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Document 62011TJ0453
Judgment of the General Court (First Chamber) of 21 October 2014. # Gilbert Szajner v Office for Harmonisation in the Internal Market (Trade Marks and Designs) (OHIM). # Case T-453/11.
Acórdão do Tribunal Geral (Primeira Secção) de 21 de Outubro de 2014.
Gilbert Szajner contra Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI).
Marca comunitária - Processo de declaração de nulidade - Marca nominativa comunitária LAGUIOLE - Denominação social francesa anterior Forge de Laguiole - Artigo 53.º, n.º 1, alínea c), e artigo 8.º, n.º 4, do Regulamento (CE) n.º 207/2009.
Processo T-453/11.
Acórdão do Tribunal Geral (Primeira Secção) de 21 de Outubro de 2014.
Gilbert Szajner contra Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI).
Marca comunitária - Processo de declaração de nulidade - Marca nominativa comunitária LAGUIOLE - Denominação social francesa anterior Forge de Laguiole - Artigo 53.º, n.º 1, alínea c), e artigo 8.º, n.º 4, do Regulamento (CE) n.º 207/2009.
Processo T-453/11.
Court reports – general
ECLI identifier: ECLI:EU:T:2014:901
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Parte decisória
No processo T‑453/11,
Gilbert Szajner, residente em Niort (França), representado por A. Lakits‑Josse, advogado,
recorrente,
contra
Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por A. Folliard‑Monguiral, na qualidade de agente,
recorrido,
sendo a outra parte na Câmara de Recurso do IHMI, interveniente no Tribunal Geral,
Forge de Laguiole SARL, com sede em Laguiole (França), representada por F. Fajgenbaum, advogado,
que tem por objeto um recurso da decisão da Primeira Câmara de Recurso do IHMI de 1 de junho de 2011 (processo R 181/2007‑1), relativa a um processo de declaração de nulidade entre a Laguiole SARL e Gilbert Szajner,
O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),
composto por: H. Kanninen, presidente, I. Pelikánová (relator) e E. Buttigieg, juízes,
secretário: C. Heeren, administradora,
vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de agosto de 2011,
vistas as observações da interveniente apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de novembro de 2011,
vista a contestação do IHMI, apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de dezembro de 2011,
vista a réplica apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 20 de abril de 2012,
vista a tréplica da interveniente apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de julho de 2012,
após a audiência de 11 de fevereiro de 2014,
vistas as observações escritas complementares apresentadas pelas partes a pedido do Tribunal Geral e apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 24 e 25 de fevereiro de 2014, bem como em 8 e 9 de abril de 2014,
profere o presente
Acórdão
Antecedentes do litígio
1. O recorrente, Gilbert Szajner, é titular da marca nominativa comunitária LAGUIOLE, pedida em 20 de novembro de 2001 e registada em 17 de janeiro de 2005 pelo Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), ao abrigo do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (CE) n.° 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1)].
2. Os produtos e os serviços para os quais a marca LAGUIOLE foi registada pertencem nomeadamente, após renúncia parcial que teve lugar no decurso do processo no IHMI, às classes 8, 14, 16, 18, 20, 21, 28, 34 e 38 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem, para cada uma dessas classes, à descrição seguinte:
– classe 8: «Ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente; colheres; serras, chaves de fendas; máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; estojos de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas; estojos de manicura»;
– classe 14: «Metais preciosos e suas ligas; joalharia, bijutaria, pedras preciosas; guarda‑joias em metais preciosos; relojoaria e instrumentos cronométricos, botões de punho, alfinetes de gravatas, alfinete de adereço, porta‑chaves de fantasia; porta‑moedas em metais preciosos; relógios e pulseiras de relógios; caixas, palmatórias para velas, cigarreiras, utensílios e recipientes para uso doméstico e para cozinha em metais preciosos; baixela em metais preciosos»;
– classe 16: «Material escolar; corta‑papéis; lápis, porta‑minas, borrachas para apagar; sobrescritos; arquivadores; álbuns, livros periódicos; almanaques, brochuras, cadernos, catálogos; calendários, litografias, cartazes»;
– classe 18: «Couro e imitações de couro; malas de viagem, maletas e sacos de viagem; bengalas; malas de mão; sacos de praia; sacos, estojos e cofres de viagem; carteiras de bolso; porta‑cartões (carteiras de bolso), porta‑documentos; pastas (marroquinaria); estojos para chaves (marroquinaria); porta‑moedas não em metais preciosos»;
– classe 20: «Molduras, objetos de arte ou de decoração em madeira, cortiça, cana, junco, vime, chifre, osso, marfim, baleia, tartaruga, âmbar, madrepérola, espuma do mar, sucedâneos de todas estas matérias ou em matérias plásticas»;
– classe 21: «Utensílios para cozinha e loiça em vidro, porcelana e faiança; loiça não em metais preciosos; saca‑rolhas; abre‑garrafas, caixas metálicas para a distribuição de guardanapos de papel; ampulhetas; pincéis para a barba, estojos de toilette »;
– classe 28: «Artigos de ginástica e desporto (exceto artigos de natação, vestuário, tapetes e calçado); luvas de golfe»;
– classe 34: «Artigos para fumadores; fósforos, isqueiros para fumadores; charuteiras e cigarreiras não em metais preciosos; corta‑charutos; cachimbos; limpadores de cachimbos»;
– classe 38: «Telecomunicações; informações em matéria de telecomunicações; agências de informação (notícias); envio de mensagens; transmissão de mensagens e de imagens auxiliada por computador; comunicações por e/ou entre computadores e terminais de computador; comunicações por telefone; comunicação, transmissão de informações contidas em bases de dados ou num servidor telemático; correio telefónico, eletrónico ou telemático; comunicação e transmissão de mensagens, de informações e de dados, em linha ou em tempo diferido, a partir de sistemas de tratamento de dados, de redes informáticas, incluindo a rede mundial de telecomunicação chamada ‘Internet’ e a rede mundial chamada ‘Web’; transmissão de informações por redes de telecomunicação, incluindo a rede mundial dita ‘Internet’».
3. Em 22 de julho de 2005, a interveniente, a Forge de Laguiole SARL, apresentou um pedido de declaração de nulidade parcial da marca LAGUIOLE, ao abrigo do disposto no artigo 52.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 40/94, em conjugação com o artigo 8.°, n.° 4, deste mesmo regulamento [atuais artigo 53.°, n.° 1, alínea c), e artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 207/2009].
4. O pedido de declaração de nulidade baseava‑se na denominação social Forge de Laguiole, utilizada pela interveniente para as atividades de «fabrico e venda de todos os artigos de cutelaria, cinzelagem, artigos para oferta e lembranças — todos os artigos relacionados com as artes da mesa». Segundo a interveniente, essa denominação social, cujo alcance não é apenas local, dá‑lhe o direito, nos termos do direito francês, de proibir a utilização de uma marca mais recente.
5. O pedido de nulidade parcial era dirigido contra todos os produtos e serviços mencionados no n.° 2, supra .
6. Por decisão de 27 de novembro de 2006, a Divisão de Anulação indeferiu o pedido de declaração de nulidade.
7. Em 25 de janeiro de 2007, a interveniente interpôs recurso para o IHMI, nos termos dos artigos 57.° a 62.° do Regulamento n.° 40/94 (atuais artigos 58.° a 64.° do Regulamento n.° 207/2009), da decisão da Divisão de Anulação.
8. Por decisão de 1 de junho de 2011 (a seguir «decisão impugnada»), a Primeira Câmara de Recurso do IHMI deu parcialmente provimento ao recurso e declarou a marca LAGUIOLE nula para os produtos das classes 8, 14, 16, 18, 20, 21, 28 e 34, tendo negado provimento ao recurso no que respeita aos serviços da classe 38.
9. Em particular, a Câmara de Recurso considerou que, de acordo com a jurisprudência francesa, uma denominação social estava protegida, por princípio, para todas as atividades abrangidas pelo seu objeto social, estando a proteção, contudo, limitada às atividades efetiva e concretamente exercidas quando o objeto social fosse impreciso ou as atividades exercidas não estivessem abrangidas por ele. Ora, no caso em apreço, o objeto social da interveniente é suficientemente preciso no que respeita ao «fabrico e venda de todos os artigos de cutelaria, cinzelagem». A Câmara de Recurso acrescentou que, mesmo admitindo que o enunciado do objeto social «fabrico e venda de todos os artigos para oferta e lembranças — todos os artigos relacionados com as artes da mesa» seja imprecisa, a denominação social da requerente merecia a proteção, pelo menos nos setores em que tinha efetivamente exercido as suas atividades antes do depósito da marca LAGUIOLE.
10. A este respeito, a Câmara de Recurso considerou que a interveniente havia demonstrado ter exercido uma atividade comercial, já antes do depósito da marca LAGUIOLE, para o comércio dos produtos abrangidos pelas «artes da mesa», as «artes da casa», pelo universo do vinho, pela cinzelagem e pelos artigos para fumadores, golfistas, caçadores e para o lazer, bem como de outros acessórios. Em contrapartida, a interveniente não demonstrou uma atividade comercial no que diz respeito aos produtos de luxo e aos artigos de viagem, aliás, não abrangidos pelo seu objeto social. Por fim, a Câmara de Recurso considerou que, à exceção dos serviços de telecomunicações da classe 38, todos os produtos designados pela referida marca coincidiam com os setores de atividade da interveniente ou se situavam em setores de atividade conexos.
11. No que se refere aos sinais em conflito, a Câmara de Recurso considerou que o termo «laguiole», embora descritivo e não distintivo para as facas, era, não obstante, o elemento dominante, ou, pelo menos, codominante, da denominação social Forge de Laguiole, mesmo quando esta era utilizada para facas. Numa apreciação global, os sinais em conflito apresentam uma certa semelhança nos planos fonético, visual e conceptual, que não pode ser contrabalançada pelo mero aditamento da expressão genérica «forje de».
12. A Câmara de Recurso concluiu daqui, por um lado, que existia um risco de confusão para os consumidores franceses, se a marca LAGUIOLE fosse utilizada para produtos ou serviços idênticos ou semelhantes, destinados à mesma clientela e vendidos no âmbito dos mesmos negócios que «a cutelaria, a cinzelagem e os objetos para oferta ou destinados às artes da mesa», os quais constituem setores de atividades da interveniente. Por outro lado, considerou que as atividades da interveniente seriam afetadas se a marca fosse usada para produtos complementares, indissociavelmente ligados a essas atividades, ou mesmo abrangidos por setores de atividades conexas onde estas atividades podem naturalmente ter desenvolvimentos.
13. Por último, segundo a Câmara de Recurso, em razão do seu prestígio, ou até da sua reputação, a denominação social Forge de Laguiole possuía um caráter distintivo forte e podia beneficiar de uma proteção excecional, mesmo para setores de atividade diferentes dos abrangidos pelo seu objeto social.
Pedidos das partes
14. O recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:
– anular a decisão impugnada;
– condenar a interveniente a suportar as suas próprias despesas, bem como as dele.
15. O IHMI conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:
– negar provimento ao recurso;
– condenar o recorrente nas despesas.
16. A interveniente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:
– confirmar a decisão da Câmara de Recurso;
– condenar o recorrente nas despesas.
Questão de direito
1. Quanto aos documentos apresentados pela primeira vez no Tribunal Geral
17. Importa observar que, no âmbito, respetivamente, da réplica e da tréplica, o recorrente e a interveniente apresentaram alguns documentos que não faziam parte dos autos do processo no IHMI.
18. Assim, o recorrente apresentou:
– três excertos de um dicionário (anexos 34, 35 e 39 da réplica);
– um excerto de um catálogo de vendas em leilão (anexo 36 da réplica);
– dois excertos de resultados de um motor de busca na Internet (anexos 37 e 40 da réplica);
– um excerto de uma enciclopédia em linha (anexo 38 da réplica);
– dois artigos de imprensa (anexo 41 da réplica);
– excertos de resultados da pesquisa de marcas na base de dados do Institut national de la propriété intellectuelle francês (INPI) (anexo 42 da réplica);
– quatro cópias de decisões da Divisão de Oposição do IHMI (anexos 34‑A, 34‑B, 37‑A e 38‑A da réplica).
19. Por sua vez, a interveniente apresentou:
– decisões de diferentes tribunais franceses (anexos 55, 57, 58, 67, 68, 69, 70, 73 e 74 da tréplica);
– três decisões de Câmaras de Recurso e da Divisão de Oposição do IHMI (anexos 56, 59 e 66 da tréplica);
– excertos das diretivas do IHMI relativas ao processo de oposição (anexo 60 da tréplica);
– quatro artigos de imprensa retirados da Internet (anexo 61 da tréplica);
– três excertos de sítios de venda por Internet (anexos 63 a 65 da tréplica);
– um excerto do Code de la consommation (Código do Consumo francês) (anexo 71 da tréplica);
– excertos do balanço de atividades de 2011 da direction générale de la concurrence, de la consommation et de la répression des fraudes francesa (DGCCRF) (anexo 72 da tréplica).
20. Além disso, o IHMI alegou, nas suas observações complementares de 21 de fevereiro de 2014, que o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (C.Cass. Ch. Com., Cœur de princesse/Mattel France, n.° 08‑2012.010), invocado pelo recorrente, devia ser afastado dos debates, por ser inadmissível.
21. Há que recordar, a este respeito, que o recurso para o Tribunal Geral visa a fiscalização da legalidade das decisões das Câmaras de Recurso do IHMI, na aceção do artigo 65.° do Regulamento n.° 207/2009, pelo que a função do Tribunal Geral não consiste em reexaminar as circunstâncias de facto à luz dos documentos que lhe são apresentados pela primeira vez. Por conseguinte, há que rejeitar os anexos 34 a 42 da réplica, bem como os anexos 61, 63 a 65 e 72 da tréplica da interveniente, sem que seja necessário examinar a sua força probatória [v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 24 de novembro de 2005, Sadas/IHMI — LTJ Diffusion (ARTHUR ET FELICIE), T‑346/04, Colet., p. II‑4891, n.° 19 e jurisprudência aí referida].
22. Em contrapartida, os anexos 34‑A, 34‑B, 37‑A e 38‑A da réplica e os anexos 56, 59, 60 e 66 da tréplica, embora tenham sido apresentados pela primeira vez perante o Tribunal Geral, não constituem provas propriamente ditas, mas dizem respeito à prática decisória do IHMI, a qual, apesar de posterior ao processo no IHMI, uma parte tem o direito de referir (acórdão ARTHUR ET FELICIE, já referido no n.° 21, supra , n.° 20).
23. O mesmo se diga dos anexos 55, 57, 58, 67 a 71, 73 e 74 da tréplica, bem como do acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.° 20, supra ), que devem ser julgados admissíveis, uma vez que dizem respeito à legislação nacional, bem como à prática jurisdicional dos tribunais nacionais, a qual, apesar de posterior ao processo no IHMI, uma parte tem o direito de referir. Com efeito, na interpretação do direito nacional que, como acontece no caso em apreço, é referido pelo direito da União (n.° 29, infra ), nem as partes nem o próprio Tribunal Geral podem ser impedidos de se inspirar em elementos retirados da legislação ou da jurisprudência nacional, pois não se trata de criticar a Câmara de Recurso por não ter tomado em conta elementos de facto respeitantes a determinado acórdão de um órgão jurisdicional francês, mas sim de invocar disposições legais ou sentenças em apoio de um fundamento relativo à má aplicação de uma disposição do direito nacional pelas Câmaras de Recurso [v., por analogia, acórdão do Tribunal Geral de 12 de julho de 2006, Vitakraft‑Werke Wührmann/IHMI — Johnson’s Veterinary Products (VITACOAT), T‑277/04, Colet., p. II‑2211, n. os 70 e 71].
24. Por outro lado, na medida em que o IHMI invoca o acórdão do Tribunal de Justiça de 5 de julho de 2011, Edwin/IHMI (C‑263/09 P, Colet., p. I‑5853, n. os 46 a 57), para contestar a admissibilidade do acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.° 20, supra ) como elemento de prova, basta constatar que não resulta daquele acórdão que o Tribunal Geral esteja impedido de tomar em conta elementos apresentados pela primeira vez perante ele por uma parte a fim de demonstrar que a Câmara de Recurso aplicou incorretamente o direito nacional invocado perante ela. Com efeito, no referido acórdão, o Tribunal de Justiça apenas examinou, por um lado, se o Tribunal Geral tinha violado uma norma nacional aplicada ao mérito de um litígio e, por outro, se era competente para apreciar a existência de tal violação (acórdão Edwin/IHMI, já referido, n.° 44). Neste contexto, é verdade que indicou que uma parte que pedia a aplicação de uma regra nacional estava obrigada a apresentar ao IHMI os elementos que estabeleciam o conteúdo da mesma (v. acórdão Edwin/IHMI, já referido, n.° 50). No entanto, isso não significa que a aplicação da regra nacional efetuada pelo IHMI não possa ser fiscalizada pelo Tribunal Geral à luz de um acórdão nacional posterior à adoção da decisão do IHMI e invocado por uma das partes no processo.
25. Por último, há que rejeitar o argumento do IHMI segundo o qual o facto de o recorrente ter apresentado o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.° 20, supra ), apenas na audiência e não antes, constitui uma «manobra processual dilatória». Com efeito, importa desde logo recordar, a este respeito, que o referido acórdão foi proferido alguns dias após a apresentação da tréplica da interveniente, num momento em que a fase escrita, embora não estivesse ainda formalmente encerrada, estava, em princípio, terminada. O recorrente não podia, portanto, invocar utilmente o acórdão de 10 de julho de 2012 nos seus articulados. Seguidamente, sublinhe‑se que, contrariamente às afirmações do IHMI, o recorrente invocou o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012, referido no n.° 20, supra , já no âmbito da fundamentação do seu pedido de realização de uma audiência, apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 23 de agosto de 2012 e notificado ao IHMI em 11 de setembro de 2012, e não apenas na audiência.
2. Quanto ao mérito
26. O recorrente invoca um único fundamento, relativo à violação do artigo 53.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 207/2009, lido em conjugação com o artigo 8.°, n.° 4, do mesmo regulamento.
27. Por força destas duas disposições, a existência de um sinal diferente de uma marca permite obter a declaração de nulidade de uma marca comunitária, se o mesmo preencher cumulativamente quatro requisitos: esse sinal deve ser utilizado na vida comercial; deve ter um alcance não apenas local; o direito a esse sinal deve ter sido adquirido em conformidade com o direito do Estado‑Membro onde o sinal era utilizado antes da data do depósito do pedido de marca comunitária; por último, deve conferir ao seu titular o direito de proibir a utilização de uma marca mais recente. Estes quatro requisitos limitam o número dos sinais diferentes de marcas que podem ser invocados para contestar a validade de uma marca comunitária em todo o território comunitário, nos termos do artigo 1.°, n.° 2, do Regulamento n.° 207/2009 [acórdão do Tribunal Geral de 24 de março de 2009, Moreira da Fonseca/IHMI — General Óptica (GENERAL OPTICA), T‑318/06 a T‑321/06, Colet., p. II‑649, n.° 32].
28. Os dois primeiros requisitos, isto é, os relativos à utilização e ao alcance do sinal invocado, uma vez que esse alcance não deve ser apenas local, resultam da própria letra do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 207/2009 e devem, por conseguinte, ser interpretados à luz do direito da União. Assim, o Regulamento n.° 207/2009 estabelece padrões uniformes, relativos à utilização dos sinais e ao respetivo alcance, que são coerentes com os princípios que inspiram o sistema instituído por esse regulamento (acórdão GENERAL OPTICA, referido no n.° 27, supra , n.° 33).
29. Em contrapartida, resulta do segmento de frase «quando e na medida em que, segundo a legislação comunitária ou o direito do Estado‑Membro aplicável a esse sinal» que os dois outros requisitos, enunciados seguidamente no artigo 8.°, n.° 4, alíneas a) e b), do Regulamento n.° 207/2009, constituem requisitos fixados pelo regulamento que, diferentemente dos precedentes, devem ser apreciados à luz dos critérios fixados pelo direito que rege o sinal invocado. Esta remissão para a legislação que regula o sinal invocado é perfeitamente justificada, dado que o Regulamento n.° 207/2009 reconhece a sinais alheios ao sistema da marca comunitária a possibilidade de serem invocados contra uma marca comunitária. Por isso, só o direito que rege o sinal invocado permite determinar se este é anterior à marca comunitária e se pode justificar que se proíba a utilização de uma marca mais recente (acórdão GENERAL OPTICA, referido no n.° 27, supra , n.° 34).
30. No caso em apreço, não é contestado que a denominação social Forge de Laguiole é um sinal utilizado na vida comercial, na aceção do artigo 8.°, n.° 4, do Regulamento n.° 207/2009, e que o seu alcance ultrapassa o âmbito local. As partes também não contestaram, nem durante o processo no IHMI nem nos seus articulados no Tribunal Geral, que os direitos sobre esta denominação social foram adquiridos, ao abrigo do direito francês, anteriormente a 20 de novembro de 2001, data do depósito da marca LAGUIOLE.
31. Na medida em que, na audiência, o recorrente tentou, por referência às suas marcas francesas LAGUIOLE, apresentadas em 1993, pôr em causa o caráter anterior da denominação social da interveniente na sua forma atual, relativamente à marca comunitária LAGUIOLE, basta observar que, no caso em apreço, só é pertinente a data de depósito da referida marca comunitária, a saber, 20 de novembro de 2001 (v. n.° 1, supra ).
32. Em contrapartida, as partes opõem‑se ao quarto requisito enunciado no n.° 27, supra , relativo à questão de saber se e, sendo esse o caso, em que medida a denominação social da interveniente lhe permite proibir ao recorrente a utilização da marca mais recente LAGUIOLE. Em conformidade com a jurisprudência acima referida no n.° 29, supra , a resposta a esta questão depende exclusivamente do direito francês.
33. No caso em apreço, a Câmara de Recurso baseou, à luz da jurisprudência francesa existente à data da adoção da decisão impugnada, o seu raciocínio em dois pilares, cada um dos quais devia ser suficiente, por si só, para fundamentar a sua conclusão segundo a qual a denominação social da interveniente estava protegida para a totalidade das atividades referidas no seu objeto social.
34. Primeiro, a Câmara de Recurso considerou, no essencial, que o enunciado do objeto social da interveniente estava definido de forma suficientemente precisa para se poder admitir que a proteção conferida pela sua denominação social se estende a todas as atividades aí enunciadas (decisão impugnada, pontos 87 a 90). Segundo, considerou que, mesmo admitindo que tal não foi o caso para a atividade de «fabrico e venda de […] todos os artigos para oferta e lembranças — todos eles relacionados com as artes da mesa», a interveniente havia demonstrado ter diversificado as suas atividades, antes de 20 de novembro de 2001, para as «artes da mesa», as «artes da casa», «o universo do vinho», a cinzelagem, os artigos para fumadores, para golfistas, para caçadores e para lazer, bem como os «outros acessórios» (decisão impugnada, pontos 91 a 94).
35. Por conseguinte, há que examinar cada um dos dois pilares em que se baseia a decisão impugnada.
Quanto ao alcance da proteção conferida pela denominação social Forge de Laguiole
36. Os artigos L. 714‑3 e L. 711‑4 do Code de la propriété intellectuelle (Código da Propriedade Intelectual francês, a seguir «CPI») têm a seguinte redação:
L. 714‑3
«Será declarado nulo por decisão judicial o registo de uma marca que não seja conforme com as disposições dos artigos L. 711‑1 a L. 711‑4.
[…]
Apenas o titular de um direito anterior pode pedir a declaração de nulidade com fundamento no artigo L. 711‑4. Todavia, a sua ação não é admissível se a marca tiver sido depositada de boa‑fé e se ele tiver tolerado o seu uso durante cinco anos.
A decisão de anulação tem efeito absoluto.»
L. 711‑4
«Não pode ser adotado como marca um sinal que viole os direitos anteriores, designadamente:
[…]
b) uma denominação ou razão social, se existir um risco de confusão no espírito do público;
[…]»
37. É pacífico que o direito de obter a anulação de uma marca mais recente com fundamento numa denominação social inclui, a fortiori, o direito de se opor à utilização dessa marca, na aceção do quarto requisito enunciado no n.° 27, supra .
38. O recorrente alega que, em direito francês, a proteção da denominação social só abrange as atividades realmente exploradas, em especial quando as atividades indicadas no objeto social são definidas de maneira demasiado lata.
39. O IHMI considera, por seu turno, que, em direito francês, o alcance da proteção da denominação social é definido pelo enunciado das atividades indicadas no objeto social, exceto se esse enunciado for demasiado lato ou impreciso, e que, nessa hipótese, o referido alcance da proteção é limitado apenas às atividades concretas exercidas pela sociedade em causa.
40. A interveniente sustenta, no essencial, que a denominação social está protegida para qualquer atividade mencionada no objeto social, mesmo que este último esteja redigido em termos latos, e independentemente das atividades efetivamente exercidas. Acrescenta que a proteção se estende também às atividades de setores económicos ainda não exercidas pelo seu titular, mas conexas com os mencionados no objeto social.
41. Importa recordar que, segundo a interpretação do artigo L. 711‑4, alínea b), do CPI, proposta pela Câmara de Recurso na decisão impugnada, uma denominação social está protegida, por princípio, para todas as atividades abrangidas pelo seu objeto social, sendo, contudo, a proteção limitada às atividades efetiva e concretamente exercidas quando o objeto social é impreciso ou quando as atividades exercidas não estão abrangidas por ele.
42. Para esta interpretação, a Câmara de Recurso baseou‑se na jurisprudência francesa pertinente, tal como existia à data da adoção da decisão impugnada, em 1 de junho de 2011. Essa jurisprudência não era uniforme e tinha dado lugar a uma controvérsia na doutrina especializada, amplamente referida pelas partes, tanto perante o IHMI como perante o Tribunal Geral.
43. Ora, essa jurisprudência divergente bem como a controvérsia por ela suscitada na doutrina foram reformuladas pelo acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.° 20, supra ). Com efeito, nesse acórdão, proferido após a adoção da decisão impugnada, foi declarado que «a denominação social só [beneficiava] de proteção para as atividades efetivamente exercidas pela sociedade, e não para as enumeradas nos seus estatutos».
44. Contrariamente ao que o IHMI e a interveniente alegam nas suas observações escritas complementares, apresentadas, respetivamente, em 24 e 25 de fevereiro de 2014, o princípio enunciado no acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.° 20, supra ) é desprovido de qualquer ambiguidade quanto ao âmbito da proteção conferida a uma denominação social e aplica‑se de forma geral. É verdade que o processo que deu origem ao referido acórdão não dizia respeito a um recurso interposto com base no artigo L. 711‑4 do CPI, mas à anulação de uma marca por depósito fraudulento e a um pedido em matéria de concorrência desleal. No entanto, há que salientar que a passagem citada no n.° 43, supra, figura na secção desse acórdão que rejeita um fundamento invocado contra a anulação da marca cœur de princesse, por depósito fraudulento, fundamento esse relativo ao facto de a referida marca se limitar a reproduzir a denominação social da sociedade recorrente, anterior à comercialização de bonecas sob a designação «cœur de princesse» pela sociedade Mattel France. Foi neste contexto que a Cour de cassation francesa redigiu a referida passagem, para seguidamente salientar que os produtos e serviços designados pela marca cœur de princesse ultrapassavam largamente as atividades até aí efetivamente exploradas pela sociedade em causa, tendo assim rejeitado como inoperante o fundamento suscitado por esta última. Em conclusão, essa passagem não contém, portanto, nenhuma limitação, nem na sua letra nem no seu contexto factual ou processual, que pudesse fazer crer que a sua aplicabilidade estava reservada às circunstâncias específicas do caso julgado.
45. Por outro lado, contrariamente à opinião do IHMI, o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.° 20, supra ) pode ser tomado em consideração pelo Tribunal Geral na sua apreciação da legalidade da decisão impugnada, embora seja posterior a esta última.
46. Com efeito, pondo de parte as considerações de ordem processual referidas nos n. os 23 e 24, supra , há que salientar, primeiro, que este acórdão não procedeu a uma viragem da jurisprudência, tendo simplesmente clarificado uma questão jurídica controvertida. Com efeito, como testemunham os numerosos acórdãos anteriores dos órgãos jurisdicionais franceses apresentados pelas partes tanto perante o IHMI como perante o Tribunal Geral, a jurisprudência dos órgãos jurisdicionais inferiores anterior ao acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.° 20, supra ), apesar de não ser uniforme, permitia concluir que a proteção da denominação social estava limitada às atividades efetivamente exercidas pela sociedade em causa.
47. Segundo, mesmo considerando que o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.° 20, supra ) deva ser entendido no sentido de que opera uma viragem da jurisprudência, tais viragens, em princípio, são retroativamente aplicáveis às situações existentes.
48. Este princípio justifica‑se pela consideração de que a interpretação jurisprudencial de uma norma num dado momento não pode ser diferente consoante a época dos factos considerados e de que ninguém pode invocar um direito adquirido a uma jurisprudência ultrapassada. Se é verdade que esse princípio pode ser atenuado na medida em que, em situações excecionais, os órgãos jurisdicionais se podem afastar dele para adaptar o efeito no tempo da retroatividade de uma viragem, a retroatividade das viragens continua a ser o princípio dominante. Ora, no caso em apreço, o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.° 20, supra ) não contém nenhuma adaptação ou limitação neste sentido.
49. Importa acrescentar, a este respeito, que o princípio análogo é aplicado pelos órgãos jurisdicionais da União (acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de agosto de 1995, Roders e o., C‑367/93 a C‑377/93, Colet., p. I‑2229, n. os 42 e 43).
50. Assim, embora o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.° 20, supra ) seja, enquanto tal, um facto novo, limita‑se a declarar o direito francês tal como deveria ter sido aplicado pela Câmara de Recurso na decisão impugnada, que data de 1 de junho de 2011, e tal como deve ser aplicado pelo Tribunal Geral, em conformidade com o princípio recordado no n.° 29, supra .
51. Daqui resulta que, no caso em apreço, a proteção da denominação social Forge de Laguiole se estende exclusivamente às atividades efetivamente exercidas pela interveniente à data do pedido da marca LAGUIOLE, em 20 de novembro de 2001.
52. Por conseguinte, o primeiro pilar do raciocínio da Câmara de Recurso, que se baseia nas atividades referidas no objeto social da interveniente, não pode servir de base à decisão impugnada, sem que seja demonstrado que essas atividades tenham sido efetivamente exercidas.
53. Resta, pois, examinar a procedência do segundo pilar do raciocínio da Câmara de Recurso, baseado nas atividades efetivamente exercidas pela interveniente.
Quanto às atividades efetivamente exercidas pela interveniente antes da data de depósito da marca LAGUIOLE
54. No caso vertente, é pacífico que a interveniente está ativa no fabrico e venda de produtos de cutelaria.
55. Segundo as conclusões da Câmara de Recurso, a interveniente também demonstrou ter diversificado as suas atividades para setores diferentes do da cutelaria, antes da data do depósito da marca LAGUIOLE (a saber, 20 de novembro de 2001).
56. O recorrente alega, a este respeito, por um lado, que a atividade da interveniente está, na realidade, limitada ao comércio de facas, consistindo a alegada diversificação na comercialização de facas equipadas com um acessório, e, por outro, que, em todo o caso, a referida diversificação é, em larga medida, posterior à data do depósito da marca LAGUIOLE.
57. O IHMI sustenta que os domínios de atividade de uma sociedade se definem em relação à clientela a que destina os seus produtos ou os seus serviços. Ora, as facas equipadas com um acessório dirigem‑se a uma clientela diferente da das facas simples, o que é demonstrado pela diferença dos canais de distribuição das diferentes facas equipadas com acessórios. Por outro lado, a diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria começou antes do depósito da marca LAGUIOLE.
58. A interveniente acrescenta que um produto pode ter duas funções diferentes, não suprimindo a função de faca a função do acessório.
59. No que se refere às provas da diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria, a Câmara de Recurso baseou‑se, no n.° 94 da decisão impugnada, em determinados documentos apresentados pela interveniente perante o IHMI, que datam do período anterior ao depósito da marca LAGUIOLE, a saber:
– a lista de preços da interveniente de 1 de janeiro de 2001 (documento 38.1), que faz menção a facas com diferentes acessórios — a saber, saca‑rolhas, sovelas, abre‑cápsulas, corta‑charutos, calcadores, porta‑chaves —, a «garfos», bem como ao modelo «Faca para caça»,
– duas faturas, de 15 de outubro de 1998 e de 30 de março de 2000, enviadas a clientes no Luxemburgo e na Áustria, que mencionam o modelo «Sommelier», que inclui saca‑rolhas e abre‑cápsulas, bem como «extrator de pino», o modelo «Laguiole du routard» e uma «bainha» em couro,
– uma fatura de 22 de novembro de 2000, dirigida a um cliente em França, que menciona um «garfo», bem como os modelos «Sommelier» e «Calumet», que incluem pá de limpeza, calcador e furador, bem como um «estojo».
60. A este respeito, deve observar‑se, primeiro, que os «cabazes oferta» e as «caixas» não são mencionados em nenhum desses documentos. Em contrapartida, na parte inferior de algumas páginas da lista de preços da interveniente de 1 de janeiro de 2001, encontra‑se a menção «As facas são fornecidas com uma embalagem para oferta e um certificado de origem». Os documentos tidos em consideração pela Câmara de Recurso fazem, portanto, referência a uma comercialização, pela interveniente, de embalagens para oferta apenas para acondicionar os seus próprios produtos, e não como produtos autónomos. Nestas circunstâncias, a Câmara de Recurso errou ao considerar, no n.° 93 da decisão impugnada, que os «cabazes oferta» e as «caixas» tinham sido propostos para venda pela interveniente no âmbito da diversificação das suas atividades para o setor dos «outros acessórios».
61. Segundo, o modelo «Laguiole du routard» consiste numa faca dobrável, sem acessório. Do mesmo modo, o modelo «Faca para caça» é, de acordo com a descrição constante da lista de preços de 1 de janeiro de 2001, um «[m]odelo que não fecha, fornecido com um estojo em couro». Por conseguinte, deve considerar‑se que estes modelos não podem servir para demonstrar uma diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria, mesmo admitindo que se destinem a ser utilizados no âmbito de «atividades de lazer» ou por caçadores, como alegou a Câmara de Recurso no n.° 93 da decisão impugnada.
62. Terceiro, as «bainhas» e os «estojos» mencionados nas faturas e na lista de preços são, pela sua conceção e a sua apresentação, exclusivamente destinados a conter as facas fabricadas pela interveniente. Quando muito, poderiam, sendo caso disso, servir para conter outras facas, consoante o tamanho e a forma das mesmas, mas não produtos estranhos à cutelaria. Além disso, as referidas bainhas e estojos são exclusivamente vendidos em conjunto com as facas, e não em separado. Nestas condições, há que considerar que são meros acessórios da cutelaria comercializada pela interveniente, sem apresentar as características de uma gama de produtos independente, e, por este motivo, não podem servir para demonstrar uma diversificação das suas atividades para setores diferentes do da cutelaria.
63. Quarto, não é claro que os garfos se enquadrem na cutelaria. Contudo, a comercialização de garfos não permite demonstrar uma atividade da interveniente em todo o setor das «artes da mesa». Com efeito, embora seja verdade que os garfos podem ser vistos como fazendo parte das «artes da mesa», trata‑se de uma categoria demasiado lata e que agrupa conjuntos de produtos demasiado heteróclitos para poderem ser comparados, para efeitos da apreciação da sua semelhança, com os produtos e os serviços designados pela marca LAGUIOLE. Em contrapartida, a comercialização de garfos demonstra uma diversificação concreta e efetiva das atividades da interveniente para os talheres em geral, enquanto subcategoria das «artes da mesa» [v., por analogia, acórdão do Tribunal Geral de 13 de fevereiro de 2007, Mundipharma/IHMI — Altana Pharma (RESPICUR), T‑256/04, Colet., p. II‑449, n.° 23].
64. Quinto, quanto aos diversos (outros) artigos que consistem numa faca equipada de um ou dois acessórios (saca‑rolhas, sovela, abre‑cápsulas, corta‑charutos, carregador, porta‑chaves, extrator de pino), a Câmara de Recurso considerou, no essencial, que estes artigos multifuncionais demonstravam a diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria.
65. Ora, como o recorrente alega com razão, os artigos multifuncionais comercializados pela interveniente não são caracterizados pela função do acessório, continuando a ser facas não obstante a presença de um ou dois acessórios. Com efeito, o acrescento dos diferentes acessórios não altera o seu caráter enquanto produtos do setor da cutelaria.
66. A este respeito, por um lado, importa referir que, nos produtos multifuncionais comercializados pela interveniente, a faca continua a ser preponderante e determina o caráter do produto no seu conjunto, no que respeita quer ao material utilizado quer a toda a sua apresentação, o que, aliás, vem sublinhado na lista de preços de 1 de janeiro de 2001. Desse documento resulta que a própria interveniente considera esses produtos como facas. Com efeito, o modelo que inclui um saca‑rolhas e um abre‑cápsulas figura na referida lista sob a designação «Faca Escanção/Abre‑cápsulas», e o modelo que inclui um extrator de pino, sob a designação «Faca do Golfista». Além disso, as partes destes produtos diferentes da lâmina, tais como a sovela e o saca‑rolhas, são aí expressamente apresentados sob a designação «Acessórios», sendo o material da lâmina e o dos referidos acessórios indicados em separado, com insistência na qualidade do aço da lâmina (o modelo «Calumet», com limpador, furador e carregador, constitui uma exceção). Por último, como já foi mencionado no n.° 60, supra , na parte inferior de algumas páginas que contêm modelos que incluem acessórios encontra‑se a menção «As facas são fornecidas com uma embalagem para oferta e um certificado de origem».
67. Por outro lado, contrariamente ao que alega a interveniente, a clientela a quem se destinam os produtos multifuncionais em causa é composta não por golfistas ou por fumadores em geral mas por compradores de cutelaria que também praticam golfe ou que fumam, ou por golfistas ou por fumadores que têm uma afinidade com cutelaria. Isto é válido tanto de uma perspetiva funcional (um extrator de pino ou um corta‑charutos que façam parte de uma faca são menos maneáveis e práticos do que o mesmo instrumento sem faca, sobretudo se a própria faca for um produto de topo de gama com uma certa dimensão, como é o caso dos produtos da interveniente) como de uma perspetiva financeira (custo acrescido considerável dos artigos multifuncionais relativamente ao simples acessório) ou ainda de uma perspetiva da imagem (um fumador ou um golfista que não se interessem por cutelaria não pensarão normalmente nos produtos da interveniente para se abastecerem em artigos para fumadores ou de golfe, virando‑se para os produtores especializados nesses setores).
68. Por conseguinte, importa rejeitar o argumento do IHMI segundo o qual os setores de atividade de uma pessoa coletiva são, antes de tudo, definidos pelos mercados a que se destinam os seus produtos ou serviços. Com efeito, os produtos multifuncionais comercializados pela interveniente não se dirigem precisamente a um público sem relação com o público‑alvo dos produtos abrangidos pelo setor da cutelaria, mas sim a um público de fumadores ou de golfistas igualmente amadores dos referidos produtos. A este respeito, há que salientar que, contrariamente ao que a Câmara de Recurso afirmou nos n. os 96 e 97 da decisão impugnada, o facto de os artigos multifuncionais comercializados pela interveniente terem sido vendidos não apenas por cuteleiros mas igualmente por armeiros, tabacarias, lojas de artigos de escrita, lojas de «prendas — artes da mesa», grandes armazéns e outras empresas não é suscetível de alterar a natureza desses artigos como produtos do setor da cutelaria.
69. Sexto, quanto à atividade de «fabrico e venda de todos os artigos […] para oferta e lembranças», mencionados no objeto social da interveniente, é verdade que, em princípio, todos os produtos comercializados por esta última podem servir para oferta ou lembranças, como o recorrente afirmou com razão. Além disso, como foi sublinhado no n.° 60, supra , uma parte, pelo menos, dos produtos da interveniente são fornecidos em embalagens para oferta, o que confirma o seu possível destino como prenda. Decorre daqui que a interveniente está efetivamente ativa no domínio da comercialização de artigos para oferta.
70. Todavia, importa referir que a interveniente não demonstrou que produzia ou comercializava artigos para oferta ou lembranças que não faziam parte da cutelaria ou dos talheres. A sua atividade em matéria de ofertas e de lembranças limita‑se, manifestamente, a propor os seus produtos habituais, do setor da cutelaria ou dos talheres, em embalagens para oferta. Por conseguinte, deve concluir‑se que, embora a interveniente tenha demonstrado ter exercido uma atividade em matéria de «fabrico e venda de todos os artigos […] para oferta e lembranças», esta atividade está confinada a prendas e a lembranças dos setores da cutelaria ou dos talheres.
71. Por conseguinte, contrariamente ao que foi considerado pela Câmara de Recurso no n.° 93 da decisão impugnada, uma diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria, antes de 20 de novembro de 2001, não estava demonstrada em relação à «cinzelagem», às «artes da mesa» — com exceção dos talheres —, às «artes da casa», ao «universo do vinho», aos artigos para fumadores, aos artigos para golfistas, aos artigos para caçadores, às atividades de lazer ou aos acessórios, como os cabazes oferta, os estojos e as caixas.
72. Em contrapartida, há que concluir que uma diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria está demonstrada em relação aos «talheres», dos quais fazem parte os «garfos» mencionados na lista de preços de 1 de janeiro de 2001, bem como em relação aos «artigos para oferta e lembranças», na medida em que se trata de produtos dos setores da cutelaria ou dos talheres. Por conseguinte, é apenas em relação a estas atividades que a interveniente pode reivindicar a proteção da sua denominação social relativamente à marca LAGUIOLE.
73. Consequentemente, há que anular a decisão impugnada na parte em que a Câmara de Recurso concluiu pela existência de um risco de confusão na aceção do artigo L. 711‑4 do CPI, no que se refere à «cutelaria» e a «todos os artigos relacionados com as artes da mesa», bem como a «todos os artigos […] para oferta e lembranças», na medida em que se trate de artigos não abrangidos pela cutelaria ou pelos talheres.
74. Assim, o exame que se segue acerca do risco de confusão na aceção do artigo L. 711‑4 do CPI apenas dirá respeito às atividades de fabrico e de venda de todos os artigos dos setores da cutelaria ou dos talheres, bem como de prendas e lembranças, na medida em que se trate de produtos dos referidos setores.
Quanto ao risco de confusão
75. Importa recordar, a título preliminar, que, em conformidade com a jurisprudência referida no n.° 29, supra , o requisito de que o sinal deve conferir ao seu titular o direito de proibir a utilização de uma marca posterior deve ser apreciado à luz dos critérios fixados pela legislação que regula o sinal anterior invocado, isto é, o direito francês.
76. Por força do artigo L. 711‑4 do CPI (reproduzido no n.° 36, supra ), o titular de uma denominação social anterior tem o direito de proibir a utilização de uma marca mais recente, na condição de «existir um risco de confusão no espírito do público».
77. Como o IHMI alega acertadamente, tendo em conta a natureza dos produtos designados pela marca LAGUIOLE, o público pertinente é o grande público francês, dotado de um nível de atenção médio.
78. Segundo a jurisprudência francesa, a apreciação do risco de confusão depende de vários fatores, entre os quais o grau de semelhança (visual, fonética e conceptual) entre os sinais em causa, o grau de semelhança entre os setores económicos abrangidos por esses sinais e o poder distintivo mais ou menos elevado do sinal anterior (CA Versailles, acórdão de 25 de outubro de 2001, Flex’cible/SOS Flexibles et Sofirop, et TGI Paris, acórdão de 8 de julho de 2011, RG 09/11931).
79. O risco de confusão é maior quando a denominação social anterior possui um poder distintivo forte, nomeadamente devido ao seu conhecimento pelo público. O prejuízo criado pelo risco de confusão não resulta unicamente de um desvio de clientela. Pode também tratar‑se de uma ofensa ao crédito ou à reputação (CA Paris, acórdão de 13 de outubro de 1962, Ann. propr. ind. 1963, p. 228).
80. Uma vez que a resolução do conflito entre uma marca e uma denominação social anterior depende da existência de um risco de confusão, se a marca for depositada para vários produtos ou serviços de natureza diferente, a sua anulação terá caráter distributivo e só se verificará para os produtos ou serviços em relação aos quais exista um risco de confusão com a atividade da pessoa coletiva (CA Paris, acórdão de 28 de janeiro de 2000, Revue Dalloz, 2001, p. 470).
Quanto à semelhança entre os setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole e pela marca LAGUIOLE
81. Segundo a jurisprudência francesa, para determinar se os setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole e pela marca LAGUIOLE são semelhantes, há que ter em conta todos os fatores pertinentes que caracterizam a relação entre os produtos ou serviços. Tais fatores incluem, em especial, a sua natureza, o seu destino, a sua utilização, bem como o seu caráter concorrente ou complementar (TGI Paris, acórdão de 25 de novembro de 2009, RG 09/10986).
82. No caso em apreço, a Câmara de Recurso considerou que os produtos designados pela marca LAGUIOLE coincidiam, em grande parte, com os setores de atividade do recorrente ou se situavam em setores de atividades conexas, consideração esta que precisou nos n. os 107 a 114 da decisão impugnada.
83. Todavia, esta consideração decorre de um exame que tem em conta a totalidade dos setores de atividade enunciados no objeto social da interveniente. Ora, como foi salientado nos n. os 71 a 74, supra , há que ter em conta, a título do risco de confusão, apenas as atividades da interveniente nos setores da cutelaria e dos talheres, bem como as prendas e lembranças, na medida em que se trate de produtos dos referidos setores.
84. Nestas condições, as conclusões da Câmara de Recurso nos n. os 107 a 114 da decisão impugnada devem ser reexaminadas à luz desta restrição dos setores de atividade protegidos pela denominação social Forge de Laguiole.
– Quanto à relação entre as «serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas», bem como «estojos de barbear; estojos de manicura», pertencentes à classe 8, «corta‑papéis», da classe 16, e «pincéis para a barba; estojos de toilette », da classe 21, e as atividades da interveniente
85. Relativamente a «serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas», da classe 8, e a «corta‑papéis», da classe 16, a Câmara de Recurso teve razão em considerar que se tratava de objetos cortantes, que faziam parte do setor da «cutelaria», visado pelo objeto social da interveniente. Os referidos produtos e as atividades da interveniente são, portanto, fortemente semelhantes. Do mesmo modo, os «estojos de barbear; estojos de manicura», da classe 8, e os «pincéis para a barba; estojos de toilette », da classe 21, são complementares ou acessórios dos referidos objetos cortantes, na medida em que são utilizados conjuntamente e são geralmente vendidos em conjunto no mesmo tipo de lojas e a uma mesma clientela. Estes produtos e as atividades da interveniente são, portanto, semelhantes.
– Quanto a «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente» e a «chaves de fendas», da classe 8
86. No que respeita a «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente», da classe 8, designados pela marca LAGUIOLE, há que observar que esta definição inclui as facas.
87. Esta conclusão não é posta em causa pelos argumentos invocados pelo recorrente e pela interveniente nas suas observações escritas complementares apresentadas, respetivamente, a 9 e 8 de abril de 2014.
88. Primeiro, o facto de o título da classe 8 da classificação de Nice estar enunciado como «Ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente; cutelaria, garfos e colheres; armas brancas; máquinas de barbear» não significa que estas diferentes categorias não apresentem sobreposições entre si. Com efeito, a classificação de Nice só tem uma finalidade administrativa e apenas se destina a facilitar a redação e o tratamento dos pedidos de marca, propondo certas classes e categorias de produtos e de serviços. Em contrapartida, os títulos das classes não constituem um sistema no qual um produto ou um serviço contido numa classe ou numa categoria não possa igualmente fazer parte de outra classe ou categoria, como resulta, nomeadamente, da regra 2, n.° 4, do Regulamento (CE) n.° 2868/95 da Comissão, de 13 de dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento (CE) n.° 40/94 do Conselho, sobre a marca comunitária (JO L 303, p. 1).
89. É por isso que, na sua decisão de 14 de maio de 2003 relativa à marca LAGUIOLE, o examinador do IHMI considerou acertadamente que «[era] pacífico que uma arma branca [era] uma ‘arma de mão cuja ação [resultava] de uma parte em metal’» e que, «portanto, este termo [compreendia] as facas», apesar de estas duas categorias de produtos figurarem no título da classe 8 da classificação de Nice.
90. Segundo, o recorrente invoca como argumento a decisão do examinador do IHMI de 14 de maio de 2003, na medida em que este procedeu a uma distinção entre as «armas brancas», que equiparou às facas e para as quais se recusou a registar a referida marca em razão do seu caráter descritivo, e as «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente», para os quais registou essa marca.
91. Importa observar, a este respeito, que a decisão do examinador do IHMI de 14 de maio de 2003 não pode vincular o Tribunal Geral na sua apreciação dos produtos abrangidos pela mesma categoria (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de abril de 2007, Alcon/IHMI, C‑412/05 P, Colet., p. I‑3569, n.° 65, e acórdão ARTHUR ET FELICIE, referido no n.° 21, supra , n.° 71). Por outro lado, há que salientar que, já durante o processo de declaração de nulidade no IHMI, o recorrente estava consciente de que as facas poderiam fazer parte da categoria das «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente», uma vez que se declarou disposto, por diversas vezes, a precisar o teor da lista dos produtos da classe 8 abrangidos, designadamente, pela marca LAGUIOLE, da seguinte forma: «Ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente, com exceção das facas». Todavia, as decisões da Divisão de Anulação e da Câmara de Recurso baseavam‑se em motivos que não necessitavam de um exame desta questão, e o recorrente não precisou efetivamente desta forma a lista dos produtos.
92. Há, pois, que concluir que as «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente», na medida em que se trata de facas, são idênticos às atividades da interveniente no setor da cutelaria — e não apenas ao modelo «Laguiole du routard», como a Câmara de Recurso considerou.
93. No entanto, contrariamente ao que a Câmara de Recurso pôde considerar, as «chaves de fendas», pertencentes à classe 8, não apresentam nenhuma semelhança com o modelo «Laguiole du routard» comercializado pela interveniente, que mais não é do que uma simples faca dobrável, sem acessórios.
– Quanto às «colheres», da classe 8
94. No que diz respeito às «colheres», da classe 8, fazem parte dos «talheres» comercializados pela interveniente (v. n. os 62 e 72, supra ) e, portanto, estão integrados num setor económico idêntico a um dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole.
– Quanto aos «utensílios para cozinha e loiça em vidro, porcelana e faiança; loiça não em metais preciosos; saca‑rolhas; abre‑garrafas, caixas metálicas para a distribuição de guardanapos de papel; ampulhetas», da classe 21, e aos «utensílios e recipientes para uso doméstico e para cozinha em metais preciosos; baixela em metais preciosos», da classe 14
95. No que respeita a estes produtos, a Câmara de Recurso associou‑os às «artes da mesa» e deduziu daí que coincidiam com as atividades da interveniente neste domínio.
96. A este respeito, há que recordar, como foi salientado no n.° 63, supra , que a categoria das «artes da mesa» é demasiado ampla e imprecisa para servir de ponto de referência a fim de estabelecer a existência de um risco de confusão. Assim, contrariamente às conclusões da Câmara de Recurso, os referidos produtos não apresentam semelhanças com os setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole.
97. Todavia, os «saca‑rolhas; abre‑garrafas» apresentam uma forte semelhança com o modelo «Sommelier», que inclui saca‑rolhas e abre‑cápsulas, e com os outros modelos de faca que incluem um saca‑rolhas, comercializados pela interveniente. Com efeito, embora a comercialização destes produtos, enquanto «derivados» de produtos abrangidos pelo setor da cutelaria, não possa demonstrar uma diversificação das atividades da interveniente para as «artes da mesa» ou para «o universo do vinho», como foi exposto nos n. os 65 e 69, supra , a verdade é que, enquanto produtos isolados, do ponto de vista da funcionalidade, são equivalentes aos «saca‑rolhas; abre‑garrafas» designados pela marca LAGUIOLE. Este facto, além da comercialização nos mesmos estabelecimentos comerciais, é suficiente para concluir que os referidos produtos se integram num setor económico idêntico a um dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole.
– Quanto aos «metais preciosos e suas ligas», às «pedras preciosas» e às «caixas, palmatórias para velas», da classe 14
98. No que respeita aos «metais preciosos e suas ligas» e às «pedras preciosas», pertencentes à classe 14, a Câmara de Recurso considerou que esses produtos eram «muito requisitados» para a cinzelagem fina e para numerosos objetos do domínio das «artes da mesa» e, portanto, apresentavam uma forte complementaridade com as atividades da interveniente. Além disso, as «caixas, palmatórias para velas», incluídas na classe 14, são vendidas no mesmo tipo de estabelecimentos consagrados às «artes da mesa e da decoração» que certos artigos alegadamente comercializados pela interveniente.
99. A este respeito, importa, antes de mais, recordar que, no caso em apreço, a «cinzelagem» e o domínio das «artes da mesa» não fazem parte dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole (v. n. os 73 e 74, supra ). Seguidamente, o simples facto de os metais e pedras preciosos poderem ser utilizados para as atividades da interveniente ligadas à cutelaria não permite concluir que, no espírito dos consumidores franceses, fazem parte de um setor económico semelhante a um dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole. Com efeito, por um lado, os metais e pedras preciosos são essencialmente destinados à indústria transformadora, e não, como a cutelaria, aos consumidores finais. Por outro lado, em princípio, esses materiais serão utilizados numa faca apenas para fins decorativos e acessórios, sem ligação com a funcionalidade da mesma.
– Quanto ao «couro e imitações de couro» e a «malas de viagem, maletas e sacos de viagem», da classe 18, bem como a «caixas»
100. No que se refere ao «couro e imitações de couro» e a «malas de viagem e maletas», da classe 18, a Câmara de Recurso salientou que eram comummente utilizados no fabrico de estojos, bainhas e caixas, comercializados pela interveniente, ou podiam ser utilizados para a embalagem e o transporte de produtos do setor da cutelaria, sobretudo quando se trata de produtos de luxo, destinados a serem oferecidos como «artigos para oferta». Daqui concluiu que estes produtos eram complementares das atividades da interveniente e «se situavam na mesma linha da sua gama de acessórios».
101. A este respeito, importa, em primeiro lugar, recordar que, no caso em apreço, os «artigos para oferta» fazem parte dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole unicamente na medida em que se trate de cutelaria ou de talheres (v. n. os 71 a 74, supra ). Em segundo lugar, o facto de o «couro e imitação de couro» poderem ser utilizados como matérias‑primas para fabricar os estojos e as bainhas comercializados pela interveniente juntamente com algumas das suas facas não pode ser suficiente para criar uma relação de semelhança com as atividades da interveniente no setor da cutelaria, uma vez que, designadamente, as matérias‑primas se destinam aos produtores, ao passo que a cutelaria visa o consumidor final. Em terceiro lugar, no que respeita, em particular, às «caixas» alegadamente comercializadas pela interveniente, importa recordar que os documentos em que a Câmara de Recurso baseou as suas conclusões quanto às atividades da interveniente em 20 de novembro de 2001 (v. n.° 59, supra ) não referem esses artigos e que, de qualquer modo, uma vez que se destinam exclusivamente a conter a cutelaria da interveniente, apenas podem ter caráter acessório, ou servir de embalagem, relativamente às atividades da interveniente no setor da cutelaria.
102. Resulta daí que o «couro e imitação de couro» e as «malas, maletas e sacos de viagem», pertencentes à classe 18, não são semelhantes às atividades da interveniente no setor da cutelaria.
– Quanto ao «material escolar; lápis, porta‑minas, borrachas para apagar; sobrescritos; arquivadores; álbuns, livros periódicos; almanaques, brochuras, cadernos, catálogos; calendários, litografias, cartazes», da classe 16
103. No que respeita a estes produtos, a Câmara de Recurso explicou que eram habitualmente vendidos em lojas de artigos de escrita e utilizados no mesmo contexto que os «corta‑papéis» da interveniente, a saber, para a escrita e a leitura, e portanto coincidiam com esse setor de atividades da interveniente. Além disso, todos esses produtos são comummente utilizados na vida comercial para a comunicação de uma empresa com os seus clientes e as suas relações de negócios ou, nomeadamente, oferecidos como brindes de empresa. Na medida em que o material impresso designado pela marca LAGUIOLE é suscetível de gerar, devido ao seu conteúdo, um risco de confusão com a denominação social Forge de Laguiole, a referida marca deve ser anulada.
104. A este respeito, há que observar, primeiro, que, contrariamente ao que concluiu a Câmara de Recurso, a relação dos referidos produtos com os «corta‑papéis» comercializados pela interveniente é demasiado fraca para poder dar lugar a uma semelhança. Com efeito, por um lado, a mera ligação constituída pela identidade parcial dos pontos de venda não é suficiente para tornar os corta‑papéis semelhantes a um conjunto de produtos que fazem sobretudo parte do setor da papelaria, dado que as lojas de artigos de escrita oferecem em geral uma grande variedade de produtos diferentes, que se destinam a um público não especializado. Por outro lado, a utilização dos corta‑papéis comercializados pela interveniente será normalmente limitada à abertura dos envelopes. Isto apenas pode dar lugar a uma fraca relação de semelhança, devido a um uso complementar, com os «envelopes», mas não com os outros produtos citados no n.° 103, supra . Segundo, o simples facto de todos estes produtos serem comummente utilizados na comunicação de uma empresa com os seus clientes e outras relações de negócios ou oferecidos como brindes de empresa não cria nenhuma semelhança com as atividades da interveniente no setor da cutelaria, dado que, em razão do fim a que se destinam, diferem totalmente das referidas atividades. Terceiro, a afirmação da Câmara de Recurso quanto ao risco de confusão suscetível de ser causado pelo material impresso designado pela marca LAGUIOLE será tratada no n.° 166, infra , no âmbito da apreciação global do risco de confusão.
– Quanto a diferentes produtos qualificados de «artigos de oferta», das classes 14, 18 e 20
105. No que diz respeito a «joalharia, bijutaria, pedras preciosas; guarda‑joias em metais preciosos; instrumentos cronométricos, botões de punho, alfinetes de gravatas, alfinete de adereço, porta‑chaves de fantasia; porta‑moedas em metais preciosos; relógios e pulseiras de relógios», da classe 14, a «bengalas; malas de mão; sacos de praia; sacos, estojos e cofres de viagem; carteiras de bolso; porta‑cartões (carteiras de bolso), porta‑documentos; pastas (marroquinaria)», da classe 18, e a «molduras, objetos de arte ou de decoração em madeira, cortiça, cana, junco, vime, chifre, osso, marfim, baleia, tartaruga, âmbar, madrepérola, espuma do mar, sucedâneos de todas estas matérias ou em matérias plásticas», da classe 20, a Câmara de Recurso limitou‑se a constatar que se tratava de «artigos de oferta» muito comummente presentes em todos os tipos de estabelecimentos ou oferecidos como brindes de empresa e a concluir que podiam, portanto, encontrar‑se nos mesmos estabelecimentos onde a interveniente comercializava os seus próprios produtos.
106. A este respeito, há que recordar, por um lado, que a atividade de «fabrico e venda de artigos de oferta» da interveniente faz parte dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole apenas na medida em que se trate de cutelaria ou de talheres (v. n. os 71 a 74, supra ). Ora, os produtos referidos no número anterior não estão abrangidos pela cutelaria ou pelos talheres nem estão relacionados com este domínio. Por outro lado, mesmo admitindo que esses produtos sejam vendidos como ofertas na mesma loja com a cutelaria comercializada pela interveniente, esta circunstância não é suscetível de criar uma semelhança entre aqueles e estes últimos, atendendo a que as lojas de ofertas dispõem de uma grande variedade de produtos heteróclitos, uma vez que se dirigem ao grande público.
– Quanto às «luvas de golfe» e aos «artigos de desporto», pertencentes à classe 28, aos «estojos para charutos», da classe 14, e aos «fósforos, isqueiros para fumadores; charuteiras e cigarreiras não em metais preciosos; corta‑charutos; cachimbos; limpadores de cachimbos», da classe 34
107. Quanto às «luvas de golfe» e aos «artigos de desporto», da classe 28, aos «estojos para charutos», da classe 14, e aos «artigos para fumadores; fósforos, isqueiros para fumadores; charuteiras e cigarreiras não em metais preciosos; cachimbos», da classe 34, a Câmara de Recurso considerou que se dirigem à mesma clientela, são adquiridos nos mesmos estabelecimentos comerciais e são utilizados no mesmo contexto que certos «artigos de oferta» desenvolvidos pela interveniente. É o que acontece, por exemplo, com o modelo «Faca do golfista», comercializado pela interveniente, relativamente às «luvas de golfe» ou aos outros «artigos de desporto», ou com o modelo «Calumet» (com limpador, furador e carregador) e o corta‑charutos, comercializados pela interveniente, relativamente ao «estojos para charutos» e aos «fósforos, isqueiros para fumadores, charuteiras e cigarreiras, cachimbos», designados pela marca LAGUIOLE.
108. Basta recordar, a este respeito, que a atividade de «fabrico e venda de artigos de oferta» faz parte dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole apenas na medida em que se trate de cutelaria ou de talheres (v. n. os 71 a 74, supra ), o que não é o caso dos produtos citados no n.° 107, supra .
109. Todavia, os «corta‑charutos» e «limpadores de cachimbos», da classe 34, apresentam uma semelhança, respetivamente, com o modelo «corta‑charutos» e o modelo «Calumet» (com limpador, furador e carregador), comercializados pela interveniente. Com efeito, embora a comercialização desses modelos, como «derivados» da cutelaria, não possa demonstrar uma diversificação das atividades da interveniente para os «produtos para fumadores» em geral, como foi exposto nos n. os 65 a 68 e 71, supra , a verdade é que, enquanto produtos isolados, são idênticos, do ponto de vista funcional, aos «corta‑charutos» e aos «limpadores de cachimbos» designados pela marca LAGUIOLE. Este facto, além da comercialização nos mesmos estabelecimentos comerciais, é suficiente para concluir por uma forte semelhança.
110. Em contrapartida, as «luvas de golfe», da classe 28, não apresentam semelhanças com o modelo «Faca do golfista» (com extrator de pino) comercializado pela interveniente. É verdade que este último pode ser utilizado em conjunto com as «luvas de golfe» designadas pela marca LAGUIOLE. Todavia, não se trata de uma relação de complementaridade baseada numa semelhança, uma vez que estes produtos podem ser utilizados em separado e são normalmente concebidos independentemente um do outro, e não em função de critérios decorrentes de uma utilização conjunta — contrariamente ao que poderia ser considerado, a título de exemplo, para as luvas de golfe relativamente a tacos de golfe.
– Quanto aos serviços da classe 38
111. No que se refere aos serviços em matéria de «telecomunicações» e de setores conexos, da classe 38, a Câmara de Recurso considerou, no n.° 114 da decisão impugnada, que não apresentavam nenhuma semelhança com as atividades da interveniente. Esta conclusão, favorável ao recorrente e não contestada pela interveniente, na realidade, não faz parte do objeto do presente litígio, pelo que não é necessário o Tribunal Geral examiná‑la.
– Conclusão sobre a semelhança entre os setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole e pela marca LAGUIOLE
112. Em conclusão, importa observar, primeiro, uma identidade, relativamente aos setores abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole, para as «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente» e as «colheres», da classe 8, bem como um grau de semelhança elevado, relativamente às atividades da interveniente, para as «serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas», da classe 8, os «corta‑papéis», da classe 16, os «saca‑rolhas; abre‑garrafas», da classe 21, e os «corta‑charutos» e «limpadores de cachimbo», da classe 34.
113. Segundo, existe uma semelhança média, relativamente aos setores abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole, para os «estojos de barbear, estojos de manicura», abrangidos pela classe 8, e para os «pincéis para a barba, estojos de toilette », da classe 21.
114. Terceiro, existe uma semelhança fraca, relativamente aos setores abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole, para os «envelopes», da classe 16.
115. Por fim, há que concluir pela inexistência de semelhança, relativamente aos setores abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole, para todos os outros produtos e serviços designados pela marca LAGUIOLE.
Quanto à semelhança dos sinais em conflito
116. A Câmara de Recurso considerou que o termo «laguiole», embora descritivo e, portanto, não distintivo para as facas, como foi declarado pela cour d’appel de Paris no seu acórdão de 3 de novembro de 1999 (G.T.I.‑G.I.L. Technologies internationales/Commune de Laguiole et Association Le couteau de Laguiole), era, não obstante, o elemento dominante, ou, pelo menos, codominante, da denominação social Forge de Laguiole, mesmo quando esta última era utilizada em facas. Por conseguinte, segundo aquele tribunal, numa apreciação global, os sinais em conflito apresentavam uma certa semelhança fonética, visual e conceptual, que não podia ser contrabalançada pelo mero aditamento da expressão genérica «forge de».
117. O recorrente alega, no essencial, que os sinais em conflito apresentam diferenças visuais, fonéticas e conceptuais.
118. O IHMI sustenta que o termo «laguiole» é dominante na denominação social Forge de Laguiole, apesar do seu caráter genérico. Dado que a marca LAGUIOLE está integralmente reproduzida na referida denominação social, o grau de semelhança entre os dois sinais é elevado.
119. A interveniente sustenta que os sinais em conflito apresentam parecenças nos planos visual, fonético e conceptual.
120. A título preliminar, importa examinar se, tal como a Câmara de Recurso considerou, seguida neste aspeto pelo IHMI e a interveniente, o termo «laguiole» constitui o elemento dominante da denominação social Forge de Laguiole, apesar do seu caráter descritivo, ou até genérico, para as facas, conforme foi declarado pela cour d’appel de Paris no seu acórdão de 3 de novembro de 1999 (n.° 116, supra ), bem como o seu caráter descritivo do lugar de estabelecimento e de produção da interveniente.
121. Em primeiro lugar, é verdade, como a Câmara de Recurso afirma no n.° 119 da decisão impugnada, que o caráter descritivo e não distintivo do termo «laguiole» para facas não implica necessariamente que esse termo seja igualmente descritivo e não distintivo para produtos diferentes das facas.
122. Importa recordar, a este respeito, que a presente análise do risco de confusão diz exclusivamente respeito às atividades de fabrico e de venda de cutelaria e talheres, bem como de prendas e lembranças, na medida em que se trate de cutelaria ou de talheres (v. n.° 74, supra ). Com efeito, as atividades da interveniente efetivamente exercidas concentram‑se quase exclusivamente no domínio da cutelaria, incluindo certos artigos com outras funções, para além da função de faca, e a comercialização de outros produtos — em especial, talheres — permanece acessória, ou mesmo marginal. É o que resulta tanto de uma análise dos produtos que figuram na lista de preços da interveniente de 1 de janeiro de 2001 como da leitura de vários artigos de imprensa que figuram no «press‑book» editado pela interveniente — na medida em que se referem claramente ao período anterior a 20 de novembro de 2001 —, nos quais a interveniente se apresenta sistematicamente como uma cutelaria especializada no fabrico de facas de tipo «Laguiole», sem que a exploração de outras atividades seja mencionada. Embora seja verdade que alguns desses artigos evocam intenções de diversificação das atividades por parte dos dirigentes da interveniente, esta última não demonstrou, como foi acima sublinhado, que tais intenções tenham sido postas em prática até 20 de novembro de 2001.
123. Nestas condições, há que concluir que o termo «Laguiole» apresenta caráter descritivo, ou até genérico, relativamente à totalidade das atividades da interveniente, pertinentes para efeitos da apreciação do risco de confusão.
124. Em segundo lugar, há que concordar com a Câmara de Recurso quando recordou que um elemento descritivo de um sinal podia, todavia, constituir o seu elemento dominante ou codominante, se, por exemplo, os outros elementos fossem igualmente descritivos ou parecessem ser tão fracos ou ainda mais fracos. A este respeito, é verdade que o elemento «Forge de» apresenta caráter descritivo relativamente às atividades nos setores da cutelaria e dos talheres exercidas pela interveniente. Todavia, contrariamente ao que considerou a Câmara de Recurso, este elemento não está «semanticamente subordinado ao nome ‘Laguiole’, que identifica a forja específica em causa». Com efeito, o elemento descritivo do lugar — e das atividades exercidas — não é preponderante relativamente ao elemento descritivo da natureza do estabelecimento. Nestas circunstâncias, não é possível identificar um elemento dominante na denominação social Forge de Laguiole, inteiramente composta por elementos de natureza descritiva, ou mesmo genérica, relativamente às atividades e/ou ao lugar de estabelecimento da interveniente.
125. Em terceiro lugar, no que toca à comparação visual, a denominação social Forge de Laguiole é composta por três palavras que formam um conjunto de quinze letras, ao passo que a marca LAGUIOLE só tem oito letras. É certo que o elemento «laguiole» está presente em cada um dos sinais em conflito; contudo, encontra‑se no fim da referida denominação social, de modo que o elemento controvertido «forge de» atenua a impressão visual criada por esta identidade parcial. Por esta razão, importa concluir pela existência de uma semelhança visual média dos sinais em conflito.
126. Em quarto lugar, no plano fonético, há que referir que a denominação social Forge de Laguiole tem cinco ou mesmo seis sílabas, enquanto a marca LAGUIOLE tem duas, ou mesmo três, em função da pronúncia do termo «laguiole». No que respeita à incidência da identidade parcial dos sinais em conflito, as considerações relativas à semelhança visual aplicam‑se mutantis mutandis e, por conseguinte, deve concluir‑se pela existência de uma semelhança fonética média.
127. Em quinto lugar, quanto à comparação conceptual, a denominação social Forge de Laguiole evoca uma oficina situada no município de Laguiole (França), como o recorrente alegou com razão, mas também, e simultaneamente, uma oficina onde se fabricam facas de tipo Laguiole. A marca LAGUIOLE, por seu turno, evoca tanto o dito município como a faca de tipo Laguiole. Assim, a Câmara de Recurso concluiu, acertadamente, que, na medida em que os sinais em conflito faziam referência aos mesmos conceitos, a saber, a cidade ou a faca, eram semelhantes no plano conceptual. O Tribunal Geral considera mesmo que o grau de semelhança conceptual deve ser qualificado de elevado.
Quanto ao elevado caráter distintivo da denominação social Forge de Laguiole, em razão do seu conhecimento pelo público
128. A Câmara de Recurso considerou, no n.° 130 da decisão impugnada, que a denominação social Forge de Laguiole possuía um forte poder distintivo em razão do prestígio, ou mesmo da reputação, de que gozava a interveniente em França e no estrangeiro devido à qualidade das suas facas.
129. O recorrente considera que nada nos autos demonstra a alegada notoriedade da denominação social Forge de Laguiole, e que é a faca de tipo Laguiole que goza de reputação, e não a denominação «Forge de Laguiole».
130. O IHMI sustenta que a denominação social Forge de Laguiole adquiriu reputação no domínio da cutelaria, e a interveniente afirma que goza de grande notoriedade em França e no estrangeiro.
131. A título preliminar, importa recordar que o direito das marcas francês é regulado pelas diretivas que harmonizam as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas [Primeira Diretiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), substituída pela Diretiva 2008/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO L 299, p. 25)]. Por conseguinte, o princípio segundo o qual o risco de confusão é tanto maior quanto mais importante for o caráter distintivo da marca anterior e segundo o qual, portanto, as marcas que tenham um elevado caráter distintivo, por exemplo, devido ao conhecimento que delas tem o público, gozam de uma proteção mais ampla do que aquelas cujo caráter distintivo é menor (acórdãos do Tribunal de Justiça de 11 de novembro de 1997, SABEL, C‑251/95, Colet., p. I‑6191, n.° 24; de 29 de setembro de 1998, Canon, C‑39/97, Colet., p. I‑5507, n.° 18; e de 22 de junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C‑342/97, Colet., p. I‑3819, n.° 20) é igualmente aplicável em direito francês das marcas. Como resulta da jurisprudência referida no n.° 79, supra , este princípio é igualmente aplicável em direito francês, quando se trata de apreciar o risco de confusão com uma denominação social, e isto desde a entrada em vigor das diretivas que harmonizam as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas.
132. Assim, há que considerar que a existência de um caráter distintivo superior ao normal, em razão do conhecimento que o público tem de uma denominação social no mercado, pressupõe necessariamente que esta denominação social seja conhecida, no mínimo, por uma parte significativa do público em causa, não sendo necessário que goze de prestígio na aceção do artigo 8.°, n.° 5, do Regulamento n.° 207/2009. Não é possível estabelecer de forma geral, por exemplo, através do recurso a percentagens determinadas sobre o grau de conhecimento que o público tem da denominação social nos meios em causa, que ela tem um caráter distintivo elevado. Há, porém, que reconhecer uma certa interdependência entre o conhecimento de uma denominação social pelo público e o caráter distintivo dessa denominação, no sentido de que quanto mais a denominação social for conhecida do público‑alvo mais reforçado é o seu caráter distintivo. Para apreciar se uma denominação social goza de elevado caráter distintivo em razão do conhecimento que dela tem o público, devem tomar‑se em consideração todos os elementos pertinentes do processo, a saber, designadamente, a quota de mercado detida pela sociedade em causa, a intensidade, o alcance geográfico e a duração do uso dessa marca, a importância dos investimentos realizados pela empresa para a promover, a proporção dos meios interessados que identifica os produtos ou os serviços como provenientes de uma empresa determinada graças à denominação social, bem como as declarações das câmaras de comércio e de indústria ou de outras associações profissionais (v., por analogia, acórdão VITACOAT, referido no n.° 23, supra , n. os 34 e 35 e jurisprudência aí referida).
133. Nestas condições, para demonstrar, no caso em apreço, o conhecimento da denominação social Forge de Laguiole pelo público, é necessário provar que uma parte substancial do público pertinente — a saber, o consumidor médio francês — conhece a referida denominação social.
134. Para concluir pela existência do forte poder distintivo da denominação social Forge de Laguiole, em razão do prestígio e da reputação de que a interveniente gozava alegadamente em França, a Câmara de Recurso baseou‑se nos elementos do dossiê que lhe foram submetidos, expostos nos n. os 63 a 66 da decisão impugnada.
135. Trata‑se, em primeiro lugar, de um artigo publicado numa revista económica francesa, em outubro de 2004, e intitulado «Laguiole — Une production traditionnelle devenue tendance».
136. A este respeito, basta recordar que o momento relevante para a apreciação do conhecimento da denominação social Forge de Laguiole pelo público é a data da apresentação do pedido da marca LAGUIOLE, a saber, 20 de novembro de 2001. Ora, o artigo em causa, que data de 2004, não contém qualquer informação que permita demonstrar que a referida denominação social beneficiava de um conhecimento particular pelo público antes da data de 20 de novembro de 2001.
137. Em segundo lugar, a Câmara de Recurso faz referência a uma carta de 9 de março de 1999, erradamente identificada como datando de 20 de março de 1999. Nessa carta, o gerente da interveniente confirma um «acordo de realização de um novo molde que permita aumentar a produção e melhorar a qualidade das peças», precisando as condições financeiras.
138. Por um lado, há que observar que o destinatário da carta de 9 de março de 1999 não está claramente identificado. Por outro lado, na medida em que a Câmara de Recurso fez referência a essa carta para fundamentar a sua afirmação segundo a qual a interveniente tinha iniciado uma colaboração com um restaurador conhecido, há que constatar que na referida carta apenas figura a menção de uma reunião «em presença dos Senhores [B. e C.]», o que não basta para identificar o restaurador em questão nem para atestar a sua colaboração efetiva com a interveniente ou a forma dessa colaboração.
139. Por conseguinte, a carta de 9 de março de 1999 não pode servir para demonstrar, de forma indireta, o conhecimento da denominação social Forge de Laguiole pelo público.
140. Em terceiro lugar, a Câmara de Recurso afirma, no n.° 65 da decisão impugnada, que os produtos da interveniente receberam inúmeros prémios e distinções a nível europeu e a nível internacional em 1992 e 1996. Em resposta a uma questão escrita do Tribunal Geral, o IHMI indicou que a Câmara de Recurso se tinha baseado, a este respeito, nas menções que constam do artigo mencionado no n.° 135, supra , numa apresentação da «estratégia da criação» da interveniente, retirada em 2005 do seu sítio Internet (p. 234 do dossiê de processo no IHMI), e noutras publicações relativas à interveniente (p. 169 do dossiê de processo no IHMI).
141. A página 169 do dossiê de processo no IHMI contém um excerto de um artigo não datado, em italiano, que menciona que a faca concebida por um criador célebre faz parte da coleção de design do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MoMA) e que o modelo «Sommelier» recebeu o prémio «Design plus» da exposição «Ambiente» de Francoforte, em 1996.
142. A lista mais completa dos prémios e distinções encontra‑se no extrato do sítio Internet que figura na página 234 do dossiê de processo no IHMI, que menciona, para além da faca em exibição no MoMA e o prémio «Design plus» de 1996, o «Grand prix français de l’objet design» em 1991 (sem indicar claramente o objeto ao qual tinha sido atribuído), o «Blade Magazine Award» 1992, para um modelo criado por um arquiteto conhecido, e o Prémio Europeu de Design 1992, «pela atividade criativa» da interveniente, todos igualmente citados na decisão impugnada.
143. O Tribunal Geral considera que esses prémios e distinções constituem um indício do conhecimento dos produtos da interveniente pelo público e, portanto, da sua denominação social, uma vez que a atribuição de prémios e distinções a uma empresa pelos seus produtos é suscetível de chamar a at enção do grande público para essa empresa. Todavia, importa igualmente ter em conta o facto de a publicidade gerada por tais prémios estar limitada a um público particularmente interessado em design e de o seu impacto no grande público francês, o único pertinente no caso em apreço (v. n.° 77, supra ), ser limitado. Esta observação vale, por maioria de razão, para o «Blade Magazine Award», atribuído por uma revista especializada nos Estados Unidos e que apenas será conhecido por consumidores franceses especialmente interessados na coleção de facas.
144. Em quarto lugar, a Câmara de Recurso remete para o «catálogo» que figura no «documento 21» apresentado pela interveniente no IHMI, como prova do facto de que a interveniente envidou continuamente esforços para se diferenciar pela qualidade e imagem dos seus produtos, designadamente através da contratação de pessoal altamente qualificado e da colaboração com desenhadores e criadores prestigiados. O referido documento faz, de facto, menção a modelos desenhados por ou criados em cooperação com dois parceiros conhecidos.
145. Ora, resulta dos autos e da resposta da interveniente a uma questão escrita do Tribunal Geral que o «documento 21» agrupa de facto três documentos diferentes, a saber, um prospeto divulgado a partir de 1997, um documento promocional divulgado a partir de 2004 e um catálogo divulgado em 2000.
146. Na medida em que apenas se encontra uma referência a um restaurador conhecido no documento promocional de 2004 e não nos outros dois documentos, essa referência não pode servir para demonstrar a existência de uma colaboração com ele, em 20 de novembro de 2001.
147. Em contrapartida, as referências a um criador célebre podem ser encontradas no catálogo de 2000, que atesta, portanto, uma colaboração com ele, antes de 20 de novembro de 2001. Por outro lado, resulta dos elementos examinados no n.° 142, supra, que, antes desta data, houve colaboração com um conhecido arquiteto.
148. Deve considerar‑se que esta colaboração com parceiros que dispõem pessoalmente de um certo prestígio e de reputação são suscetíveis de fazer com que a interveniente e a sua denominação social, sob a qual estes produtos são comercializados, beneficiem da atenção, pelo menos, da parte do público que conhece os parceiros em causa. No entanto, esta circunstância não basta para demonstrar que a referida denominação social era conhecida do grande público em geral.
149. Em quinto lugar, a Câmara de Recurso cita um artigo publicado numa revista francesa, em dezembro de 1999, intitulado «Péril sur le mythe du couteau Laguiole».
150. A Câmara de Recurso considerou que esse artigo era «particularmente ilustrativo da reputação adquirida pela denominação [social] Forge de Laguiole antes do depósito [da marca LAGUIOLE ]», uma vez que nele se aconselhava a confiar na marca para escolher uma faca Laguiole. O artigo refere em seguida três «marcas» como sendo as mais reputadas, entre as quais a denominação social da interveniente, fazendo depois um breve resumo da sua história e do seu desenvolvimento.
151. Importa referir que este artigo constitui, é certo, um indício do conhecimento da denominação social Forge de Laguiole pelo público, mas não é suficiente, por si só, para o demonstrar. Com efeito, há que ter em conta o facto de que o artigo se limita a citar a interveniente, juntamente com dois outros produtores, como sendo mais reputada do que outros. No entanto, esta opinião emitida pelo autor do artigo não permite, sem mais, tirar conclusões sobre o grau de conhecimento da referida denominação social pelo grande público, na falta, nomeadamente, de indicações sobre a tiragem e a distribuição da revista em que foi publicado.
152. Em sexto lugar, a Câmara de Recurso cita um artigo publicado numa revista francesa gratuita, em fevereiro de 1999, intitulado «L’Aveyron: un terroir en ébulition», no qual se afirma que «a Laguiole, made in Laguiole, cujo mercado foi multiplicado por vinte, começa a forjar uma boa reputação no estrangeiro».
153. Refira‑se, a este respeito, primeiro, que a frase em causa, citada de forma incompleta pela Câmara de Recurso, está, na realidade, formulada como segue: «A Laguiole ‘made in Laguiole’, cujo mercado foi multiplicado por vinte com o aparecimento de pequenas oficinas locais, começa a forjar uma boa reputação no estrangeiro». Daqui decorre que, embora a interveniente seja expressamente apresentada neste artigo, a frase citada pela Câmara de Recurso diz respeito, no entanto, à totalidade da produção de facas no município de Laguiole e não apenas aos produtos da interveniente. Segundo, a frase em causa diz respeito à reputação no estrangeiro das facas fabricadas no referido município, e não ao conhecimento da denominação social Laguiole Forge pelo público francês, único pertinente no caso em apreço (v. n.° 133, supra ).
154. Nestas condições, há que concluir que o artigo em causa constitui sobretudo um indício da reputação das facas de tipo Laguiole, fabricadas in loco — convém ainda ter em conta o facto, referido pela jurisprudência citada no n.° 86, supra , de que as facas deste tipo são igualmente fabricadas, desde longa data e de maneira tradicional, no município de Thiers (França) — e, em menor medida, da denominação social Forge de Laguiole.
155. Em conclusão, os documentos salientados pela Câmara de Recurso revelam, é certo, determinados esforços publicitários e de comunicação desenvolvidos pela interveniente para se dar a conhecer junto do grande público francês e para se demarcar das suas concorrentes através de uma imagem de qualidade ou de luxo. Dado que esses esforços se mantiveram ao longo de vários anos, não está excluído que a denominação social Forge de Laguiole possa ter adquirido um certo conhecimento junto do público, no domínio das facas de tipo Laguiole.
156. No entanto, há que ter igualmente em conta que alguns dos elementos em que a Câmara de Recurso se baseou dizem sobretudo respeito às facas de tipo Laguiole em geral, e não tanto à denominação social da interveniente.
157. Por outro lado, os artigos de imprensa que a Câmara de Recurso referiu como indícios do conhecimento da denominação social Laguiole pelo público são retirados dos meios de comunicação social especializados — como o artigo mencionado no n.° 135, supra , que se dirige a profissionais da gestão de empresa, e a «Blade Magazine», que se dirige essencialmente a colecionadores de facas americanos — ou de meios de comunicação social cujo alcance de difusão não está demonstrado — como o artigo mencionado no n.° 149, supra —, ou ainda de revistas de caráter essencialmente publicitário que, por este facto, são menos suscetíveis de reter a atenção do leitor — como o artigo mencionado no n.° 152, supra . Esta circunstância distingue, de resto, o presente processo daquele em que foi proferido o acórdão do Tribunal Geral de 16 de dezembro de 2010, Rubinstein e L’Oréal/IHMI — Allergan (BOTOLIST e BOTOCYL), T‑345/08 e T‑357/08, não publicado na Coletânea, invocado pelo IHMI no âmbito da sua resposta às questões escritas do Tribunal Geral. Com efeito, embora seja verdade que, nos n. os 50 a 53 desse acórdão, o Tribunal Geral se baseou em artigos de imprensa para estabelecer a existência de uma vasta cobertura mediática do produto em causa, o facto é que se tratava de meios de comunicação de grande difusão e que beneficiam de uma reputação à escala internacional.
158. Assim, embora os elementos tidos em conta pela Câmara de Recurso constituam seguramente indícios de um certo conhecimento da denominação social Forge de Laguiole pelo público, não são suficientes para demonstrá‑lo com certeza. Cabe salientar, a este respeito, que, no fim de contas, o esforço publicitário da interveniente para aumentar a sua notoriedade junto do público não é o elemento determinante, mas sim o conhecimento efetivo do público que resulta desse esforço, medido através dos critérios enunciados pela jurisprudência VITACOAT, referida no n.° 132, supra .
159. Ora, a decisão impugnada não contém indicações que demonstrem a existência destes critérios no caso em apreço, em especial, quanto à parte do público francês que tem conhecimento da denominação social Forge de Laguiole, quanto à quota detida pela interveniente no mercado da cutelaria em geral ou no mercado, mais restrito, das facas de tipo Laguiole, quanto à importância dos investimentos realizados pela interveniente para promover o conhecimento da sua denominação social junto do público, quanto à proporção dos meios interessados que identifica os produtos ou os serviços como provenientes da interveniente graças à sua denominação social ou quanto a declarações das câmaras de comércio e de indústria ou de outras associações profissionais independentes da interveniente. Essas indicações também não resultam dos outros documentos dos autos nem, em particular, dos elementos apresentados pela interveniente.
160. Nestas circunstâncias, a Câmara de Recurso não teve razão em considerar que, em 20 de novembro de 2001, a denominação social Forge de Laguiole tinha adquirido, para as facas, um caráter distintivo superior à norma devido ao conhecimento que dela tinha o público francês.
Conclusão quanto ao risco de confusão
161. Em conclusão, os sinais em conflito apresentam uma certa semelhança nos planos visual e fonético e uma semelhança elevada ao nível conceptual. Importa ter em conta o facto de que a denominação social Forge de Laguiole apresenta um fraco caráter distintivo intrínseco, visto que é composta exclusivamente por elementos descritivos das atividades da interveniente. Este fraco caráter distintivo não é contrabalançado com um conhecimento adquirido junto do público em causa.
162. Tendo em conta a identidade, relativamente às atividades da interveniente, das «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente» e das «colheres», da classe 8, bem como o elevado grau de semelhança, relativamente às atividades da interveniente, das «serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas», da classe 8, dos «corta‑papéis», da classe 16, dos «saca‑rolhas; abre‑garrafas», da classe 21, e dos «corta‑charutos» e «limpadores de cachimbos», da classe 34, designados pela marca LAGUIOLE, há que concluir que existe um risco de confusão entre esta última e a denominação social Forge de Laguiole, uma vez que o público visado pode pensar que esses produtos têm a mesma origem comercial que a cutelaria e os talheres comercializados pela interveniente.
163. De igual modo, tendo em conta o grau médio de semelhança, relativamente às atividades da interveniente, dos «estojos de barbear, estojos de manicura», da classe 8, e dos «pincéis para a barba, estojos de toilette », da classe 21, designados pela marca LAGUIOLE, há que concluir que existe um risco de confusão entre esta última e a denominação social Forge de Laguiole, uma vez que o público visado pode pensar que esses produtos têm a mesma origem comercial que a cutelaria e os talheres comercializados pela interveniente.
164. Em contrapartida, dado o fraco grau de semelhança, relativamente às atividades da interveniente, dos «envelopes», da classe 16, designados pela marca LAGUIOLE, há que concluir que não existe risco de confusão a esse respeito, uma vez que o público em causa não pensará que estes produtos possam ter a mesma origem comercial que a cutelaria ou os talheres comercializados pela interveniente.
165. Do mesmo modo, dada a inexistência de semelhança, relativamente às atividades da interveniente, de todos os outros produtos e serviços designados pela marca LAGUIOLE, há que concluir que não existe nenhum risco de confusão a esse respeito. Em particular, a Câmara de Recurso não teve razão ao declarar, no n.° 111 da decisão impugnada, que o material impresso (álbuns, livros, almanaques, brochuras, catálogos, calendários, litografias, cartazes, incluídos na classe 16), designado pela referida marca, era suscetível de gerar, «em razão do seu conteúdo», um risco de confusão com a denominação social Forge de Laguiole. Com efeito, não se vislumbra de que modo o «material impresso» designado por essa marca, qualquer que seja a sua natureza e o seu conteúdo, poderia criar a impressão, junto do público interessado, de ter a mesma origem comercial que a cutelaria e os talheres comercializados pela interveniente, a não ser no caso de esse material impresso dizer especificamente respeito aos produtos da interveniente. Ora, tal situação específica e excecional não pode gerar um risco de confusão em relação a toda uma categoria de produtos. Em alternativa, dever‑se‑ia considerar que a designação de «material impresso» por uma marca que apresenta semelhanças com outra apresenta um risco de confusão em relação a qualquer produto designado por essa outra marca.
166. Decorre daqui que se deve julgar procedente o fundamento único e anular a decisão impugnada na medida em que a Câmara de Recurso concluiu pela existência de um risco de confusão entre a denominação social Forge de Laguiole e a marca LAGUIOLE, relativamente aos produtos diferentes de «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente; colheres; serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; estojos de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas; estojos de manicura», da classe 8, «corta‑papéis», da classe 16, «saca‑rolhas; abre‑garrafas» e «pinceis para a barba, estojos de toilette », da classe 21, e «corta‑charutos» e «limpadores de cachimbos», da classe 34.
167. Quanto ao mais, há que negar provimento ao recurso.
Quanto às despesas
168. Nos termos do disposto no artigo 87.°, n.° 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Por outro lado, nos termos do n.° 3, primeiro parágrafo, do mesmo artigo, o Tribunal Geral pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes, se cada parte obtiver vencimento parcial.
169. No caso em apreço, o IHMI e a interveniente foram vencidas parcialmente, na medida em que há que anular parcialmente a decisão impugnada, em conformidade com os pedidos do recorrente. Contudo, o recorrente não pediu a condenação do IHMI nas despesas, mas sim da interveniente.
170. Nestas circunstâncias, há que condenar a interveniente a suportar um quarto das despesas do recorrente, bem como três quartos das suas próprias despesas. O recorrente suportará um quarto das despesas respetivas da interveniente e do IHMI, bem como três quartos das suas próprias despesas. Por último, o IHMI suportará três quartos das suas próprias despesas.
Pelos fundamentos expostos,
O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)
decide:
1) A decisão da Primeira Câmara de Recurso do Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI) de 1 de junho de 2011 (processo R 181/2007‑1) é anulada na medida em que declara a nulidade da marca nominativa comunitária LAGUIOLE, relativamente aos produtos diferentes de «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente; colheres; serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; estojos de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas; estojos de manicura», da classe 8, «corta‑papéis», da classe 16, «saca‑rolhas; abre‑garrafas» e «pinceis para a barba, estojos de toilette », da classe 21, e «corta‑charutos» e «limpadores de cachimbos», da classe 34.
2) É negado provimento ao recurso quanto ao restante.
3) A Forge de Laguiole SARL suportará um quarto das despesas do recorrente, bem como três quartos das suas próprias despesas.
4) Gilbert Szajner suportará um quarto das despesas da Forge de Laguiole e um quarto das despesas do IHMI, bem como três quartos das suas próprias despesas.
5) O IHMI suportará três quartos das suas próprias despesas.
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção)
21 de outubro de 2014 ( *1 )
«Marca comunitária — Processo de declaração de nulidade — Marca nominativa comunitária LAGUIOLE — Denominação social francesa anterior Forge de Laguiole — Artigo 53.o, n.o 1, alínea c), e artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento (CE) n.o 207/2009»
No processo T‑453/11,
Gilbert Szajner, residente em Niort (França), representado por A. Lakits‑Josse, advogado,
recorrente,
contra
Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), representado por A. Folliard‑Monguiral, na qualidade de agente,
recorrido,
sendo a outra parte na Câmara de Recurso do IHMI, interveniente no Tribunal Geral,
Forge de Laguiole SARL, com sede em Laguiole (França), representada por F. Fajgenbaum, advogado,
que tem por objeto um recurso da decisão da Primeira Câmara de Recurso do IHMI de 1 de junho de 2011 (processo R 181/2007‑1), relativa a um processo de declaração de nulidade entre a Laguiole SARL e Gilbert Szajner,
O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção),
composto por: H. Kanninen, presidente, I. Pelikánová (relator) e E. Buttigieg, juízes,
secretário: C. Heeren, administradora,
vista a petição entrada na Secretaria do Tribunal Geral em 8 de agosto de 2011,
vistas as observações da interveniente apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 25 de novembro de 2011,
vista a contestação do IHMI, apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 12 de dezembro de 2011,
vista a réplica apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 20 de abril de 2012,
vista a tréplica da interveniente apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 6 de julho de 2012,
após a audiência de 11 de fevereiro de 2014,
vistas as observações escritas complementares apresentadas pelas partes a pedido do Tribunal Geral e apresentadas na Secretaria do Tribunal Geral em 24 e 25 de fevereiro de 2014, bem como em 8 e 9 de abril de 2014,
profere o presente
Acórdão
Antecedentes do litígio
1 |
O recorrente, Gilbert Szajner, é titular da marca nominativa comunitária LAGUIOLE, pedida em 20 de novembro de 2001 e registada em 17 de janeiro de 2005 pelo Instituto de Harmonização do Mercado Interno (marcas, desenhos e modelos) (IHMI), ao abrigo do Regulamento (CE) n.o 40/94 do Conselho, de 20 de dezembro de 1993, sobre a marca comunitária (JO 1994, L 11, p. 1), conforme alterado [substituído pelo Regulamento (CE) n.o 207/2009 do Conselho, de 26 de fevereiro de 2009, sobre a marca comunitária (JO L 78, p. 1)]. |
2 |
Os produtos e os serviços para os quais a marca LAGUIOLE foi registada pertencem nomeadamente, após renúncia parcial que teve lugar no decurso do processo no IHMI, às classes 8, 14, 16, 18, 20, 21, 28, 34 e 38 na aceção do Acordo de Nice relativo à Classificação Internacional dos Produtos e dos Serviços para o registo de marcas, de 15 de junho de 1957, conforme revisto e alterado, e correspondem, para cada uma dessas classes, à descrição seguinte:
|
3 |
Em 22 de julho de 2005, a interveniente, a Forge de Laguiole SARL, apresentou um pedido de declaração de nulidade parcial da marca LAGUIOLE, ao abrigo do disposto no artigo 52.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 40/94, em conjugação com o artigo 8.o, n.o 4, deste mesmo regulamento [atuais artigo 53.o, n.o 1, alínea c), e artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 207/2009]. |
4 |
O pedido de declaração de nulidade baseava‑se na denominação social Forge de Laguiole, utilizada pela interveniente para as atividades de «fabrico e venda de todos os artigos de cutelaria, cinzelagem, artigos para oferta e lembranças — todos os artigos relacionados com as artes da mesa». Segundo a interveniente, essa denominação social, cujo alcance não é apenas local, dá‑lhe o direito, nos termos do direito francês, de proibir a utilização de uma marca mais recente. |
5 |
O pedido de nulidade parcial era dirigido contra todos os produtos e serviços mencionados no n.o 2, supra. |
6 |
Por decisão de 27 de novembro de 2006, a Divisão de Anulação indeferiu o pedido de declaração de nulidade. |
7 |
Em 25 de janeiro de 2007, a interveniente interpôs recurso para o IHMI, nos termos dos artigos 57.° a 62.° do Regulamento n.o 40/94 (atuais artigos 58.° a 64.° do Regulamento n.o 207/2009), da decisão da Divisão de Anulação. |
8 |
Por decisão de 1 de junho de 2011 (a seguir «decisão impugnada»), a Primeira Câmara de Recurso do IHMI deu parcialmente provimento ao recurso e declarou a marca LAGUIOLE nula para os produtos das classes 8, 14, 16, 18, 20, 21, 28 e 34, tendo negado provimento ao recurso no que respeita aos serviços da classe 38. |
9 |
Em particular, a Câmara de Recurso considerou que, de acordo com a jurisprudência francesa, uma denominação social estava protegida, por princípio, para todas as atividades abrangidas pelo seu objeto social, estando a proteção, contudo, limitada às atividades efetiva e concretamente exercidas quando o objeto social fosse impreciso ou as atividades exercidas não estivessem abrangidas por ele. Ora, no caso em apreço, o objeto social da interveniente é suficientemente preciso no que respeita ao «fabrico e venda de todos os artigos de cutelaria, cinzelagem». A Câmara de Recurso acrescentou que, mesmo admitindo que o enunciado do objeto social «fabrico e venda de todos os artigos para oferta e lembranças — todos os artigos relacionados com as artes da mesa» seja imprecisa, a denominação social da requerente merecia a proteção, pelo menos nos setores em que tinha efetivamente exercido as suas atividades antes do depósito da marca LAGUIOLE. |
10 |
A este respeito, a Câmara de Recurso considerou que a interveniente havia demonstrado ter exercido uma atividade comercial, já antes do depósito da marca LAGUIOLE, para o comércio dos produtos abrangidos pelas «artes da mesa», as «artes da casa», pelo universo do vinho, pela cinzelagem e pelos artigos para fumadores, golfistas, caçadores e para o lazer, bem como de outros acessórios. Em contrapartida, a interveniente não demonstrou uma atividade comercial no que diz respeito aos produtos de luxo e aos artigos de viagem, aliás, não abrangidos pelo seu objeto social. Por fim, a Câmara de Recurso considerou que, à exceção dos serviços de telecomunicações da classe 38, todos os produtos designados pela referida marca coincidiam com os setores de atividade da interveniente ou se situavam em setores de atividade conexos. |
11 |
No que se refere aos sinais em conflito, a Câmara de Recurso considerou que o termo «laguiole», embora descritivo e não distintivo para as facas, era, não obstante, o elemento dominante, ou, pelo menos, codominante, da denominação social Forge de Laguiole, mesmo quando esta era utilizada para facas. Numa apreciação global, os sinais em conflito apresentam uma certa semelhança nos planos fonético, visual e conceptual, que não pode ser contrabalançada pelo mero aditamento da expressão genérica «forje de». |
12 |
A Câmara de Recurso concluiu daqui, por um lado, que existia um risco de confusão para os consumidores franceses, se a marca LAGUIOLE fosse utilizada para produtos ou serviços idênticos ou semelhantes, destinados à mesma clientela e vendidos no âmbito dos mesmos negócios que «a cutelaria, a cinzelagem e os objetos para oferta ou destinados às artes da mesa», os quais constituem setores de atividades da interveniente. Por outro lado, considerou que as atividades da interveniente seriam afetadas se a marca fosse usada para produtos complementares, indissociavelmente ligados a essas atividades, ou mesmo abrangidos por setores de atividades conexas onde estas atividades podem naturalmente ter desenvolvimentos. |
13 |
Por último, segundo a Câmara de Recurso, em razão do seu prestígio, ou até da sua reputação, a denominação social Forge de Laguiole possuía um caráter distintivo forte e podia beneficiar de uma proteção excecional, mesmo para setores de atividade diferentes dos abrangidos pelo seu objeto social. |
Pedidos das partes
14 |
O recorrente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:
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15 |
O IHMI conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:
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16 |
A interveniente conclui pedindo que o Tribunal Geral se digne:
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Questão de direito
1. Quanto aos documentos apresentados pela primeira vez no Tribunal Geral
17 |
Importa observar que, no âmbito, respetivamente, da réplica e da tréplica, o recorrente e a interveniente apresentaram alguns documentos que não faziam parte dos autos do processo no IHMI. |
18 |
Assim, o recorrente apresentou:
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19 |
Por sua vez, a interveniente apresentou:
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20 |
Além disso, o IHMI alegou, nas suas observações complementares de 21 de fevereiro de 2014, que o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (C.Cass. Ch. Com., Cœur de princesse/Mattel France, n.o 08‑2012.010), invocado pelo recorrente, devia ser afastado dos debates, por ser inadmissível. |
21 |
Há que recordar, a este respeito, que o recurso para o Tribunal Geral visa a fiscalização da legalidade das decisões das Câmaras de Recurso do IHMI, na aceção do artigo 65.o do Regulamento n.o 207/2009, pelo que a função do Tribunal Geral não consiste em reexaminar as circunstâncias de facto à luz dos documentos que lhe são apresentados pela primeira vez. Por conseguinte, há que rejeitar os anexos 34 a 42 da réplica, bem como os anexos 61, 63 a 65 e 72 da tréplica da interveniente, sem que seja necessário examinar a sua força probatória [v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 24 de novembro de 2005, Sadas/IHMI — LTJ Diffusion (ARTHUR ET FELICIE), T-346/04, Colet., p. II-4891, n.o 19 e jurisprudência aí referida]. |
22 |
Em contrapartida, os anexos 34‑A, 34‑B, 37‑A e 38‑A da réplica e os anexos 56, 59, 60 e 66 da tréplica, embora tenham sido apresentados pela primeira vez perante o Tribunal Geral, não constituem provas propriamente ditas, mas dizem respeito à prática decisória do IHMI, a qual, apesar de posterior ao processo no IHMI, uma parte tem o direito de referir (acórdão ARTHUR ET FELICIE, já referido no n.o 21, supra, n.o 20). |
23 |
O mesmo se diga dos anexos 55, 57, 58, 67 a 71, 73 e 74 da tréplica, bem como do acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.o 20, supra), que devem ser julgados admissíveis, uma vez que dizem respeito à legislação nacional, bem como à prática jurisdicional dos tribunais nacionais, a qual, apesar de posterior ao processo no IHMI, uma parte tem o direito de referir. Com efeito, na interpretação do direito nacional que, como acontece no caso em apreço, é referido pelo direito da União (n.o 29, infra), nem as partes nem o próprio Tribunal Geral podem ser impedidos de se inspirar em elementos retirados da legislação ou da jurisprudência nacional, pois não se trata de criticar a Câmara de Recurso por não ter tomado em conta elementos de facto respeitantes a determinado acórdão de um órgão jurisdicional francês, mas sim de invocar disposições legais ou sentenças em apoio de um fundamento relativo à má aplicação de uma disposição do direito nacional pelas Câmaras de Recurso [v., por analogia, acórdão do Tribunal Geral de 12 de julho de 2006, Vitakraft‑Werke Wührmann/IHMI — Johnson’s Veterinary Products (VITACOAT), T-277/04, Colet., p. II-2211, n.os 70 e 71]. |
24 |
Por outro lado, na medida em que o IHMI invoca o acórdão do Tribunal de Justiça de 5 de julho de 2011, Edwin/IHMI (C-263/09 P, Colet., p. I-5853, n.os 46 a 57), para contestar a admissibilidade do acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.o 20, supra) como elemento de prova, basta constatar que não resulta daquele acórdão que o Tribunal Geral esteja impedido de tomar em conta elementos apresentados pela primeira vez perante ele por uma parte a fim de demonstrar que a Câmara de Recurso aplicou incorretamente o direito nacional invocado perante ela. Com efeito, no referido acórdão, o Tribunal de Justiça apenas examinou, por um lado, se o Tribunal Geral tinha violado uma norma nacional aplicada ao mérito de um litígio e, por outro, se era competente para apreciar a existência de tal violação (acórdão Edwin/IHMI, já referido, n.o 44). Neste contexto, é verdade que indicou que uma parte que pedia a aplicação de uma regra nacional estava obrigada a apresentar ao IHMI os elementos que estabeleciam o conteúdo da mesma (v. acórdão Edwin/IHMI, já referido, n.o 50). No entanto, isso não significa que a aplicação da regra nacional efetuada pelo IHMI não possa ser fiscalizada pelo Tribunal Geral à luz de um acórdão nacional posterior à adoção da decisão do IHMI e invocado por uma das partes no processo. |
25 |
Por último, há que rejeitar o argumento do IHMI segundo o qual o facto de o recorrente ter apresentado o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.o 20, supra), apenas na audiência e não antes, constitui uma «manobra processual dilatória». Com efeito, importa desde logo recordar, a este respeito, que o referido acórdão foi proferido alguns dias após a apresentação da tréplica da interveniente, num momento em que a fase escrita, embora não estivesse ainda formalmente encerrada, estava, em princípio, terminada. O recorrente não podia, portanto, invocar utilmente o acórdão de 10 de julho de 2012 nos seus articulados. Seguidamente, sublinhe‑se que, contrariamente às afirmações do IHMI, o recorrente invocou o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012, referido no n.o 20, supra, já no âmbito da fundamentação do seu pedido de realização de uma audiência, apresentado na Secretaria do Tribunal Geral em 23 de agosto de 2012 e notificado ao IHMI em 11 de setembro de 2012, e não apenas na audiência. |
2. Quanto ao mérito
26 |
O recorrente invoca um único fundamento, relativo à violação do artigo 53.o, n.o 1, alínea c), do Regulamento n.o 207/2009, lido em conjugação com o artigo 8.o, n.o 4, do mesmo regulamento. |
27 |
Por força destas duas disposições, a existência de um sinal diferente de uma marca permite obter a declaração de nulidade de uma marca comunitária, se o mesmo preencher cumulativamente quatro requisitos: esse sinal deve ser utilizado na vida comercial; deve ter um alcance não apenas local; o direito a esse sinal deve ter sido adquirido em conformidade com o direito do Estado‑Membro onde o sinal era utilizado antes da data do depósito do pedido de marca comunitária; por último, deve conferir ao seu titular o direito de proibir a utilização de uma marca mais recente. Estes quatro requisitos limitam o número dos sinais diferentes de marcas que podem ser invocados para contestar a validade de uma marca comunitária em todo o território comunitário, nos termos do artigo 1.o, n.o 2, do Regulamento n.o 207/2009 [acórdão do Tribunal Geral de 24 de março de 2009, Moreira da Fonseca/IHMI — General Óptica (GENERAL OPTICA), T-318/06 a T-321/06, Colet., p. II-649, n.o 32]. |
28 |
Os dois primeiros requisitos, isto é, os relativos à utilização e ao alcance do sinal invocado, uma vez que esse alcance não deve ser apenas local, resultam da própria letra do artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 207/2009 e devem, por conseguinte, ser interpretados à luz do direito da União. Assim, o Regulamento n.o 207/2009 estabelece padrões uniformes, relativos à utilização dos sinais e ao respetivo alcance, que são coerentes com os princípios que inspiram o sistema instituído por esse regulamento (acórdão GENERAL OPTICA, referido no n.o 27, supra, n.o 33). |
29 |
Em contrapartida, resulta do segmento de frase «quando e na medida em que, segundo a legislação comunitária ou o direito do Estado‑Membro aplicável a esse sinal» que os dois outros requisitos, enunciados seguidamente no artigo 8.o, n.o 4, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 207/2009, constituem requisitos fixados pelo regulamento que, diferentemente dos precedentes, devem ser apreciados à luz dos critérios fixados pelo direito que rege o sinal invocado. Esta remissão para a legislação que regula o sinal invocado é perfeitamente justificada, dado que o Regulamento n.o 207/2009 reconhece a sinais alheios ao sistema da marca comunitária a possibilidade de serem invocados contra uma marca comunitária. Por isso, só o direito que rege o sinal invocado permite determinar se este é anterior à marca comunitária e se pode justificar que se proíba a utilização de uma marca mais recente (acórdão GENERAL OPTICA, referido no n.o 27, supra, n.o 34). |
30 |
No caso em apreço, não é contestado que a denominação social Forge de Laguiole é um sinal utilizado na vida comercial, na aceção do artigo 8.o, n.o 4, do Regulamento n.o 207/2009, e que o seu alcance ultrapassa o âmbito local. As partes também não contestaram, nem durante o processo no IHMI nem nos seus articulados no Tribunal Geral, que os direitos sobre esta denominação social foram adquiridos, ao abrigo do direito francês, anteriormente a 20 de novembro de 2001, data do depósito da marca LAGUIOLE. |
31 |
Na medida em que, na audiência, o recorrente tentou, por referência às suas marcas francesas LAGUIOLE, apresentadas em 1993, pôr em causa o caráter anterior da denominação social da interveniente na sua forma atual, relativamente à marca comunitária LAGUIOLE, basta observar que, no caso em apreço, só é pertinente a data de depósito da referida marca comunitária, a saber, 20 de novembro de 2001 (v. n.o 1, supra). |
32 |
Em contrapartida, as partes opõem‑se ao quarto requisito enunciado no n.o 27, supra, relativo à questão de saber se e, sendo esse o caso, em que medida a denominação social da interveniente lhe permite proibir ao recorrente a utilização da marca mais recente LAGUIOLE. Em conformidade com a jurisprudência acima referida no n.o 29, supra, a resposta a esta questão depende exclusivamente do direito francês. |
33 |
No caso em apreço, a Câmara de Recurso baseou, à luz da jurisprudência francesa existente à data da adoção da decisão impugnada, o seu raciocínio em dois pilares, cada um dos quais devia ser suficiente, por si só, para fundamentar a sua conclusão segundo a qual a denominação social da interveniente estava protegida para a totalidade das atividades referidas no seu objeto social. |
34 |
Primeiro, a Câmara de Recurso considerou, no essencial, que o enunciado do objeto social da interveniente estava definido de forma suficientemente precisa para se poder admitir que a proteção conferida pela sua denominação social se estende a todas as atividades aí enunciadas (decisão impugnada, pontos 87 a 90). Segundo, considerou que, mesmo admitindo que tal não foi o caso para a atividade de «fabrico e venda de […] todos os artigos para oferta e lembranças — todos eles relacionados com as artes da mesa», a interveniente havia demonstrado ter diversificado as suas atividades, antes de 20 de novembro de 2001, para as «artes da mesa», as «artes da casa», «o universo do vinho», a cinzelagem, os artigos para fumadores, para golfistas, para caçadores e para lazer, bem como os «outros acessórios» (decisão impugnada, pontos 91 a 94). |
35 |
Por conseguinte, há que examinar cada um dos dois pilares em que se baseia a decisão impugnada. |
Quanto ao alcance da proteção conferida pela denominação social Forge de Laguiole
36 |
Os artigos L. 714‑3 e L. 711‑4 do Code de la propriété intellectuelle (Código da Propriedade Intelectual francês, a seguir «CPI») têm a seguinte redação: L. 714‑3 «Será declarado nulo por decisão judicial o registo de uma marca que não seja conforme com as disposições dos artigos L. 711‑1 a L. 711‑4. […] Apenas o titular de um direito anterior pode pedir a declaração de nulidade com fundamento no artigo L. 711‑4. Todavia, a sua ação não é admissível se a marca tiver sido depositada de boa‑fé e se ele tiver tolerado o seu uso durante cinco anos. A decisão de anulação tem efeito absoluto.» L. 711‑4 «Não pode ser adotado como marca um sinal que viole os direitos anteriores, designadamente: […]
[…]» |
37 |
É pacífico que o direito de obter a anulação de uma marca mais recente com fundamento numa denominação social inclui, a fortiori, o direito de se opor à utilização dessa marca, na aceção do quarto requisito enunciado no n.o 27, supra. |
38 |
O recorrente alega que, em direito francês, a proteção da denominação social só abrange as atividades realmente exploradas, em especial quando as atividades indicadas no objeto social são definidas de maneira demasiado lata. |
39 |
O IHMI considera, por seu turno, que, em direito francês, o alcance da proteção da denominação social é definido pelo enunciado das atividades indicadas no objeto social, exceto se esse enunciado for demasiado lato ou impreciso, e que, nessa hipótese, o referido alcance da proteção é limitado apenas às atividades concretas exercidas pela sociedade em causa. |
40 |
A interveniente sustenta, no essencial, que a denominação social está protegida para qualquer atividade mencionada no objeto social, mesmo que este último esteja redigido em termos latos, e independentemente das atividades efetivamente exercidas. Acrescenta que a proteção se estende também às atividades de setores económicos ainda não exercidas pelo seu titular, mas conexas com os mencionados no objeto social. |
41 |
Importa recordar que, segundo a interpretação do artigo L. 711‑4, alínea b), do CPI, proposta pela Câmara de Recurso na decisão impugnada, uma denominação social está protegida, por princípio, para todas as atividades abrangidas pelo seu objeto social, sendo, contudo, a proteção limitada às atividades efetiva e concretamente exercidas quando o objeto social é impreciso ou quando as atividades exercidas não estão abrangidas por ele. |
42 |
Para esta interpretação, a Câmara de Recurso baseou‑se na jurisprudência francesa pertinente, tal como existia à data da adoção da decisão impugnada, em 1 de junho de 2011. Essa jurisprudência não era uniforme e tinha dado lugar a uma controvérsia na doutrina especializada, amplamente referida pelas partes, tanto perante o IHMI como perante o Tribunal Geral. |
43 |
Ora, essa jurisprudência divergente bem como a controvérsia por ela suscitada na doutrina foram reformuladas pelo acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.o 20, supra). Com efeito, nesse acórdão, proferido após a adoção da decisão impugnada, foi declarado que «a denominação social só [beneficiava] de proteção para as atividades efetivamente exercidas pela sociedade, e não para as enumeradas nos seus estatutos». |
44 |
Contrariamente ao que o IHMI e a interveniente alegam nas suas observações escritas complementares, apresentadas, respetivamente, em 24 e 25 de fevereiro de 2014, o princípio enunciado no acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.o 20, supra) é desprovido de qualquer ambiguidade quanto ao âmbito da proteção conferida a uma denominação social e aplica‑se de forma geral. É verdade que o processo que deu origem ao referido acórdão não dizia respeito a um recurso interposto com base no artigo L. 711‑4 do CPI, mas à anulação de uma marca por depósito fraudulento e a um pedido em matéria de concorrência desleal. No entanto, há que salientar que a passagem citada no n.o 43, supra, figura na secção desse acórdão que rejeita um fundamento invocado contra a anulação da marca cœur de princesse, por depósito fraudulento, fundamento esse relativo ao facto de a referida marca se limitar a reproduzir a denominação social da sociedade recorrente, anterior à comercialização de bonecas sob a designação «cœur de princesse» pela sociedade Mattel France. Foi neste contexto que a Cour de cassation francesa redigiu a referida passagem, para seguidamente salientar que os produtos e serviços designados pela marca cœur de princesse ultrapassavam largamente as atividades até aí efetivamente exploradas pela sociedade em causa, tendo assim rejeitado como inoperante o fundamento suscitado por esta última. Em conclusão, essa passagem não contém, portanto, nenhuma limitação, nem na sua letra nem no seu contexto factual ou processual, que pudesse fazer crer que a sua aplicabilidade estava reservada às circunstâncias específicas do caso julgado. |
45 |
Por outro lado, contrariamente à opinião do IHMI, o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.o 20, supra) pode ser tomado em consideração pelo Tribunal Geral na sua apreciação da legalidade da decisão impugnada, embora seja posterior a esta última. |
46 |
Com efeito, pondo de parte as considerações de ordem processual referidas nos n.os 23 e 24, supra, há que salientar, primeiro, que este acórdão não procedeu a uma viragem da jurisprudência, tendo simplesmente clarificado uma questão jurídica controvertida. Com efeito, como testemunham os numerosos acórdãos anteriores dos órgãos jurisdicionais franceses apresentados pelas partes tanto perante o IHMI como perante o Tribunal Geral, a jurisprudência dos órgãos jurisdicionais inferiores anterior ao acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.o 20, supra), apesar de não ser uniforme, permitia concluir que a proteção da denominação social estava limitada às atividades efetivamente exercidas pela sociedade em causa. |
47 |
Segundo, mesmo considerando que o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.o 20, supra) deva ser entendido no sentido de que opera uma viragem da jurisprudência, tais viragens, em princípio, são retroativamente aplicáveis às situações existentes. |
48 |
Este princípio justifica‑se pela consideração de que a interpretação jurisprudencial de uma norma num dado momento não pode ser diferente consoante a época dos factos considerados e de que ninguém pode invocar um direito adquirido a uma jurisprudência ultrapassada. Se é verdade que esse princípio pode ser atenuado na medida em que, em situações excecionais, os órgãos jurisdicionais se podem afastar dele para adaptar o efeito no tempo da retroatividade de uma viragem, a retroatividade das viragens continua a ser o princípio dominante. Ora, no caso em apreço, o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.o 20, supra) não contém nenhuma adaptação ou limitação neste sentido. |
49 |
Importa acrescentar, a este respeito, que o princípio análogo é aplicado pelos órgãos jurisdicionais da União (acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de agosto de 1995, Roders e o., C-367/93 a C-377/93, Colet., p. I-2229, n.os 42 e 43). |
50 |
Assim, embora o acórdão da Cour de cassation francesa de 10 de julho de 2012 (n.o 20, supra) seja, enquanto tal, um facto novo, limita‑se a declarar o direito francês tal como deveria ter sido aplicado pela Câmara de Recurso na decisão impugnada, que data de 1 de junho de 2011, e tal como deve ser aplicado pelo Tribunal Geral, em conformidade com o princípio recordado no n.o 29, supra. |
51 |
Daqui resulta que, no caso em apreço, a proteção da denominação social Forge de Laguiole se estende exclusivamente às atividades efetivamente exercidas pela interveniente à data do pedido da marca LAGUIOLE, em 20 de novembro de 2001. |
52 |
Por conseguinte, o primeiro pilar do raciocínio da Câmara de Recurso, que se baseia nas atividades referidas no objeto social da interveniente, não pode servir de base à decisão impugnada, sem que seja demonstrado que essas atividades tenham sido efetivamente exercidas. |
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Resta, pois, examinar a procedência do segundo pilar do raciocínio da Câmara de Recurso, baseado nas atividades efetivamente exercidas pela interveniente. |
Quanto às atividades efetivamente exercidas pela interveniente antes da data de depósito da marca LAGUIOLE
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No caso vertente, é pacífico que a interveniente está ativa no fabrico e venda de produtos de cutelaria. |
55 |
Segundo as conclusões da Câmara de Recurso, a interveniente também demonstrou ter diversificado as suas atividades para setores diferentes do da cutelaria, antes da data do depósito da marca LAGUIOLE (a saber, 20 de novembro de 2001). |
56 |
O recorrente alega, a este respeito, por um lado, que a atividade da interveniente está, na realidade, limitada ao comércio de facas, consistindo a alegada diversificação na comercialização de facas equipadas com um acessório, e, por outro, que, em todo o caso, a referida diversificação é, em larga medida, posterior à data do depósito da marca LAGUIOLE. |
57 |
O IHMI sustenta que os domínios de atividade de uma sociedade se definem em relação à clientela a que destina os seus produtos ou os seus serviços. Ora, as facas equipadas com um acessório dirigem‑se a uma clientela diferente da das facas simples, o que é demonstrado pela diferença dos canais de distribuição das diferentes facas equipadas com acessórios. Por outro lado, a diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria começou antes do depósito da marca LAGUIOLE. |
58 |
A interveniente acrescenta que um produto pode ter duas funções diferentes, não suprimindo a função de faca a função do acessório. |
59 |
No que se refere às provas da diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria, a Câmara de Recurso baseou‑se, no n.o 94 da decisão impugnada, em determinados documentos apresentados pela interveniente perante o IHMI, que datam do período anterior ao depósito da marca LAGUIOLE, a saber:
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60 |
A este respeito, deve observar‑se, primeiro, que os «cabazes oferta» e as «caixas» não são mencionados em nenhum desses documentos. Em contrapartida, na parte inferior de algumas páginas da lista de preços da interveniente de 1 de janeiro de 2001, encontra‑se a menção «As facas são fornecidas com uma embalagem para oferta e um certificado de origem». Os documentos tidos em consideração pela Câmara de Recurso fazem, portanto, referência a uma comercialização, pela interveniente, de embalagens para oferta apenas para acondicionar os seus próprios produtos, e não como produtos autónomos. Nestas circunstâncias, a Câmara de Recurso errou ao considerar, no n.o 93 da decisão impugnada, que os «cabazes oferta» e as «caixas» tinham sido propostos para venda pela interveniente no âmbito da diversificação das suas atividades para o setor dos «outros acessórios». |
61 |
Segundo, o modelo «Laguiole du routard» consiste numa faca dobrável, sem acessório. Do mesmo modo, o modelo «Faca para caça» é, de acordo com a descrição constante da lista de preços de 1 de janeiro de 2001, um «[m]odelo que não fecha, fornecido com um estojo em couro». Por conseguinte, deve considerar‑se que estes modelos não podem servir para demonstrar uma diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria, mesmo admitindo que se destinem a ser utilizados no âmbito de «atividades de lazer» ou por caçadores, como alegou a Câmara de Recurso no n.o 93 da decisão impugnada. |
62 |
Terceiro, as «bainhas» e os «estojos» mencionados nas faturas e na lista de preços são, pela sua conceção e a sua apresentação, exclusivamente destinados a conter as facas fabricadas pela interveniente. Quando muito, poderiam, sendo caso disso, servir para conter outras facas, consoante o tamanho e a forma das mesmas, mas não produtos estranhos à cutelaria. Além disso, as referidas bainhas e estojos são exclusivamente vendidos em conjunto com as facas, e não em separado. Nestas condições, há que considerar que são meros acessórios da cutelaria comercializada pela interveniente, sem apresentar as características de uma gama de produtos independente, e, por este motivo, não podem servir para demonstrar uma diversificação das suas atividades para setores diferentes do da cutelaria. |
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Quarto, não é claro que os garfos se enquadrem na cutelaria. Contudo, a comercialização de garfos não permite demonstrar uma atividade da interveniente em todo o setor das «artes da mesa». Com efeito, embora seja verdade que os garfos podem ser vistos como fazendo parte das «artes da mesa», trata‑se de uma categoria demasiado lata e que agrupa conjuntos de produtos demasiado heteróclitos para poderem ser comparados, para efeitos da apreciação da sua semelhança, com os produtos e os serviços designados pela marca LAGUIOLE. Em contrapartida, a comercialização de garfos demonstra uma diversificação concreta e efetiva das atividades da interveniente para os talheres em geral, enquanto subcategoria das «artes da mesa» [v., por analogia, acórdão do Tribunal Geral de 13 de fevereiro de 2007, Mundipharma/IHMI — Altana Pharma (RESPICUR), T-256/04, Colet., p. II-449, n.o 23]. |
64 |
Quinto, quanto aos diversos (outros) artigos que consistem numa faca equipada de um ou dois acessórios (saca‑rolhas, sovela, abre‑cápsulas, corta‑charutos, carregador, porta‑chaves, extrator de pino), a Câmara de Recurso considerou, no essencial, que estes artigos multifuncionais demonstravam a diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria. |
65 |
Ora, como o recorrente alega com razão, os artigos multifuncionais comercializados pela interveniente não são caracterizados pela função do acessório, continuando a ser facas não obstante a presença de um ou dois acessórios. Com efeito, o acrescento dos diferentes acessórios não altera o seu caráter enquanto produtos do setor da cutelaria. |
66 |
A este respeito, por um lado, importa referir que, nos produtos multifuncionais comercializados pela interveniente, a faca continua a ser preponderante e determina o caráter do produto no seu conjunto, no que respeita quer ao material utilizado quer a toda a sua apresentação, o que, aliás, vem sublinhado na lista de preços de 1 de janeiro de 2001. Desse documento resulta que a própria interveniente considera esses produtos como facas. Com efeito, o modelo que inclui um saca‑rolhas e um abre‑cápsulas figura na referida lista sob a designação «Faca Escanção/Abre‑cápsulas», e o modelo que inclui um extrator de pino, sob a designação «Faca do Golfista». Além disso, as partes destes produtos diferentes da lâmina, tais como a sovela e o saca‑rolhas, são aí expressamente apresentados sob a designação «Acessórios», sendo o material da lâmina e o dos referidos acessórios indicados em separado, com insistência na qualidade do aço da lâmina (o modelo «Calumet», com limpador, furador e carregador, constitui uma exceção). Por último, como já foi mencionado no n.o 60, supra, na parte inferior de algumas páginas que contêm modelos que incluem acessórios encontra‑se a menção «As facas são fornecidas com uma embalagem para oferta e um certificado de origem». |
67 |
Por outro lado, contrariamente ao que alega a interveniente, a clientela a quem se destinam os produtos multifuncionais em causa é composta não por golfistas ou por fumadores em geral mas por compradores de cutelaria que também praticam golfe ou que fumam, ou por golfistas ou por fumadores que têm uma afinidade com cutelaria. Isto é válido tanto de uma perspetiva funcional (um extrator de pino ou um corta‑charutos que façam parte de uma faca são menos maneáveis e práticos do que o mesmo instrumento sem faca, sobretudo se a própria faca for um produto de topo de gama com uma certa dimensão, como é o caso dos produtos da interveniente) como de uma perspetiva financeira (custo acrescido considerável dos artigos multifuncionais relativamente ao simples acessório) ou ainda de uma perspetiva da imagem (um fumador ou um golfista que não se interessem por cutelaria não pensarão normalmente nos produtos da interveniente para se abastecerem em artigos para fumadores ou de golfe, virando‑se para os produtores especializados nesses setores). |
68 |
Por conseguinte, importa rejeitar o argumento do IHMI segundo o qual os setores de atividade de uma pessoa coletiva são, antes de tudo, definidos pelos mercados a que se destinam os seus produtos ou serviços. Com efeito, os produtos multifuncionais comercializados pela interveniente não se dirigem precisamente a um público sem relação com o público‑alvo dos produtos abrangidos pelo setor da cutelaria, mas sim a um público de fumadores ou de golfistas igualmente amadores dos referidos produtos. A este respeito, há que salientar que, contrariamente ao que a Câmara de Recurso afirmou nos n.os 96 e 97 da decisão impugnada, o facto de os artigos multifuncionais comercializados pela interveniente terem sido vendidos não apenas por cuteleiros mas igualmente por armeiros, tabacarias, lojas de artigos de escrita, lojas de «prendas — artes da mesa», grandes armazéns e outras empresas não é suscetível de alterar a natureza desses artigos como produtos do setor da cutelaria. |
69 |
Sexto, quanto à atividade de «fabrico e venda de todos os artigos […] para oferta e lembranças», mencionados no objeto social da interveniente, é verdade que, em princípio, todos os produtos comercializados por esta última podem servir para oferta ou lembranças, como o recorrente afirmou com razão. Além disso, como foi sublinhado no n.o 60, supra, uma parte, pelo menos, dos produtos da interveniente são fornecidos em embalagens para oferta, o que confirma o seu possível destino como prenda. Decorre daqui que a interveniente está efetivamente ativa no domínio da comercialização de artigos para oferta. |
70 |
Todavia, importa referir que a interveniente não demonstrou que produzia ou comercializava artigos para oferta ou lembranças que não faziam parte da cutelaria ou dos talheres. A sua atividade em matéria de ofertas e de lembranças limita‑se, manifestamente, a propor os seus produtos habituais, do setor da cutelaria ou dos talheres, em embalagens para oferta. Por conseguinte, deve concluir‑se que, embora a interveniente tenha demonstrado ter exercido uma atividade em matéria de «fabrico e venda de todos os artigos […] para oferta e lembranças», esta atividade está confinada a prendas e a lembranças dos setores da cutelaria ou dos talheres. |
71 |
Por conseguinte, contrariamente ao que foi considerado pela Câmara de Recurso no n.o 93 da decisão impugnada, uma diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria, antes de 20 de novembro de 2001, não estava demonstrada em relação à «cinzelagem», às «artes da mesa» — com exceção dos talheres —, às «artes da casa», ao «universo do vinho», aos artigos para fumadores, aos artigos para golfistas, aos artigos para caçadores, às atividades de lazer ou aos acessórios, como os cabazes oferta, os estojos e as caixas. |
72 |
Em contrapartida, há que concluir que uma diversificação das atividades da interveniente para setores diferentes do da cutelaria está demonstrada em relação aos «talheres», dos quais fazem parte os «garfos» mencionados na lista de preços de 1 de janeiro de 2001, bem como em relação aos «artigos para oferta e lembranças», na medida em que se trata de produtos dos setores da cutelaria ou dos talheres. Por conseguinte, é apenas em relação a estas atividades que a interveniente pode reivindicar a proteção da sua denominação social relativamente à marca LAGUIOLE. |
73 |
Consequentemente, há que anular a decisão impugnada na parte em que a Câmara de Recurso concluiu pela existência de um risco de confusão na aceção do artigo L. 711‑4 do CPI, no que se refere à «cutelaria» e a «todos os artigos relacionados com as artes da mesa», bem como a «todos os artigos […] para oferta e lembranças», na medida em que se trate de artigos não abrangidos pela cutelaria ou pelos talheres. |
74 |
Assim, o exame que se segue acerca do risco de confusão na aceção do artigo L. 711‑4 do CPI apenas dirá respeito às atividades de fabrico e de venda de todos os artigos dos setores da cutelaria ou dos talheres, bem como de prendas e lembranças, na medida em que se trate de produtos dos referidos setores. |
Quanto ao risco de confusão
75 |
Importa recordar, a título preliminar, que, em conformidade com a jurisprudência referida no n.o 29, supra, o requisito de que o sinal deve conferir ao seu titular o direito de proibir a utilização de uma marca posterior deve ser apreciado à luz dos critérios fixados pela legislação que regula o sinal anterior invocado, isto é, o direito francês. |
76 |
Por força do artigo L. 711‑4 do CPI (reproduzido no n.o 36, supra), o titular de uma denominação social anterior tem o direito de proibir a utilização de uma marca mais recente, na condição de «existir um risco de confusão no espírito do público». |
77 |
Como o IHMI alega acertadamente, tendo em conta a natureza dos produtos designados pela marca LAGUIOLE, o público pertinente é o grande público francês, dotado de um nível de atenção médio. |
78 |
Segundo a jurisprudência francesa, a apreciação do risco de confusão depende de vários fatores, entre os quais o grau de semelhança (visual, fonética e conceptual) entre os sinais em causa, o grau de semelhança entre os setores económicos abrangidos por esses sinais e o poder distintivo mais ou menos elevado do sinal anterior (CA Versailles, acórdão de 25 de outubro de 2001, Flex’cible/SOS Flexibles et Sofirop, et TGI Paris, acórdão de 8 de julho de 2011, RG 09/11931). |
79 |
O risco de confusão é maior quando a denominação social anterior possui um poder distintivo forte, nomeadamente devido ao seu conhecimento pelo público. O prejuízo criado pelo risco de confusão não resulta unicamente de um desvio de clientela. Pode também tratar‑se de uma ofensa ao crédito ou à reputação (CA Paris, acórdão de 13 de outubro de 1962, Ann. propr. ind. 1963, p. 228). |
80 |
Uma vez que a resolução do conflito entre uma marca e uma denominação social anterior depende da existência de um risco de confusão, se a marca for depositada para vários produtos ou serviços de natureza diferente, a sua anulação terá caráter distributivo e só se verificará para os produtos ou serviços em relação aos quais exista um risco de confusão com a atividade da pessoa coletiva (CA Paris, acórdão de 28 de janeiro de 2000, Revue Dalloz, 2001, p. 470). |
Quanto à semelhança entre os setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole e pela marca LAGUIOLE
81 |
Segundo a jurisprudência francesa, para determinar se os setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole e pela marca LAGUIOLE são semelhantes, há que ter em conta todos os fatores pertinentes que caracterizam a relação entre os produtos ou serviços. Tais fatores incluem, em especial, a sua natureza, o seu destino, a sua utilização, bem como o seu caráter concorrente ou complementar (TGI Paris, acórdão de 25 de novembro de 2009, RG 09/10986). |
82 |
No caso em apreço, a Câmara de Recurso considerou que os produtos designados pela marca LAGUIOLE coincidiam, em grande parte, com os setores de atividade do recorrente ou se situavam em setores de atividades conexas, consideração esta que precisou nos n.os 107 a 114 da decisão impugnada. |
83 |
Todavia, esta consideração decorre de um exame que tem em conta a totalidade dos setores de atividade enunciados no objeto social da interveniente. Ora, como foi salientado nos n.os 71 a 74, supra, há que ter em conta, a título do risco de confusão, apenas as atividades da interveniente nos setores da cutelaria e dos talheres, bem como as prendas e lembranças, na medida em que se trate de produtos dos referidos setores. |
84 |
Nestas condições, as conclusões da Câmara de Recurso nos n.os 107 a 114 da decisão impugnada devem ser reexaminadas à luz desta restrição dos setores de atividade protegidos pela denominação social Forge de Laguiole. |
– Quanto à relação entre as «serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas», bem como «estojos de barbear; estojos de manicura», pertencentes à classe 8, «corta‑papéis», da classe 16, e «pincéis para a barba; estojos de toilette», da classe 21, e as atividades da interveniente
85 |
Relativamente a «serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas», da classe 8, e a «corta‑papéis», da classe 16, a Câmara de Recurso teve razão em considerar que se tratava de objetos cortantes, que faziam parte do setor da «cutelaria», visado pelo objeto social da interveniente. Os referidos produtos e as atividades da interveniente são, portanto, fortemente semelhantes. Do mesmo modo, os «estojos de barbear; estojos de manicura», da classe 8, e os «pincéis para a barba; estojos de toilette», da classe 21, são complementares ou acessórios dos referidos objetos cortantes, na medida em que são utilizados conjuntamente e são geralmente vendidos em conjunto no mesmo tipo de lojas e a uma mesma clientela. Estes produtos e as atividades da interveniente são, portanto, semelhantes. |
– Quanto a «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente» e a «chaves de fendas», da classe 8
86 |
No que respeita a «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente», da classe 8, designados pela marca LAGUIOLE, há que observar que esta definição inclui as facas. |
87 |
Esta conclusão não é posta em causa pelos argumentos invocados pelo recorrente e pela interveniente nas suas observações escritas complementares apresentadas, respetivamente, a 9 e 8 de abril de 2014. |
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Primeiro, o facto de o título da classe 8 da classificação de Nice estar enunciado como «Ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente; cutelaria, garfos e colheres; armas brancas; máquinas de barbear» não significa que estas diferentes categorias não apresentem sobreposições entre si. Com efeito, a classificação de Nice só tem uma finalidade administrativa e apenas se destina a facilitar a redação e o tratamento dos pedidos de marca, propondo certas classes e categorias de produtos e de serviços. Em contrapartida, os títulos das classes não constituem um sistema no qual um produto ou um serviço contido numa classe ou numa categoria não possa igualmente fazer parte de outra classe ou categoria, como resulta, nomeadamente, da regra 2, n.o 4, do Regulamento (CE) n.o 2868/95 da Comissão, de 13 de dezembro de 1995, relativo à execução do Regulamento (CE) n.o 40/94 do Conselho, sobre a marca comunitária (JO L 303, p. 1). |
89 |
É por isso que, na sua decisão de 14 de maio de 2003 relativa à marca LAGUIOLE, o examinador do IHMI considerou acertadamente que «[era] pacífico que uma arma branca [era] uma ‘arma de mão cuja ação [resultava] de uma parte em metal’» e que, «portanto, este termo [compreendia] as facas», apesar de estas duas categorias de produtos figurarem no título da classe 8 da classificação de Nice. |
90 |
Segundo, o recorrente invoca como argumento a decisão do examinador do IHMI de 14 de maio de 2003, na medida em que este procedeu a uma distinção entre as «armas brancas», que equiparou às facas e para as quais se recusou a registar a referida marca em razão do seu caráter descritivo, e as «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente», para os quais registou essa marca. |
91 |
Importa observar, a este respeito, que a decisão do examinador do IHMI de 14 de maio de 2003 não pode vincular o Tribunal Geral na sua apreciação dos produtos abrangidos pela mesma categoria (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 26 de abril de 2007, Alcon/IHMI, C-412/05 P, Colet., p. I-3569, n.o 65, e acórdão ARTHUR ET FELICIE, referido no n.o 21, supra, n.o 71). Por outro lado, há que salientar que, já durante o processo de declaração de nulidade no IHMI, o recorrente estava consciente de que as facas poderiam fazer parte da categoria das «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente», uma vez que se declarou disposto, por diversas vezes, a precisar o teor da lista dos produtos da classe 8 abrangidos, designadamente, pela marca LAGUIOLE, da seguinte forma: «Ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente, com exceção das facas». Todavia, as decisões da Divisão de Anulação e da Câmara de Recurso baseavam‑se em motivos que não necessitavam de um exame desta questão, e o recorrente não precisou efetivamente desta forma a lista dos produtos. |
92 |
Há, pois, que concluir que as «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente», na medida em que se trata de facas, são idênticos às atividades da interveniente no setor da cutelaria — e não apenas ao modelo «Laguiole du routard», como a Câmara de Recurso considerou. |
93 |
No entanto, contrariamente ao que a Câmara de Recurso pôde considerar, as «chaves de fendas», pertencentes à classe 8, não apresentam nenhuma semelhança com o modelo «Laguiole du routard» comercializado pela interveniente, que mais não é do que uma simples faca dobrável, sem acessórios. |
– Quanto às «colheres», da classe 8
94 |
No que diz respeito às «colheres», da classe 8, fazem parte dos «talheres» comercializados pela interveniente (v. n.os 62 e 72, supra) e, portanto, estão integrados num setor económico idêntico a um dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole. |
– Quanto aos «utensílios para cozinha e loiça em vidro, porcelana e faiança; loiça não em metais preciosos; saca‑rolhas; abre‑garrafas, caixas metálicas para a distribuição de guardanapos de papel; ampulhetas», da classe 21, e aos «utensílios e recipientes para uso doméstico e para cozinha em metais preciosos; baixela em metais preciosos», da classe 14
95 |
No que respeita a estes produtos, a Câmara de Recurso associou‑os às «artes da mesa» e deduziu daí que coincidiam com as atividades da interveniente neste domínio. |
96 |
A este respeito, há que recordar, como foi salientado no n.o 63, supra, que a categoria das «artes da mesa» é demasiado ampla e imprecisa para servir de ponto de referência a fim de estabelecer a existência de um risco de confusão. Assim, contrariamente às conclusões da Câmara de Recurso, os referidos produtos não apresentam semelhanças com os setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole. |
97 |
Todavia, os «saca‑rolhas; abre‑garrafas» apresentam uma forte semelhança com o modelo «Sommelier», que inclui saca‑rolhas e abre‑cápsulas, e com os outros modelos de faca que incluem um saca‑rolhas, comercializados pela interveniente. Com efeito, embora a comercialização destes produtos, enquanto «derivados» de produtos abrangidos pelo setor da cutelaria, não possa demonstrar uma diversificação das atividades da interveniente para as «artes da mesa» ou para «o universo do vinho», como foi exposto nos n.os 65 e 69, supra, a verdade é que, enquanto produtos isolados, do ponto de vista da funcionalidade, são equivalentes aos «saca‑rolhas; abre‑garrafas» designados pela marca LAGUIOLE. Este facto, além da comercialização nos mesmos estabelecimentos comerciais, é suficiente para concluir que os referidos produtos se integram num setor económico idêntico a um dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole. |
– Quanto aos «metais preciosos e suas ligas», às «pedras preciosas» e às «caixas, palmatórias para velas», da classe 14
98 |
No que respeita aos «metais preciosos e suas ligas» e às «pedras preciosas», pertencentes à classe 14, a Câmara de Recurso considerou que esses produtos eram «muito requisitados» para a cinzelagem fina e para numerosos objetos do domínio das «artes da mesa» e, portanto, apresentavam uma forte complementaridade com as atividades da interveniente. Além disso, as «caixas, palmatórias para velas», incluídas na classe 14, são vendidas no mesmo tipo de estabelecimentos consagrados às «artes da mesa e da decoração» que certos artigos alegadamente comercializados pela interveniente. |
99 |
A este respeito, importa, antes de mais, recordar que, no caso em apreço, a «cinzelagem» e o domínio das «artes da mesa» não fazem parte dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole (v. n.os 73 e 74, supra). Seguidamente, o simples facto de os metais e pedras preciosos poderem ser utilizados para as atividades da interveniente ligadas à cutelaria não permite concluir que, no espírito dos consumidores franceses, fazem parte de um setor económico semelhante a um dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole. Com efeito, por um lado, os metais e pedras preciosos são essencialmente destinados à indústria transformadora, e não, como a cutelaria, aos consumidores finais. Por outro lado, em princípio, esses materiais serão utilizados numa faca apenas para fins decorativos e acessórios, sem ligação com a funcionalidade da mesma. |
– Quanto ao «couro e imitações de couro» e a «malas de viagem, maletas e sacos de viagem», da classe 18, bem como a «caixas»
100 |
No que se refere ao «couro e imitações de couro» e a «malas de viagem e maletas», da classe 18, a Câmara de Recurso salientou que eram comummente utilizados no fabrico de estojos, bainhas e caixas, comercializados pela interveniente, ou podiam ser utilizados para a embalagem e o transporte de produtos do setor da cutelaria, sobretudo quando se trata de produtos de luxo, destinados a serem oferecidos como «artigos para oferta». Daqui concluiu que estes produtos eram complementares das atividades da interveniente e «se situavam na mesma linha da sua gama de acessórios». |
101 |
A este respeito, importa, em primeiro lugar, recordar que, no caso em apreço, os «artigos para oferta» fazem parte dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole unicamente na medida em que se trate de cutelaria ou de talheres (v. n.os 71 a 74, supra). Em segundo lugar, o facto de o «couro e imitação de couro» poderem ser utilizados como matérias‑primas para fabricar os estojos e as bainhas comercializados pela interveniente juntamente com algumas das suas facas não pode ser suficiente para criar uma relação de semelhança com as atividades da interveniente no setor da cutelaria, uma vez que, designadamente, as matérias‑primas se destinam aos produtores, ao passo que a cutelaria visa o consumidor final. Em terceiro lugar, no que respeita, em particular, às «caixas» alegadamente comercializadas pela interveniente, importa recordar que os documentos em que a Câmara de Recurso baseou as suas conclusões quanto às atividades da interveniente em 20 de novembro de 2001 (v. n.o 59, supra) não referem esses artigos e que, de qualquer modo, uma vez que se destinam exclusivamente a conter a cutelaria da interveniente, apenas podem ter caráter acessório, ou servir de embalagem, relativamente às atividades da interveniente no setor da cutelaria. |
102 |
Resulta daí que o «couro e imitação de couro» e as «malas, maletas e sacos de viagem», pertencentes à classe 18, não são semelhantes às atividades da interveniente no setor da cutelaria. |
– Quanto ao «material escolar; lápis, porta‑minas, borrachas para apagar; sobrescritos; arquivadores; álbuns, livros periódicos; almanaques, brochuras, cadernos, catálogos; calendários, litografias, cartazes», da classe 16
103 |
No que respeita a estes produtos, a Câmara de Recurso explicou que eram habitualmente vendidos em lojas de artigos de escrita e utilizados no mesmo contexto que os «corta‑papéis» da interveniente, a saber, para a escrita e a leitura, e portanto coincidiam com esse setor de atividades da interveniente. Além disso, todos esses produtos são comummente utilizados na vida comercial para a comunicação de uma empresa com os seus clientes e as suas relações de negócios ou, nomeadamente, oferecidos como brindes de empresa. Na medida em que o material impresso designado pela marca LAGUIOLE é suscetível de gerar, devido ao seu conteúdo, um risco de confusão com a denominação social Forge de Laguiole, a referida marca deve ser anulada. |
104 |
A este respeito, há que observar, primeiro, que, contrariamente ao que concluiu a Câmara de Recurso, a relação dos referidos produtos com os «corta‑papéis» comercializados pela interveniente é demasiado fraca para poder dar lugar a uma semelhança. Com efeito, por um lado, a mera ligação constituída pela identidade parcial dos pontos de venda não é suficiente para tornar os corta‑papéis semelhantes a um conjunto de produtos que fazem sobretudo parte do setor da papelaria, dado que as lojas de artigos de escrita oferecem em geral uma grande variedade de produtos diferentes, que se destinam a um público não especializado. Por outro lado, a utilização dos corta‑papéis comercializados pela interveniente será normalmente limitada à abertura dos envelopes. Isto apenas pode dar lugar a uma fraca relação de semelhança, devido a um uso complementar, com os «envelopes», mas não com os outros produtos citados no n.o 103, supra. Segundo, o simples facto de todos estes produtos serem comummente utilizados na comunicação de uma empresa com os seus clientes e outras relações de negócios ou oferecidos como brindes de empresa não cria nenhuma semelhança com as atividades da interveniente no setor da cutelaria, dado que, em razão do fim a que se destinam, diferem totalmente das referidas atividades. Terceiro, a afirmação da Câmara de Recurso quanto ao risco de confusão suscetível de ser causado pelo material impresso designado pela marca LAGUIOLE será tratada no n.o 165, infra, no âmbito da apreciação global do risco de confusão. |
– Quanto a diferentes produtos qualificados de «artigos de oferta», das classes 14, 18 e 20
105 |
No que diz respeito a «joalharia, bijutaria, pedras preciosas; guarda‑joias em metais preciosos; instrumentos cronométricos, botões de punho, alfinetes de gravatas, alfinete de adereço, porta‑chaves de fantasia; porta‑moedas em metais preciosos; relógios e pulseiras de relógios», da classe 14, a «bengalas; malas de mão; sacos de praia; sacos, estojos e cofres de viagem; carteiras de bolso; porta‑cartões (carteiras de bolso), porta‑documentos; pastas (marroquinaria)», da classe 18, e a «molduras, objetos de arte ou de decoração em madeira, cortiça, cana, junco, vime, chifre, osso, marfim, baleia, tartaruga, âmbar, madrepérola, espuma do mar, sucedâneos de todas estas matérias ou em matérias plásticas», da classe 20, a Câmara de Recurso limitou‑se a constatar que se tratava de «artigos de oferta» muito comummente presentes em todos os tipos de estabelecimentos ou oferecidos como brindes de empresa e a concluir que podiam, portanto, encontrar‑se nos mesmos estabelecimentos onde a interveniente comercializava os seus próprios produtos. |
106 |
A este respeito, há que recordar, por um lado, que a atividade de «fabrico e venda de artigos de oferta» da interveniente faz parte dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole apenas na medida em que se trate de cutelaria ou de talheres (v. n.os 71 a 74, supra). Ora, os produtos referidos no número anterior não estão abrangidos pela cutelaria ou pelos talheres nem estão relacionados com este domínio. Por outro lado, mesmo admitindo que esses produtos sejam vendidos como ofertas na mesma loja com a cutelaria comercializada pela interveniente, esta circunstância não é suscetível de criar uma semelhança entre aqueles e estes últimos, atendendo a que as lojas de ofertas dispõem de uma grande variedade de produtos heteróclitos, uma vez que se dirigem ao grande público. |
– Quanto às «luvas de golfe» e aos «artigos de desporto», pertencentes à classe 28, aos «estojos para charutos», da classe 14, e aos «fósforos, isqueiros para fumadores; charuteiras e cigarreiras não em metais preciosos; corta‑charutos; cachimbos; limpadores de cachimbos», da classe 34
107 |
Quanto às «luvas de golfe» e aos «artigos de desporto», da classe 28, aos «estojos para charutos», da classe 14, e aos «artigos para fumadores; fósforos, isqueiros para fumadores; charuteiras e cigarreiras não em metais preciosos; cachimbos», da classe 34, a Câmara de Recurso considerou que se dirigem à mesma clientela, são adquiridos nos mesmos estabelecimentos comerciais e são utilizados no mesmo contexto que certos «artigos de oferta» desenvolvidos pela interveniente. É o que acontece, por exemplo, com o modelo «Faca do golfista», comercializado pela interveniente, relativamente às «luvas de golfe» ou aos outros «artigos de desporto», ou com o modelo «Calumet» (com limpador, furador e carregador) e o corta‑charutos, comercializados pela interveniente, relativamente ao «estojos para charutos» e aos «fósforos, isqueiros para fumadores, charuteiras e cigarreiras, cachimbos», designados pela marca LAGUIOLE. |
108 |
Basta recordar, a este respeito, que a atividade de «fabrico e venda de artigos de oferta» faz parte dos setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole apenas na medida em que se trate de cutelaria ou de talheres (v. n.os 71 a 74, supra), o que não é o caso dos produtos citados no n.o 107, supra. |
109 |
Todavia, os «corta‑charutos» e «limpadores de cachimbos», da classe 34, apresentam uma semelhança, respetivamente, com o modelo «corta‑charutos» e o modelo «Calumet» (com limpador, furador e carregador), comercializados pela interveniente. Com efeito, embora a comercialização desses modelos, como «derivados» da cutelaria, não possa demonstrar uma diversificação das atividades da interveniente para os «produtos para fumadores» em geral, como foi exposto nos n.os 65 a 68 e 71, supra, a verdade é que, enquanto produtos isolados, são idênticos, do ponto de vista funcional, aos «corta‑charutos» e aos «limpadores de cachimbos» designados pela marca LAGUIOLE. Este facto, além da comercialização nos mesmos estabelecimentos comerciais, é suficiente para concluir por uma forte semelhança. |
110 |
Em contrapartida, as «luvas de golfe», da classe 28, não apresentam semelhanças com o modelo «Faca do golfista» (com extrator de pino) comercializado pela interveniente. É verdade que este último pode ser utilizado em conjunto com as «luvas de golfe» designadas pela marca LAGUIOLE. Todavia, não se trata de uma relação de complementaridade baseada numa semelhança, uma vez que estes produtos podem ser utilizados em separado e são normalmente concebidos independentemente um do outro, e não em função de critérios decorrentes de uma utilização conjunta — contrariamente ao que poderia ser considerado, a título de exemplo, para as luvas de golfe relativamente a tacos de golfe. |
– Quanto aos serviços da classe 38
111 |
No que se refere aos serviços em matéria de «telecomunicações» e de setores conexos, da classe 38, a Câmara de Recurso considerou, no n.o 114 da decisão impugnada, que não apresentavam nenhuma semelhança com as atividades da interveniente. Esta conclusão, favorável ao recorrente e não contestada pela interveniente, na realidade, não faz parte do objeto do presente litígio, pelo que não é necessário o Tribunal Geral examiná‑la. |
– Conclusão sobre a semelhança entre os setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole e pela marca LAGUIOLE
112 |
Em conclusão, importa observar, primeiro, uma identidade, relativamente aos setores abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole, para as «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente» e as «colheres», da classe 8, bem como um grau de semelhança elevado, relativamente às atividades da interveniente, para as «serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas», da classe 8, os «corta‑papéis», da classe 16, os «saca‑rolhas; abre‑garrafas», da classe 21, e os «corta‑charutos» e «limpadores de cachimbo», da classe 34. |
113 |
Segundo, existe uma semelhança média, relativamente aos setores abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole, para os «estojos de barbear, estojos de manicura», abrangidos pela classe 8, e para os «pincéis para a barba, estojos de toilette», da classe 21. |
114 |
Terceiro, existe uma semelhança fraca, relativamente aos setores abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole, para os «envelopes», da classe 16. |
115 |
Por fim, há que concluir pela inexistência de semelhança, relativamente aos setores abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole, para todos os outros produtos e serviços designados pela marca LAGUIOLE. |
Quanto à semelhança dos sinais em conflito
116 |
A Câmara de Recurso considerou que o termo «laguiole», embora descritivo e, portanto, não distintivo para as facas, como foi declarado pela cour d’appel de Paris no seu acórdão de 3 de novembro de 1999 (G.T.I.‑G.I.L. Technologies internationales/Commune de Laguiole et Association Le couteau de Laguiole), era, não obstante, o elemento dominante, ou, pelo menos, codominante, da denominação social Forge de Laguiole, mesmo quando esta última era utilizada em facas. Por conseguinte, segundo aquele tribunal, numa apreciação global, os sinais em conflito apresentavam uma certa semelhança fonética, visual e conceptual, que não podia ser contrabalançada pelo mero aditamento da expressão genérica «forge de». |
117 |
O recorrente alega, no essencial, que os sinais em conflito apresentam diferenças visuais, fonéticas e conceptuais. |
118 |
O IHMI sustenta que o termo «laguiole» é dominante na denominação social Forge de Laguiole, apesar do seu caráter genérico. Dado que a marca LAGUIOLE está integralmente reproduzida na referida denominação social, o grau de semelhança entre os dois sinais é elevado. |
119 |
A interveniente sustenta que os sinais em conflito apresentam parecenças nos planos visual, fonético e conceptual. |
120 |
A título preliminar, importa examinar se, tal como a Câmara de Recurso considerou, seguida neste aspeto pelo IHMI e a interveniente, o termo «laguiole» constitui o elemento dominante da denominação social Forge de Laguiole, apesar do seu caráter descritivo, ou até genérico, para as facas, conforme foi declarado pela cour d’appel de Paris no seu acórdão de 3 de novembro de 1999 (n.o 116, supra), bem como o seu caráter descritivo do lugar de estabelecimento e de produção da interveniente. |
121 |
Em primeiro lugar, é verdade, como a Câmara de Recurso afirma no n.o 119 da decisão impugnada, que o caráter descritivo e não distintivo do termo «laguiole» para facas não implica necessariamente que esse termo seja igualmente descritivo e não distintivo para produtos diferentes das facas. |
122 |
Importa recordar, a este respeito, que a presente análise do risco de confusão diz exclusivamente respeito às atividades de fabrico e de venda de cutelaria e talheres, bem como de prendas e lembranças, na medida em que se trate de cutelaria ou de talheres (v. n.o 74, supra). Com efeito, as atividades da interveniente efetivamente exercidas concentram‑se quase exclusivamente no domínio da cutelaria, incluindo certos artigos com outras funções, para além da função de faca, e a comercialização de outros produtos — em especial, talheres — permanece acessória, ou mesmo marginal. É o que resulta tanto de uma análise dos produtos que figuram na lista de preços da interveniente de1 de janeiro de 2001 como da leitura de vários artigos de imprensa que figuram no «press‑book» editado pela interveniente — na medida em que se referem claramente ao período anterior a 20 de novembro de 2001 —, nos quais a interveniente se apresenta sistematicamente como uma cutelaria especializada no fabrico de facas de tipo «Laguiole», sem que a exploração de outras atividades seja mencionada. Embora seja verdade que alguns desses artigos evocam intenções de diversificação das atividades por parte dos dirigentes da interveniente, esta última não demonstrou, como foi acima sublinhado, que tais intenções tenham sido postas em prática até 20 de novembro de 2001. |
123 |
Nestas condições, há que concluir que o termo «Laguiole» apresenta caráter descritivo, ou até genérico, relativamente à totalidade das atividades da interveniente, pertinentes para efeitos da apreciação do risco de confusão. |
124 |
Em segundo lugar, há que concordar com a Câmara de Recurso quando recordou que um elemento descritivo de um sinal podia, todavia, constituir o seu elemento dominante ou codominante, se, por exemplo, os outros elementos fossem igualmente descritivos ou parecessem ser tão fracos ou ainda mais fracos. A este respeito, é verdade que o elemento «Forge de» apresenta caráter descritivo relativamente às atividades nos setores da cutelaria e dos talheres exercidas pela interveniente. Todavia, contrariamente ao que considerou a Câmara de Recurso, este elemento não está «semanticamente subordinado ao nome ‘Laguiole’, que identifica a forja específica em causa». Com efeito, o elemento descritivo do lugar — e das atividades exercidas — não é preponderante relativamente ao elemento descritivo da natureza do estabelecimento. Nestas circunstâncias, não é possível identificar um elemento dominante na denominação social Forge de Laguiole, inteiramente composta por elementos de natureza descritiva, ou mesmo genérica, relativamente às atividades e/ou ao lugar de estabelecimento da interveniente. |
125 |
Em terceiro lugar, no que toca à comparação visual, a denominação social Forge de Laguiole é composta por três palavras que formam um conjunto de quinze letras, ao passo que a marca LAGUIOLE só tem oito letras. É certo que o elemento «laguiole» está presente em cada um dos sinais em conflito; contudo, encontra‑se no fim da referida denominação social, de modo que o elemento controvertido «forge de» atenua a impressão visual criada por esta identidade parcial. Por esta razão, importa concluir pela existência de uma semelhança visual média dos sinais em conflito. |
126 |
Em quarto lugar, no plano fonético, há que referir que a denominação social Forge de Laguiole tem cinco ou mesmo seis sílabas, enquanto a marca LAGUIOLE tem duas, ou mesmo três, em função da pronúncia do termo «laguiole». No que respeita à incidência da identidade parcial dos sinais em conflito, as considerações relativas à semelhança visual aplicam‑se mutantis mutandis e, por conseguinte, deve concluir‑se pela existência de uma semelhança fonética média. |
127 |
Em quinto lugar, quanto à comparação conceptual, a denominação social Forge de Laguiole evoca uma oficina situada no município de Laguiole (França), como o recorrente alegou com razão, mas também, e simultaneamente, uma oficina onde se fabricam facas de tipo Laguiole. A marca LAGUIOLE, por seu turno, evoca tanto o dito município como a faca de tipo Laguiole. Assim, a Câmara de Recurso concluiu, acertadamente, que, na medida em que os sinais em conflito faziam referência aos mesmos conceitos, a saber, a cidade ou a faca, eram semelhantes no plano conceptual. O Tribunal Geral considera mesmo que o grau de semelhança conceptual deve ser qualificado de elevado. |
Quanto ao elevado caráter distintivo da denominação social Forge de Laguiole, em razão do seu conhecimento pelo público
128 |
A Câmara de Recurso considerou, no n.o 130 da decisão impugnada, que a denominação social Forge de Laguiole possuía um forte poder distintivo em razão do prestígio, ou mesmo da reputação, de que gozava a interveniente em França e no estrangeiro devido à qualidade das suas facas. |
129 |
O recorrente considera que nada nos autos demonstra a alegada notoriedade da denominação social Forge de Laguiole, e que é a faca de tipo Laguiole que goza de reputação, e não a denominação «Forge de Laguiole». |
130 |
O IHMI sustenta que a denominação social Forge de Laguiole adquiriu reputação no domínio da cutelaria, e a interveniente afirma que goza de grande notoriedade em França e no estrangeiro. |
131 |
A título preliminar, importa recordar que o direito das marcas francês é regulado pelas diretivas que harmonizam as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas [Primeira Diretiva 89/104/CEE do Conselho, de 21 de dezembro de 1988, que harmoniza as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO 1989, L 40, p. 1), substituída pela Diretiva 2008/95/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 22 de outubro de 2008, que aproxima as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas (JO L 299, p. 25)]. Por conseguinte, o princípio segundo o qual o risco de confusão é tanto maior quanto mais importante for o caráter distintivo da marca anterior e segundo o qual, portanto, as marcas que tenham um elevado caráter distintivo, por exemplo, devido ao conhecimento que delas tem o público, gozam de uma proteção mais ampla do que aquelas cujo caráter distintivo é menor (acórdãos do Tribunal de Justiça de 11 de novembro de 1997, SABEL, C-251/95, Colet., p. I-6191, n.o 24; de 29 de setembro de 1998, Canon, C-39/97, Colet., p. I-5507, n.o 18; e de 22 de junho de 1999, Lloyd Schuhfabrik Meyer, C-342/97, Colet., p. I-3819, n.o 20) é igualmente aplicável em direito francês das marcas. Como resulta da jurisprudência referida no n.o 79, supra, este princípio é igualmente aplicável em direito francês, quando se trata de apreciar o risco de confusão com uma denominação social, e isto desde a entrada em vigor das diretivas que harmonizam as legislações dos Estados‑Membros em matéria de marcas. |
132 |
Assim, há que considerar que a existência de um caráter distintivo superior ao normal, em razão do conhecimento que o público tem de uma denominação social no mercado, pressupõe necessariamente que esta denominação social seja conhecida, no mínimo, por uma parte significativa do público em causa, não sendo necessário que goze de prestígio na aceção do artigo 8.o, n.o 5, do Regulamento n.o 207/2009. Não é possível estabelecer de forma geral, por exemplo, através do recurso a percentagens determinadas sobre o grau de conhecimento que o público tem da denominação social nos meios em causa, que ela tem um caráter distintivo elevado. Há, porém, que reconhecer uma certa interdependência entre o conhecimento de uma denominação social pelo público e o caráter distintivo dessa denominação, no sentido de que quanto mais a denominação social for conhecida do público‑alvo mais reforçado é o seu caráter distintivo. Para apreciar se uma denominação social goza de elevado caráter distintivo em razão do conhecimento que dela tem o público, devem tomar‑se em consideração todos os elementos pertinentes do processo, a saber, designadamente, a quota de mercado detida pela sociedade em causa, a intensidade, o alcance geográfico e a duração do uso dessa marca, a importância dos investimentos realizados pela empresa para a promover, a proporção dos meios interessados que identifica os produtos ou os serviços como provenientes de uma empresa determinada graças à denominação social, bem como as declarações das câmaras de comércio e de indústria ou de outras associações profissionais (v., por analogia, acórdão VITACOAT, referido no n.o 23, supra, n.os 34 e 35 e jurisprudência aí referida). |
133 |
Nestas condições, para demonstrar, no caso em apreço, o conhecimento da denominação social Forge de Laguiole pelo público, é necessário provar que uma parte substancial do público pertinente — a saber, o consumidor médio francês — conhece a referida denominação social. |
134 |
Para concluir pela existência do forte poder distintivo da denominação social Forge de Laguiole, em razão do prestígio e da reputação de que a interveniente gozava alegadamente em França, a Câmara de Recurso baseou‑se nos elementos do dossiê que lhe foram submetidos, expostos nos n.os 63 a 66 da decisão impugnada. |
135 |
Trata‑se, em primeiro lugar, de um artigo publicado numa revista económica francesa, em outubro de 2004, e intitulado «Laguiole — Une production traditionnelle devenue tendance». |
136 |
A este respeito, basta recordar que o momento relevante para a apreciação do conhecimento da denominação social Forge de Laguiole pelo público é a data da apresentação do pedido da marca LAGUIOLE, a saber, 20 de novembro de 2001. Ora, o artigo em causa, que data de 2004, não contém qualquer informação que permita demonstrar que a referida denominação social beneficiava de um conhecimento particular pelo público antes da data de 20 de novembro de 2001. |
137 |
Em segundo lugar, a Câmara de Recurso faz referência a uma carta de 9 de março de 1999, erradamente identificada como datando de 20 de março de 1999. Nessa carta, o gerente da interveniente confirma um «acordo de realização de um novo molde que permita aumentar a produção e melhorar a qualidade das peças», precisando as condições financeiras. |
138 |
Por um lado, há que observar que o destinatário da carta de 9 de março de 1999 não está claramente identificado. Por outro lado, na medida em que a Câmara de Recurso fez referência a essa carta para fundamentar a sua afirmação segundo a qual a interveniente tinha iniciado uma colaboração com um restaurador conhecido, há que constatar que na referida carta apenas figura a menção de uma reunião «em presença dos Senhores [B. e C.]», o que não basta para identificar o restaurador em questão nem para atestar a sua colaboração efetiva com a interveniente ou a forma dessa colaboração. |
139 |
Por conseguinte, a carta de 9 de março de 1999 não pode servir para demonstrar, de forma indireta, o conhecimento da denominação social Forge de Laguiole pelo público. |
140 |
Em terceiro lugar, a Câmara de Recurso afirma, no n.o 65 da decisão impugnada, que os produtos da interveniente receberam inúmeros prémios e distinções a nível europeu e a nível internacional em 1992 e 1996. Em resposta a uma questão escrita do Tribunal Geral, o IHMI indicou que a Câmara de Recurso se tinha baseado, a este respeito, nas menções que constam do artigo mencionado no n.o 135, supra, numa apresentação da «estratégia da criação» da interveniente, retirada em 2005 do seu sítio Internet (p. 234 do dossiê de processo no IHMI), e noutras publicações relativas à interveniente (p. 169 do dossiê de processo no IHMI). |
141 |
A página 169 do dossiê de processo no IHMI contém um excerto de um artigo não datado, em italiano, que menciona que a faca concebida por um criador célebre faz parte da coleção de design do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MoMA) e que o modelo «Sommelier» recebeu o prémio «Design plus» da exposição «Ambiente» de Francoforte, em 1996. |
142 |
A lista mais completa dos prémios e distinções encontra‑se no extrato do sítio Internet que figura na página 234 do dossiê de processo no IHMI, que menciona, para além da faca em exibição no MoMA e o prémio «Design plus» de 1996, o «Grand prix français de l’objet design» em 1991 (sem indicar claramente o objeto ao qual tinha sido atribuído), o «Blade Magazine Award» 1992, para um modelo criado por um arquiteto conhecido, e o Prémio Europeu de Design 1992, «pela atividade criativa» da interveniente, todos igualmente citados na decisão impugnada. |
143 |
O Tribunal Geral considera que esses prémios e distinções constituem um indício do conhecimento dos produtos da interveniente pelo público e, portanto, da sua denominação social, uma vez que a atribuição de prémios e distinções a uma empresa pelos seus produtos é suscetível de chamar a atenção do grande público para essa empresa. Todavia, importa igualmente ter em conta o facto de a publicidade gerada por tais prémios estar limitada a um público particularmente interessado em design e de o seu impacto no grande público francês, o único pertinente no caso em apreço (v. n.o 77, supra), ser limitado. Esta observação vale, por maioria de razão, para o «Blade Magazine Award», atribuído por uma revista especializada nos Estados Unidos e que apenas será conhecido por consumidores franceses especialmente interessados na coleção de facas. |
144 |
Em quarto lugar, a Câmara de Recurso remete para o «catálogo» que figura no «documento 21» apresentado pela interveniente no IHMI, como prova do facto de que a interveniente envidou continuamente esforços para se diferenciar pela qualidade e imagem dos seus produtos, designadamente através da contratação de pessoal altamente qualificado e da colaboração com desenhadores e criadores prestigiados. O referido documento faz, de facto, menção a modelos desenhados por ou criados em cooperação com dois parceiros conhecidos. |
145 |
Ora, resulta dos autos e da resposta da interveniente a uma questão escrita do Tribunal Geral que o «documento 21» agrupa de facto três documentos diferentes, a saber, um prospeto divulgado a partir de 1997, um documento promocional divulgado a partir de 2004 e um catálogo divulgado em 2000. |
146 |
Na medida em que apenas se encontra uma referência a um restaurador conhecido no documento promocional de 2004 e não nos outros dois documentos, essa referência não pode servir para demonstrar a existência de uma colaboração com ele, em 20 de novembro de 2001. |
147 |
Em contrapartida, as referências a um criador célebre podem ser encontradas no catálogo de 2000, que atesta, portanto, uma colaboração com ele, antes de 20 de novembro de 2001. Por outro lado, resulta dos elementos examinados no n.o 142, supra, que, antes desta data, houve colaboração com um conhecido arquiteto. |
148 |
Deve considerar‑se que esta colaboração com parceiros que dispõem pessoalmente de um certo prestígio e de reputação são suscetíveis de fazer com que a interveniente e a sua denominação social, sob a qual estes produtos são comercializados, beneficiem da atenção, pelo menos, da parte do público que conhece os parceiros em causa. No entanto, esta circunstância não basta para demonstrar que a referida denominação social era conhecida do grande público em geral. |
149 |
Em quinto lugar, a Câmara de Recurso cita um artigo publicado numa revista francesa, em dezembro de 1999, intitulado «Péril sur le mythe du couteau Laguiole». |
150 |
A Câmara de Recurso considerou que esse artigo era «particularmente ilustrativo da reputação adquirida pela denominação [social] Forge de Laguiole antes do depósito [da marca LAGUIOLE]», uma vez que nele se aconselhava a confiar na marca para escolher uma faca Laguiole. O artigo refere em seguida três «marcas» como sendo as mais reputadas, entre as quais a denominação social da interveniente, fazendo depois um breve resumo da sua história e do seu desenvolvimento. |
151 |
Importa referir que este artigo constitui, é certo, um indício do conhecimento da denominação social Forge de Laguiole pelo público, mas não é suficiente, por si só, para o demonstrar. Com efeito, há que ter em conta o facto de que o artigo se limita a citar a interveniente, juntamente com dois outros produtores, como sendo mais reputada do que outros. No entanto, esta opinião emitida pelo autor do artigo não permite, sem mais, tirar conclusões sobre o grau de conhecimento da referida denominação social pelo grande público, na falta, nomeadamente, de indicações sobre a tiragem e a distribuição da revista em que foi publicado. |
152 |
Em sexto lugar, a Câmara de Recurso cita um artigo publicado numa revista francesa gratuita, em fevereiro de 1999, intitulado «L’Aveyron: un terroir en ébulition», no qual se afirma que «a Laguiole, made in Laguiole, cujo mercado foi multiplicado por vinte, começa a forjar uma boa reputação no estrangeiro». |
153 |
Refira‑se, a este respeito, primeiro, que a frase em causa, citada de forma incompleta pela Câmara de Recurso, está, na realidade, formulada como segue: «A Laguiole ‘made in Laguiole’, cujo mercado foi multiplicado por vinte com o aparecimento de pequenas oficinas locais, começa a forjar uma boa reputação no estrangeiro». Daqui decorre que, embora a interveniente seja expressamente apresentada neste artigo, a frase citada pela Câmara de Recurso diz respeito, no entanto, à totalidade da produção de facas no município de Laguiole e não apenas aos produtos da interveniente. Segundo, a frase em causa diz respeito à reputação no estrangeiro das facas fabricadas no referido município, e não ao conhecimento da denominação social Laguiole Forge pelo público francês, único pertinente no caso em apreço (v. n.o 133, supra). |
154 |
Nestas condições, há que concluir que o artigo em causa constitui sobretudo um indício da reputação das facas de tipo Laguiole, fabricadas in loco — convém ainda ter em conta o facto, referido pela jurisprudência citada no n.o 116, supra, de que as facas deste tipo são igualmente fabricadas, desde longa data e de maneira tradicional, no município de Thiers (França) — e, em menor medida, da denominação social Forge de Laguiole. |
155 |
Em conclusão, os documentos salientados pela Câmara de Recurso revelam, é certo, determinados esforços publicitários e de comunicação desenvolvidos pela interveniente para se dar a conhecer junto do grande público francês e para se demarcar das suas concorrentes através de uma imagem de qualidade ou de luxo. Dado que esses esforços se mantiveram ao longo de vários anos, não está excluído que a denominação social Forge de Laguiole possa ter adquirido um certo conhecimento junto do público, no domínio das facas de tipo Laguiole. |
156 |
No entanto, há que ter igualmente em conta que alguns dos elementos em que a Câmara de Recurso se baseou dizem sobretudo respeito às facas de tipo Laguiole em geral, e não tanto à denominação social da interveniente. |
157 |
Por outro lado, os artigos de imprensa que a Câmara de Recurso referiu como indícios do conhecimento da denominação social Laguiole pelo público são retirados dos meios de comunicação social especializados — como o artigo mencionado no n.o 135, supra, que se dirige a profissionais da gestão de empresa, e a «Blade Magazine», que se dirige essencialmente a colecionadores de facas americanos — ou de meios de comunicação social cujo alcance de difusão não está demonstrado — como o artigo mencionado no n.o 149, supra —, ou ainda de revistas de caráter essencialmente publicitário que, por este facto, são menos suscetíveis de reter a atenção do leitor — como o artigo mencionado no n.o 152, supra. Esta circunstância distingue, de resto, o presente processo daquele em que foi proferido o acórdão do Tribunal Geral de 16 de dezembro de 2010, Rubinstein e L’Oréal/IHMI — Allergan (BOTOLIST e BOTOCYL), T‑345/08 e T‑357/08, não publicado na Coletânea, invocado pelo IHMI no âmbito da sua resposta às questões escritas do Tribunal Geral. Com efeito, embora seja verdade que, nos n.os 50 a 53 desse acórdão, o Tribunal Geral se baseou em artigos de imprensa para estabelecer a existência de uma vasta cobertura mediática do produto em causa, o facto é que se tratava de meios de comunicação de grande difusão e que beneficiam de uma reputação à escala internacional. |
158 |
Assim, embora os elementos tidos em conta pela Câmara de Recurso constituam seguramente indícios de um certo conhecimento da denominação social Forge de Laguiole pelo público, não são suficientes para demonstrá‑lo com certeza. Cabe salientar, a este respeito, que, no fim de contas, o esforço publicitário da interveniente para aumentar a sua notoriedade junto do público não é o elemento determinante, mas sim o conhecimento efetivo do público que resulta desse esforço, medido através dos critérios enunciados pela jurisprudência VITACOAT, referida no n.o 132, supra. |
159 |
Ora, a decisão impugnada não contém indicações que demonstrem a existência destes critérios no caso em apreço, em especial, quanto à parte do público francês que tem conhecimento da denominação social Forge de Laguiole, quanto à quota detida pela interveniente no mercado da cutelaria em geral ou no mercado, mais restrito, das facas de tipo Laguiole, quanto à importância dos investimentos realizados pela interveniente para promover o conhecimento da sua denominação social junto do público, quanto à proporção dos meios interessados que identifica os produtos ou os serviços como provenientes da interveniente graças à sua denominação social ou quanto a declarações das câmaras de comércio e de indústria ou de outras associações profissionais independentes da interveniente. Essas indicações também não resultam dos outros documentos dos autos nem, em particular, dos elementos apresentados pela interveniente. |
160 |
Nestas circunstâncias, a Câmara de Recurso não teve razão em considerar que, em 20 de novembro de 2001, a denominação social Forge de Laguiole tinha adquirido, para as facas, um caráter distintivo superior à norma devido ao conhecimento que dela tinha o público francês. |
Conclusão quanto ao risco de confusão
161 |
Em conclusão, os sinais em conflito apresentam uma certa semelhança nos planos visual e fonético e uma semelhança elevada ao nível conceptual. Importa ter em conta o facto de que a denominação social Forge de Laguiole apresenta um fraco caráter distintivo intrínseco, visto que é composta exclusivamente por elementos descritivos das atividades da interveniente. Este fraco caráter distintivo não é contrabalançado com um conhecimento adquirido junto do público em causa. |
162 |
Tendo em conta a identidade, relativamente às atividades da interveniente, das «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente» e das «colheres», da classe 8, bem como o elevado grau de semelhança, relativamente às atividades da interveniente, das «serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas», da classe 8, dos «corta‑papéis», da classe 16, dos «saca‑rolhas; abre‑garrafas», da classe 21, e dos «corta‑charutos» e «limpadores de cachimbos», da classe 34, designados pela marca LAGUIOLE, há que concluir que existe um risco de confusão entre esta última e a denominação social Forge de Laguiole, uma vez que o público visado pode pensar que esses produtos têm a mesma origem comercial que a cutelaria e os talheres comercializados pela interveniente. |
163 |
De igual modo, tendo em conta o grau médio de semelhança, relativamente às atividades da interveniente, dos «estojos de barbear, estojos de manicura», da classe 8, e dos «pincéis para a barba, estojos de toilette», da classe 21, designados pela marca LAGUIOLE, há que concluir que existe um risco de confusão entre esta última e a denominação social Forge de Laguiole, uma vez que o público visado pode pensar que esses produtos têm a mesma origem comercial que a cutelaria e os talheres comercializados pela interveniente. |
164 |
Em contrapartida, dado o fraco grau de semelhança, relativamente às atividades da interveniente, dos «envelopes», da classe 16, designados pela marca LAGUIOLE, há que concluir que não existe risco de confusão a esse respeito, uma vez que o público em causa não pensará que estes produtos possam ter a mesma origem comercial que a cutelaria ou os talheres comercializados pela interveniente. |
165 |
Do mesmo modo, dada a inexistência de semelhança, relativamente às atividades da interveniente, de todos os outros produtos e serviços designados pela marca LAGUIOLE, há que concluir que não existe nenhum risco de confusão a esse respeito. Em particular, a Câmara de Recurso não teve razão ao declarar, no n.o 111 da decisão impugnada, que o material impresso (álbuns, livros, almanaques, brochuras, catálogos, calendários, litografias, cartazes, incluídos na classe 16), designado pela referida marca, era suscetível de gerar, «em razão do seu conteúdo», um risco de confusão com a denominação social Forge de Laguiole. Com efeito, não se vislumbra de que modo o «material impresso» designado por essa marca, qualquer que seja a sua natureza e o seu conteúdo, poderia criar a impressão, junto do público interessado, de ter a mesma origem comercial que a cutelaria e os talheres comercializados pela interveniente, a não ser no caso de esse material impresso dizer especificamente respeito aos produtos da interveniente. Ora, tal situação específica e excecional não pode gerar um risco de confusão em relação a toda uma categoria de produtos. Em alternativa, dever‑se‑ia considerar que a designação de «material impresso» por uma marca que apresenta semelhanças com outra apresenta um risco de confusão em relação a qualquer produto designado por essa outra marca. |
166 |
Decorre daqui que se deve julgar procedente o fundamento único e anular a decisão impugnada na medida em que a Câmara de Recurso concluiu pela existência de um risco de confusão entre a denominação social Forge de Laguiole e a marca LAGUIOLE, relativamente aos produtos diferentes de «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente; colheres; serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; estojos de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas; estojos de manicura», da classe 8, «corta‑papéis», da classe 16, «saca‑rolhas; abre‑garrafas» e «pinceis para a barba, estojos de toilette», da classe 21, e «corta‑charutos» e «limpadores de cachimbos», da classe 34. |
167 |
Quanto ao mais, há que negar provimento ao recurso. |
Quanto às despesas
168 |
Nos termos do disposto no artigo 87.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Por outro lado, nos termos do n.o 3, primeiro parágrafo, do mesmo artigo, o Tribunal Geral pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes, se cada parte obtiver vencimento parcial. |
169 |
No caso em apreço, o IHMI e a interveniente foram vencidas parcialmente, na medida em que há que anular parcialmente a decisão impugnada, em conformidade com os pedidos do recorrente. Contudo, o recorrente não pediu a condenação do IHMI nas despesas, mas sim da interveniente. |
170 |
Nestas circunstâncias, há que condenar a interveniente a suportar um quarto das despesas do recorrente, bem como três quartos das suas próprias despesas. O recorrente suportará um quarto das despesas respetivas da interveniente e do IHMI, bem como três quartos das suas próprias despesas. Por último, o IHMI suportará três quartos das suas próprias despesas. |
Pelos fundamentos expostos, O TRIBUNAL GERAL (Primeira Secção) decide: |
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Kanninen Pelikánová Buttigieg Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 21 de outubro de 2014. Assinaturas |
Índice
Antecedentes do litígio |
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Pedidos das partes |
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Questão de direito |
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1. Quanto aos documentos apresentados pela primeira vez no Tribunal Geral |
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2. Quanto ao mérito |
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Quanto ao alcance da proteção conferida pela denominação social Forge de Laguiole |
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Quanto às atividades efetivamente exercidas pela interveniente antes da data de depósito da marca LAGUIOLE |
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Quanto ao risco de confusão |
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Quanto à semelhança entre os setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole e pela marca LAGUIOLE |
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— Quanto à relação entre as «serras, máquinas de barbear, lâminas para máquinas de barbear; limas e alicates para as unhas, corta‑unhas», bem como «estojos de barbear; estojos de manicura», pertencentes à classe 8, «corta‑papéis», da classe 16, e «pincéis para a barba; estojos de toilette», da classe 21, e as atividades da interveniente |
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— Quanto a «ferramentas e instrumentos manuais conduzidos manualmente» e a «chaves de fendas», da classe 8 |
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— Quanto às «colheres», da classe 8 |
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— Quanto aos «utensílios para cozinha e loiça em vidro, porcelana e faiança; loiça não em metais preciosos; saca‑rolhas; abre‑garrafas, caixas metálicas para a distribuição de guardanapos de papel; ampulhetas», da classe 21, e aos «utensílios e recipientes para uso doméstico e para cozinha em metais preciosos; baixela em metais preciosos», da classe 14 |
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— Quanto aos «metais preciosos e suas ligas», às «pedras preciosas» e às «caixas, palmatórias para velas», da classe 14 |
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— Quanto ao «couro e imitações de couro» e a «malas de viagem, maletas e sacos de viagem», da classe 18, bem como a «caixas» |
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— Quanto ao «material escolar; lápis, porta‑minas, borrachas para apagar; sobrescritos; arquivadores; álbuns, livros periódicos; almanaques, brochuras, cadernos, catálogos; calendários, litografias, cartazes», da classe 16 |
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— Quanto a diferentes produtos qualificados de «artigos de oferta», das classes 14, 18 e 20 |
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— Quanto às «luvas de golfe» e aos «artigos de desporto», pertencentes à classe 28, aos «estojos para charutos», da classe 14, e aos «fósforos, isqueiros para fumadores; charuteiras e cigarreiras não em metais preciosos; corta‑charutos; cachimbos; limpadores de cachimbos», da classe 34 |
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— Quanto aos serviços da classe 38 |
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— Conclusão sobre a semelhança entre os setores económicos abrangidos pela denominação social Forge de Laguiole e pela marca LAGUIOLE |
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Quanto à semelhança dos sinais em conflito |
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Quanto ao elevado caráter distintivo da denominação social Forge de Laguiole, em razão do seu conhecimento pelo público |
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Conclusão quanto ao risco de confusão |
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Quanto às despesas |
( *1 ) Língua do processo: francês.