Choose the experimental features you want to try

This document is an excerpt from the EUR-Lex website

Document 52020AR0150

    Parecer do Comité das Regiões Europeu — Pacote Serviços: Uma perspetiva atualizada dos órgãos de poder local e regional da Europa

    COR 2020/00150

    JO C 324 de 1.10.2020, p. 53–57 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, GA, HR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

    1.10.2020   

    PT

    Jornal Oficial da União Europeia

    C 324/53


    Parecer do Comité das Regiões Europeu — Pacote Serviços: Uma perspetiva atualizada dos órgãos de poder local e regional da Europa

    (2020/C 324/09)

    Relator:

    Jean-Luc VANRAES (BE-Renew Europe), membro do Conselho Municipal de Uccle

    Textos de referência:

    Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que introduz o Cartão Eletrónico Europeu de Serviços e as estruturas administrativas conexas

    COM(2016) 824 final

    Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho sobre o enquadramento jurídico e operacional do Cartão Eletrónico Europeu de Serviços introduzido pelo Regulamento… [Regulamento CEES]

    COM(2016) 823 final

    Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa a um teste de proporcionalidade a realizar antes da aprovação de nova regulamentação das profissões

    COM(2016) 822 final

    Proposta de diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho respeitante à aplicação da Diretiva 2006/123/CE relativa aos serviços no mercado interno, instituindo um procedimento de notificação para os regimes de autorização e os requisitos relativos aos serviços, e que altera a Diretiva 2006/123/CE e o Regulamento (UE) n.o 1024/2012 relativo à cooperação administrativa através do Sistema de Informação do Mercado Interno

    COM(2016) 821 final

    Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões relativa às recomendações para a reforma da regulamentação dos serviços profissionais

    COM(2016) 820 final

    RECOMENDAÇÕES POLÍTICAS

    O COMITÉ DAS REGIÕES EUROPEU

    Importância e urgência de completar o mercado único dos serviços

    1.

    reconhece que o mercado único é uma grande realização da política da UE que sustenta a competitividade, a prosperidade e o bem-estar dos consumidores na Europa; sublinha que o bom funcionamento do mercado único também contribui para impulsionar o crescimento económico, a inovação e o emprego a nível regional e local e que os órgãos de poder local e regional, enquanto importantes entidades adjudicantes públicas, beneficiam de um melhor funcionamento do mercado único, incluindo nos serviços;

    2.

    reconhece que o mercado único é um projeto em curso e que subsistem obstáculos importantes; sublinha que a sua realização e o seu aprofundamento exigem um maior empenho dos intervenientes institucionais em todos os níveis de governação e que aos Estados-Membros, em particular, cabe a responsabilidade importante de assegurar uma realização eficaz;

    3.

    sublinha que as propostas políticas relativas ao mercado único podem ter um impacto territorial significativo, que deve ser devidamente avaliado. As avaliações do impacto territorial contribuem para medir os possíveis efeitos das propostas legislativas de forma exaustiva e equilibrada, abrangendo uma vasta gama de aspetos, e são essenciais para muitas regiões que não participam diretamente no processo legislativo, mas que aplicam a legislação; reitera que está à disposição para contribuir para estas avaliações com os seus conhecimentos especializados;

    4.

    apela para que a realização do mercado único respeite, tanto quanto possível, os princípios da autonomia local; recorda que a Carta Europeia de Autonomia Local (1) reconhece que os órgãos de poder local são um dos principais fundamentos de qualquer regime democrático, que a salvaguarda e o reforço da autonomia local constituem um contributo importante para a construção de uma Europa assente nos princípios da democracia e da descentralização dos poderes e que, para tal, os órgãos de poder local devem ter um amplo grau de autonomia no que se refere às suas responsabilidades, às formas e aos meios de exercício dessas responsabilidades e aos recursos necessários para o seu cumprimento;

    5.

    considera que deve ser ponderada uma abordagem mais descentralizada da realização do mercado único, o que implicará a descentralização da responsabilidade pelo acompanhamento e controlo da correta aplicação do direito da UE, conferindo-a às agências ao nível dos Estados-Membros, à semelhança da abordagem descentralizada na aplicação das regras de concorrência da UE; considera que uma tal abordagem descentralizada ajudaria a reduzir os encargos administrativos a todos os níveis e a promover a apropriação do mercado único pelos Estados-Membros, o que é essencial ao seu bom funcionamento;

    6.

    salienta que muitos dos obstáculos económicos mais significativos que ainda persistem se encontram no domínio dos serviços;

    7.

    salienta que os serviços constituem a maior componente da economia europeia, gerando cerca de 70 % do PIB e do emprego (2); indica, no entanto, que o setor dos serviços da UE se caracteriza pelo lento crescimento da produtividade e por uma fraca competitividade, bem como por uma enorme diversidade de setores, com características diferentes; assinala que o comércio intra-UE de serviços representa apenas um terço do comércio intra-UE de bens e não há indícios de que venha a aumentar;

    8.

    assinala que as barreiras injustificadas à prestação transfronteiriça de serviços, resultado sobretudo da coexistência de normas e procedimentos diferentes, são um dos principais motivos dos maus resultados do setor, que a remoção dessas barreiras daria aos prestadores de serviços e aos consumidores maiores oportunidades para explorar plenamente todo o potencial do mercado interno, que quaisquer novas medidas se devem basear nas necessidades comprovadas dos prestadores de serviços, que a enorme diversidade do setor dos serviços pode tornar necessária a adoção de uma abordagem mais setorial e que os governos regionais e locais poderiam desempenhar um papel importante para contribuir para a resolução dos problemas que surjam;

    9.

    salienta que os serviços constituem um importante contributo intermédio para a economia enquanto parte das cadeias de valor mundiais e que os serviços competitivos, nomeadamente os serviços às empresas, são altamente importantes para a produtividade e a competitividade de custos noutros setores, como a indústria transformadora, vitais para as economias regionais e locais;

    10.

    refere que, dez anos após a sua entrada em vigor, o potencial da Diretiva Serviços para estimular a livre circulação de serviços ainda não foi plenamente concretizado e que os prestadores de serviços em certos setores enfrentam ainda uma série de barreiras para se estabelecerem noutro Estado-Membro ou prestarem serviços transfronteiras de forma temporária; faz notar que, de acordo com as estimativas, a eliminação das barreiras ao comércio e investimento transnacionais no setor dos serviços ao abrigo da Diretiva Serviços já em vigor poderia levar a um crescimento de 1,7 % do PIB da UE;

    11.

    observa que, das propostas legislativas da Comissão no pacote Serviços, apenas uma foi adotada, nomeadamente a Diretiva relativa a um teste de proporcionalidade a realizar antes da aprovação de nova regulamentação das profissões; observa também que as propostas legislativas relativas ao Cartão Eletrónico Europeu de Serviços estão bloqueadas no processo legislativo e que a proposta de diretiva que institui um procedimento de notificação para os regimes de autorização e os requisitos relativos aos serviços tem progredido muito lentamente;

    12.

    insta a Comissão a analisar as atividades empresariais e profissionais mais comuns em cada Estado-Membro, que já poderiam beneficiar da Diretiva Serviços em vigor, de modo a elaborar o mais rapidamente possível uma lista exaustiva dos custos e obstáculos desnecessários com que se deparam os empreendedores; insta ainda a Comissão a elaborar, com caráter de urgência, uma recomendação que inclua um modelo normalizado de balcão único, previsto no artigo 6.o da referida diretiva, para que os Estados-Membros disponham de um modelo comum que facilite ao máximo aos prestadores a sua utilização em várias línguas, à semelhança do que é feito com as regulamentações técnicas, de forma muito eficiente e com custos mínimos de tradução;

    13.

    observa que o Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) no processo Visser Vastgoed (3) pode ter implicações muito significativas para os órgãos de poder local e regional; considera que estas devem ser tidas em conta na legislação da UE e que a proposta de diretiva relativa ao procedimento de notificação constitui o quadro adequado para o efeito;

    14.

    considera que as implicações do processo Visser Vastgoed poderão não se limitar às obrigações de notificação para os planos de urbanização relativos ao comércio retalhista, alargando-se potencialmente a vastos domínios;

    15.

    reconhece a importância do bom funcionamento do mercado único para as regiões fronteiriças e considera que os instrumentos de cooperação transfronteiriça da UE, como os AECT (4), podem desempenhar um papel útil neste contexto;

    Cartão Eletrónico Europeu de Serviços

    16.

    toma nota de que o Parlamento Europeu rejeitou a proposta da Comissão Europeia relativa ao Cartão Eletrónico Europeu de Serviços e solicitou àquela a retirada do documento; observa, além disso, que o Conselho não alcançou uma posição comum sobre o mesmo documento e recorda que, para apoiar as empresas que prestam serviços transfronteiras, as medidas da atual Diretiva Serviços, como os pontos de contacto individuais, devem ser corretamente aplicadas;

    17.

    lembra os colegisladores de que a ideia inicial na base do cartão eletrónico de serviços — ideia essa que a proposta não logrou concretizar — consistia em reduzir a complexidade administrativa e os custos para os prestadores de serviços transfronteiras, em especial as PME, no cumprimento das formalidades administrativas;

    18.

    salienta que, sem a introdução de um cartão eletrónico de serviços, os prestadores de serviços transfronteiras continuam a ter de pagar os mesmos custos para cumprimento das formalidades administrativas e que o cartão eletrónico de serviços reduziria estes custos para metade, o que teria sido extremamente vantajoso para as PME;

    19.

    recorda, por conseguinte, a necessidade de tomar medidas significativas no sentido da simplificação administrativa do ponto de vista dos prestadores de serviços e dos custos desnecessários com que continuam confrontados; assinala, porém, que o esforço legislativo, técnico e administrativo da introdução do cartão eletrónico de serviços deve ser proporcional aos benefícios esperados para os órgãos de poder local e regional;

    20.

    recorda aos colegisladores que a Diretiva Serviços estipula que os Estados-Membros não podem impor requisitos equivalentes aos que o prestador já cumpriu noutro Estado-Membro; observa, no entanto, que tal disposição continua a não ser suficientemente aplicada na prática e que, por conseguinte, os prestadores de serviços se deparam frequentemente com os mesmos requisitos que as empresas de um outro Estado-Membro, apesar de já terem cumprido requisitos equivalentes ou semelhantes no seu Estado-Membro de origem;

    21.

    lembra os colegisladores de que a complexidade da cooperação entre as autoridades nacionais e a consequente carga administrativa do procedimento do cartão eletrónico de serviços proposto foi uma das razões principais pelas quais não se alcançou um compromisso nas negociações sobre esta questão. A este respeito, insta a Comissão Europeia a centrar-se, nas suas futuras propostas, no estabelecimento de normas simples e claras para a cooperação entre as autoridades;

    22.

    salienta que as grandes diferenças entre os Estados-Membros quanto às formas jurídicas e aos requisitos em matéria de participação acionista também continuam a ser um obstáculo à liberdade de estabelecimento no setor dos serviços às empresas;

    23.

    observa igualmente que os prestadores de serviços enfrentam grandes dificuldades na obtenção de uma cobertura de seguro de responsabilidade profissional, exigida pela lei, quando pretendem oferecer os seus serviços noutro Estado-Membro;

    24.

    salienta também que, quanto aos requisitos aplicáveis, as leis setoriais a nível nacional nem sempre fazem a distinção necessária entre os prestadores de serviços que pretendem estabelecer-se e os que pretendem prestar serviços transfronteiras temporariamente, o que gera incerteza e requisitos regulamentares desproporcionados para os prestadores de serviços transfronteiras;

    25.

    lamenta que os obstáculos supramencionados não tenham sido eliminados e continuem a contribuir para a fraca integração dos serviços no mercado único, no quadro já previsto pela Diretiva Serviços;

    26.

    insta, por conseguinte, as outras instituições a chegarem a um consenso de modo a resolverem os problemas que a proposta legislativa relativa ao cartão eletrónico se propõe resolver, permitindo assim uma melhor aplicação com base na Diretiva Serviços;

    27.

    reconhece as diferenças entre os Estados-Membros na aplicação dos critérios de elegibilidade para a participação dos prestadores de serviços em concursos, o que pode constituir um obstáculo ao mercado único; entende, pois, que importa aproveitar o potencial dos instrumentos da UE para harmonizar a aplicação desses critérios sempre que possível;

    28.

    chama a atenção para as disposições da Diretiva Serviços destinadas a aumentar as atividades transfronteiras e o desenvolvimento de um verdadeiro mercado único dos serviços, através de uma maior convergência das regras profissionais a nível europeu, e insta a Comissão Europeia a propor iniciativas que incentivem as associações profissionais a nível europeu a utilizarem estas possibilidades para facilitar a livre circulação dos prestadores de serviços;

    29.

    frisa a importância da Diretiva Serviços e do seu contributo para a livre circulação de serviços no mercado único; salienta, ao mesmo tempo, que as empresas — em particular as PME — e os poderes públicos enfrentam numerosos desafios na aplicação das regras da diretiva;

    Procedimento de notificação

    30.

    toma nota do Acórdão do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) no processo Visser Vastgoed e das incertezas jurídicas que este pode implicar para os órgãos de poder local e regional (5), nomeadamente no que se refere à obrigação de notificação; além disso, assinala que o âmbito de aplicação poderá não ser limitado aos serviços no comércio retalhista e aos planos de urbanização, podendo afetar outras atividades de regulamentação dos órgãos de poder local e regional;

    31.

    entende que a melhoria do procedimento de notificação no âmbito do pacote Serviços abre a oportunidade de resolver as questões suscitadas pelo acórdão do TJUE, e insta os colegisladores a concentrarem os seus esforços na apresentação de soluções durante as negociações em curso sobre o procedimento de notificação, o que assegurará também a segurança jurídica necessária neste contexto;

    32.

    salienta que muitos órgãos de poder local e regional enfrentam desafios em termos de capacidade e de recursos para fazer face aos encargos administrativos decorrentes da atual obrigação legal de notificação — de acordo com a decisão do TJUE — e que qualquer novo procedimento de notificação deve ter em conta este facto, a fim de reduzir o mais possível os encargos administrativos;

    33.

    chama a atenção para a necessidade de encontrar o equilíbrio adequado entre os esforços exigidos pelas obrigações de notificação e o valor acrescentado de cumprir os objetivos da Diretiva Serviços, tendo em conta que a maior parte das regulamentações locais e regionais têm um efeito insignificante no mercado único e, provavelmente, cumprem os requisitos da Diretiva Serviços;

    34.

    salienta que importa evitar que qualquer novo procedimento de notificação tenha o efeito de retardar desnecessariamente a adoção de regulamentações locais e regionais, uma vez que tais atrasos afetam negativamente todos os intervenientes e entravam a atividade económica e o investimento (por exemplo, no comércio retalhista e no desenvolvimento imobiliário que lhe está associado);

    35.

    apela para uma transparência e uma abertura ao diálogo suficientes por parte da Comissão Europeia no contexto de um novo procedimento de notificação, especialmente durante a fase do procedimento em que a Comissão avalia se a regulamentação local ou regional está em conformidade com a Diretiva Serviços;

    36.

    insiste na necessidade de uma aplicação eficaz da Diretiva Serviços e, por conseguinte, propõe que a Comissão Europeia apresente um conjunto de critérios quantitativos e/ou qualitativos para avaliar que tipo de regulamentações locais e regionais podem ficar isentas da obrigação de notificação ao abrigo da Diretiva Serviços, sem que esta isenção coloque obstáculos à aplicação da diretiva;

    37.

    propõe à Comissão Europeia que investigue a viabilidade de elementos de aplicação descentralizados, nomeadamente no que toca à notificação, associados a critérios quantitativos e/ou qualitativos, uma vez que tal poderia aumentar a eficiência da aplicação e permitir uma avaliação mais precisa do interesse público regional e local; respeitar-se-iam assim os princípios da autonomia local e da subsidiariedade;

    38.

    salienta a importância dos princípios da não discriminação, da proporcionalidade e do interesse público, aplicados na Diretiva Serviços, e sublinha, no contexto regulamentar local e regional, que o considerando 9 da Diretiva Serviços exclui explicitamente do seu âmbito de aplicação a regulamentação em matéria de gestão de utilização dos solos, o planeamento urbano e o ordenamento do território.

    Bruxelas, 1 de julho de 2020.

    O Presidente do Comité das Regiões Europeu

    Apostolos TZITZIKOSTAS


    (1)  Conselho da Europa, 1985.

    (2)  Documento de trabalho dos serviços da Comissão — Relatório do desempenho do mercado único, SWD(2019) 444 final.

    (3)  Processos apensos C-360/15 e C-31/16, acórdão de 30 de janeiro de 2018.

    (4)  Agrupamentos Europeus de Cooperação Territorial.

    (5)  Existem mais de 95 000 municípios na UE, com enormes diferenças em termos de dimensão e de capacidade. Na Alemanha e na Áustria, em conjunto, 250 000 planos locais de urbanização poderiam, em princípio, ser abrangidos pela Diretiva Serviços e respetiva obrigação de notificação (relatório intercalar de 15 de janeiro de 2020 de um estudo encomendado pelo CR sobre as implicações para os órgãos de poder local e regional da Diretiva da Comissão relativa ao procedimento de notificação, à luz do Acórdão do TJUE de janeiro de 2018).


    Top