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Document 62001CJ0108

Acórdão do Tribunal de 20 de Maio de 2003.
Consorzio del Prosciutto di Parma e Salumificio S. Rita SpA contra Asda Stores Ltd e Hygrade Foods Ltd.
Pedido de decisão prejudicial: House of Lords - Reino Unido.
Denominações de origem protegidas - Regulamento (CEE) n.º2081/92 - Regulamento (CE) n.º1107/96 - Prosciutto di Parma - Caderno de especificações - Condição de corte e de embalagem do presunto na região de produção - Artigos 29.ºCE e 30.ºCE - Justificação - Oponibilidade da condição a terceiros - Segurança jurídica - Publicidade.
Processo C-108/01.

Colectânea de Jurisprudência 2003 I-05121

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2003:296

62001J0108

Acórdão do Tribunal de 20 de Maio de 2003. - Consorzio del Prosciutto di Parma e Salumificio S. Rita SpA contra Asda Stores Ltd e Hygrade Foods Ltd. - Pedido de decisão prejudicial: House of Lords - Reino Unido. - Denominações de origem protegidas - Regulamento (CEE) n.º2081/92 - Regulamento (CE) n.º1107/96 - Prosciutto di Parma - Caderno de especificações - Condição de corte e de embalagem do presunto na região de produção - Artigos 29.ºCE e 30.ºCE - Justificação - Oponibilidade da condição a terceiros - Segurança jurídica - Publicidade. - Processo C-108/01.

Colectânea da Jurisprudência 2003 página I-05121


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1. Agricultura - Legislações uniformes - Protecção das indicações geográficas e das denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios - Utilização de uma denominação de origem protegida subordinada à condição de realização de operações tais como o corte e a embalagem do produto na região de produção - Admissibilidade

(Regulamento n.° 2081/92 do Conselho)

2. Livre circulação de mercadorias - Restrições quantitativas à exportação - Medidas de efeito equivalente - Utilização da denominação de origem protegida «Prosciutto di Parma» subordinada, por uma medida comunitária, à condição de o produto ser cortado e embalado na região de produção - Justificação - Protecção da propriedade industrial e comercial - Medida necessária e proporcionada de natureza a preservar a reputação da denominação de origem - Oponibilidade aos operadores económicos - Inexistência por falta de publicidade adequada

(Artigos 29.° CE e 30.° CE; Regulamento n.° 1107/96 da Comissão)

Sumário


1. O Regulamento n.° 2081/92, relativo à protecção das indicações geográficas e denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que a utilização de uma denominação de origem protegida seja subordinada à condição de que determinadas operações, como o corte e a embalagem do produto, sejam efectuadas na região de produção, desde que essa condição esteja prevista no caderno de especificações.

Com efeito, o artigo 4.° do referido regulamento, que subordina o benefício de uma denominação de origem protegida à conformidade do produto com um caderno de especificações e enumera, de forma não exaustiva, os elementos que este deve incluir, não exclui de modo nenhum que sejam adoptadas regras técnicas específicas aplicáveis às operações que levam a diferentes apresentações de um mesmo produto no mercado, por forma a que o produto, por um lado, satisfaça, em relação a cada uma dessas apresentações, o critério de qualidade que os consumidores têm tendência a privilegiar há vários anos, e, por outro, ofereça a garantia de uma origem geográfica determinada.

( cf. n.os 43, 44, 48, 50, disp. 1 )

2. O facto de o Regulamento n.° 1107/96, relativo ao registo, nomeadamente, da denominação de origem protegida «Prosciutto di Parma», subordinar a utilização desta denominação para o presunto comercializado em fatias à condição de as operações de corte e de embalagem serem efectuadas na região de produção tem por efeito restringir especificamente as correntes de exportação do presunto susceptível de beneficiar dessa denominação e estabelecer assim uma diferença de tratamento entre o comércio interno de um Estado-Membro e o seu comércio de exportação e constitui assim uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à exportação na acepção do artigo 29.° CE.

Uma condição deste tipo pode, no entanto, considerar-se justificada nos termos da protecção da propriedade industrial e comercial e, por conseguinte, compatível com o artigo 29.° CE, uma vez que tem como objectivo preservar a reputação do presunto de Parma mediante um reforço do controlo das suas características particulares e da sua qualidade, constituindo assim uma medida que protege a denominação de que beneficia o conjunto dos operadores em causa e que reveste para estes uma importância determinante, e que a restrição daí resultante pode ser considerada necessária para a realização do objectivo prosseguido, no sentido de que não existem medidas alternativas menos restritivas susceptíveis de o alcançar.

Contudo, a condição em causa não é oponível aos operadores económicos, por não ter sido levada ao seu conhecimento através de uma publicidade adequada na regulamentação comunitária.

( cf. n.os 58, 59, 78, 79, 81, 99, disp. 2-3 )

Partes


No processo C-108/01,

que tem por objecto um pedido dirigido ao Tribunal de Justiça, nos termos do artigo 234.° CE, pela House of Lords (Reino Unido), destinado a obter, no litígio pendente neste órgão jurisdicional entre

Consorzio del Prosciutto di Parma,

Salumificio S. Rita SpA

e

Asda Stores Ltd,

Hygrade Foods Ltd,

uma decisão a título prejudicial sobre a interpretação dos Regulamentos (CEE) n.° 2081/92 do Conselho, de 14 de Julho de 1992, relativo à protecção das indicações geográficas e denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios (JO L 208, p. 1), alterado pelo Acto relativo às condições de adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 1994, C 241, p. 21, e JO 1995, L 1, p. 1), e (CE) n.° 1107/96 da Comissão, de 12 de Junho de 1996, relativo ao registo das indicações geográficas e denominações de origem nos termos do procedimento previsto no artigo 17.° do Regulamento n.° 2081/92 (JO L 148, p. 1),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: G. C. Rodríguez Iglesias, presidente, J.-P. Puissochet, M. Wathelet, R. Schintgen e C. W. A. Timmermans, presidentes de secção, C. Gulmann (relator), D. A. O. Edward, P. Jann, V. Skouris, F. Macken, N. Colneric, S. von Bahr e J. N. Cunha Rodrigues, juízes,

advogado-geral: S. Alber,

secretário: M.-F. Contet, administradora principal,

vistas as observações escritas apresentadas:

- em representação do Consorzio del Prosciutto di Parma e da Salumificio S. Rita SpA, por F. Capelli, avvocato, e A. Barone, solicitor,

- em representação da Asda Stores Ltd e da Hygrade Foods Ltd, por N. Green, QC, e M. Hoskins, barrister, mandatados por Eversheds, solicitors, e por Clarke Willmott e Clarke, solicitors,

- em representação do Governo do Reino Unido, por G. Amodeo, na qualidade de agente, assistida por C. Lewis, barrister,

- em representação do Governo espanhol, por M. López-Monís Gallego, na qualidade de agente,

- em representação do Governo francês, por G. de Bergues e L. Bernheim, na qualidade de agentes,

- em representação do Governo italiano, por U. Leanza, na qualidade de agente, assistido por O. Fiumara, avvocato dello Stato,

- em representação da Comissão das Comunidades Europeias, por J. L. Iglesias Buhigues, C. O'Reilly e A.-M. Rouchaud, na qualidade de agentes,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações do Consorzio del Prosciutto di Parma e da Salumificio S. Rita SpA, da Asda Stores Ltd, da Hygrade Foods Ltd, dos Governos francês e italiano, e da Comissão, na audiência de 19 de Fevereiro de 2002,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 25 de Abril de 2002,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por despacho de 8 de Fevereiro de 2001, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 7 de Março seguinte, a House of Lords colocou, nos termos do artigo 234.° CE, uma questão prejudicial sobre a interpretação dos Regulamentos (CEE) n.° 2081/92 do Conselho, de 14 de Julho de 1992, relativo à protecção das indicações geográficas e denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios (JO L 208, p. 1), alterado pelo Acto relativo às condições de adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia (JO 1994, C 241, p. 21, e JO 1995, L 1, p. 1, a seguir «Regulamento n.° 2081/92»), e (CE) n.° 1107/96 da Comissão, de 12 de Junho de 1996, relativo ao registo das indicações geográficas e denominações de origem nos termos do procedimento previsto no artigo 17.° do Regulamento n.° 2081/92 (JO L 148, p. 1).

2 Esta questão foi colocada no quadro de um litígio que opõe, por um lado, o Consorzio del Prosciutto di Parma (a seguir «Consorzio»), associação de produtores de presunto de Parma, com sede em Itália, assim como a Salumificio S. Rita SpA (a seguir «Salumificio»), sociedade igualmente com sede em Itália, produtora de presunto de Parma e membro do Consorzio, e, por outro lado, a Asda Stores Ltd (a seguir «Asda»), sociedade com sede no Reino Unido, que explora supermercados, assim como a Hygrade Foods Ltd (a seguir «Hygrade»), igualmente com sede no Reino Unido, importadora de presunto de Parma, a propósito da comercialização no Reino Unido, sob a denominação de origem protegida «Prosciutto di Parma» (a seguir «DOP presunto de Parma»), de presunto de Parma cortado em fatias e embalado neste Estado-Membro.

Enquadramento jurídico

Legislação nacional

3 O artigo 1.° da legge n.° 26, tutela della denominazione di origine «Prosciutto di Parma» (Lei n.° 26, relativa à protecção da denominação de origem «presunto de Parma»), de 13 de Fevereiro de 1990 (GURI n.° 42, de 20 de Fevereiro de 1990, p. 3, a seguir «Lei de 13 de Fevereiro de 1990»), reserva a denominação «presunto de Parma» exclusivamente ao presunto que ostenta uma marca distintiva que permite a sua identificação em qualquer momento, obtido a partir de pernas frescas de porcos criados e abatidos na Itália continental, e que é produzido em conformidade com as disposições legais após uma cura na área de produção típica, durante um período mínimo prescrito por lei.

4 O artigo 2.° da Lei de 13 de Fevereiro de 1990 define a área de produção típica como a parte relevante da província de Parma. O artigo 3.° enuncia as características específicas do presunto de Parma, nomeadamente o seu peso, a sua cor, o seu aroma e o seu sabor.

5 O artigo 6.° da mesma lei dispõe que:

- após ter sido aposta a marca, o presunto de Parma pode ser vendido desossado e em pedaços de diversos pesos e formas, ou cortado em fatias e embalado de maneira adequada;

- se não for possível conservar a marca no produto, a mesma deve ser indelevelmente aposta de forma a que não possa ser apagada da embalagem, sob o controlo do órgão competente e segundo métodos determinados pelo regulamento de execução;

- neste último caso, as operações de acondicionamento são efectuadas na área de produção típica indicada no artigo 2.°

6 O artigo 11.° dispõe que os ministros competentes podem fazer-se assistir por um consórcio de produtores para efeitos de vigilância e de controlo.

7 O artigo 25.° do decreto n.° 253, regolamento di esecuzione della legge 13 febbraio 1990, n.° 26 (Decreto n.° 253, que regulamenta a execução da Lei n.° 26 de 13 de Fevereiro de 1990), de 15 de Fevereiro de 1993 (GURI n.° 173, de 26 de Julho de 1993, p. 4, a seguir «Decreto de 15 de Fevereiro de 1993»), prevê que a operação de corte e a embalagem do presunto de Parma devem ser efectuadas em instalações situadas na área de produção típica e aprovadas pelo consórcio.

8 O artigo 26.° do mesmo decreto impõe a presença de representantes do consórcio quando do corte e da embalagem do produto.

9 O Decreto de 15 de Fevereiro de 1993 contém igualmente disposições respeitantes ao acondicionamento e à rotulagem.

10 Nos termos de um Decreto de 12 de Abril de 1994, foi confiado ao Consorzio uma missão de controlo da aplicação das disposições relativas à denominação de origem «presunto de Parma».

Direito comunitário

11 O artigo 29.° CE dispõe:

«São proibidas, entre os Estados-Membros, as restrições quantitativas à exportação, bem como todas as medidas de efeito equivalente.»

12 Nos termos do artigo 30.° CE, o artigo 29.° CE é aplicável sem prejuízo das proibições ou restrições à exportação justificadas por razões, nomeadamente, de protecção da propriedade industrial e comercial.

13 O artigo 2.° do Regulamento n.° 2081/92 dispõe:

«1. A protecção comunitária das denominações de origem e das indicações geográficas dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios será obtida em conformidade com o disposto no presente regulamento.

2. Na acepção do presente regulamento, entende-se por:

a) Denominação de origem, o nome de uma região, de um local determinado ou, em casos excepcionais, de um país, que serve para designar um produto agrícola ou um género alimentício:

- originário dessa região, desse local determinado ou desse país e

- cuja qualidade ou características se devem essencial ou exclusivamente ao meio geográfico, incluindo os factores naturais e humanos, e cuja produção, transformação e elaboração ocorrem na área geográfica delimitada;

[...]»

14 O artigo 4.° do mesmo regulamento precisa:

«1. Para poder beneficiar de uma denominação de origem protegida (DOP) [...] um produto agrícola ou um género alimentício deve obedecer a especificações.

2. As especificações do produto deverão incluir, pelo menos:

a) O nome do produto agrícola ou do género alimentício, incluindo a denominação de origem [...];

b) A descrição do produto agrícola ou do género alimentício, incluindo as matérias-primas se for caso disso, as principais características físicas, químicas, microbiológicas e/ou organolépticas do produto ou do género alimentício;

c) A delimitação da área geográfica [...];

d) Os elementos que provem que o produto agrícola ou o género alimentício são originários da área geográfica, na acepção do n.° 2, alínea a) ou b) do artigo 2.° [...];

e) A descrição do método de obtenção do produto e, se for caso disso, dos métodos locais, leais e constantes;

f) Os elementos que justificam a relação com o meio geográfico ou a origem geográfica na acepção do n.° 2, alínea a), [...] do artigo 2.° [...];

g) As referências relativas à ou às estruturas de controlo previstas no artigo 10.° ;

h) Os elementos específicos da rotulagem relacionados com a menção DOP [...] ou as menções tradicionais nacionais equivalentes;

i) As eventuais exigências fixadas por disposições comunitárias e/ou nacionais.»

15 Os artigos 5.° a 7.° prevêem um procedimento normal de registo das DOP. Este procedimento inclui a apresentação de um pedido à Comissão, por intermédio de um Estado-Membro (artigo 5.° , n.os 4 e 5). Este pedido é acompanhado das especificações referidas no artigo 4.° (artigo 5.° , n.° 3). A Comissão verificará se o pedido inclui todos os elementos previstos no artigo 4.° (artigo 6.° , n.° 1). Se concluir pela positiva, fará publicar no Jornal Oficial das Comunidades Europeias, nomeadamente, o nome do produto, os elementos principais do pedido e as referências às disposições nacionais que regem a sua elaboração, a sua produção ou o seu fabrico (artigo 6.° , n.° 2). Qualquer Estado-Membro ou qualquer pessoa singular ou colectiva legitimamente interessada pode opor-se ao registo, sendo a oposição então examinada segundo um procedimento determinado (artigo 7.° ). Na falta de oposição, a Comissão regista a denominação e publica-a no Jornal Oficial das Comunidades Europeias (artigo 6.° , n.os 3 e 4).

16 O artigo 8.° enuncia:

«As menções DOP [...] ou as menções tradicionais nacionais equivalentes deverão constar apenas dos produtos agrícolas e géneros alimentícios que obedeçam ao presente regulamento.»

17 O artigo 10.° , n.° 1, dispõe:

«Os Estados-Membros assegurarão que, o mais tardar seis meses depois da data de entrada em vigor do presente regulamento, tenham sido criadas estruturas de controlo, cuja função consistirá em garantir que os produtos agrícolas e géneros alimentícios que comportem uma denominação protegida, satisfaçam as condições formuladas nos cadernos de especificações e obrigações.»

18 O artigo 13.° , n.° 1, alínea a), prevê que as denominações registadas se encontram protegidas contra qualquer utilização comercial directa ou indirecta de uma denominação registada para produtos não abrangidos pelo registo, na medida em que esses produtos sejam comparáveis a produtos registados sob essa denominação, ou na medida em que a utilização dessa denominação explore a reputação da mesma.

19 O artigo 17.° organiza um procedimento simplificado de registo de denominações já legalmente protegidas:

«1. No prazo de seis meses seguinte à data de entrada em vigor do presente regulamento, os Estados-Membros comunicarão à Comissão quais são, de entre as suas denominações legalmente protegidas [...], as que desejam registar ao abrigo do presente regulamento.

2. Em conformidade com o parecer do artigo 15.° [assistência de um comité composto de representantes dos Estados-Membros e, eventualmente, intervenção do Conselho], a Comissão registará as denominações referidas no n.° 1 que correspondam aos requisitos dos artigos 2.° e 4.° do presente regulamento. O artigo 7.° [relativo ao direito de oposição] não é aplicável. [...]

3. Os Estados-Membros podem manter a protecção nacional das denominações comunicadas em conformidade com o n.° 1 até à data em que for tomada uma decisão sobre o registo.»

20 O Regulamento n.° 1107/96, que entrou em vigor em 21 de Junho de 1996, regista, designadamente, a DOP «presunto de Parma», sob a rubrica «Produtos à base de carne».

21 Em 26 de Outubro de 1996, a Comissão publicou no Jornal Oficial das Comunidades Europeias uma comunicação sobre as estruturas de controlo comunicadas pelos Estados-Membros nos termos do n.° 2 do artigo 10.° do Regulamento n.° 2081/92 (JO C 317, p. 3). Esta publicação destina-se a divulgar as estruturas de controlo correspondentes a cada indicação geográfica ou denominação de origem registada ao abrigo do Regulamento n.° 2081/92. No que se refere à DOP «presunto de Parma», indica o Consorzio, cujo endereço especifica.

Litígio no processo principal

22 A Asda explora uma cadeia de supermercados no Reino Unido, nos quais vende, nomeadamente, presunto com a denominação «presunto de Parma», comprado previamente cortado na Hygrade, que, por seu turno, compra o presunto desossado, mas não cortado, a um produtor italiano membro do Consorzio. O presunto é cortado em fatias e embalado hermeticamente pela Hygrade em pacotes contendo cinco fatias cada um.

23 Os pacotes contêm a seguinte menção: «ASDA A taste of Italy PARMA HAM Genuine Italian Parma Ham» («ASDA O sabor da Itália PRESUNTO DE PARMA Autêntico presunto de Parma italiano»).

24 No verso dos pacotes, figuram as menções «PARMA HAM All authentic Asda continental meats are made by traditional methods to guarantee their authentic flavour and quality» («PRESUNTO DE PARMA Todas as carnes continentais autênticas da Asda são preparadas segundo os métodos tradicionais para garantir o seu sabor e a sua qualidade autênticos») e «Produced in Italy, packed in UK for Asda Stores Limited» («Produzido em Itália, embalado no Reino Unido para Asda Stores Limited»).

25 Em 14 de Novembro de 1997, o Consorzio instaurou no Reino Unido uma acção judicial contra a Asda e a Hygrade, para que fossem emitidas contra estas diversas intimações com vista, essencialmente, a que as mesmas pusessem termo às suas actividades, com o fundamento de que eram contrárias aos regulamentos aplicáveis ao presunto de Parma.

26 Em 17 de Novembro de 1997, o Consorzio requereu contra estas sociedades uma providência cautelar, pedindo que fossem proferidas as intimações requeridas no pedido principal e nas suas alegações.

27 A Asda e a Hygrade concluíram no sentido da improcedência dos pedidos, sustentando, em especial, que o Regulamento n.° 2081/92 e/ou o Regulamento n.° 1107/96 não conferiam ao Consorzio os direitos por ele invocados.

28 Os pedidos foram julgados improcedentes.

29 O Consorzio interpôs recurso para a Court of Appeal (England & Wales) (Reino Unido). A Salumificio foi autorizada a intervir neste processo. Foi negado provimento ao recurso em 1 de Dezembro de 1998.

30 O Consorzio e a Salumificio recorreram então para a House of Lords.

31 Considerando que a solução do litígio dependia da interpretação dos Regulamentos n.os 2081/92 e 1107/96, a House of Lords decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça a questão prejudicial seguinte:

«O Regulamento (CEE) n.° 2081/92 do Conselho, como instrumento de direito comunitário, conjugado com o Regulamento (CE) n.° 1107/96 da Comissão e com as especificações da denominação de origem protegida Prosciutto di Parma, cria um direito válido directamente invocável nos tribunais dos Estados-Membros, para restringir a venda a retalho como presunto de Parma de fatias e embalagens de presunto derivado de presuntos devidamente exportados de Parma de acordo com as condições da denominação de origem protegida, mas que não foi posteriormente cortado, embalado e rotulado de acordo com as especificações?»

Quanto à questão prejudicial

32 Importa observar, a título liminar, que o caderno de especificações, com base no qual a DOP «presunto de Parma» foi registada pelo Regulamento n.° 1107/96, menciona expressamente a exigência de corte e de embalagem do produto na região de produção no que se refere ao presunto comercializado em fatias e refere a Lei de 13 de Fevereiro de 1990 assim como o Decreto de 15 de Fevereiro de 1993 como exigências a respeitar nos termos de disposições nacionais, na acepção do artigo 4.° , n.° 2, alínea i), do Regulamento n.° 2081/92.

33 Ainda a título liminar, cumpre observar que, no processo principal, estão em causa operações de corte e de embalagem realizadas numa fase diferente das fases da venda a retalho e da restauração, relativamente às quais não se contesta a inaplicabilidade da condição de realização das referidas operações na região de produção.

34 Assim, quando, no presente acórdão, se fizer referência à condição de corte e de embalagem na região de produção, apenas estão em causa as operações de corte e de embalagem efectuadas numa fase diferente das fases da venda a retalho e da restauração.

35 À luz destas observações, a questão prejudicial abrange essencialmente quatro elementos.

36 O primeiro elemento diz respeito à questão de saber se o Regulamento n.° 2081/92 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que a utilização de uma DOP seja subordinada à condição de que determinadas operações, como o corte e a embalagem do produto, sejam realizadas na região de produção.

37 O segundo elemento diz respeito à questão de saber se a subordinação a essa condição da utilização da DOP «presunto de Parma» no presunto comercializado em fatias constitui uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à exportação na acepção do artigo 29.° CE.

38 O terceiro elemento diz respeito à questão de saber se, em caso de resposta afirmativa, a condição em causa pode ser considerada justificada e, por conseguinte, compatível com esta última disposição.

39 Por último, o quarto elemento diz respeito à questão de saber se esta condição é oponível aos operadores económicos, apesar de não ter sido levada ao seu conhecimento.

Quanto à possibilidade de subordinar a utilização de uma DOP à condição de que determinadas operações, como o corte e a embalagem do produto, sejam realizadas na região de produção

40 O Consorzio, a Salumificio, os Governos espanhol, francês e italiano, bem como a Comissão consideram, em substância, que o Regulamento n.° 2081/92 permite, em princípio, que os produtores possam subordinar a utilização da DOP à condição de que determinadas operações, como o corte e a embalagem do produto, sejam realizadas na região de produção.

41 A Asda e a Hygrade duvidam que essa condição possa fazer parte, seja de que maneira for, da regulamentação comunitária. O Governo do Reino Unido considera que o Regulamento n.° 2081/92 não confere aos produtores o direito de proibir a venda sob a DOP de um produto cortado e embalado fora da região de produção.

42 A este propósito, resulta quer da letra quer da economia do Regulamento n.° 2081/92 que o caderno de especificações é o instrumento que determina o alcance da protecção uniforme que esse regulamento instaura na Comunidade.

43 Com efeito, o artigo 4.° , n.° 1, do Regulamento n.° 2081/92 subordina o benefício de uma DOP à conformidade do produto com um caderno de especificações. O artigo 8.° do mesmo regulamento subordina a aposição da menção «DOP» num produto à conformidade do mesmo com o referido regulamento e, consequentemente, com o caderno de especificações, determinando depois o artigo 13.° o conteúdo da protecção uniforme conferida à denominação registada. O artigo 10.° , n.° 1, precisa que a função da estrutura de controlo criada em cada Estado-Membro consiste em garantir que os produtos que comportem uma DOP satisfaçam as condições do caderno de especificações.

44 Em conformidade com o artigo 4.° , n.° 2, do Regulamento n.° 2081/92, o caderno de especificações inclui, pelo menos, os elementos enumerados, de maneira não exaustiva, nessa disposição.

45 Inclui portanto, nomeadamente, os elementos referidos nas alíneas b), d), e), h) e i), desta disposição, a saber:

- a descrição do produto, as suas principais características físicas, químicas, microbiológicas e/ou organolépticas;

- os elementos que provem que o produto é originário de uma área geográfica delimitada;

- a descrição do método de obtenção do produto e, se for caso disso, dos métodos locais, leais e constantes;

- os elementos específicos da rotulagem relacionados com a menção «DOP»;

- as eventuais exigências fixadas por disposições comunitárias e/ou nacionais.

46 O caderno de especificações comporta, assim, a definição pormenorizada do produto protegido, estabelecida pelos produtores interessados, sob controlo do Estado-Membro que o transmite, e posteriormente da Comissão, que regista a DOP, no quadro do procedimento normal dos artigos 5.° a 7.° ou do procedimento simplificado do artigo 17.° do Regulamento n.° 2081/92.

47 Esta definição determina simultaneamente o alcance das obrigações a respeitar para efeitos da utilização da DOP e, como seu corolário, o alcance do direito protegido em relação a terceiros como efeito do registo da DOP, o qual consagra, a nível comunitário, regras enunciadas ou visadas no caderno de especificações.

48 A este propósito, observe-se que a letra do artigo 4.° do Regulamento n.° 2081/92 não exclui de modo nenhum que sejam adoptadas regras técnicas específicas aplicáveis às operações que levam a diferentes apresentações de um mesmo produto no mercado, por forma a que o produto, por um lado, satisfaça, em relação a cada uma dessas apresentações, o critério de qualidade que os consumidores, nos termos do terceiro considerando deste regulamento, têm tendência a privilegiar há vários anos, e, por outro, ofereça a garantia de uma origem geográfica determinada, cada vez mais procurada, segundo o mesmo considerando.

49 Tendo em conta estes dois objectivos, podem, por conseguinte, ser adoptadas regras técnicas específicas para operações como o corte e a embalagem do produto.

50 Importa portanto concluir que o Regulamento n.° 2081/92 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que a utilização de uma DOP seja subordinada à condição de que determinadas operações, como o corte e a embalagem do produto, sejam efectuadas na região de produção, desde que essa condição esteja prevista no caderno de especificações.

Quanto à natureza de medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à exportação da condição de corte e de embalagem do produto na região de produção relativamente à DOP «presunto de Parma»

51 A Asda e a Hygrade alegam que as condições relativas ao acondicionamento de um produto são susceptíveis de constituir restrições na acepção dos artigos 28.° CE e 29.° CE. Em particular, a aplicação no Reino Unido de uma regra nos termos da qual o presunto de Parma comercializado em fatias só pode beneficiar da DOP se tiver sido cortado e embalado na região de produção é manifestamente susceptível de entravar directa ou indirectamente, actual ou potencialmente, o comércio intracomunitário.

52 O Governo do Reino Unido considera que a condição em causa no processo principal constitui uma restrição quantitativa à exportação.

53 A este respeito, recorde-se que, segundo jurisprudência assente, a proibição das restrições quantitativas, bem como das medidas de efeito equivalente, aplica-se não apenas relativamente às medidas nacionais mas também relativamente às medidas adoptadas pelas instituições comunitárias (v., nomeadamente, acórdãos de 25 de Junho de 1997, Kieffer e Thill, C-114/96, Colect., p. I-3629, n.° 27, e de 13 de Setembro de 2001, Schwarzkopf, C-169/99, Colect., p. I-5901, n.° 37).

54 O artigo 29.° CE proíbe todas as medidas que tenham por objecto ou por efeito restringir especificamente as correntes de exportação e estabelecer assim uma diferença de tratamento entre o comércio interno de um Estado-Membro e o seu comércio de exportação, de modo a assegurar uma vantagem especial à produção nacional ou ao mercado interno do Estado interessado (v., nomeadamente, a propósito de medidas nacionais, acórdão de 23 de Maio de 2000, Sydhavnens Sten & Grus, C-209/98, Colect., p. I-3743, n.° 34).

55 Conforme referido no n.° 32 do presente acórdão, o caderno de especificações da DOP «presunto de Parma» menciona expressamente a exigência de corte e de embalagem do produto na região de produção para o presunto comercializado em fatias e refere a Lei de 13 de Fevereiro de 1990 assim como o Decreto de 15 de Fevereiro de 1993 como exigências fixadas por disposições nacionais, na acepção do artigo 4.° , n.° 2, alínea i), do Regulamento n.° 2081/92. Na medida em que regista a DOP «presunto de Parma», o Regulamento n.° 1107/96 faz do corte e da embalagem na região de produção uma condição de utilização da DOP «presunto de Parma» no presunto comercializado em fatias.

56 Esta condição tem como consequência que o presunto produzido na região de produção, que preencha as outras condições exigidas para poder beneficiar da DOP «presunto de Parma», não pode ser cortado fora da referida região, sob pena de não poder usar essa denominação.

57 Em contrapartida, o presunto de Parma transportado no interior da região de produção conserva o seu direito à DOP quando seja aí cortado e embalado em conformidade com as regras referidas no caderno de especificações.

58 Assim, estas regras têm por efeito restringir especificamente as correntes de exportação do presunto susceptível de beneficiar da DOP «presunto de Parma» e estabelecer assim uma diferença de tratamento entre o comércio interno de um Estado-Membro e o seu comércio de exportação. Desta forma, implicam restrições quantitativas à exportação na acepção do artigo 29.° CE (v., no mesmo sentido, acórdão de 16 de Maio de 2000, Bélgica/Espanha, C-388/95, Colect., p. I-3123, n.os 38 e 40 a 42).

59 Deve portanto concluir-se que a subordinação da utilização da DOP «presunto de Parma», no presunto comercializado em fatias, à condição de as operações de corte e de embalagem serem efectuadas na região de produção constitui uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à exportação na acepção do artigo 29.° CE.

Quanto à justificação da condição de corte e de embalagem do produto na região de produção

60 O Consorzio, a Salumificio, os Governos espanhol e italiano assim como a Comissão alegam que, no acórdão Bélgica/Espanha, já referido, o Tribunal de Justiça decidiu que uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à exportação, constituída pela obrigação de engarrafar um vinho de denominação de origem na sua região de produção, para poder utilizar a denominação de origem, era justificada, uma vez que tinha em vista preservar a reputação da denominação, garantindo, além da autenticidade do produto, a manutenção das suas qualidades e características. Consideram que a jurisprudência resultante deste acórdão pode ser transposta para a condição de corte e de embalagem do presunto de Parma na região de produção, dado que esta condição é justificada pela finalidade da garantia da autenticidade e da qualidade do produto. O Governo francês sublinha que esta condição permite garantir que o produto é originário da área geográfica.

61 A Asda, a Hygrade e o Governo do Reino Unido afirmam que as operações de corte e de embalagem não afectam a qualidade do presunto de Parma e não prejudicam a sua autenticidade. Baseando-se nesta premissa, o Governo do Reino Unido considera que a abordagem do acórdão Bélgica/Espanha, já referido, que seria efectivamente de seguir no presente processo, deve conduzir a uma solução contrária à consignada nesse acórdão.

62 A título liminar, deve recordar-se que, nos termos do artigo 30.° CE, o artigo 29.° CE não prejudica as proibições ou restrições à exportação justificadas por razões, nomeadamente, de protecção da propriedade industrial e comercial.

63 Importa referir que a legislação comunitária manifesta uma tendência geral para valorizar a qualidade dos produtos no quadro da política agrícola comum, de modo a favorecer a reputação dos mesmos, graças, designadamente, à utilização de denominações de origem que são objecto de uma protecção particular (v. acórdão Bélgica/Espanha, já referido, n.° 53). Esta tendência concretizou-se no sector dos vinhos de qualidade, com a adopção do Regulamento (CEE) n.° 823/87 do Conselho, de 16 de Março de 1987, que estabelece disposições especiais relativas aos vinhos de qualidade produzidos em regiões determinadas (JO L 84, p. 59), revogado e substituído pelo Regulamento (CE) n° 1493/1999 do Conselho, de 17 de Maio de 1999, que estabelece a organização comum do mercado vitivinícola (JO L 179, p. 1). Manifestou-se igualmente, em relação a outros produtos agrícolas, com a adopção do Regulamento n.° 2081/92, que, à luz dos seus considerandos, visa, nomeadamente, satisfazer as expectativas dos consumidores em matéria de produtos de qualidade e de uma origem geográfica determinada, bem como facilitar a obtenção pelos produtores, em condições de concorrência iguais, de melhores rendimentos em contrapartida de um real esforço qualitativo.

64 As denominações de origem integram os direitos de propriedade industrial e comercial. A regulamentação aplicável protege os seus beneficiários contra uma utilização abusiva das referidas denominações por terceiros que pretendam aproveitar-se da reputação que as mesmas adquiriram. Visam garantir que o produto que as ostenta provém de uma zona geográfica determinada e apresenta certas características particulares. São susceptíveis de gozar de grande reputação junto dos consumidores e constituir, para os produtores que preencham as condições da sua utilização, um meio fundamental de fidelizar a clientela. A reputação das denominações de origem é função da imagem de que estas gozam junto dos consumidores. Essa imagem, por seu turno, depende essencialmente das características específicas e, mais geralmente, da qualidade do produto. É esta última que está na base, em definitivo, da reputação do produto (v. acórdão Bélgica/Espanha, já referido, n.os 54 a 56). Na percepção do consumidor, a ligação entre a reputação dos produtores e a qualidade dos produtos depende, além disso, da sua convicção de que os produtos vendidos sob a denominação de origem são autênticos.

65 O caderno de especificações da DOP «presunto de Parma», ao impor a realização do corte e da embalagem na região de produção, tem em vista permitir aos beneficiários da DOP conservar o controlo de uma das apresentações do produto no mercado. A condição que estabelece tem por objectivo garantir uma melhor salvaguarda da qualidade e da autenticidade do produto, bem como, consequentemente, da reputação da DOP, de que os beneficiários assumem, plena e colectivamente, a responsabilidade.

66 Neste contexto, uma condição como a que está aqui em causa deve ser considerada conforme ao direito comunitário, apesar dos seus efeitos restritivos sobre as trocas comerciais, se se demonstrar que constitui um meio necessário e proporcionado susceptível de preservar a reputação da DOP «presunto de Parma» (v., no mesmo sentido, acórdão Bélgica/Espanha, já referido, n.os 58 e 59).

67 Quanto a este aspecto, importa referir que o presunto de Parma é consumido principalmente em fatias e que todas as operações que conduzem a essa apresentação são concebidas para obter, em especial, um paladar, uma cor e uma textura determinados, que serão apreciados pelo consumidor.

68 O corte e a embalagem do presunto constituem, assim, operações importantes, susceptíveis de prejudicar a qualidade e, por conseguinte, a reputação da DOP, caso sejam realizadas em condições que conduzam a um produto não conforme com as qualidades organolépticas associadas ao mesmo. Estas operações são igualmente susceptíveis de comprometer a garantia de autenticidade do produto, pois têm necessariamente por consequência a eliminação da marcação de origem aposta nas pernas inteiras utilizadas.

69 O caderno de especificações da DOP «presunto de Parma», através das regras que estabelece e das exigências fixadas nas disposições nacionais para as quais remete, institui um dispositivo que regula de maneira detalhada e rigorosa as três fases que conduzem à colocação no mercado de presunto pré-embalado em fatias. A primeira fase comporta a desossagem do presunto, a preparação de peças, a refrigeração e a congelação das mesmas para efeitos das operações de corte. A segunda fase corresponde às operações de corte. A terceira consiste na embalagem do presunto cortado, sob vácuo ou em atmosfera protegida.

70 Devem ser respeitadas três regras principais durante o processo industrial.

71 Em primeiro lugar, após o controlo da autenticidade das pernas de porco utilizadas, deve ser efectuada uma selecção destas. Só as pernas que preenchem determinadas condições adicionais mais restritivas, em particular relativas ao peso, ao tempo de cura, ao teor em água, ao teor de humidade interna, à ausência de defeitos visíveis, podem ser cortadas e embaladas. A selecção prossegue com as diversas fases do processo, quando aparecem anomalias do produto, tais como manchas resultantes de micro-hemorragias, zonas brancas no músculo, ou ainda a presença de gordura intramuscular excessiva, que não podem ser detectadas antes da desossagem ou do corte.

72 Em segundo lugar, todos os operadores da região de produção que pretendam cortar e embalar presunto de Parma devem estar aprovados pela estrutura de controlo, que aprova igualmente os fornecedores de embalagens.

73 Em terceiro lugar, em cada uma das três fases do processo, devem estar presentes representantes da estrutura de controlo. Estes velam permanentemente pelo respeito de todas as prescrições do caderno de especificações, incluindo a marcação do produto em cada fase. No termo das operações, certificam o número de embalagens produzidas.

74 As diferentes fases dão lugar a intervenções técnicas e de controlo muito precisas, que incidem sobre a autenticidade, a qualidade, a higiene e a rotulagem. Algumas carecem de apreciações especializadas, nomeadamente nas fases de refrigeração e de congelação das peças.

75 Neste contexto, deve admitir-se que os controlos efectuados fora da região de produção dariam menos garantias, em termos de qualidade e de autenticidade do produto, do que os efectuados na região de produção no respeito do processo previsto no caderno de especificações (v., no mesmo sentido, acórdão Bélgica/Espanha, já referido, n.° 67). Com efeito, por um lado, os controlos realizados segundo este último procedimento apresentam um carácter profundo e sistemático e são efectuados por profissionais que possuem um conhecimento especializado das características do presunto de Parma. Por outro lado, dificilmente os representantes dos beneficiários da DOP poderiam instaurar eficazmente tais controlos nos outros Estados-Membros.

76 Por conseguinte, o risco para a qualidade e a autenticidade do produto oferecido ao consumidor final é mais importante quando aquele foi cortado e embalado fora da região de produção do que quando o foi no interior desta (v., no mesmo sentido, acórdão Bélgica/Espanha, já referido, n.° 74).

77 Esta conclusão não é posta em causa pela circunstância, sublinhada no presente processo, de o corte do presunto poder ser efectuado, pelo menos sob determinadas condições, por retalhistas e restauradores, fora da região de produção. Com efeito, esta operação deve ser realizada, em princípio, diante do consumidor, ou, pelo menos, este pode exigir que assim seja, a fim de, nomeadamente, verificar a presença da marcação de origem na perna utilizada. Sobretudo, as operações de corte e de embalagem efectuadas a montante da fase da comercialização a retalho ou da restauração constituem, em virtude das quantidades dos produtos em causa, um risco bem mais real para a reputação de uma DOP, em caso de controlo insuficiente da autenticidade do produto e da sua qualidade, do que as operações realizadas por retalhistas ou pessoas da área da restauração.

78 Por conseguinte, a condição de corte e de embalagem na região de produção, que tem como objectivo preservar a reputação do presunto de Parma mediante um reforço do controlo das suas características particulares e da sua qualidade, pode considerar-se justificada enquanto medida que protege a DOP de que beneficia o conjunto dos operadores em causa e que reveste para estes uma importância determinante (v., no mesmo sentido, acórdão Bélgica/Espanha, já referido, n.° 75).

79 A restrição daí resultante pode ser considerada necessária para a realização do objectivo prosseguido, no sentido de que não existem medidas alternativas menos restritivas susceptíveis de o alcançar.

80 A este propósito, a DOP «presunto de Parma» não seria protegida do mesmo modo através de uma obrigação, imposta aos operadores estabelecidos fora da região de produção, de informar os consumidores, mediante rotulagem adequada, de que o corte e a embalagem foram efectuados fora daquela região. Com efeito, o prejuízo para a qualidade ou a autenticidade de um presunto cortado e embalado fora da região de produção, que resultaria da ocorrência dos riscos ligados às operações de corte e de embalagem, poderia prejudicar a reputação de todos os presuntos comercializados sob a DOP «presunto de Parma», incluindo os cortados e embalados na região de produção sob controlo da colectividade beneficiária da DOP (v., no mesmo sentido, acórdão Espanha/Bélgica, já referido, n.os 76 e 77).

81 Deve, portanto, concluir-se que a subordinação da utilização da DOP «presunto de Parma», no presunto comercializado em fatias, à condição de as operações de corte e de embalagem serem efectuadas na região de produção pode considerar-se justificada e, portanto, compatível com o artigo 29.° CE.

Quanto à oponibilidade aos operadores económicos da condição de corte e de embalagem na região de produção

Observações apresentadas ao Tribunal de Justiça

82 O Consorzio e a Salumificio consideram que a condição de corte e de embalagem na região de produção, prevista no caderno de especificações da DOP «presunto de Parma», pode ser invocada nos órgãos jurisdicionais nacionais. Em sua opinião, um operador só poderia alegar a sua ignorância desta condição resultante de actos e disposições às quais não tem acesso, na hipótese de contra ele ser requerida a aplicação de uma sanção. Tal como o Governo italiano, consideram que o operador não pode, em contrapartida, alegar a sua ignorância da condição, quando, como no processo principal, apenas lhe é pedido que ponha termo, no futuro, à venda de presunto de Parma cortado e embalado fora da região de produção. Acrescentam que, em qualquer circunstância, a Asda e a Hygrade não tiveram nenhuma dificuldade, no litígio principal, em obter e utilizar livremente e legalmente todas as informações e documentos necessários, nomeadamente uma versão em inglês do caderno de especificações, disponível desde 1997.

83 O Governo francês alega que, nos termos do artigo 249.° CE, qualquer particular pode invocar directamente um regulamento comunitário num órgão jurisdicional nacional, no âmbito de um processo civil.

84 A Comissão afirma que a ausência de publicação do caderno de especificações resulta da economia do Regulamento n.° 2081/92 e do processo de registo específico posto em prática. Segundo a Comissão, a questão prejudicial colocada toca na própria essência da regulamentação e põe em causa todo o processo de registo previsto no Regulamento n.° 2081/92. A falta de publicação do caderno de especificações resulta de uma opção deliberada do legislador comunitário no quadro do procedimento simplificado. Este procedimento agrupou a totalidade das denominações já protegidas pelas legislações nacionais. As denominações registadas no âmbito da sua aplicação já eram bem conhecidas não apenas do público mas, segundo tudo indica, também dos operadores económicos, fossem eles importadores, distribuidores ou vendedores a retalho. Também é de supor que estes operadores comercializavam os produtos em causa anteriormente ao registo da DOP. A intenção prosseguida pelo legislador comunitário terá sido unicamente conceder às denominações já protegidas no plano nacional o benefício da protecção comunitária, após verificação, pela Comissão, da sua conformidade com os termos e condições dos artigos 2.° e 4.° do Regulamento n.° 2081/92.

85 A Asda e a Hygrade sustentam que uma medida não publicada no Jornal Oficial das Comunidades Europeias não pode ser posta em prática relativamente a um particular, quando, como no processo principal, este não tem qualquer direito legal a obter uma cópia dessa medida, seja na sua língua ou noutra língua. Não obstante o princípio do efeito directo dos regulamentos, previsto no artigo 249.° CE, uma medida comunitária só é susceptível de criar direitos individuais se for suficientemente clara, precisa e incondicional. O alcance e o efeito de uma regulamentação comunitária devem ser claros e previsíveis para os particulares, sob pena de violação dos princípios da segurança jurídica e da transparência. As regras adoptadas devem permitir às pessoas interessadas conhecer precisamente o alcance das obrigações que lhes incumbem. A falta de publicação de um acto constitui obstáculo a que as obrigações previstas nesse acto sejam impostas a um particular. Além disso, uma obrigação imposta pelo direito comunitário deve ser facilmente acessível na língua do Estado-Membro onde deve ser aplicada. Na falta de tradução oficial, uma medida comunitária não pode lesar os direitos dos particulares, tanto no quadro de processos civis como no de processos penais. Se o Consorzio fosse autorizado a fazer respeitar, num órgão jurisdicional nacional, um caderno de especificações não publicado, seriam violados os princípios da segurança jurídica e da transparência. Por conseguinte, as disposições relativas a esse caderno de especificações não podem ter efeito directo.

86 O Governo do Reino Unido afirma que o Regulamento n.° 1107/96 refere unicamente que a denominação «presunto de Parma» é uma DOP. Nada nesta DOP indica que um operador que comprou presunto de Parma não o possa cortar e embalar a fim de o vender ao consumidor. Nada na natureza das operações chama a atenção do operador para o facto de a DOP «presunto de Parma» não poder ser utilizada nas fatias cortadas fora da região de produção a partir de um presunto que ostenta legalmente a DOP. Qualquer proibição de utilizar a DOP «presunto de Parma» deveria ser transparente e facilmente acessível. Os princípios da transparência e da acessibilidade só são respeitados se a restrição puder facilmente ser determinada com fundamento em publicações oficiais da Comunidade.

Resposta do Tribunal de Justiça

87 Recorde-se que, nos termos do artigo 249.° , segundo parágrafo, CE, o regulamento, acto de carácter geral, é obrigatório em todos os seus elementos e directamente aplicável em todos os Estados-Membros.

88 A esse título, cria não só direitos mas também obrigações para os particulares, que estes podem invocar em relação a outros particulares perante os órgãos jurisdicionais nacionais.

89 Não obstante, o imperativo da segurança jurídica implica que a regulamentação comunitária permita aos interessados conhecer com exactidão o alcance das obrigações que a mesma lhes impõe (v. acórdão de 1 de Outubro de 1998, Reino Unido/Comissão, C-209/96, Colect., p. I-5655, n.° 35).

90 O Regulamento n.° 2081/92 enuncia, no seu décimo segundo considerando, que, para beneficiarem de protecção em todos os Estados-Membros, as denominações de origem devem ser registadas ao nível comunitário e que a inscrição num registo permite igualmente assegurar a informação dos profissionais e dos consumidores.

91 Todavia, não prevê a publicação do caderno de especificações ou de elementos deste no quadro do procedimento simplificado.

92 O Regulamento n.° 1107/96 limita-se a prever que a denominação «presunto de Parma» é registada como DOP nos termos do artigo 17.° do Regulamento n.° 2081/92.

93 Ao efectuar esse registo, aquele regulamento consagra a nível comunitário as condições enunciadas ou referidas no caderno de especificações e, nomeadamente, a que impõe a realização das operações de corte e de embalagem na região de produção. Esta condição implica para os terceiros uma obrigação de non facere, a qual é susceptível de ser objecto de um processo civil ou mesmo penal.

94 Ora, conforme admitiram todos os intervenientes que se exprimiram a este propósito no decurso do processo, a protecção conferida por uma DOP não se estende habitualmente a operações como o corte e a embalagem do produto. Essas operações só são proibidas a terceiros, fora da região de produção, se o caderno de especificações previr expressamente uma condição nesse sentido.

95 Nestas circunstâncias, o princípio da segurança jurídica exigia que a condição em causa fosse levada ao conhecimento de terceiros através de uma publicidade adequada na regulamentação comunitária, publicidade que poderia ter sido feita através da menção dessa condição no Regulamento n.° 1107/96.

96 Por não ter sido levada ao conhecimento dos terceiros, a referida condição não lhes é oponível perante um órgão jurisdicional nacional, seja para efeitos de uma sanção penal ou no quadro de um processo civil.

97 Não se pode sustentar utilmente que a publicação das condições contidas nos cadernos de especificações não era necessária no quadro do procedimento simplificado do artigo 17.° do Regulamento n.° 2081/92, dado que as denominações registadas eram já bem conhecidas do público e dos operadores económicos e que a intenção prosseguida pelo legislador comunitário era unicamente alargar ao nível comunitário uma protecção já existente no plano nacional.

98 Com efeito, anteriormente ao Regulamento n.° 2081/92, as denominações de origem eram protegidas por disposições nacionais publicadas e aplicáveis, em princípio, unicamente no território do Estado-Membro que as tinha adoptado, sob reserva de convenções internacionais que alargassem a protecção ao território de outros Estados-Membros, por comum acordo das partes contratantes. Ora, sob esta última reserva, não se pode presumir que, em consequência dessa situação, as condições inerentes às referidas denominações de origem eram necessariamente conhecidas do público e dos operadores económicos de toda a Comunidade, incluindo quanto ao alcance exacto da protecção, determinada por cadernos de especificações e disposições nacionais de conteúdo técnico, redigidas na língua nacional do Estado-Membro considerado.

99 Deve pois concluir-se que a condição de corte e de embalagem do produto na região de produção não é oponível aos operadores económicos, por não ter sido levada ao seu conhecimento através de uma publicidade adequada na regulamentação comunitária.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

100 As despesas efectuadas pelos Governos do Reino Unido, espanhol, francês e italiano, bem como pela Comissão, que apresentaram observações ao Tribunal, não são reembolsáveis. Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional nacional, compete a este decidir quanto às despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

pronunciando-se sobre a questão submetida pela House of Lords, por despacho de 8 de Fevereiro de 2001, declara:

1) O Regulamento (CEE) n.° 2081/92 do Conselho, de 14 de Julho de 1992, relativo à protecção das indicações geográficas e denominações de origem dos produtos agrícolas e dos géneros alimentícios, alterado pelo Acto relativo às condições de adesão da República da Áustria, da República da Finlândia e do Reino da Suécia e às adaptações dos Tratados em que se funda a União Europeia, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que a utilização de uma denominação de origem protegida seja subordinada à condição de que determinadas operações, como o corte e a embalagem do produto, sejam efectuadas na região de produção, desde que essa condição esteja prevista no caderno de especificações.

2) A subordinação da utilização da denominação de origem protegida «presunto de Parma», no presunto comercializado em fatias, à condição de as operações de corte e de embalagem serem efectuadas na região de produção constitui uma medida de efeito equivalente a uma restrição quantitativa à exportação na acepção do artigo 29.° CE, mas pode considerar-se justificada e, portanto, compatível com esta última disposição.

3) Todavia, a condição em causa não é oponível aos operadores económicos, por não ter sido levada ao seu conhecimento através de uma publicidade adequada na regulamentação comunitária.

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