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Document 62009CJ0173
Judgment of the Court (Grand Chamber) of 5 October 2010.#Georgi Ivanov Elchinov v Natsionalna zdravnoosiguritelna kasa.#Reference for a preliminary ruling: Administrativen sad Sofia-grad - Bulgaria.#Social security - Freedom to provide services - Sickness insurance - Hospital treatment provided in another Member State - Prior authorisation - Conditions of application of the second subparagraph of Article 22(2) of Regulation (EEC) No 1408/71 - Methods of reimbursement to the insured person of hospital expenses incurred in another Member State - Obligation on a lower court to comply with the directions of a higher court.#Case C-173/09.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 5 de Outubro de 2010.
Georgi Ivanov Elchinov contra Natsionalna zdravnoosiguritelna kasa.
Pedido de decisão prejudicial: Administrativen sad Sofia-grad - Bulgária.
Segurança social - Livre prestação de serviços - Seguro de doença - Cuidados hospitalares dispensados noutro Estado-Membro - Autorização prévia - Condições de aplicação do artigo 22.º, n.º 2, segundo parágrafo, do Regulamento (CEE) n.º 1408/71 - Modalidades de reembolso ao segurado das despesas hospitalares incorridas noutro Estado-Membro - Obrigação para um órgão jurisdicional inferior de acatar as instruções de um órgão jurisdicional superior.
Processo C-173/09.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 5 de Outubro de 2010.
Georgi Ivanov Elchinov contra Natsionalna zdravnoosiguritelna kasa.
Pedido de decisão prejudicial: Administrativen sad Sofia-grad - Bulgária.
Segurança social - Livre prestação de serviços - Seguro de doença - Cuidados hospitalares dispensados noutro Estado-Membro - Autorização prévia - Condições de aplicação do artigo 22.º, n.º 2, segundo parágrafo, do Regulamento (CEE) n.º 1408/71 - Modalidades de reembolso ao segurado das despesas hospitalares incorridas noutro Estado-Membro - Obrigação para um órgão jurisdicional inferior de acatar as instruções de um órgão jurisdicional superior.
Processo C-173/09.
Colectânea de Jurisprudência 2010 I-08889
ECLI identifier: ECLI:EU:C:2010:581
Processo C‑173/09
Georgi Ivanov Elchinov
contra
Natsionalna zdravnoosiguritelna kasa
(pedido de decisão prejudicial apresentado pelo
Administrativen sad Sofia‑grad)
«Segurança social – Livre prestação de serviços – Seguro de doença – Cuidados hospitalares dispensados noutro Estado‑Membro – Autorização prévia – Condições de aplicação do artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento (CEE) n.° 1408/71 – Modalidades de reembolso ao segurado das despesas hospitalares incorridas noutro Estado‑Membro – Obrigação para um órgão jurisdicional inferior de acatar as instruções de um órgão jurisdicional superior»
Sumário do acórdão
1. Direito da União – Primado – Direito nacional contrário – Inaplicabilidade de pleno direito das normas existentes – Obrigação de acatar as instruções de um órgão jurisdicional superior não conformes com o Direito da União – Inadmissibilidade
(Artigo 267.° TFUE)
2. Segurança social dos trabalhadores migrantes – Seguro de doença – Prestações em espécie fornecidas noutro Estado‑Membro
(Artigo 49.° CE; Regulamento n.° 1408/71 do Conselho, artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo)
3. Segurança social dos trabalhadores migrantes – Seguro de doença – Prestações em espécie fornecidas noutro Estado‑Membro
[Regulamento n.° 1408/71 do Conselho, artigos 22.°, n.° 1, alínea c), i), e 2, segundo parágrafo]
4. Segurança social dos trabalhadores migrantes – Seguro de doença – Prestações em espécie fornecidas noutro Estado‑Membro
[Regulamento n.° 1408/71 do Conselho, artigo 22.°, n.° 1, alínea c), i)]
1. O direito da União opõe‑se a que um órgão jurisdicional nacional, ao qual compete julgar um processo que lhe foi remetido por um órgão jurisdicional superior que decidiu em sede de recurso, esteja vinculado, de acordo com o direito processual nacional, pelas apreciações de direito feitas pelo órgão jurisdicional superior, se o órgão jurisdicional de reenvio considerar, atendendo à interpretação que solicitou do Tribunal de Justiça, que as referidas apreciações não são conformes com o direito da União.
Com efeito, em primeiro lugar, a existência de uma regra processual nacional, nos termos da qual os órgãos jurisdicionais que não decidem em última instância estão vinculados por apreciações feitas pelo órgão jurisdicional superior, não pode pôr em causa a faculdade de que dispõem os órgãos jurisdicionais nacionais que não decidem em última instância de submeter ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial quando têm dúvidas sobre a interpretação do direito da União.
Em segundo lugar, um acórdão proferido a título prejudicial pelo Tribunal de Justiça vincula o juiz nacional, quanto à interpretação ou à validade dos actos das instituições da União em causa, para a solução do litígio no processo principal.
Além disso, o juiz nacional encarregado de aplicar, no âmbito da sua competência, as disposições do direito da União tem a obrigação de garantir a plena eficácia dessas disposições, não aplicando, se necessário e pela sua própria autoridade, qualquer disposição contrária da legislação nacional, sem que tenha de pedir ou de esperar a sua revogação prévia por via legislativa ou por qualquer outro procedimento constitucional.
(cf. n.os 25, 29, 31, 32, disp. 1)
2. Os artigos 49.° CE e 22.° do Regulamento n.° 1408/71, na sua versão alterada e actualizada pelo Regulamento n.° 118/97, conforme alterado pelo Regulamento n.° 1992/2006, opõem‑se a uma legislação de um Estado‑Membro interpretada no sentido de que exclui, em todos os casos, a assunção dos cuidados hospitalares dispensados sem autorização prévia noutro Estado‑Membro.
Com efeito, embora o direito da União não se oponha, em princípio, a um sistema de autorização prévia, é contudo necessário, por um lado, que as condições estabelecidas para a concessão dessa autorização sejam justificadas à luz do objectivo de garantir, no território do Estado‑Membro em causa, uma acessibilidade suficiente e permanente a uma gama equilibrada de cuidados hospitalares de qualidade de evitar, na medida do possível, qualquer desperdício de recursos financeiros, técnicos e humanos. Por outro lado, é necessário que essas condições não excedam o que é objectivamente necessário a esse fim e que o mesmo resultado não possa ser obtido por regras menos restritivas. Um sistema desse tipo deve, além disso, ser fundamentado em critérios objectivos, não discriminatórios e conhecidos antecipadamente, de modo a enquadrar o exercício do poder de apreciação das autoridades nacionais, a fim de este não ser utilizado de modo arbitrário.
Uma legislação nacional que exclui em todos os casos a assunção dos cuidados hospitalares dispensados sem autorização prévia priva o beneficiário da segurança social, que, por razões ligadas ao seu estado de saúde ou à necessidade de receber cuidados de urgência num estabelecimento hospitalar, foi impedido de solicitar essa autorização ou não pode esperar a resposta da instituição competente, da assunção, por essa instituição, desses cuidados, mesmo que as condições dessa assunção estejam reunidas. Ora, a assunção desses cuidados, não é susceptível de comprometer a realização dos objectivos de planificação hospitalar nem de causar prejuízos graves ao equilíbrio financeiro do sistema de segurança social. Não afecta a manutenção de um serviço hospitalar equilibrado e acessível a todos nem a de uma capacidade de cuidados e de uma especialidade médica no território nacional. Por conseguinte, essa legislação não é justificada pelos imperativos acima referidos e, de qualquer forma, não satisfaz a exigência de proporcionalidade. Logo, comporta uma restrição injustificada à livre prestação de serviços.
(cf. n.os 43‑47, 51, disp. 2)
3. Tratando‑se de cuidados médicos que não podem ser dispensados no Estado‑Membro em cujo território reside o beneficiário da segurança social, o artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71, na sua versão alterada e actualizada pelo Regulamento n.° 118/97, conforme alterado pelo Regulamento n.° 1992/2006, deve ser interpretado no sentido de que uma autorização solicitada ao abrigo do n.° 1, alínea c), i), do mesmo artigo não pode ser recusada:
– se, quando as prestações previstas pela legislação nacional são objecto de uma lista que não menciona expressamente e precisamente o método de tratamento aplicado, mas define os tipos de tratamento assumidos pela instituição competente, se determinar, em aplicação dos princípios de interpretação usuais e na sequência de um exame baseado em critérios objectivos e não discriminatórios, tendo em conta todos os elementos médicos pertinentes e os dados científicos disponíveis, que esse método de tratamento corresponde a tipos de tratamento mencionados nessa lista; e
– se um tratamento alternativo que apresente o mesmo grau de eficácia não puder ser ministrado em tempo oportuno no Estado‑Membro em cujo território reside o beneficiário da segurança social.
O mesmo artigo opõe‑se a que os órgãos nacionais chamados a pronunciar‑se sobre um pedido de autorização prévia presumam, ao aplicar essa disposição, que os cuidados hospitalares que não podem ser dispensados no Estado‑Membro em cujo território reside o beneficiário da segurança social não figuram entre as prestações cuja assunção é prevista pela legislação desse Estado e, inversamente, que os cuidados hospitalares que figuram entre essas prestações podem ser ministrados no referido Estado‑Membro.
Com efeito, no que se refere à primeira condição enunciada no artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71, não é, em princípio, incompatível com o direito da União que um Estado‑Membro proceda à elaboração de listas limitativas das prestações médicas tomadas a cargo pelo seu sistema de segurança social e esse direito não pode, em princípio, ter por efeito obrigar um Estado‑Membro a alargar essas listas de prestações. Compete unicamente aos órgãos nacionais chamados a pronunciarem‑se sobre um pedido de autorização para receber cuidados de saúde dispensados num Estado‑Membro diferente daquele em que reside o beneficiário da segurança social determinar se esses cuidados fazem parte das previsões da referida lista. Contudo, há que ter em conta que, uma vez que os Estados‑Membros estão obrigados a não violar o direito da União no exercício da sua competência, deve assegurar‑se que o artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71 seja aplicado em conformidade com o referido direito. Se o método de tratamento em causa corresponde a prestações previstas pela legislação do Estado‑Membro de residência, a autorização prévia não pode ser recusada pelo facto de esse método de tratamento não ser praticado nesse Estado‑Membro.
Além disso, no que se refere à segunda condição enunciada no artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71, se o facto de o tratamento pretendido noutro Estado‑Membro não ser praticado no Estado‑Membro de residência do interessado não implicar, per se, que a segunda condição está preenchida, impõe‑se declarar que é esse o caso quando um tratamento que apresente o mesmo grau de eficácia não possa ser realizado nesse Estado‑Membro em tempo oportuno.
Por último, resulta desta interpretação que uma decisão relativa a um pedido de autorização prévia apresentado ao abrigo do n.° 1, alíneas c), i), do artigo 22.° do Regulamento n.° 1408/71 não pode ser baseada numa presunção segundo a qual, se os cuidados hospitalares considerados não puderem ser dispensados no Estado‑Membro competente, deve presumir‑se que os referidos cuidados não fazem parte das prestações assumidas pelo sistema nacional de segurança social, e, inversamente, se os referidos cuidados figurarem entre as prestações assumidas por este, há que presumir que podem ser dispensados nesse Estado‑Membro.
(cf. n.os 58, 60‑62, 64, 68, 69, 73, disp. 3)
4. Quando tiver sido demonstrado que a recusa de concessão de uma autorização pedida ao abrigo do artigo 22.°, n.° 1, alínea c), i), do Regulamento n.° 1408/71, na sua versão alterada e actualizada pelo Regulamento n.° 118/97, conforme alterado pelo Regulamento n.° 1992/2006, não era fundada, quando os cuidados hospitalares já tiverem sido prestados e os custos correspondentes suportados pelo beneficiário da segurança social, o órgão jurisdicional nacional deve obrigar a instituição competente, de acordo com as regras processuais nacionais, a reembolsar ao referido beneficiário o montante que teria normalmente sido pago por esta última se a autorização tivesse sido devidamente concedida.
O referido montante é igual ao determinado segundo as disposições da legislação à qual está sujeita a instituição do Estado‑Membro em cujo território foram dispensados os cuidados hospitalares. Se esse montante for inferior ao que teria resultado da aplicação da legislação em vigor no Estado‑Membro de residência em caso de hospitalização neste último, deve ainda ser concedido ao beneficiário da segurança social um reembolso complementar, a cargo da instituição competente, correspondente à diferença entre esses dois montantes, no limite das despesas realmente efectuadas.
(cf. n.os 77, 78, 81, disp. 4)
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)
5 de Outubro de 2010 (*)
«Segurança social – Livre prestação de serviços – Seguro de doença – Cuidados hospitalares dispensados noutro Estado‑Membro – Autorização prévia – Condições de aplicação do artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento (CEE) n.° 1408/71 – Modalidades de reembolso ao segurado das despesas hospitalares incorridas noutro Estado‑Membro – Obrigação para um órgão jurisdicional inferior de acatar as instruções de um órgão jurisdicional superior»
No processo C‑173/09,
que tem por objecto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 234.° CE, apresentado pelo Administrativen sad Sofia‑grad (Bulgária), por decisão de 28 de Abril de 2009, entrado no Tribunal de Justiça em 14 de Maio de 2009, no processo
Georgi Ivanov Elchinov
contra
Natsionalna zdravnoosiguritelna kasa,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),
composto por: V. Skouris, presidente, A. Tizzano, J. N. Cunha Rodrigues, K. Lenaerts, J.‑C. Bonichot e R. Silva de Lapuerta, presidentes de secção, A. Rosas, K. Schiemann, P. Kūris (relator), J.‑J. Kasel, M. Safjan, D. Šváby e M. Berger, juízes,
advogado‑geral: P. Cruz Villalón,
secretário: R. Grass,
vistas as observações apresentadas:
– em representação de G. I. Elchinov, por L. Panayotova, advokat,
– em representação do Governo búlgaro, por T. Ivanov e E. Petranova, na qualidade de agentes,
– em representação do Governo checo, por M. Smolek, na qualidade de agente,
– em representação do Governo grego, por K. Georgiadis, I. Bakopoulos e S. Vodina, na qualidade de agentes,
– em representação do Governo espanhol, por J. M. Rodríguez Cárcamo, na qualidade de agente,
– em representação do Governo polaco, por M. Dowgielewicz, na qualidade de agente,
– em representação do Governo finlandês, por A. Guimaraes‑Purokoski, na qualidade de agente,
– em representação do Governo do Reino Unido, por S. Ossowski, na qualidade de agente,
– em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por S. Petrova, na qualidade de agente,
ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 10 de Junho de 2010,
profere o presente
Acórdão
1 O pedido de decisão prejudicial tem por objecto a interpretação dos artigos 49.° CE e 22.° do Regulamento (CEE) n.° 1408/71 do Conselho, de 14 de Junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na sua versão alterada e actualizada pelo Regulamento (CE) n.° 118/97 do Conselho, de 2 de Dezembro de 1996 (JO 1997, L 28, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1992/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2006 (JO L 392, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 1408/71»).
2 Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe G. I. Elchinov à Natsionalna zdravnoosiguritelna kasa (Caixa Nacional de Seguros de Doença, a seguir «NZOK») a propósito da recusa desta em lhe conceder uma autorização de receber cuidados hospitalares na Alemanha.
Quadro jurídico
Regulamentação da União
3 O Regulamento n.° 1408/71, no seu artigo 22.°, sob a epígrafe «Estad[a] fora do Estado competente – Regresso ou transferência de residência para outro Estado‑Membro no decurso de uma doença ou maternidade – Necessidade de se deslocar a outro Estado‑Membro a fim de receber tratamentos adequados», dispõe:
«1. O trabalhador assalariado ou não assalariado que preencha as condições exigidas pela legislação do Estado competente para ter direito às prestações, tendo em conta, quando necessário, o disposto no artigo 18.°, e:
[…]
c) Que seja autorizado pela instituição competente a deslocar‑se ao território de outro Estado‑Membro a fim de nele receber tratamentos adequados ao seu estado,
terá direito:
i) Às prestações em espécie concedidas, por conta da instituição competente, pela instituição do lugar de estada […], nos termos da legislação aplicada por esta instituição, como se nela estivesse inscrito, sendo, no entanto, o período de concessão das prestações regulado pela legislação do Estado competente;
[…]
2. […]
A autorização exigida nos termos do n.° 1, alínea c), não pode ser recusada quando os tratamentos em causa figurarem entre as prestações previstas pela legislação do Estado‑Membro em cujo território reside o interessado e se os mesmos tratamentos não puderem, tendo em conta o seu estado actual de saúde e a evolução provável da doença, ser‑lhe dispensados no prazo normalmente necessário para obter o tratamento em causa no Estado‑Membro de residência.
[…]»
4 O artigo 36.°, n.° 1, do Regulamento n.° 1408/71 prevê:
«As prestações em espécie concedidas pela instituição de um Estado‑Membro, por conta da instituição de outro Estado‑Membro, nos termos das disposições do presente [c]apítulo, são reembolsadas integralmente.»
5 Com base no artigo 2.°, n.° 1, do Regulamento n.° 574/72 do Conselho, de 21 de Março de 1972, que estabelece as modalidades de aplicação do Regulamento n.° 1408/71 (JO L 74, p. 1; EE 05 F1 p. 156), a Comissão Administrativa para a Segurança Social dos Trabalhadores Migrantes, referida no artigo 80.° do Regulamento n.° 1408/71, adoptou um modelo para o certificado necessário para a aplicação do artigo 22.°, n.° 1, alínea c), i), deste último regulamento, a saber, o formulário «E 112».
Legislação nacional
6 Nos termos do artigo 224.° do Código de Processo Administrativo búlgaro:
«As indicações do Supremo Tribunal Administrativo relativas à interpretação e aplicação da lei são vinculativas na reapreciação do processo.»
7 Nos termos do artigo 81.°, n.° 1, da Lei relativa à saúde (DV n.° 70, de 10 de Agosto de 2004):
«Todos os cidadãos búlgaros têm direito a beneficiar de cuidados de saúde nas condições e segundo as modalidades previstas na presente lei e na Lei relativa ao seguro de doença.»
8 Ao abrigo do artigo 33.° da Lei relativa ao seguro de doença (DV n.° 70, de 19 de Junho de 1998), todos os cidadãos búlgaros que não sejam simultaneamente cidadãos de outro Estado‑Membro estão obrigatoriamente segurados na NZOK.
9 O artigo 35.° da referida lei prevê que os segurados têm direito à obtenção de um documento necessário ao exercício dos seus direitos em matéria de seguro de doença de acordo com as regras relativas à coordenação dos regimes de segurança social.
10 O artigo 36.°, n.° 1, da mesma lei dispõe:
«As pessoas cobertas por seguro obrigatório só têm o direito de obter o reembolso do valor parcial ou total das despesas incorridas com assistência médica no estrangeiro se tiverem obtido uma autorização prévia para esse efeito da NZOK.»
11 Os tipos de prestações de saúde tomadas a cargo pela NZOK são enumerados no artigo 45.° da Lei relativa ao seguro de doença, cujo n.° 2 prevê que o pacote básico de saúde é definido por decreto do Ministério da Saúde. Nesta base, o referido ministério adoptou o Decreto n.° 40, de 24 de Novembro de 2004, relativo à definição do pacote básico das prestações de saúde, garantido pelo orçamento da NZOK (DV n.° 88, de 2006), cujo artigo único enuncia que o pacote básico das referidas prestações de saúde comporta aquelas cujo tipo e montante são determinados de acordo com os anexos 1 a 10 do referido decreto. O anexo 5 do mesmo, intitulado «Lista das prestações de saúde», visa, sob o número 136, as «outras operações do globo ocular» assim como, sob o número 258, o «tratamento radiológico de alta tecnologia de doenças oncológicas e não oncológicas».
Litígio no processo principal e questões prejudiciais
12 G. I. Elchinov, cidadão búlgaro inscrito na NZOK, sofre de uma doença grave, devido à qual pediu, em 9 de Março de 2007, a essa caixa a concessão de um formulário E 112 para receber um tratamento com tecnologia de ponta numa clínica especializada em Berlim (Alemanha), uma vez que esse tratamento não é ministrado na Bulgária.
13 Não obstante o seu estado de saúde, G. I. Elchinov foi internado na clínica na Alemanha em 15 de Março de 2007, onde recebeu cuidados de saúde, antes de obter a resposta da NZOK.
14 Por decisão de 18 de Abril de 2007, tomada após o parecer do Ministério da Saúde, o director da NZOK recusou conceder a G. I. Elchinov a autorização solicitada, referindo, designadamente, que as condições de concessão dessa autorização previstas no artigo 22.° do Regulamento n.° 1408/71 não estavam preenchidas, uma vez que o dito tratamento não figura entre as prestações previstas pela legislação búlgara e pagas pela NZOK.
15 G. I. Elchinov interpôs recurso dessa decisão no Administrativen sad Sofia‑grad (Tribunal Administrativo de Sófia). Uma peritagem médico‑legal realizada durante o processo confirmou que o tratamento em causa constituía uma terapia de ponta que ainda não era praticada na Bulgária.
16 Por decisão de 13 de Agosto de 2007, o Administrativen sad Sofia‑grad anulou a referida decisão, considerando que as condições de concessão de uma autorização previstas no artigo 22.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1408/71 estavam preenchidas no presente caso. Esse órgão jurisdicional observou, designadamente, que o tratamento em causa não existia na Bulgária, mas correspondia às prestações com os números 136 e 258 que constam da lista das prestações de saúde.
17 A NZOK interpôs recurso dessa decisão no Varhoven administrativen sad (Supremo Tribunal Administrativo) que, por acórdão de 4 de Abril de 2008, anulou e remeteu o processo para outra Secção do órgão jurisdicional de reenvio. O Varhoven administrativen sad declarou, com efeito, que a decisão dos juízes de primeira instância de que os cuidados recebidos por G. I. Elchinov estavam incluídos nas prestações com os números 136 e 258 da lista de prestações de saúde estava errada. Observou, além disso, que, se a NZOK tomar a cargo cuidados concretos para os quais se pede a concessão do formulário E 112, deve presumir‑se que os mesmos podem ser dispensados em estabelecimentos de saúde búlgaros, de forma que os primeiros juízes se deviam ter pronunciado sobre a questão de saber se esses cuidados podiam ser dispensados num desses estabelecimentos num prazo que não representasse nenhum perigo para a saúde do interessado.
18 No âmbito do novo exame do processo pelo Administrativen sad Sofia‑grad, uma nova peritagem confirmou que um tratamento como o administrado a G. I. Elchinov na Alemanha não era praticado na Bulgária.
19 Foi nestas condições que o Administrativen sad Sofia‑grad decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
«1) O artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento […] n.° 1408/71 […] deve ser interpretado no sentido de que, quando o tratamento concreto para o qual é solicitada a [concessão] do [formulário] E 112 não puder ser [ministrado] numa instituição de saúde búlgara, deve presumir‑se que esse tratamento não é financiado pelo orçamento da [NZOK] ou do Ministério da Saúde e, inversamente, que, quando este tratamento é financiado pelo orçamento da NZOK ou do Ministério da Saúde, deve presumir‑se que o tratamento pode ser ministrado numa instituição de saúde búlgara?
2) A expressão [‘os mesmos tratamentos não puderem ser dispensados no [...] Estado‑Membro de residência’], constante do artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento […] n.° 1408/71, deve ser interpretada no sentido de que abrange os casos em que o tratamento existente no território em que o beneficiário reside é um tipo de tratamento muito menos eficaz e muito mais radical do que o que existe noutro Estado‑Membro, ou apenas os casos em que o interessado não pode ser atempadamente tratado?
3) Tendo em conta o princípio da autonomia processual, o tribunal nacional está obrigado a acatar as indicações vinculativas que lhe foram dadas por uma instância superior que revogou a sua decisão anterior e lhe remeteu o processo para reapreciação, quando existam fundamentos para se pensar que essas indicações estão em contradição com o direito comunitário?
4) Quando o tratamento em causa não puder ser prestado no território do Estado‑Membro em que o beneficiário reside, para que este Estado‑Membro seja obrigado a autorizar o tratamento noutro Estado‑Membro nos termos do artigo 22.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento […] n.° 1408/71, é suficiente que o tipo de tratamento em causa esteja incluído nas prestações previstas na legislação do primeiro, mesmo que essa legislação não mencione expressamente o método concreto de tratamento?
5) Os artigos 49.° CE e 22.° do Regulamento […] n.° 1408/71 opõem‑se a uma disposição nacional, como a do artigo 36.°, n.° 1, da Lei [relativa ao seguro de doença], nos termos [da] qual os beneficiários obrigatórios só têm direito ao reembolso parcial ou total das despesas de saúde efectuadas no estrangeiro quando tiverem obtido uma autorização prévia para esse efeito?
6) O tribunal nacional deve obrigar a entidade competente do Estado em que o beneficiário da caixa de doença reside a [conceder] o documento necessário para a realização de um tratamento no estrangeiro ([formulário] E 112) quando a recusa de [concessão] desse documento for considerada ilegal, se o pedido de [concessão] do documento tiver sido apresentado antes da realização do tratamento no estrangeiro e o tratamento já tiver sido ministrado no momento em que foi proferida a decisão judicial?
7) Em caso de resposta afirmativa à questão anterior e se o tribunal considerar ilegal a recusa de autorização de um tratamento no estrangeiro, como devem as despesas efectuadas pelo beneficiário da caixa de doença com o tratamento ser‑lhe reembolsadas?:
a) directamente pelo Estado em que está inscrito como beneficiário do seguro de doença ou pelo Estado em que foi efectuado o tratamento, mediante a apresentação da autorização para realização de um tratamento no estrangeiro?
b) em que medida, se o montante das comparticipações previstas pela lei do Estado da residência for diferente do das comparticipações previstas na lei do Estado em que o tratamento foi realizado, ao abrigo do artigo 49.° CE, que proíbe as restrições à livre prestação de serviços?»
Quanto às questões prejudiciais
20 Há que responder em primeiro lugar à terceira questão antes de proceder ao exame das outras seis questões, que incidem sobre a interpretação dos artigos 49.° CE e 22.° do Regulamento n.° 1408/71.
Quanto à terceira questão
21 Resulta da decisão de reenvio que o Administrativen sad Sofia‑grad tem dúvidas quanto à interpretação dos artigos 49.° CE e 22.° do Regulamento n.° 1408/71 e, em especial, relativamente à interpretação desse artigo 22.° feita pelo Varhoven administrativen sad no seu acórdão de 4 de Abril de 2008. Ao submeter ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial com vista à interpretação das disposições acima referidas, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber se o juiz do mérito está vinculado pelas apreciações de direito feitas pelo tribunal superior, quando tem razões para supor que essas apreciações não são conformes com o direito da União.
22 O órgão jurisdicional de reenvio expõe, com efeito, que, de acordo com o artigo 224.° do Código de Processo Administrativo búlgaro, as indicações do Varhoven administrativen sad relativas à interpretação e à aplicação da lei têm, quando de um exame posterior do processo pelo Administrativen sad Sofia‑grad, carácter vinculativo relativamente a este último. Observa, além disso, que o direito da União consagra o princípio da autonomia processual dos Estados‑Membros.
23 Ainda que a questão que submete ao Tribunal de Justiça não pareça excluir a possibilidade de um órgão jurisdicional nacional decidir sem reenvio prejudicial afastando‑se das apreciações de direito, feitas no mesmo processo pelo órgão jurisdicional nacional superior, que julga não serem conformes com o direito da União, deve declarar‑se não ser isso que se passa no presente caso, uma vez que o órgão jurisdicional de reenvio submeteu ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial para clarificar as dúvidas que tinha quanto à correcta interpretação do direito da União.
24 Consequentemente, através da sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio procura saber se o direito da União se opõe a que um órgão jurisdicional nacional, ao qual compete julgar um processo que lhe foi remetido por um órgão jurisdicional superior chamado a decidir em sede de recurso, esteja vinculado, em conformidade com o direito processual nacional, por apreciações de direito feitas pelo órgão jurisdicional superior, se considerar, atendendo à interpretação que solicitou do Tribunal de Justiça, que as referidas apreciações não são conformes com o direito da União.
25 A este respeito, há que recordar, em primeiro lugar, que a existência de uma regra processual nacional, como a aplicável no processo principal, não pode pôr em causa a faculdade de que dispõem os órgãos jurisdicionais nacionais que não decidem em última instância de submeter ao Tribunal de Justiça um pedido de decisão prejudicial quando têm dúvidas, como no presente caso, sobre a interpretação do direito da União.
26 Com efeito, constitui jurisprudência assente que o artigo 267.° TFUE confere aos órgãos jurisdicionais nacionais uma faculdade muito ampla de recorrer ao Tribunal de Justiça, se considerarem que um processo neles pendente suscita questões relativas à interpretação ou à apreciação da validade de disposições do direito da União necessárias para a resolução do litígio que lhes foi submetido (v., neste sentido, acórdãos de 16 de Janeiro de 1974, Rheinmühlen‑Düsseldorf, 166/73, Colect., p. 17, n.° 3; de 27 de Junho de 1991, Mecanarte, C‑348/89, Colect., p. I‑3277, n.° 44; de 10 de Julho de 1997, Palmisani, C‑261/95, Colect., p. I‑4025, n.° 20; de 16 de Dezembro de 2008, Cartesio, C‑210/06, Colect., p. I‑9641, n.° 88; e de 22 de Junho de 2010, Melki e Abdeli, C‑188/10 e C‑189/10, ainda não publicado na Colectânea, n.° 41). Os órgãos jurisdicionais nacionais são, de resto, livres de exercer essa faculdade a qualquer momento do processo que considerarem adequado (v., neste sentido, acórdão Melki e Abdeli, já referido, n.os 52 e 57).
27 Daqui o Tribunal de Justiça deduziu que uma regra de direito nacional, nos termos da qual os órgãos jurisdicionais que não decidem em última instância estão vinculados por apreciações feitas pelo órgão jurisdicional superior, não deve retirar a esses órgãos jurisdicionais a faculdade de submeter ao Tribunal de Justiça questões de interpretação do direito da União a que essas apreciações de direito se referem. Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou que o tribunal que não decide em última instância, se considerar que a apreciação de direito feita pelo tribunal de grau superior o pode levar a proferir uma sentença contrária ao direito da União, deve ter a faculdade de colocar ao Tribunal de Justiça as questões que o preocupam (v., neste sentido, acórdãos Rheinmühlen‑Düsseldorf, já referido, n.os 4 e 5; Cartesio, já referido, n.° 94; de 9 de Março de 2010, ERG e o., C‑378/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 32, e Melki e Abdeli, já referido, n.° 42).
28 Todavia, há que salientar que a faculdade reconhecida ao juiz nacional pelo artigo 267.°, segundo parágrafo, TFUE, de solicitar uma interpretação prejudicial ao Tribunal de Justiça antes de, se for o caso, deixar de aplicar as indicações de um tribunal superior que se revelem contrárias ao direito da União, não se pode transformar numa obrigação (v., neste sentido, acórdão de 19 de Janeiro de 2010, Kücükdeveci, C‑555/07, ainda não publicado na Colectânea, n.os 54 e 55).
29 Há que recordar, em segundo lugar, que resulta de jurisprudência assente que um acórdão proferido a título prejudicial pelo Tribunal de Justiça vincula o juiz nacional, quanto à interpretação ou à validade dos actos das instituições da União em causa, para a solução do litígio no processo principal (v., designadamente, acórdãos de 24 de Junho de 1969, Milch‑, Fett‑ und Eierkontor, 29/68, Recueil, p, 165, n.° 3, Colect. 1969‑1970, p. 51; de 3 de Fevereiro de 1977, Benedetti, 52/76, Recueil, p. 163, n.° 26, Colect., p. 67; despacho de 5 de Março de 1986, Wünsche, 69/85, Colect., p. 947, n.° 13; e acórdão de 14 de Dezembro de 2000, Fazenda Pública, C‑446/98, Colect., p. I‑11435, n.° 49).
30 Resulta destas considerações que o juiz nacional, tendo exercido a faculdade que lhe é conferida pelo artigo 267.°, segundo parágrafo, TFUE, está vinculado, para a resolução do litígio no processo principal, pela interpretação das disposições em causa feita pelo Tribunal de Justiça e deve, se for esse o caso, afastar as apreciações do tribunal superior se considerar, à luz dessa interpretação, que estas não são conformes com o direito da União.
31 Além disso, há que salientar que, segundo jurisprudência bem assente, o juiz nacional encarregado de aplicar, no âmbito da sua competência, as disposições do direito da União tem a obrigação de garantir a plena eficácia dessas disposições, não aplicando, se necessário e pela sua própria autoridade, qualquer disposição contrária da legislação nacional, a saber, no presente caso, a regra processual enunciada no n.° 22 do presente acórdão, sem que tenha de pedir ou de esperar a sua revogação prévia por via legislativa ou por qualquer outro procedimento constitucional (v., neste sentido, acórdãos de 9 de Março de 1978, Simmenthal, 106/77, Colect., p. 243, n.° 24, e de 19 de Novembro de 2009, Filipiak, C‑314/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 81).
32 À luz do que precede, há que responder à terceira questão que o direito da União se opõe a que um órgão jurisdicional nacional, ao qual compete julgar um processo que lhe foi remetido por um órgão jurisdicional superior que decidiu em sede de recurso, esteja vinculado, de acordo com o direito processual nacional, pelas apreciações de direito feitas pelo órgão jurisdicional superior, se considerar, atendendo à interpretação que solicitou do Tribunal de Justiça, que as referidas apreciações não são conformes com o direito da União.
Quanto às questões relativas à interpretação dos artigos 49.° CE e 22.° do Regulamento n.° 1408/71
33 Há que examinar, antes de mais, a quinta questão, relativa ao alcance do poder dos Estados‑Membros de subordinar a uma autorização prévia a assunção de cuidados hospitalares dispensados noutro Estado‑Membro, depois, a primeira, segunda e quarta questões, relativas às condições enunciadas no artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71, e, por último, em conjunto, a sexta e sétima questões, relativas às modalidades de reembolso ao beneficiário da segurança social dos referidos cuidados.
Quanto à quinta questão, relativa ao alcance do poder dos Estados‑Membros de subordinar a uma autorização prévia a assunção de cuidados hospitalares dispensados noutro Estado‑Membro
34 Através da quinta questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se os artigos 49.° CE e 22.° do Regulamento n.° 1408/71 se opõem a uma legislação de um Estado‑Membro que exclui, em todos os casos, a assunção de cuidados hospitalares dispensados noutro Estado‑Membro sem autorização prévia.
35 O órgão jurisdicional de reenvio, recordando que G. I. Elchinov se foi tratar na Alemanha antes de ter recebido a resposta da NZOK ao seu pedido de autorização, pergunta‑se se um beneficiário da segurança social pode solicitar a assunção de cuidados hospitalares dispensados num Estado‑Membro diferente daquele em cujo território reside sem ter obtido previamente a autorização da instituição competente, quando o seu estado de saúde o exigia, ou se a prestação dos cuidados, na falta dessa autorização prévia, acarreta a extinção do direito de o beneficiário da segurança social pedir a sua assunção. Observando que o artigo 36.° da Lei relativa ao seguro de doença só permite a assunção de cuidados dispensados noutro Estado‑Membro se o segurado obteve uma autorização prévia para esse efeito, interroga‑se sobre a conformidade dessa disposição com os artigos 49.° CE e 22.° do Regulamento n.° 1408/71.
36 A este respeito, em primeiro lugar, há que recordar que, segundo jurisprudência assente, as prestações médicas efectuadas mediante remuneração estão abrangidas pelo âmbito de aplicação das disposições relativas à livre prestação de serviços, inclusive quando os cuidados de saúde são dispensados em quadro hospitalar (v., neste sentido, acórdãos de 16 de Maio de 2006, Watts, C‑372/04, Colect., p. I‑4325, n.° 86 e jurisprudência referida, e de 15 de Junho de 2010, Comissão/Espanha, C‑211/08, ainda não publicado na Colectânea, n.° 47 e jurisprudência referida).
37 Também já foi decidido que a livre prestação de serviços inclui a liberdade de os destinatários de serviços, designadamente as pessoas que devam receber tratamento médico, se deslocarem a outro Estado‑Membro para aí beneficiarem desses serviços (v. acórdãos, já referidos, Watts, n.° 87 e jurisprudência referida, e Comissão/Espanha, n.os 48 a 50 e jurisprudência referida).
38 A aplicabilidade do artigo 22.° do Regulamento n.° 1408/71 à situação em causa não exclui que a mesma seja abrangida pelo âmbito de aplicação das disposições relativas à livre prestação de serviços e, neste caso, do artigo 49.° CE. Com efeito, por um lado, o facto de uma regulamentação nacional poder ser conforme com uma disposição de direito derivado, no presente caso, com o artigo 22.° do Regulamento n.° 1408/71, não tem por efeito subtraí‑la às disposições do Tratado CE (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Watts, n.os 46 e 47, e Comissão/Espanha, n.° 45).
39 Por outro lado, o artigo 22.°, n.° 1, alínea c), i), do Regulamento n.° 1408/71 tem por objectivo conferir o direito às prestações em espécie concedidas, por conta da instituição competente, pela instituição do lugar de estada, de acordo com as disposições da legislação do Estado‑Membro onde as prestações são concedidas, como se o segurado estivesse inscrito nesta última instituição (v., neste sentido, acórdãos de 28 de Abril de 1998, Decker, C‑120/95, Colect., p. I‑1831, n.os 28 e 29, e Kohll, C‑158/96, Colect., p. I‑1931, n.os 26 e 27; de 12 de Julho de 2001, Vanbraekel e o., C‑368/98, Colect., p. I‑5363, n.os 32 e 36; de 23 de Outubro de 2003, Inizan, C‑56/01, Colect., p. I‑12403, n.os 19 e 20; e Watts, já referido, n.° 48). O n.° 2, segundo parágrafo, do mesmo artigo, quanto a si, tem por único objectivo identificar as circunstâncias em que se exclui que a instituição competente possa recusar a autorização solicitada com base no n.° 1, alínea c) (v., neste sentido, acórdão Vanbraekel e o., já referido, n.° 31).
40 Em segundo lugar, há igualmente que recordar que, como alegam os governos que apresentaram observações no presente processo, é pacífico que o direito da União não prejudica a competência dos Estados‑Membros para organizarem os seus sistemas de segurança social e que, na falta de harmonização a nível da União Europeia, compete à legislação de cada Estado‑Membro determinar as condições que conferem direito a prestações em matéria de segurança social. No entanto, não deixa de ser verdade que, no exercício dessa competência, os Estados‑Membros devem respeitar o direito da União, nomeadamente as disposições relativas à livre prestação de serviços, as quais comportam a proibição para estes de introduzir ou de manter restrições injustificadas ao exercício dessa liberdade no domínio da saúde (v., designadamente, neste sentido, acórdãos Watts, já referido, n.° 92 e jurisprudência referida; de 19 de Abril de 2007, Stamatelaki, C‑444/05, Colect., p. I‑3185, n.° 23; e Comissão/Espanha, já referido, n.° 53).
41 Ainda que uma autorização prévia, como a exigida pelo artigo 36.° da Lei relativa ao seguro de doença, constitua, tanto para os pacientes como para os prestadores, um obstáculo à livre prestação de serviços (v., neste sentido, acórdãos Kohll, já referido, n.° 35; de 12 de Julho de 2001, Smits e Peerbooms, C‑157/99, Colect., p. I‑5473, n.° 69; de 13 de Maio de 2003, Müller‑Fauré e van Riet, C‑385/99, Colect., p. I‑4509, n.° 44; e Watts, já referido, n.° 98), o Tribunal de Justiça decidiu contudo que o artigo 49.° CE não se opõe, em princípio, a que o direito que assiste a um paciente de obter tratamentos hospitalares noutro Estado‑Membro a cargo do sistema pelo qual está abrangido seja submetido a uma autorização prévia (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Smits e Peerbooms, n.° 82, e Watts, n.° 113).
42 Com efeito, o Tribunal de Justiça considerou que não se pode excluir que um risco grave para o equilíbrio financeiro do sistema de segurança social possa constituir uma razão imperiosa de interesse geral susceptível de justificar um entrave à livre prestação de serviços. Reconheceu também que o objectivo de manutenção de um serviço médico e hospitalar equilibrado e acessível a todos pode igualmente ser abrangido por derrogações com base em razões de saúde pública previstas no artigo 46.° CE, na medida em que esse objectivo contribua para a realização de um nível elevado de protecção da saúde. Precisou ainda que o mesmo artigo 46.° CE permite aos Estados‑Membros restringir a livre prestação de serviços médicos e hospitalares, na medida em que a manutenção da capacidade de tratamento ou de uma especialidade médica no território nacional seja essencial para a saúde pública, ou mesmo para a sobrevivência da sua população (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Kohll, n.os 41, 50 e 51; Smits e Peerbooms, n.os 72 a 74; Müller‑Fauré e van Riet, n.os 67 e 73; e Watts, n.os 103 a 105).
43 O Tribunal de Justiça também considerou que o número de infra‑estruturas hospitalares, a sua repartição geográfica, a sua organização e os equipamentos de que dispõem, ou ainda a natureza dos serviços médicos que estão em condições de oferecer, devem poder ser objecto de uma planificação que responda, em regra, a diversas preocupações. Por um lado, esta planificação prossegue o objectivo de garantir, no território do Estado‑Membro em causa, uma acessibilidade suficiente e permanente a uma gama equilibrada de cuidados hospitalares de qualidade. Por outro lado, exprime a vontade de garantir um controlo dos custos e de evitar, na medida do possível, qualquer desperdício de recursos financeiros, técnicos e humanos. Esse desperdício seria, com efeito, tanto mais prejudicial quanto é certo que o sector dos cuidados hospitalares gera custos consideráveis e deve responder a necessidades crescentes, e os recursos financeiros que podem ser consagrados aos cuidados de saúde não são, independentemente do modo de financiamento utilizado, ilimitados (acórdãos, já referidos, Smits e Peerbooms, n.os 76 a 79, e Watts, n.os 108 e 109).
44 Em terceiro lugar, deve ainda recordar‑se que, embora o direito da União não se oponha, em princípio, a um sistema de autorização prévia, é contudo necessário que as condições estabelecidas para a concessão dessa autorização sejam justificadas à luz dos imperativos acima referidos, que não excedam o que é objectivamente necessário a esse fim e que o mesmo resultado não possa ser obtido por regras menos restritivas. Um sistema desse tipo deve, além disso, ser fundamentado em critérios objectivos, não discriminatórios e conhecidos antecipadamente, de modo a enquadrar o exercício do poder de apreciação das autoridades nacionais, a fim de este não ser utilizado de modo arbitrário (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Smits e Peerbooms, n.os 82 e 90; Müller‑Fauré e van Riet, n.os 83 a 85; e Watts, n.os 114 a 116).
45 No presente caso, há que observar que uma legislação nacional que exclui em todos os casos a assunção dos cuidados hospitalares dispensados sem autorização prévia priva o beneficiário da segurança social, que, por razões ligadas ao seu estado de saúde ou à necessidade de receber cuidados de urgência num estabelecimento hospitalar, foi impedido de solicitar essa autorização ou não pode, como G. I. Elchinov, esperar a resposta da instituição competente, da assunção, por essa instituição, desses cuidados, mesmo que as condições dessa assunção estejam reunidas.
46 Ora, a assunção desses cuidados, em situações especiais como as descritas no número precedente, não é susceptível de comprometer a realização dos objectivos de planificação hospitalar mencionados no n.° 43 do presente acórdão nem de causar prejuízos graves ao equilíbrio financeiro do sistema de segurança social. Não afecta a manutenção de um serviço hospitalar equilibrado e acessível a todos nem a de uma capacidade de cuidados e de uma especialidade médica no território nacional.
47 Por conseguinte, essa legislação não é justificada pelos imperativos acima referidos e, de qualquer forma, não satisfaz a exigência de proporcionalidade recordada no n.° 44 do presente acórdão. Logo, comporta uma restrição injustificada à livre prestação de serviços.
48 Além disso, no que toca à aplicação do artigo 22.°, n.° 1, alínea c), do Regulamento n.° 1408/71, o Tribunal de Justiça decidiu, no n.° 34 do acórdão Vanbraekel e o., já referido, que, quando um beneficiário da segurança social apresentou um pedido de autorização ao abrigo dessa disposição e esse pedido foi indeferido pela instituição competente e a natureza infundada desse indeferimento foi ulteriormente demonstrada ou pela própria instituição competente ou através de decisão jurisdicional, esse beneficiário tem o direito de ser directamente reembolsado pela instituição competente num montante equivalente ao que, normalmente, seria tomado a cargo caso a autorização tivesse sido devidamente concedida desde o início.
49 Daqui resulta que a legislação de um Estado‑Membro não pode excluir em todos os casos a assunção dos cuidados hospitalares dispensados sem autorização prévia noutro Estado‑Membro.
50 No que se refere à legislação em causa no processo principal, como observou o advogado‑geral nos n.os 49 e 50 das suas conclusões, o artigo 36.° da Lei relativa ao seguro de doença é ambíguo. Compete, de qualquer forma, ao órgão jurisdicional de reenvio apreciar, à luz das indicações contidas no presente acórdão, a conformidade desse artigo com os artigos 49.° CE e 22.° do Regulamento n.° 1408/71 tal como interpretados pelo Tribunal de Justiça e, na medida em que o referido artigo 36.° possa ser objecto de várias interpretações, interpretá‑lo em conformidade com o direito da União (v., neste sentido, acórdão Melki e Abdeli, já referido, n.° 50 e jurisprudência referida).
51 À luz de todas as considerações precedentes, há que responder à quinta questão que os artigos 49.° CE e 22.° do Regulamento n.° 1408/71 se opõem a uma legislação de um Estado‑Membro interpretada no sentido de que exclui, em todos os casos, a assunção dos cuidados hospitalares dispensados sem autorização prévia noutro Estado‑Membro.
Quanto à primeira, segunda e quarta questões, relativas às condições enunciadas no artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71
52 Através da primeira, segunda e quarta questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, no essencial, se, tratando‑se de cuidados médicos que não podem ser dispensados no Estado‑Membro no território do qual o beneficiário da segurança social reside, o artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71 deve ser interpretado no sentido de que uma autorização pedida ao abrigo do n.° 1, alínea c), i), do mesmo artigo não pode ser recusada, por um lado, quando a legislação desse Estado‑Membro prevê o tipo de tratamento a ministrar, mas não indica expressamente e precisamente o método de tratamento aplicado, e, por outro, quando um tratamento alternativo que apresenta o mesmo grau de eficácia não pode ser prestado em tempo oportuno nesse mesmo Estado‑Membro. Além disso, procura saber se esse mesmo artigo deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que os órgãos nacionais que se devem pronunciar sobre um pedido de autorização prévia presumam, ao aplicar essa disposição, que os cuidados hospitalares que não podem ser dispensados no referido Estado‑Membro não figuram entre as prestações cuja assunção é prevista pela legislação desse Estado e, inversamente, que os cuidados hospitalares que se contam entre essas prestações podem ser ministrados nesse Estado‑Membro.
53 O artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71 prevê duas condições cujo preenchimento torna obrigatória a concessão, pela instituição competente, da autorização prévia pedida com base no n.° 1, alínea c), i), do mesmo artigo (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Inizan, n.° 41, e Watts, n.° 55).
54 A primeira condição exige que o tratamento em causa figure entre as prestações previstas pela legislação do Estado‑Membro em cujo território reside o beneficiário da segurança social, ao passo que a segunda condição exige que o tratamento que esse beneficiário pretende receber num Estado‑Membro diferente daquele em cujo território reside não possa, atendendo ao seu estado actual de saúde e à evolução provável da sua doença, ser‑lhe dispensado no prazo normalmente necessário para obter o tratamento em causa no Estado‑Membro de residência (acórdãos, já referidos, Inizan, n.os 42 e 44, e Watts, n.os 56 e 57).
55 Atendendo a que a quarta questão submetida ao Tribunal de Justiça incide sobre a primeira dessas condições, há que começar por examiná‑la. Em seguida, será analisada a segunda questão, que diz respeito à segunda dessas condições, e, por último, será examinada a primeira questão, relativa à presunção evocada na decisão de reenvio, uma vez que a resposta a essa questão decorre das respostas dadas às duas outras.
– Quanto à quarta questão, relativa à primeira condição enunciada no artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71
56 A fim de determinar se está preenchida a primeira condição enunciada no artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71, há que verificar se os «tratamentos em causa», a saber, conforme resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça, o tratamento do olho prescrito pela receita médica e que consiste na aplicação de placas radioactivas ou de uma terapia protónica, figuram entre as «prestações previstas pela legislação do Estado‑Membro em cujo território reside o interessado», isto é, entre as prestações cuja assunção é prevista pelo regime búlgaro de segurança social.
57 A este respeito, deve salientar‑se que, como foi recordado no n.° 40 do presente acórdão, o direito da União não prejudica a competência dos Estados‑Membros para organizar os seus sistemas de segurança social e que, na falta de uma harmonização ao nível da União, compete à legislação de cada Estado‑Membro determinar as condições de concessão das prestações em matéria de segurança social.
58 Assim, já foi decidido que, em princípio, não é incompatível com o direito da União que um Estado‑Membro proceda à elaboração de listas limitativas das prestações médicas tomadas a cargo pelo seu sistema de segurança social e que esse direito não possa, em princípio, ter por efeito obrigar um Estado‑Membro a alargar essas listas de prestações (v., neste sentido, acórdão Smits e Peerbooms, já referido, n.° 87).
59 Daqui resulta que, como os governos que apresentaram observações no presente processo alegaram, compete a cada Estado‑Membro prever as prestações médicas assumidas pelo seu próprio sistema de segurança social. Para esse efeito, o Estado‑Membro em causa tem a faculdade de elaborar uma lista que enumere precisamente os tratamentos ou métodos de tratamentos ou que refira, mais em geral, categorias ou tipos de tratamento ou de métodos de tratamento.
60 Compete, neste contexto, unicamente aos órgãos nacionais chamados a pronunciarem‑se sobre um pedido de autorização para receber cuidados de saúde dispensados num Estado‑Membro diferente daquele em que reside o beneficiário da segurança social determinar se esses cuidados fazem parte das previsões da referida lista. No presente caso, compete ao órgão jurisdicional de reenvio decidir se os cuidados recebidos por G. I. Elchinov na Alemanha figuram entre as prestações de saúde mencionadas no anexo 5 do Decreto n.° 40.
61 Contudo, há que ter em conta que, uma vez que os Estados‑Membros estão obrigados a não violar o direito da União no exercício da sua competência, deve assegurar‑se que o artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71 seja aplicado em conformidade com o referido direito, no respeito das exigências recordadas no n.° 44 do presente acórdão.
62 Daqui decorre que, quando a lista das prestações médicas reembolsáveis não menciona expressamente e precisamente o método de tratamento aplicado, mas define os tipos de tratamentos, por um lado, compete à instituição competente do Estado‑Membro de residência do beneficiário da segurança social examinar, aplicando os princípios de interpretação usuais e com base em critérios objectivos e não discriminatórios, tomando em consideração todos os elementos médicos pertinentes e os dados científicos disponíveis, se esse método de tratamento corresponde a prestações previstas pela legislação desse Estado‑Membro. Por outro lado, daqui resulta que, se for esse o caso, não pode ser recusado um pedido de autorização prévia pelo facto de esse método de tratamento não ser praticado no Estado‑Membro de residência do beneficiário da segurança social, pois esse motivo, se fosse admitido, implicaria uma restrição do alcance do artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71.
– Quanto à segunda questão, relativa à segunda condição enunciada no artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71
63 A fim de determinar se a segunda condição enunciada no artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71 está preenchida, há que verificar se os cuidados em causa podem, tendo em conta o estado actual da saúde do beneficiário da segurança social e da evolução da sua doença, ser‑lhe ministrados no prazo normalmente necessário para os obter no Estado‑Membro de residência.
64 No presente caso, o órgão jurisdicional de reenvio indica que o tratamento em questão não pode ser ministrado no Estado‑Membro de residência do interessado onde teria sido realizada uma intervenção cirúrgica que não pode ser considerada, em seu entender, um tratamento idêntico ou que apresente o mesmo grau de eficácia. Ora, se o facto de o tratamento pretendido noutro Estado‑Membro não ser praticado no Estado‑Membro de residência do interessado não implicar, per se, que a segunda condição enunciada no artigo 22.°, n.° 2, do Regulamento n.° 1408/71 está preenchida, impõe‑se pelo contrário declarar que é esse o caso quando um tratamento que apresente o mesmo grau de eficácia não possa ser realizado nesse Estado‑Membro em tempo oportuno.
65 Com efeito, o Tribunal de Justiça já decidiu que o artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71 deve ser interpretado no sentido de que a autorização a que essa disposição se refere não pode ser recusada quando a primeira condição enunciada pela mesma está satisfeita e quando não se pode obter um tratamento idêntico ou que apresente o mesmo grau de eficácia em tempo oportuno no Estado‑Membro em cujo território o interessado reside (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Inizan, n.os 45, 59 e 60, e Watts, n.os 59 a 61).
66 A este respeito, o Tribunal de Justiça precisou que, para apreciar se um tratamento que apresenta o mesmo grau de eficácia para o paciente pode ser obtido em tempo útil no Estado‑Membro de residência, a instituição competente é obrigada a atender a todas as circunstâncias que caracterizam cada caso concreto, tendo devidamente em conta não apenas a situação médica do paciente no momento em que a autorização é solicitada e, eventualmente, o grau de dor ou a natureza da deficiência deste último, que possa, por exemplo, tornar impossível ou excessivamente difícil o exercício de uma actividade profissional, mas igualmente os seus antecedentes (acórdãos, já referidos, Inizan, n.° 46, e Watts, n.° 62).
67 Assim, no contexto em que os cuidados em causa não podem ser dispensados no Estado‑Membro em cujo território reside o beneficiário da segurança social e em que as prestações previstas pela legislação desse Estado‑Membro são objecto, não de uma enumeração precisa de tratamentos ou de métodos de tratamento, mas de uma definição mais geral de categorias ou de tipos de tratamentos ou de métodos de tratamento, o artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71 implica que, se se verificar que o tratamento pretendido noutro Estado‑Membro faz parte de uma dessas categorias ou corresponde a um desses tipos, a instituição competente é obrigada a conceder ao beneficiário da segurança social a autorização necessária à assunção do custo desse tratamento quando o tratamento alternativo que pode ser ministrado em tempo oportuno no Estado‑Membro da sua residência não apresenta, como na situação descrita pelo órgão jurisdicional de reenvio, o mesmo grau de eficácia.
– Quanto à primeira questão, relativa à presunção evocada na decisão de reenvio
68 No contexto desta questão, o órgão jurisdicional de reenvio expõe que, segundo as indicações fornecidas no processo principal pelo Varhoven administrativen sad, se os cuidados hospitalares considerados não podem ser dispensados na Bulgária, há que presumir que os referidos cuidados não fazem parte das prestações de saúde assumidas pela NZOK e, inversamente, se os referidos cuidados são assumidos por esta, há que presumir que podem ser dispensados na Bulgária. Esse órgão jurisdicional interroga‑se sobre a conformidade dessa presunção com o artigo 22.° do Regulamento n.° 1408/71, uma vez que essa presunção tem por consequência, em seu entender, que as duas condições enunciadas no n.° 2, segundo parágrafo, do mesmo artigo só podem estar preenchidas na hipótese em que sejam ministrados cuidados que apresentam o mesmo grau de eficácia no Estado‑Membro de residência, mas isso não seja possível em tempo oportuno.
69 A este respeito, há que observar que decorre da interpretação do artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71, feita no âmbito do exame da quarta e segunda questões, que uma decisão relativa a um pedido de autorização apresentado ao abrigo no n.° 1, alínea c), i), do mesmo artigo não se pode basear nessa presunção.
70 Com efeito, em primeiro lugar, resulta do que é enunciado no n.° 62 do presente acórdão, por um lado, que há que examinar, em cada caso, em aplicação dos princípios de interpretação usuais e com base em critérios objectivos e não discriminatórios, tendo em conta todos os elementos pertinentes e os dados científicos disponíveis, se o método de tratamento em causa corresponde a prestações previstas pela legislação nacional e, por outro, que não pode ser recusado um pedido de autorização prévia pelo facto de esse método de tratamento não ser praticado no Estado‑Membro de residência do beneficiário da segurança social.
71 Em segundo lugar, resulta do que foi dito nos n.os 64 a 67 do presente acórdão que não se pode rejeitar um pedido de autorização quando não possam ser dispensados cuidados idênticos aos pretendidos ou que apresentem o mesmo grau de eficácia em tempo oportuno no Estado‑Membro de residência, o que também deve ser verificado em cada caso.
72 Além de a utilização da presunção evocada na primeira questão submetida pelo órgão jurisdicional de reenvio ter por efeito restringir o alcance do artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71, a mesma criaria um entrave à livre prestação de serviços no sector da saúde, não justificado pelos imperativos referidos nos n.os 42 e 43 do presente acórdão.
73 À luz destas considerações, há que responder à primeira, segunda e quarta questões que, tratando‑se de cuidados médicos que não podem ser dispensados no Estado‑Membro em cujo território reside o beneficiário da segurança social, o artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71 deve ser interpretado no sentido de que uma autorização solicitada ao abrigo do n.° 1, alínea c), i), do mesmo artigo não pode ser recusada:
– se, quando as prestações previstas pela legislação nacional são objecto de uma lista que não menciona expressamente e precisamente o método de tratamento aplicado, mas define os tipos de tratamento assumidos pela instituição competente, se determinar, em aplicação dos princípios de interpretação usuais e na sequência de um exame baseado em critérios objectivos e não discriminatórios, tendo em conta todos os elementos médicos pertinentes e os dados científicos disponíveis, que esse método de tratamento corresponde a tipos de tratamento mencionados nessa lista; e
– se um tratamento alternativo que apresente o mesmo grau de eficácia não puder ser ministrado em tempo oportuno no Estado‑Membro em cujo território reside o beneficiário da segurança social.
O mesmo artigo opõe‑se a que os órgãos nacionais chamados a pronunciar‑se sobre um pedido de autorização prévia presumam, ao aplicar essa disposição, que os cuidados hospitalares que não podem ser dispensados no Estado‑Membro em cujo território reside o beneficiário da segurança social não figuram entre as prestações cuja assunção é prevista pela legislação desse Estado e, inversamente, que os cuidados hospitalares que figuram entre essas prestações podem ser ministrados no referido Estado‑Membro.
Quanto à sexta e sétima questões, relativas às modalidades de reembolso ao beneficiário da segurança social dos cuidados hospitalares dispensados noutro Estado‑Membro
74 Através da sexta e sétima questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta se o juiz nacional deve obrigar a instituição competente a conceder ao beneficiário da segurança social o formulário E 112 se considerar que, apesar de os cuidados hospitalares já terem terminado no momento que decide, a recusa de conceder esse documento é ilegal. Além disso, pergunta se, nesse caso, os custos dos cuidados hospitalares devem ser reembolsados ao beneficiário da segurança social pela instituição competente ou pela do lugar em que foram dispensados os cuidados e até que valor o reembolso deve ser efectuado quando o montante das prestações previstas pela legislação do Estado‑Membro de residência do beneficiário da segurança social difere do montante das prestações previstas pela do Estado‑Membro em cujo território os cuidados foram dispensados.
75 A este respeito, há que observar que a concessão de uma autorização prévia como a que toma a forma do formulário E 112 não parece ser útil quando os cuidados hospitalares já foram dispensados ao beneficiário da segurança social, salvo, eventualmente, na hipótese de estes ainda não terem sido facturados ao interessado ou ainda não terem sido pagos. Fora dessa hipótese, como já foi dito no n.° 48 do presente acórdão, o beneficiário da segurança social tem o direito, nesse caso, de obter directamente o reembolso, pela instituição competente, num montante equivalente ao que seria normalmente assumido por essa instituição se a autorização tivesse sido devidamente concedida antes do início dos cuidados.
76 De qualquer forma, compete ao juiz nacional obrigar a instituição competente, de acordo com as regras processuais nacionais, a assumir o montante mencionado no número precedente.
77 Esse montante é igual ao determinado segundo as disposições da legislação à qual está sujeita a instituição do Estado‑Membro em cujo território foram dispensados os cuidados hospitalares (v., neste sentido, acórdão Vanbraekel e o., já referido, n.° 32).
78 Se o montante do reembolso das despesas incorridas com serviços hospitalares fornecidos num Estado‑Membro diferente do da residência, que resulta da aplicação das regras em vigor neste Estado, for inferior ao montante que teria resultado da aplicação da legislação em vigor no Estado‑Membro de residência em caso de hospitalização neste último, deve ainda ser concedido pela instituição competente, por força do artigo 49.° CE conforme interpretado pelo Tribunal de Justiça, um reembolso complementar correspondente à diferença entre esses dois montantes (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Vanbraekel e o., n.os 38 a 52, e Comissão/Espanha, n.os 56 e 57).
79 O Tribunal de Justiça precisou que, no caso de a legislação do Estado‑Membro competente prever a gratuitidade dos tratamentos hospitalares dispensados no âmbito do serviço nacional de saúde e de a legislação do Estado‑Membro no qual o paciente abrangido pelo referido serviço foi, ou devia ter sido, autorizado a receber um tratamento hospitalar a expensas desse serviço não prever a assunção integral do custo do referido tratamento, deve ser concedido a esse paciente, pela instituição competente, um reembolso correspondente à eventual diferença entre, por um lado, o montante do custo, objectivamente calculado, de um tratamento equivalente num estabelecimento do serviço em causa, limitado, sendo esse o caso, ao valor do montante global facturado pelo tratamento dispensado no Estado‑Membro de estada, e, por outro, o montante até ao qual a instituição deste último Estado‑Membro é obrigada a comparticipar, por força do artigo 22.°, n.° 1, alínea c), i), do Regulamento n.° 1408/71, por conta da instituição competente, em aplicação das disposições da legislação desse Estado‑Membro (acórdão Watts, já referido, n.° 143).
80 Há que acrescentar que, como observou o advogado‑geral no n.° 85 das suas conclusões, os beneficiários da segurança social que recebem cuidados hospitalares num Estado‑Membro diferente do da sua residência sem solicitar autorização ao abrigo do artigo 22.°, n.° 1, alínea c), i), do Regulamento n.° 1408/71 só podem pretender obter a assunção dos referidos cuidados, com base no artigo 49.° CE, até ao limite da cobertura garantida pelo regime de seguro de doença no qual estão inscritos (v., neste sentido, acórdão Müller‑Fauré e van Riet, n.os 98 e 106). O mesmo se diga quando a recusa de concessão de uma autorização prévia pedida nos termos do referido artigo 22.° tem fundamento.
81 À luz destas considerações, há que responder à sexta e sétima questões que:
– Quando tiver sido demonstrado que a recusa de concessão de uma autorização pedida ao abrigo do artigo 22.°, n.° 1, alínea c), i), do Regulamento n.° 1408/71 não era fundada, os cuidados hospitalares já tiverem sido prestados e os custos correspondentes suportados pelo beneficiário da segurança social, o órgão jurisdicional nacional deve obrigar a instituição competente, de acordo com as regras processuais nacionais, a reembolsar ao referido beneficiário da segurança social o montante que teria normalmente sido pago por esta última se a autorização tivesse sido devidamente concedida.
– O referido montante é igual ao determinado segundo as disposições da legislação à qual está sujeita a instituição do Estado‑Membro em cujo território foram dispensados os cuidados hospitalares. Se esse montante for inferior ao que teria resultado da aplicação da legislação em vigor no Estado‑Membro de residência em caso de hospitalização neste último, deve ainda ser concedido ao beneficiário da segurança social um reembolso complementar, a cargo da instituição competente, correspondente à diferença entre esses dois montantes, no limite das despesas realmente efectuadas.
Quanto às despesas
82 Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efectuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) declara:
1) O direito da União opõe‑se a que um órgão jurisdicional nacional, ao qual compete julgar um processo que lhe foi remetido por um órgão jurisdicional superior que decidiu em sede de recurso, esteja vinculado, de acordo com o direito processual nacional, pelas apreciações de direito feitas pelo órgão jurisdicional superior, se considerar, atendendo à interpretação que solicitou do Tribunal de Justiça, que as referidas apreciações não são conformes com o direito da União.
2) Os artigos 49.° CE e 22.° do Regulamento (CEE) n.° 1408/71 do Conselho, de 14 de Junho de 1971, relativo à aplicação dos regimes de segurança social aos trabalhadores assalariados, aos trabalhadores não assalariados e aos membros da sua família que se deslocam no interior da Comunidade, na sua versão alterada e actualizada pelo Regulamento (CE) n.° 118/97 do Conselho, de 2 de Dezembro de 1996, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.° 1992/2006 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 18 de Dezembro de 2006, opõem‑se a uma legislação de um Estado‑Membro interpretada no sentido de que exclui, em todos os casos, a assunção dos cuidados hospitalares dispensados sem autorização prévia noutro Estado‑Membro.
3) Tratando‑se de cuidados médicos que não podem ser dispensados no Estado‑Membro em cujo território reside o beneficiário da segurança social, o artigo 22.°, n.° 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.° 1408/71, na sua versão alterada e actualizada pelo Regulamento n.° 118/97, conforme alterado pelo Regulamento n.° 1992/2006, deve ser interpretado no sentido de que uma autorização solicitada ao abrigo do n.° 1, alínea c), i), do mesmo artigo não pode ser recusada:
– se, quando as prestações previstas pela legislação nacional são objecto de uma lista que não menciona expressamente e precisamente o método de tratamento aplicado, mas define os tipos de tratamento assumidos pela instituição competente, se determinar, em aplicação dos princípios de interpretação usuais e na sequência de um exame baseado em critérios objectivos e não discriminatórios, tendo em conta todos os elementos médicos pertinentes e os dados científicos disponíveis, que esse método de tratamento corresponde a tipos de tratamento mencionados nessa lista; e
– se um tratamento alternativo que apresente o mesmo grau de eficácia não puder ser ministrado em tempo oportuno no Estado‑Membro em cujo território reside o beneficiário da segurança social.
O mesmo artigo opõe‑se a que os órgãos nacionais chamados a pronunciar‑se sobre um pedido de autorização prévia presumam, ao aplicar essa disposição, que os cuidados hospitalares que não podem ser dispensados no Estado‑Membro em cujo território reside o beneficiário da segurança social não figuram entre as prestações cuja assunção é prevista pela legislação desse Estado e, inversamente, que os cuidados hospitalares que figuram entre essas prestações podem ser ministrados no referido Estado‑Membro.
4) Quando tiver sido demonstrado que a recusa de concessão de uma autorização pedida ao abrigo do artigo 22.°, n.° 1, alínea c), i), do Regulamento n.° 1408/71, na sua versão alterada e actualizada pelo Regulamento n.° 118/97, conforme alterado pelo Regulamento n.° 1992/2006, não era fundada, os cuidados hospitalares já tiverem sido prestados e os custos correspondentes suportados pelo beneficiário da segurança social, o órgão jurisdicional nacional deve obrigar a instituição competente, de acordo com as regras processuais nacionais, a reembolsar ao referido beneficiário o montante que teria normalmente sido pago por esta última se a autorização tivesse sido devidamente concedida.
O referido montante é igual ao determinado segundo as disposições da legislação à qual está sujeita a instituição do Estado‑Membro em cujo território foram dispensados os cuidados hospitalares. Se esse montante for inferior ao que teria resultado da aplicação da legislação em vigor no Estado‑Membro de residência em caso de hospitalização neste último, deve ainda ser concedido ao beneficiário da segurança social um reembolso complementar, a cargo da instituição competente, correspondente à diferença entre esses dois montantes, no limite das despesas realmente efectuadas.
Assinaturas
* Língua do processo: búlgaro.