial e administrativo e ao equilíbrio entre os objetivos comerciais e não comerciais. O âmbito de aplicação de alguns desses acordos é definido por referência ao tipo de mercadorias (por exemplo, o Acordo sobre a agricultura e o Acordo sobre os têxteis e o vestuário); outros aplicam‑se a tipos específicos de instrumentos da política comercial (por exemplo, o Acordo OTC; o Acordo sobre as medidas de investimento relacionadas com o comércio; o Acordo antidumping; o Acordo SMC; e o Acordo sobre as medidas de salvaguarda); a medidas comerciais com um objetivo específico (por exemplo, o Acordo MSF) ou a determinadas etapas do processo de importação ou exportação [por exemplo, o Acordo sobre a aplicação do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994 (a seguir «Acordo sobre o valor aduaneiro»); o Acordo sobre a inspeção antes da expedição; o Acordo sobre as regras de origem; e o Acordo sobre procedimentos em matéria de licenças de importação].

146.

Por conseguinte, decorre claramente do parecer 1/94 que a União Europeia dispõe de competência exclusiva no que se refere às matérias abrangidas por esses acordos e às obrigações assumidas nos termos desses acordos ( 103 ). Esta posição mantém‑se no âmbito do Tratado de Lisboa, que não alterou a descrição da política comercial comum no que diz respeito ao comércio de mercadorias.

147.

Neste contexto, parece‑me claro que os capítulos dois a cinco dizem especificamente respeito ao comércio de mercadorias. O seu objeto corresponde, no essencial, às matérias abrangidas por determinados acordos constantes do anexo 1‑A ao Acordo OMC, que fazem parte da competência exclusiva da União Europeia no domínio da política comercial comum. Assim, o capítulo dois está relacionado com o objeto dos artigos I, II, e XI do GATT de 1994, que contêm as obrigações fundamentais em matéria de acesso ao mercado no comércio de mercadorias. As matérias abrangidas pelo capítulo três estão relacionadas com as disposições do GATT de 1994 sobre antidumping, subvenções e medidas de salvaguarda e com os acordos mais específicos correspondentes (o Acordo antidumping, o Acordo sobre as subvenções e as medidas de compensação e o Acordo sobre as medidas de salvaguarda), constantes do anexo 1‑A ao Acordo OMC. Os capítulos quatro e cinco dizem respeito aos obstáculos não pautais abrangidos pelas disposições do artigo III do GATT de 1994 («tratamento nacional») e pelas disposições mais especificas constantes do Acordo OTC e do Acordo MSF, incluídos igualmente no anexo 1‑A ao Acordo OMC.

148.

Estas matérias dizem respeito ao transporte transfronteiras de mercadorias, bem como à sua entrada em circulação, desalfandegamento e tratamento no mercado. Estão, portanto, especificamente relacionadas com o comércio internacional.

149.

Além disso, as regras destinadas a facilitar esses procedimentos (essenciais para a importação e a exportação de mercadorias) e a torná‑lo, assim como às regras que regulam o tratamento dessas mercadorias no mercado, mais transparentes, previsíveis, eficientes e eficazes em termos de custos, promovem, facilitam ou regulam as trocas comerciais e têm efeitos diretos e imediatos no comércio ( 104 ).

150.

Esta conclusão aplica‑se igualmente à cooperação aduaneira prevista no capítulo seis e às disposições suplementares em matéria aduaneira constantes do Memorando de entendimento n.o 3 e às regras constantes do Memorando de entendimento n.o 4 relativo ao reconhecimento mútuo dos programas dos operadores económicos autorizados (ambos os memorandos de entendimento estão relacionados com o capítulo seis).

151.

O capítulo seis diz respeito aos procedimentos, à avaliação aduaneira e à facilitação do comércio (parcialmente abrangidos pelo GATT de 1994), ao Acordo sobre o valor aduaneiro e ao recente Acordo da OMC relativo à facilitação do comércio. As formas de cooperação previstas no capítulo seis correspondem, em certa medida, às que são aplicáveis em matéria aduaneira no âmbito do GATT de 1994 e do Acordo sobre o valor aduaneiro. Estes acordos previam igualmente, para além de disposições gerais sobre publicação ( 105 ), consultas sobre questões relativas à administração do sistema de avaliação aduaneira ( 106 ). Além disso, a um nível mais geral, o GATT de 1994 e os acordos do anexo 1‑A preveem muitas formas de cooperação semelhantes em várias matérias relativas ao comércio de mercadorias ( 107 ). Tais disposições não impediram o Tribunal de Justiça de concluir, no parecer 1/94, que esses acordos são integralmente abrangidos pela política comercial comum ( 108 ).

152.

Não posso subscrever o argumento formalista baseado numa distinção, no que diz respeito ao comércio de mercadorias no mercado interno, entre as disposições do Tratado que regulam a união aduaneira (artigos 30.° a 32.° TFUE) e a cooperação aduaneira (artigo 33.o TFUE). É verdade que o artigo 206.o TFUE, que estabelece os objetivos da união aduaneira, apenas refere os artigos 28.° a 32.° TFUE. Contudo, isso acontece porque são essas as disposições que instituem a união aduaneira. Não é essa a finalidade de uma disposição como o artigo 33.o TFUE, que proporciona uma base jurídica para a adoção de legislação destinada a reforçar a cooperação aduaneira na União Europeia. Por conseguinte, não se pode razoavelmente retirar conclusões quanto ao âmbito da política comercial comum do facto de o artigo 206.o TFUE não referir expressamente o artigo 33.o TFUE. Os artigos 6.°, alínea g), e 197.° TFUE também não têm qualquer impacto no âmbito dessa política. Estas disposições abordam, em termos gerais, a cooperação administrativa entre os Estados‑Membros e entre estes e a União Europeia. São, portanto, aplicáveis sem prejuízo da competência exclusiva da União Europeia para incluir na sua política comercial comum medidas destinadas a melhorar a cooperação administrativa com Estados terceiros no que diz respeito a matérias abrangidas por essa política.

153.

Por último, a minha análise dos capítulos dois a seis aplica igualmente ao Protocolo n.o 1 relativo à definição do conceito de «produtos originários» e aos métodos de cooperação administrativa. Este protocolo diz respeito às regras de origem. É manifesto que está especificamente ligado ao comércio internacional de mercadorias.

154.

Por conseguinte, concluo que os capítulos dois a seis são integralmente abrangidos pela competência exclusiva da União Europeia no domínio da política comercial comum, nos termos do artigo 207.o TFUE.

155.

Passo a abordar o capítulo oito. Uma vez que os capítulos sete (Obstáculos não pautais ao comércio e investimentos na produção de energia renovável) e treze (Comércio e desenvolvimento sustentável) suscitam questões semelhantes relativamente ao âmbito da política comercial comum e à relação entre objetivos comerciais e não comerciais ( 109 ), analisarei o capítulo sete mais adiante, em conjunto com o capítulo treze.

Serviços, estabelecimento e comércio eletrónico (capítulo oito do EUSFTA ( 110 ) )

Argumentos

Argumentos gerais

156.

A Comissão afirma que a secção A define o objetivo e o âmbito de aplicação do capítulo oito do EUSFTA. As secções B a D deste capítulo são abrangidas pela competência exclusiva da União Europeia porque o seu âmbito de aplicação corresponde ao dos compromissos sobre prestação de serviços em modos 1, 2, 3 e 4 nos termos do GATS, que é abrangido pelo artigo 207.o, n.o 1, TFUE. Nos termos do artigo I:2, alíneas a) a d), do GATS, esses quatro modos abrangem a prestação de um serviço: a) com origem no território de um Membro (da OMC) e destino ao território de qualquer outro Membro (da OMC) («modo 1» ou «prestação transfronteiras»); b) no território de um Membro (da OMC) a um consumidor de serviços de qualquer outro Membro (da OMC) («modo 2» ou «consumo no estrangeiro»); c) por um prestador de serviços de um Membro (da OMC) através de uma presença comercial no território de qualquer outro Membro (da OMC) («modo 3» ou «presença comercial»); e d) por um prestador de serviços de um Membro (da OMC) através da presença de pessoas singulares de um Membro (da OMC) no território de qualquer outro Membro (da OMC) («modo 4» ou «presença de pessoas singulares»).

157.

Relativamente a cada subsecção da secção E do capítulo oito («Quadro regulamentar»), a Comissão sustenta que existe uma ligação suficientemente estreita com o comércio internacional.

158.

No que diz respeito às disposições de aplicação geral (subsecção 1), a Comissão baseia‑se numa comparação com as disposições do GATS e com certos instrumentos não vinculativos adotados por vários órgãos da OMC. A Comissão acrescenta que o artigo 8.16 do EUSFTA, sobre reconhecimento mútuo das qualificações profissionais, é abrangido pela política comercial comum porque facilita o acesso ao mercado aos prestadores de serviços estrangeiros e porque o Tribunal de Justiça confirmou que essas obrigações impostas pelo GATS se inserem na política comercial comum. O artigo 8.17 do EUSFTA, sobre transparência, estabelece obrigações que são comuns nos acordos comerciais internacionais e semelhantes às que decorrem dos artigos III:1 e III:4 do GATS. Incertezas sobre as medidas aplicáveis que regulam as atividades comerciais podem levar os prestadores de serviços a decidirem não aceder a mercados externos.

159.

No que diz respeito à regulamentação interna (subsecção 2), a Comissão sustenta, no essencial, que essa subsecção impõe condições que visam assegurar que os requisitos e procedimentos em matéria de licenciamento e de qualificação não dificultem o comércio internacional. A sua finalidade é semelhante à do artigo VI:4 do GATS, que visa assegurar que essas normas e procedimentos, mesmo não sendo discriminatórios, não criem obstáculos desnecessários ao comércio de serviços. Além disso, a obrigação prevista no artigo 8.19, n.o 3, do EUSFTA, de manter ou de criar tribunais ou processos judiciais, arbitrais ou administrativos que permitam a fiscalização das decisões, é semelhante à prevista no artigo VI:2, alínea a), do GATS.

160.

Além disso, as disposições específicas sobre serviços informáticos, serviços postais, serviços de telecomunicações e serviços financeiros (subsecções 3, 4, 5 e 6), algumas das quais reiteram ou reforçam compromissos assumidos no âmbito do GATS, são igualmente abrangidas pela competência da União Europeia nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

161.

A secção F contém sobretudo declarações de intenção. A única obrigação concreta (no artigo 8.58 do EUSFTA) proíbe a imposição de direitos aduaneiros, que é uma matéria claramente abrangida pela política comercial comum.

162.

O Parlamento e o Conselho não apresentaram argumentos específicos em relação às disposições do capítulo oito que não dizem respeito aos transportes ( 111 ).

163.

Os Estados‑Membros dedicam especial atenção a disposições específicas, como as relativas aos serviços financeiros e ao reconhecimento mútuo das qualificações profissionais.

164.

Vários Estados‑Membros alegam que a subsecção 6, relativa aos serviços financeiros, não é integralmente abrangida pela política comercial comum da União Europeia. A Diretiva 2014/65, relativa aos mercados de instrumentos financeiros («Diretiva MiFiD II») ( 112 ), que entrou em vigor em janeiro de 2017, harmoniza apenas certos aspetos da prestação de serviços financeiros e de investimento por nacionais de países terceiros.

165.

As regras em matéria de reconhecimento mútuo das qualificações profissionais também não são abrangidas pela política comercial comum. Em primeiro lugar, contrariamente ao que afirma a Comissão, o simples facto de uma matéria ter impacto nas relações comerciais externas ou ser regulada pelo direito económico internacional não é suficiente para que seja abrangida pela política comercial comum. Em segundo lugar, a Diretiva 2005/36/CE, relativa ao reconhecimento das qualificações profissionais ( 113 ), aplica‑se sem prejuízo da competência exclusiva dos Estados‑Membros no que diz respeito ao reconhecimento das qualificações profissionais adquiridas fora do território da União Europeia. De igual modo, no domínio dos transportes marítimos, as regras comuns adotadas, em especial na Diretiva 96/50/CE do Conselho (relativa às condições de obtenção dos certificados nacionais de condução de embarcações) e na Diretiva 2008/106/CE (relativa ao nível mínimo de formação dos marítimos) ( 114 ), apenas estabelecem regras mínimas que não podem ser afetadas pelo artigo 8.16 do EUSFTA. Em terceiro lugar, a Comissão não tem em conta o facto de que o GATS (em especial o seu artigo VII:1) não exige que os Membros da OMC reconheçam as qualificações profissionais adquiridas em países terceiros ou que celebrem acordos internacionais a esse respeito.

166.

Além disso, a forma como a liberalização deve ser levada a acabo nos termos do EUSFTA, em especial no domínio do estabelecimento, afetará ou poderá afetar os serviços de saúde e os serviços sociais, que continuam a ser da competência dos Estados‑Membros. Isso é incompatível com o artigo 207.o, n.o 6, TFUE. A Comissão alega também, incorretamente, que as disposições relativas ao comércio eletrónico apenas contêm declarações de intenção.

167.

Por último, a Comissão não pode invocar o artigo 216.o TFUE para justificar a existência de uma competência partilhada em domínios não abrangidos pela competência exclusiva da União Europeia. A Comissão não demonstrou a necessidade de celebrar o EUSFTA para alcançar um dos objetivos estabelecidos pelos Tratados.

Argumentos relativos aos transportes

168.

A Comissão trata separadamente as obrigações previstas no capítulo oito que estão especificamente relacionadas com os transportes (na lista de compromissos específicos da União Europeia, incluída no anexo 8‑A, e na subsecção 7 da secção E, relativa aos serviços de transporte marítimo internacional).

169.

A Comissão alega que, embora uma parte muito significativa das trocas comerciais entre Singapura e a União Europeia nos cinco setores dos transportes abrangidos pelo EUSFTA (aéreo, ferroviário, rodoviário, por vias interiores navegáveis e marítimo) seja efetuada em modo 3 (estabelecimento), as disposições relativas ao estabelecimento dos prestadores de serviços de transporte não são abrangidas pela exceção prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE. Isso acontece porque o estabelecimento em matéria de serviços de transporte não é abrangido pelo âmbito de aplicação do título VI da parte III do TFUE (em conjugação com o artigo 58.o, n.o 1, TFUE), ao qual o artigo 207.o, n.o 5, se refere, e porque nenhuma disposição do Tratado exclui a aplicação aos transportes das disposições relativas à liberdade de estabelecimento. A Comissão estabelece aqui uma analogia com a distinção entre, por um lado, a livre prestação de serviços de transporte de acordo com o direito derivado adotado nos termos do título VI da parte III do TFUE, que se restringe aos modos 1, 2 e 4, e, por outro, a liberdade de estabelecimento prevista no artigo 49.o e seguintes TFUE.

170.

No que diz respeito aos compromissos constantes do EUSFTA que estão abrangidos pela exceção prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE, a Comissão afirma que a competência exclusiva da União Europeia decorre do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE. A ação externa dos Estados‑Membros é suscetível de afetar as regras comuns adotadas no domínio dos serviços de transporte, que está em grande parte coberto essas regras comuns. No caso de o Tribunal de Justiça não concordar e considerar necessário analisar os compromissos relativos a cada um dos setores dos transportes, pelo menos os compromissos contidos no EUSFTA relativos ao transporte marítimo internacional, ao transporte ferroviário e ao transporte rodoviário, bem como a certos serviços auxiliares, são abrangidos pela competência exclusiva da União Europeia.

171.

Relativamente aos serviços de transporte aéreo, a Comissão afirma que a competência exclusiva da União Europeia em matéria de serviços de reparação e manutenção de aeronaves durante os quais a aeronave é retirada de serviço, em matéria de venda e de comercialização de serviços de transporte aéreo e em matéria de sistemas informatizados de reserva (aos quais são aplicáveis as secções B e C) assenta, em parte, no artigo 207.o, n.o 1, TFUE e, em parte, no primeiro e terceiro pressupostos visados no artigo 3.o, n.o 2, TFUE. Quanto aos serviços de reparação e manutenção de aeronaves, o artigo 12.o do Regulamento (CE) n.o 216/2008 ( 115 ) prevê a celebração de um acordo pela União Europeia (primeiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE). No que diz respeito à venda e à comercialização de serviços de transporte aéreo, a Comissão alega que estes serviços não implicam, em si mesmos, o transporte de mercadorias ou de passageiros: por conseguinte, são abrangidos pelo âmbito da política comercial comum. Os serviços de sistemas informatizados de reserva são amplamente regulados por normas comuns, em especial o Regulamento (CE) n.o 80/2009 ( 116 ), e, por conseguinte, são abrangidos pela competência exclusiva da União Europeia, em conformidade com o terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE.

172.

Devido à situação geográfica da União Europeia e de Singapura, a relevância prática dos modos 1, 2 e 4 é limitada.

173.

Assim, no que se refere concretamente ao transporte por vias interiores navegáveis, não existe, na prática, exercício de competência externa através do EUSFTA.

174.

No que diz respeito ao transporte ferroviário, a União Europeia não aceitou nenhum compromisso em modos 1 ou 4 e só aceitou compromissos integrais no que diz respeito ao modo 2. Estes compromissos são, em todo o caso, acessórios dos compromissos do EUSFTA no domínio dos transportes ou da política comercial comum. No que diz respeito à prestação de serviços de transporte ferroviário por uma filial de uma sociedade de Singapura estabelecida num Estado‑Membro para outro Estado‑Membro (modo 3), a Diretiva 2012/34/UE autoriza a livre prestação de serviços no interior da União por operadores estabelecidos num Estado‑Membro, sem impor requisitos de nacionalidade em relação aos proprietários da filial ( 117 ). Assim, esta matéria é abrangida por regras comuns.

175.

No que diz respeito ao transporte rodoviário, a União Europeia aceitou compromissos limitados em matéria de transporte de passageiros e de mercadorias. Não foram assumidos compromissos em modo 1. Em contrapartida, a União Europeia assume um compromisso integral (sem reservas) para o modo 2 e um compromisso sujeito a reservas para o modo 4. À semelhança do que acontece com o transporte ferroviário, os compromissos assumidos têm um interesse limitado. Em todo o caso, o compromisso específico em modo 2 é acessório dos outros compromissos previstos no EUSFTA. No que diz respeito à prestação destes serviços por uma filial de uma sociedade de Singapura estabelecida num Estado‑Membro para outro Estado‑Membro (modo 3), os Regulamentos (CE) n.o 1072/2009 ( 118 ) e n.o 1073/2009 ( 119 ), em conjugação com o Regulamento (CE) n.o 1071/2009 ( 120 ), estabelecem regras comuns no que se refere às condições de estabelecimento dos operadores de transporte rodoviário na União Europeia. Uma vez que esses regulamentos são aplicáveis independentemente da nacionalidade dos proprietários da filial, a prestação transfronteiras de serviços de transporte rodoviário por sociedades estabelecidas na União Europeia está em grande parte coberta por regras comuns. A União Europeia dispõe, assim, da correspondente competência externa exclusiva nos termos do artigo 3.o, n.o 2, TFUE. Por último, quanto ao modo 4, a Comissão aduz os mesmos argumentos em relação ao transporte rodoviário que aduz em relação ao transporte marítimo ( 121 ). Na prática, uma empresa de transporte rodoviário de Singapura pode enviar pessoal‑chave (muito provavelmente transferências dentro das empresas ( 122 )) para o estabelecimento que criou num Estado‑Membro. Nesse caso, a Diretiva 2014/66/UE é aplicável à entrada e à residência desses nacionais de países terceiros no âmbito de transferências dentro das empresas ( 123 ). Em todo o caso, esses compromissos são acessórios do compromisso assumido pela União Europeia no que diz respeito à prestação de serviços de transporte rodoviário em modo 3 (em relação ao qual a União Europeia dispõe de competência exclusiva ( 124 )).

176.

No que diz respeito ao transporte marítimo, a Comissão alega que o Regulamento (CEE) n.o 4055/86 ( 125 ) prevê regras comuns e abrange, pelo menos, uma parte significativa da prestação de serviços de transporte marítimo entre os Estados‑Membros e Estados terceiros. Abrange igualmente o tratamento de nacionais de países terceiros (a saber, o pessoal de certas empresas de navegação estabelecidas em países terceiros). Ao contrário dos regulamentos relevantes para o transporte aéreo, o Regulamento n.o 4055/86 aplica‑se a certas empresas de navegação de países terceiros ( 126 ). Este regulamento também não se limita às rotas de navegação no interior da União. Além disso, aplica‑se à prestação (transfronteiras) de serviços de transporte marítimo por filiais de sociedades de Singapura estabelecidas num Estado‑Membro, a partir desse Estado‑Membro para outro Estado‑Membro.

177.

No que diz respeito ao modo 4, a Comissão afirma que, na prática, uma empresa de transporte marítimo de Singapura enviará pessoal‑chave (muito provavelmente transferências dentro das empresas) para o estabelecimento que criou num Estado‑Membro. Nesse caso, a Diretiva 2014/66 é aplicável às condições de entrada e de residência dos nacionais de países terceiros no âmbito de transferências dentro das empresas. Em todo o caso, o compromisso em modo 4 é um complemento necessário ao compromisso em modo 3, relativamente ao qual a União Europeia dispõe de competência exclusiva ( 127 ).

178.

A Comissão acrescenta que os serviços portuários, que são objeto do artigo 8.56, n.o 6, do EUSFTA (parte da subsecção 7), não foram liberalizados para os prestadores estrangeiros desses serviços. Tal deve‑se ao facto de não fazerem parte da lista de compromissos da União Europeia. O artigo 8.56, n.o 6, do EUSFTA é um simples aprofundamento das obrigações de tratamento nacional no que diz respeito ao transporte marítimo internacional, na medida em que esteja liberalizado.

179.

No que diz respeito aos serviços auxiliares de transporte marítimo, transporte por vias interiores navegáveis, transporte ferroviário e transporte rodoviário, a Comissão alega que alguns desses serviços não são serviços de transporte. Assim, inserem‑se no âmbito da política comercial comum da União Europeia. É o caso, em particular, dos serviços prestados pelos despachantes aduaneiros. Relativamente à manutenção e reparação de equipamento para o transporte marítimo, o transporte por vias interiores navegáveis, o transporte ferroviário e o transporte rodoviário, a Comissão alega que esses serviços são abrangidos pelos compromissos da União Europeia em matéria de serviços prestados às empresas. Por conseguinte, são abrangidos pela política comercial comum.

180.

No caso de o Tribunal de Justiça concluir que determinadas disposições do EUSFTA relativas aos serviços de transporte não se enquadram no âmbito das competências exclusivas da União Europeia, a Comissão afirma que essas disposições se inserem nas competências partilhadas da União Europeia porque, em conformidade com o disposto no segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE, esses compromissos internacionais são necessários para alcançar um dos objetivos dos Tratados. A Comissão refere, em especial, o objetivo de estabelecer regras comuns para os serviços de transporte entre a União Europeia e Estados terceiros, previsto no artigo 91.o, n.o 1, TFUE.

181.

O Parlamento alega que determinados serviços (como o armazenamento e o depósito, os serviços de transitário, os serviços de reboque e de tração) são serviços auxiliares dos serviços de transporte marítimo, pelo que devem ser tratados da mesma forma que estes últimos. O Parlamento afirma ainda que os compromissos em modo 4 (presença temporária de pessoas singulares) são necessários para assegurar um direito de estabelecimento efetivo. Por conseguinte, o regime jurídico da prestação de serviços em modo 4 deve seguir o do modo 3 e, consequentemente, escapar à exceção estabelecida no artigo 207.o, n.o 5, TFUE. Caso os serviços em modo 4 sejam, contudo, considerados de forma autónoma, os compromissos correspondentes continuam a ser abrangidos pelo artigo 207.o, n.o 1, TFUE, pois a presença temporária de pessoas singulares é regulada pelas disposições do Tratado relativas à entrada e à residência de nacionais de países terceiros no território dos Estados‑Membros, e não pelas disposições relativas à política de transportes, constantes do título VI da parte III do TFUE. No que diz respeito ao transporte marítimo, o Parlamento acrescenta que, nos termos do Regulamento n.o 4055/86, a União Europeia dispõe de competência exclusiva relativamente aos convénios de repartição de cargas.

182.

O Conselho e muitos Estados‑Membros alegam que não existe fundamento para excluir o estabelecimento no domínio dos transportes do âmbito de aplicação do artigo 207.o, n.o 5, TFUE. As disposições do título VI, relativo aos transportes, e a jurisprudência também não indicam que o estabelecimento no domínio dos transportes fica totalmente fora do âmbito de aplicação dessas disposições. O artigo 58.o, n.o 1, TFUE não sustenta a interpretação do artigo 207.o, n.o 5, TFUE feita pela Comissão. Embora não exista uma disposição semelhante sobre o direito de estabelecimento, a livre circulação dos trabalhadores e a livre circulação de capitais, a interpretação da Comissão restringe o título relativo aos transportes a matérias relacionadas com a livre prestação de serviços. Em todo o caso, o artigo 58.o, n.o 1, TFUE não consta do título relativo aos transportes. Não seria coerente com a estrutura dos Tratados que uma disposição que reduz significativamente o âmbito do título relativo aos transportes não constasse desse mesmo título. O Conselho e muitos Estados‑Membros referem exemplos de atos legislativos da União Europeia baseados no artigo 91.o, n.o 1, ou no artigo 100.o, n.o 2, TFUE e que dizem respeito à liberdade de estabelecimento ou à livre circulação dos trabalhadores no domínio dos transportes ( 128 ).

183.

O Conselho afirma que o âmbito das matérias relativas aos transportes abrangidas pelo EUSFTA é muito mais amplo do que a Comissão sugere. O Conselho e muitos Estados‑Membros acrescentam que a relevância prática de uma disposição do EUSFTA (em especial, no que diz respeito ao transporte por vias interiores navegáveis, ferroviário e rodoviário) não afeta a repartição de competências externas. De igual modo, o âmbito de uma matéria não se torna mais limitado em consequência das reservas exprimidas pela União Europeia em benefício de um Estado‑Membro individual ( 129 ) (por exemplo, no que diz respeito a serviços de leasing e de aluguer sem operadores, relativos a navios, aeronaves e outro equipamento de transporte, previstos na lista de compromissos específicos da União Europeia, ou no que diz respeito à manutenção e reparação de navios, de equipamento de transporte ferroviário, de veículos automóveis, de motociclos, de motoneves e de equipamento de transporte rodoviário bem como de aeronaves e suas peças sobressalentes previstas nessa mesma lista).

184.

O Conselho é de opinião que a Comissão não demonstrou que os pressupostos visados no artigo 3.o, n.o 2, TFUE se verifiquem no que diz respeito a todas as disposições relativas aos transportes do capítulo oito. Entre os domínios que não são abrangidos pela competência exclusiva da União Europeia estão: i) os serviços auxiliares de transporte rodoviário, ferroviário e por vias interiores navegáveis e muitos dos serviços auxiliares dos serviços de transporte marítimo; ii) os serviços de transporte marítimo no que se refere aos navios que arvoram o pavilhão de um Estado terceiro, os serviços de transporte marítimo prestados em modo 3 e os serviços de transporte marítimo prestados em modo 4 no que diz respeito aos vendedores de serviços às empresas e aos visitantes de negócios para efeitos de estabelecimento; iii) os serviços de transporte por vias interiores navegáveis; iv) os serviços de transporte ferroviário prestados em modo 2 bem como a manutenção e reparação de equipamento de transporte ferroviário urbano e suburbano; v) os serviços de transporte rodoviário prestados em modo 2 e os serviços de transporte rodoviário prestados em modo 4 no que diz respeito aos vendedores de serviços às empresas e aos visitantes de negócios para efeitos de estabelecimento; e vi) o reconhecimento mútuo das qualificações profissionais. Mesmo que o Tribunal de Justiça concorde com a interpretação estrita do artigo 207.o, n.o 5, TFUE feita pela Comissão, partes do capítulo oito não são, em todo o caso, abrangidas pela competência exclusiva da União Europeia.

185.

O Conselho e muitos Estados‑Membros alegam igualmente que a Comissão não pode agrupar todas as matérias relacionadas com os transportes referidas no EUSFTA como um único «domínio» relevante para efeitos de aplicação do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE. O Conselho alega que alguns serviços auxiliares são tão distintos que formam um domínio próprio. Para efeitos do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE, os «domínios» relevantes devem ser definidos por referência aos diferentes modos de transporte e não estão em grande parte cobertos por regras comuns.

186.

Assim, no que diz respeito ao transporte marítimo, as disposições relevantes do EUSFTA contêm obrigações que não são abrangidas pelo âmbito de aplicação do Regulamento n.o 4055/86. Este regulamento tem, portanto, um âmbito de aplicação mais restrito. Além disso, ao contrário do EUSFTA, o Regulamento n.o 4055/86 não é aplicável a todos os modos de prestação de serviços. Não diz respeito aos serviços portuários (auxiliares) ou a outros serviços auxiliares de transporte marítimo, mas apenas ao transporte de pessoas ou de mercadorias.

187.

Quando o regulamento seja, de facto, aplicável, deve estabelecer‑se uma distinção entre os convénios de repartição de cargas, que são em grande parte abrangidos pelo artigo 3.o do Regulamento n.o 4055/86, e todas as outras restrições à livre circulação de serviços no setor dos transportes marítimos, que não são em grande parte abrangidas por esse regulamento.

188.

No que diz respeito ao transporte por vias interiores navegáveis, a Comissão não identificou quaisquer regras comuns que possam ser afetadas pelas disposições do EUSFTA. A competência exclusiva nos termos do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE não pode ser estabelecida nesse domínio com base nos Regulamentos (CEE) n.o 3921/91 ( 130 ) ou (CE) n.o 1356/96 do Conselho ( 131 ).

189.

No que diz respeito ao transporte ferroviário, os compromissos em modo 3 assumidos pela União no EUSFTA podem afetar a Diretiva 2012/34, que estabelece um espaço ferroviário europeu único. Contudo, esta diretiva não contém regras relativas ao modo 2.

190.

No que diz respeito ao transporte rodoviário, a Comissão não demonstrou a existência de quaisquer regras comuns relacionadas com o modo 2. Além disso, no que diz respeito ao modo 4, a Diretiva 2014/66 não é aplicável a uma empresa de Singapura que ainda não tenha um estabelecimento num Estado‑Membro. Existem regras comuns apenas no que diz respeito ao modo 3. Estas regras constam, em especial, dos Regulamentos n.o 1071/2009, n.o 1072/2009 e n.o 1073/2009, que não impõem um requisito de nacionalidade para a prestação de serviços de transporte rodoviário.

191.

No que diz respeito ao transporte aéreo, a União Europeia dispõe, nos termos do artigo 3.o, n.o 2, TFUE, de competência externa exclusiva no que se refere aos serviços de sistemas informatizados de reserva, como resultado do Regulamento n.o 80/2009. Contudo, a Comissão não tem razão no que diz respeito aos serviços de reparação e manutenção de aeronaves (quanto à alegação de que a base para a celebração de um acordo internacional é o artigo 12.o do Regulamento n.o 216/2008) e à venda e à comercialização de serviços de transporte aéreo (que, na opinião da Comissão, não são abrangidos pela exceção prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE). Tais serviços estão indissociavelmente ligados aos transportes, sendo mesmo essenciais para a prestação de serviços de transporte.

192.

No que diz respeito aos modos de prestação de serviços de transporte (e não aos modos de transporte), não existem regras comuns relativas à prestação de serviços de transporte em modo 3 (estabelecimento). A adoção de tais regras também não está prevista num futuro próximo. O modo 4 não é totalmente abrangido por regras comuns, em especial pela Diretiva 2014/66. Esta diretiva é aplicável, em especial, à transferência dentro das empresas de nacionais de países terceiros tais como gestores, especialistas e empregados estagiários, mas não a outro pessoal‑chave. Além disso, as suas disposições sobre as condições de entrada e de residência de nacionais de países terceiros não prejudicam a aplicação de disposições mais favoráveis constantes a) da legislação da UE, incluindo os acordos bilaterais ou multilaterais; e b) dos acordos bilaterais ou multilaterais celebrados entre um ou mais Estados‑Membros e um ou mais países terceiros ( 132 ). Tais disposições favoráveis constam do EUSFTA, em especial do artigo 8.14, conjugado com o artigo 8.13. Embora a União Europeia tenha competência externa exclusiva implícita em matéria de residência de curta duração (em consequência da adoção do Regulamento n.o 810/2009, que estabelece o Código Comunitário de Vistos ( 133 )), os Estados‑Membros continuam a ser competentes no que diz respeito aos vistos de longa duração, com exceção dos casos específicos que estão sujeitos a regras comuns (como o caso da transferência dentro de um grupo de empresas).

193.

Além disso, ao contrário da Comissão, os Estados‑Membros alegam que o modo 4 é um modo distinto de prestação de serviços. O modo 4 não pode ser considerado um acessório necessário ao estabelecimento (modo 3), que muitas vezes implica a contratação de pessoal local.

194.

Por último, o reconhecimento da competência externa exclusiva da União Europeia no que diz respeito às disposições do capítulo oito relativas à presença temporária de pessoas singulares teria como consequência a harmonização, violando assim não só a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros decorrente do Protocolo n.o 21 como também o artigo 207.o, n.o 6, TFUE.

Análise

Introdução

195.

No parecer 1/94, o Tribunal de Justiça declarou, no que diz respeito ao comércio de serviços — diferentes dos serviços de transporte — regulado pelo GATS, que apenas as prestações transfronteiras que não implicassem qualquer circulação de pessoas («modo 1») podiam ser equiparadas a comércio de mercadorias e, por conseguinte, ser abrangidas pela política comercial comum ( 134 ). Em contrapartida, os modos 2 a 4 (ou seja, consumo no estrangeiro, presença comercial e presença de pessoas singulares, respetivamente) implicavam a circulação de pessoas e diziam respeito ao tratamento dos nacionais de países terceiros aquando da passagem das fronteiras externas dos Estados‑Membros. Por conseguinte, esses modos permaneciam fora do âmbito da política comercial comum ( 135 ).

196.

Posteriormente, o Tratado de Nice alargou o âmbito da política comercial comum de forma a abranger, em especial, a negociação e a celebração de acordos sobre o comércio de serviços na medida em que esses acordos ainda não estivessem abrangidos pela política comercial comum ( 136 ). Não foi estabelecida nenhuma distinção em função do modo de prestação de serviços. Contudo, essa competência estava sujeita a um conjunto complexo de regras constantes do artigo 133.o, n.os 5 e 6, CE. Uma exceção previa que os acordos relativos ao comércio de serviços em determinados setores (cultural, audiovisual, dos serviços de educação, social e da saúde humana) continuavam a ser abrangidos pela competência partilhada entre a [então] Comunidade Europeia e os Estados‑Membros ( 137 ). Sem prejuízo destas exceções, o Tribunal de Justiça declarou, no parecer 1/08, que a Comunidade adquirira competência exclusiva para celebrar, em especial, acordos internacionais relativos ao comércio de serviços prestados em modos 2 a 4 ( 138 ). Fê‑lo sem analisar em pormenor o tipo de obrigação assumida pela Comunidade para cada um desses modos de prestação de serviços.

197.

Na sequência da entrada em vigor do Tratado de Lisboa, o artigo 207.o, n.o 1, TFUE passou a abranger o comércio de serviços nos quatro modos regulados pelo artigo I:2, alíneas a) a d), do GATS, uma vez que a distinção entre comércio de mercadorias e de serviços foi eliminada. O artigo 207.o TFUE já não contém uma derrogação (setorial) da competência exclusiva da União Europeia nesse domínio, embora a exceção geral no que diz respeito aos transportes continue a ser aplicável ( 139 ). Assim, a política comercial comum passou a abranger a totalidade do GATS na medida em que esse acordo seja aplicável aos serviços diferentes dos serviços de transporte.

198.

Qual é a situação relativamente ao capítulo oito do EUSFTA?

199.

Para determinar a competência da União Europeia no que se refere ao capítulo oito e a natureza dessa competência, é necessário estabelecer uma distinção entre as partes desse capítulo que são abrangidas pela política comercial comum (artigo 207.o TFUE) e as que podem ser da competência da União Europeia com base noutra disposição. Isto porque o artigo 207.o, n.o 5, TFUE exclui expressamente os serviços de transporte do âmbito da política comercial comum.

200.

Por conseguinte, começarei por analisar se, na medida em que não é aplicável aos serviços de transporte, o capítulo oito está abrangido pela competência exclusiva da União Europeia em matéria de política comercial comum. Em seguida, analisarei separadamente a competência da União Europeia no que diz respeito às disposições do capítulo oito que são aplicáveis aos serviços de transporte. Neste contexto, é necessário ter em conta as disposições que abordam expressamente a questão de saber se esse capítulo é ou não aplicável a esses serviços, as disposições geralmente aplicáveis, as disposições específicas em matéria de serviços marítimos internacionais e os compromissos constantes da lista de compromissos específicos da União Europeia. Esta lista contém listas separadas para a prestação transfronteiras de serviços, o estabelecimento, o pessoal‑chave e os estagiários de nível pós‑universitário, bem como para os vendedores de serviços às empresas. Essas listas separadas contêm compromissos específicos (sub)setoriais relativos aos transportes (em especial, transporte marítimo, transporte por vias interiores navegáveis, transporte ferroviário, transporte rodoviário, transporte por condutas de produtos, diferentes de combustíveis) e aos serviços auxiliares desses diferentes tipos de transportes.

Competência exclusiva com base no artigo 207.o, n.o 1, TFUE, em conjugação com o artigo 3.o, n.o 1, TFUE

201.

As secções B a D do capítulo oito (prestação transfronteiras de serviços, consumo no estrangeiro ( 140 ), estabelecimento e presença temporária de pessoas singulares por motivos profissionais) são aplicáveis às prestações de serviços que correspondem aos modos 1 a 4 previstos no GATS. Por conseguinte, as regras relativas a esses modos de prestação de serviços são, em princípio, abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 207.o, n.o 1, TFUE. O mesmo se aplica às obrigações horizontais previstas na secção E («Quadro regulamentar»), subsecções 1 (reconhecimento mútuo das qualificações profissionais e transparência) e 2 (regulamentação interna), e às obrigações específicas setoriais previstas nas subsecções 3 (serviços de informática), 4 (serviços postais), 5 (serviços de telecomunicações) e 6 (serviços financeiros). De igual modo, a secção F, relativa ao «Comércio eletrónico», tem essencialmente como objetivo aumentar as oportunidades comerciais que podem resultar da utilização e do desenvolvimento do comércio eletrónico. A secção G estabelece as condições em que as Partes podem adotar medidas que, de outra forma, poderiam ser incompatíveis com o capítulo oito e prevê o reexame deste capítulo. Por conseguinte, estas secções têm efeitos diretos e imediatos no comércio, pelo que são abrangidas pela política comercial comum da União Europeia.

202.

Uma questão diferente é saber se a secção C («Estabelecimento», ou seja, prestação de serviços em modo 3) também diz respeito ao investimento estrangeiro direto. A Comissão admite que a secção C do capítulo oito pode ser aplicável, nos termos do artigo 8.8, alínea d), do EUSFTA, a formas de estabelecimento criadas para efetuar uma atividade económica que não implique (exclusivamente) a prestação de serviços. Essas formas de estabelecimento podem, por conseguinte, não ser abrangidas pelo «comércio de serviços» previsto no artigo 207.o, n.o 1, TFUE. Contudo, a Comissão alega que, quando satisfaça as condições para ser qualificado como «investimento estrangeiro direto», o estabelecimento já é abrangido pela política comercial comum da União Europeia. Abordarei este argumento no n.o 326, infra.

203.

Em seguida, como já expliquei ( 141 ), o comércio de serviços em modo 4 (presença temporária de pessoas singulares) insere‑se no âmbito da política comercial comum, sob reserva da exceção prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE. Este é o motivo pelo qual rejeito os argumentos aduzidos por alguns Estados‑Membros em relação aos Protocolos n.o 21 e n.o 22. Estes protocolos não são suscetíveis de ter qualquer efeito na questão de saber qual a base jurídica correta para o Conselho decidir celebrar um acordo internacional. É a base jurídica de uma medida que determina os protocolos a aplicar, e não o contrário ( 142 ). Ambos os protocolos abrangem o título V da parte III do TFUE (Domínio da Liberdade, Segurança e Justiça). Nada indica que esse título possa ser parte da base jurídica da decisão de celebrar o EUSFTA. Tal acontece, em especial, devido ao artigo 8.1, n.o 4, do EUSFTA e ao facto de o modo 4 (abrangido pelo EUSFTA) dizer respeito à presença temporária de pessoas singulares por motivos profissionais.

204.

De igual modo, não posso subscrever o argumento apresentado por alguns Estados‑Membros no que diz respeito aos serviços financeiros. Esse argumento exige que a União Europeia tenha adotado direito derivado para que um domínio seja abrangido pela competência exclusiva da União Europeia em matéria de política comercial comum. Já expliquei que nem o artigo 3.o, n.o 1, alínea e), TFUE nem o artigo 207.o, n.o 1, TFUE tornam a competência da União Europeia dependente da adoção prévia de regras harmonizadas ou de outras regras em matéria de relações comerciais entre a União Europeia e Estados terceiros ( 143 ). Neste contexto, não é necessário explorar o âmbito da Diretiva MiFiD II, que foi referida na audiência.

205.

Também não estou convencido de que a política comercial comum não abranja o artigo 8.16 do EUSFTA, relativo ao reconhecimento mútuo das qualificações profissionais. Tal reconhecimento mútuo é suscetível de ter um impacto direto na liberalização do comércio de serviços, em especial no que diz respeito aos modos 3 e 4, porque facilita a circulação de pessoas para efeitos de prestação de serviços. Além disso, o artigo 8.16 do EUSFTA não harmoniza os requisitos em matéria de qualificação e/ou de experiência profissional, nem exige ou proíbe que as Partes imponham esses requisitos. Procura antes incentivar as Partes a adotarem uma recomendação (e possivelmente a negociarem um acordo) sobre o reconhecimento mútuo dos requisitos em matéria de qualificação e/ou de experiência profissional. A sua função é, por conseguinte, semelhante à do artigo VII do GATS.

206.

Por último, como já expliquei ( 144 ), o âmbito da política comercial comum, que é uma política autónoma, não pode ficar dependente da adoção prévia de disposições de direito derivado da União que regulem o mercado interno, nem, a fortiori, do âmbito e do conteúdo dessas disposições. Por esta razão, a Diretiva 2005/36 não pode modificar a repartição de competências que resulta dos artigos 3.°, n.o 1, alínea e), e 207.°, n.o 1, TFUE.

207.

Por conseguinte, concluo que, embora sujeitas à exceção relativa aos transportes prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE, as secções B a G do capítulo oito são abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 207.o, n.o 1, TFUE. Daqui decorre que a secção A, que estabelece os objetivos e o âmbito desse capítulo, é igualmente abrangida pela política comercial comum (sujeita à mesma exceção).

Matérias excluídas do âmbito da política comercial comum por força do artigo 207.o, n.o 5, TFUE

208.

As regras em matéria de transportes são excluídas do âmbito da competência exclusiva da União Europeia por força do artigo 207.o, n.o 5, TFUE. Por conseguinte, na medida em que o capítulo oito se aplique a serviços de transporte, é necessário analisar se a União Europeia tem, não obstante, competência exclusiva com base no artigo 3.o, n.o 2, TFUE ( 145 ).

209.

As observações apresentadas no presente processo demonstram que o alcance preciso da exclusão prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE permanece indefinido. O artigo 207.o, n.o 5, TFUE abrange o estabelecimento no setor dos transportes? E os serviços que apenas podem ser prestados no setor dos transportes são igualmente abrangidos por essa exceção? Abordarei cada uma destas questões individualmente.

210.

No que diz respeito à primeira questão, não interpreto o artigo 207.o, n.o 5, TFUE da mesma forma que a Comissão.

211.

O artigo 207.o, n.o 5, TFUE coloca a «celebração de acordos internacionais no domínio dos transportes» fora da política comercial comum. Apesar de esta disposição prever que tais acordos estão sujeitos, inter alia, às disposições do título VI da parte III do TFUE, essa referência diz respeito aos efeitos da exceção, e não ao seu âmbito. Os argumentos do Conselho e dos Estados‑Membros no contexto dos transportes incidiram, no essencial, nas questões relacionadas com o estabelecimento (modo 3).

212.

Uma vez que o artigo 207.o, n.o 5, TFUE não estabelece uma distinção entre os modos de prestação de serviços, não encontro fundamento para considerar que a exceção nele contida não se aplica aos serviços prestados em modo 3. Esta conclusão é confirmada (pelo menos implicitamente) pelo parecer 1/08, no qual o Tribunal de Justiça concluiu que o aspeto relativo aos transportes dos acordos em causa, que abrangia igualmente o modo 3, se inseria no domínio da política de transportes. Assim, ao aplicar o (atual) artigo 207.o, n.o 5, TFUE, o Tribunal de Justiça não estabeleceu qualquer distinção entre os vários modos de prestação de serviços ( 146 ).

213.

Em todo o caso, o estabelecimento não está excluído do âmbito do título VI da parte III do TFUE, sobre «Os transportes». Este título aplica‑se a todos os modos de prestação de serviços sempre que estejam em causa serviços de transporte. Assim, por exemplo, o estabelecimento pode ser abrangido por legislação adotada nos termos do artigo 91.o, n.o 1, alínea b), TFUE, que estabeleça as condições em que os transportadores não residentes podem efetuar serviços de transporte num Estado‑Membro.

214.

É verdade que o artigo 58.o, n.o 1, TFUE (que faz parte do capítulo 3 do título IV, relativo a serviços) dispõe que a livre prestação de serviços em matéria de transportes é regulada pelas disposições constantes do título VI da parte III do TFUE, e também é verdade que não existe uma disposição análoga no capítulo 2 do título IV, relativo ao direito de estabelecimento. O Tribunal de Justiça declarou que o artigo 58.o, n.o 1, TFUE está incluído no capítulo 3 («Os Serviços») do título IV do Tratado FUE porque os transportes são, no essencial, um serviço. Uma vez que, em razão dos aspetos especiais deste ramo de atividade económica, era necessário submeter os transportes a um regime especial ( 147 ), os serviços de transporte são autonomizados e expressamente regulados pelo título VI da parte III do TFUE, e não pelas disposições desse Tratado relativas à livre circulação de serviços ( 148 ).

215.

Contudo, a inexistência de uma disposição análoga ao artigo 58.o, n.o 1, TFUE no capítulo 2 do título IV, relativo ao direito de estabelecimento, não significa que o estabelecimento esteja, enquanto tal, excluído do título VI da parte III do TFUE. Significa tão só que o estabelecimento no setor dos transportes não está excluído do âmbito do capítulo 2 do título IV. O Tribunal de Justiça considerou, no essencial, que esse capítulo é diretamente aplicável aos transportes, pelo menos na medida em que não sejam aplicáveis regras mais específicas adotadas com base no título VI da parte III ( 149 ).

216.

Passo a analisar a questão de saber se os serviços prestados no setor dos transportes são abrangidos pela exceção prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE. A resposta a esta questão implica uma tomada de posição sobre a questão de saber se o grau de conexão entre o serviço e o transporte deve atingir um determinado limiar para desencadear a exceção prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE. Em especial, coloca‑se a questão de saber se serviços como a carga e descarga, o desalfandegamento, a agência marítima, o aluguer de embarcações com tripulação ou a venda e comercialização de serviços de transporte aéreo são abrangidos pela política comercial comum ou pela política comum de transportes.

217.

Na minha opinião, a expressão «acordos internacionais no domínio dos transportes» abrange acordos (ou partes de acordos) que se apliquem não apenas a serviços de transporte enquanto tais (designadamente o transporte de mercadorias ou de pessoas por via aérea, rodoviária, ferroviária, marítima ou por vias interiores navegáveis) mas igualmente a serviços que estejam intrínseca e indissociavelmente ligados a tais serviços, ou seja, serviços especificamente relacionados com serviços de transporte e dependentes destes ( 150 ).

218.

A coerência da ação externa em matéria de transportes exige que o próprio serviço de transporte e o serviço auxiliar façam parte da mesma política comum. A coerência da política da União Europeia no que diz respeito aos serviços de transporte enquanto tais e a liberalização adequada desses serviços poderiam ficar comprometidas na falta de uma política correspondente no que diz respeito aos serviços que estão intrinsecamente ligados aos transportes e que, na prática, tornam possível a prestação de serviços de transporte. Assim, por exemplo, o transporte marítimo de carga em contentores não tem utilidade se não estiverem disponíveis serviços para descarregar os contentores do navio, de forma que o seu conteúdo possa seguidamente ser transportado e finalmente entregue aos destinatários. Por conseguinte, as medidas de liberalização do acesso dos navios cargueiros aos portos poderiam ficar comprometidas se, por exemplo, os serviços de carga e descarga continuassem sujeitos a medidas protecionistas. O mesmo acontece, por exemplo, com a manutenção e reparação de equipamento de transporte, relativamente às quais se pode presumir que exigem know‑how e aparelhagem técnicas específicas ao modo de transporte em causa, e que são necessárias para assegurar a eficiência desse transporte. De igual modo, os sistemas de reserva por computador consistem em sistemas informatizados nos quais são recolhidos e disponibilizados ao público dados para efeitos de reserva e, por fim, de aquisição (em especial) serviços de transporte. O facto de esses sistemas poderem ser igualmente utilizados para reservar e adquirir alojamento para viajantes em nada não modifica o facto de terem como principal razão de ser a venda de serviços de transporte. Esta interpretação encontra apoio no parecer 1/08, no qual o Tribunal de Justiça afirmou que «determinados serviços de transporte aéreo» cobertos pela lista em causa nesse processo incluíam «serviços de reparação e manutenção de aeronaves, a venda e a comercialização de serviços de transportes ou ainda os serviços de sistemas informatizados de reservas» ( 151 ).

219.

Por outro lado, serviços que não estejam intrínseca e indissociavelmente ligados a serviços de transporte, como os serviços de desalfandegamento, não são abrangidos pela exceção prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE. Tais serviços são prestados porque são importadas e exportadas mercadorias. Isso implica, obviamente, a circulação transfronteiras de mercadorias, utilizando diversas formas de transporte. Contudo, a necessidade desses serviços ocorre independentemente dos modos de transporte utilizados.

Competência exclusiva com base no artigo 3.o, n.o 2, TFUE

220.

No que diz respeito às matérias abrangidas pelo âmbito da exclusão prevista no artigo 207.o, n.o 5, TFUE e, por conseguinte, pelo domínio dos transportes, as competências são, em princípio, partilhadas entre a União Europeia e os Estados‑Membros ( 152 ). A Comissão alega, contudo, que a União Europeia dispõe de competência externa exclusiva com base quer no primeiro quer no terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE, consoante o serviço de transporte em causa.

– Primeiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE

221.

A Comissão alega que o artigo 12.o do Regulamento n.o 216/2008 prevê a celebração de um acordo pela União Europeia. É a razão pela qual a União Europeia dispõe de competência exclusiva para celebrar um acordo na medida em que este diga respeito a serviços de manutenção e reparação de aeronaves.

222.

Discordo.

223.

O Regulamento n.o 216/2008 cria a Agência Europeia para a Segurança da Aviação e estabelece um quadro amplo e adequado para a definição e a aplicação de regras técnicas e procedimentos administrativos comuns no domínio da aviação civil e para a segurança dos aviões de países terceiros que usam os aeroportos comunitários ( 153 ). Aplica‑se, inter alia, à manutenção e operação de produtos aeronáuticos (incluindo, assim, aeronaves ( 154 )), peças e equipamentos ( 155 ).

224.

Nos termos do artigo 12.o, a União Europeia deve celebrar com países terceiros acordos de reconhecimento mútuo, relativos à utilização de certificados emitidos pelas autoridades aeronáuticas desses países, que certificam a conformidade com os requisitos de segurança da aviação civil. Esta disposição, em conjugação com o terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE, constitui a base que permite à União Europeia celebrar, sem os Estados‑Membros, com países terceiros, acordos internacionais relativos ao reconhecimento mútuo desses certificados. Contudo, não cria uma competência externa exclusiva da UE para celebrar acordos internacionais com o objetivo a liberalização do comércio de serviços de manutenção e reparação de aeronaves. Por outras palavras, o facto de o legislador ter decidido que os Estados‑Membros não podem celebrar os seus próprios acordos internacionais no que diz respeito a um aspeto específico de determinada política não significa que o primeiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE possa ser utilizado para invocar uma competência externa exclusiva em relação a toda essa política ou a outros aspetos dela.

– Terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE

225.

O primeiro passo que a aplicação do artigo 3.o, n.o 2, TFUE implica consiste em definir o domínio em causa ( 156 ). As partes no presente processo não estão de acordo quanto ao que constitui o domínio relevante para efeitos de apurar se a União Europeia dispõe de competência exclusiva na medida em que o EUSFTA se aplica a serviços de transporte.

226.

Ao não assumir compromissos ou ao assumir apenas compromissos muito limitados para determinados modos de transporte previstos no capítulo oito, a União Europeia optou por exercer a sua competência de uma forma especial. Nestas circunstâncias, a base jurídica para o exercício dessa competência externa deve estar nos Tratados. Por exemplo, resulta da lista de compromissos específicos anexa ao capítulo oito que a União Europeia não assume compromissos no que diz respeito ao modo 1 para serviços de transporte ferroviário ( 157 ). Assim, optou por não aceitar nenhuma obrigação. Isso pressupõe que a União Europeia dispõe de competência para efetuar esta opção. Essa competência deve ter uma base jurídica nos Tratados. O mesmo raciocínio se aplica aos compromissos que possam ter pouca relevância prática (por exemplo, devido à distância geográfica entre a União Europeia e Singapura). Quando uma competência é exercida, aplicam‑se as regras do Tratado relevantes em matéria de repartição de competências externas entre a União Europeia e os Estados‑Membros. Daí eu concordar com o Conselho em que essa repartição não pode ser diferente consoante a localização geográfica dos países terceiros com os quais a União Europeia celebre determinado acordo internacional.

227.

Por outro lado, as opções efetuadas no exercício de competências, bem como os efeitos práticos dessas opções, podem ter um impacto na questão de saber se o acordo internacional afeta regras comuns ou altera o seu alcance. A última etapa da análise AETR exige, como expliquei, que se examine concretamente as consequências dos compromissos internacionais no direito derivado da União no domínio correspondente ( 158 ).

228.

Os compromissos horizontais previstos no capítulo oito e os compromissos horizontais e compromissos específicos setoriais constantes da lista de compromissos específicos, anexa a esse capítulo, mostram que o EUSFTA liberaliza o comércio de serviços de transporte entre a União Europeia e Singapura com base no modo de transporte relevante. Assim, enquanto os compromissos horizontais se aplicam, em princípio, a todos os serviços de transporte (com exceção de uma grande parte dos serviços de transporte aéreo), princípios específicos aplicam‑se à liberalização dos transportes marítimos internacionais. Além disso, a lista de compromissos específicos (apêndice 8‑A1) para o modo 1 (prestação transfronteiras) estabelece uma distinção, no título 11 («Serviços de transporte»), entre compromissos em matéria de transporte marítimo (secção 11.A); transporte por vias interiores navegáveis (secção 11.B); transporte ferroviário (secção 11.C); transporte rodoviário (secção 11.D); e transporte de produtos (exceto combustíveis) por condutas (pipelines) (secção 11.E). No título 12 («Serviços auxiliares de transporte»), estão elencados os compromissos específicos no que diz respeito aos serviços auxiliares que correspondem a cada um desses tipos de transporte. As mesmas distinções são estabelecidas no apêndice 8‑A2, relativo ao modo 3 (estabelecimento), e no apêndice 8‑A3, relativo ao modo 4 (Pessoal‑chave e estagiários de nível pós‑universitário e vendedores de serviços às empresas) ( 159 ). O grau de compromisso depende de a menção utilizada na lista indicar a expressão «não consolidado» (que significa que não foi assumido nenhum compromisso em relação a todos ou a alguns dos serviços em causa) ou «nenhuma» (que significa que foram assumidos compromissos integrais) ou especificar os termos de determinado compromisso (por exemplo, a condição de nacionalidade ainda poder continuar a ser aplicada).

229.

Essa distinção é consentânea com o facto de, como demonstra o direito derivado da União que executa a política comum de transportes da UE ( 160 ), cada modo de transporte (aéreo, rodoviário, ferroviário, marítimo e por vias interiores navegáveis) ( 161 ) ter características que são, em grande medida, próprias desse modo de transporte e que, por conseguinte, suscitam a adoção de regras específicas, designadamente com vista à sua liberalização.

230.

Daqui decorre que, no presente processo, os domínios relevantes para efeitos do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE correspondem à prestação de serviços de transporte segundo cada um dos modos de transporte, ou seja, transporte aéreo, transporte rodoviário, transporte ferroviário, transporte marítimo e transporte por vias interiores navegáveis ( 162 ). Cada domínio inclui serviços que estão intrinsecamente ligados aos serviços de transporte em causa. Esses serviços não podem, ao mesmo tempo, estar intrinsecamente ligados a um modo de transporte e constituir um domínio separado para efeitos do artigo 3.o, n.o 2, TFUE (porque são distintos de outros serviços).

231.

Passo agora a analisar se esses domínios são «em grande parte cobertos» por regras comuns e, em seguida, analisarei o impacto que a celebração do EUSFTA teria sobre essas regras.

232.

No que diz respeito ao transporte marítimo, rejeito o argumento de que o facto de o Regulamento n.o 4055/86 não dizer (principalmente) respeito à prestação de serviços de transporte marítimo internacional de países terceiros para a União Europeia é suficiente para afastar a competência externa exclusiva com base no terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE.

233.

É verdade que o Regulamento n.o 4055/86 se aplica aos «transportes marítimos intracomunitários» (definidos como «transporte por mar de passageiros ou mercadorias entre um porto de um Estado‑Membro e um porto ou instalação offshore de outro Estado‑Membro») e ao «tráfego com países terceiros» (definido como «transporte por mar de passageiros ou mercadorias entre os portos de um Estado‑Membro e portos ou instalações offshore de um país terceiro») ( 163 ). Uma vez que se destina, no essencial, a executar as regras do Tratado em matéria de livre prestação de serviços e a jurisprudência correspondente ( 164 ), esse regulamento é aplicável apenas a i) cidadãos da UE estabelecidos num Estado‑Membro que não seja o do destinatário dos serviços (artigo 1.o, n.o 1) ou ii) nacionais de um Estado‑Membro estabelecidos fora da União Europeia e companhias marítimas estabelecidas fora da União Europeia mas controladas por cidadãos da UE, desde que os seus navios estejam matriculados nesse Estado‑Membro de acordo com a respetiva legislação (artigo 1.o, n.o 2) ( 165 ). Assim, ao contrário do EUSFTA, o Regulamento n.o 4055/86 não tem por objeto eliminar restrições à prestação de serviços de transporte marítimo internacional quando esses serviços sejam prestados por nacionais de países terceiros ou companhias de navegação estabelecidas fora da União Europeia e controladas por nacionais de países terceiros, ou quando os navios estejam matriculados num Estado terceiro, salvo se os serviços forem prestados por cidadãos da UE estabelecidos num Estado‑Membro que não seja o do destinatário dos serviços ( 166 ).

234.

Contudo, a questão de saber se o Regulamento n.o 4055/86 se aplica ou não a situações que apresentem um elemento não europeu (e portanto uma dimensão externa) não é relevante para a realização de uma análise AETR. Um compromisso internacional pode perfeitamente afetar regras comuns aplicáveis apenas a situações «intra‑UE» ou alterar o seu alcance. O parecer 1/03 oferece um exemplo ( 167 ). A nova Convenção de Lugano, que constituía o objeto do pedido de parecer nesse processo, visava estender a Estados terceiros as regras comuns em matéria de competência judiciária e reconhecimento e execução de decisões em matéria civil e comercial que resultam do Regulamento (CE) n.o 44/2001 do Conselho ( 168 ). Embora essas regras comuns não tenham sido concebidas para ser aplicadas à competência judiciária dos órgãos jurisdicionais de Estados terceiros e ao reconhecimento e execução de decisões emitidas por esses órgãos jurisdicionais, o Tribunal de Justiça concluiu que a nova Convenção de Lugano afetaria a aplicação uniforme e coerente do sistema instituído pelo Regulamento n.o 44/2001 ( 169 ).

235.

O Regulamento n.o 4055/86 cobre, em grande parte, o domínio dos serviços de transporte marítimo?

236.

No que diz respeito ao transporte marítimo, a União Europeia aceita, no capítulo oito, para além das obrigações horizontais estabelecidas nesse capítulo, compromissos integrais em modos 1 e 2, determinados compromissos em modo 3 e compromissos limitados em modo 4 ( 170 ). No que diz respeito aos serviços auxiliares de transporte marítimo, os compromissos em modos 1 e 3 dependem do Estado‑Membro em causa e do tipo de serviços auxiliares, e foram aceites compromissos integrais em modo 2. Alguns Estados‑Membros aceitaram compromissos limitados em modo 4.

237.

Existe certamente uma sobreposição entre o Regulamento n.o 4055/86 e o capítulo oito do EUSFTA. A finalidade deste regulamento é, de acordo com o artigo 58.o, n.o 1, TFUE, tornar aplicável ao setor dos transportes marítimos entre Estados‑Membros as normas do Tratado sobre livre prestação de serviços ( 171 ). Consequentemente, o referido regulamento proíbe a aplicação de qualquer regra nacional que tenha por efeito tornar a prestação de serviços entre Estados‑Membros mais difícil do que a prestação de serviços puramente interna num Estado‑Membro, a menos que a referida regulamentação se mostre justificada por uma razão imperiosa de interesse geral e desde que as medidas que prevê sejam necessárias e proporcionadas ( 172 ). Tal como o EUSFTA, o Regulamento n.o 4055/86 tem assim como objetivo liberalizar a prestação transfronteiriça de serviços de transporte marítimo (ou seja, a prestação desses serviços em modos 1 e 2). Além disso, tanto o EUSFTA como o referido regulamento contêm regras específicas relativas a convénios de repartição de cargas contidos em acordos bilaterais celebrados com países terceiros ( 173 ).

238.

Contudo, a simples existência dessas regras no Regulamento n.o 4055/86 não é suficiente para concluir que a liberalização dos serviços de transporte marítimo está em grande parte coberta por regras comuns.

239.

Em primeiro lugar, o Regulamento n.o 4055/86 diz respeito apenas ao comércio transfronteiriço de serviços marítimos (modos 1 e 2). Não liberaliza a prestação de serviços em modo 3, ou seja, o estabelecimento. Tal pode dever‑se ao facto de o transporte marítimo (como outros modos de transporte) já ser regulado, na União Europeia, pelas regras do Tratado em matéria de liberdade de estabelecimento constantes dos artigos 49.° a 55.° TFUE. Estas disposições não contêm qualquer exclusão comparável à estabelecida pelo artigo 58.o TFUE relativamente aos serviços ( 174 ). Assim, o modo 3 no transporte marítimo está sujeito às disposições do Tratado em matéria de liberdade de estabelecimento. Contudo, como explicarei a propósito do investimento de carteira, as disposições do Tratado não podem, na minha opinião, ser consideradas «regras comuns» para efeitos do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE ( 175 ). Além disso, embora o artigo 50.o, n.o 1, TFUE constitua uma base jurídica para a adoção de regras comuns destinadas a «realizar a liberdade de estabelecimento numa determinada atividade», nenhuma das partes no presente processo referiu que essa disposição tenha sido utilizada no setor do transporte marítimo ( 176 ).

240.

Em segundo lugar, quanto ao modo 4, a Comissão afirma, corretamente, que a Diretiva 2014/66 estabelece regras comuns. Contudo, esta diretiva é aplicável, concretamente, no âmbito de uma transferência dentro da empresa de gestores, especialistas ou empregados estagiários ( 177 ). Como demonstra o artigo 8.13, n.o 2, do EUSFTA, a secção D do capítulo oito tem um âmbito de aplicação significativamente mais amplo, uma vez que abrange não apenas as transferências de pessoal dentro da empresa mas igualmente outras formas de «presença temporária de pessoas singulares por motivos profissionais». Assim, o artigo 8.13, n.o 2, alínea a), segundo parágrafo, do EUSFTA refere que o pessoal‑chave abrange, além do «pessoal transferido no seio da empresa», os «visitantes de negócios para efeitos de estabelecimento». Essa secção aplica‑se igualmente a «vendedores de serviços às empresas», definidos como «qualquer pessoa singular representante de um prestador de serviços de uma parte que pretende a entrada temporária no território da outra parte para negociar a venda de serviços ou celebrar acordos com a finalidade de vender serviços por conta desse prestador de serviços». Também neste caso a prestação de serviços não implica qualquer transferência de trabalhadores «no seio da empresa».

241.

Por conseguinte, concluo que o domínio da liberalização dos serviços de transporte marítimo ainda não é em grande parte coberto por regras comuns e que, em consequência, não existe uma competência externa exclusiva neste domínio, na aceção do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE.

242.

Contudo, reconheço que a União Europeia dispõe de competência partilhada para celebrar um acordo internacional com vista à liberalização dos serviços de transporte marítimo.

243.

Na minha opinião, as disposições do EUSFTA em matéria de serviços de transporte marítimo podem ser consideradas necessárias para alcançar os objetivos do título VI da parte III do TFUE no que diz respeito à política de transportes da União Europeia (segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE). A política comum de transportes pressupõe, inter alia, a adoção de regras comuns aplicáveis aos transportes internacionais efetuados a partir do, ou com destino ao, território de um Estado‑Membro, ou que atravessem o território de um ou mais Estados‑Membros [artigo 91.o, n.o 1, alínea a), TFUE]. Tal inclui os transportes por caminho de ferro, por estrada, por via navegável, marítimos e aéreos (artigo 100.o TFUE). Um corolário necessário é a competência para celebrar acordos internacionais de forma a obter compromissos recíprocos dos países terceiros nos quais o transporte tem a sua origem ou o seu destino. Por conseguinte, considero que a União Europeia e os Estados‑Membros partilham a competência relativamente a essas disposições, nos termos do artigo 4.o, n.o 2, alínea g), TFUE («Transportes») e do segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE, em conjugação com os artigos 91.° e 100.°, n.o 2, TFUE.

244.

Passo a analisar o transporte por vias interiores navegáveis. Para além das obrigações horizontais estabelecidas no capítulo oito, a União Europeia aceita neste capítulo compromissos limitados em modos 1 e 2, bem como em modo 3 (consoante o Estado‑Membro em causa). Não são assumidos compromissos em modo 4. No que diz respeito a serviços auxiliares por vias interiores navegáveis (tais como serviços de carga e descarga ou serviços de entreposto e armazenagem), os compromissos assumidos em modos 1, 2 e 3 dependem do Estado‑Membro em causa e do tipo de serviços auxiliares.

245.

Já tive oportunidade de explicar por que razão discordo do argumento da Comissão segundo o qual, devido à pouca importância prática de determinados serviços, a União Europeia não assumiu, no essencial, nenhum compromisso e, na prática, não exerce qualquer competência através do EUSFTA ( 178 ). Além disso, a Comissão não apresentou nenhum elemento que demonstre que os requisitos previstos no terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE estão preenchidos. Nestas circunstâncias, não é necessário continuar a explorar a possível aplicação do artigo 3.o, n.o 2, TFUE às disposições do capítulo oito na medida em que estas se aplicam aos transportes por vias interiores navegáveis. De acordo com o artigo 3.o, n.o 2, TFUE, a União Europeia não dispõe de competência externa exclusiva relativamente a este tipo de transporte.

246.

Contudo, tal como no caso dos transportes marítimos ( 179 ), as disposições do EUSFTA em matéria de transportes por vias interiores navegáveis podem ser consideradas necessárias para alcançar os objetivos do título VI da parte III do TFUE (segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE) e, por conseguinte, ser abrangidas, pelas mesmas razões, pela competência partilhada entre a União Europeia e os Estados‑Membros com base no artigo 4.o, n.o 2, alínea g), e no segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE, em conjugação com os artigos 91.° e 100.°, n.o 1, TFUE.

247.

No que diz respeito ao transporte aéreo, para além das obrigações horizontais estabelecidas no capítulo oito, a União Europeia aceita compromissos integrais em modos 1 e 2, embora esses compromissos estejam limitados a i) serviços de reparação e manutenção de aeronaves durante os quais a aeronave é retirada de serviço; ii) venda e comercialização de serviços de transporte aéreo; e iii) serviços de sistemas informatizados de reserva. Além disso, a União Europeia aceita alguns compromissos em modo 3 e compromissos limitados em modo 4 (pode ser aplicada uma condição de nacionalidade) para os serviços de transporte aéreo internacional.

248.

Já rejeitei a alegação da Comissão de que a UE dispõe de competência exclusiva em matéria de serviços de reparação e manutenção de aeronaves com base no primeiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE ( 180 ).

249.

Consequentemente, a questão de saber se a União Europeia dispõe de competência exclusiva no domínio do transporte aéreo depende da questão de saber se os requisitos previstos no terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE estão preenchidos.

250.

Na minha opinião, a Comissão não demonstrou que esses requisitos estão preenchidos. Os argumentos que apresentou relativamente aos serviços de reparação e manutenção de aeronaves restringem‑se ao primeiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE. A sua posição sobre a venda e comercialização de serviços de transporte aéreo é que são abrangidas pela política comercial comum. O único tipo de serviços de transporte aéreo relativamente aos quais a Comissão apresenta uma análise AETR são os serviços de sistemas informatizados de reserva. É ponto assente que o Regulamento n.o 80/2009 estabelece regras comuns aplicáveis a qualquer sistema informatizado de reserva na medida em este integre produtos de transporte aéreo propostos ou utilizados na UE. Além disso, o Tribunal de Justiça confirmou que, por efeito do regulamento que precedeu o Regulamento n.o 80/2009 [Regulamento (CEE) n.o 2299/89 do Conselho ( 181 )], a União Europeia adquiriu a competência exclusiva para celebrar acordos internacionais relacionados com os sistemas informatizados de reserva propostos ou utilizados no seu território ( 182 ). Contudo, este elemento não é, por si só, suficiente para se concluir que a prestação de serviços de transporte aéreo é um domínio em grande parte coberto por regras comuns. Por conseguinte, a União Europeia não dispõe de competência externa exclusiva nesse domínio.

251.

As disposições do EUSFTA em matéria de serviços de transporte aéreo podem, todavia, ser consideradas necessárias para alcançar os objetivos do título VI da parte III do TFUE (segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE), por razões idênticas às que se aplicam ao transporte marítimo e ao transporte por vias interiores navegáveis ( 183 ). Por conseguinte, a União Europeia e os Estados‑Membros partilham a competência relativamente a essas disposições, nos termos do artigo 4.o, n.o 2, alínea g), e do segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE, em conjugação com os artigos 91.° e 100.°, n.o 2, TFUE.

252.

Passando agora ao transporte ferroviário, para além das obrigações horizontais estabelecidas no capítulo oito, a União Europeia não aceitou compromissos em modo 1 e aceitou compromissos integrais em modo 2. Foram assumidos compromissos integrais para a maioria dos Estados‑Membros em relação ao modo 3, embora os Estados‑Membros possam sujeitar a utilização do domínio público a monopólios públicos ou a direitos exclusivos concedidos a operadores privados. Não são aplicáveis quaisquer reservas no que diz respeito ao modo 4 ( 184 ). Quanto aos serviços auxiliares de transporte ferroviário, os compromissos em modos 1 e 3 dependem do Estado‑Membro em causa e do tipo de serviço auxiliar. Foram assumidos compromissos integrais em modo 2.

253.

Rejeito o argumento da Comissão de que o parecer 1/94 e o acórdão C‑268/94, Portugal/Conselho ( 185 ), permitem sustentar a conclusão de que os compromissos assumidos no EUSFTA no que diz respeito à prestação de serviços de transporte ferroviário em modo 2 são «de âmbito extremamente limitado» e, por conseguinte, acessórios dos compromissos no domínio da política comercial comum (relativamente à qual a União Europeia dispõe de competência exclusiva). Na parte relevante do parecer 1/94, o Tribunal de Justiça estabeleceu uma distinção entre um acordo internacional «com a natureza e dimensão do TRIPS», que não pode ser considerado abrangido pelo âmbito da política comercial comum, e os acordos comerciais que tratam de direitos de propriedade intelectual de forma meramente acessória ( 186 ). Por conseguinte, essa parte do parecer 1/94 dizia respeito ao âmbito dos acordos que têm como base jurídica o (atual) artigo 207.o, n.o 1, TFUE. Não tem aplicação quando, como no presente processo, se pede ao Tribunal de Justiça que esclareça se a União Europeia dispõe de competência externa exclusiva com base no artigo 3.o, n.o 2, TFUE, num domínio (neste caso, o transporte ferroviário) que não é abrangido pela política comercial comum. O mesmo raciocínio se aplica ao acórdão Portugal/Conselho ( 187 ).

254.

Passo a analisar a questão de saber se a Diretiva 2012/34 cobre em grande parte o domínio dos serviços de transporte ferroviário na União Europeia.

255.

A Diretiva 2012/34, que é aplicável à utilização da infraestrutura ferroviária para os serviços ferroviários nacionais e internacionais ( 188 ), tem como objetivo sujeitar o setor ferroviário ao princípio da livre prestação de serviços tendo em conta as características específicas desse setor ( 189 ). Consequentemente, a Diretiva 2012/34 regula o acesso das empresas ferroviárias às infraestruturas ferroviárias de todos os Estados‑Membros (incluindo um Estado‑Membro diferente daquele em que a empresa está estabelecida) para fins de exploração quer de serviços de transporte ferroviário de mercadorias quer de serviços internacionais de transporte de passageiros ( 190 ). Por conseguinte, abrange a prestação de serviços de transporte ferroviário transfronteiriços (modos 1 e 2) na União Europeia. Além disso, a Diretiva estabelece regras materiais e procedimentais relativas às condições em que uma empresa ferroviária pode obter uma licença que lhe permita efetuar serviços de transporte ferroviário na União Europeia, incluindo a partir do território de um Estado‑Membro para o território de outro Estado‑Membro. Essas condições estão relacionadas, em especial, com a boa reputação, a capacidade financeira e a competência profissional da empresa ( 191 ). Por conseguinte, a Diretiva 2012/34 contém regras pormenorizadas em matéria de acesso ao mercado através do estabelecimento (modo 3).

256.

Nestas circunstâncias, considero que a Diretiva 2012/34 cobre em grande parte o domínio do transporte ferroviário.

257.

Considero igualmente que as regras relevantes do EUSFTA modificariam o alcance das regras comuns estabelecidas por essa Diretiva. Por exemplo, as disposições relativas ao estabelecimento (secção C do capítulo oito) são aplicáveis às «medidas adotadas ou mantidas pelas partes que afetam o estabelecimento em qualquer atividade económica» ( 192 ). Essas disposições incluem a proteção contra o tratamento discriminatório. Assim, uma empresa de transporte ferroviário de Singapura que pretenda aceder ao mercado da UE estabelecendo aí uma presença comercial deve ter acesso não discriminatório ao mercado, sem prejuízo das limitações estabelecidas na lista de compromissos específicos da União Europeia ( 193 ). Uma vez estabelecida num Estado‑Membro, essa empresa não pode ser objeto de um tratamento menos favorável do que o concedido às empresas análogas desse Estado‑Membro ( 194 ). O efeito destas disposições relativas ao acesso ao mercado e ao tratamento nacional é, assim, facultar às empresas de transporte ferroviário de Singapura o acesso ao espaço ferroviário europeu único estabelecido pela Diretiva 2012/34. Por exemplo, uma empresa de transporte ferroviário de Singapura teria direito, em princípio, a obter uma licença nas mesmas condições que as empresas ferroviárias «nacionais» ( 195 ). Sem prejuízo da limitação horizontal para serviços de utilidade pública que figura na lista de compromissos específicos da União Europeia relativos ao estabelecimento ( 196 ), essa empresa teria igualmente direito a aceder à infraestrutura ferroviária dos Estados‑Membros ( 197 ) e a não ser tratada de forma menos favorável do que uma empresa ferroviária «nacional» no que diz respeito à repartição das capacidades da infraestrutura ( 198 ). Por outras palavras, o EUSFTA modificaria o âmbito da Diretiva 2012/34.

258.

Uma vez que o EUSFTA teria esse efeito sobre as regras comuns relativas ao acesso ao mercado de serviços de transporte ferroviário da UE, esta adquiriu competência externa exclusiva no domínio do transporte ferroviário. Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo facto de, no que diz respeito à prestação de serviços de transporte ferroviário em modo 4, a Diretiva 2014/66 ter uma menor abrangência do que as disposições relevantes do EUSFTA. O terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE não exige que exista uma concordância total entre os domínios abrangidos pelos compromissos internacionais e os abrangidos pelas regras da UE ( 199 ).

259.

Por conseguinte, considero que a União Europeia dispõe de competência externa exclusiva no que diz respeito às disposições do EUSFTA relativas aos serviços de transporte ferroviário, com base nos artigos 91.° e 100.°, n.o 1, TFUE, em conjugação com o terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE e o terceiro pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE.

260.

No que diz respeito aos transportes rodoviários, para além das obrigações horizontais que resultam do capítulo oito, a União Europeia não aceitou compromissos em modo 1 e aceitou compromissos integrais em modo 2. Os compromissos em modo 3 estão sujeitos a várias reservas em determinados Estados‑Membros, consoante o tipo de transporte (transporte de passageiros ou transporte de mercadorias). No que diz respeito ao modo 4, alguns Estados‑Membros mantiveram reservas (sob a forma de condições de nacionalidade e de residência). Quanto aos serviços auxiliares de transporte rodoviário, os compromissos em modos 1 e 3 dependem do Estado‑Membro em causa e do tipo de serviços auxiliares em causa. Foram aceites compromissos integrais em modo 2. Três Estados‑Membros mantiveram reservas para o modo 4 (sob a forma de uma condição de nacionalidade).

261.

A Comissão alega que os compromissos em modo 2 para os serviços de transporte rodoviário têm pouca relevância prática. Rejeito este argumento pelas razões que já expliquei ( 200 ).

262.

O Regulamento n.o 1071/2009 cobre, todavia, em grande parte o domínio dos serviços de transporte rodoviário?

263.

O Regulamento n.o 1071/2009 institui uma regulamentação exaustiva em matéria de acesso à atividade de transportador rodoviário e ao seu exercício, tanto no domínio do transporte rodoviário de mercadorias como no do transporte rodoviário de passageiros ( 201 ). O referido regulamento estabelece requisitos para o exercício dessa atividade, designadamente, dispor de um estabelecimento efetivo e estável num Estado‑Membro, bem como ter idoneidade, capacidade financeira apropriada e a capacidade profissional exigida ( 202 ). Além disso, o Regulamento n.o 1071/2009 exige que cada Estado‑Membro designe uma ou várias autoridades competentes encarregadas de autorizar as empresas a exercer a atividade de transportador rodoviário se preencherem aqueles requisitos ( 203 ). A referida regulamentação é completada por regras setoriais constantes do Regulamento n.o 1072/2009, relativo ao acesso ao mercado do transporte rodoviário de mercadorias ( 204 ), e do Regulamento n.o 1073/2009, relativo ao acesso ao mercado dos serviços de transporte em autocarro ( 205 ). Estes dois regulamentos exigem que as empresas em causa obtenham uma licença comunitária para poderem exercer essas atividades ( 206 ).

264.

Neste contexto, os Regulamentos n.o 1071/2009, n.o 1072/2009 e n.o 1073/2009 regulam a prestação transfronteiras de serviços de transporte rodoviário (modos 1 e 2), bem como o acesso ao mercado de serviços de transporte rodoviário através do estabelecimento (modo 3). O Regulamento n.o 1072/2009 contém igualmente regras sobre o certificado de motorista e regula assim a presença temporária de pessoas singulares no território dos Estados‑Membros para efeitos de prestação de serviços de transporte rodoviário de mercadorias (modo 4) ( 207 ). Embora a Diretiva 2014/66 tenha uma menor abrangência do que os compromissos relevantes assumidos no EUSFTA para o modo 4, considero que as regras comuns existentes cobrem em grande parte o domínio do transporte rodoviário.

265.

Considero, além disso, que o âmbito dos Regulamentos n.o 1071/2009, n.o 1072/2009 e n.o 1073/2009 seria modificado por compromissos internacionais como os que constam do EUSFTA. O meu raciocínio é, no essencial, idêntico ao raciocínio que fiz em relação aos transportes ferroviários ( 208 ).

266.

Em especial, as disposições relativas ao estabelecimento (secção C do capítulo oito) são aplicáveis às «medidas adotadas ou mantidas pelas partes que afetam o estabelecimento em qualquer atividade económica» ( 209 ). Essas disposições incluem a proteção contra o tratamento discriminatório. Assim, um transportador rodoviário de Singapura que pretenda aceder ao mercado da UE estabelecendo aí uma presença comercial deve ter acesso não discriminatório ao mercado, sem prejuízo das limitações estabelecidas na lista de compromissos específicos da União Europeia ( 210 ). Uma vez estabelecido num Estado‑Membro, esse transportador teria direito a ser tratado de modo não menos favorável do que os operadores desse Estado‑Membro ( 211 ). O efeito destas disposições relativas ao acesso ao mercado e ao tratamento nacional é, assim, facultar aos transportadores rodoviários de Singapura o acesso não discriminatório ao mercado da UE eliminando os obstáculos ao seu estabelecimento efetivo nesse mercado. Em consequência do EUSFTA, deve ser concedido a esses transportadores o acesso a esse mercado em condições idênticas (por exemplo, relativamente à capacidade financeira ou à competência profissional ( 212 )) às que são aplicáveis aos operadores nacionais. Por outras palavras, o EUSFTA modificaria o âmbito dos Regulamentos n.o 1071/2009, n.o 1072/2009 e n.o 1073/2009.

267.

Uma vez que o EUSFTA teria esse efeito sobre as regras comuns relativas ao acesso ao mercado de serviços de transporte rodoviário da UE, esta adquiriu competência externa exclusiva no domínio do transporte rodoviário. Consequentemente, a União Europeia dispõe de competência externa exclusiva no que diz respeito às disposições do EUSFTA relativas aos serviços de transporte rodoviário, com base nos artigos 91.° e 100.°, n.o 1, TFUE, em conjugação com o terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE e o terceiro pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE.

268.

À luz destas considerações, concluo que a União Europeia partilha com os Estados‑Membros a competência externa para assumir os compromissos previstos no capítulo oito do EUSFTA na medida em que este diz respeito ao transporte aéreo, ao transporte marítimo e ao transporte por vias interiores navegáveis, incluindo os serviços intrinsecamente ligados a esses serviços de transporte; e dispõe de competência externa exclusiva com base no terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE para assumir os compromissos previstos no capítulo oito do EUSFTA na medida em que este diz respeito ao transporte ferroviário e ao transporte rodoviário (e aos serviços intrinsecamente ligados a esses serviços de transporte). A União Europeia dispõe de competência externa exclusiva com base nos artigos 3.°, n.o 1, alínea e), e 207.°, n.o 1, TFUE no que diz respeito a todos os outros serviços abrangidos por esse capítulo.

269.

Passo agora a analisar a secção A do capítulo nove do EUSFTA. Analisarei a secção B desse capítulo em conjunto com os capítulos treze, quinze e dezasseis do EUSFTA ( 213 ).

Investimento (capítulo nove, secção A, do EUSFTA ( 214 ) )

Argumentos

270.

A Comissão afirma que a secção A do capítulo nove do EUSFTA, que diz especificamente respeito ao investimento internacional e não é aplicável aos investimentos dentro da UE, é abrangida pela competência exclusiva da União Europeia no domínio da política comercial comum na medida em que se aplica ao investimento estrangeiro direto. Baseando‑se no critério aplicado em casos relacionados com o comércio de mercadorias e serviços e os aspetos comerciais da propriedade intelectual, a Comissão alega que um acordo é abrangido pelo âmbito de aplicação do artigo 207.o, n.o 2, TFUE se disser especificamente respeito ao investimento internacional na medida em que se destine essencialmente a promover, facilitar ou regular os investimentos internacionais e tenha efeitos diretos e imediatos nesses investimentos.

271.

Ao distinguir entre investimento de carteira (ou outros investimentos indiretos) e investimento estrangeiro direto (ambos podem ser abrangidos pela definição constante do artigo 9.1 do EUSFTA), a Comissão propõe que a definição de «investimento direto» dada pelo Tribunal de Justiça em matéria de livre circulação de capitais e pagamentos seja transposta para o artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

272.

De acordo com a Comissão, a política comercial comum abrange quer as regras aplicáveis ao acesso inicial de investimentos ao mercado do Estado de acolhimento quer a proteção que deve ser concedida a um investimento depois de ter sido admitido no mercado («proteção pós‑admissão»). Esta proteção inclui, por exemplo, a proteção contra a discriminação, o tratamento desleal e não equitativo e a expropriação sem compensação. A Comissão alega que, ao referirem o «investimento estrangeiro direto», os artigos 206.° e 207.°, n.o 1, TFUE não estabelecem qualquer distinção entre o acesso ao mercado e a proteção pós‑admissão. Além disso, excluir a proteção pós‑admissão do investimento estrangeiro direto da política comercial comum seria igualmente contrário aos objetivos estabelecidos no artigo 206.o TFUE. Em especial, o objetivo da «supressão progressiva das restrições […] aos investimentos estrangeiros diretos» visa a eliminação das restrições que resultam quer das barreiras à admissão inicial de um investimento quer dos obstáculos ao seu funcionamento e à sua fruição subsequentes. Nesse contexto, a Comissão estabelece analogias com a competência exclusiva da União Europeia no domínio do comércio de mercadorias e serviços, que também não se limita ao acesso ao mercado.

273.

A Comissão acrescenta que a política comercial comum já abrange normas do GATS aplicáveis ao tratamento pós‑admissão da prestação de serviços em modo 3 (ou seja, através da presença comercial ( 215 )). No capítulo oito do EUSFTA encontram‑se normas idênticas. Não seria lógico concluir que a União Europeia não dispõe de competência exclusiva no que se refere às normas estabelecidas no capítulo nove mas dispõe de competência exclusiva no que se refere a normas análogas constantes do capítulo oito do EUSFTA ou do GATS.

274.

A Comissão considera que o artigo 345.o TFUE não limita a competência exclusiva da União Europeia no que se refere ao capítulo nove na medida em que este capítulo diz respeito à expropriação. O artigo 9.6 do EUSFTA sujeita o exercício do direito de expropriar a condições semelhantes às que são impostas pelos artigos 49.° e 63.° TFUE. Essa disposição não prejudica as regras aplicáveis ao regime da propriedade em cada Estado‑Membro: não proíbe um Estado‑Membro de expropriar nem exige que um Estado‑Membro exproprie quaisquer ativos detidos por investidores de Singapura.

275.

A Comissão rejeita igualmente o argumento de que a primeira parte do artigo 207.o, n.o 6, TFUE exclui as cláusulas de expropriação do âmbito da política comercial comum por não existir no mercado interno uma política da UE comparável. Este argumento não reconhece a distinção entre competências externas exclusivas expressas e implícitas. A segunda parte do artigo 207.o, n.o 6, TFUE também não modifica a posição da Comissão: o artigo 345.o TFUE não exclui, por si só, a harmonização dos direitos de propriedade. Em todo o caso, o artigo 9.6 do EUSFTA não harmoniza as disposições legislativas ou regulamentares dos Estados‑Membros na aceção do artigo 207.o, n.o 6, TFUE.

276.

A Comissão admite que, na medida em que se aplica ao investimento de carteira, o capítulo nove não é abrangido pela política comercial comum. Alega que a União Europeia dispõe, todavia, de competência exclusiva porquanto o investimento de carteira é um movimento de capitais na aceção do artigo 63.o TFUE e as normas de tratamento previstas no capítulo nove são, pelo menos em grande parte, cobertas pelas regras comuns estabelecidas nessa disposição do Tratado. Em especial, as normas fundamentais do tratamento nacional, do tratamento justo e equitativo e da proteção contra a expropriação são abrangidas pela proibição prevista no artigo 63.o, n.o 1, TFUE. Embora o artigo 63.o, n.o 1, TFUE esteja sujeito à exceção prevista no artigo 64.o, n.o 1, TFUE, as restrições «salvaguardadas» por esta última disposição (ou seja, as restrições existentes que podem ser mantidas) não incluem restrições ao investimento de carteira. Em consequência, os requisitos do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE estão preenchidos.

277.

A Comissão afirma que a sua interpretação da expressão «regras comuns» utilizada no terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE no sentido de que abrange as disposições do Tratado e as regras de direito derivado respeita os motivos subjacentes à jurisprudência AETR. Esses motivos são a proteção da unidade do mercado comum e a aplicação uniforme do direito da União, bem como a necessidade de assegurar a aplicação uniforme e coerente das regras da UE assim como o bom funcionamento do sistema que estas regras estabelecem ( 216 ). A Comissão alega igualmente que as regras do Tratado sobre a livre circulação de capitais são únicas porque têm uma dimensão externa. Além disso, e sob reserva da exceção prevista no artigo 64.o, n.o 1, TFUE, o artigo 63.o, n.o 1, TFUE, permite, por si só, alcançar a plena liberalização dos movimentos de capitais entre a União Europeia e países terceiros. Assim, não há necessidade de adotar direito derivado para estender a livre circulação de capitais aos movimentos de capitais entre Estados‑Membros e países terceiros ou para alcançar a sua plena liberalização. O facto de, com exceção do acórdão Pringle ( 217 ), a maioria dos processos relativos à aplicação do princípio AETR envolver regras comuns constantes do direito derivado deve‑se à frequência com que os Tratados se limitam a estabelecer objetivos políticos e a atribuir poderes legislativos às instituições. Por último, a não ser que a União Europeia disponha de competência exclusiva, não será possível assegurar que as regras comuns do artigo 63.o, n.o 1, TFUE sejam aplicadas de modo uniforme e coerente.

278.

Caso o Tribunal de Justiça decida que a União Europeia não dispõe de competência exclusiva em matéria de investimento de carteira com base no artigo 3.o, n.o 2, TFUE, em conjugação com o artigo 63.o, n.o 1, TFUE, a Comissão afirma que a União Europeia dispõe, todavia, de competência partilhada. Para tal, baseia‑se no artigo 216.o, n.o 1, TFUE, que prevê que a União Europeia dispõe de competência para celebrar acordos internacionais com países terceiros quando essa celebração seja «[…] necessária para alcançar, no âmbito das políticas da União, um dos objetivos estabelecidos nos Tratados […]». No presente processo, o objetivo é assegurar a livre circulação de capitais, incluindo o investimento de carteira, entre a União Europeia e países terceiros. A liberalização dos movimentos de capitais extra‑UE não pode ser eficaz a não ser que os países terceiros eliminem as suas próprias restrições aos movimentos de capitais entre a União Europeia e os respetivos territórios. Para que o façam, é normalmente necessário celebrar acordos internacionais, assentes na reciprocidade, com esses países. A Comissão insiste que não sustenta que a União Europeia dispõe de competência exclusiva pois o capítulo nove é necessário para que a União Europeia possa exercer as suas competências externas.

279.

O Parlamento defende igualmente a existência de uma competência exclusiva da UE no que diz respeito à secção A do capítulo nove do EUSFTA. Em especial, afirma que a União Europeia dispõe de competência exclusiva no que diz respeito ao investimento de carteira porque, por um lado, a cobertura do investimento de carteira pelo capítulo nove é acessória da finalidade principal ou preponderante deste capítulo (assegurar a proteção do investimento estrangeiro direto), e, por outro lado, o artigo 3.o, n.o 2, TFUE pode ser igualmente aplicado quando o direito primário da UE possa ser afetado. O Parlamento concorda especificamente com a posição da Comissão de que a proibição da expropriação constante do artigo 9.6 do EUSFTA não configura nem uma interferência nos diferentes regimes de propriedade e sistemas de registo e de estruturação das relações de propriedade nas diferentes tradições jurídicas dos Estados‑Membros nem uma harmonização das ordens jurídicas dos Estados‑Membros.

280.

O Conselho admite que, do ponto de vista económico, o comércio e o investimento estrangeiro direto estão interligados e que alguns aspetos do tratamento do investimento estrangeiro direto estão relacionados com questões gerais de política comercial comum (ou seja, o acesso ao mercado, como o acesso de um investidor estrangeiro a licenças de importação e exportação). Contudo, afirma que a regulação do investimento estrangeiro direto não prossegue necessariamente objetivos comerciais. De acordo com o Conselho, a elaboração de normas relativas à admissão, ao tratamento e à proteção do investimento estrangeiro direto constitui um domínio autónomo das relações económicas internacionais que não faz automaticamente parte da política comercial. O Conselho estabelece uma distinção entre: i) a admissão de investimento estrangeiro direto (ou seja, o acesso ao mercado: a decisão de autorizar ou não um investidor direto a investir num Estado de acolhimento e de lhe impor ou não restrições ou condições ii) o movimento de capitais relacionado com o investimento estrangeiro direto (mesmo que um investidor possa igualmente obter fundos no Estado de acolhimento e, portanto, o investimento estrangeiro direto não envolva sempre, necessariamente, a circulação transfronteiras de capitais; e iii) o tratamento do investimento.

281.

De acordo com o Conselho, o capítulo nove é um capítulo autónomo que trata apenas da proteção dos investimentos e utiliza uma definição muito ampla de «investimento», baseada em ativos. Este capítulo não diz respeito nem à admissão nem à promoção do investimento. As regras relativas à admissão dos investimentos constam do capítulo oito do EUSFTA.

282.

O Conselho admite que a União Europeia dispõe de competência exclusiva em matéria de investimento estrangeiro direto que esteja relacionado com a política comercial comum mas propõe uma interpretação mais restrita do âmbito do artigo 207.o, n.o 1, TFUE do que a apresentada pela Comissão e pelo Parlamento Europeu. A este respeito, o Conselho considera que não é necessário que o Tribunal de Justiça se pronuncie sobre os limites exatos da competência em matéria de investimento estrangeiro direto ao abrigo do EUSFTA. No essencial, o Conselho alega que a Comissão não demonstrou que todas as normas estabelecidas na secção A se referem a disposições abrangidas pela competência exclusiva da União Europeia em matéria de investimento estrangeiro direto ou de qualquer outro tipo de investimento abrangido pelo capítulo nove.

283.

No que diz respeito à cláusula de tratamento nacional do artigo 9.3 do EUSFTA, o Conselho incide a sua apreciação nas situações previstas no artigo 9.3, n.o 3, nas quais as partes podem afastar a obrigação de tratamento nacional. De acordo com o Conselho, a União Europeia não pode dispor de competência exclusiva para assinar e celebrar o EUSFTA na medida em que este diz respeito a medidas adotadas pelos Estados‑Membros no exercício da sua responsabilidade em matéria de segurança nacional. A União Europeia também não dispõe de competência exclusiva em matéria de proteção de tesouros nacionais ou de competência legislativa para adotar medidas no domínio da tributação direta.

284.

No que diz respeito à cláusula de tratamento justo e equitativo e à cláusula de plena proteção e segurança constantes do artigo 9.4 do EUSFTA, o Conselho alega que a Comissão não demonstrou que a União Europeia dispõe de competência exclusiva na matéria relativa a qualquer uma destas cláusulas.

285.

No que diz respeito ao regime de compensação por perdas com investimentos (abrangido pelo capítulo nove) previsto no artigo 9.5 do EUSFTA, o Conselho afirma que a União Europeia não dispõe de competência no que se refere à parte dessa disposição respeitante às forças armadas dos Estados‑Membros. É igualmente duvidoso que a União Europeia possa assinar e celebrar sozinha um acordo que trata das implicações de situações de guerra ou de conflito armado, de revolução, de estado de emergência nacional, de rebelião, de insurreição ou de motim no território dos Estados‑Membros.

286.

No que diz respeito às disposições relativas à expropriação constantes do artigo 9.6 do EUSFTA, o Conselho afirma que a jurisprudência do Tribunal de Justiça não apoia o argumento de que todas medidas relativas à expropriação previstas no EUSFTA são integralmente abrangidas pela competência exclusiva da União Europeia. Por força do artigo 345.o TFUE, a União Europeia não pode dispor de competência exclusiva para assinar e celebrar o EUSFTA no que toca ao artigo 9.6.

287.

O Conselho afirma igualmente que a Comissão não alegou, e muito menos demonstrou, que determinadas matérias abrangidas pelo artigo 9.7, n.o 2, do EUSFTA, em especial as infrações penais, a segurança social, os regimes de pensão públicos ou os regimes obrigatórios de poupança e tributação, são abrangidas pela competência exclusiva da União Europeia.

288.

O Conselho discorda que a Comissão invoque o terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE para reivindicar uma competência exclusiva da União Europeia no que se refere ao investimento de carteira.

289.

Em primeiro lugar, embora possa implicar movimento de capitais, o investimento de carteira não pode ser equiparado ao livre movimento de capitais previsto nos Tratados. O artigo 63.o, n.o 1, TFUE não trata da proteção dos investimentos. Também não trata do investimento de carteira ou do investimento direto enquanto tal. O artigo 63.o, n.o 1, TFUE aplica‑se apenas na medida em que esteja em causa um movimento de capitais. Tal não é necessariamente o caso do investimento estrangeiro direto e do investimento de carteira. O Conselho salienta ainda a importância de assegurar que os operadores de países terceiros não violem as restrições admitidas à liberdade de estabelecimento (justificadas com base no artigo 65.o, n.o 2, TFUE) baseando‑se diretamente no artigo 63.o TFUE. O Tribunal de Justiça estabeleceu uma distinção entre liberdade de estabelecimento e livre circulação de capitais adotando uma abordagem focada no centro de gravidade da operação, através da qual procura determinar qual é o aspeto concreto de uma situação que é principalmente afetado pelas restrições em causa.

290.

Em segundo lugar, nenhuma disposição dos Tratados confere uma competência específica à União Europeia para agir no domínio do investimento de carteira ou (a fortiori) da proteção do investimento de carteira. Por conseguinte, à luz dos artigos 4.°, n.o 1, e 5.°, n.o 2, TFUE, os Estados‑Membros é que têm o direito de agir neste domínio.

291.

Em terceiro lugar, caso o Tribunal de Justiça admita, todavia, que o investimento de carteira constitui um movimento de capitais na aceção do artigo 63.o, n.o 1, TFUE e que esta disposição confere à União Europeia uma competência específica para agir relativamente à proteção desse tipo de investimento, o Conselho alega que a União Europeia não adotou nenhuma legislação nos termos do artigo 63.o, n.o 1, TFUE em matéria de proteção do investimento de carteira. O Conselho reconhece que existem disposições de direito derivado em matéria, por exemplo, de admissão de valores imobiliários às bolsas de valores e aos mercados de instrumentos financeiros. Embora essas regras contenham aspetos que têm a ver com o investimento de carteira, nenhuma foi adotada utilizando as bases jurídicas relativas ao livre movimento de capitais.

292.

Em quarto lugar, a União não pode, em todo o caso, ter competência externa exclusiva implícita em matéria de investimento de carteira porque o artigo 63.o, n.o 1, TFUE não é uma «regra comum» na aceção do artigo 3.o, n.o 2, TFUE. Mesmo que se presuma que existe direito primário que permita alcançar a plena liberalização dos movimentos de capitais entre os Estados‑Membros e países terceiros, o Conselho alega que a interpretação inédita que a Comissão dá ao conceito de «regras comuns» na aceção do artigo 3.o, n.o 2, TFUE é incorreta. A jurisprudência do Tribunal de Justiça demonstra que é necessário que a União Europeia tenha exercido a sua competência interna adotando disposições de direito derivado. Esta exigência é inerente ao conceito de competência implícita. A Comissão invoca incorretamente o acórdão Pringle e o parecer 1/92 ( 218 ). No acórdão Pringle ( 219 ), o Tribunal de Justiça declarou que o Tratado que cria o Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE) não era abrangido, no seu todo, pela competência exclusiva da União Europeia estabelecida no artigo 3.o, n.o 1, alínea c), TFUE. Não foi necessário o Tribunal de Justiça analisar ainda a questão de saber se o Tratado MEE podia, contudo, ser considerado suscetível de afetar «regras comuns ou de alterar o alcance das mesmas» na aceção do artigo 3.o, n.o 2, TFUE. Em todo o caso, é manifesto que o objetivo no acórdão Pringle estava relacionado com o exercício pela União Europeia das competências que lhe foram expressamente atribuídas. O Conselho admite que, no parecer 1/92 ( 220 ), o Tribunal de Justiça se referiu, efetivamente, às disposições do Tratado em matéria de concorrência. Todavia, os processos que o Tribunal de Justiça evocou nesse parecer salientavam claramente que deve ser exercida uma competência interna antes de surgir uma competência implícita para celebrar um acordo internacional ou que a existência dessa competência implícita está ligada a uma competência expressamente conferida pelos Tratados.

293.

Caso o Tribunal de Justiça admita que o artigo 63.o, n.o 1, TFUE pode constituir uma «regra comum», o Conselho alega que a Comissão não demonstrou de que modo o domínio do investimento de carteira foi «em grande parte coberto» pelas supostas «regras comuns». A Comissão também não demonstrou que, na medida em que diz respeito à proteção do investimento de carteira, o capítulo nove é suscetível de afetar tais regras comuns ou de alterar o seu alcance das mesmas.

294.

O Conselho manifesta igualmente preocupação quanto aos motivos subjacentes ao argumento subsidiário da Comissão de que existe uma competência partilhada em matéria de investimento de carteira, baseada no artigo 216.o, n.o 1, TFUE. A necessidade de alcançar um objetivo específico do Tratado implica que se demonstre que foram atribuídas internamente competências à União Europeia para alcançar esse objetivo. Tal impede que a Comissão se baseie no artigo 216.o, n.o 1, TFUE no que diz respeito ao investimento de carteira. Caso o Tribunal de Justiça conclua que a União Europeia tem, efetivamente, a competência necessária para regular a proteção do investimento de carteira, o Conselho observa que a Comissão não alega que a União Europeia apenas teria possibilidade de exercer essa competência interna através da celebração de um acordo internacional nem que o exercício de competências internas e externas em matéria de proteção de investimento estrangeiro em carteira de títulos deveria, por conseguinte, ser coincidente. Além disso, se a Comissão tivesse razão, não seria necessário celebrar um acordo internacional: o artigo 63.o, n.o 1, TFUE permitiria, por si só, alcançar a plena liberalização dos movimentos de capitais entre a União Europeia e países terceiros.

295.

O Conselho concorda que a União Europeia e os Estados‑Membros partilham a competência no que se refere ao capítulo nove. Contudo, uma vez que a competência em matéria de proteção do investimento de carteira não foi atribuída à União Europeia, esta não pode exercer essa competência sem a participação dos Estados‑Membros. A título subsidiário, o Conselho alega que, caso o Tribunal de Justiça aceite que a União Europeia dispõe, efetivamente, de uma competência partilhada em matéria de investimento de carteira, a questão de saber se essa competência deve ser exercida através da celebração do EUSFTA continua a ser uma decisão política.

296.

A maioria dos Estados‑Membros intervenientes pronunciou‑se sobre a secção A. Os argumentos que apresentaram correspondem, em geral, aos diferentes aspetos da posição do Conselho.

297.

Assim, alegam que o significado das expressões «investimento direto», constante do artigo 64.o TFUE, e «investimento estrangeiro direto», constante do artigo 207.o, n.o 1, TFUE, deve ser o mesmo. A este respeito, é pertinente a jurisprudência relativa ao âmbito do artigo 64.o TFUE, bem como a definição de investimento direto (e de investimento de carteira) constante do Regulamento (CE) n.o 184/2005 ( 221 ) e da Diretiva 88/361 ( 222 ).

298.

A competência exclusiva da União Europeia no que diz respeito ao investimento estrangeiro direto limita‑se à eliminação das restrições a esse tipo de investimento. Na medida em que o EUSFTA assegura igualmente outras formas de proteção, essas regras não são abrangidas pela competência exclusiva da União Europeia nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE. É o caso das disposições relativas à promoção e à proteção do investimento estrangeiro direto (como as respeitantes à expropriação, às forças armadas, à tributação direta, ao direito e ao processo penais).

299.

O artigo 9.6 do EUSFTA (expropriação) estabelece princípios gerais de acordo com os quais as Partes devem aplicar as suas próprias leis sobre propriedade. Estas matérias são abrangidas pela competência dos Estados‑Membros, que deve ser exercida nos termos do direito da União. O artigo 345.o TFUE impõe uma limitação ao exercício pela União Europeia das competências que lhe são atribuídas pelos Tratados.

300.

Decorre do artigo 207.o, n.o 6, TFUE que a União Europeia não pode exercer uma competência exclusiva para negociar e celebrar acordos comerciais internacionais em domínios nos quais não disponha de competência legislativa para adotar legislação interna. Essa disposição impede igualmente que a União Europeia disponha de competência exclusiva, nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE, no que se refere a outros investimentos para além do investimento estrangeiro direto.

301.

A interpretação inédita que a Comissão dá ao artigo 3.o, n.o 2, TFUE implicaria que a União Europeia dispusesse, nos termos dos artigos 3.°, n.o 2, e 63.° TFUE, de competência exclusiva em matéria de investimento de carteira. Implicaria igualmente que, independentemente de integrarem ou não a política comercial comum, todos os acordos suscetíveis de limitar o investimento pudessem ser abrangidos pela competência exclusiva implícita da União Europeia. Contudo, os Tratados deixam claro que a competência exclusiva (expressa) apenas existe no que diz respeito ao investimento estrangeiro direto. As regras comuns na aceção do artigo 3.o, n.o 2, TFUE são regras de direito derivado, não de direito primário. A existência de competência interna não é suficiente. Os antecedentes históricos do artigo 3.o, n.o 2, TFUE confirmam esta interpretação. Em todo o caso, o artigo 63.o TFUE não constitui uma base jurídica para o exercício de uma competência. A base jurídica para agir encontra‑se no artigo 64.o, n.o 2, TFUE e está sujeita a restrições.

302.

Além disso, as condições previstas no artigo 3.o, n.o 2, TFUE não estão reunidas. O âmbito da secção A do capítulo nove é muito mais amplo do que o do artigo 63.o TFUE. A expropriação não constitui uma restrição à livre circulação de capitais prevista nos Tratados. Na medida em que o artigo 63.o TFUE se aplica, isso apenas assegura a aplicação do princípio da não‑discriminação. Não foram adotadas quaisquer regras comuns em matéria de expropriação.

303.

Ao aceitar o artigo 9.10, n.o 1, do EUSFTA, a União Europeia não pode decidir sozinha sobre a cessão de vigência dos acordos celebrados entre os Estados‑Membros e Singapura. Tal disposição não respeita o princípio geral, expresso no artigo 59.o, n.o 1, alínea a), da Convenção de Viena de 1969, de que a vigência dos acordos internacionais apenas pode cessar se essa for a intenção das partes. A Comissão também não apresentou uma base de direito internacional que confirme a sua posição. Além disso, a própria União Europeia reconheceu, no Regulamento (UE) n.o 1219/2012 ( 223 ), que os acordos bilaterais assinados pelos Estados‑Membros até 1 de dezembro de 2009 podem ser mantidos em vigor ou podem entrar em vigor, nos termos desse regulamento.

304.

Por último, nenhum dos pressupostos visados no artigo 216.o TFUE se verifica. Por conseguinte, a União Europeia não dispõe de competência partilhada no que diz respeito ao investimento de carteira.

Análise

Introdução

305.

Há duas vias para a União Europeia poder dispor de competência exclusiva no que diz respeito às regras materiais que regulam o investimento, constantes da secção A do capítulo nove. São essas regras abrangidas pela política comercial comum, nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE? Se não forem, integram, não obstante, um domínio em que existem regras comuns (coincidentes com esse domínio ou que o cobrem em grande parte) suscetíveis de ser afetadas ou cujo alcance possa ser alterado se o EUSFTA for celebrado (terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE)? Abordarei cada uma destas possibilidades individualmente.

306.

Coloca‑se ainda uma questão diferente a respeito do capítulo nove, na medida em que o artigo 9.10, n.o 1, do EUSFTA dispõe que, em consequência da entrada em vigor do EUSFTA, determinados acordos bilaterais de investimento entre os Estados‑Membros e Singapura (elencados num anexo ao capítulo nove) deixarão de produzir efeitos. Abordarei esta questão separadamente ( 224 ).

Competência exclusiva com base no artigo 207.o, n.o 1, TFUE, em conjugação com o artigo 3.o, n.o 1, TFUE

– Significado da expressão «investimento estrangeiro direto» constante do artigo 207.o, n.o 1, TFUE

307.

O capítulo nove define os investimentos e os investidores aos quais se aplica. Ao contrário dos Tratados, não distingue entre investimento estrangeiro direto e outras formas de investimento ( 225 ). Nem o EUSFTA nem os Tratados se referem a «investimento de carteira».

308.

O pedido da Comissão proporciona ao Tribunal de Justiça uma primeira oportunidade de interpretar o conceito de «investimento estrangeiro direto» constante do artigo 207.o, n.o 1, TFUE e de decidir em que medida a política comercial comum abrange a regulação do «investimento estrangeiro direto». Este tipo de investimento já estava previsto no artigo III‑315.°, n.o 1, do Tratado que estabelece uma Constituição para a Europa ( 226 ). O conteúdo dessa disposição era idêntico ao do artigo 207.o, n.o 1, TFUE ( 227 ).

309.

Por força do artigo 207.o, n.o 1, TFUE, em conjugação com o artigo 3.o, n.o 1, alínea e), TFUE, a União Europeia dispõe de competência exclusiva em matéria de investimento estrangeiro direto. Essa competência é aplicável em conjugação com a competência noutras matérias abrangidas pela política comercial comum (como os serviços) mas que possam estar relacionadas com o investimento (como o investimento no setor dos serviços) ( 228 ).

310.

Os Tratados não definem «investimento estrangeiro direto». Contudo, várias disposições dos Tratados, Protocolos e Declarações ( 229 ) utilizam o termo «investimento».

311.

A nível geral, considero que «investimento» significa a colocação de dinheiro ou de outros ativos numa atividade comercial com o objetivo de obter lucros.

312.

O artigo 207.o, n.o 1, TFUE refere‑se a um tipo específico de investimento, ou seja, o investimento que é, simultaneamente, «estrangeiro» e «direto».

313.

Um investimento estrangeiro é um investimento efetuado por uma pessoa singular ou coletiva da UE num Estado terceiro ou por uma pessoa singular ou coletiva de um Estado terceiro na União Europeia. O investimento estrangeiro direto é, assim, um investimento direto que contém uma componente não europeia.

314.

A expressão «investimento direto» aparece igualmente noutras disposições do Tratado, em especial no artigo 64.o, n.os 1 e 2, TFUE, que está incluído no capítulo 4 («Os capitais e os pagamentos») do título IV («A livre circulação de pessoas, de serviços e de capitais»). Sem prejuízo do artigo 64.o, n.os 1 e 2, TFUE, o artigo 63.o TFUE proíbe todas as restrições aos movimentos de capitais entre Estados‑Membros e entre Estados‑Membros e países terceiros. Esta proibição tem um âmbito de aplicação alargado. É aplicável, por exemplo, às restrições aos movimentos de capitais que sejam de molde a dissuadir os não residentes de investirem num Estado‑Membro ou a dissuadir os residentes desse Estado‑Membro de investirem noutros Estados‑Membros ( 230 ).

315.

O âmbito de aplicação do artigo 64.o, n.o 1, TFUE é definido por referência às categorias de movimentos de capitais suscetíveis de ser objeto de restrições ( 231 ). Esta disposição delimita a proibição prevista no artigo 63.o TFUE no que diz respeito à circulação de capitais provenientes de, ou com destino a, países terceiros que envolva investimento direto (incluindo o investimento imobiliário), estabelecimento, prestação de serviços financeiros ou admissão de valores mobiliários a mercados de capitais. O artigo 64.o, n.o 2, TFUE proporciona uma base jurídica para o Parlamento e o Conselho adotarem medidas no que diz respeito a essas formas de circulação de capitais. Nas condições estabelecidas no artigo 64.o, n.o 3, TFUE, o Conselho pode adotar igualmente medidas que constituam um «retrocesso» no direito da União em relação à liberalização dos movimentos de capitais provenientes de, ou com destino a, países terceiros.

316.

Seja qual for o âmbito preciso dos artigos 63.° e 64.° TFUE, creio que estas disposições se aplicam claramente aos movimentos de capitais e aos pagamentos provenientes de, ou com destino a, países terceiros que envolvam investimento direto, incluindo investimento estrangeiro direto. Por conseguinte, tanto estas disposições como a jurisprudência que as interpreta são pertinentes para a definição do âmbito do conceito de «investimento estrangeiro direto» constante do artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

317.

Quando interpretou o conceito de «investimento direto» do artigo 64.o, n.o 1, TFUE, o Tribunal de Justiça baseou‑se na definição desta expressão que figura na Diretiva 88/361 do Conselho para a execução do artigo 67.o do Tratado CEE ( 232 ). O artigo 1.o, n.o 1, desta diretiva dispõe que os movimentos de capitais são classificados de acordo com a nomenclatura estabelecida no anexo I (que o Tribunal de Justiça considerou que tem valor indicativo ( 233 )).

318.

A nomenclatura estabelecida no anexo I elenca, sob a designação «investimentos diretos», o seguinte: «1) Criação e extensão de sucursais ou de empresas novas pertencentes exclusivamente ao investidor e aquisição integral de empresas existentes; 2) Participação em empresas novas ou existentes com vista a criar ou manter laços económicos duradouros; 3) Empréstimos a longo prazo com vista a criar ou manter laços económicos duradouros; e 4) Reinvestimentos de lucros com vista a manter laços económicos duradouros». Essa parte do anexo remete igualmente para as notas explicativas que definem determinados termos exclusivamente para efeitos da nomenclatura e da Diretiva 88/361. Essas notas definem «investimentos diretos» como «os investimentos de qualquer natureza efetuados por pessoas singulares, empresas comerciais, industriais ou financeiras e que servem para criar ou manter relações duradouras e diretas entre o investidor e o empresário ou a empresa a que se destinam esses fundos com vista ao exercício de uma atividade económica. As notas acrescentam que esta noção «deve pois ser considerada na sua aceção mais lata».

319.

Neste contexto, o Tribunal de Justiça considerou que o conceito de «investimento direto» abrange «investimentos efetuados por pessoas singulares ou coletivas que servem para criar ou manter relações duradouras e diretas entre o investidor e a empresa a que se destinam esses fundos com vista ao exercício de uma atividade económica» ( 234 ). No acórdão Test Claimants in the FII Group Litigation, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 63.o TFUE abrange, em princípio, os movimentos de capitais que impliquem um estabelecimento ou investimentos diretos, e afirmou que estes últimos conceitos «[se] referem […] a uma forma de participação numa empresa através da detenção de ações que confere a possibilidade de participar efetivamente na sua gestão e no seu controlo» ( 235 ). No acórdão Haribo, o Tribunal de Justiça aplicou esse critério para concluir que uma participação social não estava abrangida pelo âmbito de aplicação do artigo 64.o, n.o 1, TFUE (e, consequentemente, não configurava um investimento direto) quando implicasse uma participação inferior a 10% no capital social de uma sociedade ( 236 ).

320.

Esta jurisprudência parece refletir definições utilizadas noutros contextos. Por exemplo, a Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico («OCDE») define «investimento direto» como «[…] uma categoria de investimento transfronteiras feito por uma entidade residente numa determinada economia […] com o objetivo de estabelecer um interesse duradouro [cuja a existência está demonstrada quando o investidor direto detém, pelo menos, 10% dos direitos de voto na empresa que beneficia do investimento direto] numa empresa […] residente numa economia diferente daquela onde se encontra o investidor direto». O interesse do investidor direto consiste em estabelecer «[…] com a empresa de investimento direto uma relação estratégica de longo prazo para assegurar uma influência significativa do investidor direto na sua gestão» ( 237 ). O Fundo Monetário Internacional («FMI») define «investimento direto» como «[…] uma categoria de investimento internacional que reflete o objetivo de uma entidade residente numa economia de obter um interesse duradouro numa empresa residente noutra economia». De acordo com o FMI, o «interesse duradouro implica a existência de uma relação de longo prazo entre o investidor direto e a empresa, bem como um grau significativo de influência por parte do investidor na gestão da empresa» ( 238 ). A Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento («UNCTAD») refere‑se às definições utilizadas pela OCDE e pelo FMI.

321.

A jurisprudência relativa ao âmbito de aplicação do artigo 63.o TFUE também ajuda a compreender o que fica excluído do conceito de «investimento direto». Assim, o Tribunal de Justiça distinguiu este tipo de investimento do «investimento de carteira», ou seja, «a aquisição de títulos no mercado de capitais efetuada unicamente com a intenção de realizar uma aplicação financeira sem pretender influenciar a gestão e o controlo da empresa» ( 239 ). Esta interpretação corresponde igualmente às definições de «investimento de carteira» utilizadas noutras publicações ( 240 ).

322.

Neste contexto, interpreto a expressão «investimento estrangeiro direto» constante do artigo 207.o, n.o 1, TFUE no sentido de que designa os investimentos feitos por uma pessoa singular ou coletiva de um Estado terceiro na União Europeia e os investimentos feitos por uma pessoa singular ou coletiva da UE num Estado terceiro, que servem para estabelecer ou manter relações diretas e duradouras, sob a forma de uma participação efetiva no controlo e na gestão da sociedade, entre o investidor e a sociedade na qual o investimento é feito a fim de que esta possa desenvolver uma atividade económica. Ao aplicar esta definição, considero que o facto de o investidor direto deter, pelo menos, 10% dos direitos de voto da empresa que beneficia do investimento direto pode constituir uma orientação probatória, mas não é seguramente determinante.

– Regulação do «investimento estrangeiro direto» como parte integrante da política comercial comum

323.

As partes discordam quanto à questão de saber que formas de regulação do «investimento estrangeiro direto» são abrangidas pela política comercial comum da União Europeia. É ponto assente que esta política abrange o acesso ao mercado (ou seja, as condições de entrada e de estabelecimento) e a promoção do investimento. Assim, uma disposição como o artigo 9.7 do EUSFTA («Transferência»), que exige que as Partes permitam que todas as transferências relacionadas com um investimento abrangido sejam efetuadas numa moeda livremente convertível, sem restrições nem atrasos, e que, portanto, se aplica ao acesso ao mercado, é abrangida pela política comercial comum.

324.

A política comercial comum abrange igualmente a proteção dos investidores (e dos seus investimentos) após terem entrado no mercado estrangeiro?

325.

Na minha opinião, a resposta é afirmativa.

326.

É evidente que a política comercial comum abrange, pelo menos em certa medida, a proteção de determinados investimentos estrangeiros. Tal acontece porque essa política abrange o comércio de serviços, entendido como os quatros modos de prestação de serviços abrangidos pelo GATS ( 241 ). O GATS estabelece obrigações relativamente, inter alia, tanto ao acesso ao mercado como ao tratamento nacional, ao princípio da nação mais favorecida e à regulamentação interna, em especial no que diz respeito à prestação de serviços por um prestador de serviços de um Membro através da presença comercial no território de qualquer outro Membro (o chamado modo 3 de prestação de serviços, que corresponde, de forma geral, ao «estabelecimento») ( 242 ). Nos termos deste acordo, entende‑se por presença comercial «qualquer forma de estabelecimento comercial ou profissional, inclusivamente através i) Da constituição, aquisição ou manutenção de uma pessoa coletiva; ou ii) Da criação ou manutenção de uma sucursal ou de uma representação; no território de um Membro com vista à prestação de um serviço» ( 243 ). Quando o investimento estrangeiro direto se destine a estabelecer uma presença comercial para efeitos de prestação de um serviço é abrangido pelo comércio de serviços e, por conseguinte, insere‑se na política comercial comum. Tendo em conta os tipos de obrigações assumidas nos termos do GATS e a conclusão do Tribunal de Justiça no parecer 1/08 ( 244 ), é igualmente evidente que a política comercial comum abrange o acesso ao mercado e o tratamento que deve ser concedido depois de estabelecida a presença comercial. Por conseguinte, pelo menos alguma forma de proteção do investimento estrangeiro direto pós‑admissão é abrangida pela política comercial comum na medida em que envolva comércio de serviços.

327.

Além disso, a questão de saber se a política comercial comum abrange a regulação que protege, através da aplicação do princípio do tratamento nacional, as medidas de investimento relacionadas com o comércio de mercadorias já foi resolvida. O Tribunal de Justiça declarou que a União Europeia dispõe de competência exclusiva para celebrar o Acordo sobre as Medidas de Investimento Relacionadas com o Comércio («Acordo TRIM») ( 245 ), que é aplicável às medidas de investimento relacionadas com o comércio de mercadorias ( 246 ) e estabelece, inter alia, uma obrigação de tratamento nacional ( 247 ).

328.

É igualmente jurisprudência constante que um ato da União está abrangido pela política comercial comum «[…] quando verse especificamente sobre as trocas comerciais internacionais, na medida em que se destine essencialmente a promover, a facilitar ou a regular as trocas comerciais e tenha efeitos diretos e imediatos nestas» ( 248 ). Por conseguinte, o mesmo critério deve ser aplicado ao investimento estrangeiro direto. Assim, as medidas da UE que se destinem essencialmente a promover, facilitar ou regular o investimento estrangeiro direto e que tenham efeitos diretos e imediatos no investimento estrangeiro direto e nos investidores são abrangidas pela política comercial comum da UE.

329.

Acrescento que o contexto específico em que a expressão «investimento estrangeiro direto» aparece nos artigos 206.° e 207.°, n.o 1, TFUE, corresponde àquele em que a mesma expressão foi utilizada nos projetos de artigos relativos à ação externa no Tratado Constitucional proposto pelo Praesidium da Convenção. A propósito dos (atuais) artigos 206.° e 207.°, n.o 1, TFUE, o Praesidium comentou que tinha sido acrescentada uma referência aos investimentos estrangeiros diretos «[…] para reconhecer o facto de os fluxos financeiros completarem o comércio de mercadorias e constituírem hoje em dia uma parte muito considerável das trocas comerciais […]» ( 249 ). Tal sugere que o investimento e o comércio são componentes essenciais de uma política comercial comum efetiva e unificada. Numa economia cada vez mais globalizada, deve presumir‑se que as decisões sobre mercados de exportação e de importação e sobre os locais de produção dependem quer do comércio quer das políticas e da regulamentação em matéria de investimento.

330.

Por conseguinte, a política comercial comum inclui, para além de medidas que permitem e melhoram a entrada do investimento estrangeiro no país de acolhimento, medidas que protegem esses investimentos, quando essa proteção tenha um efeito direto e imediato na decisão de efetuar o investimento estrangeiro direto e na fruição dos lucros desse investimento.

331.

Esta interpretação do artigo 207.o TFUE permite que a União Europeia alcance os objetivos da política comercial comum. De acordo com o artigo 206.o TFUE, na prossecução dessa política, a União Europeia contribui, inter alia«[…] para a supressão progressiva das restrições às trocas internacionais e aos investimentos estrangeiros diretos […]». Na minha opinião, esta frase não pode ser interpretada no sentido de que a política comercial comum se limita à eliminação das restrições ao acesso ao mercado no que diz respeito ao investimento estrangeiro direto. O objetivo da supressão progressiva das restrições não se limita à questão de saber se as mercadorias ou os serviços podem aceder a um mercado ou se um investimento estrangeiro direto pode entrar num mercado. As medidas nas fronteiras e as limitações à entrada constituem apenas um tipo de restrição. Muitos outros tipos de medidas (ou a sua falta) podem também impedir, tornar mais cara ou, de alguma forma, tornar mais gravosa a colocação de um produto ou serviço no mercado ou a realização de um investimento para daí retirar lucros. Tais restrições podem resultar, por exemplo, de um tratamento discriminatório; de falta de segurança, previsibilidade e transparência na regulação do comércio internacional e do investimento estrangeiro direto ( 250 ); ou da existência de práticas comerciais desleais.

332.

Na linha desta interpretação, o Tribunal de Justiça admitiu que as disposições sobre comércio de mercadorias e de serviços (com exceção dos transportes) constantes do GATT de 1994 e do GATS são abrangidas pela política comercial comum ( 251 ). Estes acordos não se restringem às regras sobre o acesso ao mercado. São igualmente necessários outros tipos de regras relativas, em especial, aos instrumentos nacionais, pois, na sua falta, os benefícios do acesso ao mercado podem ser privados de efeito útil por, inter alia, medidas nacionais discriminatórias.

333.

O mesmo raciocínio deve, na minha opinião, aplicar‑se à regulação do investimento estrangeiro direto. Na verdade, a eficácia das regras que permitem este tipo de investimento pode ser totalmente comprometida se, realizado o investimento, o investidor ficar sem proteção contra, por exemplo, o tratamento discriminatório (v. artigo 9.3 do EUSFTA, relativo ao «Tratamento nacional», em conjugação com o Memorando de entendimento n.o 5, e artigo 9.5, n.o 1, do EUSFTA, relativo à «Compensação por perdas»), a expropriação (v. artigo 9.6 do EUSFTA, relativo à «Expropriação»), ou as restrições às transferências (v., artigo 9.7 do EUSFTA, relativo à «Transferência»). Por exemplo, se se permitir o acesso de um investimento ao mercado mas a atividade económica na qual o investimento é efetuado for, em seguida, expropriada sem compensação, as consequências para o investidor podem ser piores do que se o acesso tivesse sido simplesmente negado. O mesmo se aplica quando um investidor sofra perdas no Estado de acolhimento devido ao facto de o seu investimento ser objeto de requisição ou desnecessariamente destruído pelas forças armadas ou pelas autoridades desse Estado (v. artigo 9.5, n.o 2, do EUSFTA, relativo à «Compensação por perdas»).

334.

De igual modo, se for recusado aos investidores um tratamento justo e equitativo para os seus investimentos, por denegação de justiça, por violação fundamental de um processo equitativo, ou por existir um comportamento de má‑fé do Estado de acolhimento, tal pode comprometer a decisão de realizar um investimento nesse Estado e de fruir os lucros desse investimento (v. artigo 9.4 do EUSFTA, relativo ao «Nível de tratamento»). A falta de proteção no que diz respeito à segurança física dos investidores e dos investimentos pode ter a mesma consequência (v., novamente, artigo 9.4 do EUSFTA, relativo ao «Nível de tratamento»).

335.

Não vejo nenhuma razão para ter uma opinião diferente pelo facto de as disposições que estabelecem exceções a algumas dessas normas, como o artigo 9.3, n.o 3, do EUSFTA, se referirem a objetivos cuja prossecução pode ser da competência dos Estados‑Membros. A função dessas disposições é prescrever as condições nas quais as Partes podem adotar ou aplicar medidas que, de outra forma, violam essas normas, a fim de alcançar objetivos legítimos, como a proteção da segurança pública ou a manutenção da ordem pública. Trata‑se de medidas abrangidas pelo âmbito da política comercial comum devido à sua relação específica com o investimento estrangeiro direto. Assim, as condições nas quais tais medidas podem, excecionalmente, ser aplicadas são igualmente abrangidas por essa política.

336.

Por conseguinte, concluo que a política comercial comum abrange igualmente a regulação da proteção do investimento estrangeiro direto na medida em que a existência dessa proteção tenha um efeito direto e imediato na decisão de realizar o investimento estrangeiro direto e na fruição dos lucros desse investimento.

337.

Tal significa que o capítulo nove, secção A, do EUSFTA é abrangido pela competência exclusiva da União na medida em que as disposições dessa secção dizem respeito à liberalização e proteção do investimento estrangeiro direto na aceção do artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

338.

Contudo, vários Estados‑Membros objetam que a política comercial comum não pode abranger normas de proteção do investimento estrangeiro direto contra a expropriação. Alegam que, de acordo com o artigo 345.o TFUE, essa matéria é abrangida pela competência dos Estados‑Membros. De acordo com esta disposição, os Tratados não podem, de modo algum, prejudicar as regras aplicáveis ao regime da propriedade nos Estados‑Membros. Em conjugação com o artigo 207.o, n.o 6, TFUE, tal significa (alegam) que a política comercial comum não se estende à expropriação do investimento estrangeiro direto.

339.

Não faço essa interpretação dos artigos 207.°, n.o 6, e 345.° TFUE.

340.

O artigo 345.o TFUE consagra o princípio da neutralidade dos Tratados no que toca ao regime da propriedade nos Estados‑Membros: os Tratados não se opõem, em princípio, à nacionalização de empresas nem à sua privatização ( 252 ). Contudo, o Tribunal de Justiça declarou que o artigo 345.o TFUE «[…] não tem por efeito subtrair os regimes de propriedade existentes nos Estados‑Membros às regras fundamentais do [TFUE], como, nomeadamente, a não discriminação, a liberdade de estabelecimento e a liberdade de movimento de capitais» ( 253 ). Na minha opinião, daqui decorre que, embora os Estados‑Membros possam, efetivamente, escolher o seu regime da propriedade, as consequências que resultam dessa escolha e as condições nas quais a propriedade é detida não são excluídas do âmbito das regras de direito da União aplicáveis. Por outras palavras, o artigo 345.o TFUE não pode ser interpretado no sentido de que os Estados‑Membros podem regular a regime da propriedade «excluindo qualquer ação [da UE] nesta matéria» ( 254 ).

341.

Se a União Europeia celebrar um acordo internacional (independentemente da base jurídica utilizada) que retire aos Estados‑Membros o seu direito de expropriar bens, tal pode, efetivamente, violar o direito assegurado pelo artigo 345.o TFUE. Contudo, não é assim quando a União Europeia acorda com um Estado terceiro que nenhuma das partes no acordo pode nacionalizar ou expropriar os investimentos efetuados por investidores da outra parte, salvo se estiverem reunidas determinadas condições. Um acordo desta natureza não viola a prerrogativa (ou seja, a competência exclusiva) dos Estados‑Membros de escolherem o seu regime da propriedade. Apenas limita as circunstâncias nas quais podem decidir nacionalizar ou expropriar investimentos. Na medida em que tal acordo abranja igualmente investimento estrangeiro direto, o artigo 345.o TFUE não limita a competência exclusiva da União Europeia nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE para acordar com um Estado terceiro sujeitar o exercício desse direito a condições. Tal acordo também não harmoniza as condições de expropriação na União Europeia.

342.

Este é o motivo pelo qual considero que o artigo 345.o TFUE, em conjugação com o artigo 207.o, n.o 6, TFUE, não limita o exercício da competência exclusiva da União Europeia nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE ( 255 ).

343.

Em consequência, concluo que, na medida em que se aplica ao investimento estrangeiro direto, a secção A do capítulo nove («Proteção dos investimentos») é integralmente abrangida pela competência exclusiva da União Europeia nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

344.

Por último, acrescento que, embora o «investimento estrangeiro direto» seja hoje claramente uma matéria abrangida pela política comercial comum, certas partes da secção A do capítulo nove do EUSFTA podem muito bem ser abrangidas por essa política por força de outros aspetos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE. Já referi a interação entre o comércio de serviços e o investimento ( 256 ). Os aspetos comerciais do direito da propriedade intelectual e o investimento podem, de igual modo, interagir na medida em que, nos termos do EUSFTA, os direitos de propriedade intelectual e goodwill são uma das formas de investimento previstas nesse capítulo ( 257 ).

345.

Contudo, para efeitos do presente processo, é suficiente a conclusão de que o conteúdo do capítulo nove diz respeito a, pelo menos, uma das matérias previstas no artigo 207.o, n.o 1, TFUE, pelo que é abrangido pela política comercial comum.

Competência da União Europeia com base no artigo 63.o TFUE, em conjugação com o artigo 3.o, n.o 2, TFUE.

346.

É ponto assente que o artigo 207.o, n.o 1, TFUE não abrange, enquanto tal, tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto. As partes utilizaram maioritariamente o termo «investimento de carteira» para descrever esses investimentos.

347.

A menos que (certas partes das) regras do EUSFTA aplicáveis a esses outros tipos de investimento sejam abrangidas pelos compromissos em matéria de serviços ( 258 ), a base jurídica da ação da União Europeia no que diz respeito a tal investimento e da competência exclusiva da União Europeia deve ser procurada noutro local.

348.

Nada sugere que a União Europeia necessite de uma competência exclusiva para celebrar o EUSFTA de forma a poder exercer a sua competência interna. Assim, o segundo pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE não se aplica.

349.

Contudo, as partes não estão de acordo quanto à questão de saber se a União Europeia pode invocar uma competência exclusiva relativamente ao capítulo nove, secção A, com base no terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE na medida em que diz respeito a tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto.

350.

Não posso concordar com a interpretação ampla que a Comissão dá ao artigo 3.o, n.o 2, TFUE, de acordo com a qual as «regras comuns» incluem as disposições do Tratado.

351.

É verdade que o próprio texto do artigo 3.o, n.o 2, TFUE não fornece orientações decisivas. Embora o TFUE utilize o conceito de «regras comuns» especificamente em relação à adoção de disposições de direito derivado da União ( 259 ), o título VII da parte III do TFUE tem a epígrafe «As regras comuns relativas à concorrência, à fiscalidade e à aproximação das legislações». Assim, este título classifica as disposições do Tratado nele contidas como «regras comuns».

352.

Contudo, o terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE deve ser interpretado à luz do acórdão AETR e da jurisprudência subsequente que aplicou o princípio AETR ( 260 ). Nesta perspetiva, é manifesto que a interpretação ampla do conceito de «regras comuns» feita pela Comissão não pode ser aceite.

353.

O artigo 3.o, n.o 2, TFUE estabelece pressupostos suplementares para que a União Europeia disponha de competência exclusiva para celebrar acordos internacionais quando não disponha de competência exclusiva expressa nos termos do artigo 3.o, n.o 1, TFUE. Por conseguinte, essa competência deve provir de outra base que não os próprios Tratados. Para o terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE essa outra base é o impacto que os acordos internacionais celebrados pelos Estados‑Membros podem ter nas «regras comuns», ou seja, as regras adotadas pela União Europeia no exercício da sua competência interna (para prosseguir uma política comum) em determinados domínios. Assim, tal como o Tribunal de Justiça esclareceu no parecer 2/92, apenas o exercício de uma competência interna (que é diferente da sua mera existência) pode dar origem a uma competência externa exclusiva (implícita) ( 261 ). No parecer 1/94, o Tribunal de Justiça salientou que «[…] a competência externa exclusiva da [União Europeia] não decorre ipso facto do seu poder normativo no plano interno» ( 262 ).

354.

O argumento da Comissão significaria que o artigo 3.o, n.o 2, TFUE reconhece o direito da União Europeia de celebrar um acordo que afete os Tratados ou altere o seu alcance. Contudo, a função principal do artigo 3.o, n.o 2, TFUE é, como resulta claro da sua redação, delimitar a natureza da competência externa da UE. A sua finalidade não pode ser habilitar a União Europeia a «afetar» regras de direito primário da União ou a «alterar o seu alcance» através da celebração de um acordo internacional ( 263 ). O direito primário só pode ser modificado introduzindo alterações nos Tratados nos termos do artigo 48.o TUE ( 264 ). Contrariamente ao que alega a Comissão, o risco de afetar o direito primário da UE não pode fundamentar uma competência externa exclusiva na aceção do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE ( 265 ). O artigo 3.o, n.o 2, TFUE também não pode ser interpretado no sentido de que a União Europeia dispõe de competência externa exclusiva apenas com base no facto de ter competência para adotar regras no plano interno ( 266 ).

355.

A este respeito, a Comissão invocou o acórdão Pringle, no qual o Tribunal de Justiça analisou se o Tratado MEE (celebrado pelos Estados‑Membros cuja moeda é o Euro) afetava a competência da União Europeia para conceder, com base no artigo 122.o, n.o 2, TFUE, ajuda financeira pontual a um Estado‑Membro em dificuldades, ou sob grave ameaça de dificuldades, devidas a calamidades naturais ou ocorrências excecionais que não possa controlar. Nesse acórdão, o Tribunal de Justiça recordou que a criação do MEE não afetou a competência do Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia para conceder, com base no artigo 122.o, n.o 2, TFUE, ajuda financeira pontual a um Estado‑Membro sempre que constatar que este se encontra em dificuldades, ou sob grave ameaça de dificuldades, devidas a calamidades naturais ou ocorrências excecionais que não possa controlar. Contudo, acrescentou seguidamente que, visto nem o artigo 122.o, n.o 2, TFUE nem nenhuma outra disposição dos Tratados EU e FUE conferirem à União Europeia uma competência específica para instituir um mecanismo de estabilidade permanente como o MEE, os Estados‑Membros estão habilitados para atuar neste domínio, tendo em conta os artigos 4.°, n.o 1, e 5.°, n.o 2, TUE ( 267 ). Quando examinou se o artigo 3.o, n.o 2, TFUE se opunha a que os Estados‑Membros cuja moeda é o Euro celebrassem o Tratado MEE, o Tribunal de Justiça analisou quer o Regulamento (UE) n.o 407/2010 do Conselho ( 268 ) quer a disposição do Tratado que atribui competência à União Europeia para adotar disposições de direito derivado. O Tribunal de Justiça concluiu que o artigo 3.o, n.o 2, TFUE não se opunha a que um grupo de Estados‑Membros celebrasse o Tratado MEE.

356.

Após descrever a principal finalidade do artigo 3.o, n.o 2, TFUE, o Tribunal de Justiça declarou no acórdão Pringle que «[…] [d]ecorre igualmente [do artigo 3.o, n.o 2, TFUE] que os Estados‑Membros estão proibidos de celebrar entre si acordos que sejam suscetíveis de afetar regras comuns ou de alterar o alcance das mesmas» ( 269 ). Esta afirmação expressa simplesmente o princípio do primado do direito da União sobre o direito nacional, que é válido em relação quer ao direito primário quer ao direito derivado da União. Esta parte do raciocínio do Tribunal de Justiça no acórdão Pringle não permite afirmar que a competência exclusiva da UE para celebrar um acordo internacional com base no terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE possa decorrer de «regras comuns» constantes do direito primário da União.

357.

O argumento da Comissão implica igualmente que a competência externa exclusiva possa ser estabelecida com base no terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE mesmo quando a competência interna subjacente à disposição do Tratado na qual se baseia não tenha sido exercida. Se assim fosse, a distinção entre o segundo pressuposto, que diz especificamente respeito a uma situação em que uma competência interna não foi exercida, e o terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE desapareceria parcialmente.

358.

Além disso, se o terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE fosse interpretado no sentido de que a competência exclusiva é a consequência necessária do facto de um acordo internacional poder afetar as disposições do Tratado ou alterar o seu alcance, a mera existência de uma disposição do Tratado poderia ser suficiente para concluir que a União Europeia dispõe dessa competência. Se assim fosse, por que razão não se teriam os autores do projeto do Tratado limitado a confirmar expressamente a existência dessa competência externa exclusiva?

359.

Este é o motivo pelo qual considero que a expressão «regras comuns» constante do artigo 3.o, n.o 2, TFUE não pode ser interpretada no sentido de que inclui as «disposições do Tratado».

360.

É ponto assente que não existem disposições de direito derivado da União, em aplicação dos artigos 63.°, n.o 1, e 64.°, n.o 2, TFUE, relativas a tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto.

361.

Por conseguinte, concluo que, na falta de regras comuns, os requisitos do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE não estão preenchidos. Daqui decorre que a União Europeia não dispõe de competência exclusiva com base neste pressuposto. A Comissão também não alegou que a União Europeia dispõe dessa competência com base noutro fundamento.

362.

A União Europeia dispõe de competência partilhada com os Estados‑Membros?

Competências partilhadas entre a União Europeia e os Estados‑Membros

363.

A título subsidiário, a Comissão alega que a União Europeia dispõe de competência partilhada para celebrar um acordo internacional relativo a tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto, com base no segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE.

364.

Na audiência, o Tribunal de Justiça perguntou ao Conselho e à Comissão qual a base jurídica para a União Europeia dispor de competência interna em matéria de investimentos diferentes do investimento estrangeiro direto. O Conselho respondeu que não existe nenhuma base jurídica nos Tratados para a adoção de disposições de direito derivado que regulem investimentos diferentes do investimento estrangeiro direto suscetíveis de ser consideradas «regras comuns» na aceção do terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE. Admitiu, todavia, que determinados aspetos dos tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto podem ficar sujeitos a atos legislativos adotados com base em disposições do Tratado (para além dos artigos 63.° e 64.° TFUE) que regulam o mercado interno. A Comissão respondeu que, dada a proibição que já consta do artigo 63.o, n.o 1, TFUE, os Tratados não fornecem (obviamente) nenhuma base jurídica para a adoção de disposições de direito derivado com o objetivo de alcançar a liberalização (como algo distinto da harmonização) dos movimentos de capitais, incluindo o investimento de carteira. Contudo, tanto o artigo 114.o como o artigo 352.o TFUE proporcionam uma base jurídica para a eliminação das restrições ao investimento de carteira. Dito isto, na medida em que o EUSFTA não visa a harmonização, o artigo 114.o TFUE não é uma base jurídica adequada. A Comissão alegou que, em todo o caso, não é necessário identificar uma base jurídica para o exercício da competência interna para que a União possa agir com base no artigo 216.o, n.o 1, TFUE.

365.

Na minha opinião, o segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE só é relevante se a União Europeia dispuser de competência interna. Para tal, a matéria em causa deve ser abrangida pelo direito da União e, consequentemente, pela sua competência ( 270 ). Não é necessário que a União Europeia seja competente para adotar disposições de direito derivado.

366.

Considero que, neste caso, todos os requisitos para a aplicação do segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE estão preenchidos.

367.

Nos termos do artigo 63.o TFUE, a União Europeia dispõe claramente de competência em matéria de liberalização e proteção de tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto na medida em que tais investimentos constituam movimentos de capitais entre os Estados‑Membros e entre os Estados‑Membros e países terceiros. Uma vez que não existe nos Tratados uma definição do conceito de «movimentos de capitais», o Tribunal de Justiça interpretou esta expressão baseando‑se na nomenclatura (não exaustiva) anexa à Diretiva 88/361 ( 271 ). Os movimentos de capitais são classificados de acordo com a natureza económica dos ativos e responsabilidades a que se referem. A definição é muito ampla. Assim, o conceito de «movimentos de capitais» abrange, inter alia, a bens imóveis, títulos, outros instrumentos do mercado monetário, certificados de participação em organismos de investimento coletivo, contas correntes e de depósitos junto de instituições financeiras, créditos ligados a transações comerciais ou a prestações de serviços, empréstimos e créditos financeiros, cauções, outras garantias, direitos de garantia, transferências em execução de contratos de seguros, movimentos de capitais de caráter pessoal, importação e exportação física de valores, patentes, desenhos, marcas de fabrico e invenções.

368.

Outras formas de regulação desses tipos de investimento podem basear‑se no artigo 114.o TFUE na medida em que aproximem as legislações que regulam o estabelecimento e o funcionamento do mercado interno. Podem ser igualmente retiradas competências suplementares do artigo 352.o TFUE.

369.

O aspeto da livre circulação de capitais do mercado interno tem uma componente interna e uma componente externa. Um acordo que se destine a alcançar a liberalização recíproca entre a União Europeia e um país terceiro, como o EUSFTA, enquadra‑se nessa política. Uma vez que tais compromissos recíprocos não podem ser obtidos sem o consentimento do país terceiro, pode ser necessária a celebração de um acordo internacional na aceção do primeiro pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE, para alcançar esse objetivo.

370.

Esta é a razão pela qual concluo que, na medida em que se aplica a tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto, a secção A do capítulo nove é abrangida pelas competências partilhadas entre a União Europeia e os Estados‑Membros, com base no artigo 4.o, n.o 2, alínea a), TFUE e no primeiro pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE, em conjugação com o artigo 63.o TFUE.

Quanto à questão de saber se o EUSFTA pode pôr termo aos acordos bilaterais celebrados entre os Estados‑Membros e Singapura

371.

Uma questão distinta é saber se a União Europeia dispõe de competência para dar o seu acordo ao artigo 9.10, n.o 1, do capítulo nove, secção A, do EUSFTA. Esta disposição prevê que, em consequência da entrada em vigor do EUSFTA, os acordos bilaterais de investimento entre os Estados‑Membros e Singapura elencados no anexo 9‑D ( 272 ) deixarão de produzir efeitos. Esses acordos serão anulados, revogados e substituídos pelo EUSFTA. A nota 19 a essa disposição ( 273 ) refere que «[p]ara maior clareza, [esses acordos] consideram‑se revogados pelo [EUSFTA], na aceção do artigo 59.o, n.o 1, alínea a), da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados».

372.

No seu pedido, a Comissão alega que o artigo 9.10 («Relação com outros acordos»), conjuntamente com os artigos 9.8 («Sub‑rogação») e 9.9 («Cessação de vigência»), são claramente dependentes e, por conseguinte, acessórios das outras disposições materiais sobre investimento constantes do capítulo nove, secção A. Na audiência, a Comissão alegou que, quando celebra um acordo internacional num domínio abrangido pela sua competência (pelo menos, quando essa competência é exclusiva), a União Europeia sucede aos Estados‑Membros no que diz respeito aos acordos bilaterais que estes celebram com Estados terceiros, pelo que pode agir em nome dos Estados‑Membros, inclusive revogando esses acordos bilaterais.

373.

O Conselho e um número significativo de Estados‑Membros alegaram que a União Europeia não pode, agindo sozinha, acordar com um Estado terceiro pôr termo e substituir acordos internacionais celebrados entre esse Estado e os Estados‑Membros e nos quais a própria União Europeia não seja parte.

374.

Na minha opinião, apenas se torna necessário decidir definitivamente essa questão se o Tribunal de Justiça considerar que a União Europeia dispõe de competência exclusiva sobre todas as outras partes do EUSFTA. Caso o Tribunal de Justiça decida que a competência da União Europeia é partilhada com os Estados‑Membros e, por conseguinte, se o EUSFTA tiver de ser celebrado pela União Europeia e pelos Estados‑Membros, os próprios Estados‑Membros (em causa) podem decidir, manifestando o seu consentimento em ficar vinculados pelo EUSFTA, se põem ou não termo aos acordos existentes com Singapura.

375.

Pelos motivos que já apresentei, considero que a União Europeia não dispõe de competência exclusiva relativamente a todo o capítulo nove, secção A (nem, aliás, a todo o EUSFTA) ( 274 ).

376.

Todavia, por uma questão de exaustividade, analisarei sucintamente a questão de saber se, não sendo parte nos acordos celebrados entre os Estados‑Membros e Singapura, que estão incluídos no anexo 9‑D, a União Europeia pode acordar com Singapura pôr termo a esses acordos sem o consentimento dos Estados‑Membros.

377.

Trata‑se de uma questão inédita ( 275 ).

378.

Quando a União Europeia adquire competência exclusiva (interna ou externa) num determinado domínio, age num domínio que anteriormente era da competência dos Estados‑Membros. Se a União Europeia decide ou não desfazer as ações anteriores dos Estados‑Membros dependerá da forma como exerce essa competência e da questão de saber se tal cria alguma incompatibilidade com a ação anterior dos Estados‑Membros. As condições nas quais a União Europeia pode exercer competências internas dependem do direito da União. Em todo o caso, a ação da União deve ser exercida no respeito do direito internacional ( 276 ).

379.

Quando a União Europeia assume competências anteriormente exercidas pelos Estados‑Membros num domínio regulado por um acordo internacional, as disposições desse acordo tornam‑se, enquanto matéria de direito da União, vinculativas para a União Europeia ( 277 ). Esta foi a posição do Tribunal de Justiça no que diz respeito ao GATT de 1947 [no qual todos os Estados‑Membros (nessa altura) eram partes, mas não a União Europeia], no acórdão International Fruit Company ( 278 ). O efeito vinculativo do GATT de 1947 era uma condição para determinar se afetava a validade do direito derivado da CEE. O Tribunal de Justiça não analisou (nem necessitava de o fazer) de que modo essa conclusão afetava as obrigações dos Estados‑Membros no âmbito do GATT de 1947 ou o seu estatuto como partes contratantes nesse acordo. Na minha opinião, resulta do acórdão Internacional Fruit Company que, do ponto de vista do direito da União, a União Europeia tinha adquirido competência exclusiva em matérias abrangidas pelo GATT de 1947 e, do ponto de vista do direito internacional, substituíra os Estados‑Membros como parte responsável pelo cumprimento das obrigações por estes assumidas no âmbito do GATT de 1947.

380.

Contudo, o acórdão International Fruit Company não aborda a questão de saber se, quando a União Europeia assume competências anteriormente exercidas pelos Estados‑Membros num domínio que passa a ser da sua competência exclusiva, essas competências incluem o direito de pôr termo a acordos existentes celebrados pelos Estados‑Membros com países terceiros. Com efeito, os Estados‑Membros continuaram a ser partes contratantes no GATT de 1947, que passou a ser aplicável, do ponto de vista do direito da União, tanto aos Estados‑Membros como à CEE.

381.

O Tribunal de Justiça considerou igualmente que, em princípio, a aplicação dos Tratados UE pode não afetar o compromisso dos Estados‑Membros de respeitarem os direitos de Estados terceiros decorrentes de um acordo anterior e de cumprirem as suas obrigações correspondentes ( 279 ). Assim, mesmo que os Tratados transfiram a competência num determinado domínio integralmente para a União Europeia, os Estados‑Membros devem continuar a cumprir as suas obrigações decorrentes dos acordos internacionais celebrados com Estados terceiros. Isso é conforme com o princípio assente de direito internacional segundo o qual o direito interno não pode justificar o incumprimento de um acordo internacional nem afetar a validade desse acordo ( 280 ). Tal significa igualmente que as modificações aos Tratados não podem ter como resultado que a União Europeia substitua os Estados‑Membros nos acordos que estes tenham celebrado anteriormente com Estados terceiros. Por conseguinte, o Estado terceiro continua a estar vinculado por um acordo que celebrou com o Estado‑Membro em causa e, em princípio, as duas partes nesse acordo devem dar‑lhe pleno cumprimento, em aplicação do princípio pacta sunt servanda ( 281 ).

382.

Contudo, os Estados‑Membros devem cumprir as suas obrigações decorrentes desses acordos em conformidade com o direito da União e com o exercício pela União Europeia das suas competências exclusivas recém‑adquiridas. Quando não for possível fazê‑lo sem infringir o direito da União, os Estados‑Membros devem adotar as medidas necessárias para assegurar a conformidade desses acordos com o direito da União. Essa obrigação resulta quer do primado do direito da União quer do dever de cooperação leal previsto no artigo 4.o, n.o 3, TUE.

383.

O artigo 351.o TFUE, que diz respeito à relação entre, por um lado, os acordos celebrados pelos Estados‑Membros antes de 1 de janeiro de 1958 (ou antes da adesão de determinados Estados‑Membros) entre um ou mais Estados‑Membros e um ou mais países terceiros, e, por outro lado, as disposições do Tratados, confirma este raciocínio.

384.

O artigo 351.o, primeiro parágrafo, TFUE tem por objeto «[…] precisar, de acordo com os princípios do direito internacional, que a aplicação do Tratado não afeta o compromisso de o Estado‑Membro interessado respeitar os direitos de Estados terceiros emergentes duma convenção anterior e observar as suas obrigações […]» ( 282 ).

385.

O segundo parágrafo dessa disposição estabelece que, na medida em que tais convenções não sejam compatíveis com os Tratados, o Estado ou os Estados‑Membros em causa recorrerão a todos os meios adequados para eliminar as incompatibilidades verificadas. Esses meios poderão tornar necessária a anulação da convenção. Quando não exista qualquer incompatibilidade entre a convenção anterior e os Tratados, não existe nenhuma obrigação de adotar medidas corretivas.

386.

O artigo 351.o TFUE aplica‑se à relação entre, por um lado, os acordos bilaterais celebrados entre Singapura e vários Estados‑Membros, individualmente considerados, antes da sua adesão à União Europeia (Bulgária, Eslovénia, Hungria, Lituânia, Polónia, República Checa e República Eslovaca: ou seja, alguns dos acordos constantes do anexo 9‑D) ( 283 ) e, por outro lado, os Tratados. Contudo, o artigo 351.o, primeiro parágrafo, TFUE não regula, enquanto tal, a relação entre a primeira categoria de acordos e os acordos celebrados posteriormente entre Singapura e a União Europeia. Também não é aplicável aos acordos celebrados por outros Estados‑Membros.

387.

Por isso, em vez de sustentar a tese da Comissão, o artigo 351.o TFUE confirma claramente que um Estado‑Membro continua a ser parte nos acordos internacionais que tenha celebrado anteriormente e é responsável pela eliminação de quaisquer incompatibilidades entre esses acordos e os Tratados. O artigo 351.o TFUE aplica‑se independentemente de a União Europeia dispor ou não de competências exclusivas ou partilhadas nos domínio abrangidos por esses acordos.

388.

Nenhuma disposição do Tratado elenca as obrigações dos Estados‑Membros que celebram acordos internacionais com Estados terceiros (ou com organizações internacionais) após a sua adesão à União Europeia. As suas obrigações resultam quer do primado do direito da União quer do dever de cooperação leal previsto no artigo 4.o, n.o 3, TUE. Assim, os Tratados afetam, de facto, o direito dos Estados‑Membros de celebrarem tais acordos após a sua adesão à União Europeia. Estes apenas podem fazê‑lo em domínios abrangidos pelas suas competências e na condição de respeitarem o direito da União.

389.

Se a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros se modificar posteriormente e a União Europeia adquirir competências suplementares que sejam, por natureza, exclusivas, não vejo razão para que as regras estabelecidas no artigo 351.o TFUE devam deixar de ser aplicáveis. Os Estados‑Membros continuam a ter o dever de recorrer a todos os meios adequados para assegurar que os acordos existentes no domínio em causa, que passam a ver vinculativos também para a União Europeia ( 284 ), estejam em conformidade com essa nova repartição de competências e com quaisquer medidas posteriormente adotadas pela União Europeia no exercício das suas competências.

390.

Considero que esta conclusão está igualmente em plena conformidade com o direito internacional.

391.

Na nota 19 ( 285 ) ao artigo 9.10, n.o 1, do EUSFTA, a União Europeia e Singapura referem‑se expressamente ao artigo 59.o da Convenção de Viena de 1969. Do ponto de vista do direito dos Tratados, esta disposição vincula todos os Estados‑Membros e Singapura. A própria União Europeia não está nem pode estar vinculada pela Convenção de Viena de 1969 porque não é um Estado. Todavia, o Tribunal de Justiça baseou‑se nessa disposição para resolver questões relativas à sucessão de acordos ( 286 ).

392.

O artigo 59.o da Convenção de Viena de 1969 trata da revogação (tácita) de um Tratado entre as partes que resulta da celebração, por todas essas partes, de um tratado posterior. De acordo com esta disposição, «1) Considera‑se que cessou a vigência de um tratado quando todas as partes nesse tratado concluíram posteriormente um novo tratado sobre a mesma matéria e: a) Se resultar do tratado posterior ou se estiver, de outro modo, estabelecido que, segundo a intenção das partes, a matéria deve ser regida pelo novo tratado […]». Daqui a Comissão conclui que a União Europeia deve passar a ser considerada parte nos acordos bilaterais anteriores.

393.

O artigo 59.o não se afasta, de modo algum, do princípio básico de que a cessação da vigência de um Tratado (tal como a sua celebração) exige o consentimento das partes nesse Tratado ( 287 ). Funciona, antes de mais, como uma norma de conflitos para determinar qual o Tratado aplicável quando se verifique uma sucessão de acordos e todas as partes no Tratado anterior sejam também partes no Tratado posterior, sem que o Tratado anterior tenha deixado de vigorar ( 288 ). Quando a União Europeia decida exercer as suas novas competências adquiridas e celebre um acordo com um Estado terceiro, este fica vinculado por esse novo acordo, bem como por quaisquer outros acordos que tenha celebrado anteriormente com Estados‑Membros sobre a mesma matéria. Daí pode, obviamente, resultar incerteza jurídica para o Estado terceiro. Quando o artigo 59.o da Convenção de Viena de 1969 for aplicável, esse conflito é resolvido a favor do acordo posterior entre a União Europeia e o Estado terceiro. Quando não for aplicável, o Estado terceiro deve, em princípio, cumprir ambos os acordos.

394.

Contudo, o artigo 59.o da Convenção de Viena de 1969 só é aplicável apenas se se admitir que (à luz do direito internacional) a União Europeia sucedeu a cada um dos Estados‑Membros no que diz respeito aos acordos bilaterais elencados no anexo 9‑D. Aquela disposição não fornece orientações gerais sobre a sucessão de Tratados. A Convenção de Viena de 1969 não prejudica nenhuma questão que possa surgir a propósito de um Tratado em virtude de uma sucessão de Estados ( 289 ). A Convenção de Viena de 1978 sobre Sucessão de Estados em Matéria de Tratados ( 290 ) também não aborda a situação específica em causa. [Acrescento que, embora esta convenção tenha entrado em vigor, apenas alguns Estados‑Membros estão entre os seus (poucos) signatários].

395.

Na audiência, a Comissão referiu‑se ao que descreveu como uma prática «consolidada» e «aceite por um grande número de países». Contudo, os poucos exemplos que apresentou dizem todos respeito ao que a própria União Europeia realizou. A Comissão não forneceu qualquer elemento que permita concluir que os outros Estados consideram que tal prática constitui uma norma direito internacional.

396.

Neste contexto, não encontro nenhum fundamento de direito internacional (no seu estado atual) para concluir que a União Europeia pode suceder automaticamente aos Estados‑Membros num acordo internacional celebrado por eles, no qual não seja parte, e em seguida pôr termo a esse acordo. Esta regra constituiria uma exceção à regra fundamental do consentimento na produção de direito internacional. Admitir a posição da Comissão significaria que, em caso de modificações do direito da União e do eventual exercício pela União Europeia das suas competências externas, um Estado‑Membro poderia deixar de ser parte num acordo internacional ainda que tivesse consentido em ficar vinculado por esse acordo e que esse acordo estivesse em vigor relativamente a ele ( 291 ). Os direitos e as obrigações do Estado‑Membro nos termos desse acordo extinguir‑se‑iam e, se a União Europeia decidisse exercer as suas novas competências, seriam substituídos pelos direitos e as obrigações assumidos pela União Europeia com o Estado terceiro, sem que o Estado‑Membro tivesse manifestado o seu consentimento em relação a essas modificações (fundamentais).

397.

Por último, observo que a União Europeia adotou instrumentos de direito derivado (Regulamento n.o 1219/2012) que estabelecem disposições transitórias para os acordos bilaterais de investimento entre os Estados‑Membros e os países terceiros. Contudo, esse regulamento refere expressamente que não prejudica a repartição de competências entre a União e os seus Estados‑Membros de acordo com o TFUE ( 292 ). O referido regulamento baseia‑se na premissa de que a União Europeia dispõe de competência exclusiva em todas as matérias abrangidas por esses acordos bilaterais anteriores, e fornece uma base de direito da União que permite aos Estados‑Membros agirem no que diz respeito aos acordos existentes e (eventuais) novos acordos. Contudo, este regulamento não prevê que a própria União Europeia possa (em conjunto com o Estado terceiro vinculado pelo acordo bilateral) pôr termo a esses acordos anteriores.

398.

Por conseguinte, concluo que os Estados‑Membros dispõem de competência exclusiva para pôr termo a acordos bilaterais de investimento que tenham celebrado anteriormente com Estados terceiros. Em consequência, a União Europeia não dispõe de competência para dar o seu acordo ao artigo 9.19 do EUSFTA.

Contratos públicos (capítulo dez do EUSFTA ( 293 ) )

Argumentos

399.

A Comissão alega que o Tribunal de Justiça já reconheceu, no processo C‑360/93 ( 294 ), que, em princípio, a política comercial comum abrange a celebração de acordos relativos à abertura recíproca dos mercados públicos de bens e de prestações transfronteiras de serviço. Uma vez que outros modos de prestação de serviços estão atualmente incluídos no âmbito da política comercial comum, o mesmo argumento é extensível a esses outros modos de prestação de serviços. A um nível mais geral, a Comissão alega que os acordos internacionais que regulam o acesso, por um lado, de bens e serviços de países terceiros aos mercados de contratos públicos da União Europeia e, por outro, de bens e serviços da UE aos mercados de contratos públicos de países terceiros dizem especificamente respeito ao comércio internacional, pelo que têm efeitos diretos e imediatos no comércio internacional. A Comissão acrescenta que o (recente) Protocolo que altera o Acordo sobre Contratos Públicos da OMC foi celebrado pela União Europeia, no exercício da sua competência exclusiva em matéria de política comercial comum.

400.

As outras partes no presente processo não apresentaram argumentos específicos em relação ao capítulo dez.

Análise

401.

Ao contrário da Comissão, considero que o processo C‑360/93 ( 295 ) não é relevante para decidir se o capítulo dez é ou não abrangido pela política comercial comum. Nesse processo, o Tribunal de Justiça anulou duas decisões do Conselho, respetivamente, i) de celebrar de um acordo entre a (atual) União Europeia e os Estados Unidos da América, relativo à adjudicação de contratos públicos, e ii) de estender o benefício das disposições de uma diretiva do Conselho sobre procedimentos de celebração dos contratos de direito público de forma a abranger os Estados Unidos da América ( 296 ). O Tribunal de Justiça declarou que o artigo 113.o CE não constituía uma base jurídica adequada para essas decisões porque, na altura, apenas a prestação transfronteiras de serviços era abrangida pelo âmbito da política comercial comum. Contudo, ambas as decisões abrangiam igualmente outros modos de prestação de serviços (presença comercial ou presença de pessoas singulares no território da outra parte contratante) ( 297 ). Por conseguinte, o Tribunal de Justiça não tomou posição sobre a questão de saber se um contrato público é, enquanto tal, abrangido pela política comercial comum.

402.

Todavia, concordo com a Comissão quando afirma que o objetivo do capítulo dez é, antes de mais, facilitar a abertura recíproca dos mercados de contratos públicos da União Europeia e de Singapura, dentro dos limites impostos a cada uma das Partes na lista de compromissos de acesso ao mercado. Este capítulo visa igualmente reforçar a concorrência na aquisição pública de bens, serviços e obras, bem como garantir a transparência e a equidade dos procedimentos neste domínio. Para tal, desenvolve os compromissos já assumidos por ambas as Partes no âmbito do Acordo sobre Contratos Públicos da OMC (revisto) ( 298 ). De facto, grandes partes deste capítulo correspondem (palavra por palavra) a esse acordo da OMC.

403.

A conclusão segundo a qual o comércio de bens e serviços — e, por conseguinte, as regras em matéria de acesso ao mercado de, e a regulamentação interna aplicável a, tais bens e serviços — está abrangido pela política comercial comum não é afetada pelo facto de esses bens e serviços serem adquiridos por autoridades públicas e não por entidades privadas.

404.

Contudo, o capítulo dez também prevê a aplicação de determinados compromissos específicos ao setor dos transportes. O anexo 10.E, parte 2 («Compromissos da União»), que estabelece os serviços relativamente aos quais a União aceita compromissos, confirma expressamente que este capítulo abrange várias formas de serviços de transporte. Além disso, a nota 2 a essa parte do anexo dispõe que os compromissos da União em matéria de serviços estão sujeitos às limitações e condições especificadas nos compromissos da União no âmbito do capítulo oito.

405.

Na medida em que o capítulo dez se aplica aos serviços de transporte e aos serviços intrinsecamente ligados a esses serviços, decorre do artigo 207.o, n.o 5, TFUE que a competência da União Europeia em relação a esse capítulo não se pode basear na política comercial comum ( 299 ).

406.

A Comissão não indicou em que outra base jurídica a União pode dispor de competência exclusiva em relação ao capítulo dez.

407.

Na minha opinião, a União Europeia dispõe de uma competência partilhada no que se refere a este capítulo na medida em que o mesmo se aplica a serviços de transporte e a serviços intrinsecamente ligados a estes serviços. O capítulo dez assegura que os contratos por ele abrangidos sejam adjudicados em conformidade com os princípios da igualdade de tratamento, da não discriminação e da transparência e, assim, assegura a abertura da contratação pública à concorrência na União Europeia e em Singapura ( 300 ). Desta forma, o referido capítulo contribui para estabelecer ou assegurar o funcionamento do mercado interno, que, como indica claramente o protocolo n.o 27 relativo ao mercado interno e à concorrência «inclui um sistema que assegura que a concorrência não seja falseada» ( 301 ). Neste sentido, o capítulo dez pode ser considerado necessário para alcançar o objetivo de estabelecer o mercado interno, previsto no artigo 26.o, n.o 1, TFUE, na aceção do segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE ( 302 ). Contudo, essa competência externa é partilhada entre a União Europeia e os seus Estados‑Membros, nos termos do artigo 4.o, n.o 2, alínea a), TFUE.

408.

Por conseguinte, concluo que as disposições do capítulo dez sobre contratos públicos são abrangidas pelo âmbito da competência exclusiva da União Europeia, nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE, exceto quando se aplicam à contratação pública de serviços de transporte e de serviços intrinsecamente ligados a estes serviços. Na medida em que se aplicam a esta categoria de serviços, as disposições do capítulo dez são abrangidas pela competência partilhada da União Europeia.

Propriedade Intelectual (capítulo onze do EUSFTA ( 303 ) )

Argumentos

409.

A Comissão alega que todo o capítulo onze é abrangido pelo âmbito da política comercial comum porque diz respeito aos aspetos comerciais da propriedade intelectual, na aceção do artigo 207.o, n.o 1, TFUE. Por conseguinte, a União Europeia dispõe, nos termos do artigo 3.o, n.o 1, TFUE, de competência exclusiva no que se refere a este capítulo.

410.

A Comissão baseia a sua posição no acórdão Daiichi ( 304 ) , no qual o Tribunal de Justiça declarou que só as regras adotadas pela União Europeia no domínio da propriedade intelectual «que apresentam uma ligação específica com as trocas comerciais internacionais são suscetíveis de se integrarem no conceito de “aspetos comerciais da propriedade intelectual”» ( 305 ); mas que o Acordo TRIPS se insere, na sua totalidade, nesse conceito ( 306 ). O mesmo acontece em relação aos acordos internacionais em matéria de propriedade intelectual celebrados fora do âmbito da OMC que tenham uma ligação específica com o comércio internacional. A Comissão invoca, a este respeito, o acórdão Regione autonoma Friuli‑Venezia Giulia e ERSA ( 307 ).

411.

Em primeiro lugar, a Comissão afirma que a maior parte das disposições do capítulo onze se baseiam no Acordo TRIPS. Em segundo lugar, o artigo 11.2, n.o 1, refere que as disposições deste capítulo «complementam os direitos e as obrigações que incumbem às partes no âmbito do Acordo TRIPS e de outros tratados internacionais no domínio da propriedade intelectual». Em terceiro lugar, o capítulo onze faz parte de um acordo comercial mais amplo entre a União Europeia e Singapura, como indica o artigo 11.1, n.o 1. Os objetivos aí enunciados demonstram estabelecer normas comuns de proteção da propriedade intelectual não é, em si mesmo, um objetivo do EUSFTA. Os objetivos são antes reduzir as distorções do comércio e aumentar o acesso ao mercado dos produtos protegidos por direitos de propriedade intelectual. Além disso, tal como acontece no Acordo TRIPS, o capítulo onze está sujeito às disposições relativas à resolução de litígios constantes dos capítulos quinze e dezasseis do EUSFTA. Por conseguinte, a violação das obrigações previstas no capítulo onze podem implicar a aplicação de sanções comerciais.

412.

No que diz respeito às referências que o capítulo onze faz a outros acordos internacionais em matéria de propriedade intelectual, a Comissão alega que a utilização desta técnica (comum) de redação é razoável e justificada, uma vez que o objetivo geral consiste em abolir progressivamente os obstáculos ao comércio internacional e ao investimento. Além disso, a maior parte das referências são meramente declaratórias ou revestem a forma de «compromissos de melhores esforços», que não produzem efeitos jurídicos suscetíveis de comprometer a competência da União Europeia no que diz respeito ao capítulo onze.

413.

A posição do Parlamento sobre o capítulo onze coincide com a da Comissão. O Parlamento acrescenta que não existe no capítulo onze qualquer referência ao artigo 61.o do Acordo TRIPS (que diz respeito a processos penais e penas) ( 308 ).

414.

Nenhum dos argumentos do Conselho diz especificamente respeito ao capítulo onze.

415.

Muitos Estados‑Membros alegam que a União Europeia não dispõe de competência exclusiva no que diz respeito ao capítulo onze, que não tem qualquer ligação específica com o comércio internacional, pelo que não pode ser abrangido pelo conceito de «aspetos comerciais da propriedade intelectual». O acórdão Daiichi ( 309 ) dizia essencialmente respeito ao artigo 27.o do Acordo TRIPS, e não a todo esse acordo. Por conseguinte, o artigo 207.o TFUE não pode ser interpretado no sentido de que atribui competência exclusiva à União Europeia para celebrar acordos que abranjam todas as disposições do Acordo TRIPS. Se, ao contrário desta alegação, o acórdão do Tribunal de Justiça disse, de facto, respeito a todas as disposições do Acordo TRIPS, o raciocínio do Tribunal de Justiça baseou‑se especificamente em características da ordem jurídica da OMC que não estão presentes no EUSFTA. Mesmo que se faça uma interpretação abrangente do acórdão Daiichi ( 310 ), este acórdão não é extensível a matérias não diretamente reguladas pelo Acordo TRIPS.

416.

O capítulo onze do EUSFTA e o Acordo TRIPS não se sobrepõem totalmente. Em todo o caso, o simples facto de uma matéria ser regulada pelo Acordo OMC (do qual o Acordo TRIPS é parte integrante) não significa que essa matéria seja necessariamente também abrangida pela política comercial comum. O artigo 207.o, n.o 1, TFUE não deve ser interpretado no sentido de que todos os acordos internacionais em matéria de direitos de propriedade intelectual passam a ser abrangidos pela política comercial comum.

417.

O capítulo onze reproduz quer determinadas disposições do Acordo TRIPS quer disposições de outros acordos em matéria de propriedade intelectual (negociados fora do contexto da OMC) relativamente aos quais a União Europeia não pode dispor de competência exclusiva. Ao contrário do Acordo TRIPS, esses acordos (essencialmente acordos internacionais administrados pela Organização Mundial da Propriedade Intelectual) não foram celebrados como parte de acordos comerciais. Também não podem ser classificados como acordos comerciais na aceção do acórdão Regione autonoma Friuli‑Venezia Giulia e ERSA ( 311 ). Qualquer relação entre esses acordos e o comércio internacional é apenas indireta. A União Europeia não pode assumir compromissos internacionais que apenas dizem respeito aos Estados‑Membros. A União Europeia também não pode exigir aos Estados‑Membros que apliquem os acordos internacionais que celebraram.

418.

Além disso, as disposições relativas à aplicação de direitos protegidos, como os artigos 42.° a 50.° do Acordo TRIPS (ou seja, as disposições da secção 2 da parte III, intitulado «processos e medidas corretivas civis e administrativos») não fazem parte da política comercial comum. Essas disposições dizem respeito à organização judicial e ao processo civil. Não têm nenhuma ligação específica com o comércio internacional.

419.

A União Europeia também não pode dispor de competência exclusiva porque o capítulo onze incorpora o artigo 61.o do Acordo TRIPS, que diz respeito a penas. As questões penais não fazem parte dos aspetos comerciais da propriedade intelectual.

420.

A União Europeia também não é competente para aceitar as obrigações estabelecidas no artigo 11.4 do EUSFTA na medida em que esta disposição incorpora a Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas ( 312 ), o Tratado da OMPI sobre o Direito de Autor ( 313 ) e o Tratado da OMPI sobre Prestações e Fonogramas ( 314 ), que se aplicam aos direitos morais. A União Europeia não dispõe de competência no que diz respeito aos direitos morais; nem houve harmonização neste domínio.

421.

O artigos 11.2 (que se refere ao Acordo TRIPS e à Convenção de Paris para a Proteção da Propriedade Industrial ( 315 )) e o artigo 11.29 do EUSFTA (que evoca o Tratado de Cooperação em matéria de Patentes ( 316 ) e exige que as Partes envidem, se for caso disso, todos os esforços razoáveis para respeitar os artigos 1.° a 16.° do Tratado sobre o Direito das Patentes ( 317 )) terão efeitos nas patentes, que são matéria da competência partilhada (v., em especial, artigo 118.o TFUE e Regulamentos n.o 1257/2012 e n.o 1260/2012) ( 318 ). A proteção de patentes é uma matéria sujeita à cooperação reforçada entre os Estados‑Membros (com exceção da Espanha, Itália e Croácia). Esta matéria não pode ficar sujeita à competência exclusiva: o conceito de cooperação reforçada não é compatível com o conceito de competência exclusiva. Outro Estado‑Membro alega igualmente que a Comissão não explicou de que modo a União Europeia poderia respeitar o artigo 11.29 do EUSFTA ( 319 ) se fosse a única signatária do EUSFTA. As matérias abrangidas pelo Tratado de Cooperação em Matéria de Patentes e pelo Tratado sobre o Direito das Patentes são diferentes das questões materiais relativas a patentes abrangidas pelo Acordo TRIPS.

422.

O artigo 11.35 (sobre variedades vegetais) também não é abrangido pela política comercial comum. A Convenção Internacional para a Proteção das Obtenções Vegetais não está especificamente relacionada com o comércio internacional. Essa convenção prevê uma forma sui generis de proteção da propriedade intelectual. A base jurídica para a decisão do Conselho de celebrar essa convenção foi o artigo 43.o TFUE, que diz respeito à agricultura.

423.

Por último, é necessário que exista uma (quase) uniformização entre a competência interna e a competência externa. Assim, dado que determinadas matérias abrangidas pelo capítulo onze não estão harmonizadas, a União Europeia não dispõe de competência exclusiva nos termos do artigo 3.o, n.o 2, TFUE.

Análise

Significado da expressão «aspetos comerciais da propriedade intelectual» constante do artigo 207.o, n.o 1, TFUE

424.

Na sequência da entrada em vigor do Tratado de Lisboa, o artigo 207.o, n.o 1, TFUE dispõe atualmente que a política comercial comum assenta em princípios uniformes no que diz respeito igualmente «aos aspetos comerciais da propriedade intelectual». O ponto de partida para interpretar esta expressão é o acórdão Daiichi ( 320 ).

425.

No acórdão que proferiu nesse processo, o Tribunal de Justiça começou por observar que, uma vez que o direito primário da União evoluíra significativamente, a sua jurisprudência anterior relativa ao Acordo TRIPS, incluindo o parecer 1/94 ( 321 ), deixara de ser relevante para determinar em que medida o Acordo TRIPS se inseria na política comercial comum.

426.

Em primeiro lugar, o Tribunal de Justiça considerou que, embora não tenha como objeto as modalidades das operações de comércio internacional enquanto tais, o Acordo TRIPS é parte integrante do regime da OMC e constitui um dos acordos multilaterais principais nos quais o regime se baseia ( 322 ).

427.

Em segundo lugar, o Tribunal de Justiça declarou que a especificidade da ligação entre o Acordo TRIPS e o comércio internacional é ilustrada pelo facto de, nos termos das regras que regulam o mecanismo de resolução de litígios da OMC, ser possível um Estado‑Membro utilizar a suspensão de concessões de forma cruzada entre o Acordo TRIPS e os outros acordos multilaterais principais que constituem o Acordo OMC ( 323 ). A este respeito, o Tribunal de Justiça baseou‑se no artigo 22.o, n.o 3, do Memorando de entendimento da OMC sobre as regras e processos que regem a resolução dos litígios. Esta disposição identifica as concessões ou outras obrigações que podem ser suspensas.

428.

Em terceiro lugar, o Tribunal de Justiça entendeu que os autores do Tratado, ao incluírem a frase «aspetos comerciais da propriedade intelectual» no artigo 207.o, n.o 1, TFUE, não puderam ignorar que os termos utilizados correspondiam quase literalmente ao próprio título do Acordo TRIPS ( 324 ).

429.

Em quarto lugar, o Tribunal de Justiça insistiu no facto de que o objetivo essencial do Acordo TRIPS é reforçar e harmonizar a proteção da propriedade intelectual à escala mundial. Assim, resulta do preâmbulo que o objetivo do acordo é reduzir as distorções do comércio internacional garantindo, no território de cada um dos membros da OMC, uma proteção eficaz e adequada dos direitos de propriedade intelectual ( 325 ). O contexto das regras materiais é a liberalização do comércio e não a harmonização das legislações dos Estados‑Membros.

430.

Por conseguinte, considero que, no acórdão Daiichi, o Tribunal de Justiça considerou que o acordo TRIPS se insere, na sua totalidade, na política comercial comum. A sua análise não se limitou ao artigo 27.o do Acordo TRIPS.

431.

Dito isto, não estou convencida de que os fundamentos do acórdão Daiichi possam e devam ser transpostos como um todo para a análise do EUSFTA.

432.

O facto de a terminologia utilizada no artigo 207.o, n.o 1, TFUE («aspetos comerciais da propriedade intelectual») ter correspondência no título do Acordo TRIPS («aspetos dos direitos de propriedade intelectual relacionados com o comércio») é, aparentemente, específico desse acordo da OMC.

433.

A inclusão de disposições sobre propriedade intelectual num determinado acordo comercial pode indiciar uma ligação específica entre essas disposições e o comércio internacional. No entanto, a política comercial comum pode abranger igualmente disposições sobre propriedade intelectual ou acordos negociados e celebrados num contexto não relacionado com o comércio ( 326 ). Se a mera inclusão de uma matéria num acordo dessa natureza bastasse para este ser abrangido pela política comercial comum, os Estados‑Membros correriam um sério risco de perder as suas atuais competências ( 327 ).

434.

O âmbito da política comercial comum também não deve, a meu ver, ser definido por referência ao tipo de medidas previstas nas regras para a resolução de litígios ( 328 ).

435.

Na minha opinião, o que é relevante para efeitos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE é saber se um acordo que contenha disposições sobre proteção da propriedade intelectual diz especificamente respeito ao comércio internacional. Tal deve ser determinado analisando se o acordo se destina essencialmente a promover, a facilitar ou a regular as trocas comerciais (e não a harmonizar as legislações dos Estados‑Membros) ( 329 ); tem efeitos diretos e imediatos nessas trocas comerciais; e tem como objetivo reduzir as distorções do comércio internacional garantindo, no território de cada Parte, uma proteção eficaz e adequada dos interesses económicos nos monopólios que os direitos de propriedade intelectual criam. Essa é a essência do acórdão Daiichi.

436.

Neste ponto, concordo com o advogado‑geral N. Wahl quando afirma que, pela sua própria natureza, as regras sobre propriedade intelectual estão, na sua maioria, relacionadas com o comércio, uma vez que são, no essencial, direitos exclusivos que criam monopólios suscetíveis de restringir a livre circulação de bens ou serviços ( 330 ). Numa economia de mercado, a importância fundamental desses direitos consiste no seu valor económico. Quando o exercício desses direitos seja essencial para a exploração comercial da propriedade intelectual protegida num mercado transfronteiras, tais direitos são abrangidos pelos «aspetos comerciais da propriedade intelectual» ( 331 ). Nesta perspetiva, os interesses relacionados com a proteção desses direitos tornam‑se, no essencial, interesses comerciais.

437.

Tal não significa que todas as formas de proteção dos direitos de propriedade intelectual estejam sempre e necessariamente relacionadas com o comércio internacional. Por exemplo, o Tribunal de Justiça afirmou que o objeto específico dos direitos de proteção da propriedade literária e artística consiste em garantir a proteção quer dos direitos morais quer dos direitos económicos dos seus titulares ( 332 ). Os direitos morais complementam os direitos económicos na medida em que conferem ao autor «o direito de reivindicar a paternidade da obra e de se opor a qualquer deformação, mutilação ou outra modificação da obra, ou a qualquer outro atentado contra a mesma obra prejudicial à sua honra ou à sua reputação» ( 333 ). Visam proteger a relação de um autor com a sua obra. Essa relação é essencialmente independente dos direitos económicos que o autor possa ter sobre a sua obra. Tal significa igualmente que, quando um acordo, como o EUSFTA, abranja a criação e a proteção de direitos morais, a base jurídica para a celebração desse acordo não pode ser apenas o artigo 207.o, n.o 1, TFUE. As disposições sobre esses direitos não são acessórias das disposições relativas aos direitos económicos. Concluir de outra forma significaria eliminar os termos «aspetos comerciais» do artigo 207.o, n.o 1, TFUE, de modo a que tanto os aspetos comerciais como os aspetos não comerciais da propriedade intelectual fossem abrangidos pela política comercial comum.

438.

Um certo número de Estados‑Membros pede que o Tribunal de Justiça limite a conclusão a que chegou no seu acórdão Daiichi excluindo determinadas disposições do acordo TRIPS, como os artigos 42.° a 50.° e 61.° desse acordo, do âmbito da política comercial comum. Alegam que estas disposições dizem respeito à organização judicial, ao processo civil e às questões penais. Daqui decorre que, uma vez que essas disposições fazem, todavia, parte do EUSFTA, a União Europeia não dispõe de competência exclusiva no que se refere ao capítulo onze.

439.

Se esse argumento estivesse correto, implicaria que toda e qualquer disposição de um acordo internacional devia satisfazer o requisito de ter uma ligação específica com o comércio internacional para ser abrangida pela política comercial comum. Contudo, a decisão sobre se a União Europeia dispõe de competência exclusiva e, portanto, a identificação da base jurídica adequada para a ação em causa devem basear‑se em fatores objetivos, nos quais se incluem a finalidade e o conteúdo da ação ( 334 ). A base jurídica de uma decisão de celebrar um acordo internacional não é a soma das bases jurídicas de toda e qualquer disposição desse acordo. Assim, por exemplo, no processo C‑137/12 ( 335 ), o facto de o acordo internacional em causa incluir disposições relativas a medidas de apreensão e de perda não alterou a conclusão do Tribunal de Justiça de que esse acordo se inseria no âmbito da política comercial comum. Essas disposições visavam «[…] de uma maneira geral, garantir a eficácia da proteção jurídica dos serviços que se baseiem num acesso condicional no território de todas as partes [contratantes]» e, por conseguinte «[…] contribu[iam] para o objetivo principal da decisão recorrida, lida em conjugação com a Convenção […]» ( 336 ).

440.

Por último, não considero que a União Europeia goza de competência exclusiva em matéria de política comercial comum apenas quando disponha das competências correspondentes no mercado interno e tenha exercido essas competências internas (tendo como resultado a harmonização). Tal implicaria interpretar os artigos 3.°, n.o 1, alínea e), e 207.°, n.o 1, TFUE no sentido de que contêm uma condição do tipo daquela que o Tribunal de Justiça definiu no acórdão AETR. Contudo, a política comercial comum tem uma componente interna e uma componente externa. O exercício pela União Europeia da competência em matéria de política comercial comum não depende da questão de saber se a União dispõe de competência interna com base em qualquer outro fundamento e se exerceu essa competência. Nos termos do artigo 3.o, n.o 1, TFUE, a competência exclusiva da União Europeia no que se refere a essa política não depende das condições estabelecidas no artigo 3.o, n.o 2, TFUE ( 337 ).

Competência da União Europeia no que se refere ao capítulo onze do EUSFTA

441.

Na minha opinião, o capítulo onze aborda quer aspetos comerciais quer aspetos não comerciais da propriedade intelectual.

442.

A análise dos artigos 11.1, n.o 1, e 11.1, n.o 2, do EUSFTA demonstra que a proteção adequada e eficaz dos direitos de propriedade intelectual é considerada um instrumento concebido para aumentar os benefícios decorrentes do comércio e do investimento. Para este fim, o capítulo onze estabelece, no essencial, normas mínimas para a regulamentação interna da propriedade intelectual, bem como obrigações relativas à aplicação eficaz dessas normas.

443.

Assim, o capítulo onze define o âmbito da proteção relativamente a cada direito de propriedade intelectual abrangido, estabelece a duração da proteção e as formas de a obter, especifica as formas de cooperação e estabelece um leque de obrigações destinadas a assegurar a proteção jurídica adequada e a execução dos direitos abrangidos por esse capítulo através de medidas apropriadas. Deste modo, o capítulo onze baseia‑se, em parte, na técnica (igualmente utilizada no acordo TRIPS ( 338 )) de incorporar normas materiais relativas à propriedade intelectual que figuram em acordos internacionais celebrados fora do contexto do EUSFTA.

444.

Na minha opinião, o facto de o capítulo onze incorporar partes do Acordo TRIPS, bem como outros acordos internacionais celebrados fora do contexto da OMC após a entrada em vigor do Acordo TRIPS e decisões da OMC, em vez de reproduzir literalmente essa linguagem ( 339 ), não pode afetar a repartição de competências. De uma forma ou de outra, a fonte dos direitos e das obrigações das Partes no EUSFTA é o próprio EUSFTA. Com efeito, o recurso à incorporação no Acordo TRIPS não impediu o Tribunal de Justiça de concluir, no acórdão Daiichi, que a União Europeia dispunha de competência para celebrar esse acordo.

445.

Por conseguinte, ao contrário da Comissão, não estabeleço uma distinção entre as disposições do capítulo onze que incorporam outros acordos internacionais (ou partes desses acordos) e as que se referem a esses acordos sem tornar as suas disposições vinculativas no âmbito do EUSFTA. A competência de que a União Europeia dispõe nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE, é de definir e executar a política comercial comum. A União Europeia pode fazê‑lo através da negociação e da celebração de acordos internacionais. Os objetivos da política comercial comum e da ação externa em geral podem ser prosseguidos de várias formas, não resultando de todas elas, necessariamente, obrigações juridicamente vinculativas. Como o Tribunal de Justiça afirmou no processo C‑660/13, no quadro de um memorando de entendimento, «uma decisão relativa à assinatura de um acordo não vinculativo […] faz parte dos atos de definição das políticas da União […]» ( 340 ).

446.

Na minha opinião, as conclusões a que o Tribunal de Justiça chegou no acórdão Daiichi ( 341 ) são igualmente aplicáveis ao capítulo onze na medida em que este incorpora o conteúdo do Acordo TRIPS no que diz respeito aos direitos de propriedade intelectual abrangidos por esse capítulo (designadamente, direitos de autor e direitos conexos; patentes; marcas comerciais; desenhos e modelos; configurações (topografias) de circuitos integrados; indicações geográficas; e proteção de informações não divulgadas).

447.

Considero que, em princípio, não existe qualquer motivo para concluir de forma diferente no que diz respeito às outras disposições relativas ao nível mínimo de proteção da propriedade intelectual, desde que estejam relacionadas com a proteção e a prossecução efetiva de interesses económicos resultantes de um direito de propriedade intelectual. A política prosseguida utiliza normas mínimas de proteção dos interesses económicos contidos na propriedade intelectual para promover o investimento, reduzir os obstáculos às trocas comerciais, facilitar o comércio internacional e assegurar uma certa igualdade nas condições da concorrência. Tudo isso faz parte de uma política comercial.

448.

Apesar de os direitos relativos às variedades vegetais não serem abrangidos pelo Acordo TRIPS, considero que essa subsecção do capítulo onze (artigo 11.35 do EUSFTA, que reitera as obrigações das Partes nos termos da Convenção Internacional para a Proteção das Obtenções Vegetais ( 342 )) deve ser analisada da mesma forma. Com efeito, os direitos relativos às variedades vegetais são direitos económicos: direitos de um obtentor autorizar, no que diz respeito a uma variedade protegida, inter alia, a produção ou a reprodução, as condições para a multiplicação, a oferta para venda, a venda ou qualquer outra forma de comercialização, a exportação, a importação e o armazenamento ( 343 ).

449.

Compreendo as objeções à competência exclusiva da União Europeia no que diz respeito ao artigo 61.o do Acordo TRIPS. Contudo, o capítulo onze não incorpora, de facto, o artigo 61.o do Acordo TRIPS. O texto do capítulo onze não se refere expressamente a esta disposição. Também não contém uma secção sobre medidas penais. Considero que, na parte em que este capítulo incorpora o Acordo TRIPS a respeito a determinados direitos de propriedade intelectual, essa referência cruzada está relacionada com as «Normas relativas à existência, âmbito e exercício dos direitos de propriedade intelectual», constantes da parte II do Acordo TRIPS, e não com as disposições sobre a «Aplicação efetiva dos direitos de propriedade intelectual», constantes da parte III do Acordo TRIPS. Na verdade, o capítulo onze contém a sua própria secção autónoma sobre a execução (de natureza cível) dos direitos de propriedade intelectual.

450.

As disposições relativas à transparência, à proteção eficaz dos direitos garantidos e aos meios destinados a fazer cumprir as obrigações são parte integrante da política comercial comum da União Europeia. Por esta razão, considero que as partes do capítulo onze relativas aos meios de execução, de natureza cível, dos direitos de propriedade intelectual e às medidas na fronteira são igualmente abrangidas pela política comercial comum ( 344 ). O mesmo se aplica no que diz respeito a disposições como o artigo 11.52, que prevê formas de cooperação internacional ( 345 ).

451.

Contudo, o capítulo onze do EUSFTA abrange igualmente aspetos não comerciais da propriedade intelectual.

452.

Ao contrário do acordo TRIPS ( 346 ), o artigo 11.4 do EUSFTA (relativo à proteção concedida aos direitos de autor e direitos conexos) incorpora todos os direitos e obrigações estabelecidos na Convenção de Berna. Assim, inclui o artigo 6‑bis dessa convenção, que protege direitos morais. O próprio artigo 6‑bis estabelece uma distinção entre direitos morais e direitos económicos de um autor.

453.

O artigo 11.4 incorpora igualmente no EUSFTA todo o Tratado da OMPI sobre o Direito de Autor, e o Tratado da OMPI sobre Prestações e Fonogramas. O artigo 3.o do primeiro tratado exige que as partes contratantes apliquem o disposto nos artigos 2.° a 6.° da Convenção de Berna em relação à proteção prevista no Tratado da OMPI sobre o Direito de Autor. O artigo 5.o, n.o 1, do segundo tratado identifica determinados direitos morais que assistem a um intérprete ou executante.

454.

Já realcei o papel autónomo, e importante, dos direitos morais ( 347 ). Esse papel é claramente reconhecido no EUSFTA. Contudo, tais direitos são também claramente não comerciais. Por conseguinte, concluo que, na medida em que o capítulo onze se aplica a aspetos não comerciais da propriedade intelectual, a competência da União Europeia para celebrar essas partes do referido capítulo não se pode basear no artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

455.

A Comissão não procurou alegar que a União Europeia tem, todavia, competência externa exclusiva com base num dos fundamentos do artigo 3.o, n.o 2, TFUE.

456.

Uma vez que os direitos morais são independentes dos direitos económicos de propriedade intelectual (e se aplicam conjuntamente com eles) ( 348 ), considero que disposições como as que constam do capítulo onze do EUSFTA podem ser consideradas necessárias para alcançar os objetivos do mercado interno na medida em que se aplicam a aspetos não comerciais dos direitos de propriedade intelectual. O facto de poder não existir (ainda) harmonização dos direitos morais não compromete esta conclusão ( 349 ). Por conseguinte, esses aspetos do capítulo onze do EUSFTA inserem‑se na competência partilhada entre a União Europeia e os Estados‑Membros com base nos artigos 4.°, n.o 2, alínea a), 26.°, n.o 1, e no segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE.

Concorrência e questões conexas (capítulo doze do EUSFTA ( 350 ) )

Argumentos

457.

A Comissão alega que, no essencial, o capítulo doze promove e facilita o comércio de mercadorias e serviços entre a União Europeia e Singapura. Este capítulo tem como objeto proibir práticas anticoncorrenciais de dimensões transnacionais suscetíveis de impedir o acesso efetivo ao mercado ou de reduzir os benefícios económicos da liberalização do comércio que o EUSFTA pretende alcançar. Além disso, o capítulo doze não tem como consequência uma harmonização e refere‑se expressamente à relação entre comportamento anticoncorrencial e comércio internacional. Por conseguinte, tem efeitos diretos e imediatos no comércio e insere‑se totalmente no âmbito da competência exclusiva da União Europeia, nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE. A Comissão refere igualmente vários acordos da OMC que integram elementos da política de concorrência.

458.

As outras partes no presente processo não apresentaram argumentos específicos em relação ao capítulo doze.

Análise

459.

Concordo com a Comissão quando afirma que a ligação entre comércio internacional e política de concorrência já transparece de determinadas disposições dos acordos da OMC ( 351 ). Dito isto, não foi ainda adotada qualquer política abrangente da OMC em matéria de concorrência e comércio ( 352 ).

460.

Em contrapartida, o capítulo doze do EUSFTA procura tratar de forma exaustiva os efeitos nocivos que os comportamentos ou práticas anticoncorrenciais, públicos ou particulares, podem ter no comércio entre a União Europeia e Singapura. Assim, exige que cada Parte mantenha e aplique no respetivo território legislação abrangente aplicável a acordos entre empresas, exploração abusiva de uma posição dominante e operações de concentração de empresas que resultem numa redução assinalável da concorrência ou que sejam suscetíveis de entravar de modo significativo a concorrência, que afetem o comércio entre a União Europeia e Singapura ( 353 ). Considera‑se que esses tipos de comportamento anticoncorrencial são suscetíveis de comprometer os benefícios da liberalização do comércio que o EUSFTA pretende alcançar, quer privando de efeito útil as regras em matéria de acesso ao mercado quer reduzindo os benefícios económicos que as empresas de uma parte possam esperar obter através da comercialização das suas mercadorias e serviços no território da outra parte ( 354 ).

461.

O capítulo doze está também diretamente relacionado com a regulação do comércio, na medida em que visa limitar as distorções de concorrência decorrentes da possibilidade de as Partes criarem ou manterem empresas públicas, ou outorgarem direitos especiais ou exclusivos a empresas ( 355 ), e dispõe sobre subvenções proibidas e outras subvenções ( 356 ).

462.

O artigo 12.7, n.o 2, do EUSFTA ilustra essa relação entre o capítulo doze e o comércio internacional. Esta disposição, que incorpora igualmente o artigo 3.o do Acordo SMC (sobre subvenções proibidas) ( 357 ), proíbe a concessão de determinadas categorias de subvenções «exceto se a parte que concede a subvenção demonstrar, a pedido da outra parte, que a subvenção em causa não afeta nem é suscetível de vir a afetar o comércio da outra parte» ( 358 ). De igual modo, o artigo 12.8, n.o 1, do EUSFTA exige que as Partes «envid[em] todos os esforços» para suprimir as distorções da concorrência causadas pelas subvenções relacionadas com o comércio de mercadorias e serviços «na medida em que estas afetem ou sejam suscetíveis de afetar o comércio de cada parte» e para evitar tais distorções.

463.

O facto de o capítulo doze ter como consequência um certo grau de harmonização das regras da concorrência não significa que o seu objetivo seja aproximar as legislações dos Estados‑Membros neste domínio a fim de melhorar o funcionamento do mercado interno. Em vez disso, o capítulo doze estende algumas das regras e princípios fundamentais do direito da concorrência da União a Singapura a fim de regular o comércio de mercadorias e serviços com este país terceiro ( 359 ). Essas regras incluem os artigos 101.° e 102.° TFUE, que regulam os acordos ou as práticas concertadas entre empresas e a exploração de forma abusiva, por empresas, da sua posição dominante num mercado, conjuntamente com o Regulamento n.o 139/2004 do Conselho, relativo ao controlo das concentrações de empresas ( 360 ). De igual modo, as disposições do EUSFTA refletem o artigo 106.o TFUE (que diz respeito às empresas públicas, às empresas às quais os Estados‑Membros concedam direitos especiais ou exclusivos e às empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral) e os artigos 107.° a 109.° TFUE (que visam evitar distorções de concorrência resultantes de auxílios concedidos pelos Estados).

464.

É verdade que o capítulo doze contém igualmente disposições em matéria de cooperação e coordenação na aplicação da lei, na proteção das informações comerciais confidenciais e de outras informações confidenciais, na consulta entre as Partes sobre concorrência e na exclusão da aplicação dos capítulos quinze («Resolução de Litígios») e dezasseis («Mecanismo de mediação») para resolver questões decorrentes do capítulo doze (exceto no que diz respeito ao artigo 12.7, sobre subvenções proibidas). Essas disposições são todas acessórias das obrigações materiais principais estabelecidas no capítulo doze. Por conseguinte, não comprometem a minha conclusão de que o capítulo doze tem como objetivo promover, facilitar ou regular as trocas comerciais e, assim, tem efeitos diretos e imediatos no comércio de mercadorias e serviços.

465.

No que diz respeito à disposição sobre transparência em matéria de subvenções relacionadas com o comércio de mercadorias e a prestação de serviços (artigo 12.9 do EUSFTA), remeto para a minha análise do capítulo catorze e de outras disposições relativas à transparência constantes de outros capítulos ( 361 ).

466.

Este é o motivo pelo qual concluo que o capítulo doze é integralmente abrangido pelo âmbito da competência exclusiva da União Europeia nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

Obstáculos não pautais ao comércio e [aos] investimentos na produção de energia renovável (capítulo sete do EUSFTA ( 362 )) e ao comércio e desenvolvimento sustentável (capítulo treze do EUSFTA ( 363 ) )

Argumentos

Obstáculos não pautais ao comércio e [aos] investimentos na produção de energia renovável

467.

A Comissão alega que a União Europeia dispõe de competência exclusiva no que se refere ao capítulo sete com base no artigo 207.o, n.o 1, TFUE. Por um lado, este capítulo exige a eliminação ou redução dos obstáculos ao comércio (obstáculos pautais e não pautais) e aos investimentos e impõe a convergência regulamentar com vista a facilitar o comércio. Por outro lado, tem igualmente ligações com o investimento estrangeiro direto: proíbe as Partes de exigirem a formação de parcerias com empresas locais.

468.

O Parlamento e o Conselho não apresentaram argumentos específicos em relação ao capítulo sete.

469.

Certos Estados‑Membros afirmam que o objetivo do capítulo sete é reduzir as emissões de gases com efeito de estufa promovendo a produção de energia renovável, e que, por conseguinte, este capítulo está ligado à política ambiental (artigo 191.o TFUE) e não à política comercial comum.

Comércio e desenvolvimento sustentável

470.

A Comissão alega que, nos termos dos artigos 3.°, n.o 1, alínea e), e 207.°, n.o 1, TFUE, o capítulo treze é integralmente abrangido pela competência exclusiva da União Europeia. A competência em matéria de política comercial comum não se limita à adoção de instrumentos que apenas produzem efeitos nos aspetos tradicionais do comércio externo. As discrepâncias nos níveis de proteção ambiental e laboral entre os Estados podem ter efeitos diretos e imediatos no comércio internacional e no investimento. A redução das normas de proteção numa das Partes pode reforçar o comércio e o investimento no seu território. Em contrapartida, as normas em matéria de ambiente e trabalho podem tornar‑se obstáculos dissimulados ao comércio. Como decorre, inter alia, do artigo 13.1, n.o 1, do EUSFTA, este visa desenvolver e promover o comércio internacional de modo a contribuir para o objetivo de desenvolvimento sustentável, que inclui o desenvolvimento económico, o desenvolvimento social e a proteção do ambiente.

471.

A Comissão alega que o capítulo treze não visa criar novas obrigações materiais relativamente à proteção laboral e do ambiente, mas apenas reitera determinados compromissos internacionais existentes. A sua finalidade é assegurar que as condições para o comércio e o investimento não são negativamente afetadas em consequência de níveis de proteção diferentes.

472.

A Comissão não vê nenhum conflito entre, por um lado, o capítulo treze e, por outro, o artigo 3.o, n.o 5, TUE e o artigo 21.o, n.o 2, TFUE. O artigo 3.o, n.o 5, TUE exige que a União Europeia integre as preocupações com o «desenvolvimento sustentável do planeta» e com o «comércio livre e equitativo» na sua política comercial comum. O artigo 21.o, n.o 2, TFUE inclui igualmente vários objetivos relacionados com o desenvolvimento sustentável.

473.

No que diz respeito às disposições específicas do capítulo treze, a Comissão alega, em especial, que o facto de o artigo 13.3, n.o 3, do EUSFTA incluir o compromisso de aplicar efetivamente determinados princípios relativos aos direitos fundamentais no trabalho não justifica a conclusão de que os Estados‑Membros devem participar na celebração do EUSFTA. Esta disposição não regula a forma específica como Singapura e os Estados‑Membros devem assegurar a aplicação efetiva das convenções da Organização Internacional do Trabalho (OIT) que ratificaram. Além disso, os artigos 13.6, n.o 2, e 13.8, alínea a), do EUSFTA apenas reiteram compromissos já assumidos. Outras disposições [como o artigo 13.8, alíneas b) a d)] visam evitar efeitos de distorção no comércio internacional, estando, por conseguinte, indissociavelmente ligadas ao comércio internacional.

474.

O Parlamento concorda, no essencial, com a Comissão.

475.

O Conselho e vários Estados‑Membros consideram que, embora o capítulo treze tenha uma ligação com o comércio, regula igualmente aspetos laborais, de proteção do ambiente e das pescas não relacionados com o comércio e tem como objetivo promover a proteção laboral e ambiental, bem como a conservação dos recursos biológicos do mar no âmbito da política comum das pescas. Por conseguinte, estas disposições do capítulo treze não se podem basear no artigo 207.o TFUE. O Conselho afirma igualmente que o artigo 13.3, n.os 3 e 4, do EUSFTA implica um mínimo de harmonização da legislação dos Estados‑Membros em domínios nos quais os Tratados a excluem. Se se considerar que estas disposições se inserem na política comercial comum, serão incompatíveis com o artigo 207.o, n.o 6, TFUE.

476.

Além disso, o Conselho e vários Estados‑Membros afirmam que o capítulo treze é claramente independente do resto do acordo. Isso é demonstrado, em especial, pelo sistema de resolução de litígios específico aplicável a este capítulo ( 364 ).

477.

Por último, o Conselho alega que a competência exclusiva da União Europeia para assumir os compromissos relativos ao comércio de produtos de pesca previsto no artigo 13.8 do EUSFTA resulta do artigo 3.o, n.o 1, alínea d), TFUE (conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da política comum das pescas), e não do artigo 3.o, n.o 1, alínea e), TFUE (política comercial comum). O objetivo principal do artigo 13.8 é assegurar a conservação e a gestão dos recursos haliêuticos de forma sustentável, e não facilitar, regular ou reger o comércio.

Análise

Objetivos relacionados e não relacionados com o comércio: princípios gerais

478.

A política comercial comum deve ser conduzida de acordo com os princípios e objetivos da ação externa da União Europeia ( 365 ), que incluem o desenvolvimento de «medidas internacionais para preservar e melhorar a qualidade do ambiente e a gestão sustentável dos recursos naturais à escala mundial, a fim de assegurar um desenvolvimento sustentável» ( 366 ). Esta é a razão pela qual concordo com a Comissão que os níveis de proteção do ambiente revelam ligações com o comércio internacional. As disparidades significativas podem falsear a concorrência e o comércio; normas pouco exigentes num mercado podem gerar vantagens concorrenciais para as empresas instaladas no território nacional e, consequentemente, atrair o investimento estrangeiro, em prejuízo dos mercados nos quais os padrões de proteção sejam mais elevados. Em contrapartida, as normas em matéria de proteção do ambiente podem ser utilizadas para fins de protecionismo ( 367 ). Por estes motivos, a promoção do desenvolvimento sustentável está entre os objetivos estabelecidos no preâmbulo do Acordo OMC ( 368 ). O mesmo raciocínio pode ser aplicado à relação entre proteção laboral e o comércio internacional.

479.

Contudo, o facto de a política comercial comum poder igualmente prosseguir objetivos não comerciais não significa que os capítulos sete e treze sejam automaticamente abrangidos pelo âmbito de aplicação do artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

480.

O Tribunal de Justiça já forneceu algumas orientações sobre como distinguir entre as medidas que se inserem no âmbito da política comercial comum (porque se destinam essencialmente a promover, a facilitar ou a regular as trocas comerciais e têm efeitos diretos e imediatos nestas) ( 369 ), e as medidas ligadas às políticas ambiental e social da União Europeia.

481.

Assim, o Tribunal de Justiça já admitiu que os atos da UE que prossigam igualmente objetivos não meramente económicos (por exemplo, objetivos sociais, ambientais ou humanitários) podem ser abrangidos pela política comercial comum ( 370 ). Contudo, em todos os casos, os acordos internacionais em causa envolviam instrumentos de política comercial: acordos comerciais para a acumulação de existências, no parecer 1/78; concessão de preferências pautais, no processo 45/86; importação (sob condições) de produtos agrícolas, no processo C‑62/88; e requisitos de rotulagem (ou seja, obstáculos técnicos ao comércio), no processo C‑281/01. Todos estes instrumentos têm efeitos diretos e imediatos no comércio dos produtos ou serviços em causa.

482.

Em contrapartida, os acordos internacionais não especificamente relacionados com o comércio não são abrangidos pela política comercial comum, mesmo que tenham uma ligação indireta com o comércio. Assim, no parecer 2/00, o Tribunal de Justiça teve em conta o facto de as regras relativas aos movimentos transfronteiras de organismos vivos modificados, constantes do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança, anexo à Convenção sobre a Diversidade Biológica, não se aplicarem apenas aos movimentos para fins comerciais. Por conseguinte, concluiu que a finalidade ou a componente principal desse protocolo era a proteção do ambiente e não a política comercial comum ( 371 ). De igual modo, no processo C‑411/06 ( 372 ), o Tribunal de Justiça confirmou que a finalidade do Regulamento (CE) n.o 1013/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2006, relativo a transferências de resíduos ( 373 ), não era definir as características que os resíduos deviam ter para poderem circular livremente no mercado interno ou no âmbito das trocas comerciais com países terceiros, mas sim, de forma mais geral, instituir um sistema harmonizado de procedimentos através dos quais a circulação dos resíduos pudesse ser circunscrita a fim de se proteger o ambiente ( 374 ). Por conseguinte, esse regulamento baseava‑se validamente nas disposições do Tratado relativas à proteção do ambiente.

483.

Neste contexto, analisarei se os capítulos sete e treze se inserem integralmente na política comercial comum.

Obstáculos não pautais ao comércio e aos investimentos na produção de energia renovável

484.

O capítulo sete do EUSFTA tem como objetivo proteger o ambiente (e acessoriamente a saúde humana) «promove[ndo], desenvolve[ndo] e aumenta[ndo] a produção de energia a partir de fontes renováveis e fontes não fósseis» e reduzindo assim as emissões de gases com efeito estufa ( 375 ). Contudo, o seu âmbito de aplicação limita‑se às medidas que «podem afetar o comércio e o investimento entre as partes», relacionadas com a produção de energia verde ( 376 ). A questão de saber se a União Europeia dispõe de competência exclusiva no que se refere a este capítulo com base no artigo 207.o, n.o 1, TFUE depende da questão de saber se o mesmo se destina essencialmente a promover, a facilitar ou a regular as trocas comerciais e, assim, tem efeitos diretos e imediatos no comércio ( 377 ).

485.

Na minha opinião, a resposta é afirmativa.

486.

As disposições constantes do capítulo sete dizem respeito, antes de mais, à regulação dos instrumentos de política comercial e à eliminação de obstáculos ao comércio e ao investimento. Assim, o artigo 7.4 trata da eliminação dos obstáculos ao comércio e ao investimento que possam comprometer a produção de energia verde, por exemplo, proibindo «requisitos de conteúdo local» e a formação obrigatória de parcerias com empresas locais ( 378 ). De igual modo, o artigo 7.5 do EUSFTA visa eliminar obstáculos técnicos ao comércio de produtos para a produção de energia verde. É um ponto assente que os compromissos internacionais destinados a evitar que as normas e os regulamentos técnicos, bem como os procedimentos de avaliação da conformidade, criem obstáculos desnecessários ao comércio internacional são abrangidos pela política comercial comum ( 379 ). Os artigos 7.6 e 7.7 do EUSFTA (relativos, respetivamente, às exceções bem como à aplicação e à cooperação) são acessórios dos outros compromissos que decorrem do capítulo sete e, por conseguinte, não são decisivos para determinar se este capítulo é abrangido pela política comercial comum.

487.

Daqui decorre que o capítulo sete tem como objetivo regular e facilitar as trocas comerciais relacionadas com a produção de energia verde, pelo que tem efeitos diretos e imediatos no comércio. Por conseguinte, este capítulo é integralmente abrangido pela competência exclusiva da União Europeia nos termos do artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

488.

Esta conclusão não é posta em causa pela alegação apresentada por um Estado‑Membro de que o capítulo sete pode afetar o direito de os Estados‑Membros, nos termos do segundo parágrafo do artigo 194.o, n.o 2, TFUE, determinarem as condições de exploração dos seus recursos energéticos, a sua escolha entre diferentes fontes energéticas e a estrutura geral do seu aprovisionamento energético. Como resulta do seu enunciado, o artigo 194.o, n.o 2, TFUE destina‑se unicamente a esclarecer o âmbito da competência da União Europeia para adotar atos legislativos que visam executar uma política energética. Por conseguinte, não pode limitar o alcance autónomo da política comercial tal como definida no artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

Comércio e Desenvolvimento sustentável

489.

Algumas disposições do capítulo treze têm claramente uma ligação direta e imediata com a regulação do comércio. Assim, o artigo 13.6, n.o 4, do EUSFTA aborda especificamente a questão dos obstáculos dissimulados ao comércio que podem resultar de medidas de execução dos acordos multilaterais em matéria de ambiente. De igual modo, o artigo 13.12 do EUSFTA tem como objetivo, no essencial, evitar que uma das Partes afete o comércio ou o investimento renunciando ou criando derrogações à sua legislação em matéria de ambiente e de trabalho, ou renunciando à aplicação efetiva dessa legislação nestas matérias. Outros exemplos são o artigo 13.11, n.o 1, do EUSFTA, que visa concretamente facilitar e promover o comércio e o investimento em mercadorias e serviços respeitadores do ambiente, e o artigo 13.11, n.o 2, através do qual as Partes acordam em envidar esforços para facilitar a supressão dos obstáculos ao comércio ou ao investimento relativos a mercadorias e serviços respeitadores do ambiente.

490.

Contudo, apesar da intenção declarada das Partes de não harmonizarem as normas relativas ao trabalho e ao ambiente (artigo 13.1, n.o 4, do EUSFTA), um número significativo de disposições do capítulo treze não impõe uma forma de condicionamento do comércio (permitindo que a outra Parte adote sanções comerciais em caso de incumprimento ou fazendo depender um benefício comercial específico da observância de normas em matéria de trabalho e de ambiente) nem regula de outro modo a utilização de instrumentos de política comercial como meio de promover o desenvolvimento sustentável.

491.

Assim, os artigos 13.3, n.o 1, 13.3, n.o 3, 13.4, 13.6, n.o 2, e 13.6, n.o 3, do EUSFTA visam essencialmente estabelecer na União Europeia e em Singapura normas mínimas (respetivamente) de proteção laboral e de proteção do ambiente, independentemente dos seus eventuais efeitos no comércio. Por conseguinte, estas disposições ficam claramente fora do âmbito da política comercial comum. Ao contrário do que acontece com as cláusulas relativas a «elementos essenciais» em certos acordos internacionais de comércio da UE ( 380 ), que impõem uma obrigação de respeitar os princípios democráticos e os direitos humanos, a violação das normas em matéria de trabalho e de ambiente a que estas disposições do EUSFTA se referem não confere à outra Parte o direito de suspender os benefícios comerciais que resultam do EUSFTA. Os artigos 13.16 e 13.17 do EUSFTA não autorizam uma Parte a suspender as concessões comerciais à outra Parte se esta não respeitar os compromissos assumidos no âmbito do capítulo treze ( 381 ). Além disso, diversamente do regime especial de incentivo ao desenvolvimento sustentável e à boa governação, no âmbito do designado sistema GSP+ ( 382 ), as referidas disposições também não visam autorizar concessões comerciais a Singapura na condição de esta respeitar essas normas.

492.

O artigo 13.8 do EUSFTA diz respeito ao «Comércio de produtos da pesca». Reconheço que a obrigação prevista no artigo 13.8, alínea b), de introduzir medidas eficazes de luta contra a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada pode ter como consequência, inter alia, a adoção de instrumentos de política comercial, ou incluir medidas destinadas a eliminar a utilização de tais instrumentos (como subvenções que contribuem para o excesso de pesca e de capacidade, que estão ligadas à pesca ilegal, não declarada e não regulamentada). Esta disposição também refere exemplos de tais medidas.

493.

Em contrapartida, as restantes alíneas do artigo 13.8 do EUSFTA visam essencialmente contribuir para a conservação e a gestão sustentáveis dos recursos haliêuticos pelas Partes. Por exemplo, o artigo 13.8, alínea a), do EUSFTA exige que as Partes respeitem, em geral, as medidas de conservação a longo prazo e a exploração sustentável dos recursos haliêuticos, conforme definido nos instrumentos internacionais por elas ratificados, e defendam os princípios da ONU para a Alimentação e a Agricultura e os instrumentos pertinentes da ONU relativos a estas questões. A observância destas normas não é um requisito prévio para a obtenção de benefícios comerciais. O desrespeito desses compromissos também não pode ter como consequência a suspensão de concessões comerciais ao abrigo do EUSFTA ( 383 ). De igual modo, o artigo 13.8, alíneas c) e d), do EUSFTA não tem ligações diretas e imediatas ao comércio internacional. Por conseguinte, não se insere na política comercial comum.

494.

Quais são as implicações para a questão da competência?

495.

Na minha opinião, os artigos 3.°, n.o 5, e 21.° TUE e os artigos 9.° e 11.° TFUE, a que a Comissão se refere, não são relevantes para resolver a questão da competência. O objetivo destas disposições é impor à União Europeia que contribua para determinados objetivos nas suas políticas e ações. Estas disposições não podem afetar o âmbito da política comercial comum previsto no artigo 207.o TFUE. Pela mesma razão, é irrelevante que, como alega a Comissão, os direitos fundamentais a que o artigo 13.3, n.o 3, do EUSFTA se refere sejam compatíveis com as normas universais em matéria de trabalho previstas na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia. Essa alegação assenta na compatibilidade material do EUSFTA com os direitos fundamentais. Não pode modificar o âmbito da competência da União Europeia ( 384 ).

496.

Também não aceito a alegação da Comissão de que, no essencial, os artigos 13.3, n.o 3 e 13.6, n.o 2, do EUSFTA não são «suficientemente vinculativos» para ser tidos em conta na análise da repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros no que diz respeito ao capítulo treze. Neste ponto, a Comissão baseia‑se no processo C‑377/12 ( 385 ), no qual o Tribunal de Justiça considerou que as disposições sobre readmissão, transportes e ambiente constantes do Acordo‑Quadro de Parceria e Cooperação entre a União Europeia e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a República das Filipinas, por outro ( 386 ), não continham «obrigações de âmbito tal que se [pudesse] considerar que constitui[iam] objetivos distintos dos da cooperação para o desenvolvimento, que não [eram] nem secundários nem indiretos relativamente a estes últimos» ( 387 ). Uma vez que a migração, os transportes e o ambiente são parte integrante da política de desenvolvimento da União Europeia, exigir que um acordo de cooperação para o desenvolvimento que inclui essas matérias se baseie noutras disposições dos Tratados para além da disposição relativa à política de desenvolvimento seria, na prática, suscetível de esvaziar de conteúdo a competência e o procedimento previstos nessa disposição ( 388 ). Em contrapartida, nem os direitos fundamentais no trabalho nem as normas de proteção do ambiente são parte integrante da política comercial comum. Por conseguinte, o processo C‑377/12 não tem utilidade para a análise do capítulo treze do EUSFTA.

497.

Na minha opinião, o capítulo treze tem quatro componentes. A primeira componente integra as disposições abrangidas pela política comercial comum. A segunda e terceira componentes integram as disposições relativas, respetivamente, às normas de proteção em matéria de trabalho e às normas de proteção em matéria de ambiente. A quarta componente diz respeito à conservação e à gestão sustentáveis dos recursos haliêuticos.

498.

Não se pode considerar que nenhuma destas componentes é um simples complemento necessário para assegurar a eficácia das outras componentes do EUSFTA ou do capítulo treze, ou que tem um alcance extremamente limitado. Em especial, não posso aceitar o argumento da Comissão de que o artigo 13.6, n.o 2, do EUSFTA (que exige a aplicação efetiva dos acordos multilaterais em matéria de ambiente nos quais a União Europeia e Singapura são partes) não implica nenhuma nova obrigação internacional para as Partes. É verdade que esta disposição apenas remete para compromissos multilaterais relativos à proteção do ambiente já assumidos pelas Partes. Contudo, o seu efeito é incorporar esses compromissos no EUSFTA e, por conseguinte, torná‑los aplicáveis às relações entre a União Europeia e Singapura com base no EUSFTA. Assim, o artigo 13.6, n.o 2, tem claramente como consequência uma nova obrigação para as Partes, aplicável em conformidade com o disposto no EUSFTA.

499.

Daqui decorre que a decisão da União Europeia de assumir compromissos no âmbito de cada uma das quatro componentes deve fundar‑se numa base jurídica distinta.

500.

No que diz respeito à primeira componente, a competência exclusiva da União Europeia resulta dos artigos 3.°, n.o 1, alínea e), e 207.°, n.o 1, TFUE. Nos termos dos artigos 3.°, n.o 1, alínea d), TFUE e 43.°, n.o 2, TFUE ( 389 ), a quarta componente é abrangida pela competência exclusiva da União Europeia em matéria de conservação dos recursos biológicos do mar, no âmbito da política comum das pescas.

501.

Em contrapartida, a segunda e terceira componentes são, em princípio, abrangidas pela competência partilhada da União Europeia.

502.

As disposições relativas às normas de proteção em matéria de trabalho (segunda componente) podem ser consideradas necessárias para alcançar os objetivos da política social estabelecidos no artigo 151.o TFUE no que diz respeito, em especial, aos domínios elencados no artigo 153.o, n.o 1, alíneas a), b) e c), TFUE (melhoria do ambiente de trabalho a fim de proteger a saúde e a segurança dos trabalhadores; condições de trabalho; e segurança social e proteção social dos trabalhadores). Por conseguinte, a União Europeia dispõe de competência partilhada no que se refere a essa componente, em aplicação dos artigos 4.°, n.o 2, alínea b), 151.° e 153.°, n.o 1, TFUE, e do segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE.

503.

No que diz respeito às disposições relativas às normas de proteção em matéria de ambiente (terceira componente), basta observar que a União Europeia é competente, nos termos do artigo 191.o, n.o 1, TFUE, para prosseguir uma política ambiental que vise a preservação, a proteção e a melhoria da qualidade do ambiente. A competência externa da União Europeia para prosseguir políticas ambientais, que resulta quer do artigo 191.o, n.o 4, TFUE ( 390 ) quer do primeiro pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE é partilhada com os Estados‑Membros nos termos do artigo 4.o, n.o 2, alínea e), TFUE.

504.

A Comissão não alegou que a União Europeia dispõe de competência externa exclusiva no que se refere à segunda e à terceira componentes com base no artigo 3.o, n.o 2, TFUE. Por conseguinte, não cabe ao Tribunal de Justiça verificar se o terceiro pressuposto visado nesta disposição se poderia aplicar às referidas componentes ( 391 ).

Transparência e reexame administrativo e judicial das medidas de aplicação geral (capítulo catorze do EUSFTA ( 392 )e disposições conexas de outros capítulos ( 393 ) )

Argumentos

505.

A Comissão afirma que o capítulo catorze é abrangido pela competência exclusiva da União Europeia em matéria de política comercial comum porque: i) o objetivo deste capítulo é facilitar o comércio e o investimento; ii) as suas disposições se aplicam apenas a medidas relativas a matérias abrangidas por outros capítulos do EUSFTA; e iii) as suas disposições se destinam a clarificar e melhorar disposições já existentes nos acordos da OMC, em especial o artigo X do GATT de 1994. Além disso, estas disposições refletem igualmente considerações básicas em matéria de tratamento equitativo que fazem parte dos princípios gerais do direito da União.

506.

O Parlamento e o Conselho não apresentaram argumentos específicos em relação ao capítulo catorze.

507.

Apenas alguns Estados‑Membros se pronunciaram sobre o capítulo catorze. Os argumentos apresentados consistem, por um lado, em que este capítulo diz respeito ao exercício da administração nacional, ao recurso a procedimentos administrativos e à proteção judicial relativamente às medidas administrativas e, por outro, em que o argumento da Comissão pressupõe que a União Europeia dispõe de competência exclusiva no que diz respeito a todas as outras partes do EUSFTA. Contudo, na medida em que se destina a dar aplicação efetiva a outras partes do EUSFTA relativamente às quais a União Europeia não dispõe de competência exclusiva, o capítulo catorze não pode ser abrangido pela competência exclusiva da União Europeia. As próprias disposições do capítulo catorze também não estão especificamente relacionadas com o comércio internacional. Por último, as matérias relativas à justiça constantes dos artigos 14.5 e 14.6 do EUSFTA não são abrangidas nem pela competência exclusiva nem pela competência partilhada da União Europeia: não são abrangidas pelo âmbito de aplicação do artigo 81.o, n.o 2, TFUE (relativo à cooperação judiciária em matéria civil).

Análise

508.

O capítulo catorze estabelece obrigações de transparência, de consulta e de melhoria da administração aplicáveis às leis, aos regulamentos, às decisões judiciais, bem como aos procedimentos e decisões administrativas suscetíveis de ter impacto sobre qualquer matéria abrangida pelo EUSFTA (designadas «medidas de aplicação geral») ( 394 ). As Partes incluíram este capítulo especialmente devido ao impacto que os seus quadros normativos podem ter no comércio e no investimento entre elas ( 395 ). As obrigações previstas no capítulo catorze aplicam‑se conjuntamente com obrigações similares, com objetivos idênticos, constantes de outros capítulos do EUSFTA ( 396 ).

509.

Assim, o capítulo catorze aplica‑se transversalmente a todos os capítulos do EUSFTA e apenas no que diz respeito às matérias abrangidas por esses capítulos. Por conseguinte, considero que o objetivo essencial do capítulo catorze não é regular os processos administrativos e a proteção judicial enquanto tais. As obrigações previstas neste capítulo apenas são acionadas quando as medidas de aplicação geral têm impacto sobre as matérias abrangidas pelo EUSFTA. O seu objetivo e a sua função são tornar a regulação das matérias abrangidas pelo EUSFTA efetiva, funcional e aplicável ( 397 ). As disposições do capítulo catorze (e as disposições mais específicas relativas às mesmas matérias que constam de outros capítulos) não são aplicáveis de forma independente. São, pela sua própria natureza, acessórias; contudo, também são essenciais para o bom funcionamento do EUSFTA.

510.

Além disso, a transparência, a consulta e a administração de medidas de aplicação geral em matérias abrangidas pela política comercial comum são essenciais para reduzir ou evitar obstáculos ao comércio. Com efeito, a falta de transparência, de justiça e de segurança jurídica pode, por si só, constituir um obstáculo ao comércio ( 398 ). Se não for assegurado aos comerciantes e aos investidores um tratamento equitativo e se não existirem garantias para assegurar que esses comerciantes e esses investidores, bem como os Governos, tenham conhecimentos das medidas de aplicação geral em matéria de comércio e de investimento, e se adaptem a elas, os benefícios da liberalização do comércio resultantes das regras materiais do EUSFTA podem perder‑se. Além disso, as condições de concorrência podem ser afetadas se essas medidas não forem, de facto, aplicadas ou, na falta de salvaguardas suficientes, se determinadas transações não puderem ser concretizadas na prática. Os comerciantes podem renunciar à atividade comercial ou ao investimento, ou as suas transações podem atrasar‑se ou tornar‑se mais dispendiosas.

511.

Neste contexto, considero que a política comercial comum abrange as regras e decisões relativas à publicação, à administração, bem como ao reexame administrativo e judicial das medidas de aplicação geral com impacto sobre as matérias abrangidas pelo EUSFTA especificamente ligadas ao comércio internacional ou ao investimento. Embora não se apliquem ao conteúdo material dessas medidas, as obrigações neste domínio são, tal como as obrigações materiais, essenciais para alcançar o objetivo de promover e facilitar o comércio e o investimento, e têm efeitos diretos e imediatos no comércio.

512.

Na minha opinião, estas obrigações têm uma função idêntica no contexto de políticas externas diferentes da política comercial comum que são relevantes para as matérias abrangidas pelo EUSFTA. Na celebração de acordos com Estados terceiros respeitantes a outras matérias abrangidas pela competência partilhada ou exclusiva da União Europeia (como os transportes, a proteção do ambiente ou a promoção do investimento de carteira), a competência da União Europeia deve incluir o poder de decidir sobre disposições destinadas a assegurar a eficácia dos compromissos para ela assumidos. Assim, por exemplo, os compromissos materiais relativos à proteção do ambiente podem ficar comprometidos se um país terceiro não facultar aos cidadãos da UE o acesso a um reexame judicial das medidas de aplicação geral de caráter ambiental, quando esse reexame judicial está disponível para os seus próprios nacionais em circunstâncias idênticas.

513.

Por conseguinte, considero que a repartição de competências no que se refere às disposições relativas à transparência e ao reexame administrativo e judicial das medidas de aplicação geral (no capítulo catorze ou noutros capítulos) deve observar a repartição das competências materiais.

Resolução de litígios e mediação (capítulo nove, secção B ( 399 ), e capítulos treze, quinze e dezasseis do EUSFTA ( 400 ) )

Argumentos

514.

A Comissão alega que a União Europeia dispõe de competência exclusiva relativamente a todas as disposições sobre RLIE da secção B do capítulo nove. Essa competência decorre necessariamente da competência relativa às disposições materiais do acordo que são aplicadas e interpretadas quando o mecanismo de resolução de litígios seja acionado. Isso significa igualmente que, em princípio, a União Europeia é exclusivamente responsável, à luz do direito internacional, por qualquer violação dessas disposições. A União Europeia pode decidir, à luz do direito da União, repartir a responsabilidade financeira relacionada com o mecanismo de RLIE entre a União Europeia e os Estados‑Membros, e conferir poderes a estes últimos para atuarem na qualidade de parte demandada (e, assim, sendo caso disso, assumirem a responsabilidade financeira) quando sejam responsáveis pelo tratamento em causa, salvo se esse tratamento for exigido pelo direito da União. Este é, precisamente, o objetivo do Regulamento n.o 912/2014 ( 401 ), que é aplicável a todos os acordos nos quais a União Europeia seja parte e que prevejam um mecanismo de RLIE. As regras sobre a repartição da responsabilidade constantes deste regulamento são aplicáveis quando a União Europeia determine, nos termos do artigo 9.15, n.o 2, do EUSFTA, qual a parte demandada em litígios entre os investidores e um Estado.

515.

A Comissão não apresentou argumentos específicos em relação aos artigos 13.16 (Consultas a nível do Governo) e 13.17 (Painel de peritos) do EUSFTA.

516.

No que diz respeito aos capítulos quinze (Resolução de Litígios) e dezasseis (Mecanismo de mediação), a Comissão afirma que esses capítulos são necessários para assegurar a aplicação eficaz dos direitos e obrigações decorrentes do EUSFTA e seguem a prática internacional estabelecida. Uma vez que a União Europeia dispõe de competência exclusiva relativamente às partes do EUSFTA a que os capítulos quinze e dezasseis se aplicam, dispõe igualmente de competência exclusiva no que se refere a esses capítulos.

517.

O Parlamento comunga, no essencial, da posição da Comissão.

518.

O Conselho alega que, uma vez que a União Europeia não dispõe de competência para legislar em matéria de proteção diplomática (artigo 9.28 do EUSFTA), a União Europeia não pode, em caso algum, dispor de competência exclusiva para assinar e celebrar o EUSFTA. Não obstante o disposto no artigo 23.o, primeiro parágrafo, TFUE, a decisão de conceder ou não proteção diplomática numa determinada situação pertence aos Estados‑Membros. A título subsidiário, o Conselho afirma que a competência da União Europeia no que diz respeito ao artigo 9.28 do EUSFTA se limita aos litígios que envolvam investimento estrangeiro direto.

519.

O Conselho não apresentou argumentos específicos em relação aos capítulos quinze e dezasseis.

520.

Embora a maioria dos Estados‑Membros que apresentaram observações escritas tenha abordado a secção B do capítulo nove (exaustivamente), as suas observações sobre os capítulos quinze e dezasseis são muitos mais limitadas. Na audiência, alguns Estados‑Membros concentraram‑se no artigo 9.28 do EUSFTA (relativo à proteção diplomática).

521.

No que diz respeito à secção B do capítulo nove, alegam, em primeiro lugar, que, uma vez que a União Europeia não dispõe de competência exclusiva relativamente a tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto, não pode dispor de competência exclusiva no que diz respeito a essa secção, que se aplica tanto ao investimento estrangeiro direto como a outros tipos de investimento. Além disso, uma vez que o EUSFTA prevê um mecanismo de resolução de litígios no qual os Estados‑Membros podem ser designados como partes demandadas, as leis constitucionais de determinados Estados‑Membros podem impor‑lhes que participem na celebração desse acordo.

522.

O Conselho e os Estados‑Membros não apresentaram argumentos específicos em relação aos artigos 13.16 e 13.17 do EUSFTA, tendo apenas invocado o artigo 13.17 em apoio da sua posição sobre a competência da União Europeia no que se refere às disposições materiais do capítulo treze.

Análise

523.

Na minha opinião, a repartição de competências no que diz respeito aos mecanismos de resolução de litígios sobre a interpretação e a aplicação de diversas disposições do EUSFTA é acessória da repartição de competências materiais. Isso acontece tanto em relação aos capítulos quinze e dezasseis, que se aplicam numa base transversal, como em relação a outros capítulos que preveem formas específicas de resolução de litígios (como a secção B do capítulo nove, relativo ao investimento, e o capítulo treze, relativo ao comércio e desenvolvimento sustentável).

524.

Esta repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros é regulada apenas pelos Tratados. As disposições da ordem jurídica interna, mesmo de natureza constitucional, não são suscetíveis de a modificar ( 402 ).

525.

Decorre dos pareceres 1/91, 1/09 e 2/13 que, quando a União Europeia disponha de competência no que diz respeito às disposições materiais de um acordo internacional, dispõe igualmente de competência no que diz respeito aos mecanismos de resolução de litígios, que visam assegurar que essas disposições são efetivamente aplicadas. Tais mecanismos mais não fazem do que contribuir para alcançar os objetivos principais do acordo e são, por isso, acessórios das regras (materiais) com as quais estão relacionados ( 403 ).

526.

Esta conclusão aplica‑se quer ao mecanismo transversal de resolução de litígios previsto no capítulo quinze quer aos mecanismos específicos de resolução de litígios estabelecidos na secção B do capítulo nove e no capítulo treze ( 404 ). Ao contrário de alguns Estados‑Membros, considero que o facto de o mecanismo de RLIE conceder a um investidor de uma Parte o direito de iniciar um procedimento de arbitragem contra a outra Parte não tem, em si mesmo, nenhuma incidência na repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros. Esta característica reflete o facto de as Partes terem decidido optar por esse tipo de resolução de litígios no que diz respeito ao investimento, em vez de (ou juntamente com) uma resolução de litígios entre Estados. Por conseguinte, diz respeito à forma como a competência externa é exercida, e não à existência ou à natureza dessa competência externa.

527.

O mesmo raciocínio se aplica aos mecanismos de mediação como os estabelecidos no anexo 9‑E (especificamente para os litígios entre um investidor e um Estado) e no capítulo dezasseis. Estes visam igualmente assegurar a aplicação efetiva das disposições do EUSFTA às quais se aplicam.

528.

A minha conclusão não é posta em causa pelo argumento (aduzido por um Estado‑Membro) de que, como o artigo 9.16 do EUSFTA prevê um processo de arbitragem sob a égide do Centro Internacional para a Resolução de Diferendos Relativos a Investimentos (CIRDI), a União Europeia não pode ser parte na Convenção para a Resolução de Diferendos Relativos a Investimentos entre Estados e Nacionais de Outros Estados, assinada em 18 de março de 1965. É verdade que apenas os Estados podem ser partes nessa convenção ( 405 ). Contudo, o Tribunal de Justiça já declarou que um obstáculo de direito internacional à capacidade da União Europeia para celebrar um acordo internacional não diz respeito ao âmbito da competência externa da União Europeia, que apenas pode ser apreciado por referência ao direito da União. Tal obstáculo não impede a União Europeia de exercer a sua competência externa por intermédio dos Estados‑Membros atuando solidariamente no interesse da União ( 406 ). Em todo o caso, a arbitragem do CIRDI é apenas um dos mecanismos de resolução de litígios referido no artigo 9.16 do EUSFTA.

529.

Uma vez que a resolução de litígios e os mecanismos de mediação são por natureza acessórios, a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros no que se refere a tais mecanismos é necessariamente idêntica à que se aplica às disposições materiais a que os referidos mecanismos dizem respeito. Por outras palavras, esses mecanismos não podem, por si só, alterar a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros.

530.

Esta é a razão pela qual não me convence o argumento de que, devido ao facto de os Estados‑Membros poderem ser partes demandadas num litígio relativo a um investimento e terem eventualmente de suportar os encargos financeiros resultantes de uma decisão proferida nesse litígio ( 407 ), a União Europeia não pode dispor de competência exclusiva para dar o seu acordo à secção B do capítulo nove do EUSFTA.

531.

Além disso, as regras sobre a repartição da responsabilidade financeira entre a União Europeia e os seus Estados‑Membros estabelecidas no Regulamento n.o 912/2014 não afetam a repartição de competências estabelecida nos Tratados. A parte introdutória do artigo 1.o, n.o 1, do Regulamento n.o 912/2014 dispõe expressamente que este regulamento é aplicável «sem prejuízo da repartição de competências estabelecida pelo TFUE» ( 408 ); e o próprio regulamento deve respeitar as regras do Tratado em matéria de competência ( 409 ).

532.

Em todo o caso, o Tribunal de Justiça já declarou que, em matéria de repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros para a celebração de um acordo internacional, pouco importa as obrigações e os encargos financeiros inerentes à execução do acordo projetado incumbam diretamente aos Estados‑Membros ( 410 ). As medidas, tanto internas como externas, adotadas pela União no âmbito da sua competência não implicam necessariamente uma transferência para as instituições da UE das obrigações e encargos financeiros que podem acarretar: essas medidas têm exclusivamente por fim substituir a ação unilateral dos Estados‑Membros por uma ação comum, assente em princípios uniformes, para toda a União Europeia ( 411 ).

533.

Na minha opinião, este raciocínio aplica‑se a fortiori aos encargos financeiros impostos a um Estado‑Membro em consequência da adoção por um tribunal arbitral de uma sentença definitiva que conclua que esse Estado‑Membro aplicou medidas incompatíveis com as regras do EUSFTA em matéria de proteção dos investimentos.

534.

Por uma questão de exaustividade, devo acrescentar que, no parecer 1/78, o Tribunal de Justiça declarou, no essencial, que, quando um acordo internacional crie um mecanismo financeiro que constitua «um elemento essencial» do acordo, esse facto pode justificar, por si só, a participação dos Estados‑Membros na sua celebração, na medida em que os encargos financeiros subsequentes sejam imputados diretamente aos orçamentos dos Estados‑Membros ( 412 ). Considero que este raciocínio não se aplica aos encargos financeiros que podem resultar para os Estados‑Membros do mecanismo de RLIE previsto no EUSFTA. Tais encargos financeiros, se existirem, resultarão do cumprimento inadequado, por parte de um Estado‑Membro, das obrigações decorrentes do EUSFTA. Não podem, por isso, ser comparados aos que foram analisados pelo Tribunal de Justiça no parecer 1/78.

535.

Por conseguinte, concluo que a União Europeia dispõe de competência para dar o seu acordo aos mecanismos de resolução de litígios e de mediação estabelecidos no capítulo nove, secção B, e nos capítulos treze, quinze e dezasseis do EUSFTA. Uma vez que certas disposições do EUSFTA às quais os referidos capítulos se aplicam são da competência partilhada da União Europeia, a União Europeia partilha essa competência com os Estados‑Membros. Na medida em que dispõe de competência exclusiva no que diz respeito a determinadas disposições do EUSFTA, a União Europeia pode, por si só, dar o seu acordo ao capítulo nove, secção B, aos artigos 13.16 e 13.17, e aos capítulos quinze e dezasseis do EUSFTA.

536.

Saliento que a minha conclusão diz apenas respeito à competência. Não me debrucei nem me pronunciei sobre a compatibilidade material da secção B do capítulo nove com as regras materiais dos Tratados. Essa questão não está abrangida pelo âmbito do pedido de parecer da Comissão ( 413 ).

537.

Por último, o argumento de que a União Europeia não pode dispor de competência exclusiva no que se refere à secção B do capítulo nove devido ao artigo 9.28 do EUSFTA não me convence. A principal objeção a esta disposição é que a União Europeia não dispõe de competência no que diz respeito à proteção diplomática.

538.

Uma vez que esta questão só tem relevância fundamental se o Tribunal de Justiça decidir que a União Europeia dispõe de competência exclusiva no que se refere a todas as outras partes do EUSFTA, partirei do princípio de que assim é, para efeitos da análise que se segue.

539.

A proteção diplomática diz respeito aos procedimentos através dos quais o Estado da nacionalidade de uma pessoa lesada invoca a responsabilidade de outro Estado pelo dano causado a um nacional seu por atuação ou omissão ilícitas desse outro Estado, com vista a garantir a proteção desse nacional e a obter uma reparação ( 414 ). Ora, como afirmou o Tribunal Permanente de Justiça Internacional, «ao assumir a defesa de um dos seus cidadãos e ao recorrer, em nome dele, à ação diplomática ou a um processo judicial internacional, o Estado está, na verdade, a fazer valer os seus próprios direitos — o direito de garantir, na pessoa dos seus cidadãos, o respeito pelas regras do direito internacional» ( 415 ). É uma regra de direito internacional consuetudinário que, antes de um Estado conceder proteção diplomática aos seus nacionais lesados, estes devem ter esgotado previamente todas as vias de recurso internas ( 416 ).

540.

O direito internacional tem vindo a reconhecer cada vez mais direitos às pessoas singulares, incluindo o direito de invocar cláusulas de proteção contra o seu próprio Estado e os Estados de acolhimento, pelo que a proteção diplomática passou a coexistir com meios (como os mecanismos de RLIE) que permitem às pessoas singulares obter diretamente o respeito dos seus direitos ( 417 ). De acordo com a Comissão de Direito Internacional, «os procedimentos de resolução de litígios previstos [em acordos bilaterais de investimento] e [no] CIRDI oferecem mais vantagens ao investidor estrangeiro do que o sistema de proteção diplomática do direito internacional consuetudinário, uma vez que dão acesso direto à arbitragem internacional, permitem evitar a incerteza política inerente à natureza discricionária da proteção diplomática e dispensam os requisitos s que está sujeito o exercício da proteção diplomática» ( 418 ).

541.

A Comissão confirmou que o artigo 9.28 do EUSFTA se baseia na Convenção CIRDI ( 419 ).

542.

Na minha opinião, o artigo 9.28 do EUSFTA diz respeito à relação entre, por um lado, a competência dos tribunais arbitrais na aceção da secção B do capítulo nove («Tribunal arbitral na aceção do capítulo nove do EUSFTA») e, por outro lado, outros órgãos jurisdicionais (nacionais ou internacionais) e outros procedimentos que permitem desencadear a responsabilidade da outra Parte (artigo 9.28, n.o 1) e os painéis de arbitragem na aceção do capítulo quinze do EUSFTA («Painel de arbitragem na aceção do capítulo quinze do EUSFTA) (artigo 9.28, n.o 2). Quando uma Parte e um investidor da outra Parte tenham acordado submeter o seu litígio à arbitragem nos termos da secção B do capítulo nove, esse litígio não pode (em princípio) ser submetido à jurisdição de outro órgão jurisdicional através da proteção diplomática ou de uma ação a nível internacional. Estão previstas duas exceções: a primeira, quando a Parte não tenha respeitado nem dado execução à sentença proferida por um tribunal arbitral na aceção do capítulo nove do EUSFTA (artigo 9.28, n.o 1), e, a segunda, quando um painel de arbitragem na aceção do capítulo quinze do EUSFTA tenha competência judiciária para apreciar um litígio relativo a uma medida de aplicação geral (artigo 9.28, n.o 2).

543.

Na minha opinião, quando os mecanismos de resolução de litígios digam respeito à interpretação e à aplicação de disposições de um acordo internacional abrangido pela competência exclusiva da União Europeia, esta pode igualmente decidir sobre as cláusulas que delimitem a jurisdição (exclusiva) desses mecanismos.

544.

Por último, em conformidade com o artigo 23.o, primeiro parágrafo, TFUE, as autoridades diplomáticas e consulares de um Estado‑Membro podem, em determinadas circunstâncias, ter de conceder proteção aos nacionais de outro Estado‑Membro nas mesmas condições que se aplicam aos seus próprios nacionais. Assim, o direito da União alarga a categoria de pessoas que podem beneficiar da proteção diplomática de um Estado‑Membro. De resto, os Estados‑Membros dispõem de competência para decidir sobre a proteção diplomática. Contudo, esta competência deve ser exercida de acordo com a competência que os Tratados atribuem à União Europeia para aceitar a jurisdição dos mecanismos de resolução de litígios para resolver litígios relativos a disposições de um acordo internacional abrangido (nesse caso) pela sua competência exclusiva.

Disposições institucionais, gerais e finais (capítulo dezassete do EUSFTA ( 420 ) )

Argumentos

545.

A Comissão afirma que o objetivo do capítulo dezassete é criar um quadro institucional e processual que garanta a eficácia do EUSFTA. Uma vez que as disposições do capítulo dezassete são, por conseguinte, acessórias do resto do EUSFTA, a União Europeia dispõe igualmente de competência exclusiva no que se refere a este capítulo. Esta conclusão aplica‑se igualmente às disposições que estabelecem cláusulas de exceção em matéria de fiscalidade (artigo 17.6), de balança de transações correntes e circulação de capitais (artigo 17.7), de fundos soberanos (artigo 17.8), de restrições para salvaguarda da situação da balança de pagamentos (artigo 17.9), de segurança (artigo 17.10) e de divulgação de informações (artigo 17.11).

546.

Nem o Parlamento nem o Conselho tomaram posição sobre o capítulo dezassete.

547.

Apenas um Estado‑Membro abordou este capítulo, alegando que a Comissão não demonstrou que o artigo 17.6 do EUSFTA diz especificamente respeito ao comércio internacional, e que, em todo o caso, esta disposição ultrapassa o âmbito das competências atribuídas pelos Tratados à União Europeia em matéria fiscal.

Análise

548.

As disposições do capítulo dezassete do EUSFTA com uma dimensão meramente processual ou institucional são frequentemente encontradas em acordos (comerciais) internacionais. Essas disposições criam órgãos aos quais são confiadas tarefas específicas no âmbito do acordo e regulam o seu funcionamento (artigos 17.1, 17.2 e 17.3); regulam a relação entre o acordo e outros compromissos internacionais das Partes (artigos 17.3 e 17.17) e estabelecem regras em matéria de alterações (artigo 17.5), entrada em vigor (artigo 17.12), período de vigência (artigo 17.13), cumprimento das obrigações (artigo 17.14), efeitos do acordo nas ordens jurídicas das Partes (artigo 17.15), cobertura do acordo e versões que fazem fé (artigos 17.16 e 17.20), futuras adesões à União Europeia e âmbito de aplicação territorial do acordo (artigos 17.18 e 17.19). Uma vez que estas disposições são, por natureza, meramente acessórias, não podem alterar a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros no que diz respeito às outras disposições do EUSFTA.

549.

As restantes disposições do capítulo dezassete têm caráter mais material.

550.

O artigo 17.6 do EUSFTA (fiscalidade) (em conjugação com o Memorando de entendimento n.o 1) tem como objetivo clarificar em que o EUSFTA é aplicável às medidas fiscais, e preservar a competência quer de Singapura quer da União Europeia ou dos seus Estados‑Membros para levarem a cabo as suas políticas fiscais. Consequentemente, esta disposição é acessória do resto do EUSFTA; não constitui uma componente distinta.

551.

O mesmo acontece em relação ao artigo 17.9 do EUSFTA («Restrições para salvaguarda da balança de pagamentos»). Esta disposição permite a cada Parte que se encontre, ou sob a ameaça de se encontrar, em dificuldades graves a nível de balança de pagamentos ou das suas finanças externas, restringir benefícios concedidos no âmbito do EUSFTA no que diz respeito ao comércio de mercadorias e de serviços, ao estabelecimento, bem como aos pagamentos e às transferências relacionadas com os investimentos. Por este motivo, este artigo só é relevante em relação às outras disposições do EUSFTA, que derroga. Por conseguinte, esta disposição não constitui uma componente distinta deste acordo. De igual modo, os artigos 17.10 («Exceções por razões de segurança») e 17.11 («Divulgação de informações») são meramente acessórios do resto do EUSFTA.

552.

Por último, os artigos 17.7 («Balança de transações correntes e circulação de capitais») e 17.8 («Fundos soberanos») contêm regras que são autónomas em relação às outras disposições do EUSFTA. Contudo, estas disposições são de âmbito muito limitado, pelo que não podem ser consideradas uma componente distinta do EUSFTA.

553.

Por conseguinte, concluo que as disposições do capítulo dezassete do EUSFTA são ou meramente acessórias de outras disposições deste acordo ou de âmbito muito limitado, e, por estes motivos, não podem alterar a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros no que diz respeito às várias componentes do EUSFTA.

Apreciação da competência externa da União Europeia para celebrar o EUSFTA

554.

Decorre de todas as considerações anteriores que, para efeitos de apreciação da repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros, o EUSFTA deve ser dividido em várias partes distintas. Essas partes são: as disposições abrangidas pela política comercial comum; as disposições que liberalizam os serviços de transporte entre a União Europeia e Singapura e que, por conseguinte, são abrangidas pelo âmbito da política de transportes; as disposições que regulam os tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto, que estão sujeitas às regras relativas à livre circulação de capitais; as disposições que regulam os aspetos não comerciais dos direitos de propriedade intelectual, que são necessárias para alcançar os objetivos do mercado interno; as disposições relativas à convergência das normas fundamentais em matéria de trabalho e de ambiente entre a União Europeia e Singapura e que são, por isso, abrangidas, respetivamente, pelo âmbito da política social e da política de proteção do ambiente; e as disposições relativas à conservação dos recursos biológicos do mar, que são abrangidas pela política das pescas.

555.

Nenhuma destas partes pode ser identificada como componente principal ou preponderante do EUSFTA ou como «apenas acessória» ou «de âmbito extremamente limitado».

556.

Uma vez que nem todas estas partes são abrangidas pela competência externa exclusiva da União Europeia, o EUSFTA não pode, com base na competência exclusiva da União Europeia, ser celebrado sem a participação dos Estados‑Membros.

557.

A minha opinião detalhada sobre a repartição de competências entre a União Europeia e os Estados‑Membros no que diz respeito às várias partes do EUSFTA é a que segue.

558.

A União Europeia dispõe de competência externa exclusiva, nos termos dos artigos 3.°, n.o 1, alínea e), e 207.°, n.o 1, TFUE, no que se refere às partes do EUSFTA que incluem as disposições abrangidas pela política comercial comum. Estas disposições dizem respeito:

aos objetivos e definições gerais (capítulo um);

ao comércio de mercadorias (capítulos dois a seis);

ao comércio e aos investimentos na produção de energia renovável (capítulo sete);

ao comércio de serviços e aos contratos públicos (capítulos oito e dez), com exceção das partes do EUSFTA aplicáveis aos serviços de transporte e aos serviços intrinsecamente ligados a serviços de transporte;

ao investimento estrangeiro direto (capítulo nove, secção A);

aos aspetos comerciais dos direitos de propriedade intelectual (capítulo onze, com exceção das disposições relativas aos aspetos não comerciais destes direitos);

à concorrência e questões conexas (capítulo doze); e

ao comércio e ao desenvolvimento sustentável na medida em que as disposições em causa dizem principalmente respeito a instrumentos de política comercial (capítulo treze, com exceção das disposições referidas nos n.os 559 e 562, infra).

559.

A União Europeia dispõe igualmente de competência externa exclusiva, nos termos dos artigos 3.°, n.o 1, alínea d), e 43.°, n.o 2, TFUE, no que se refere às partes do EUSFTA relacionadas com a conservação dos recursos biológicos do mar [artigo 13.8, alíneas a), c) e d), do EUSFTA].

560.

Além disso, a União Europeia dispõe de competência externa exclusiva, nos termos dos artigos 91.° e 100.°, n.o 1, TFUE, em conjugação com o terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE e o quarto pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE, no que se refere às disposições do EUSFTA relativas ao comércio de serviços de transporte ferroviário e rodoviário (capítulo oito do EUSFTA).

561.

Por último, a União Europeia dispõe igualmente de competência externa exclusiva no que se refere às matérias abrangidas pela secção B do capítulo nove, pelos artigos 13.16 e 13.17 e pelos capítulos catorze a dezassete do EUSFTA na medida em que estas disposições se aplicam a (e, portanto, são acessórias de) partes do EUSFTA relativamente às quais a União Europeia dispõe de competência externa exclusiva.

562.

A competência externa da União Europeia é partilhada com os Estados‑Membros no que se refere às seguintes componentes do EUSFTA:

disposições sobre comércio de serviços de transporte aéreo, serviços de transporte marítimo e transporte por vias interiores navegáveis, incluindo serviços intrinsecamente ligados a estes serviços de transporte (capítulo oito), com base nos artigos 4.°, n.o 2, alínea g), 91.° e 100.° TFUE e no segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE;

disposições sobre tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto (capítulo nove, secção A), com base nos artigos 4.°, n.o 2, alínea a), e 63.° TFUE e no segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE;

disposições sobre contratos públicos na medida em que se aplicam a serviços de transporte e serviços intrinsecamente ligados a serviços de transporte (capítulo dez), com base nos artigos 4.°, n.o 2, alínea a), e 26.°, n.o 1, TFUE e no segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE;

disposições relativas a aspetos não comerciais dos direitos de propriedade intelectual (capítulo onze), com base nos artigos 4.°, n.o 2, alínea a), e 26.°, n.o 1, TFUE e no segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE;

disposições que estabelecem normas fundamentais em matéria de trabalho e de ambiente e que, por isso, são abrangidas pelo âmbito da política social ou da política de proteção do ambiente (capítulo treze), com base, respetivamente, nos artigos 4.°, n.o 2, alínea b), 151.° e 153.°, n.o 1, TFUE e no segundo pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE, e nos artigos 4.°, n.o 2, alínea e), e 191.°, n.o 4, TFUE e no primeiro pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE; e

matérias abrangidas pela secção B do capítulo nove, pelos artigos 13.16 e 13.17 e pelos capítulos catorze a dezassete do EUSFTA na medida em que estas disposições se aplicam a (e, portanto, são acessórias de) partes do EUSFTA relativamente às quais a União Europeia dispõe de competência externa partilhada.

563.

Por último, a União Europeia não dispõe de competência externa para aceitar ficar vinculada pelo artigo 9.10, n.o 1, do EUSFTA (capítulo nove, secção A), que prevê a anulação de acordos bilaterais celebrados entre determinados Estados‑Membros e Singapura. Esta competência pertence exclusivamente a esses Estados‑Membros.

564.

Decorre destas conclusões que o EUSFTA, na sua redação atual, apenas pode ser celebrado pela União Europeia e pelos Estados‑Membros atuando conjuntamente.

565.

Um processo de ratificação que envolva todos os Estados‑Membros juntamente com a União Europeia pode, necessariamente, ser moroso e complexo. Pode igualmente implicar o risco de que o resultado de negociações laboriosas seja bloqueado por alguns Estados‑Membros, ou até por um único Estado‑Membro. Um bloqueio deste tipo pode comprometer a eficácia da ação externa da UE e ter consequências negativas para as relações entre a União Europeia e o(s) Estado(s) terceiros(s) em causa.

566.

Contudo, a necessidade de unidade e de celeridade da ação externa da EU, bem como as dificuldades que podem surgir se a União Europeia e os Estados‑Membros tiverem de participar conjuntamente na celebração e na aplicação de um acordo internacional, não podem afetar a resposta a dar à questão de saber quem tem competência para celebrar esse acordo. Esta questão deve ser respondida exclusivamente com base nos Tratados ( 421 ). Daqui decorre que as preocupações de índole prática no que diz respeito à negociação e à celebração do EUSFTA, bem como à sua aplicação, não são suscetíveis de eliminar as divergências que identifiquei nas presentes conclusões entre o amplo leque de matérias regulado por este acordo e o âmbito da política comercial comum tal como resulta do Tratado de Lisboa. Por outras palavras, o facto de não existir uma sobreposição integral entre o que deve ser considerado «política comercial» ou «política de investimento» nas relações internacionais (e que, por conseguinte, é abrangido por um acordo como o EUSFTA) e o que constitui a política comercial comum à luz do direito da União não é relevante para determinar se a União Europeia dispõe de competência exclusiva para celebrar este acordo.

567.

Uma hipótese seria, obviamente, dividir o EUSFTA em vários acordos, em função da ou das competências envolvidas. Contudo, trata‑se de uma decisão política que exige (em especial) o acordo do Estado terceiro em causa.

568.

O Tribunal de Justiça declarou que, quando seja negociado e celebrado um acordo que exija a participação tanto da União Europeia como dos Estados‑Membros que a constituem, quer a União Europeia quer os Estados‑Membros devem atuar no âmbito das competências de que dispõem e no respeito das competências de quaisquer outras partes contratante ( 422 ). É verdade que, em princípio, cada Parte (incluindo os Estados‑Membros) deve — nesta fase — escolher entre aceitar ou rejeitar o acordona totalidade. Contudo, esta escolha deve ser efetuada em conformidade com as regras do Tratado relativas à repartição de competências. Se um Estado‑Membro se recusar a celebrar um acordo internacional por motivos ligados a aspetos desse acordo que são da competência externa exclusiva da União Europeia, esse Estado‑Membro estará a atuar em violação dessas regras do Tratado.

569.

Por último, o Tribunal de Justiça declarou em várias ocasiões que, quando a matéria de um acordo seja, em parte, da competência da União Europeia e, em parte, da competência dos Estados‑Membros, é essencial assegurar uma cooperação estreita entre os Estados‑Membros e as instituições da UE, tanto no processo de negociação e de celebração como na execução dos compromissos assumidos. É o que decorre da exigência de unidade na representação internacional da União Europeia ( 423 ), bem como do princípio da cooperação leal expresso no artigo 4.o, n.o 3, TUE. Pelos motivos que expus nas presentes conclusões, esta obrigação de cooperação plena aplica‑se à negociação, à celebração e à aplicação do EUSFTA.

Conclusão

570.

Com base nas considerações anteriores, proponho que o Tribunal de Justiça responda ao pedido de parecer da Comissão do seguinte modo:

1.

O Acordo de Comércio Livre projetado entre a União Europeia e a República de Singapura («EUSFTA») apenas pode ser celebrado pela União Europeia e pelos Estados‑Membros atuando conjuntamente.

2.

A União Europeia dispõe de competência externa exclusiva no que se refere às partes do EUSFTA que incluem as disposições abrangidas pela política comercial comum, designadamente:

os objetivos e definições gerais (capítulo um);

o comércio de mercadorias (capítulos dois a seis);

o comércio e os investimentos na produção de energia renovável (capítulo sete);

o comércio de serviços e os contratos públicos (capítulos oito e dez), com exceção das partes do EUSFTA aplicáveis a serviços de transporte e a serviços intrinsecamente ligados a serviços de transporte;

o investimento estrangeiro direto (capítulo nove, secção A);

os aspetos comerciais dos direitos de propriedade intelectual (capítulo onze, com exceção das disposições relativas aos aspetos não comerciais destes direitos);

a concorrência e questões conexas (capítulo doze); e

o comércio e o desenvolvimento sustentável na medida em que as disposições em causa dizem principalmente respeito a instrumentos de política comercial (capítulo treze, com exceção das disposições relativas à conservação dos recursos biológicos do mar e das disposições que estabelecem normas fundamentais em matéria de trabalho e de ambiente e que são, por isso, abrangidas pelo âmbito da política social ou da política de proteção do ambiente).

A União Europeia dispõe igualmente de competência externa exclusiva no que diz respeito às partes do EUSFTA (capítulo treze) relativas à conservação dos recursos biológicos do mar.

A União Europeia dispõe igualmente de competência externa exclusiva no que se refere às disposições do EUSFTA (capítulo oito) relativas ao comércio de serviços de transporte ferroviário e rodoviário.

A União Europeia dispõe igualmente de competência externa exclusiva no que se refere às matérias abrangidas pela secção B do capítulo nove, pelos artigos 13.16 e 13.17 e pelos capítulos catorze a dezassete do EUSFTA na medida em que estas disposições se aplicam a (e, portanto, são acessórias de) partes do EUSFTA relativamente às quais União Europeia dispõe de competência externa exclusiva.

3.

A competência externa da União Europeia é partilhada com os Estados‑Membros no que se refere às seguintes componentes do EUSFTA:

disposições sobre comércio de serviços de transporte aéreo, serviços de transporte marítimo e transporte por vias interiores navegáveis, incluindo serviços intrinsecamente ligados a estes serviços de transporte (capítulo oito);

disposições sobre tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto (capítulo nove, secção A);

disposições sobre contratos públicos na medida em que se aplicam aos serviços de transporte e aos serviços intrinsecamente ligados a serviços de transporte (capítulo dez);

disposições relativas a aspetos não comerciais dos direitos de propriedade intelectual (capítulo onze);

disposições que estabelecem normas fundamentais em matéria de trabalho e de ambiente e que, por isso, são abrangidas pelo âmbito da política social ou da política de proteção do ambiente (capítulo treze); e

matérias abrangidas pela secção B do capítulo nove, pelos artigos 13.16 e 13.17 e pelos capítulos catorze a dezassete do EUSFTA na medida em que essas disposições se aplicam a (e, portanto, são acessórias das) partes do EUSFTA relativamente às quais a União Europeia dispõe de competência externa partilhada.

4.

A União Europeia não dispõe de competência externa para aceitar ficar vinculada pelo artigo 9.10, n.o 1, do EUSFTA (capítulo nove, secção A), que prevê a anulação de acordos bilaterais celebrados entre determinados Estados‑Membros e Singapura. Esta competência pertence exclusivamente a esses Estados‑Membros.

Anexo — Descrição sucinta do EUSFTA

571.

O primeiro e segundo considerandos do EUSFTA referem‑se ao Acordo de Parceria e Cooperação entre a União Europeia e Singapura. O segundo e quinto considerandos dispõem que as referidas Partes desejam consolidar a sua relação e melhorar as condições de vida, promover o crescimento económico e a estabilidade, criar novas oportunidades de emprego e melhorar o bem‑estar geral e, para o efeito, reiteram o seu compromisso de promover a liberalização do comércio e do investimento. O quarto considerando refere que as Partes estão igualmente determinadas a reforçar as suas relações económicas, comerciais e de investimento, em conformidade com o objetivo do desenvolvimento sustentável, e a promover o comércio e o investimento de uma forma que tenha em conta níveis elevados de proteção do ambiente e do trabalho, bem como normas internacionalmente reconhecidas e os acordos de que sejam partes. As Partes reconhecem ainda, no oitavo considerando, a importância da transparência no comércio internacional em prol de todas as Partes interessadas. O nono considerando refere que as Partes pretendem estabelecer regras claras e mutuamente vantajosas que regulem os respetivos comércio e investimento, e reduzir ou eliminar os entraves ao comércio e investimento mútuos. O décimo considerando explica que as Partes estão decididas a contribuir para o desenvolvimento harmonioso e para a expansão do comércio internacional através da remoção dos entraves ao comércio, mediante o EUSFTA, e a evitar a criação de novos entraves ao comércio ou ao investimento entre as Partes, suscetíveis de reduzir os benefícios decorrentes do EUSFTA. No décimo primeiro considerando, as Partes declaram que se baseiam nos respetivos direitos e obrigações ao abrigo do Acordo OMC e de outros acordos e disposições multilaterais, regionais e bilaterais dos quais são Parte.

572.

O capítulo um («Objetivos e definições gerais») dispõe que, através do EUSFTA, as Partes criam uma zona de comércio livre em conformidade com o artigo XXIV do GATT de 1994 e com o artigo V do GATS (artigo 1.1). O artigo 1.2 dispõe que o EUSFTA tem como objetivos liberalizar e facilitar o comércio e o investimento entre as Partes.

573.

O capítulo dois («Tratamento nacional e acesso ao mercado das mercadorias») aplica‑se ao comércio de mercadorias entre as Partes (artigo 2.2). O objetivo estabelecido no artigo 2.1 é proceder à liberalização progressiva e recíproca do comércio de mercadorias ao longo de um período de transição com início na data de entrada em vigor do Acordo, em conformidade com os seus termos e com o artigo XXIV do GATT de 1994. O artigo 2.3 estabelece a obrigação de conceder o tratamento nacional, em conformidade com o artigo III do GATT de 1994 (que é assim incorporado no EUFSTA). O capítulo dois também abrange a classificação das mercadorias (artigo 2.5); exige a redução e/ou eliminação dos direitos aduaneiros sobre as importações (artigo 2.6); e proíbe a manutenção ou instituição de direitos aduaneiros e impostos sobre as exportações (artigo 2.7). Estabelece ainda obrigações no que diz respeito a medidas não pautais, em especial a restrições às importações e às exportações. (artigo 2.9); taxas e formalidades relacionadas com a importação e a exportação (artigo 2.10); procedimentos em matéria de licenças de importação e exportação (artigo 2.11); empresas comerciais do Estado (artigo 2.12); e eliminação de medidas não pautais setoriais tal como estabelecido nos anexos 2‑B e 2‑C (artigo 2.13). O artigo 2.14 prevê uma clausula de exceções gerais e refere‑se, em especial, ao artigo XX do GATT de 1994 (que é a cláusula de exceções gerais desse acordo). O artigo 2.15 estabelece um «Comité do Comércio de Mercadorias» cujas responsabilidades principais são acompanhar a aplicação, promover o comércio de mercadorias entre as Partes no que diz respeito às matérias abrangidas pelo capítulo em causa e respetivos anexos e analisar as medidas pautais e não pautais relativas ao comércio de mercadorias entre as Partes.

574.

O anexo 2‑A aborda a eliminação dos direitos aduaneiros. Inclui dois apêndices: o apêndice 2‑A1 (calendário de eliminação dos direitos aduaneiros relativo a Singapura) e o apêndice 2‑A2 (calendário de eliminação dos direitos aduaneiros relativo à União Europeia). O anexo 2‑B, aplicável a todos os tipos de veículos a motor e suas Partes, contém uma série de obrigações que abrangem, inter alia, a utilização de normas internacionais, a convergência regulamentar, produtos com novas tecnologias ou novas características, licenças de importação e outras medidas suscetíveis de restringir o comércio. O anexo 2‑C, relativo aos produtos farmacêuticos e dispositivos médicos, aborda as normas internacionais, a transparência e a cooperação regulamentar.

575.

O capítulo três tem como epígrafe «Recursos em matéria comercial».

576.

No que diz respeito a medidas antidumping e de compensação, o artigo 3.1 dispõe que as Partes reiteram os seus direitos e obrigações ao abrigo do artigo VI do GATT de 1994 (que dispõe sobre direitos antidumping e de compensação), do Acordo antidumping e do Acordo sobre subvenções e medidas de compensação. Este capítulo estabelece regras processuais para tratar pedidos de direitos antidumping e de compensação (artigo 3.2); estabelece a regra do direito inferior no que diz respeito a cada tipo de direito (artigo 3.3); refere a necessidade de tomar em consideração o interesse público (artigo 3.4); e exclui as disposições da secção sobre medidas antidumping e de compensação do âmbito dos capítulos quinze («Resolução de litígios») e dezasseis («Mecanismo de mediação») (artigo 3.5).

577.

O capítulo três contém igualmente regras específicas sobre medidas de salvaguarda. Em especial, as Partes reiteram os direitos e obrigações que lhes incumbem em virtude do artigo XIX do GATT de 1994 (que dispõe sobre medidas de emergência para os casos de importações de produtos especiais), do Acordo sobre Salvaguardas e do artigo 5.o do Acordo sobre a Agricultura (artigo 3.6). Prevê ainda regras processuais e de transparência (artigo 3.7) e exclui as disposições da secção sobre medidas globais de salvaguarda do âmbito dos capítulos quinze («Resolução de litígios») e dezasseis («Mecanismo de mediação») (artigo 3.8). Os artigos 3.9 a 3.13 preveem a aplicação (se necessário, a título provisório) de medidas bilaterais de salvaguarda específicas e de uma compensação adequada quando seja imposto esse tipo de medidas.

578.

O capítulo quatro («Obstáculos técnicos ao comércio») tem como objetivo, no essencial, facilitar e intensificar o comércio de mercadorias entre as Partes, mediante a criação de um quadro para a prevenção, identificação e eliminação de obstáculos desnecessários ao comércio, no âmbito do Acordo sobre os Obstáculos Técnicos ao Comércio (artigo 4.1), que é incorporado e faz parte integrante do EUSFTA (artigo 4.3). O capítulo quatro aplica‑se à preparação, adoção e aplicação de todos os regulamentos técnicos, normas e procedimentos de avaliação da conformidade, tal como definidos no anexo 1 do Acordo sobre os Obstáculos Técnicos ao Comércio, na medida em que sejam suscetíveis de afetar o comércio de mercadorias entre as Partes, independentemente da origem dessas mercadorias (artigo 4.2.1). O capítulo quatro contém igualmente disposições sobre, inter alia, diferentes formas de cooperação conjunta (artigo 4.4), a natureza dos organismos de normalização e o envolvimento das Partes nesses organismos (artigo 4.5), a base da regulamentação técnica (artigo 4.6), mecanismos destinados a facilitar a aceitação dos resultados das avaliações da conformidade (artigo 4.7), transparência (artigo 4.8) e requisitos em matéria de marcação ou rotulagem (obrigatórias) (artigo 4.10). Outras disposições dizem respeito ao intercâmbio de informações (como o artigo 4.9) e à disponibilização de informações para fins definidos (por exemplo, através de pontos de contacto instituídos em conformidade com o artigo 14.4) (artigo 4.11).

579.

O capítulo cinco («Medidas sanitárias e fitossanitárias») tem como objetivos a) proteger a vida e a saúde das pessoas, dos animais e das plantas nos respetivos territórios das Partes e, ao mesmo tempo, facilitar o comércio entre as Partes no domínio das medidas sanitárias e fitossanitárias («MSF»); b) colaborar, a fim de prosseguir a aplicação do Acordo sobre a Aplicação de Medidas Sanitárias e Fitossanitárias; e c) melhorar a comunicação, a cooperação e a resolução de questões relativas à aplicação das MSF que afetam o comércio entre as Partes (artigo 5.1). As Partes reiteram os direitos e obrigações que lhes incumbem ao abrigo do Acordo MSF [artigo 5.4; v., igualmente, artigo 5.6, alínea a)].

580.

O artigo 5.6 («Princípios gerais») diz respeito às formas de garantir a harmonização das MSF e limitações na utilização das MSF, de forma a evitar obstáculos injustificados ao comércio e restrições desnecessárias, bem como a discriminação arbitrária ou injustificada e atrasos no acesso aos mercados das Partes. Outras obrigações substanciais dizem respeito a requisitos em matéria de importação (artigo 5.7); verificações (artigo 5.8); procedimento aplicável em caso de verificação no local a fim de autorizar as importações de uma determinada categoria de produtos de origem animal provenientes da Parte de exportação (artigo 5.9; v., igualmente, anexo 5‑B); determinação e reconhecimento de zonas indemnes de parasitas ou doenças (artigo 5.10); medidas de emergência em caso de risco grave para a vida ou a saúde das pessoas, dos animais ou das plantas (artigo 5.13) e (procedimento para) reconhecimento da equivalência de uma medida individual e/ou de um grupo de medidas (artigo 5.14). As obrigações gerais em matéria de transparência e intercâmbio de informações constam do artigo 5.11.

581.

O capítulo seis («Alfândegas e facilitação do comércio») tem como objetivo reconhecer a importância das questões aduaneiras e da facilitação do comércio no contexto evolutivo do comércio mundial e reforçar a cooperação nessa área, de modo a garantir que a legislação e os procedimentos pertinentes, assim como a capacidade administrativa das administrações em causa, cumpram os objetivos que consistem em promover a facilitação do comércio, garantindo ao mesmo tempo um controlo aduaneiro efetivo (artigo 6.1, n.o 1). O artigo 6.2 estabelece os princípios nos quais devem assentar as disposições e procedimentos aduaneiros das Partes (artigo 6.2, n.o 1). As Partes devem igualmente simplificar, sempre que possível, os requisitos e formalidades para promover a autorização de saída e o desalfandegamento céleres das mercadorias e envidar esforços no sentido de continuar a simplificar e normalizar os dados e os documentos exigidos pelas alfândegas e outros organismos (artigo 6.2, n.o 2). Os artigos 6.3 a 6.14 estabelecem obrigações específicas em matéria de cooperação aduaneira; trânsito e transbordo; decisões prévias; procedimentos aduaneiros simplificados; autorização de saída das mercadorias; taxas e encargos; agentes aduaneiros; inspeção antes da expedição; determinação do valor aduaneiro; gestão do risco; sistema de balcão único (facilitar um único procedimento de apresentação, por via eletrónica, de todas as informações exigidas); e aplicação de procedimentos eficazes, expeditos, não discriminatórios e facilmente acessíveis. O artigo 6.16 aborda a relação das Partes com a comunidade empresarial.

582.

O artigo 6.15 estabelece uma obrigação geral de publicar ou disponibilizar de outro modo legislação, regulamentos e procedimentos administrativos, bem como outros requisitos relacionados com as alfândegas e a facilitação do comércio (artigo 6.15, n.o 1), e designar ou gerir um ou mais pontos de informação (artigo 6.15, n.o 2). Ao longo do capítulo seis, várias disposições dizem respeito à necessidade de proceder ao intercâmbio e à disponibilização de informações [por exemplo, artigos 6.3, n.o 2, 6.8, n.o 2, e 6.16, alínea b)].

583.

O capítulo sete («Obstáculos não pautais ao comércio e investimentos na produção de energia renovável») procura promover, desenvolver e aumentar a produção de energia a partir de fontes renováveis e fontes não fósseis sustentáveis, em especial através da facilitação do comércio e dos investimentos. Para este efeito, as Partes comprometem‑se a cooperar no sentido de eliminar ou reduzir os obstáculos pautais e não pautais e fomentar a convergência regulamentar, com ou sem normas regionais e internacionais (artigo 7.1).

584.

O capítulo sete aplica‑se às medidas que podem afetar o comércio e o investimento entre as Partes, relacionadas com a produção de energia a partir de fontes renováveis e fontes não fósseis sustentáveis, mas não se aplica aos produtos a partir dos quais é gerada a energia (artigo 7.3, n.o 1).

585.

O artigo 7.4 exige que as Partes a) se abstenham de adotar medidas que prevejam requisitos de conteúdo local ou quaisquer outras compensações (qualquer condição que promova o desenvolvimento local) que afetem os produtos, os prestadores de serviços, os investidores ou os investimentos da outra Parte; b) se abstenham de adotar medidas que exijam a formação de parcerias com empresas locais (exceto se estiverem relacionadas com razões de ordem técnica); c) garantam que quaisquer regras relativas aos procedimentos de autorização, certificação e concessão de licenças aplicados são objetivas, transparentes, não arbitrárias e não exercem qualquer discriminação contra os requerentes da outra Parte; d) garantam que os encargos administrativos impostos sobre ou relacionados com a importação e a utilização de mercadorias originárias da outra Parte, ou que afetem o fornecimento de mercadorias pelos fornecedores da outra Parte, estejam sujeitos ao artigo 2.10 e que os encargos administrativos impostos sobre ou relacionados com a prestação de serviços pelos prestadores da outra Parte estejam sujeitos aos artigos 8.18 a 8.20; e e) garantam que as modalidades, as condições e os procedimentos aplicáveis à ligação e ao acesso a redes de transporte de eletricidade são transparentes e não exercem qualquer discriminação contra os fornecedores da outra Parte.

586.

O artigo 7.5 diz respeito à utilização de normas internacionais ou regionais aplicáveis aos produtos para a produção de energia de fontes renováveis e fontes não fósseis sustentáveis, à necessidade de especificar os regulamentos técnicos com base em requisitos de produtos e à aceitação de declarações de conformidade da outra Parte.

587.

O artigo 7.6, n.o 1, refere que as disposições do capítulo sete estão sujeitas às cláusulas de exceções gerais constantes dos artigos 2.14 e 8.62, à clausula de segurança e exceções gerais constante do artigo 10.3 e às disposições aplicáveis do capítulo dezassete. De acordo com o artigo 7.6, n.o 2, nenhuma disposição do capítulo sete pode ser interpretada no sentido de impedir a adoção ou a aplicação efetiva, pelas Partes, de medidas necessárias para a exploração segura das redes de energia em causa, ou a segurança do abastecimento de energia.

588.

O artigo 7.7 define o papel do Comité de Comércio no que diz respeito à cooperação e à aplicação do capítulo sete e especifica o que essa cooperação pode incluir.

589.

O capítulo oito («Serviços, estabelecimento e comércio eletrónico») está dividido em sete secções.

590.

Na secção A, as Partes reafirmam os respetivos compromissos ao abrigo do Acordo da OMC e acordam em que o capítulo estabelece as disposições necessárias à liberalização progressiva e recíproca do comércio de serviços, do estabelecimento e do comércio eletrónico (artigo 8.1, n.o 1).

591.

O artigo 8.1, n.o 2, refere que, salvo disposição em contrário, o capítulo oito a) não é aplicável às subvenções ou contributos concedidos pelas Partes; b) não é aplicável aos serviços prestados no exercício da autoridade governamental nos respetivos territórios das Partes; c) não exige a privatização de empresas públicas; e/ou d) não é aplicável às disposições legislativas e regulamentares nem aos requisitos que regem os contratos públicos celebrados por organismos públicos e referentes a serviços adquiridos para dar resposta a necessidades dos poderes públicos, e não com vista à revenda numa perspetiva comercial ou com vista à sua utilização no âmbito da prestação de serviços para venda numa perspetiva comercial. O artigo 8.1.4 acrescenta que o capítulo oito não é aplicável às medidas que afetem as pessoas singulares que pretendam ter acesso ao mercado de trabalho de uma Parte, nem às medidas referentes à cidadania, à residência ou ao emprego numa base permanente.

592.

O artigo 8.1.3 salvaguarda o direito de cada Parte de regular e de introduzir nova regulamentação para realizar objetivos políticos legítimos de uma forma consentânea com o capítulo oito.

593.

O artigo 8.2, alínea d), refere que as disposições do EUSFTA são igualmente aplicáveis às companhias de navegação estabelecidas fora da União e controladas por nacionais de um Estado‑Membro, caso os seus navios estejam registados em conformidade com a legislação desse Estado‑Membro e arvorem o pavilhão de um Estado‑Membro.

594.

O artigo 8.2, alínea m), define «comércio de serviços» como a prestação de um serviço: i) com origem no território de uma Parte e com destino ao território da outra Parte («transfronteiras»); ii) no território de uma Parte a um consumidor de serviços da outra Parte («consumo no estrangeiro»); iii) por um prestador de serviços de uma Parte através de uma presença comercial no território da outra Parte («presença comercial»); e iv) por um prestador de serviços de uma Parte através da presença de pessoas singulares dessa Parte no território da outra Parte («presença de pessoas singulares»).

595.

A secção B («Prestação transfronteiras de serviços») aplica‑se a medidas das Partes que afetem a prestação transfronteiras de serviços em todos os setores, exceto a) serviços audiovisuais; b) cabotagem marítima nacional (abrange o transporte de passageiros ou de mercadorias entre um porto ou ponto situado num Estado‑Membro Membro e outro porto ou ponto situado no mesmo Estado‑Membro e o tráfego com origem e destino no mesmo porto ou ponto situado num Estado‑Membro da União Europeia; e c) serviços de transporte aéreo nacional e internacional, regulares ou não, e serviços diretamente ligados ao exercício dos direitos de tráfego (aéreo) (artigo 8.3). Estão, no entanto, abrangidos: i) serviços de reparação e manutenção de aeronaves durante os quais a aeronave é retirada de serviço; ii) a venda e a comercialização de serviços de transporte aéreo; e iii) serviços de sistemas informatizados de reserva [artigo 8.3, alínea c)]. O artigo 8.4 define, para efeitos da secção B, «prestação transfronteiras de serviços» como a prestação de um serviço: a) com origem no território de uma Parte e com destino ao território da outra Parte e b) no território de uma Parte a um consumidor de serviços da outra Parte.

596.

O artigo 8.5 diz respeito ao acesso ao mercado. Cada Parte deve conceder aos serviços e aos prestadores de serviços da outra Parte um tratamento não menos favorável do que o previsto segundo as condições e as limitações acordadas e especificadas na respetiva lista de compromissos específicos (artigo 8.5, n.o 1). No que diz respeito aos setores nos quais sejam assumidos compromissos de acesso ao mercado, o artigo 8.5, n.o 2, determina as medidas que uma Parte não deve manter ou adotar em relação a uma subdivisão regional ou à totalidade do seu território, salvo especificação em contrário na respetiva lista de compromissos específicos.

597.

O artigo 8.6 estabelece a obrigação de tratamento nacional. Nos setores inscritos na respetiva lista de compromissos específicos, e tendo em conta as condições e as qualificações nela enumeradas, cada Parte deve conceder aos serviços e aos prestadores de serviços da outra Parte, relativamente a todas a medidas que afetem a prestação transfronteiras de serviços, um tratamento não menos favorável do que o concedido aos seus próprios serviços e prestadores de serviços similares (artigo 8.6, n.o 1).

598.

O artigo 8.7, n.o 1, dispõe que a lista de compromissos específicos contém os setores liberalizados por cada uma das Partes nos termos da secção B e as limitações em matéria de acesso ao mercado e de tratamento nacional aplicáveis aos serviços e prestadores de serviços da outra Parte nesses setores.

599.

A secção C diz respeito ao «Estabelecimento», definido no artigo 8.8, alínea d), como «i) a constituição, aquisição ou manutenção de uma pessoa coletiva; ou ii) a criação ou a manutenção de uma sucursal ou de uma representação no território de uma Parte para efetuar uma atividade económica, incluindo, mas não exclusivamente, a prestação de um serviço». Os termos «constituição» e «aquisição» de uma pessoa coletiva devem ser entendidos como incluindo a participação de capital numa pessoa coletiva, com vista a criar ou manter laços económicos duradouros [nota 8 do artigo 8.8, alínea d)]. A secção C é aplicável às medidas adotadas ou mantidas pelas Partes, que afetam o estabelecimento em qualquer atividade económica, à exceção de a) mineração, fabrico e processamento de materiais nucleares; b) produção ou comércio de armas, de munições ou de material de guerra; c) serviços audiovisuais; d) cabotagem marítima nacional; e e) serviços de transporte aéreo nacional e internacional, regulares ou não, e serviços diretamente ligados ao exercício dos direitos de tráfego (aéreo) (artigo 8.9). No entanto, a secção C é aplicável às medidas que afetam o estabelecimento nas atividades económicas de i) serviços de reparação e manutenção de aeronaves durante os quais a aeronave é retirada de serviço; ii) venda e comercialização de serviços de transporte aéreo; e iii) serviços de sistemas informatizados de reserva [artigo 8.9, alínea e)].

600.

Os artigos 8.10, 8.11 e 8.12, relativos, respetivamente, ao acesso ao mercado, ao tratamento nacional e às listas de compromissos específicos, refletem em grande medida os artigos 8.5, 8.6 e 8.7 no que diz respeito ao estabelecimento [as disposições referem‑se, respetivamente, ao acesso ao mercado, ao tratamento nacional e às listas de compromissos específicos no que diz respeito à prestação transfronteiras de serviços (secção B)].

601.

A secção D («Presença temporária de pessoas singulares por motivos profissionais») aplica‑se a medidas tomadas pelas Partes relativamente à entrada ou estada temporária, nos seus territórios, de pessoal‑chave, estagiários de nível pós‑universitário e vendedores de serviços às empresas em conformidade com o artigo 8.1, n.o 4 (artigo 8.13, n.o 1). Entende‑se por «pessoal‑chave» qualquer pessoa singular contratada por pessoas coletivas de uma Parte, exceto organismos sem fins lucrativos, responsável pelo estabelecimento ou controlo adequado, administração e funcionamento de um estabelecimento [artigo 8.13, n.o 2, alínea a)]. Essa categoria abrange os «visitantes de negócios para efeitos de estabelecimento» e o «pessoal transferido no seio da empresa». Entende‑se por «visitantes de negócios para efeitos de estabelecimento», qualquer pessoa singular que ocupe funções de quadro superior, responsável pela constituição de um estabelecimento e que não efetua transações diretas com o público em geral nem recebe remuneração de uma fonte situada na Parte de acolhimento [artigo 8.13, n.o 2, alínea a), subalínea i)]. Entende‑se por «pessoal transferido no seio da empresa», qualquer pessoa singular contratada por qualquer pessoa coletiva de uma Parte, ou, no caso dos profissionais que prestam serviços às empresas, que desta tenha sido sócia por, no mínimo, um ano e que tenha sido transferida temporariamente para um estabelecimento no território da outra Parte. Pode tratar‑se de executivos, gestores ou especialistas [artigo 8.13, n.o 2, alínea a), subalínea ii)].

602.

No que diz respeito ao pessoal‑chave e aos estagiários de nível pós‑universitário, o artigo 8.14 dispõe que, para cada setor liberalizado em conformidade com a secção C e sujeito às reservas enunciadas na lista de compromissos específicos, as Partes devem permitir reciprocamente que os empresários (sic) da outra Parte utilizem no seu estabelecimento pessoas singulares dessa outra Parte, desde que se trate de pessoal‑chave ou estagiários de nível pós‑universitário, tal como definidos no artigo 8.13. Essa disposição define igualmente diferentes períodos‑limite de entrada e estada temporária para pessoal transferido no seio da empresa, visitantes de negócios para efeitos de estabelecimento e estagiários de nível pós‑universitário. São proibidas as medidas que impliquem limitações do número total de pessoas singulares que um empresário (sic) pode transferir como pessoal‑chave ou estagiários de nível pós‑universitário num determinado setor (sob a forma de quotas numéricas ou com base num exame das necessidades económicas) ou limitações discriminatórias (artigo 8.14, n.o 2).

603.

Nos termos do artigo 8.15, as Partes devem, em princípio, permitir a entrada e estada temporária de vendedores de serviços às empresas por um máximo de 90 dias num período de 12 meses (artigo 8.15).

604.

A secção E («Quadro regulamentar») está dividida em subsecções que contêm disposições de aplicação geral; regulamentação interna; serviços de informática; serviços postais; serviços de telecomunicações; serviços financeiros; e serviços de transporte marítimo internacional.

605.

A subsecção 1 contém disposições de aplicação geral. Estabelece obrigações no que se refere ao reconhecimento mútuo das qualificações profissionais (artigo 8.16) e à transparência (artigo 8.17). Nenhuma disposição do artigo 8.16 obsta a que as Partes exijam que as pessoas singulares possuam as habilitações necessárias e/ou a experiência profissional especificada no território em que o serviço é prestado relativamente ao setor de atividade em questão (artigo 8.16, n.o 1). Cada Parte deve responder prontamente aos pedidos formulados pela outra Parte a fim de obter informações específicas sobre qualquer das suas medidas de aplicação geral ou acordos internacionais que digam respeito ou afetem o disposto no capítulo oito. Cada Parte deve, nos termos do artigo 14.4, estabelecer igualmente um ou mais pontos de informação (artigo 8.17).

606.

A subsecção 2 diz respeito à regulamentação interna. É aplicável a medidas relativas aos requisitos e procedimentos em matéria de licenciamento e de qualificações que afetam a prestação transfronteiras de serviços; o estabelecimento, no território das Partes, das pessoas singulares e coletivas; e a estada temporária de pessoas singulares no território das Partes (artigo 8.18, n.o 1), de acordo com os compromissos específicos assumidos pelas Partes (artigo 8.18, n.o 2).

607.

Os artigos 8.19 e 8.20 estabelecem obrigações relativas aos requisitos e procedimentos em matéria de licenciamento e de qualificações, ao processo de obtenção de uma licença e para assegurar a imediata revisão ou, por razões justificadas, a adoção de medidas corretivas adequadas em relação a decisões administrativas que afetem o estabelecimento, a prestação de serviços transfronteiras ou a estada temporária de pessoas singulares por motivos profissionais.

608.

A subsecção 3 é relativa aos serviços de informática. O artigo 8.21, n.o 1, dispõe que as Partes subscrevem o memorando definido nos restantes números do artigo 8.21 no que diz respeito aos serviços de informática liberalizados em conformidade com as secções B a D. Esse memorando refere‑se maioritariamente ao conceito de «serviços de informática e serviços conexos».

609.

A subsecção 4 diz respeito aos serviços postais. De acordo com o artigo 8.22, cada Parte deve adotar ou manter medidas adequadas para impedir que os prestadores de serviços postais que, individual ou coletivamente, sejam prestadores principais no mercado de serviços postais em causa adotem ou prossigam práticas anticoncorrenciais. Nos termos do artigo 8.23, os órgãos reguladores devem ser distintos e não responsáveis perante qualquer prestador de serviços postais. As decisões e os procedimentos por eles aprovados devem ser imparciais relativamente a todos os participantes no mercado.

610.

A subsecção 5 é aplicável às medidas que afetam o comércio de serviços de telecomunicações. Enuncia os princípios do quadro normativo para os serviços de telecomunicações liberalizados em conformidade com as secções B a D (ou seja, a prestação transfronteiras de serviços, o estabelecimento e a presença temporária de pessoas singulares por motivos profissionais) (artigo 8.24, n.o 1). Os artigos 8.26 a 8.38 contêm obrigações substanciais em matéria de, entre outros, acesso e utilização de redes e serviços públicos de telecomunicações, interligação, partilha de recursos e portabilidade dos números. Os artigos 8.41 e 8.42 estabelecem obrigações relativas, por um lado, aos procedimentos de obtenção de autorização para prestar serviços de telecomunicações e, por outro lado, aos procedimentos de atribuição e utilização de recursos limitados.

611.

No artigo 8.45 é estabelecida uma obrigação geral de transparência. Nos artigos 8.29, n.o 3, e 8.41, n.o 2, por exemplo, são estabelecidas obrigações especificas relativas à disponibilização de informação.

612.

A subsecção 6 enuncia os princípios que regulam o quadro normativo para todos os serviços financeiros liberalizados em conformidade com as secções B a D (artigo 8.49, n.o 1). O artigo 8.50, n.os 1 e 2, autoriza as Partes a tomar ou manter medidas prudenciais e estabelece as condições nas quais tal pode ser efetuado. De acordo com o artigo 8.50, n.o 4, cada Parte envida todos os esforços para garantir a aplicação e execução, no seu território, de uma série de normas enumeradas em matéria de controlo bancário, supervisão de seguros, regulação de valores, transparência e intercâmbio de informações para fins fiscais. Nos termos do artigo 8.50, n.o 5, as Partes podem exigir, sob determinadas condições, o registo ou a autorização dos prestadores de serviços financeiros transfronteiras da outra Parte, bem como dos instrumentos financeiros.

613.

O artigo 8.52 exige que cada Parte conceda aos fornecedores de serviços financeiros da outra Parte, sob determinadas condições, o acesso aos sistemas de pagamento e de compensação administrados por entidades públicas e aos meios de financiamento e de refinanciamento disponíveis no decurso de operações comerciais normais.

614.

O artigo 8.53 diz respeito aos novos serviços financeiros. Obriga cada Parte a autorizar que os prestadores de serviços financeiros da outra Parte prestem qualquer novo serviço financeiro que a Parte autorizaria os seus próprios prestadores de serviços financeiros a prestar, sem exigir qualquer medida legislativa adicional.

615.

O artigo 8.54 diz respeito, em especial, à transferência de informações em suporte eletrónico ou por outro meio, para e do território de uma das Partes, com vista ao tratamento de dados, sempre que o mesmo seja necessário no decurso das operações comerciais normais de prestadores de serviços financeiros.

616.

A subsecção 7 enuncia os princípios relativos à liberalização dos serviços de transporte marítimo internacional em conformidade com as secções B a D. O artigo 8.56, n.o 3 dispõe que as Partes acordam em garantir a aplicação efetiva dos princípios do livre acesso à carga numa base comercial e da livre prestação de serviços de transporte marítimo internacional, bem como do tratamento nacional no quadro da prestação desses serviços. As Partes devem aplicar o princípio do livre acesso ao mercado e ao comércio no setor do transporte marítimo internacional numa base comercial e não discriminatória [artigo 8.56, n.o 3, alínea a)]. Cada Parte deve conceder aos navios que arvorem pavilhão da outra Parte ou operados por prestadores de serviços da outra Parte um tratamento não menos favorável do que o concedido aos seus próprios navios, ou aos de qualquer país terceiro, consoante o que for mais favorável, no que respeita, designadamente, ao acesso a portos, à utilização das infraestruturas e dos serviços marítimos auxiliares dos portos, bem como às taxas e encargos conexos, às infraestruturas aduaneiras e ao acesso aos cais de acostagem e às infraestruturas de carga e descarga. O artigo 8.56, n.o 5, dispõe que cada Parte deve autorizar que os prestadores de serviços de transporte marítimo internacional da outra Parte tenham um estabelecimento no seu território, de acordo com condições de estabelecimento e de exercício de atividade conformes às condições enunciadas na respetiva lista de compromissos específicos. De acordo com o artigo 8.56, n.o 6, as Partes devem facultar aos prestadores de serviços de transporte marítimo internacional da outra Parte, em termos e condições razoáveis e não discriminatórios, a utilização dos seguintes serviços portuários: a) pilotagem; b) reboques e assistência a rebocadores; c) abastecimento; d) aprovisionamento e carga de combustíveis e de água; e) recolha de lixo e eliminação de resíduos de lastro; f) serviços de capitania portuária; g) auxílios à navegação; e h) serviços operacionais em terra essenciais para as operações de embarque.

617.

Na secção F («Comércio eletrónico»), as Partes acordam na importância de facilitar a utilização e o desenvolvimento do comércio eletrónico, bem como a aplicabilidade das regras da OMC ao comércio eletrónico; e comprometem‑se a promover o desenvolvimento do comércio eletrónico nas suas relações comerciais, em especial cooperando no que diz respeito a questões suscitadas pelo comércio eletrónico ao abrigo do disposto no capítulo oito (artigo 8.57, n.os 1 e 2). Reconhecem igualmente que o desenvolvimento do comércio eletrónico deve ser totalmente compatível com as mais elevadas normas internacionais em matéria de proteção dos dados, de modo a garantir a confiança dos seus utilizadores (Artigo 8.57, n.o 4).

618.

Nos termos do artigo 8.58, as Partes não devem sujeitar a direitos aduaneiros as transmissões eletrónicas. No artigo 8.59, as Partes reiteram que as medidas relativas à prestação de um serviço através de meios eletrónicos são abrangidas pelo âmbito de aplicação das obrigações constantes das disposições aplicáveis do capítulo oito, sob reserva de eventuais exceções aplicáveis.

619.

A secção G tem como epígrafe «Exceções». O artigo 8.62 estabelece uma cláusula de exceções gerais. No artigo 8.63, as Partes comprometem‑se a proceder ao reexame do capítulo oito e das respetivas listas de compromissos específicos, o mais tardar, três anos após a entrada em vigor do EUSFTA e, em seguida, periodicamente.

620.

O artigo único do anexo 8‑A estabelece que a lista de compromissos específicos da União Europeia é enunciada nos apêndices 8‑A1 a 8‑A3. Estes tratam, respetivamente, da lista de compromissos específicos em conformidade com o artigo 8.7 (Prestação transfronteiras de serviços), com o artigo 8.12 (Estabelecimento) e com os artigos 8.14 e 8.15 (Pessoal‑chave e estagiários de nível pós‑universitário e vendedores de serviços às empresas).

621.

O anexo 8‑B dispõe que a lista de compromissos específicos de Singapura é apresentada nos apêndices 8‑B1 (Compromissos específicos) e 8‑B2 (Serviços financeiros).

622.

O capítulo nove («Investimento») é constituído por duas partes. A secção A contém as disposições materiais em matéria de proteção dos investidores e dos seus investimentos. A secção B prevê um mecanismo de resolução de litígios entre investidores e o Estado («RLIE») a fim de aplicar essas disposições.

623.

Para efeitos do capítulo nove, entende‑se por «investimento abrangido» o investimento que é detido, direta ou indiretamente, ou controlado, direta ou indiretamente, por um investidor abrangido de uma Parte no território da outra Parte (artigo 9.1, n.o 1). Entende‑se por «investidor abrangido» uma pessoa singular ou pessoa coletiva de uma Parte que tenha realizado um investimento no território da outra Parte (artigo 9.1, n.o 2). Entende‑se por «investimento» todo o tipo de ativos que possuem as características de um investimento, tais como a afetação de capitais ou de outros recursos, a expectativa de ganhos ou lucros, a assunção de risco e uma determinada duração (artigo 9.1, n.o 1). O artigo 9.1, n.o 1, alíneas a) a h), apresenta uma lista das várias formas que o investimento pode assumir.

624.

O capítulo nove é aplicável independentemente de esses investimentos terem sido realizados antes ou depois da entrada em vigor do EUSFTA (artigo 9.2, n.o 1).

625.

O artigo 9.3, n.o 1, estabelece o requisito do tratamento nacional: cada Parte deve conceder aos investidores abrangidos da outra Parte e aos seus investimentos abrangidos, no seu território, um tratamento não menos favorável do que o que concede, em situações semelhantes, aos seus próprios investidores e respetivos investimentos no que diz respeito à exploração, gestão, condução, manutenção, utilização, fruição e venda ou outra forma de alienação dos seus investimentos. O artigo 9.3, n.o 3, estabelece determinadas exceções e dispõe sobre as condições nas quais uma Parte pode adotar ou aplicar medidas que concedam um tratamento menos favorável.

626.

O artigo 9.4 exige que cada Parte conceda, no seu território, aos investimentos abrangidos da outra Parte um tratamento justo e equitativo, bem como plena proteção e segurança (artigo 9.4, n.o 1) — esta segurança refere‑se apenas à obrigação de uma Parte no que respeita à segurança física dos investidores e investimentos abrangidos (artigo 9.4, n.o 4). Para dar cumprimento a essa obrigação, o artigo 9.4, n.o 2, dispõe que as Partes se abstêm de adotar medidas que constituam: a) uma denegação de justiça em processos penais, civis ou administrativos; b) uma violação fundamental do processo equitativo; c) um comportamento manifestamente arbitrário; d) assédio, coação, abuso de poder ou comportamento de má‑fé semelhante; ou e) uma violação das expectativas legítimas de um investidor abrangido decorrente de declarações específicas ou inequívocas de uma Parte tendentes a induzir o investimento e que o investidor abrangido considera razoavelmente fiáveis.

627.

O artigo 9.5, n.o 1, dispõe que aos investidores abrangidos de uma Parte que sofram prejuízos devido a guerra ou outro conflito armado, revolução, estado de emergência nacional, rebelião, insurreição ou motim no território da outra Parte deve ser concedido por esta última Parte, relativamente à restituição, indemnização, compensação ou outra forma de ressarcimento, um tratamento não menos favorável do que o concedido por essa Parte aos seus próprios investidores ou aos investidores de qualquer país terceiro, consoante o que for mais favorável para o investidor abrangido em causa. O artigo 9.5, n.o 2, exige que as Partes atribuam uma restituição ou compensação se um investimento abrangido for requisitado ou destruído.

628.

Por força do artigo 9.6, n.o 1, nenhuma das Partes deve, direta ou indiretamente, nacionalizar, expropriar, ou sujeitar a medidas com efeito equivalente à nacionalização ou expropriação os investimentos abrangidos dos investidores abrangidos da outra Parte, salvo se essa expropriação for realizada: a) por motivos de interesse público; b) nos devidos termos da lei; c) de forma não discriminatória; e d) mediante o pagamento de uma compensação rápida, adequada e efetiva, em conformidade com artigo 9.6, n.o 2. O artigo 9.6, n.o 2, define a forma como deve ser determinado o montante da compensação. O artigo 9.6 não se aplica à emissão de licenças obrigatórias concedidas em relação a direitos de propriedade intelectual, na medida em que essa emissão seja compatível com o Acordo TRIPS (artigo 9.6, n.o 3). O artigo 9.6.4 diz respeito ao exame de qualquer medida de expropriação ou avaliação por uma autoridade judicial ou outra autoridade independente da Parte que adota essa medida.

629.

O artigo 9.7 dispõe que cada Parte deve permitir que todas as transferências relacionadas com um investimento abrangido sejam efetuadas numa moeda livremente convertível, sem restrições nem atrasos (artigo 9.7, n.o 1). Contudo, nenhuma disposição do artigo 9.7 pode ser interpretada no sentido de impedir uma Parte de aplicar, de uma forma equitativa e não discriminatória, a sua legislação nas matérias referidas nas alíneas a) a g) do artigo 9.7, n.o 2 (artigo 9.7, n.o 2).

630.

As restantes disposições da secção A dizem respeito à sub‑rogação (artigo 9.8), à cessação de vigência (artigo 9.9) e à relação do EUSFTA com outros acordos (artigo 9.10). Em especial, o artigo 9.9 dispõe que, em caso de denúncia do EUSFTA nos termos do disposto no artigo 17.13, o capítulo nove continua a produzir efeitos por um período adicional de 20 anos a contar da data da mesma, no que respeita aos investimentos abrangidos realizados antes da data de denúncia do EUSFTA. O artigo 9.10, n.o 1, dispõe que, quando o EUSFTA entrar em vigor, os acordos entre os Estados‑Membros e Singapura constantes do anexo 9‑D (incluindo os direitos e obrigações deles decorrentes) deixam de produzir efeitos e devem ser substituídos ou revogados pelo EUSFTA. A nota de rodapé 51 acrescenta que esses acordos devem ser considerados revogados pelo EUSFTA, na aceção do artigo 59.o, n.o 1, alínea a), da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. Os restantes números do artigo 9.10 abordam essencialmente os efeitos da aplicação provisória do EUSFTA sobre a aplicação das disposições dos acordos constantes do anexo 9‑D.

631.

A secção B do capítulo nove é aplicável aos litígios que oponham um demandante de uma Parte à outra Parte em razão de um tratamento (ou de uma omissão) que o demandante considere contrário às disposições da secção A e que tenha alegadamente provocado prejuízos ou danos ao demandante ou à sua empresa estabelecida localmente (artigo 9.11, n.o 1).

632.

Nos termos do artigo 9.12, a forma preferível de resolução de um litígio é a resolução amigável através de negociação. O artigo 9.14 dispõe que as partes no litígio podem, em qualquer altura, acordar em recorrer à mediação ou a outras formas de resolução alternativa de litígios. Caso um litígio não possa ser resolvido de forma amigável, a Parte demandante de uma Parte pode apresentar, num determinado prazo, um pedido de realização de consultas à outra Parte (artigo 9.13). Se o litígio não puder ser resolvido no prazo de três meses a contar da apresentação do pedido de realização de consultas, a Parte demandante pode apresentar uma declaração de intenção de recorrer à arbitragem (artigo 9.15). Se essa declaração de intenção tiver sido enviada à União Europeia, esta deve determinar quem agirá como Parte adversa (ou seja, demandada) num determinado prazo e informar de imediato a Parte demandante da sua decisão (artigo 9.15, n.o 2). Caso essa decisão não seja adotada, o artigo 9.15, n.o 3, estabelece, no essencial, que a Parte demandada deve ser determinada de acordo com a declaração de intenção de recorrer à arbitragem.

633.

No mínimo três meses após a data da declaração de intenção, a Parte demandante pode apresentar, de acordo com os critérios estabelecidos no artigo 9.17 e sujeito a outros requisitos jurisdicionais aplicáveis (artigo 9.17, n.o 5), o pedido de arbitragem a um dos mecanismos de resolução de litígios previstos no artigo 9.16, n.o 1. Esses mecanismos incluem a arbitragem sob a égide do Centro Internacional para a Resolução de Diferendos relativos a Investimentos, por um tribunal arbitral estabelecido em conformidade com as regras de arbitragem da Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional ou qualquer outra instituição de arbitragem ou ao abrigo de quaisquer outras regras de arbitragem em que as partes no litígio acordem.

634.

Os artigos 9.18 a 9.21 dispõem, respetivamente, sobre a constituição do tribunal arbitral; a legislação aplicável e as regras de interpretação; e os pedidos manifestamente destituídos de valor jurídico ou destituídos de fundamento jurídico.

635.

Quando seja proferida uma sentença definitiva que reconheça a existência de uma violação das disposições do capítulo nove, o tribunal pode apenas conceder, separadamente ou em conjunto, a) uma indemnização pecuniária (sujeita aos limites estabelecidos no artigo 9.24, n.o 2) e eventuais juros aplicáveis, e b) a restituição dos bens, desde que a Parte demandada possa pagar uma indemnização pecuniária e eventuais juros aplicáveis em vez da restituição (artigo 9.24, n.o 1). Não podem ser concedidas indemnizações punitivas (artigo 9.24, n.o 2). Os artigos 9.25 e 9.26 dispõem, respetivamente sobre indemnização ou outras formas de compensação e custos.

636.

O artigo 9.27 diz respeito ao efeito vinculativo da sentença e ao seu cumprimento.

637.

De acordo com o artigo 9.28, n.o 1, cada Parte deve abster‑se de conceder proteção diplomática ou apresentar um pedido a nível internacional relativamente a um litígio que um dos seus investidores e a outra Parte aceitaram submeter ou submeteram a arbitragem nos termos da secção B, salvo se essa outra Parte não tiver respeitado ou executado a sentença proferida nesse litígio. Para efeitos do artigo 9.28, n.o 1, a proteção diplomática exclui os contactos diplomáticos informais que visam exclusivamente facilitar uma resolução do litígio. Todavia, o artigo 9.28, n.o 1, não exclui a possibilidade de uma Parte recorrer a processos de resolução de litígios nos termos do capítulo quinze relativamente a uma medida de aplicação geral, mesmo que essa medida tenha alegadamente violado o EUSFTA no que respeita a um investimento específico, em relação ao qual se apresentou um pedido de arbitragem.

638.

Os anexos ao capítulo nove dizem respeito à expropriação (anexos 9‑A a 9‑C); à lista dos acordos existentes entre os Estados‑Membros da União Europeia e Singapura (anexo 9‑D); ao mecanismo de mediação de litígios entre investidores e o Estado (anexo 9‑E); ao código de conduta para árbitros e mediadores (anexo 9‑F); e às regras relativas ao acesso do público a documentos, às audições e à possibilidade de terceiros apresentarem observações (anexo 9‑G).

639.

O capítulo dez («Contratos Públicos») e os seus nove anexos fornecem o enquadramento para os contratos públicos celebrados pelas Partes. Para efeitos do capítulo dez, entende‑se por «contratos abrangidos» a aquisição i) para fins públicos de bens, serviços ou qualquer combinação de ambos, por quaisquer meios contratuais, cujo valor, tal como estimado, é igual ou superior ao limiar especificado nos anexos 10‑A a 10‑G; ii) por uma entidade adjudicante que iii) não se encontre de outra forma excluída (Artigo 10.2, n.o 2). O artigo 10.2, n.o 3, define as situações às quais o capítulo dez não é aplicável (salvo disposição em contrário nos anexos 10‑A a 10‑G).

640.

O artigo 10.3 dispõe sobre segurança e exceções gerais.

641.

O artigo 10.4 estabelece os princípios gerais aplicáveis aos contratos públicos. Em especial, os artigos 10.4, n.o 1, e 10.4, n.o 2, preveem as obrigações de tratamento nacional e outras formas de obrigações de não discriminação. Nos termos do artigo 10.4, n.o 7, essas disposições não são aplicáveis a medidas não especificamente ligadas à adjudicação dos contratos.

642.

O artigo 10.5 estabelece regras relativas à informação que cada Parte deve publicar sobre o seu sistema de contratos.

643.

Para cada contrato abrangido, as entidades adjudicantes devem publicar um anúncio de concurso previsto (artigo 10.6, n.o 1) que deve incluir a informação referida no artigo 10.6, n.o 2. Além disso, para cada contrato abrangido, deve ser publicado um resumo do anúncio (artigo 10.6, n.o 3). O artigo 10.7 estabelece obrigações relativas ao tipo de condições de participação num concurso que as entidades adjudicantes podem (ou não podem) impor; à forma de avaliar se um fornecedor cumpriu essas condições; e aos motivos com base nos quais as Partes podem excluir um fornecedor. O artigo 10.8 diz respeito à qualificação dos fornecedores. O artigo 10.9 estabelece requisitos relativos às especificações técnicas e à documentação do concurso. O artigo 10.10 diz respeito à necessidade de dar tempo suficiente aos fornecedores para prepararem e apresentarem os respetivos pedidos de participação e propostas. O artigo 10.11 aplica‑se à condução de negociações. O artigo 10.12 estabelece as condições nas quais as entidades adjudicantes podem usar um procedimento de concurso limitado e optar por não aplicar algumas das garantias estabelecidas no capítulo dez. O artigo 10.14 contém regras para o tratamento das propostas e a adjudicação dos contratos. O artigo 10.15 estabelece obrigações relativas à informação que as entidades adjudicantes devem prestar aos fornecedores participantes ou publicar.

644.

O artigo 10.16, n.o 1, exige que cada Parte comunique prontamente, a pedido da outra Parte, todas as informações necessárias para determinar se o procedimento de adjudicação foi conduzido de modo equitativo, imparcial e em conformidade com o capítulo quinze. Em circunstâncias definidas, a informação não deve ser divulgada (artigo 10.6, n.o 2).

645.

O artigo 10.17 estabelece requisitos relativos ao tipo de processo administrativo ou judicial que cada Parte deve prever, às condições em esse processo deve ser conduzido e às regras processuais aplicáveis.

646.

Os anexos ao capítulo dez dizem respeito a: entidades da administração central que celebram contratos públicos nos termos do EUSFTA (anexo 10‑A); entidades a nível sub‑central que celebram contratos públicos nos termos do EUSFTA (anexo 10‑B); serviços de utilidade pública e outras entidades que celebram contratos públicos nos termos do EUSFTA (anexo 10‑C); bens abrangidos (anexo 10‑D); serviços abrangidos (anexo 10‑E); serviços de construção e concessões de obras abrangidos (anexo 10‑F); notas gerais e derrogações às disposições do artigo 10.4 (Princípios gerais) (anexo 10‑G); meios de publicação (anexo 10‑H); e parcerias público‑privadas (anexo 10‑I).

647.

O capítulo onze («Propriedade intelectual») tem como objetivos facilitar a produção e a comercialização de produtos inovadores e criativos e a prestação de serviços entre as Partes, bem como aumentar os benefícios decorrentes do comércio e do investimento através da proteção eficaz dos direitos de propriedade intelectual e da adoção de medidas com vista à aplicação efetiva desses direitos (artigo 11.1, n.o 1). Os objetivos e os princípios enunciados na parte I do Acordo TRIPS (nomeadamente nos artigos 7.° e 8.°) aplicam‑se ao capítulo onze, mutatis mutandis (artigo 11.1, n.o 2).

648.

A secção A aborda o âmbito de aplicação do capítulo onze, as definições pertinentes e o esgotamento dos direitos de propriedade intelectual. O artigo 11.2, n.o 1, dispõe que o capítulo onze complementa os direitos e as obrigações que incumbem às Partes no âmbito do Acordo TRIPS e de outros tratados internacionais no domínio da propriedade intelectual de que ambas sejam partes. Para efeitos do capítulo onze, entende‑se por «direitos de propriedade intelectual» todas as categorias da propriedade intelectual que constituem o objeto das secções 1 a 7 da parte II do Acordo TRIPS, designadamente: direitos de autor e direitos conexos; patentes; marcas comerciais; desenhos e modelos; configurações (topografias) de circuitos integrados; indicações geográficas; e proteção de informações não divulgadas (artigo 11.2, n.o 2, alínea a), subalíneas i) a vii), respetivamente), bem como os direitos de proteção das variedades vegetais (artigo 11.2, n.o 2, alínea b). De acordo com o artigo 11.3, cada Parte pode estabelecer livremente o seu próprio regime respeitante ao esgotamento dos direitos de propriedade intelectual, sob reserva das disposições do Acordo TRIPS.

649.

Cada subsecção da secção B aborda um direito de propriedade intelectual específico (ou um conjunto de direitos de propriedade intelectual).

650.

A subsecção A tem como epígrafe «Direitos de autor e direitos conexos». Nos termos do artigo 11.4 («Proteção concedida»), as Partes devem respeitar os direitos e as obrigações decorrentes de outros acordos internacionais, designadamente: da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas; do Tratado da OMPI sobre o Direito de Autor; do Tratado da OMPI sobre Prestações e Fonogramas; e do Acordo TRIPS. O artigo 11.5 define os prazos da proteção dos direitos de autor e direitos conexos.

651.

O resto da subsecção A diz respeito ao direito dos produtores de fonogramas a uma remuneração equitativa (artigo 11.6), às práticas e políticas em matéria de direitos de sequência dos artistas (artigo 11.7), à disponibilização de proteção jurídica adequada e recursos jurídicos eficazes contra a evasão a medidas de caráter tecnológico eficazes utilizadas pelos titulares de direitos no âmbito do exercício dos seus direitos e que, em relação às suas obras, prestações e fonogramas, restringe atos que não são autorizados pelos autores, artistas ou produtores de fonogramas em causa ou permitidos pela legislação interna (artigo 11.9) e à proteção das informações eletrónicas para a gestão dos direitos (artigo 11.10).

652.

A subsecção B tem como epígrafe «Marcas comerciais». De acordo com o artigo 11.12, cada Parte deve envidar todos os esforços razoáveis para respeitar o Tratado sobre o Direito das Marcas (concluído em Genebra, em 27 de outubro de 1994) e o Tratado de Singapura sobre o Direito das Marcas (adotado em Singapura, em 27 de março de 2006). Cada Parte deve instaurar um sistema de registo de marcas, no âmbito do qual a administração competente em matéria de marcas deve fundamentar, por escrito, uma recusa de registo de uma marca comercial. O requerente deve ter a oportunidade de recorrer da decisão de recusa junto de uma autoridade judicial; deve ser introduzida a possibilidade de rejeição dos pedidos de uma marca comercial por parte de terceiros e cada Parte deve criar uma base de dados eletrónica pública dos pedidos e dos registos de marcas comerciais (artigo 11.13). As Partes devem proteger as marcas bem conhecidas em conformidade com o Acordo TRIPS (artigo 11.14). O artigo 11.15 prevê exceções aos direitos conferidos por uma marca comercial.

653.

A subsecção C («Indicações geográficas») aplica‑se ao reconhecimento e à proteção das indicações geográficas de vinhos, bebidas espirituosas, produtos agrícolas e géneros alimentícios originários dos territórios das Partes (artigo 11.16, n.o 1). Assim que o EUSFTA entrar em vigor, as Partes devem estabelecer sistemas de registo e proteção das indicações geográficas para essas categorias de bens que considerem adequadas (artigo 11.17). As restantes disposições dizem respeito a questões como o âmbito de aplicação da proteção das indicações geográficas (artigo 11.19) ou as pessoas que podem usar uma indicação geográfica protegida (artigo 11.20).

654.

A subsecção D tem como epígrafe «Desenhos e modelos». As Partes devem assegurar a proteção dos desenhos ou modelos criados de forma independente que sejam novos ou originais. Essa proteção concretiza‑se mediante registo e confere aos seus titulares direitos exclusivos (artigo 11.24, n.o 1). O artigo 11.25 estabelece o âmbito dos direitos conferidos pelo registo ao titular de um desenho ou modelo protegido. A duração da proteção oferecida deve ser de, pelo menos, 10 anos a contar da data do pedido (artigo 11.26). O artigo 11.27 diz respeito às exceções limitadas à proteção dos desenhos ou modelos. O artigo 11.28 aborda a relação entre os desenhos ou modelos protegidos e o direito de autor.

655.

A subsecção E tem como epígrafe «Patentes». Através do artigo 11.29, as Partes reiteram as obrigações que lhes incumbem ao abrigo do Tratado de Cooperação em matéria de Patentes e, se for caso disso, comprometem‑se a envidar todos os esforços razoáveis para respeitar os artigos 1.° a 16.° do Tratado sobre o Direito das Patentes de uma forma compatível com a respetiva legislação nacional e os procedimentos internos. As Partes comprometem‑se igualmente a respeitar a Decisão do Conselho Geral da OMC, de 30 de agosto de 2003, sobre a aplicação do n.o 6 da Declaração de Doha sobre o Acordo TRIPS e a Saúde Pública, bem como a Decisão do Conselho Geral da OMC, de 6 de dezembro de 2005, relativa à alteração do Acordo TRIPS. O artigo 11.31 estabelece as condições nas quais as Partes devem prever a possibilidade de prorrogar a duração dos direitos conferidos pela proteção através de patente.

656.

A subsecção F («Proteção de dados de ensaio») diz respeito à proteção dos dados de ensaio apresentados para efeitos da obtenção de uma autorização administrativa de introdução no mercado, respetivamente, de um produto farmacêutico ou de um produto químico para a agricultura (artigos 11.33 e 11.34).

657.

A única disposição da subsecção G («Variedades vegetais») dispõe que as Partes reafirmam as suas obrigações ao abrigo da Convenção Internacional para a Proteção das Obtenções Vegetais, incluindo o seu direito de aplicar a exceção facultativa ao direito do obtentor prevista no artigo 15.o, n.o 2, dessa Convenção (artigo 11.35).

658.

A secção C tem como epígrafe «Execução de natureza cível dos direitos de propriedade intelectual». No artigo 11.36, as Partes reiteram os seus compromissos ao abrigo dos artigos 41.° a 50.° do Acordo TRIPS. Concordam em estabelecer medidas, procedimentos e vias de recurso ao abrigo da respetiva legislação interna contra as infrações aos direitos de propriedade intelectual abrangidos pelo capítulo onze, compatíveis com esses compromissos (artigo 11.36, n.o 1). Tais medidas, procedimentos e vias de recurso devem preencher os requisitos estabelecidos no artigo 11.36, n.o 2. O artigo 11.36, n.o 3, prevê que nenhuma disposição do capítulo onze afeta a capacidade de cada Parte de aplicar a ordem jurídica nacional nem cria qualquer obrigação para qualquer uma das Partes de alterar a respetiva legislação em vigor no que diz respeito à execução dos direitos de propriedade intelectual. Além disso, nenhuma disposição desse capítulo impõe a qualquer das Partes uma obrigação de instituir um sistema judicial distinto para assegurar a aplicação efetiva dos direitos de propriedade intelectual ou relativa à repartição de meios entre a aplicação efetiva dos direitos de propriedade intelectual e a aplicação da lei em geral.

659.

O resto da secção C aborda, em especial, a obrigação de adotar as medidas adequadas para publicar ou disponibilizar ao público informações sobre as decisões judiciais finais nos processos judiciais de natureza cível instituídos em virtude de infrações aos direitos de propriedade intelectual (artigo 11.37); a obrigação de disponibilizar as medidas, os procedimentos e os recursos de natureza cível referidos na secção C no que diz respeito a todas as categorias da propriedade intelectual que constituem o objeto das secções 1 a 6 da parte II do Acordo TRIPS (artigo 11.38); as medidas de preservação da prova (artigo 11.39); as medidas inibitórias (artigo 11.42); as medidas alternativas (artigo 11.43); e as indemnizações por perdas e danos (artigo 11.44).

660.

A secção D tem como epígrafe «Medidas na fronteira». O artigo 11.49 estabelece o âmbito de aplicação dessas medidas, especificamente em relação aos procedimentos relativos às mercadorias sob controlo aduaneiro. O artigo 11.50 exige que as autoridades aduaneiras adotem uma série de abordagens para identificar as expedições que contenham mercadorias apresentadas sob uma marca de contrafação, mercadorias pirateadas em desrespeito do direito de autor, mercadorias pirateadas relativamente a um desenho ou modelo e mercadorias apresentadas sob uma indicação geográfica de contrafação. O artigo 11.51 identifica as áreas em que as Partes acordam em cooperar.

661.

A única disposição da secção E («Cooperação») refere que as Partes acordam em cooperar com o objetivo de cumprir os compromissos e obrigações referidos no capítulo onze e identifica as atividades que devem ser incluídas nos domínios de cooperação (artigo 11.52).

662.

O capítulo doze («Concorrência e questões conexas») dispõe sobre antitrust e concentrações, empresas públicas, empresas que beneficiam de direitos especiais ou exclusivos e monopólios estatais.

663.

A secção A diz respeito a «Antitrust e concentrações». No artigo 12.1, n.o 1, as Partes reconhecem a importância de uma concorrência livre e não distorcida nas suas relações comerciais e reconhecem que as práticas ou as transações comerciais anticoncorrenciais podem distorcer o bom funcionamento dos mercados das Partes e minar as vantagens da liberalização do comércio. O artigo 12.1, n.o 2 dispõe que, para promover uma concorrência livre e não distorcida em todos os setores da sua economia, as Partes devem manter legislação abrangente que aborde de forma eficaz três questões que afetam o comércio entre elas, designadamente: a) os acordos horizontais e verticais; b) a exploração abusiva de uma posição dominante; e c) as operações de concentração de empresas que resultem numa redução assinalável da concorrência ou que sejam suscetíveis de entravar de modo significativo uma concorrência efetiva.

664.

A secção B diz respeito a «Empresas públicas, empresas que beneficiam de direitos especiais ou exclusivos e monopólios estatais». O artigo 12.3, n.o 1, prevê que as disposições do capítulo doze não devem impedir nenhuma das Partes, em conformidade com a respetiva legislação, de designar ou manter empresas públicas e empresas que beneficiam de direitos especiais ou exclusivos. O resto do artigo 12.3 estabelece obrigações no que diz respeito às condições aplicáveis a tais empresas. O artigo 12.4 dispõe que as Partes podem continuar a designar ou a manter monopólios estatais. Contudo, devem adaptar os monopólios estatais de natureza comercial, de modo a assegurar que esses monopólios não exerçam qualquer discriminação na aquisição e comercialização de mercadorias e serviços.

665.

A secção C diz respeito às «Subvenções». Os artigos 12.5, n.o 1, e 12.5, n.o 2, definem subvenção para efeitos do EUSFTA e determinam que tipos de subvenções devem ser objeto do capítulo doze. O artigo 12.5, n.o 3, dispõe que as disposições dos artigos 12.7 («Subvenções proibidas»), 12.8 («Outras subvenções») e 12.10 («Cláusula de reexame»), bem como do anexo 12‑A, não são aplicáveis a várias subvenções nos setores da pesca e da agricultura. As disposições da secção C não prejudicam os direitos e obrigações das Partes ao abrigo do Acordo OMC (artigo 12.6). O artigo 12.7 determina que tipos de subvenções, relacionadas com o comércio de mercadorias e serviços, são proibidas e prevê exceções. O artigo 12.8, n.o 2, diz respeito à troca de informações respeitante a essas subvenções. O artigo 12.9 estabelece obrigações de transparência. O artigo 12.10, n.o 1, exige que as Partes procedam ao acompanhamento constante das questões abordadas na secção C.

666.

A secção D («Questões de caráter geral») estabelece obrigações relativas à cooperação e à coordenação em matéria de aplicação da lei (artigo 12.11), à confidencialidade (artigo 12.12) e à consulta (artigo 12.13). O artigo 12.14 exclui todas as questões decorrentes do disposto no capítulo doze, com exceção do artigo 12.7 («Subvenções proibidas»), do âmbito de aplicação dos capítulos quinze («Resolução de litígios») e dezasseis («Mecanismo de mediação»).

667.

O anexo 12‑A estabelece princípios aplicáveis a outras subvenções.

668.

O capítulo treze tem como epígrafe «Comércio e Desenvolvimento Sustentável».

669.

A secção A contém «Disposições introdutórias». O artigo 13.1 refere‑se a vários instrumentos internacionais e reitera o compromisso assumido pelas Partes no sentido de desenvolver e promover o comércio internacional e as suas relações comerciais e económicas bilaterais de modo a contribuir para o objetivo de desenvolvimento sustentável (artigo 13.1, n.o 1). As Partes reconhecem que o desenvolvimento económico, o desenvolvimento social e a proteção do ambiente são interdependentes e constituem componentes do desenvolvimento sustentável que se reforçam mutuamente e sublinham a vantagem da cooperação nas questões sociais e ambientais associadas ao comércio enquanto Parte de uma abordagem global do comércio e do desenvolvimento sustentável (artigo 13.1, n.o 2). As Partes reconhecem igualmente que é inapropriado encorajar o comércio ou o investimento através do enfraquecimento ou de uma redução dos níveis de proteção previstos na legislação interna em matéria de ambiente e trabalho mas salientam que as normas em matéria de ambiente e trabalho não devem ser utilizadas para fins de protecionismo comercial (artigo 13.1, n.o 3). Além disso, as Partes referem que têm como objetivo reforçar as suas relações comerciais e a cooperação de forma a promover o desenvolvimento sustentável no contexto dos artigos 13.1, n.o 1, e 13.1, n.o 2, e declaram que não pretendem harmonizar as respetivas normas relativas ao trabalho e ao ambiente (artigo 13.1, n.o 4).

670.

Cada Parte conserva o direito de estabelecer os seus próprios níveis de proteção do ambiente e do trabalho e de aprovar ou alterar em conformidade as respetivas legislações e políticas aplicáveis, em conformidade com os princípios de normas internacionalmente reconhecidas ou de acordos, referidos nos artigos 13.3 e 13.6, de que sejam partes (artigo 13.2, n.o 1). As Partes devem continuar a melhorar essas legislações e políticas, bem como desenvolver esforços para garantir e incentivar níveis elevados de proteção do ambiente e do trabalho (artigo 13.2, n.o 2).

671.

A secção B intitula‑se «Comércio e desenvolvimento sustentável — aspetos relacionados com o trabalho». As Partes reconhecem o valor da cooperação e dos acordos internacionais em matéria de emprego e questões laborais assumidos pela comunidade internacional em resposta aos desafios e às oportunidades nos domínios económico, social e do emprego decorrentes da globalização; e comprometem‑se a consultar e a cooperar, conforme necessário, em questões de trabalho e emprego relacionadas com o comércio que se revistam de interesse mútuo (artigo 13.3, n.o 1). As Partes reiteram igualmente os seus compromissos no sentido de reconhecer o emprego pleno e produtivo e o trabalho digno para todos, enquanto elemento fundamental de um desenvolvimento sustentável de todos os países e objetivo prioritário da cooperação internacional; e decidem promover o desenvolvimento do comércio internacional de modo a viabilizar o emprego pleno e produtivo, bem como o trabalho digno para todos (artigo 13.3, n.o 2). Em conformidade com as obrigações que lhes incumbem ao abrigo da OIT e com a Declaração da OIT relativa aos princípios e direitos fundamentais no trabalho e seu seguimento, as Partes comprometem‑se a respeitar, promover e aplicar efetivamente os princípios relativos aos direitos fundamentais no trabalho, nomeadamente: a) a liberdade de associação e o reconhecimento efetivo do direito à negociação coletiva; b) a eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou obrigatório; c) a eliminação efetiva do trabalho infantil; e d) a eliminação da discriminação no emprego e na atividade profissional. As Partes reiteram igualmente o respetivo compromisso de aplicar efetivamente as convenções da OIT que Singapura e os Estados‑Membros da União Europeia ratificaram (artigo 13, n.o 3). As Partes comprometem‑se a envidar esforços contínuos e sustentados no sentido de ratificar e aplicar efetivamente as convenções fundamentais da OIT; a ponderar a possibilidade de ratificar e aplicar efetivamente outras convenções da OIT, tendo em conta as circunstâncias nacionais; e a proceder ao intercâmbio de informações relevantes (artigo 13.3, n.o 4). O artigo 13.3, n.o 5, dispõe que as Partes reconhecem que a violação de princípios e normas fundamentais em matéria de trabalho não pode ser invocada ou de outro modo utilizada como uma legítima vantagem comparativa.

672.

No artigo 13.4, as Partes reconhecem a importância de cooperar em aspetos em matéria de trabalho relacionados com o comércio, de modo a realizar os objetivos do EUSFTA. Esta disposição contém igualmente uma lista (não‑exaustiva) de domínios nos quais as Partes podem encetar atividades de cooperação em benefício mútuo.

673.

O artigo 13.5 dispõe que as Partes devem ter em consideração informações científicas e técnicas pertinentes e normas, orientações ou recomendações internacionais relacionadas, bem como o princípio da precaução, no contexto da preparação e aplicação das medidas que visam a saúde e segurança no trabalho, suscetíveis de afetar o comércio ou o investimento entre as Partes.

674.

A secção C tem a epígrafe «Comércio e desenvolvimento sustentável — aspetos relacionados com o ambiente». As Partes reconhecem o valor da governação e dos acordos internacionais em matéria de ambiente; salientam a necessidade de melhorar a complementaridade (sic) entre as políticas, regras e medidas comerciais e ambientais; e declaram que irão dialogar e cooperar, conforme necessário, no que diz respeito às negociações sobre questões de ambiente relacionadas com o comércio que se revistam de interesse mútuo (artigo 13.6, n.o 1). Além disso, as Partes comprometem‑se a aplicar efetivamente, através de legislação, regulamentações ou outras medidas e práticas, nos seus territórios, os acordos multilaterais em matéria de ambiente dos quais são Partes (artigo 13.6, n.o 2). As Partes reiteram o seu empenhamento em concretizar o objetivo final da Convenção‑Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas («CQNUAC») e do seu Protocolo de Quioto e acordam em trabalhar em conjunto para reforçar o sistema multilateral assente em regras ao abrigo da CQNUAC, com base nas decisões acordadas nesta Convenção‑Quadro, e a apoiar os esforços de desenvolvimento, no âmbito da CQNUAC, de um acordo internacional em matéria de alterações climáticas aplicável a partir de 2020 a todas as Partes (artigo 13.6, n.o 3). Nenhuma disposição do EUSFTA deve ser interpretada no sentido de impedir a adoção ou a manutenção, por qualquer das Partes, de medidas destinadas a pôr em prática os acordos multilaterais em matéria de ambiente de que são signatárias, desde que essas medidas não sejam aplicadas de um modo que constitua um meio de discriminação arbitrária ou injustificada entre as Partes ou uma restrição dissimulada ao comércio (artigo 13.6, n.o 4).

675.

O artigo 13.7 aborda o comércio de madeira e de produtos de madeira. As Partes reconhecem a importância da conservação e gestão sustentável das florestas a nível mundial. Comprometem‑se a: a) trocar informações sobre estratégias para promover o comércio e o consumo de madeira e de produtos de madeira provenientes de florestas geridas de forma legal e sustentável, e para melhor dar a conhecer estas estratégias; b) promover a aplicação efetiva da legislação e governação no domínio das florestas a nível mundial e abordar o problema do comércio de madeira abatida ilegalmente e de produtos conexos; c) cooperar com vista a promover a eficácia das medidas ou políticas destinadas a combater o comércio de madeira abatida ilegalmente e de produtos conexos; e d) promover a utilização efetiva da Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies de Fauna e Flora Selvagens Ameaçadas de Extinção no que respeita às espécies de madeira que estejam em risco.

676.

O artigo 13.8 diz respeito ao comércio de produtos da pesca. As Partes reconhecem a importância de assegurar a conservação e a gestão sustentáveis dos recursos haliêuticos e comprometem‑se a: a) respeitar as medidas de conservação a longo prazo e a exploração sustentável dos recursos haliêuticos, conforme definido nos instrumentos internacionais ratificados pelas respetivas Partes e defender os princípios da Organização para a Alimentação e a Agricultura («FAO») e os instrumentos pertinentes da ONU relativos a estas questões; b) introduzir e aplicar medidas eficazes de luta contra a pesca ilegal, não declarada e não regulamentada («INN»), facilitar medidas para prevenir a entrada de produtos da pesca INN nos fluxos comerciais e o intercâmbio de informações sobre as atividades de pesca INN; c) adotar medidas efetivas de monitorização e controlo para garantir o cumprimento das medidas de conservação; e d) defender os princípios do Acordo da FAO para a promoção do cumprimento das medidas internacionais de conservação e de gestão pelos navios de pesca no alto mar e respeitar as disposições pertinentes do Acordo da FAO relativo às medidas que os Estados de porto devem adotar para evitar, impedir e eliminar a pesca INN.

677.

O artigo 13.9 está redigido em termos quase idênticos aos do artigo 13.5, a não ser o facto de se referir e aplicar a «medidas que visam a proteção do ambiente» e não da saúde e segurança no trabalho.

678.

No artigo 13.10, as Partes reconhecem a importância de cooperar em aspetos da política de ambiente relacionados com o comércio, de modo a realizar os objetivos do EUSFTA. Esta disposição contém uma lista (não exaustiva) de domínios nos quais as Partes podem encetar atividades de cooperação em benefício mútuo.

679.

A secção D contém «Disposições gerais». O artigo 13.11 refere a decisão das Partes de continuarem a envidar esforços acrescidos para facilitar e promover o comércio e o investimento em mercadorias e serviços ambientais (13.11, n.o 1), a obrigação de envidarem esforços, em especial, para facilitar a supressão dos obstáculos ao comércio ou ao investimento relativos a mercadorias e serviços respeitadores do ambiente (13.11, n.o 2), a necessidade de reduzirem as emissões de gases com efeito de estufa e de limitarem tanto quanto possível as distorções do comércio (13.11, n.o 3) e as práticas de responsabilidade social das empresas (13.11, n.o 4).

680.

Nos termos do artigo 13.12, nenhuma Parte deve renunciar ou criar derrogações, nem oferecer‑se para renunciar ou criar derrogações, à sua legislação em matéria de ambiente e de trabalho, de uma forma que afete o comércio ou o investimento entre as Partes (artigo 13.12, n.o 1); ou renunciar, em virtude de uma ação ou inação sustentada ou recorrente, de uma forma que afete o comércio ou o investimento entre as Partes, à aplicação efetiva da sua legislação em matéria de ambiente e de trabalho (artigo 13.12, n.o 2).

681.

O artigo 13.13 estabelece obrigações de transparência relativamente a qualquer medida de aplicação geral destinada a proteger o ambiente ou as condições de trabalho, suscetível de afetar o comércio e o investimento entre as Partes. Os artigos 13.14 e 13.15 abordam a revisão do impacto da aplicação do EUSFTA no desenvolvimento sustentável e os mecanismos institucionais para monitorizar o respeito pelo disposto no capítulo treze.

682.

Se estiverem em desacordo quanto a quaisquer questões relacionadas com o capítulo treze, as Partes apenas podem recorrer aos procedimentos previstos no artigo 13.16 («Consultas a nível do Governo») e no artigo 13.17 («Painel de peritos»). Os capítulos quinze («Resolução de litígios») e dezasseis («Mecanismo de mediação») não se aplicam ao capítulo treze (artigo 13.16, n.o 1). Os artigos 13.16, n.o 2, a 13.16, n.o 6, estabelecem os procedimentos para as consultas a nível do Governo e os objetivos destas consultas. O artigo 13.17 define, inter alia, os mecanismos e procedimentos para a constituição de um painel de peritos encarregado de analisar qualquer questão que não tenha sido solucionada de forma satisfatória pela comissão de comércio prevista no artigo 13.16, n.o 4.

683.

O capítulo catorze («Transparência») tem como objetivos instaurar um quadro normativo transparente e previsível para os operadores económicos (artigo 14.2, n.o 1), reiterar os compromissos ao abrigo do Acordo OMC e definir esclarecimentos e disposições melhoradas para efeitos de transparência, consulta e melhoria da administração das medidas de aplicação geral (artigo 14.2, n.o 2). Entende‑se por «medidas de aplicação geral» leis, regulamentos, decisões judiciais, procedimentos e decisões administrativas que podem ter um impacto sobre qualquer matéria abrangida pelo EUSFTA. Estão, todavia, excluídas as decisões aplicáveis a uma pessoa em particular [artigo 14.1, alínea a)].

684.

O artigo 14.3 estabelece as obrigações em matéria de publicação que incumbem a cada Parte no que diz respeito quer às medidas de aplicação geral (artigo 14.3, n.o 1) quer a qualquer proposta de adoção ou de alteração de uma medida de aplicação geral (artigo 14.3, n.o 2). O artigo 14.4, n.o 1, exige que cada Parte designe um ponto de contacto para facilitar a aplicação efetiva do EUSFTA e a comunicação entre as Partes sobre quaisquer questões abrangidas por este acordo. Os artigos 14.4, n.o 2, a 14.4, n.o 8, contêm mais pormenores sobre esse ponto de contacto, o seu funcionamento e os pedidos de informação que lhe podem ser dirigidos.

685.

O artigo 14.5 estabelece as obrigações que devem ser cumpridas a fim de administrar, de forma coerente, imparcial e razoável, todas as medidas de aplicação geral. Em especial, cada Parte deve: a) envidar esforços para notificar as pessoas interessadas da outra Parte, diretamente afetadas por um processo, com uma antecedência razoável, em conformidade com os seus procedimentos, do início desse processo; b) garantir às pessoas interessadas uma oportunidade razoável para apresentarem factos e argumentos em apoio da sua posição antes de qualquer decisão administrativa final; e c) garantir que os seus processos se baseiam na respetiva legislação e estão em conformidade com a mesma.

686.

O artigo 14.6, n.o 1, exige que as Partes instituam ou mantenham tribunais ou processos judiciais, quase‑judiciais ou administrativos para assegurar o reexame imediato e, sempre que tal se justifique, a retificação das medidas administrativas relativas às questões abrangidas pelo EUSFTA. Os tribunais devem ser imparciais e independentes do serviço ou autoridade responsável pela aplicação administrativa das disposições e não devem possuir qualquer interesse significativo no desenlace da questão em apreço (14.6, n.o 1). As Partes devem igualmente assegurar que, em qualquer dos tribunais ou processos referidos no artigo 14.6, n.o 1, as partes no processo tenham direito a: a) uma oportunidade razoável de fundamentar ou defender as suas posições; e b) uma decisão fundada nos elementos de prova e nas alegações ou, se exigido por lei, o processo compilado pela autoridade administrativa (artigo 14.6, n.o 2). O artigo 14.6, n.o 3, dispõe sobre a aplicação dessas decisões.

687.

As Partes acordam em cooperar com vista à promoção da qualidade e eficácia da legislação nas respetivas políticas regulamentares (artigo 14.7, n.o 1) e à promoção dos princípios de boa conduta administrativa (artigo 14.7, n.o 2).

688.

O artigo 14.8 dispõe que, sempre que existam regras específicas e diferentes relativas à matéria objeto do capítulo catorze enunciadas noutros capítulos do EUSFTA, essas regras prevalecem.

689.

O capítulo quinze («Resolução de Litígios») tem como objetivo prevenir e resolver quaisquer diferendos que possam ocorrer entre as Partes, relativos à interpretação e aplicação do EUSFTA, com vista a alcançar, na medida do possível, uma solução mutuamente acordada (artigo 15.1). Salvo disposição expressa em contrário, o capítulo quinze é aplicável a qualquer diferendo respeitante à interpretação e aplicação do EUSFTA (artigo 15.2).

690.

Os procedimentos instituídos nos artigos 15.3 a 15.13 preveem as seguintes fases do mecanismo de resolução de litígios: consultas de boa‑fé, de modo a alcançar uma solução mutuamente acordada (artigos 15.3, n.o 1, a 15.3, n.o 4); pedido de constituição de um painel de arbitragem, em conformidade com o artigo 15.4, se as consultas forem concluídas sem que se tenha alcançado uma solução mutuamente acordada (artigo 15.3, n.o 5); arbitragem (artigos 15.4 a 15.8); procedimentos relativos ao cumprimento (artigos 15.9 a 15.11); aplicação de medidas corretivas em caso de não cumprimento (artigo 15.12); e revisão das medidas adotadas para dar cumprimento à decisão após a suspensão das obrigações (artigo 15.13).

691.

Os artigos 15.14 a 15.19 contêm várias regras relativas a procedimentos de arbitragem, que são complementadas pelo anexo 15‑A. As disposições gerais da secção D dispõem sobre a lista de árbitros (artigo 15.20); a relação entre o mecanismo de resolução de litígios previsto no capítulo quinze e o mecanismo de resolução de litígios da OMC (artigo 15.21); os prazos (artigo 15.22); e a revisão e alteração do capítulo quinze (artigo 15.23).

692.

O capítulo dezasseis («Mecanismo de mediação») tem como objetivo facilitar a procura de uma solução mutuamente acordada através de um processo de mediação abrangente e rápido (artigo 16.1). O capítulo dezasseis é aplicável a qualquer medida abrangida pelo âmbito de aplicação do EUSFTA que possa afetar negativamente o comércio e o investimento entre as Partes, salvo disposição em contrário (artigo 16.2).

693.

Antes do início do procedimento de mediação, uma das Partes pode, a qualquer momento, solicitar por escrito informações relativamente a tal medida (artigo 16.2). O procedimento instituído nos artigos 16.3 a 16.6 prevê as seguintes fases do mecanismo de mediação: pedido para que seja dado início à mediação (artigo 16.3); seleção do mediador (artigo 16.4); a própria mediação (artigo 16.5); e aplicação de uma solução mutuamente acordada (artigo 16.6). O artigo 16.7 diz respeito à relação entre a mediação e a resolução de litígios. As restantes disposições são relativas aos prazos (artigo 16.8), aos custos (artigo 16.9) e à revisão (artigo 16.10).

694.

O capítulo dezassete tem como epígrafe «Disposições Institucionais, Gerais e Finais». Os artigos 17.1 e 17.2 estabelecem uma estrutura institucional composta por vários comités nos quais as Partes se devem reunir para supervisionar e facilitar a aplicação e a execução do EUSFTA. O artigo 17.3 dispõe que, se qualquer disposição do Acordo OMC que tenham incorporado no EUSFTA for alterada, as Partes devem, sendo caso disso, consultar‑se a fim de encontrar uma solução mutuamente satisfatória. O artigo 17.4 aborda a tomada de decisões no âmbito dos vários comités. O artigo 17.5 diz respeito a eventuais alterações do EUSFTA.

695.

O artigo 17.6, n.o 1, dispõe que o EUSFTA é aplicável a medidas fiscais apenas na medida em que tal seja necessário para que as disposições do EUSFTA produzam efeitos. De acordo com o artigo 17.6, n.o 2, nenhuma disposição do EUSFTA prejudica os direitos e as obrigações de Singapura ou da União Europeia, ou de um dos seus Estados‑Membros, decorrentes de quaisquer convenções de natureza fiscal entre Singapura e um ou vários Estados‑Membros da União Europeia. Os artigos 17.6, n.o 3, e 17.6, n.o 4, estabelecem que nenhuma disposição do EUSFTA obsta à adoção ou manutenção de determinados tipos de medidas fiscais e medidas destinadas a impedir a evasão ou a fraude fiscal. O artigo 17.6, n.o 5, diz respeito ao direito de Singapura de adotar ou manter medidas fiscais necessárias para proteger os interesses imperiosos de ordem pública decorrentes de condicionalismos específicos de espaço.

696.

As Partes devem autorizar, numa moeda livremente convertível e em conformidade com o disposto no artigo VIII dos Estatutos do Fundo Monetário Internacional, todos os pagamentos e transferências da balança de transações correntes da balança de pagamentos entre elas (artigo 17.7). Nesse contexto, as Partes devem consultar‑se mutuamente (artigo 17.7).

697.

Cada Parte deve incentivar os seus fundos soberanos a respeitar os princípios e práticas geralmente aceites («Princípios de Santiago») (artigo 17.8).

698.

O artigo 17.9 diz respeito às condições e procedimentos que permitem a uma Parte que se encontre em dificuldades graves a nível da balança de pagamentos ou das finanças externas, ou sob tal ameaça, tomar ou manter medidas restritivas no que diz respeito ao comércio de mercadorias, de serviços e ao estabelecimento, bem como aos pagamentos e às transferências relacionadas com os investimentos.

699.

O artigo 17.10 estabelece uma cláusula de exceções por razões de segurança, que permite às Partes tomar as medidas necessárias para proteger os seus interesses essenciais em matéria de segurança.

700.

As restantes disposições do capítulo dezassete dizem respeito à divulgação de informações e à proteção de informações confidenciais (artigo 17.11); à entrada em vigor do EUSFTA (artigo 17.12); ao seu período de vigência e à cessação da sua vigência (artigo 17.13); ao cumprimento das obrigações que lhes incumbem por força do EUSFTA (artigo 17.14); à ausência de efeito direto (artigo 17.15); aos anexos, apêndices, declarações comuns, protocolos e memorandos de entendimento que fazem parte integrante do EUSFTA (artigo 17.16); às relações entre o EUSFTA e o Acordo de Parceria e Cooperação e o Acordo OMC (Artigo 17.17); às futuras adesões à União Europeia (artigo 17.18); à aplicação territorial do EUSFTA (artigo 17.19); e às versões do EUSFTA que fazem fé, ou seja, os textos nas línguas alemã, búlgara, checa, croata, dinamarquesa, eslovaca, eslovena, espanhola, estónia, finlandesa, francesa, grega, húngara, inglesa, italiana, letã, lituana, maltesa, neerlandesa, polaca, portuguesa, romena e sueca (artigo 17.20).

701.

O Protocolo n.o 1 é relativo à definição da noção de «produtos originários» e aos métodos de cooperação administrativa. Os Memorandos de entendimento n.os 1 a 5 são relativos, respetivamente, ao artigo 17.6 (Fiscalidade); à remuneração dos árbitros; às disposições suplementares em matéria aduaneira; ao reconhecimento mútuo dos programas dos operadores económicos autorizados; e aos condicionalismos específicos de Singapura em matéria de espaço ou de acesso aos recursos naturais.


( 1 ) Língua original: inglês.

( 2 ) O texto do EUSFTA está disponível ao público no sítio Internet da Comissão: http://comércio.ec.europa.eu/doclib/press/index.cfm?id=961. Para um resumo muito sucinto, v. n.os 9 a 30, infra; para um resumo mais detalhado, v. anexo às presentes conclusões. O resumo constante do anexo às presentes conclusões baseia‑se na versão em língua inglesa do texto do EUSFTA, que a Comissão forneceu ao Tribunal de Justiça (em anexo ao seu pedido). Seguidamente, forneceu ao Tribunal de Justiça traduções do EUSFTA em todas as línguas oficiais da União Europeia. Aquando da elaboração e tradução das presentes conclusões, constatou‑se a existência de certas diferenças entre a versão original inicialmente fornecida em inglês pela Comissão e i) a versão inglesa disponível ao público, assim como ii) as outras versões linguísticas fornecidas pela Comissão. Também a numeração das notas de rodapé diferem entre a versão inglesa (quer a fornecida pela Comissão quer a disponível na Internet) e as outras versões linguísticas. Uma vez que a única versão disponível ao público aquando da apresentação das presentes conclusões era a inglesa, utilizei a numeração que figura nessa versão, mas indiquei, sempre que me apercebi, que determinada nota pode ter um número diferente noutras versões linguísticas. Não posso garantir que não tenham sido feitas outras alterações. Por exemplo, a versão que está disponível ao público contém mais um considerando: «Reiterando o direito de cada Parte de adotar e implementar medidas necessárias à prossecução de objetivos legítimos de políticas públicas, nomeadamente objetivos sociais, ambientais, de segurança, de saúde e segurança públicas, e de reforço e proteção da diversidade cultural»).

( 3 ) Ou seja, os acordos constantes do apêndice 1 do Memorando de Entendimento sobre as Regras e Processos que regem a Resolução de Litígios da OMC.

( 4 ) V., a este respeito, parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.os 34, 53, 71, 98 e 105. Nesse parecer, o Tribunal de Justiça analisou as matérias e os objetivos de vários acordos internacionais que fazem parte do Acordo de Marraquexe que cria a Organização Mundial do Comércio («Acordo OMC»), em especial o Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços («GATS») e o Acordo sobre os Aspetos dos Direitos de Propriedade Intelectual Relacionados com o Comércio («Acordo TRIPS»), e vários acordos que regulam comércio de mercadorias incluídos no anexo 1A («Acordos Multilaterais sobre o Comércio de Mercadorias») do Acordo OMC, tais como o Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994 («GATT de 1994») e o Acordo sobre os Obstáculos Técnicos ao Comércio («Acordo OTC»).

( 5 ) Quando falo em competência externa exclusiva «implícita», refiro‑me à exclusividade que não se baseia numa disposição do Tratado que confere expressamente competência exclusiva num domínio específico da União Europeia.

( 6 ) A expressão é utilizada pelas partes no presente processo, nas suas observações. V., além disso, em especial, n.os 307 e 346, infra.

( 7 ) O artigo XXIV intitula‑se «Aplicação territorial ‑ Tráfico fronteiriço ‑ Uniões aduaneiras e zonas de comércio livre».

( 8 ) O artigo V diz respeito à «Integração económica».

( 9 ) No essencial, o «tratamento nacional» significa que a fiscalidade e a regulamentação nacional não devem ser aplicadas aos produtos importados ou nacionais de uma forma que tenha como objetivo proteger a produção nacional.

( 10 ) O texto do Acordo OMC e de todos os acordos da OMC que o integram estão disponíveis em: https://www.wto.°rg/english/docs_e/legal_e/final_e.htm.

( 11 ) V., igualmente, artigo 4.o, n.o 1, TUE.

( 12 ) V., igualmente, Declaração n.o 18 sobre a delimitação de competências nas declarações anexadas à ata final da Conferência Intergovernamental que adotou o Tratado de Lisboa (JO 2016, C 202, p. 335). Esta declaração confirma que «[…] pertencem aos Estados‑Membros as competências não atribuídas à União pelos Tratados». Dispõe ainda que, «[q]uando os Tratados atribuam à União competência partilhada com os Estados‑Membros em determinado domínio, os Estados‑Membros exercem a sua competência na medida em que a União não tenha exercido a sua ou tenha decidido deixar de a exercer».

( 13 ) JO 2012, C 326, p. 307.

( 14 ) O artigo 6.o TFUE contém uma lista exaustiva dos domínios nos quais a União Europeia dispõe de competência para desenvolver ações destinadas a apoiar, coordenar ou completar a ação dos Estados‑Membros.

( 15 ) É ponto assente entre as partes no presente processo que a União Europeia dispõe de competência externa exclusiva, nos termos dos artigos 3.°, n.o 1, alínea e), e 207.°, n.o 1, TFUE, no que diz respeito a determinadas partes do EUSFTA.

( 16 ) O artigo 5.o CE dispunha: «A Comunidade atuará nos limites das atribuições que lhe são conferidas e dos objetivos que lhe são cometidos pelo Tratado. Nos domínios que não sejam das suas atribuições exclusivas, a Comunidade intervém apenas, de acordo com o princípio da subsidiariedade, se e na medida em que os objetivos da ação encarada não possam ser suficientemente realizados pelos Estados‑Membros, e possam pois, devido à dimensão ou aos efeitos da ação prevista, ser melhor alcançados ao nível comunitário. A ação da Comunidade não deve exceder o necessário para atingir os objetivos do presente Tratado».

( 17 ) Para uma síntese útil, v., Lenaerts, K., e Van Nuffel, P., European Union Law, Sweet & Maxwell, 2011, n.os 7.021 a 7.025.

( 18 ) Não vou especular sobre a questão de saber se essa reversibilidade é igualmente aplicável à competência externa exclusiva da UE nos termos do artigo 3.o, n.o 2, TFUE. Foi alegado que, se a UE chamar a si uma matéria a nível interno e proceder à celebração de um acordo internacional com base no artigo 3.o, n.o 2, TFUE, o facto de posteriormente deixar de legislar a nível interno não afeta o caráter exclusivo da sua já consolidada competência externa. No entanto, a doutrina está dividida quanto a este aspeto.

( 19 ) Importa referir que a redação está longe de ser ideal. O mecanismo de preempção constante do artigo 2.o, n.o 2, TFUE é aplicável a todas as competências partilhadas, a não ser que esteja expressamente prevista uma exceção (como no artigo 4.o, n.os 3 e 4, TFUE). Tal como está redigido, o artigo 4.o, n.o 1, TFUE define também, logicamente, as competências em matéria de política externa e de segurança comum (PESC) como competências «partilhadas», que são, por conseguinte, passíveis de preempção nos termos do artigo 2.o, n.o 2: uma consequência que pode ser motivo de inquietação pelo menos para alguns Estados‑Membros.

( 20 ) V., por exemplo, no que diz respeito ao princípio da atribuição: parecer 2/94 (Adesão da União Europeia à CPDHLF), de 28 de março de 1996, EU:C:1996:140, n.o 24, e parecer 2/00 (Protocolo de Cartagena sobre Biosegurança), de 6 de dezembro de 2001, EU:C:2001:664, n.o 5.

( 21 ) Embora o artigo 3.o, n.o 2, TFUE estabeleça quatro pressupostos, uma vez que a alternativa final («afetar regras comuns ou alterar o seu alcance») abre duas possibilidades, irei tratá‑las conjuntamente. As referências ao «terceiro pressuposto» nos termos do artigo 3.o, n.o 2, devem, portanto, ser entendidas no sentido de que incluem ambas as possibilidades.

( 22 ) Cada um destes pressupostos reflete o princípio da atribuição (v. parecer 1/13 (Adesão de Estados terceiros à convenção de Haia), de 14 de outubro de 2014, EU:C:2014:2303, n.o 67 e jurisprudência referida). O primeiro pressuposto reflete (em parte) o parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 95; o segundo pressuposto reflete o parecer 1/76 (Acordo que institui um Fundo de Imobilização da Navegação Interior), de 26 de abril de 1977, EU:C:1977:63, n.o 3; o terceiro e quarto pressupostos refletem o princípio (embora expresso em termos mais gerais) estabelecido no acórdão de 31 de março de 1971, Comissão/Conselho, 22/70, EU:C:1971:32, n.os 17 e 18 («acórdão AETR»). Para uma análise mais pormenorizada sobre o princípio AETR, v. n.os 120 a 131, infra.

( 23 ) Um «ato legislativo» é um ato jurídico adotado por processo legislativo (artigo 289.o, n.o 3, TFUE). V., quanto à distinção entre atos legislativos e atos regulamentares, acórdão de 3 de outubro de 2013, Inuit Tapiriit Kanatami e o./Parlamento e Conselho, C‑583/11 P, EU:C:2013:625. O TUE proíbe atos legislativos na PESC: v., segundo parágrafo do artigo 24.o, n.o 1, TUE.

( 24 ) Também aqui, a redação do Tratado após o Tratado de Lisboa é um pouco estranha. O que já referi nestas conclusões parece ser a interpretação natural do terceiro pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE, conjugado com o primeiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE; e essa leitura conduz, de facto, à conclusão de que a competência externa adquirida dessa forma pela União Europeia tem caráter exclusivo. Mas não é fácil conciliar esta conclusão com o enunciado do artigo 4.o, n.o 4, TFUE. Suponhamos (por exemplo) que a União Europeia adotava um ato legislativo no domínio da cooperação para o desenvolvimento, que previa a celebração de um acordo internacional. O artigo 4.o, n.o 4, TFUE estabelece que a União Europeia «dispõe de competência para desenvolver ações e uma política comum» nos domínios da cooperação para o desenvolvimento e da ajuda humanitária; mas, acrescenta, «sem que o exercício dessa competência possa impedir os Estados‑Membros de exercerem a sua». Tendo em conta esta redação, poder‑se‑á, de facto, dizer que a competência da UE daí decorrente é sempre exclusiva? (o artigo 4.o, n.o 3, TFUE está redigido em termos globalmente semelhantes no que respeita às competências nos domínios da investigação, do desenvolvimento tecnológico e do espaço, e suscita a mesma dúvida).

( 25 ) V., em especial, parecer 1/76 (Acordo que institui um Fundo Europeu de Imobilização da Navegação Interior), de 26 de abril de 1977, EU:C:1977:63, n.os 1 a 3. Nesse processo, o acordo em questão tinha como objetivo sanear a situação económica da indústria de transportes fluviais numa região geográfica onde os transportes por via navegável interior revestem uma importância particular no conjunto das redes de transportes internacionais (n.o 1). O Tribunal de Justiça concluiu que: «o estabelecimento de regras comuns ao abrigo do artigo 75.o do Tratado [CEE] não permit[ia] realizar inteiramente o objetivo pretendido [devido à] participação tradicional de embarcações dependentes de um Estado não membro, a Suíça, sujeitas ao regime da liberdade de navegação estabelecida por instrumentos internacionais de data antiga». (n.o 2). Embora, nesse parecer, o Tribunal de Justiça não tenha declarado expressamente que a competência da UE daí decorrente era exclusiva, o Tribunal de Justiça interpretou claramente o parecer 1/76 nesse sentido na jurisprudência posterior. V., por exemplo, parecer 2/92 (Terceira decisão revista do Conselho da OCDE relativa ao tratamento nacional), de 24 de março de 1995, EU:C:1995:83, n.o 32.

( 26 ) Antes Tratado de Lisboa, o acórdão do Tribunal de Justiça no processo AETR tinha um «valor acrescentado» duplo: em primeiro lugar, criou uma competência externa e, em segundo lugar, definiu essa competência como exclusiva. Se um domínio (adequadamente definido) for regulado por regras comuns, tal é suficiente para acionar o pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE relativamente a esse domínio. V., ainda, n.os 120 a 131, infra.

( 27 ) No quarto pressuposto visado no artigo 216.o, n.o 1, TFUE pode ler‑se «seja suscetível de afetar normas comuns ou alterar o seu alcance», enquanto no terceiro pressuposto visado no artigo 3.o, n.o 2, TFUE se pode ler «quando tal celebração […] seja suscetível de afetar regras comuns ou de alterar o alcance das mesmas». Não creio que a ligeira diferença de redação entre as duas disposições comporte qualquer consequência.

( 28 ) V. n.o 60, supra.

( 29 ) Deixo de parte a questão de saber se, no caso de um Estado‑Membro se desvincular unilateralmente de um acordo celebrado simultaneamente pelos Estados‑Membros e pela União Europeia sem ter dialogado previamente com as instituições da UE (em especial com a Comissão e com o Conselho), isso pode ser considerado uma violação do dever de cooperação leal previsto no artigo 4.o, n.o 3, TUE.

( 30 ) Nas conclusões que apresentou no processo que deu origem ao acórdão Comissão/Conselho (C‑13/07, EU:C:2009:190, n.o 121), a advogada‑geral J. Kokott escreveu: «tal como uma pequena gota de pastis pode tornar turvo um copo de água, determinadas disposições, ainda que tenham caráter acessório, contidas num acordo internacional baseado no artigo 133.o, n.o 5, primeiro parágrafo, CE podem desencadear igualmente a obrigação de celebrar um acordo misto». V., igualmente, acórdão de 3 de dezembro de 1996, Portugal/Conselho, C‑268/94, EU:C:1996:461, n.o 39 e jurisprudência referida.

( 31 ) V., a este respeito, parecer 2/00 (Protocolo de Cartagena sobre Biosegurança), de 6 de dezembro de 2001, EU:C:2001:664, n.o 15.

( 32 ) V., inter alia, parecer 1/75 (Acordo da OCDE relativo a uma norma para as despesas locais), de 11 de novembro de 1975, EU:C:1975:145, pp. 1360 e 1361; parecer 2/00 (Protocolo de Cartagena sobre Biosegurança), de 6 de dezembro de 2001, EU:C:2001:664, n.os 6 e 17; e parecer 2/13 (Adesão da União Europeia à CEDH), de 18 de dezembro de 2014, EU:C:2014:2454, n.o 145.

( 33 ) V., inter alia, parecer 2/00 (Protocolo de Cartagena sobre Biosegurança), de 6 de dezembro de 2001, EU:C:2001:664, n.os 6 e 17.

( 34 ) De acordo com o artigo 46.o, n.o 1, da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, de 1969 (RTNU, vol. 1155 p. 331, a seguir «Convenção de Viena de 1969»), «A circunstância de o consentimento de um Estado em ficar vinculado por um tratado ter sido manifestado com violação de uma disposição do seu direito interno relativa à competência para concluir tratados não pode ser invocada por esse Estado como tendo viciado o seu consentimento, salvo se essa violação tiver sido manifesta e disser respeito a uma norma de importância fundamental do seu direito interno». Nos termos do artigo 46.o, n.o 2, uma violação é manifesta «se for objetivamente evidente para qualquer Estado que proceda, nesse domínio, de acordo com a prática habitual e de boa‑fé». O artigo 46.o da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados entre Estados e Organizações Internacionais ou entre Organizações Internacionais, de 1986 (que ainda não entrou em vigor) [25 ILM 543 (1986)], contém normas idênticas.

( 35 ) A este propósito, o Tribunal de Justiça recebeu recentemente um pedido de decisão prejudicial relativo à compatibilidade com os artigos 18.°, primeiro parágrafo, 267.° e 344.° TFUE de uma disposição sobre RLIE constante de um acordo bilateral de proteção do investimento entre Estados‑Membros da União Europeia: v. processo C‑284/16, República Eslovaca/Achmea BV (pendente no Tribunal de Justiça).

( 36 ) V. artigos 4.°, n.o 1, e 5.°, n.o 2, TUE. V., igualmente, artigos 2.° a 6.° TFUE e análise efetuada nos n.os 55 a 64, supra.

( 37 ) V., inter alia, parecer 2/00 (Protocolo de Cartagena sobre Biosegurança), de 6 de dezembro de 2001, EU:C:2001:664, n.o 5, e acórdão de 1 de outubro de 2009, Comissão/Conselho, C‑370/07, EU:C:2009:590, n.o 47.

( 38 ) V., mais recentemente, acórdão de 14 de junho de 2016, Parlamento/Conselho, C‑263/14, EU:C:2016:435, n.o 43 e jurisprudência referida.

( 39 ) Parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739, n.o 111.

( 40 ) Parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739, n.o 112 e jurisprudência referida.

( 41 ) Tal resulta da estrutura da fundamentação do Tribunal de Justiça no parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739.

( 42 ) V., por exemplo, acórdãos de 12 de dezembro de 2002, Comissão/Conselho, C‑281/01, EU:C:2002:761, n.o 43, e de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675, n.o 76.

( 43 ) V. parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739, n.o 166.

( 44 ) V., por exemplo, parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 68; acórdãos de 12 de dezembro de 2002, Comissão/Conselho, C‑281/01, EU:C:2002:761, n.o 43, e de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675, n.o 76; e parecer 2/00 (Protocolo de Cartagena sobre Biosegurança), de 6 de dezembro de 2001, EU:C:2001:664, n.os 37 e 44.

( 45 ) Acórdão de 14 de junho de 2016, Parlamento/Conselho, C‑263/14, EU:C:2016:435, n.o 44 e jurisprudência referida; v., igualmente, acórdão de 10 de janeiro de 2006, Comissão/Conselho, C‑94/03, EU:C:2006:2, n.o 51.

( 46 ) Parecer 1/75 (Acordo da OCDE relativo a uma norma para as despesas locais), de 11 de novembro de 1975, EU:C:1975:145, p. 1364. V., igualmente, acórdão de 15 de dezembro de 1976, Donckerwolcke e Schou, 41/76, EU:C:1976:182, n.o 32.

( 47 ) Artigo 30.o TFUE.

( 48 ) Conclusões do advogado‑geral N. Wahl no processo de parecer 3/15 (Tratado de Marraquexe para facilitar o acesso a obras publicadas), EU:C:2016:657, n.o 43. Na data em que escrevo as presentes conclusões, esse processo ainda está pendente no Tribunal de Justiça.

( 49 ) Parecer 1/78 (Acordo internacional sobre a borracha natural), de 4 de outubro de 1979, EU:C:1979:224, n.o 44, e acórdão de 26 de março de 1987, Comissão/Conselho, 45/86, EU:C:1987:163, n.o 20.

( 50 ) V. conclusões do advogado‑geral N. Wahl no processo de parecer 3/15 (Tratado de Marraquexe para facilitar o acesso a obras publicadas), EU:C:2016:657, n.o 43.

( 51 ) Parecer 1/78 (Acordo internacional sobre a borracha natural), de 4 de outubro de 1979, EU:C:1979:224, n.os 41 a 46.

( 52 ) Acórdãos de 17 de outubro de 1995, Werner, C‑70/94, EU:C:1995:328, n.o 10, e de 17 de outubro de 1995, Leifer e o., C‑83/94, EU:C:1995:329, n.o 11.

( 53 ) Acórdão de 29 de março de 1990, Grécia/Conselho, C‑62/88, EU:C:1990:153, n.os 17 a 20, e parecer 2/00 (Protocolo de Cartagena sobre Biosegurança), de 6 de dezembro de 2001, EU:C:2001:664, n.o 40. V., igualmente, mais recentes, conclusões do advogado‑geral N. Wahl no processo de parecer 3/15 (Tratado de Marraquexe para facilitar o acesso a obras publicadas), EU:C:2016:657, n.o 69.

( 54 ) Acórdãos de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520, n.o 50, e de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675, n.o 56.

( 55 ) V., inter alia, acórdãos de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520, n.os 51 e 52 e jurisprudência referida, e de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675, n.os 57 e 58.

( 56 ) Acórdão de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675, n.o 67.

( 57 ) Esta abordagem é sustentada pelo parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.os 44 e 45 (relativamente aos serviços) e n.os 59 e 60 (relativamente aos direitos de propriedade intelectual).

( 58 ) Essa declaração dispõe que, «em conformidade com o sistema de repartição de competências entre a União e os Estados‑Membros, previsto no [TUE] e no [TFUE], pertencem aos Estados‑Membros as competências não atribuídas à União pelos Tratados».

( 59 ) V. ainda n.os 424 a 430, infra.

( 60 ) Por esta razão, não partilho da interpretação dada pela advogada‑geral J. Kokott à limitação que anteriormente decorria do artigo 133.o, n.o 6, CE. V. conclusões da advogada‑geral J. Kokott no processo Comissão/Conselho, C‑13/07, EU:C:2009:190, n.os 120 a 122 e 139 a 142. De acordo com a advogada‑geral J. Kokott, o espírito e o objetivo do n.o 1 dessa disposição é «[…] de um modo muito geral, estabelecer um paralelismo entre as competências internas e externas da [União Europeia] e impedir que a [União Europeia] assuma compromissos no plano externo que, devido à insuficiência de atribuições, não poderia transpor para o plano interno».

( 61 ) V. artigo 6.o TFUE.

( 62 ) V. artigo 168.o TFUE. O artigo 6.o TFUE prevê que, em matéria de proteção e melhoria da saúde humana, a União Europeia dispõe de competência para desenvolver ações destinadas a «apoiar, coordenar ou completar a ação dos Estados‑Membros».

( 63 ) V., respetivamente, artigos 153.°, n.o 2, alínea a), 165.°, n.o 4, 168.°, n.o 5, e 167.°, n.o 5, TFUE.

( 64 ) V. n.os 208 a 219, infra.

( 65 ) Acórdão de 31 de março de 1971, Comissão/Conselho, 22/70, EU:C:1971:32, n.o 16.

( 66 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.os 49 e 50.

( 67 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 48.

( 68 ) V. terceiro parágrafo do artigo 133.o, n.o 6, CE («A negociação e a celebração de acordos internacionais no domínio dos transportes continuam a reger‑se pelo disposto no título V e no artigo 300.o»). Essa disposição refletia a vontade dos autores do Tratado de Nice «de manter uma forma de statu quo ante na matéria» [v. parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739, n.o 159].

( 69 ) V. artigo 207.o, n.o 5, TFUE.

( 70 ) Parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739, n.o 164.

( 71 ) Parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739, n.o 163. A mesma conclusão já podia ser retirada (embora implicitamente) do parecer 2/92 (Terceira decisão revista do Conselho da OCDE relativa ao tratamento nacional), de 24 de março de 1995, EU:C:1995:83, n.o 27.

( 72 ) V. n.os 208 a 219, infra.

( 73 ) V. n.os 221 a 224, infra.

( 74 ) V., inter alia, acórdão de 5 de novembro de 2002, Comissão/Alemanha, C‑476/98, EU:C:2002:631, n.o 109 e jurisprudência referida.

( 75 ) Acórdão de 5 de novembro de 2002, Comissão/Alemanha, C‑476/98, EU:C:2002:631, n.o 108 e jurisprudência referida.

( 76 ) V., para esse efeito, parecer 1/03 (Nova Convenção de Lugano), de 7 de fevereiro de 2006, EU:C:2006:81, n.os 45, 121 e 122.

( 77 ) V. n.os 225 a 268, infra.

( 78 ) Acórdão de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 66.

( 79 ) Acórdão de 31 de março de 1971, Comissão/Conselho, 22/70, EU:C:1971:32, n.o 21. Essas obrigações estão agora consagradas no segundo e terceiro parágrafos do artigo 4.o, n.o 3, TUE.

( 80 ) Acórdão de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 75.

( 81 ) Assim, essa abordagem é aplicável à Convenção do Conselho da Europa sobre a proteção dos direitos dos organismos de radiodifusão (acórdão de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.os 78 a 103) ou ao Tratado de Marraquexe para facilitar o acesso a obras publicadas por parte das pessoas cegas, com deficiência visual ou com outras dificuldades de acesso a textos impressos [v. conclusões do advogado‑geral N. Wahl no processo de parecer 3/15 (Tratado de Marraquexe para facilitar o acesso a obras publicadas, EU:C:2016:657, n.os 137 a 154)].

( 82 ) V. n.os 350 a 359, infra.

( 83 ) Acórdãos de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 69 e jurisprudência referida, e de 26 de novembro de 2014, Green Network, C‑66/13, EU:C:2014:2399, n.o 30. Essa fase da análise estabelece uma distinção entre o critério previsto no artigo 3.o, n.o 2, TFUE e a identificação de domínios «objeto de preempção» em virtude da ação da UE no âmbito das competências partilhadas.

( 84 ) Acórdãos de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 70 e jurisprudência referida, e de 26 de novembro de 2014, Green Network, C‑66/13, EU:C:2014:2399, n.o 31.

( 85 ) V., por exemplo, acórdão de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 81.

( 86 ) V., por exemplo, acórdão de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 82.

( 87 ) V., por exemplo, parecer 1/03 (Nova Convenção de Lugano), de 7 de fevereiro de 2006, EU:C:2006:81, n.o 172.

( 88 ) Parecer 1/13 (Adesão de Estados terceiros à convenção de Haia), de 14 de outubro de 2014, EU:C:2014:2303, n.o 74 e jurisprudência referida, e acórdão de 26 de novembro de 2014, Green Network, C‑66/13, EU:C:2014:2399, n.o 33.

( 89 ) V. n.os 234 e 349 a 361, infra.

( 90 ) Acórdão de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 68 e jurisprudência referida.

( 91 ) Acórdão de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 68 e jurisprudência referida.

( 92 ) Acórdão de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 71 e jurisprudência referida.

( 93 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordos OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 96.

( 94 ) Já exprimi esta opinião no parecer que apresentei no processo que deu origem ao acórdão Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:224, n.os 104 a 111.

( 95 ) Acórdão de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 73.

( 96 ) V. n.o 2 do anexo às presentes conclusões.

( 97 ) Uma outra questão é saber se todas as matérias abrangidas pelo capítulo do EUSFTA relativo aos serviços (capítulo oito) são efetivamente da competência exclusiva da União Europeia. V. n.os 195 a 268, infra.

( 98 ) V. n.os 3 a 12 do anexo ao presente parecer.

( 99 ) V. n.o 131 do anexo ao presente parecer.

( 100 ) O texto desse acordo está disponível em: https://www.wto.°rg/english/tratop_e/tradfa_e/tradfa_e.htm.

( 101 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 34.

( 102 ) O Tribunal de Justiça analisou alguns desses acordos (o Acordo sobre a agricultura, o Acordo SMC e o Acordo OTC) à luz dos argumentos específicos que as partes nesse processo tinham suscitado em relação aos mesmos acordos. V. parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.os 28 a 33.

( 103 ) A posição era a mesma no quadro do GATT de 1947, na medida em que a Comunidade Europeia tinha adquirido progressivamente competências anteriormente exercidas pelos Estados‑Membros. V. acórdãos de 12 de dezembro de 1972, International Fruit Company e o., 21/72 a 24/72, EU:C:1972:115, n.o 18, e de 3 de junho de 2008, The International Association of Independent Tanker Owners e o., C‑308/06, EU:C:2008:312, n.os 48 e 49.

( 104 ) V., igualmente, n.os 510 a 512, infra.

( 105 ) V. artigo 12.o do Acordo sobre o valor aduaneiro e artigo X:1 do GATT de 1994.

( 106 ) V. artigos 18.°, n.o 1, e 19.° do Acordo sobre o valor aduaneiro.

( 107 ) V., por exemplo, artigo IX, n.o 6, do GATT de 1994 (cooperação com vista a evitar que as marcas comerciais sejam utilizadas de determinadas formas); artigo XV do GATT de 1994 (cooperação, consulta e intercâmbio de informações com o FMI no que diz respeito a acordos em matéria de câmbio); artigo XXV do GATT de 1994 (ação coletiva das Partes contratantes); artigo XXXVIII do GATT de 1994 (ação coletiva para prosseguir os objetivos estabelecidos no artigo XXXVI em matéria de comércio e desenvolvimento); artigo 4.o, n.o 2, do Acordo MSF (consultas com vista à obtenção de acordos sobre o reconhecimento da equivalência de MSF determinadas); artigo 7.o e anexo B do Acordo MSF (transparência e intercâmbio de informações); artigo 10.o do Acordo OTC (intercâmbio de informações).

( 108 ) V. parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 34.

( 109 ) V. n.os 467 a 504, infra.

( 110 ) V. n.os 19 a 51 do anexo ao presente parecer.

( 111 ) Quanto aos argumentos relativos aos transportes, v. n.os 168 a 194, infra.

( 112 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, relativa aos mercados de instrumentos financeiros e que altera a Diretiva 2002/92/CE e a Diretiva 2011/61/UE (JO 2014, L 173, p. 349).

( 113 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de setembro de 2005 (JO 2005, L 255, p. 22), conforme alterada.

( 114 ) Diretiva de 23 de julho de 1996, relativa à harmonização das condições de obtenção dos certificados nacionais de condução de embarcações de navegação interior para o transporte de mercadorias e de passageiros na Comunidade (JO 1996, L 235, p. 31), e Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 19 de novembro de 2008, relativa ao nível mínimo de formação dos marítimos (JO 2008, L 323, p. 33).

( 115 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de fevereiro de 2008, relativo a regras comuns no domínio da aviação civil e que cria a Agência Europeia para a Segurança da Aviação, e que revoga a Diretiva 91/670/CEE do Conselho, o Regulamento (CE) n.o 1592/2002 e a Diretiva 2004/36/CE (JO 2002, L 79, p. 1), conforme alterado.

( 116 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de janeiro de 2009, relativo a um código de conduta para os sistemas informatizados de reserva e que revoga o Regulamento (CEE) n.o 2299/89 do Conselho (JO 2009, L 35, p. 47).

( 117 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de novembro de 2012, que estabelece um espaço ferroviário europeu único (JO 2012, L 343, p. 32).

( 118 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro de 2009, que estabelece regras comuns para o acesso ao mercado do transporte internacional rodoviário de mercadorias (JO 2009, L 300, p. 72).

( 119 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro de 2009, que estabelece regras comuns para o acesso ao mercado internacional dos serviços de transporte em autocarro e que altera o Regulamento (CE) n.o 561/2006 (JO 2009, L 300, p. 88).

( 120 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de outubro de 2009, que estabelece regras comuns no que se refere aos requisitos para o exercício da atividade de transportador rodoviário e que revoga a Diretiva 96/26/CE do Conselho (JO 2009, L 300, p. 51).

( 121 ) V. n.o 177, infra.

( 122 ) V. artigo 8.13 do EUSFTA.

( 123 ) Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de maio de 2014, relativa às condições de entrada e residência de nacionais de países terceiros no quadro de transferências dentro das empresas (JO 2014, L 157, p. 1).

( 124 ) V. n.o 169, supra.

( 125 ) Regulamento de 22 de dezembro de 1986 que aplica o princípio da livre prestação de serviços aos transportes marítimos entre Estados‑Membros e Estados‑Membros para países terceiros (JO 1986, L 378, p. 1).

( 126 ) Artigo 1.o, n.o 2, do Regulamento n.o 4055/86 do Conselho.

( 127 ) A Comissão invoca o parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 51, e o parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739, n.o 166.

( 128 ) Esses exemplos incluem a Diretiva 2012/34; a Diretiva 2005/45/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 7 de setembro de 2005, relativa ao reconhecimento mútuo dos certificados dos marítimos emitidos pelos Estados‑Membros e que altera a Diretiva 2001/25/CE (JO 2005, L 255, p. 160); e o Regulamento n.o 1071/2009.

( 129 ) Nas suas alegações, as partes no presente processo não centraram a sua atenção nos processos internos que levaram a União Europeia a chegar a acordo com Singapura quanto aos termos dessas reservas.

( 130 ) Regulamento de 16 de dezembro de 1991, que fixa as condições de admissão dos transportadores não residentes aos transportes nacionais de mercadorias ou de passageiros por via navegável num Estado‑Membro (JO 1991, L 373, p. 1).

( 131 ) Regulamento de 8 de julho de 1996, relativo a regras comuns aplicáveis aos transportes de mercadorias ou de pessoas por via navegável entre os Estados‑Membros, com vista a realizar a livre prestação de serviços neste setor (JO 1996, L 175, p. 7).

( 132 ) Artigo 4.o, n.o 1, alíneas a) e b), da Diretiva 2014/66.

( 133 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de julho de 2009, que estabelece o Código Comunitário de Vistos (Código de Vistos) (JO 2009, L 243, p. 1).

( 134 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 44.

( 135 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.os 45 a 47. O Tribunal de Justiça confirmou essa posição no parecer 2/92 (Terceira decisão revista do conselho da OCEDE relativa ao tratamento nacional), de 24 de março de 1995, EU:C:1995:83, n.os 24 a 26.

( 136 ) V. artigo 133.o, n.o 5, CE. O Tratado de Amesterdão introduziu no Tratado CE uma base jurídica que permitia alargar o âmbito da política comercial comum. Contudo, esta faculdade nunca foi exercida.

( 137 ) O segundo parágrafo do artigo 133.o, n.o 6, CE dispunha que, «[…] em derrogação do primeiro parágrafo do n.o 5, os acordos no domínio do comércio de serviços culturais e audiovisuais, de serviços de educação, bem como de serviços sociais e de saúde humana, [eram] da competência partilhada entre a Comunidade e os seus Estados‑Membros».

( 138 ) Parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739, n.o 119.

( 139 ) V. n.os 208 a 219, infra. Ainda são aplicáveis regras processuais específicas no que diz respeito a determinados domínios ou setores do comércio de serviços. V. artigo 207.o, n.o 4, TFUE.

( 140 ) A secção B é aplicável às medidas que afetem a prestação transfronteiras de serviços. Contudo, para efeitos desta secção, entende‑se que a prestação transfronteiras de serviços abrange igualmente o consumo no estrangeiro (artigo 8.4 do EUSFTA).

( 141 ) V. n.o 197, supra.

( 142 ) V., neste sentido, acórdãos de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675, n.os 73 e 74, e de 18 de dezembro de 2014, Reino Unido/Conselho, C‑81/13, EU:C:2014:2449, n.o 37.

( 143 ) V. n.o 109, supra.

( 144 ) V. n.o 109, supra.

( 145 ) V. n.os 225 a 268, infra.

( 146 ) V. parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739, n.os 168 a 173.

( 147 ) V. acórdão de 4 de abril de 1974, Comissão/França, 167/73, EU:C:1974:35, n.o 27.

( 148 ) V., por exemplo, acórdão de 1 de outubro de 2015, Trijber e Harmsen, C‑340/14 e C‑341/14, EU:C:2015:641, n.o 47.

( 149 ) Acórdão de 22 de dezembro de 2010, Yellow Cab Verkehrsbetrieb, C‑338/09, EU:C:2010:814, n.os 31 a 33.

( 150 ) V., por analogia, acórdão de 15 de outubro de 2015, Grupo Itevelesa e o., C‑168/14, EU:C:2015:685.

( 151 ) Parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739, n.o 169.

( 152 ) Artigo 4.o, n.o 2, alínea g), TFUE.

( 153 ) Considerandos 32, 33 e 34 do Regulamento n.o 216/2008.

( 154 ) Artigo 3.o, alínea d), do Regulamento n.o 216/2008.

( 155 ) Artigo 1.o, n.o 1, alínea a), do Regulamento n.o 216/2008.

( 156 ) V. n.o154, supra.

( 157 ) Apêndice 8‑A1, Lista de compromissos específicos em conformidade com artigo 8.7 (Prestação transfronteiras de serviços), 11.C.

( 158 ) V. n.os 128 a 130, supra.

( 159 ) Títulos 16 e 17.

( 160 ) Uma perspetiva geral desse direito derivado está disponível em: www.eur‑lex.europa.eu/summary/capítulo/transport.html?root_default=SUM_1_CODED%3D32%2CSUM_2_CODED%3D3205&locale=pt (acedida em 4 de outubro de 2016).

( 161 ) Cada um destes modos é referido no artigo 100.o TFUE.

( 162 ) A Comissão não apresentou argumentos quanto à repartição de competências no que diz respeito ao transporte de produtos (exceto combustíveis) por condutas (pipelines).

( 163 ) Artigo 1.o, n.o 4, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 4055/86.

( 164 ) Acórdão de 8 de julho de 2014, Fonnship e Svenska Transportarbetareförbundet, C‑83/13, EU:C:2014:2053, n.o 41 e jurisprudência referida.

( 165 ) Artigo 1.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 4055/86.

( 166 ) Embora o artigo 7.o do Regulamento n.o 4055/86 disponha que o Conselho «pode tornar as disposições [desse] regulamento extensivas a prestadores de serviços de transportes marítimos nacionais de países terceiros e estabelecidos na [União Europeia]», essa disposição ainda não foi aplicada até á data.

( 167 ) Parecer 1/03 (Nova Convenção de Lugano), de 7 de fevereiro de 2006, EU:C:2006:81.

( 168 ) Regulamento de 22 de dezembro de 2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial (JO 2000, L 12, p. 1).

( 169 ) Parecer 1/03 (Nova Convenção de Lugano), de 7 de fevereiro de 2006, EU:C:2006:81, n.o 172.

( 170 ) Pode ser aplicada uma condição de nacionalidade.

( 171 ) V., inter alia, acórdãos de 5 de outubro de 1994, Comissão/FrançaC‑381/93, EU:C:1994:370, n.o 13, e de 11 de janeiro de 2007, Comissão/Grécia, C‑269/05, não publicado, EU:C:2007:17, n.o 20.

( 172 ) V., inter alia, acórdão de 14 de novembro de 2002, Geha Naftiliaki e o., C‑435/00, EU:C:2002:661, n.o 20.

( 173 ) Artigo 3.o do Regulamento n.o 4055/86.

( 174 ) V. n.os 214 e 215, supra.

( 175 ) V. n.os 350 a 359, infra.

( 176 ) Como expliquei, cabe à parte que reivindica a competência exclusiva demonstrar a natureza exclusiva da competência externa da União Europeia na qual se baseia (n.o 122, supra).

( 177 ) Artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2014/66.

( 178 ) V. n.o 226, supra. Também não é relevante para a repartição de competências o facto de a lista de compromissos da União Europeia ter sido negociada com base nas listas do GATS.

( 179 ) V. n.o 243, supra.

( 180 ) V. n.os 221 a 224, supra.

( 181 ) Regulamento de 24 de julho de 1989, relativo a um código de conduta para os sistemas informatizados de reserva (JO 1989, L 220, p. 1).

( 182 ) V., por exemplo, acórdão de 5 de novembro de 2002, Comissão/Dinamarca, C‑467/98, EU:C:2002:625, n.o 103.

( 183 ) V. n.os 243 e 246, supra.

( 184 ) Não existe qualquer referência aos serviços de transporte rodoviário em relação ao modo 4 na lista de compromissos específicos respeitante a pessoal‑chave e estagiários de nível pós‑universitário e a vendedores de serviços às empresas no Apêndice 8‑A3, cuja finalidade é, de acordo com o seu primeiro parágrafo, indicar «as atividades económicas liberalizadas nos termos dos artigos 8.7 […] e 8.12 […] a que se aplicam as limitações em matéria de pessoal‑chave e estagiários de nível pós‑universitário em conformidade com o artigo 8.14 […] e o artigo 8.15» e especificar essas limitações.

( 185 ) A Comissão invoca, em especial, o parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 67, e o acórdão de 3 de dezembro de 1996, Portugal/Conselho, C‑268/94, EU:C:1996:461, n.o 75.

( 186 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.os 66 a 68.

( 187 ) Acórdão de 3 de dezembro de 1996, Portugal/Conselho, C‑268/94, EU:C:1996:461, n.o 75.

( 188 ) Artigo 1.o, n.o 2, da Diretiva 2012/34.

( 189 ) Considerando 7 da Diretiva 2012/34.

( 190 ) V. artigos 1.°, n.o 1, alínea b), 10.°, n.os 1 e 2, e 17.° da Diretiva 2012/34.

( 191 ) Artigos 18.°, 19.°, 20.° e 21.° da Diretiva 2012/34.

( 192 ) Artigo 8.9 do EUSFTA. As exceções a esta regra estabelecidas nesta disposição não são relevantes neste contexto.

( 193 ) Artigo 8.10, n.o 1, do EUSFTA. V., igualmente, n.o 252, supra.

( 194 ) Artigo 8.11, n.o 1, do EUSFTA.

( 195 ) Artigo 17.o, n.os 1 e 3, da Diretiva 2012/34.

( 196 ) Apêndice 8‑A2 do EUSFTA. Essa limitação, que se aplica aos serviços de transporte ferroviário que requeiram a utilização do domínio público, permite que atividades económicas que sejam consideradas serviços de utilidade pública a nível nacional ou local possam estar sujeitas a monopólios públicos ou ser objeto de direitos exclusivos concedidos a operadores privados.

( 197 ) Artigo 10.o da Diretiva 2012/34.

( 198 ) Artigos 38.° a 54.° da Diretiva 2012/34.

( 199 ) V. n.o 125, supra.

( 200 ) V. n.o 226, supra.

( 201 ) Artigo 1.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1071/2009.

( 202 ) Artigos 3.° e 5.° a 9.° do Regulamento n.o 1071/2009.

( 203 ) Artigo 10.o do Regulamento n.o 1071/2009.

( 204 ) O Regulamento é aplicável quer aos transportes rodoviários internacionais de mercadorias, definidos como os transportes rodoviários internacionais de mercadorias por conta de outrem em trajetos efetuados no território da União, quer aos transportes nacionais rodoviários de mercadorias efetuados a título temporário por transportadores não residentes («cabotagem») (artigo 1.o, n.os 1 e 4, do Regulamento n.o 1072/2009).

( 205 ) Este regulamento é aplicável aos transportes internacionais de passageiros em autocarro efetuados no território da União Europeia por transportadores por conta de outrem ou por conta própria estabelecidos num Estado‑Membro de acordo com a legislação desse Estado‑Membro e utilizando veículos matriculados nesse Estado‑Membro e destinados, pela sua construção e equipamento, ao transporte de mais de nove pessoas, incluindo o motorista, assim como às deslocações em vazio desses veículos no âmbito desses transportes (artigo 1.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1073/2009). É igualmente aplicável aos serviços nacionais de transporte rodoviário de passageiros por conta de outrem, efetuados a título temporário por transportadores não residentes («cabotagem») (artigo 1.o, n.o 4, do Regulamento n.o 1073/2009).

( 206 ) V. artigo 4.o dos Regulamentos n.o 1072/2009 e n.o 1073/2009.

( 207 ) V. artigos 5.° e 7.° do Regulamento n.o 1072/2009. Um «certificado de motorista» consiste, essencialmente, num certificado emitido por um Estado‑Membro a qualquer transportador para o transporte rodoviário de mercadorias por conta de outrem ao abrigo de uma licença comunitária.

( 208 ) V. n.os 257 e 258, supra.

( 209 ) Artigo 8.9 do EUSFTA. As exceções a esta regra estabelecidas nesta disposição não são relevantes neste contexto.

( 210 ) Artigo 8.10, n.o 1, do EUSFTA. V., igualmente, n.o 260, supra.

( 211 ) Artigo 8.11, n.o 1, do EUSFTA.

( 212 ) Artigos 7.° e 8.° do Regulamento n.o 1071/2009.

( 213 ) V. n.os 523 a 544, infra.

( 214 ) V. n.os 52 a 60 do anexo às presentes conclusões.

( 215 ) Artigo I:2, alínea c), do GATS.

( 216 ) A Comissão refere‑se ao acórdão de 31 de março de 1971, Comissão/Conselho, 22/70, EU:C:1971:32, n.o 31, e ao parecer 1/03 (Nova Convenção de Lugano), de 7 de fevereiro de 2006, EU:C:2006:81, n.os 122 e 133.

( 217 ) Acórdão de 27 de novembro de 2012, C‑370/12, EU:C:2012:756.

( 218 ) Parecer 1/92 (Segundo parecer sobre o acordo relativo ao EEE), de 10 de abril de 1992, EU:C:1992:189.

( 219 ) Acórdão de 27 de novembro de 2012, C‑370/12, EU:C:2012:756.

( 220 ) Parecer 1/92 (Segundo parecer sobre o acordo relativo ao EEE), de 10 de abril de 1992, EU:C:1992:189.

( 221 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de janeiro de 2005, relativo a estatísticas comunitárias sobre a balança de pagamentos, o comércio internacional de serviços e o investimento direto estrangeiro (JO 2005, L 35, p. 23).

( 222 ) Diretiva, de 24 de junho de 1988, para a execução do artigo 67.o do Tratado (JO 1988, L 178, p. 5).

( 223 ) Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2012, que estabelece disposições transitórias para os acordos bilaterais de investimento entre os Estados‑Membros e os países terceiros (JO 2012, L 351, p. 40).

( 224 ) V. n.os 371 a 398, infra.

( 225 ) Artigos 9.1, n.o 1 e 9.1, n.o 2, do EUSFTA.

( 226 ) JO 2004, C 310, p. 1.

( 227 ) As discussões em torno do artigo III‑315.°, n.o 1, coincidiram com os debates na OMC sobre a negociação das disposições da OMC em matéria de investimento estrangeiro direto. A Declaração Ministerial da OMC adotada em 14 de novembro de 2001, que deu início à Ronda de Doha para o Desenvolvimento, reconheceu «[…] a necessidade de um quadro multilateral destinado a assegurar condições transparentes, estáveis e previsíveis para o investimento transfronteiriças de longo prazo, em especial o investimento estrangeiro direto, que contribuirá para a expansão do comércio […]» (sublinhado meu) (Declaração Ministerial da OMC adotada em 14 de novembro de 2001, WT/MIN(01)/DEC/1 (20 de novembro de 2001), n.o 20; v., igualmente, n.o 22). Precisamente quando o investimento estrangeiro direto estava prestes a tornar‑se parte da política comercial comum, os membros da OMC (reunidos no Conselho geral da OMC) decidiram que não seriam realizados trabalhos com vista a negociações em matéria de investimentos no âmbito da OMC durante a Ronda de Doha [OMC, Conselho Geral, Decisão adotada pelo Conselho Geral em 1 de agosto de 2004, WT/L/579 (2 de agosto de 2004), n.o 1, alínea g)].

( 228 ) V. n.o 344, infra.

( 229 ) V., por exemplo, artigos 101.°, n.o 1, alínea b), 126.°, n.o 3, 199.°, n.os 3 e 4, e 309.° TFUE; Protocolo n.o 5 relativo aos Estatutos do Banco Europeu de Investimento; Protocolo n.o 10 relativo à cooperação estruturada permanente estabelecida no artigo 42.o TUE; e Declaração n.o 30 ad artigo 126.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia.

( 230 ) V. acórdãos de 10 de abril de 2014, Emerging Markets Series of DFA Investment Trust Company, C‑190/12, EU:C:2014:249, n.o 39 e jurisprudência referida, e de 10 de fevereiro de 2011, Haribo, C‑436/08 e C‑437/08, EU:C:2011:61, n.o 50 e jurisprudência referida.

( 231 ) Acórdão de 21 de maio de 2015, Wagner‑Raith, C‑560/13, EU:C:2015:347, n.o 39.

( 232 ) Para definições noutra legislação de direito derivado, v., por exemplo, Regulamento (UE) n.o 549/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de maio de 2013, relativo ao sistema europeu de contas nacionais e regionais na União Europeia (JO 2013, L 174, p. 1), item 4.65 do anexo A e anexo 7.1 — Sumário de cada categoria de ativos; e anexo II do Regulamento n.o 184/2005. V., igualmente, por exemplo, Orientação do Banco Central Europeu, de 9 de dezembro de 2011, relativa às exigências de informação estatística do Banco Central Europeu em matéria de estatísticas externas (BCE/2011/23) (JO 2012, L 65, p. 1), anexo III, item 6.1.

( 233 ) V. acórdão de 21 de maio de 2015, Wagner‑Raith, C‑560/13, EU:C:2015:347, n.o 23 e jurisprudência referida; v., igualmente, acórdão de 12 de dezembro de 2006, Test Claimants in the FII Group Litigation, C‑446/04, EU:C:2006:774, n.os 179 e 180 e jurisprudência referida.

( 234 ) Acórdão de 17 de outubro de 2013, Welte, C‑181/12, EU:C:2013:662, n.o 32 e jurisprudência referida.

( 235 ) Acórdão de 13 de novembro de 2012, Test Claimants in the FII Group Litigation, C‑35/11, EU:C:2012:707, n.o 102 e jurisprudência referida.

( 236 ) Acórdão de 10 de fevereiro de 2011, Haribo, C‑436/08 e C‑437/08, EU:C:2011:61, n.o 137. Esse limiar de 10% é igualmente utilizado, por exemplo, na definição de «investimento estrangeiro direto» constante do Regulamento n.o 549/2013, anexo 7.1 e Orientação do Banco Central Europeu, BCE/2011/23, anexo III, item 6.1.

( 237 ) V., por exemplo, OCDE, OCDE Benchmark Definition of Foreign Direct Investment, 4.a edição (2008) n.o 11; V., igualmente, n.os 29, 117 e 122 a 147.

( 238 ) V., por exemplo, FMI, Manual da Balança de Pagamentos, 6.a edição (2009), n.o 359.

( 239 ) Acórdão de 21 de outubro de 2010, Idryma Typou, C‑81/09, EU:C:2010:622, n.o 48 (sublinhado meu). V., igualmente, acórdão de 10 de novembro de 2011, Comissão/Portugal, C‑212/09, EU:C:2011:717, n.o 47 e jurisprudência referida; e, por exemplo, definição de «investimentos de carteira» constante da Orientação do Banco Central Europeu, item 6.2.

( 240 ) V., por exemplo, OCDE, OECD Benchmark Definition of Foreign Direct Investment, 4.a edição, «[…] investimento de carteira, através do qual os investidores, em regra, não pretendem influenciar a gestão da empresa», n.o 11; v., igualmente, n.o 29.

( 241 ) V. n.os 196 e 197, supra.

( 242 ) V. artigos I:2, alínea c), X e XVI do GATS. Algumas dessas regras tratam, em especial, das condições em que os investimentos podem ser realizados. A esse respeito, o GATS complementa (pelo menos) parcialmente os acordos de investimento que muitas vezes se centram, em grande medida, no tratamento subsequente de um investimento.

( 243 ) V. artigo XXVIII, alínea d), do GATS.

( 244 ) Parecer 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739.

( 245 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 34. V., igualmente, n.o 145, supra. O Acordo TRIM está incluído no anexo 1A do Acordo OMC («Acordos multilaterais sobre o comércio de mercadorias»).

( 246 ) Artigo 1.o do Acordo TRIM.

( 247 ) Artigo 2.o, n.o 1, do Acordo TRIM. O anexo a este acordo, ao qual o artigo 2.o, n.o 2, se refere, contém uma lista não exaustiva das medidas de investimento relacionadas com o comércio que são incompatíveis com a obrigação de tratamento nacional prevista no artigo III, n.o 4, do GATT 1994 (ou seja, tratamento nacional no que diz respeito às leis, regulamentos e exigências relacionadas com a venda, a oferta para venda, a compra, o transporte, a distribuição e a utilização no mercado interno de produtos).

( 248 ) V., por exemplo, acórdão de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo and Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520, n.o 51 e jurisprudência referida.

( 249 ) V. Nota do Praesidium da Convenção, projetos de artigos relativos à ação externa do Tratado Constitucional, CONV 685/03 (23 de abril de 2003), pp. 52 e 54. Ou, como afirmaram a União Europeia e os Estados‑Membros no âmbito dos debates no seio da OMC acerca das relações entre comércio e investimento, o comércio e o investimento estrangeiro direto são interdependentes e complementam‑se mutuamente; e o investimento estrangeiro direto é um importante gerador de comércio [OMC, Working Group on the Relationship between Trade and Investment, Communication from the European Community and its Member States, Concept Paper on the Definition of Investment, WT/WGTI/W/115 (16 de abril de 2002), n.o 2].

( 250 ) V., igualmente, n.os 248 a 249, infra.

( 251 ) V., em especial, n.os 145, 196 e 197, supra.

( 252 ) Acórdão de 22 de outubro de 2013, Essent e o., C‑105/12 a C‑107/12, EU:C:2013:677, n.os 29 e 30 e jurisprudência referida.

( 253 ) Acórdão de 22 de outubro de 2013, Essent e o., C‑105/12 a C‑107/12, EU:C:2013:677, n.o 36 e jurisprudência referida. V., igualmente, por exemplo, acórdão de 4 de junho de 2002, Comissão/Portugal, C‑367/98, EU:C:2002:326, n.o 48.

( 254 ) V. acórdão de 13 de julho de 1995, Espanha/Conselho, C‑350/92, EU:C:1995:237, n.o 22.

( 255 ) Quanto ao artigo 207.o, n.o 6, TFUE, V., igualmente, n.os 106 a 110, supra.

( 256 ) V. n.o 326, supra. A este respeito, saliento igualmente que a nota 10 ao artigo 8.8, alínea d), do EUSFTA (Definição de «estabelecimento») afirma que «os termos «constituição» e «aquisição» de uma pessoa coletiva são entendidos como incluindo a participação de capital numa pessoa coletiva, com vista a criar ou manter laços económicos duradouros».

( 257 ) V. artigos 9.1, n.o 1, e 9.1, n.o 1, alínea g), do EUSFTA.

( 258 ) V. n.o 326, supra. Neste contexto, saliento que o GATS, que é abrangido pela política comercial comum (sob reserva da exceção relativa aos transportes constante do artigo 207.o, n.o 5, TFUE), podia igualmente aplicar‑se a determinados tipos de investimento diferentes do investimento estrangeiro direto. Por exemplo, a primeira frase da nota 8 ao artigo XVI:1 do GATS («Acesso ao Mercado») dispõe que «se um Membro assumir um compromisso de acesso ao mercado relativamente à prestação de um serviço através do modo de prestação referido na alínea a) do n.o 2 do artigo I e se o movimento de capitais transfronteiras constituir uma parte essencial do próprio serviço, esse Membro é obrigado a autorizar esse movimento de capitais».

( 259 ) Por exemplo, o artigo 91.o, n.o 1, alínea a), TFUE diz respeito a «regras comuns» aplicáveis aos transportes internacionais efetuados a partir de, ou com destino ao, território de um Estado‑Membro, ou que atravessem o território de um ou mais Estados‑Membros.

( 260 ) Acórdão de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 67.

( 261 ) Parecer 2/92 (Terceira decisão revista do conselho da OCDE relativa ao tratamento nacional), de 24 de março de 1995, EU:C:1995:83, n.os 33 (que se refere à necessidade de «atos legislativos internos») e 36.

( 262 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC) de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 77 (sublinhado é meu).

( 263 ) Para um exemplo do facto de que os acordos internacionais em que a União Europeia é parte estão sujeitos ao direito primário, v. acórdão de 10 de março de 1998, Alemanha/Conselho, C‑122/95, EU:C:1998:94.

( 264 ) A segunda frase do artigo 218.o, n.o 11, TFUE prevê expressamente a possibilidade de alterar os Tratados como forma de ultrapassar um parecer «negativo» baseado nessa disposição.

( 265 ) Na verdade, tal proposta poderia suscitar a questão de saber se o EUSFTA é materialmente compatível com os Tratados. Todavia, tal está claramente fora do âmbito do pedido de parecer da Comissão. V. n.o 85, supra.

( 266 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 77.

( 267 ) Acórdão de 27 de novembro de 2012, C‑370/12, EU:C:2012:756, n.os 104 e 105.

( 268 ) Regulamento de 11 de maio de 2010, que cria um mecanismo europeu de estabilização financeira (JO 2010, L 118, p. 1).

( 269 ) Acórdão de 27 de novembro de 2012, C‑370/12, EU:C:2012:756, n.o 101 (em itálico no original). Na sua tomada de posição nesse processo, a advogada‑geral J. Kokott parece sugerir que a questão relativa ao artigo 3.o, n.o 2, estava mal colocada: «[a] este respeito, cumpre observar que o artigo 3.o, n.o 2, TFUE, em conjugação com o artigo 216.o TFUE, só regula a competência exclusiva da União para a celebração de acordos com países terceiros e organizações internacionais. Em consequência, nos termos desta disposição, conjugada com o artigo 2.o, n.o 1, TFUE, os Estados‑Membros estão proibidos de celebrar este tipo de acordos com países terceiros. Ora, as partes signatárias do Tratado são exclusivamente Estados‑Membros». V. tomada de posição da advogada‑geral J. Kokott no acórdão Pringle, C‑370/12, EU:C:2012:675, n.o 98.

( 270 ) Quando uma matéria seja abrangida pelas regras do Tratado, essa matéria é da competência da União Europeia. Assim, o artigo 4.o, n.o 2, alínea a), TFUE prevê que a União Europeia dispõe de «competência partilhada» no domínio principal do mercado interno.

( 271 ) V., por exemplo, acórdão de 22 de outubro de 2013, Essent e o., C‑105/12 a C‑107/12, EU:C:2013:677, n.o 40 e jurisprudência referida. V., igualmente, n.os 317 e 318, supra (no que diz respeito à definição de «investimento direto»).

( 272 ) Todos esses acordos estabelecem que são celebrados por um prazo limitado mas podem ser renovados desde que (observadas determinadas condições) nenhuma das Partes manifeste a intenção de revogar o acordo. Os investimentos anteriores à data em que a cessação de vigência ou a revogação se torne eficaz continuam sujeitos ao regime do acordo durante um prazo definido.

( 273 ) Nota 51 em algumas versões linguísticas.

( 274 ) V. n.os 307 a 361, supra.

( 275 ) Embora existam outros casos em que a União Europeia decidiu anular ou denunciar acordos internacionais nos quais não era parte. V., por exemplo, Decisão 92/530/CEE do Conselho, de 12 de novembro de 1992, que denuncia o Acordo de Pesca entre a antiga República Democrática Alemã e a Suécia (JO 1992, L 334, p. 33).

( 276 ) V., em geral, acórdão de 24 de novembro de 1992, Poulsen e Diva Navigation Corp., C‑286/90, EU:C:1992:453, n.o 9.

( 277 ) V., igualmente, por exemplo, acórdão de 21 de dezembro de 2011, Air Transport Association of America e o., C‑366/10, EU:C:2011:864, n.o 71 (no qual o Tribunal de Justiça afirmou que, na medida em que as competências anteriormente exercidas pelos Estados‑Membros no âmbito de aplicação de um acordo internacional não estavam, até à data, assumidas na íntegra pela União Europeia, esta última não estava vinculada por esse acordo).

( 278 ) Acórdão de 12 de dezembro de 1972, International Fruit Company e o., 21/72 a 24/72, EU:C:1972:115, n.o 18. No que diz respeito a outros acordos internacionais, v., igualmente, por exemplo, acórdãos de 19 de novembro de 1975, Douaneagent der Nederlandse Spoorwegen, 38/75, EU:C:1975:154, n.os 16 e 21, e de 14 de julho de 1976, Kramer e o., 3/76, 4/76 e 6/76, EU:C:1976:114, n.os 44 e 45.

( 279 ) V., acórdão de 4 de julho de 2000, Comissão/Portugal, C‑84/98, EU:C:2000:359, n.o 53.

( 280 ) V. artigos 27.° e 46.° das Convenções de Viena de 1969 e de 1986.

( 281 ) De acordo com o artigo 26.o das Convenções de Viena de 1969 e de 1986, «[t]odo o tratado em vigor vincula as Partes e deve ser por elas cumprido de boa‑fé». O Tribunal de Justiça já anteriormente declarou que este princípio «constitui um princípio fundamental de qualquer ordem jurídica e, em especial, da ordem jurídica internacional». V. acórdão de 16 de junho de 1998, Racke, C‑162/96, EU:C:1998:293, n.o 49.

( 282 ) V., por exemplo, acórdãos de 3 de março de 2009, Comissão/Áustria, C‑205/06, EU:C:2009:118, n.o 33 e jurisprudência referida; de 19 de novembro de 2009, Comissão/Finlândia, C‑118/07, EU:C:2009:715, n.o 27 e jurisprudência referida; e de 3 de março de 2009, Comissão/Suécia, C‑249/06, EU:C:2009:119, n.o 34 e jurisprudência referida.

( 283 ) Os outros acordos constantes do anexo 9‑D foram celebrados entre Singapura e a União Económica Belgo‑Luxemburguesa, a França, a Alemanha, os Países Baixos e o Reino Unido, e têm data posterior a 1 de janeiro de 1958 ou (no caso do Reino Unido) data posterior à adesão à Comunidade Económica Europeia.

( 284 ) V. n.o 379, supra.

( 285 ) Nota 51 em algumas versões linguísticas.

( 286 ) V. acórdão de 2 de agosto de 1993, Levy, C‑158/91, EU:C:1993:332, n.o 19. A jurisprudência e a doutrina parecem apoiar a ideia de que, atualmente, o artigo 59.o da Convenção de Viena de 1969 faz parte do direito internacional geral ou comum. Para um debate sobre as fontes relevantes, v., por exemplo, Dubuisson, F., «Article 59 — Termination or suspension of the operation of a treaty implied by conclusion of a later treaty», Corten, O., e Klein, P. (eds.), The Vienna Conventions on the Law of Treaties — A Commentary — Volume II, Oxford University Press, 2011, p. 1325, v. pp. 1329‑1330.

( 287 ) V., a este respeito, artigo 54.o da Convenção de Viena de 1969. A Convenção de Viena de 1969 prevê exceções (em determinadas condições): em caso de violação substancial (artigo 60.o), impossibilidade superveniente de cumprimento (artigo 61.o), alteração fundamental das circunstâncias (artigo 62.o), rutura de relações diplomáticas ou consulares (artigo 63.o) e superveniência de uma norma imperativa de direito internacional geral (artigo 64.o).

( 288 ) Isso resulta claramente do artigo 30.o da Convenção de Viena de 1969, relativo à aplicação de Tratados sucessivos sobre a mesma matéria.

( 289 ) Artigo 73.o da Convenção de Viena de 1969. Em todo o caso, quando ambas as Convenções de Viena, de 1969 e de 1986, sejam aplicáveis (por exemplo, no contexto da relação entre um acordo bilateral entre dois Estados e um acordo entre um Estado e uma organização internacional), a Convenção de Viena de 1969 prevalece (V. artigo 7.o da Convenção de Viena de 1986).

( 290 ) United Nations Treaty Series, vol. 1946, p. 3.

( 291 ) V. artigo 2.o, n.o 1, alínea g), da Convenção de Viena de 1969.

( 292 ) Artigo 1.o, n.o 1, e considerando 3 do Regulamento n.o 1219/2012.

( 293 ) V. n.os 69 a 76 do anexo às presentes conclusões.

( 294 ) Acórdão de 7 de março de 1996, Parlamento/Conselho, C‑360/93, EU:C:1996:84.

( 295 ) Acórdão de 7 de março de 1996, Parlamento/Conselho, C‑360/93, EU:C:1996:84.

( 296 ) Concretamente, a Diretiva 90/531/CEE do Conselho, de 17 de setembro de 1990, relativa aos procedimentos de celebração dos contratos de direito público nos setores da água, da energia, dos transportes e das telecomunicações (JO 1990, L 297, p. 1).

( 297 ) Acórdão de 7 de março de 1996, Parlamento/Conselho, C‑360/93, EU:C:1996:84, n.o 30.

( 298 ) Singapura, a União Europeia e os 28 Estados‑Membros são partes no Acordo sobre Contratos Públicos. Este acordo está incluído no anexo 4 ao Acordo OMC, que contém uma lista de acordos de comércio multilaterais. Em consequência, faz parte do Acordo OMC apenas para os Membros da OMC que o tenham aceitado (e é vinculativo apenas para esses Membros) (artigo II:3 do acordo OMC). Singapura, a União Europeia e os 28 Estados‑Membros são igualmente Partes no Acordo da OMC sobre Contratos Públicos, na sua versão alterada, que entrou em vigor em 6 de abril de 2014.

( 299 ) V., igualmente, n.o 402, supra.

( 300 ) V. artigo 10.4 do EUSFTA.

( 301 ) JO 2012, C 326, p. 309.

( 302 ) Este objetivo é igualmente invocado no artigo 3.o, n.o 3, TUE.

( 303 ) V. n.os 77 a 91 do anexo às presentes conclusões.

( 304 ) Acórdão de 18 julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520.

( 305 ) A Comissão refere‑se ao n.o 52 do acórdão.

( 306 ) A Comissão refere‑se ao n.o 53 do acórdão.

( 307 ) Acórdão de 12 de maio de 2005, Regione autonoma Friuli‑Venezia Giulia e ERSA, C‑347/03, EU:C:2005:285.

( 308 ) O artigo 61.o do Acordo TRIPS dispõe: «Os Membros preverão processos penais e penas aplicáveis pelo menos em casos de contrafação deliberada de uma marca ou de pirataria em relação ao direito de autor numa escala comercial. As sanções possíveis incluirão a prisão ou sanções pecuniárias suficientes para constituir um fator dissuasivo em conformidade com o nível de penas aplicadas a delitos de gravidade correspondente. Nos casos apropriados, as sanções possíveis incluirão igualmente a apreensão, arresto ou destruição das mercadorias em infração e de quaisquer materiais e instrumentos que tenham sido utilizados predominantemente na prática do delito. Os membros podem prever a aplicação de processos penais e penas correspondentes noutros casos de infração dos direitos de propriedade intelectual, especialmente quando essas infrações sejam cometidas deliberadamente e numa escala comercial».

( 309 ) Acórdão de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520.

( 310 ) Acórdão de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520.

( 311 ) Acórdão de 12 de maio de 2005, Regione autonoma Friuli‑Venezia Giulia e ERSA, C‑347/03, EU:C:2005:285.

( 312 ) 1161 UNTS 30.

( 313 ) 36 ILM 65.

( 314 ) 36 ILM 76.

( 315 ) 828 UNTS 305.

( 316 ) 9 ILM 978.

( 317 ) 39 ILM 1047.

( 318 ) Regulamento (UE) n.o 1257/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 17 de dezembro de 2012, que regulamenta a cooperação reforçada no domínio da criação da proteção unitária de patentes (JO 2012, L 361, p. 1), e Regulamento (UE) n.o 1260/2012 do Conselho, de 17 de dezembro de 2012, que regulamenta a cooperação reforçada no domínio da criação da proteção unitária de patentes no que diz respeito ao regime de tradução aplicável (JO 2012, L 361, p. 89).

( 319 ) Nesta disposição, as Partes reiteram as obrigações que lhes incumbem no âmbito do Tratado de Cooperação em matéria de Patentes e acordam em envidar todos os esforços razoáveis para respeitar os artigos 1.° a 16.° do Tratado sobre o Direito das Patentes de uma forma compatível com a respetiva legislação nacional e os procedimentos internos.

( 320 ) Acórdão de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520.

( 321 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.os 55 a 71. À exceção das medidas específicas destinadas a evitar a colocação em livre prática de mercadorias contrafeitas, o Acordo TRIPS não era abrangido pela aplicação da política comercial comum. O Tribunal de Justiça justificou essa posição pelo facto de os direitos de propriedade intelectual se prenderem «tanto, ou mais, com o comércio interno como com o comércio internacional». Contudo, nessa altura, a disposição do Tratado sobre política comercial comum não se referia aos aspetos comerciais dos direitos de propriedade intelectual.

( 322 ) Acórdão de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520, n.o 53.

( 323 ) Acórdão de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520, n.o 54.

( 324 ) V., a este respeito, acórdão de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520, n.o 55.

( 325 ) Acórdão de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520, n.o 58.

( 326 ) V., por exemplo, conclusões do advogado‑geral N. Wahl no processo de parecer 3/15 (Tratado de Marraquexe para facilitar o acesso a obras publicadas, EU:C:2016:657, n.os 64 a 66; V., igualmente, acórdão de 12 de maio de 2005, Regione autonoma Friuli‑Venezia Giulia e ERSA, C‑347/03, EU:C:2005:285, n.os 81 a 83.

( 327 ) V., igualmente, n.o 102, supra.

( 328 ) Quando o conteúdo da obrigação violada determina o conteúdo da medida (como é o caso da suspensão retaliatória de concessões ou de obrigações), isso pode sugerir uma ligação substantiva entre os dois tipos de obrigação. Contudo, o que caracteriza a retaliação cruzada, a que o Tribunal de Justiça se referiu no acórdão Daiichi, parece ser o facto de que não existe necessariamente essa ligação. Por uma questão de exaustividade, observo que o artigo 15.12 do EUSFTA prevê a possibilidade de uma Parte ter o direito de suspender as obrigações decorrentes de qualquer disposição a que o capítulo quinze (resolução de litígios) se aplique.

( 329 ) V. acórdão de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520, n.o 51.

( 330 ) Conclusões do advogado‑geral N. Wahl no processo de parecer 3/15 (Tratado de Marraquexe para facilitar o acesso a obras publicadas), EU:C:2016:657, n.o 56.

( 331 ) A Declaração de Punta del Este de 1986, que deu inicio às negociações comerciais do Uruguay Round, que resultaram na criação da OMC, estabeleceu essa ligação nos seguintes termos: «A fim de reduzir as distorções do, e os entraves ao, comércio internacional, e tendo em conta a necessidade de fomentar uma proteção eficaz e adequada dos direitos de propriedade intelectual e de garantir que as medidas e procedimentos destinados a fazer respeitar os referidos direitos não se convertam, por sua vez, em obstáculos ao comércio legítimo, as negociações deverão ter por finalidade clarificar as disposições do GATT e elaborar, se necessário, novas regras e disciplinas».

( 332 ) V., acórdãos de 20 de outubro de 1993, Phil Collins e o., C‑92/92 e C‑326/92, EU:C:1993:847, n.o 20, e de 4 de outubro de 2011, Football Association Premier League e o., C‑403/08 e C‑429/08, EU:C:2011:631, n.o 107 e jurisprudência referida.

( 333 ) Artigo 6‑bis, n.o 1, da Convenção de Berna para a Proteção das Obras Literárias e Artísticas, revista e alterada. Esse direito moral não está incorporado no Acordo TRIPS (v. artigo 9.o, n.o 1, do Acordo TRIPS). V., igualmente, acórdão de 20 de outubro de 1993, Phil Collins e o., C‑92/92 e C‑326/92, EU:C:1993:847, n.o 20.

( 334 ) V. n.o 93, supra.

( 335 ) V. acórdão de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675.

( 336 ) V. acórdão de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675, n.o 70; v., igualmente, n.o 72.

( 337 ) V., em especial, n.o 109, supra.

( 338 ) V., por exemplo, artigo 2.1 do Acordo TRIPS.

( 339 ) Como os redatores do EUSFTA fizeram, por exemplo, para uma parte significativa do capítulo dez, relativo aos contratos públicos: v. n.o 402, supra.

( 340 ) Acórdão de 28 de julho de 2016, Conselho/Comissão, C‑660/13, EU:C:2016:616, n.o 40. V., igualmente, n.os 102 e 111 (e jurisprudência referida) das conclusões que apresentei nesse processo (EU:C:2015:787).

( 341 ) Acórdão de 18 de julho de 2013, Daiichi Sankyo e Sanofi‑Aventis Deutschland, C‑414/11, EU:C:2013:520.

( 342 ) 815 UNTS 89.

( 343 ) Artigo 14.o da Convenção Internacional para a Proteção das Obtenções Vegetais.

( 344 ) Foi alegado que o artigo 11.36, n.o 3, do EUSFTA indica claramente que o capítulo onze não impede as Partes de aplicarem as respetivas ordens jurídicas nacionais nem lhes exige que alterem a respetiva legislação em matéria de execução dos direitos de propriedade intelectual. No entanto, interpreto esta disposição no sentido apenas de que o respeito do capítulo onze não exige necessariamente que a legislação existente relativa à execução dos direitos de propriedade intelectual seja alterada.

( 345 ) V. acórdão de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675.

( 346 ) A primeira frase do artigo 9.1 do Acordo TRIPS dispõe que os Membros da OMC devem observar o disposto nos artigos 1.° a 21.° da Convenção de Berna e no respetivo anexo. Contudo, a segunda frase acrescenta que os Membros da OMC não terão direitos ou obrigações ao abrigo do Acordo TRIPS no que diz respeito aos direitos conferidos pelo artigo 6‑bis da Convenção de Berna ou aos direitos deles decorrentes.

( 347 ) V. n.o 437, supra.

( 348 ) V. n.o 437, supra.

( 349 ) V. n.o 109, supra.

( 350 ) V. n.os 92 a 97 do anexo às presentes conclusões.

( 351 ) Um exemplo claro é o Acordo SMC, que está incluído no anexo 1A ao Acordo OMC e complementa o artigo XVI do GATT (de acordo com os artigos 12.5 e 12.7 do EUSFTA, as disposições do EUSFTA sobre subvenções baseiam‑se no Acordo SCM). O objetivo do Acordo SCM é proibir e regular a atribuição de subvenções a empresas suscetíveis de falsear a concorrência favorecendo a produção nacional, e regular as ações que os membros da OMC podem adotar para combater os efeitos das subvenções.

( 352 ) As primeiras iniciativas da OMC relacionadas com a necessidade de um quadro multilateral destinada a aumentar a contribuição da política de concorrência para o comércio internacional e o desenvolvimento, e para uma assistência técnica reforçada e desenvolvimento de competências neste domínio, não se traduziram em negociações em matéria de direito da concorrência na OMC. V. Working Group on the Interaction between Trade and Competition Policy (WGTCP) — History, Mandates and Decisions, disponível em: www.OMC.°rg/english/tratop_e/comp_e/history_e.htm#cancun; e The July 2004 package, disponível em: www.OMC.°rg/english/tratop_e/dda_e/dda_package_july04_e.htm.

( 353 ) Artigos 12.1, n.o 2, e 12.2 do EUSFTA.

( 354 ) V. última frase do artigo 12.1, n.o 1, do EUSFTA.

( 355 ) Artigo 12.3 do EUSFTA.

( 356 ) Artigos 12.5 a 12.8 do EUSFTA e anexo 12‑A do EUSFTA.

( 357 ) V. artigo 12.7, n.o 1, do EUSFTA.

( 358 ) Artigo 12.7, n.o 2, alínea b), do EUSFTA.

( 359 ) V., por analogia, acórdão de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675, n.os 66 e 67.

( 360 ) Regulamento de 20 de janeiro de 2004 («Regulamento das concentrações comunitárias») (JO 2004, L 24, p. 1).

( 361 ) V. n.os 508 A 513, infra.

( 362 ) V. n.os 13 a 18 do anexo às presentes conclusões.

( 363 ) V. n.o os 98 a 112 do anexo às presentes conclusões.

( 364 ) Artigo 13.17 do EUSFTA.

( 365 ) Última frase do artigo 207.o, n.o 1, TFUE.

( 366 ) Artigo 21.o, n.o 2, alínea f), TUE. V., igualmente, artigo 3.o, n.o 5, TUE e artigo 11.o TFUE; esta última disposição prevê que as exigências em matéria de proteção do ambiente devem ser «integradas na definição e execução das políticas e ações da União, em especial com o objetivo de promover um desenvolvimento sustentável».

( 367 ) Ambas as possibilidades estão previstas no artigo 13.1, n.o 3, do EUSFTA.

( 368 ) Esse objetivo foi igualmente relevante para a interpretação feita pelo Órgão de Recurso, em especial, da cláusula geral de exceção constante do artigo XX do GATT de 1994. V., por exemplo, Relatório do Órgão de Recurso, United States — Import Prohibition of Certain Shrimp and Shrimp Products, WT/DS58/AB/R, adotado em 6 de novembro de 1998, DSR 1998:VII, p. 2755, n.os 129 a 131 e 152 a 155, e Relatório do Órgão de Recurso, India — Certain Measures relating to Solar Cells and Solar Modules, WT/DS456/AB/R, adotado em 14 de outubro de 2016, ainda não publicado no reportório, n.o 5.72.

( 369 ) V. acórdão de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675, n.o 57 e jurisprudência referida.

( 370 ) V., em especial, parecer 1/78 (Acordo internacional sobre a borracha natural), de 4 de outubro de 1979, EU:C:1979:224; e acórdãos de 26 de março de 1987, Comissão/Conselho, 45/86, EU:C:1987:163; de 29 de março de 1990, Grécia/Conselho, C‑62/88, EU:C:1990:153; e de 12 de dezembro de 2002, Comissão/Conselho, C‑281/01, EU:C:2002:761.

( 371 ) Parecer 2/00 (Protocolo de Cartagena sobre Biosegurança), de 6 de dezembro de 2001, EU:C:2001:664, n.o 40.

( 372 ) Acórdão de 8 de setembro de 2009, Comissão/Parlamento e Conselho, C‑411/06, EU:C:2009:518.

( 373 ) JO 2006, L 190, p. 1.

( 374 ) Acórdão de 8 setembro de 2009, Comissão/Parlamento e Conselho, C‑411/06, EU:C:2009:518, n.o 72.

( 375 ) Artigo 7.1 do EUSFTA.

( 376 ) Artigo 7.3 do EUSFTA.

( 377 ) V., em especial, n.o 103, supra.

( 378 ) Artigo 7.4, alíneas a) e b), do EUSFTA.

( 379 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 33. O Tribunal de Justiça fez esta afirmação a respeito do Acordo OTC, que se aplica, em especial, aos regulamentos técnicos e às normas, bem como aos procedimentos de avaliação da conformidade com os regulamentos técnicos e as normas.

( 380 ) V., por exemplo, artigo 1.o do Acordo Comercial entre a União Europeia e os seus Estados‑Membros, por um lado, e a Colômbia e o Peru, por outro (JO 2012, L 354, p. 3).

( 381 ) Os termos do mandato do painel de peritos a que o artigo 13.17 do EUSFTA se refere consistiam apenas em «elaborar um relatório […] com recomendações». V., igualmente, n.os 523 a 535, infra.

( 382 ) Regulamento (UE) n.o 978/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de outubro de 2012, relativo à aplicação de um sistema de preferências pautais generalizadas e que revoga o Regulamento (CE) n.o 732/2008 do Conselho (JO 2012, L 303, p. 1), artigos 9.° a 16.o

( 383 ) V. artigos 13.16 e 13.17 do EUSFTA e n.o 490, supra.

( 384 ) Esta posição é reforçada pelo artigo 51.o, n.o 2, da Carta, que dispõe que a Carta não torna o âmbito de aplicação do direito da União extensivo a competências que não sejam as da União, não cria quaisquer novas atribuições ou competências para a União, nem modifica as atribuições e competências definidas pelos Tratados.

( 385 ) Acórdão de 11 de junho de 2014, Comissão/Conselho, C‑377/12, EU:C:2014:1903.

( 386 ) A União é Parte nesse acordo por força da Decisão 2012/272/UE do Conselho, de 14 de maio de 2012 (JO 2012, L 134, p. 3).

( 387 ) Acórdão de 11 de junho de 2014, Comissão/Conselho, C‑377/12, EU:C:2014:1903, n.o 59.

( 388 ) Acórdão de 11 de junho de 2014, Comissão/Conselho, C‑377/12, EU:C:2014:1903, n.os 38 e 49 e jurisprudência referida.

( 389 ) O artigo 43.o, n.o 2, TFUE constitui a base jurídica para a adoção das disposições necessárias à prossecução, em especial, da política comum das pescas, à qual o artigo 3.o, n.o 1, alínea d), TFUE se refere.

( 390 ) O artigo 191.o, n.o 4, TFUE confere à União Europeia competência para celebrar acordos com países terceiros que regulem a cooperação ambiental em domínios nos quais disponha de competência.

( 391 ) V., a este propósito, acórdão de 4 de setembro de 2014, Comissão/Conselho, C‑114/12, EU:C:2014:2151, n.o 75.

( 392 ) V. n.os 113 a 118 do anexo às presentes conclusões.

( 393 ) V. n.os 7, 8, 10, 12, 15, 35, 37, 41, 42, 58, 72 a 75, 82, 88, 89, 95 e 96 do anexo às presentes conclusões.

( 394 ) Artigo 14.1, alínea a), do EUSFTA.

( 395 ) V. artigo 14.2, n.o 1, do EUSFTA.

( 396 ) V. nota 388, supra. Na medida em que as obrigações específicas enunciadas noutros capítulos, relativas à transparência e ao reexame administrativo e judicial, divirjam das disposições do capítulo catorze, essas regras mais específicas enunciadas noutros capítulos prevalecem (artigo 14.8 do EUSFTA).

( 397 ) V., por exemplo, acórdão de 22 de outubro de 2013, Comissão/Conselho, C‑137/12, EU:C:2013:675.

( 398 ) É por esse motivo que os acordos da OMC contêm um amplo leque de obrigações destinadas a assegurar a proteção contra tais obstáculos no que diz respeito à preparação, adoção, entrada em vigor, publicação, aplicação, notificação e administração e reexame (administrativo e judicial) de medidas. V., por exemplo, artigo X do GATT de 1994.

( 399 ) V. n.os 61 a 67 do anexo às presentes conclusões.

( 400 ) V. n.os 111, 112 e 119 a 123 do anexo às presentes conclusões.

( 401 ) Regulamento (UE) n.o 912/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de julho de 2014, que estabelece um regime de gestão da responsabilidade financeira relacionada com os órgãos jurisdicionais de resolução de litígios entre os investidores e o Estado, estabelecidos por acordos internacionais em que a União é parte (JO 2014, L 257, p. 121).

( 402 ) Parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 20.

( 403 ) V. pareceres 1/91 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 14 de dezembro de 1991, EU:C:1991:490, n.os 40 e 70; 1/09, de 8 de março de 2011, EU:C:2011:123, n.o 74; e 2/13 (Adesão da União Europeia à CEDH), de 18 de dezembro de 2014, EU:C:2014:2454, n.o 182.

( 404 ) Também se aplica, por analogia, às disposições específicas relativas à resolução de litígios constantes dos artigos 13.16 e 13.17 do EUSFTA.

( 405 ) Artigo 67.o dessa convenção.

( 406 ) V., a este respeito, parecer 2/91 (Convenção n.o 170 da OIT), de 19 de março de 1993, EU:C:1993:106, n.os 3 a 5. Nesse processo, a Constituição da OIT impedia a (então) Comunidade Europeia de celebrar, por si própria, a Convenção n.o 170.

( 407 ) Tal decorre dos artigos 9.11, n.o 2, e 9.15, n.o 2, do EUSFTA, em conjugação com o artigo 9.24, nos termos do qual o tribunal pode conceder uma indemnização pecuniária acrescida de eventuais juros aplicáveis, e a restituição de bens.

( 408 ) V., igualmente, Declaração comum do Parlamento Europeu, do Conselho e da Comissão, anexa ao Regulamento n.o 912/2014.

( 409 ) Em todo o caso, o artigo 9.15, n.o 2, do EUSFTA, nos termos do qual a União Europeia deve proceder a uma determinação da parte demandada no prazo de dois meses a contar da data de receção da declaração de intenção de recorrer à arbitragem, não remete (expressa ou implicitamente) para esse regulamento.

( 410 ) Parecer 1/75 (Acordo da OCDE relativo a uma norma para as despesas locais), de 11 de novembro de 1975, EU:C:1975:145, p. 1364. V., igualmente, parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 21.

( 411 ) V., neste sentido, parecer 1/75 (Acordo da OCDE relativo a uma norma para as despesas locais), de 11 de novembro de 1975, EU:C:1975:145, p. 1364.

( 412 ) Parecer 1/78 (Acordo internacional sobre a borracha natural), de 4 de outubro de 1979, EU:C:1979:224, n.o 60. V., igualmente, parecer 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 21.

( 413 ) V. n.o 85, supra.

( 414 ) As principais características da proteção diplomática foram descritas pela Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas como a «[…] invocação por um Estado, através de uma ação diplomática ou de outros meios de resolução pacífica, da responsabilidade de outro Estado em razão de um ato internacionalmente ilícito desse Estado contra uma pessoa singular ou coletiva nacional do primeiro Estado, com o objetivo de retirar consequências jurídicas dessa responsabilidade». Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas, Projeto de Artigos sobre Proteção Diplomática Comentados (2006), adotado pela Comissão de Direito Internacional na sua quinquagésima oitava sessão e apresentado à Assembleia Geral como parte do relatório da Comissão sobre os trabalhos dessa sessão (A/61/10), «UN ILC Draft Articles on Diplomatic Protection», Yearbook of the International Law Commission, 2006, vol. II, Part Two, artigo 1.o e comentário ao artigo 1.o, n.o 2.

( 415 ) Tribunal Permanente de Justiça Internacional, acórdão Mavrommatis Palestine Concessions (Grécia c. Reino Unido), Coletânea 1924, série A, n.o 2, p. 12. V., igualmente, Tribunal Internacional de Justiça, processo relativo à Barcelona Traction Light and Power Company Limited (Bélgica c. Espanha), segunda fase, acórdão de 5 de fevereiro de 1970, Coletânea 1970, p. 3, n.o 78.

( 416 ) Tribunal Internacional de Justiça, Processo Interhandel (Suíça c. Estados Unidos da América), exceções preliminares, acórdão de 21 de março de 1959, Coletânea 1959, p. 6, p. 27. V., igualmente, «UN ILC Draft Articles on Diplomatic Protection», artigo 14.o e comentário a esta disposição.

( 417 ) Para uma resenha histórica desta evolução, v., por exemplo, Parlett, K., The Individual in the International Legal System: Continuity and Change in International Law, Cambridge University Press, 2011, pp. 47 a 123 (sobre «Ações individuais e internacionais»).

( 418 ) «UN ILC Draft Articles on Diplomatic Protection», comentário ao artigo 17.o, n.o 2.

( 419 ) O artigo 27.o, n.o 1, da Convenção CIRDI dispõe que: «[n]enhum Estado Contratante concederá proteção diplomática nem apresentará internacionalmente uma reclamação respeitante a um diferendo que um dos seus nacionais e outro Estado Contratante tenham consentido submeter ou hajam submetido a arbitragem no quadro da presente Convenção, exceto no caso de o outro Estado Contratante não acatar a sentença proferida no dito diferendo».

( 420 ) V. n.os 124 a 130 do anexo às presentes conclusões.

( 421 ) V., neste sentido, pareceres 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 107, e 1/08 (Acordos que alteram compromissos específicos assumidos ao abrigo do GATS), de 30 de novembro de 2009, EU:C:2009:739, n.o 127.

( 422 ) Acórdão de 28 de abril de 2015, Comissão/Conselho, C‑28/12, EU:C:2015:282, n.o 47.

( 423 ) V., inter alia, pareceres 1/94 (Acordos anexos ao Acordo OMC), de 15 de novembro de 1994, EU:C:1994:384, n.o 108, e 2/00 (Protocolo de Cartagena sobre Biosegurança), de 6 de dezembro de 2001, EU:C:2001:664, n.o 18; e acórdãos de 20 de abril de 2010, Comissão/Suécia, C‑246/07, EU:C:2010:203, n.o 73, e de 28 de abril de 2015, Comissão/Conselho, C‑28/12, EU:C:2015:282, n.o 54.

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