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Document 52023IE0695

    Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Acompanhamento das medidas relativas à inflação e à energia e da resiliência energética da UE em setores económicos essenciais (parecer de iniciativa)

    EESC 2023/00695

    JO C 349 de 29.9.2023, p. 12–17 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, GA, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    29.9.2023   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 349/12


    Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Acompanhamento das medidas relativas à inflação e à energia e da resiliência energética da UE em setores económicos essenciais

    (parecer de iniciativa)

    (2023/C 349/03)

    Relator:

    Felipe MEDINA MARTÍN

    Decisão da Plenária

    25.1.2023

    Base jurídica

    Artigo 52.o, n.o 2, do Regimento

     

    Parecer de iniciativa

    Competência

    Secção dos Transportes, Energia, Infraestruturas e Sociedade da Informação

    Adoção em secção

    26.6.2023

    Adoção em plenária

    12.7.2023

    Reunião plenária n.o

    580

    Resultado da votação

    (votos a favor/votos contra/abstenções)

    151/1/2

    1.   Conclusões e recomendações

    1.1.

    O presente parecer do Comité Económico e Social Europeu (CESE) visa avaliar o impacto da crise energética desencadeada pela pandemia de COVID-19 e pela guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia nas empresas europeias, nos seus trabalhadores e em todos os cidadãos europeus. O CESE observa que surgiram problemas muito diversos em toda a economia, tais como aumentos desproporcionados dos custos de produção, reorganização das cadeias de abastecimento, dificuldades no fornecimento de alimentos e outros bens, aumento dos custos de investimento ou perda de poder de compra das famílias europeias.

    1.2.

    O CESE está preocupado com os elevados níveis de inflação atingidos na Europa devido aos custos da energia e das matérias-primas e, consequentemente, aos preços dos serviços e dos produtos industriais. A inflação na Europa atingiu o seu nível mais elevado desde a criação do euro. O CESE insta as instituições europeias a criarem mecanismos de controlo como os descritos no documento elaborado pelo Gabinete Europeu das Uniões de Consumidores (BEUC). Deve assegurar-se, por exemplo, a plena aplicação das medidas estabelecidas no projeto de regulamento do Conselho, que prevê uma reforma importante, e o ajustamento da configuração do mercado da eletricidade. O CESE insta os Estados-Membros da UE a aplicarem os atos da UE já adotados, como o pacote Energias Limpas, que contribui para acelerar a transição ecológica e aprofundar o mercado interno.

    1.3.

    O CESE considera que é urgente reformar o quadro temporário de crise revisto da UE, tendo em conta os enormes aumentos de custos resultantes da guerra na Ucrânia e da crise energética. Além disso, recomenda que o quadro temporário relativo a medidas de auxílio estatal seja aplicado de modo a fazer chegar os auxílios previstos, quer no regulamento relativo a uma intervenção de emergência no domínio da energia, quer no quadro de recuperação e resiliência, a todos os setores afetados pela crise energética, com especial destaque para os setores essenciais, a fim de não comprometer a capacidade de sobrevivência de muitas empresas, evitar um impacto negativo no custo de vida dos consumidores e não afetar negativamente a sua capacidade de encontrar produtos de base no seu quotidiano. Além disso, o CESE apela, mais uma vez, para a introdução de uma «regra de ouro» que permita realizar os investimentos públicos necessários.

    1.4.

    O CESE considera que os agregados familiares e os setores essenciais devem beneficiar dos planos que se destinam a atenuar o impacto dos preços elevados da energia. Embora se tenham verificado lucros muito elevados em alguns setores, as declarações de falência na UE sofreram um aumento considerável, de 26,8 % em comparação com o trimestre anterior, atingindo o valor de 113,1, que é o nível mais elevado alguma vez registado, segundo o índice utilizado pelo Eurostat para medir o nível de falência na UE face a um valor de referência de 100 em 2015. O CESE solicita à Comissão e aos Estados-Membros que, ao aplicarem medidas de redução da procura nos períodos de pico, envidem esforços para assegurar que os agregados familiares e os setores essenciais têm acesso a um abastecimento energético contínuo. Ao mesmo tempo, algumas empresas, principalmente do setor da energia, aumentaram os lucros à custa da inflação existente, como salienta o Banco Central Europeu (BCE) (1). Os lucros neste setor continuaram a impulsionar a inflação na UE, um fator que é necessário abordar.

    1.5.

    A crise energética repercutiu-se na economia sob a forma de uma inflação elevada, um fraco crescimento económico, uma forte pressão sobre as finanças públicas, a diminuição no poder de compra dos agregados familiares e das empresas e a perda de competitividade económica externa. No seguimento das recomendações do BCE, o CESE propõe que se estabeleça o critério «ecológico triplo» que assegure que as futuras intervenções sejam adaptadas à situação, orientadas para uma finalidade e compatíveis com a transição. A adoção de medidas relativas aos preços sem um alvo específico, como é o caso do limite máximo nos preços de determinados alimentos, apenas prolongaria, a mais longo prazo, o período de inflação elevada.

    1.6.

    A persistência da inflação elevada, em particular devido aos preços da energia, provoca uma perda generalizada do poder de compra dos trabalhadores, dos consumidores e das empresas da Europa, o que afeta as condições de vida de muitas famílias, bem como a procura interna e o crescimento. Esta situação, juntamente com a manutenção da política monetária de aumento das taxas de juro, também afeta negativamente muitas empresas. O CESE considera que o diálogo social no setor da energia se reveste de importância para tomar as decisões adequadas a nível nacional.

    1.7.

    O CESE insta os governos a incentivarem a aplicação de medidas de poupança e eficiência energética nas empresas e nas famílias, que permitam reduzir de forma permanente a procura de energia. Neste sentido, importa incentivar a expansão das energias renováveis (estabelecendo as condições jurídicas e fiscais necessárias, incluindo a introdução de uma «regra de ouro» para os investimentos) para reduzir a nossa dependência dos combustíveis fósseis. A situação atual deve ser utilizada como alavanca para acelerar a descarbonização da economia da UE. Estas medidas devem ser acompanhadas de garantias de não deslocalização associadas aos apoios financeiros. Chegou o momento de realizar os investimentos necessários na transformação energética europeia (e criar as condições de enquadramento fiscal) para reduzir a dependência dos combustíveis fósseis. Além disso, o CESE considera que é necessário avançar com as alterações propostas no plano REPowerEU para simplificar e acelerar a concessão de licenças para a instalação de infraestruturas de energias renováveis. Neste contexto, o CESE insta a UE e os Estados-Membros a estudarem formas de permitir que o preço pago pela energia excedentária introduzida na rede seja utilizado em investimentos viáveis para maximizar a capacidade de produzir energia renovável e partilhá-la quando exceder as necessidades de consumo próprio. A reconfiguração do mercado da energia deve constar da agenda a longo prazo da Comissão Europeia, a fim de evitar futuras perturbações no abastecimento energético e preços exorbitantes.

    2.   Observações gerais

    2.1.

    A vaga de inflação que atravessa a Europa é geral e pode ser claramente dividida em duas fases. A primeira teve origem no período de recuperação após o confinamento da população devido à pandemia de COVID-19. A retoma súbita de todos os setores provocou estrangulamentos nas cadeias de abastecimento, que aumentaram os custos das matérias-primas e do transporte de mercadorias. Os custos das matérias-primas aumentaram 101 % entre janeiro de 2020 e março de 2022 (2) e os custos do transporte de mercadorias aumentaram 545 % no mesmo período (3).

    2.2.

    A segunda fase inflacionista foi desencadeada pela guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia, em fevereiro de 2022, e pela guerra subsequente. Nessa ocasião, o choque centrou-se na energia e em alguns produtos que tanto a Rússia como a Ucrânia forneciam em grandes quantidades à UE: gás natural, trigo, óleo de girassol e fertilizantes. Entre fevereiro e abril de 2022, os preços destes produtos aumentaram 18,6 %, 16,8 %, 38,6 % e 16,7 %, respetivamente (4). Desde então, estes custos diminuíram, embora, em março de 2023, o índice de preços das matérias-primas do Fundo Monetário Internacional (FMI) se situasse 40,9 % acima dos níveis de janeiro de 2020 e os preços do transporte de mercadorias estivessem 3,6 % acima desses níveis.

    2.3.

    Estes acontecimentos traduziram-se em inflação na economia mundial e europeia. A taxa de variação interanual do índice harmonizado de preços no consumidor (5) na área do euro atingiu 11,5 % (Eurostat) no mês de outubro. Estes valores não eram atingidos desde o século passado e, apesar de terem descido nos últimos meses (em março de 2023, a taxa era de 8,3 %), estão a revelar-se muito difíceis de reduzir. O facto de a inflação subjacente (que não inclui a energia) manter uma trajetória ascendente na maior parte da Europa prova que o choque dos preços não é transitório, como se pensava inicialmente. Tal pode significar que a política monetária lançada pelo BCE não está a produzir os resultados esperados.

    3.   Impacto da inflação na economia europeia

    3.1.

    O CESE observa que as perspetivas económicas se deterioraram na sequência da invasão da Ucrânia pela Rússia, em fevereiro de 2022. O cenário económico previsto (6) para os próximos anos deverá ser de abrandamento em comparação com 2022, ainda que essas previsões tenham melhorado nos últimos meses. No inverno, a Comissão Europeia estimava para a UE no seu conjunto um crescimento do PIB de 0,8 % em 2023 e de apenas 1,6 % em 2024, ao passo que, nas previsões recentes da primavera, estas percentagens passaram a ser de 1,0 % e 1,7 %, respetivamente. Paralelamente, a inflação deverá diminuir gradualmente, embora a um ritmo mais lento do que o inicialmente previsto (9,2 % em 2022, 6,7 % em 2023, 3,1 % em 2024). O mercado de trabalho será restringido pelo baixo crescimento e a dívida pública está a aumentar devido, nomeadamente, ao rápido aumento das taxas de juro pelo BCE, o que exercerá pressão nos orçamentos da maioria dos Estados-Membros.

    3.2.

    Os 96,5 milhões de europeus que vivem em risco de pobreza ou exclusão social são os mais afetados pela inflação elevada. Num inquérito Eurobarómetro, 41 % dos entrevistados referem os preços, a inflação e o custo de vida como um dos problemas mais importantes para o seu país, à frente da saúde (32 %) e da situação económica (19 %).

    3.3.

    A UE sofreu um corte quase total do fornecimento de gás proveniente da Rússia, na sequência das decisões políticas adotadas, e quase metade dos Estados-Membros foram afetados pela redução do abastecimento, em maior ou menor grau. O aumento da inflação e dos preços dos produtos de base, a escassez de mão de obra e as perturbações nas cadeias de abastecimento mundiais estão a afetar negativamente as cadeias de abastecimento alimentar e não alimentar da Europa. De acordo com as perspetivas económicas da Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos, o crescimento mundial deverá abrandar significativamente, para cerca de 2,2 %, em 2023.

    3.4.

    Segundo o BCE, o aumento dos preços da energia é responsável por dois terços do diferencial da taxa de inflação na área do euro. De acordo com a Comissão, entre 2019 e 2022, o aumento das margens de lucro foi de 54 % no setor da energia, ao passo que os salários aumentaram apenas 6 %. A perda generalizada do poder de compra dos trabalhadores, dos consumidores e das empresas da Europa afeta as condições de vida de muitas famílias e, se não for corrigida, pode também afetar a procura interna e o crescimento e, por conseguinte, outros setores empresariais. Esta situação também se deve à manutenção da política monetária de subida das taxas de juro. O CESE considera que o diálogo social no setor da energia se reveste de importância para tomar as decisões adequadas a nível nacional.

    3.5.

    Enquanto os preços no consumidor aumentaram globalmente na Europa, os salários comportaram-se de forma menos volátil, o que retirou poder de compra aos cidadãos europeus, especialmente os mais vulneráveis, que não têm forma de se proteger contra a inflação. Com efeito, já se observam alterações no comportamento dos consumidores devido à perda de poder de compra das famílias, que enfrentam uma grave crise do custo de vida associada ao aumento vertiginoso das faturas de energia e ao impacto da inflação. Os instrumentos aplicados pelos Estados-Membros para proteger os consumidores domésticos vulneráveis variam consideravelmente e, em alguns casos, a sua eficácia pode ser limitada. A Comissão Europeia deve ponderar a possibilidade de estabelecer normas mínimas a aplicar pelos reguladores e decisores políticos para proteger e apoiar os consumidores domésticos vulneráveis.

    3.6.

    Um dos setores mais afetados pelo efeito combinado da pandemia e da guerra foi o da produção de alimentos — agricultura, pecuária e indústria alimentar — e da sua distribuição ao consumidor final. A proximidade da guerra e o seu impacto nos mercados da energia e das matérias-primas está a criar um fosso entre os preços dos produtos agrícolas na Europa e nos mercados internacionais, onde os preços europeus mais aumentaram. Com efeito, segundo o quadro dos preços dos produtos de base de abril de 2023, a taxa de crescimento dos preços da maioria dos produtos agrícolas europeus é superior à mundial, especialmente no que se refere aos produtos à base de carne. Esta tendência tem três efeitos importantes. Em primeiro lugar, a população europeia está a sentir a inflação de forma mais intensa no conjunto de bens de primeira necessidade. Em segundo lugar, os produtos alimentares europeus estão a perder competitividade a nível internacional. Em terceiro lugar, os preços pagos aos agricultores aumentaram devido ao aumento dos custos de produção.

    3.7.

    A guerra de agressão da Rússia contra a Ucrânia criou enormes desafios na cadeia de abastecimento alimentar, para além da espiral dos custos da energia: o aumento dos preços dos principais fatores de produção (alimentos para animais, fertilizantes) e a escassez de determinados produtos de base (por exemplo, óleos vegetais ou trigo) necessários para manter uma cadeia de abastecimento plenamente funcional. O efeito de dominó do aumento dos custos está a conduzir a decisões de redução da produção de fertilizantes, o que agravará ainda mais o aumento dos preços. As secas registadas em toda a Europa durante o verão de 2022 e, até à data, em 2023 estão a intensificar a pressão sobre os preços, reduzindo a oferta disponível.

    3.8.

    Alguns setores essenciais, incluindo empresas e trabalhadores, que não podem suspender a sua atividade, independentemente da situação em que se encontrem, enfrentam um duplo ónus: a diminuição do número de consumidores dispostos a pagar e o aumento dos custos, em especial faturas de energia exorbitantes. As empresas do setor alimentar tentaram limitar o aumento dos custos para garantir preços competitivos aos consumidores, mas receiam agora uma crise do consumo (Hidalgo, M., 2023 (7); Eurocommerce, 2023). Recentemente, o Governo de Espanha publicou (8) o primeiro relatório do Observatório das Margens Empresariais, no qual indica que as margens na cadeia alimentar diminuíram 25 % desde 2021, pelo que é evidente que a evolução das margens de lucro é muito heterogénea.

    Ao mesmo tempo, algumas empresas, principalmente do setor da energia, aumentaram os lucros à custa da inflação existente, como salienta o BCE (9). Os lucros neste setor continuaram a impulsionar a inflação na UE, um fator que é necessário abordar.

    3.9.

    O Banco de Espanha (10) refere os efeitos muito positivos que a chamada «exceção ibérica» ou «mecanismo ibérico» teve no sistema de fixação de preços no mercado da eletricidade. Refere igualmente o impacto positivo, embora mais limitado, da redução do IVA sobre os preços dos produtos alimentares e dos combustíveis, embora acrescente que os custos desta medida teriam sido mais baixos se os auxílios tivessem sido direcionados para as famílias com rendimentos mais baixos. O Banco de Espanha refere igualmente que as medidas introduzidas pelo Governo espanhol para aumentar o salário mínimo interprofissional, as pensões e o rendimento mínimo vital tiveram um impacto positivo na atenuação dos efeitos da inflação nas famílias com rendimentos mais baixos.

    4.   Impacto do aumento dos custos da energia na rentabilidade das empresas europeias

    4.1.

    Os preços grossistas da eletricidade e do gás aumentaram até quinze vezes desde o início de 2021, o que teve graves repercussões nos consumidores e nas empresas. Os governos europeus começaram a aplicar um conjunto de políticas para dar resposta a esta situação. Um tipo de política visa atenuar o impacto do aumento dos custos nos consumidores e nas empresas, enquanto o outro procura estabilizar e reduzir os preços grossistas e garantir a segurança energética. O CESE insta a Comissão Europeia e os Estados-Membros a realizarem uma reforma ampla da configuração do mercado da eletricidade e do sistema de cálculo dos preços da eletricidade, em consonância com o parecer TEN/793 (11).

    4.2.

    Os preços da energia afetam os custos das empresas de formas muito diversas: em primeiro lugar, influenciam os custos do próprio fornecimento de eletricidade, em segundo lugar, têm um impacto indireto no resto da cadeia de abastecimento e, em terceiro lugar, podem ter consequências financeiras. A título de exemplo, um estudo do Banco de Espanha publicado ex ante na primavera de 2022 (12) estimava que, em 2023, um aumento cumulativo de 25 % nos custos da energia para as empresas teria um efeito de redução de 1,6 % do seu valor acrescentado bruto. No entanto, trata-se de um efeito médio; o relatório conclui que alguns setores são mais afetados do que outros, com benefícios sobretudo para os setores da extração de petróleo e do gás natural e prejuízos, em especial, para a pesca e aquicultura, os transportes terrestres, os transportes marítimos e por vias navegáveis interiores, o comércio e reparação de veículos automóveis, a agricultura e a pecuária, a educação, os transportes aéreos, as atividades imobiliárias, o fabrico de coque e de produtos petrolíferos refinados, as atividades de saúde e ação social, e a hotelaria e a restauração. Alguns destes setores revelaram-se importantes para o bom funcionamento da economia da UE durante a pandemia. Muitos dos setores mais afetados são grandes consumidores de energia elétrica que não a utilizam de forma intensiva na sua atividade produtiva.

    4.3.

    Para além do impacto direto e indireto no valor acrescentado bruto (margens) das empresas, estas podem estar sujeitas a uma maior vulnerabilidade financeira. O relatório do Banco de Espanha menciona os setores mais afetados. Existe um grupo de setores particularmente vulneráveis que, em 2023, não só estariam sobre-endividados, como também teriam rentabilidades negativas: comércio e reparação de veículos automóveis; transportes terrestres e transportes por oleodutos ou gasodutos; pesca e aquicultura; agricultura e pecuária; e têxteis, vestuário, couro e calçado.

    4.4.

    À medida que forem diminuindo as reservas acumuladas de gás natural na Europa — em maio de 2023, o volume armazenado era de 68 % (13) — enfrentaremos dificuldades acrescidas na gestão da nossa política energética. A diferença entre as quantidades anteriormente fornecidas pela Rússia e as quantidades provenientes de fornecedores alternativos ainda persiste, pelo que é pouco provável que os preços desçam a curto prazo. O que aconteceu, na verdade, foi uma redução significativa da procura. Os preços elevados da energia levam a uma redução da competitividade da nossa indústria e das nossas cadeias de abastecimento, favorecendo, por sua vez, a externalização de atividades para fora da UE, reduzindo assim a independência estratégica deste bloco. O impacto nas famílias, em especial as mais vulneráveis, é particularmente significativo, com uma percentagem crescente de pessoas em risco ou em situação de pobreza. Tal acontecerá, pelo menos, até 2024 (14). A fim de combater estas situações, o CESE recomenda a adoção de várias medidas, incluindo garantias de localização associadas ao apoio financeiro, novas medidas de poupança de energia e de eficiência energética necessárias para as empresas reduzirem a procura, investimentos maciços e condições fiscais necessárias à expansão da produção de energias renováveis, a fim de reduzir a dependência dos combustíveis fósseis.

    4.5.

    Consequentemente, devido à subida em flecha dos custos da energia, muitas empresas e agregados familiares encontram-se cada vez mais numa situação que pode pôr em causa a sua existência. Embora o inverno tenha sido bastante ameno, não podemos esperar que as condições ambientais nos sejam sempre favoráveis. Por isso, é necessário tomar medidas que protejam os agregados familiares particularmente vulneráveis, devendo prever-se medidas dirigidas especificamente a este grupo.

    4.6.

    No caso das empresas, o aumento exponencial dos custos empresariais, a par da contenção de despesas dos consumidores, poderá conduzir mesmo, nalguns casos, à deslocalização forçada. No entanto, essa não é uma opção viável para as empresas que prestam um serviço essencial aos clientes e ao resto da cadeia de abastecimento e que não podem simplesmente suspender as suas operações devido ao aumento dos preços da energia.

    4.7.

    Embora muitos setores e os respetivos trabalhadores tenham sido considerados essenciais durante a pandemia de COVID-19, esse reconhecimento desapareceu na atual crise energética. Até à data, os Estados-Membros não prestaram apoio específico a muitos desses setores. As empresas pertencentes a esses setores e os seus trabalhadores envidaram esforços para proteger os consumidores à custa das suas próprias margens, pelo que lhes é difícil repercutir nos clientes o custo total do aumento exorbitante das faturas de energia. Não é possível manter esta situação a longo prazo. Do mesmo modo, o CESE considera que os governos não estão a proteger as pessoas de forma tão vigorosa como durante a pandemia.

    4.8.

    Muitas empresas estão a fazer numerosos investimentos para reduzir o consumo de energia e ter maior capacidade para aumentar o acesso a energias renováveis. O CESE considera que as empresas também podem agir como aceleradores da eletrificação dos transportes e substituir o gás para aquecimento, desempenhando um papel fundamental na transição energética e nos objetivos da UE em matéria de energias renováveis para 2030. No entanto, tal exigirá um quadro regulamentar favorável, incluindo a concessão de licenças e a luta contra os desincentivos dos preços à produção de mais energia.

    4.9.

    O CESE sublinha a importância de associar as obrigações decorrentes do plano REPowerEU e as relacionadas com o desempenho energético dos edifícios à concessão de apoio e de ter em conta a capacidade dos operadores para suportarem os custos dos investimentos consideráveis que essas obrigações implicam. Estas medidas serão importantes para reduzir a dependência dos combustíveis fósseis, mas as obrigações devem estar associadas à disponibilidade de financiamento, tanto público como privado. A reconfiguração do mercado da energia deve constar da agenda a longo prazo da Comissão Europeia, a fim de evitar futuras perturbações no abastecimento energético e preços exorbitantes, tendo também em conta a formação dos futuros trabalhadores do setor.

    Na mesma ordem de ideias, o CESE considera que ambos os programas devem também refletir os aspetos práticos, relacionados com a disponibilidade de equipamentos e de mão de obra qualificada, nas obrigações relativas à instalação de estações de carregamento rápido para veículos ou de infraestruturas para os combustíveis alternativos. É necessário garantir que os fundos desembolsados através das novas propostas possam ser utilizados para permitir que esta transição ocorra dentro dos prazos previstos.

    Bruxelas, 12 de julho de 2023.

    O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

    Oliver RÖPKE


    (1)  Estudo do BCE sobre a inflação, 2023.

    (2)  Índice de preços das matérias-primas do FMI. Disponível em: https://www.imf.org/en/Research/commodity-prices

    (3)   Freightos Baltic Index. Disponível em: https://fbx.freightos.com/

    (4)  Índice de preços das matérias-primas do FMI. Disponível em: https://www.imf.org/en/Research/commodity-prices

    (5)  Eurostat. Disponível em: https://ec.europa.eu/eurostat

    (6)  https://economy-finance.ec.europa.eu/economic-forecast-and-surveys/economic-forecasts/spring-2023-economic-forecast-improved-outlook-amid-persistent-challenges_en

    (7)   «Margins and profits of Spanish food retailers in 2022» [Margens e lucros dos retalhistas de produtos alimentares espanhóis em 2022].

    (8)  Relatório trimestral do Observatório das Margens Empresariais (OME) 2023/T3 (bde.es).

    (9)  Estudo do BCE sobre a inflação, 2023.

    (10)  https://www.bde.es/f/webbe/SES/Secciones/Publicaciones/PublicacionesAnuales/InformesAnuales/22/Files/InfAnual_2022_En.pdf.

    (11)  Parecer do Comité Económico e Social Europeu — Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que altera os Regulamentos (UE) 2019/943 e (UE) 2019/942 e as Diretivas (UE) 2018/2001 e (UE) 2019/944 com vista a melhorar a configuração do mercado da eletricidade da União [COM(2023) 148 final — 2023/0077 (COD)] (JO C 293 de 18.8.2023, p. 112).

    (12)  Disponível em: https://www.bde.es/f/webbde/Secciones/Publicaciones/InformesBoletinesRevistas/InformesEstabilidadFinancera/22/IEF_2022_1_Rec1_4.pdf.

    (13)  Informação disponível em: https://agsi.gie.eu/data-overview/eu

    (14)  EIU (2023): «Energy crisis will erode Europe’s competitiveness in 2023» [A crise energética enfraquecerá a competitividade da Europa em 2023]. Disponível em: https://www.eiu.com/n/energy-crisis-will-erode-europe-competitiveness-in-2023/


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