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Document 52016DC0542

RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO E AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU sobre a aplicação da Diretiva 2008/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho em determinados aspetos da mediação em matéria civil e comercial

COM/2016/0542 final

Bruxelas, 26.8.2016

COM(2016) 542 final

RELATÓRIO DA COMISSÃO AO PARLAMENTO EUROPEU, AO CONSELHO E AO COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU

sobre a aplicação da Diretiva 2008/52/CE do Parlamento Europeu e do Conselho
em determinados aspetos da mediação em matéria civil e comercial


1.Introdução

1.1.Objetivo

A Diretiva 2008/52/CE, relativa a certos aspetos da mediação em matéria civil e comercial 1 , incluindo o ramo do direito da família, visa facilitar o acesso à resolução alternativa de litígios (RAL) e promover a sua resolução amigável, incentivando o recurso à mediação e assegurando uma relação equilibrada entre a mediação e o processo judicial. A citada diretiva («Diretiva "Mediação"») aplicase aos litígios transfronteiriços em matéria civil e comercial, e devia ser transposta para o direito nacional até 21 de maio de 2011. A presente avaliação da aplicação da Diretiva «Mediação» realizase em conformidade com o seu artigo 11.º.

O objetivo de assegurar um melhor acesso à justiça, no âmbito da política da União Europeia que visa estabelecer um espaço de liberdade, de segurança e de justiça, inclui o acesso a modos judiciais e extrajudiciais de resolução de litígios. A mediação pode proporcionar uma solução extrajudicial rápida e pouco onerosa para litígios em matéria civil e comercial através de procedimentos adaptados às necessidades das partes. Acresce que os acordos obtidos por mediação têm mais probabilidades de serem cumpridos voluntariamente pelas partes. Estas vantagens tornamse ainda mais evidentes em situações transfronteiriças.

Embora a mediação constitua geralmente uma vantagem em matéria civil e comercial, há que realçar a sua importância específica no direito da família. A mediação pode criar uma atmosfera construtiva favorável à discussão e assegurar acordos justos entre os pais. Além disso, as soluções amigáveis são provavelmente duradouras, podendo abranger, além da residência principal dos filhos, outras questões, como as condições das visitas ou o acordo sobre pensão de alimentos a eles destinadas.

1.2.Contexto

A Diretiva «Mediação»foi a primeira medida de incentivo ao recurso à mediação, geralmente em litígios cíveis e comerciais. Uma vez adotada, envidaramse outros esforços no domínio da mediação, ao nível da UE.

   O aumento da qualidade, da independência e da eficiência dos sistemas judiciais tem sido, desde 2012, uma característica essencial do Semestre Europeu. O Painel de Avaliação da Justiça na UE informa o Semestre Europeu e ajuda os EstadosMembros a aumentarem a eficácia dos respetivos sistemas judiciais. O painel de avaliação contém também dados sobre as atividades empreendidas pelos EstadosMembros para a promoção do recurso voluntário a métodos de RAL. A Comissão incentiva a recolha e a partilha de informações sobre as práticas e os métodos de promoção do recurso voluntário à RAL. A promoção inclui publicidade adaptada (folhetos, sessões de informação), recolha e publicação de dados, avaliação da eficácia dos métodos de RAL, bem como a disponibilização de apoio judiciário neste domínio 2 .

   No quadro da Rede Judiciária Europeia em Matéria Civil e Comercial, um grupo de trabalho elaborou um conjunto de recomendações destinadas a melhorar o recurso à mediação familiar em contexto transfronteiriço, em especial nos casos de rapto de crianças. No Portal Europeu da Justiça foi criada uma secção distinta, dedicada à mediação transfronteiriça 3 , destinada a prestar informações sobre os sistemas de mediação nacionais.

   Além disso, através do seu programa «Justiça» 4 , a Comissão cofinancia vários projetos de promoção da mediação e da formação de juízes e profissionais da justiça.

   Por último, a Diretiva 2013/11/UE, sobre a resolução alternativa de litígios de consumo («Diretiva "RAL"») 5 e o Regulamento (UE) n.º 524/2013, sobre a resolução de litígios de consumo em linha («Regulamento "RLL"») 6 asseguram que os consumidores possam recorrer a entidades competentes em RAL contratuais, de todos os tipos, com comerciantes, e criam uma plataforma em linha, à escala da UE, para litígios de consumo decorrentes de transações em linha com comerciantes ( www.ec.europa.eu/odr ).

1.3.Fontes de informação

O presente relatório baseiase em informações coligidas a partir de fontes diversas:

   Em 2013, foi realizado um estudo sobre a aplicação da Diretiva «Mediação» 7 , que foi atualizado em 2016 8 .

   Em 2014, um grupo de trabalho da Rede Judiciária Europeia em Matéria Civil e Comercial elaborou um documento sobre a promoção da mediação familiar internacional em casos de rapto internacional de crianças.

   Os resultados do estudo e as experiências dos EstadosMembros na aplicação da Diretiva «Mediação» foram debatidos em julho de 2015, numa reunião da Rede Judiciária Europeia em Matéria Civil e Comercial.

   Por último, realizouse uma consulta pública em linha 9 , de 18 de setembro a 18 de dezembro de 2015. Foram recebidas 562 respostas, de cidadãos interessados, mediadores, juízes, advogados e outros profissionais da justiça, académicos, organizações, autoridades públicas e EstadosMembros.

2.Apreciação global

A avaliação mostra que, de um modo geral, a Diretiva «Mediação» tem acrescentado o valor da UE. O impacto significativo que a sua aplicação tem tido na legislação de vários EstadosMembros resulta da sensibilização dos legisladores nacionais para as vantagens deste método de RAL. A dimensão do impacto da Diretiva «Mediação» nos EstadosMembros difere consoante o nível preexistente dos sistemas de mediação nacionais:

   Antes da adoção da Diretiva «Mediação», 15 EstadosMembros já dispunham de um sistema de mediação abrangente. Nesses EstadosMembros, esta diretiva praticamente não trouxe, ou trouxe muito poucas, alterações ao seu sistema.

   Em 9 EstadosMembros, a mediação regiase por normas dispersas ou relevava do setor privado e assentava na autorregulação. Nesses EstadosMembros, a transposição da Diretiva «Mediação» impulsionou a adoção de alterações substanciais ao quadro de mediação vigente.

   Adotaram sistemas de mediação, pela primeira vez, devido à transposição da Diretiva «Mediação», 4 EstadosMembros. Nesses EstadosMembros, esta diretiva desencadeou o estabelecimento de quadros legais adequados para regular a mediação.

Nos casos em que a transposição da Diretiva «Mediação» conduziu à introdução de alterações importantes no quadro de mediação vigente, ou à introdução de um sistema de mediação abrangente, foi dado um passo importante para a promoção do acesso à RAL e ao estabelecimento de uma relação equilibrada entre a mediação e os processos judiciais.

Todavia, na prática, detetaramse algumas dificuldades no funcionamento dos sistemas de mediação nacionais. As dificuldades relacionamse, principalmente, com a falta da «cultura» de mediação nos EstadosMembros, a falta de conhecimentos sobre a forma de tratar os processos transfronteiriços, o baixo nível de conhecimentos sobre a mediação e o funcionamento dos mecanismos de controlo da qualidade dos mediadores. Vários participantes na consulta pública argumentaram que a mediação não era ainda suficientemente conhecida e que era necessária uma «mudança cultural» para que os cidadãos confiem no sistema de mediação. Por outro lado, salientaram que os juízes e os tribunais se mantinham relutantes em remeter as partes para a mediação.

Os inquiridos na consulta pública reconheceram a importância da mediação, particularmente em questões de família (em especial, no âmbito de processos sobre a custódia dos filhos, os direitos de visita e os casos de rapto de crianças), e nos litígios comerciais.

3.Pontos de apreciação específicos

3.1.Dados estatísticos sobre mediação

O estudo e a consulta pública revelam que é muito difícil obter dados estatísticos abrangentes sobre mediação, como, por exemplo, o número de processos, a duração média e a taxa de êxito, especialmente sobre a mediação transfronteiriça. Em particular, há jurisdições sobre as quais não existem dados abrangentes e comparáveis. Contudo, na consulta, muitos mediadores facultaram dados sobre as suas próprias atividades – entres outros, o número de processos de mediação e taxas de êxito, frequentemente impressionantes. Outros declararam que as taxas de êxito dependiam do número de partes, da questão de facto e de cada situação, fatores que consideram terem também influência na duração dos processos. Outros lamentam o facto de ser muito difícil, sem uma base de dados fiável, argumentar a favor da mediação e da sua eficácia, e ganhar a confiança dos cidadãos. De modo geral e aparentemente, os inquiridos concordaram em que a mediação permite atingir economias de custos significativas numa vasta gama de litígios cíveis e comerciais e, em muitos casos, reduz significativamente o tempo necessário para a resolução de litígios.

Embora se reconheça que, devido à natureza «não oficial» do sistema de mediação, em comparação com os processos judiciais formais, é mais difícil obter dados abrangentes sobre este método, para maior promoção da mediação seria muito importante que existisse uma base de dados mais sólida. A Rede Judiciária Europeia em Matéria Civil e Comercial começou a trabalhar na melhoria da recolha ao nível nacional de dados sobre a aplicação dos instrumentos da União em direito civil e comercial, incluindo a Diretiva «Mediação».

3.2.Âmbito de aplicação (artigo 1.º, n.º 2)

Quase todos os EstadosMembros alargaram o âmbito de aplicação das suas medidas de transposição da Diretiva «Mediação», não o limitando aos processos transfronteiriços, antes tornandoo extensivo aos processos nacionais. Só 3 EstadosMembros optaram por transpor a Diretiva «Mediação» contemplando apenas os processos transfronteiriços, fazendo uso da sua definição de «transfronteiriço». O alargamento do âmbito de aplicação aos casos nacionais é positivo, uma vez que, até à data, o número de processos nacionais supera o de processos transfronteiriços. Por conseguinte, as normas da Diretiva «Mediação» vão além do seu âmbito de aplicação, para benefício dos que recorrem à mediação. O seu alargamento aos processos nacionais revela ainda que, em geral, os EstadosMembros quiseram tratar da mesma forma processos nacionais e processos transfronteiriços. Com efeito, tendo em conta o conteúdo normativo da Diretiva «Mediação», não há razão para distinguir entre os dois tipos de processo.

Além disso, importa salientar que, embora, na prática, o direito da família seja, aparentemente, o ramo em que mais se recorre à mediação, a Diretiva «Mediação» aplicase a todos litígios em matéria civil e comercial. Um domínio em que a mediação continua pouco desenvolvida é o dos processos de insolvência. Importa recordar que, na sua Recomendação sobre uma Nova Abordagem em matéria de Falência e de Insolvência das Empresas, a Comissão incentivou a nomeação de mediadores entre devedores e credores por tribunais, se o considerarem necessário para o êxito de negociações sobre planos de reestruturação.

3.3.Mecanismos de controlo da qualidade (artigo 4.º, n.º 1)

3.3.1.Códigos de conduta

As partes interessadas consideram a adoção de códigos de conduta nacionais uma medida importante para assegurar a qualidade da mediação. São 19 os EstadosMembros que elaboram e impõem a adesão a códigos de conduta, enquanto noutros os códigos deontológicos são estabelecidos pelos próprios prestadores dos serviços de mediação. Alguns EstadosMembros superaram os requisitos mínimos da Diretiva «Mediação, tornando obrigatória a adesão a códigos de conduta para mediadores e organismos de mediação. O Código de Conduta Europeu para Mediadores 10 desempenha uma função essencial neste âmbito, quer pelo facto de ser diretamente utilizado pelas partes interessadas quer por ter inspirado códigos nacionais ou setoriais. Em alguns EstadosMembros, a adesão ao código europeu é obrigatória por lei, enquanto noutros, não o sendo, o código é aplicado na prática. Na sua maioria, as partes interessadas consideraram que o incentivo à elaboração de códigos de conduta facultativos e a adesão de mediadores e organismos de mediação a esses códigos, nos termos da Diretiva «Mediação, têm sido eficazes. Afigurase, por conseguinte, que, no que diz respeito aos códigos de conduta, a aplicação da diretiva é, em geral, satisfatória.

3.3.2.Normas de qualidade para a prestação de serviços de mediação

São 18 os EstadosMembros em que estão regulados os mecanismos de controlo da qualidade da prestação de serviços de mediação. A maior parte dos EstadosMembros dispõe de procedimentos obrigatórios de acreditação dos mediadores, de que mantêm registos. Nos casos em que a legislação não prevê registos nem procedimentos de acreditação, estabeleceramnos, geralmente, os próprios organismos de mediação. É grande a variedade de mecanismos de controlo de qualidade na UE.

Na consulta, um grande número de inquiridos entre os quais, em particular, muitos mediadores pronunciouse a favor da elaboração de normas europeias de qualidade para a prestação de serviços de mediação. Porém, foi escasso o apoio dos EstadosMembros.

Os inquiridos que defenderam a elaboração de normas europeias de qualidade dividiramse entre os que são a favor de normas uniformes ao nível da UE, considerandoas necessárias para continuar a promover o recurso à mediação, e os que são a favor de normas mínimas, que garantam a coerência, mas permitam igualmente ter em conta as diferenças locais em termos de cultura de mediação. Outros sublinharam que as normas europeias se devem basear nas normas nacionais de padrão mais elevado, a fim de evitar que correspondam ao menor denominador comum.

Os inquiridos que se manifestaram contra a elaboração de normas de qualidade europeias alegaram que estas não são necessárias para o êxito da mediação, que as normas nacionais divergem demasiado, que a elaboração daquelas normas deve ficar ao critério dos EstadosMembros, ou que é suficiente a autorregulação em cada mercado nacional. Salientaram igualmente que se registam significativas diferenças culturais e jurídicas na resolução de litígios nos EstadosMembros, as quais influenciam o recurso à mediação pelas partes. A uniformidade restringiria as possibilidades de escolha dos consumidores e originaria litígios. Quando muito, a União Europeia deve promover e facilitar a partilha de boas práticas.

Tendo em conta as reservas dos EstadosMembros contra normas europeias de qualidade vinculativas, mas também o importante apoio das partes interessadas, uma solução possível seria o financiamento pela UE da elaboração de normas europeias de qualidade para a prestação de serviços de mediação, promovida pelas partes interessadas, no contexto do trabalho do Comité Europeu de Normalização (CEN), com fundamento no Regulamento (UE) n.º 1025/2012, relativo à normalização europeia; por exemplo, para um acordo técnico no âmbito do CEN (CWA). Apesar de, em princípio, os trabalhos do CWA deverem orientarse plenamente para o mercado, o financiamento é possível se for considerado «necessário e adequado à consolidação da legislação e das políticas da União» 11 .

3.4.Formação de mediadores (artigo 4.º, n.º 2)

A formação é incentivada ou regulada, em parte ou exaustivamente, pela legislação nacional de 17 EstadosMembros. Superando os requisitos mínimos estabelecidos pela Diretiva «Mediação, a maioria dos EstadosMembros regula a formação inicial dos mediadores e tornaa obrigatória. Muitos impõem também um requisito de formação contínua. Nos EstadosMembros em que a formação não está regulada, os organismos de mediação proporcionam, geralmente, formação facultativa.

Na consulta, a grande maioria dos inquiridos considerou que o incentivo da formação inicial e contínua dos mediadores, imposto pela Diretiva «Mediação, produziu resultados. Outros sublinharam as disparidades e as divergências entre os diversos EstadosMembros no que se refere à criação, ao reconhecimento, ao crescimento e à evolução da profissão de mediador. Na sua opinião, existe uma base comum, mas poucas sinergias entre as diversas jurisdições, no que diz respeito à formação e ao estabelecimento de normas. Consideram que a formação dos mediadores na Europa varia substancialmente em termos de duração e de conteúdo da formação.

Relativamente à mediação em questões de família, a Rede Judiciária Europeia em Matéria Civil e Comercial realçou a importância dos cidadãos no acesso a mediadores com formação específica em questões de família de natureza internacional e em casos de rapto de menores.

A fim de continuar a promover a formação de mediadores, a Comissão prosseguirá o cofinanciamento de vários projetos de formação em mediação, através do seu programa «Justiça».

3.5.Recurso à mediação (artigo 5.º, n.º 1)

Todos os EstadosMembros preveem a possibilidade de os tribunais convidarem as partes a recorrerem à mediação ou, pelo menos, a assistirem a sessões de informação sobre este método de RAL. Em alguns EstadosMembros, a participação nessas sessões de informação é obrigatória, por iniciativa do juiz (por exemplo, na República Checa) ou para determinados litígios previstos na lei, como os de natureza familiar [Lituânia, Luxemburgo e Reino Unido (Inglaterra e País de Gales)]. Noutros EstadosMembros, os advogados devem informar os seus clientes da possibilidade de recurso à mediação, ou a petição ao tribunal deve indicar se foi tentada a mediação ou se existem razões que obstem a essa tentativa. Os sistemas de mediação de alguns EstadosMembros foram concebidos para satisfazer os requisitos de determinados processos como, por exemplo, aqueles a que se aplicam prazos rigorosos. Nos Países Baixos, por exemplo, o juiz de instrução discute, principalmente, a possibilidade de mediação transfronteiriça com os pais que pretendam recorrer à mediação nos processos de rapto parental de menores. A mediação transfronteiriça tem início no dia seguinte ao da audiência preliminar e termina decorridos três dias. Se a mediação for bem-sucedida, os resultados são apresentados de imediato ao juiz no processo. No Reino Unido, o juiz deve verificar a todo o tempo do processo judicial a possibilidade de os sistemas de resolução alternativa de litígios, incluindo a mediação, serem adequados para dirimir o litígio. Se assim o entender, deve convidar as partes a submeterem o litígio a um determinado sistema.

Uma maioria significativa das partes interessadas considerou que as práticas destinadas a motivar as partes a recorrerem à mediação não são eficazes. Afirmaram que esses convites são muito raros, porque os juízes não conhecem a mediação ou não confiam nesta. Os inquiridos que consideraram as práticas eficazes referiramse, sobretudo, ao ramo do direito da família.

O exposto demonstra que, excetuados alguns casos específicos acima referidos, as práticas de incentivo ao recurso à mediação pelas partes não ainda são satisfatórias. Devem, portanto, ser envidados esforços suplementares ao nível nacional, no quadro dos sistemas de mediação existentes. Os inquiridos salientaram como particularmente útil que o direito nacional estabeleça as seguintes medidas: dever das partes de declararem nas suas petições aos tribunais se foi feita qualquer tentativa de mediação, o que serviria não para recordar, não só aos juízes que as apreciam, mas também os advogados que aconselham as partes, a possibilidade de recurso à mediação; sessões de informação obrigatórias no âmbito dos processos judiciais; dever dos tribunais de ponderarem a mediação em todas as fases do processo judicial, particularmente em matéria de direito da família.

3.6.Recurso à mediação, obrigatório ou incentivado, inclusivamente mediante sanções, por força da lei (artigo 5.º, n.º 2)

Do estudo decorre que, em 5 EstadosMembros, a mediação é obrigatória em determinados casos. Em Itália, por exemplo, a mediação é obrigatória em muitos e diversos tipos de litígio; na Hungria e na Croácia em determinadas questões familiares.

Muitos EstadosMembros promovem o recurso à mediação incentivando financeiramente as partes. Os incentivos financeiros à mediação dados por 13 EstadosMembros assumem a forma de redução dos honorários e das custas dos processos judiciais, ou do seu reembolso integral, se por essa via for alcançado um acordo durante a suspensão do processo judicial. Na Eslováquia, por exemplo, são restituídos 30%, 50% ou 90% do montante das custas judiciais, consoante a fase do processo em que o acordo por mediação é alcançado. Em alguns EstadosMembros, a própria mediação é gratuita ou proposta a baixo custo, de acordo com a situação económica das partes.

Os incentivos financeiros assumem também a forma de apoio judiciário. Os EstadosMembros aplicam normas diferentes para diferentes tipos de litígio ou processos de mediação. Por exemplo, na Alemanha, é sempre concedido apoio judiciário para a mediação judicial, mas é limitado para a mediação extrajudicial. Na Eslovénia, o apoio judiciário é concedido apenas para a mediação judicial. No Luxemburgo, o apoio judiciário é disponibilizado para a mediação judicial e para a mediação em questões familiares por um mediador certificado. Em Itália, o apoio judiciário é disponibilizado para a mediação obrigatória. Neste contexto, importa salientar que o artigo 10.º da Diretiva 2003/8/CE torna extensivo o direito ao apoio judiciário em litígios transfronteiriços aos processos extrajudiciais, incluindo a mediação, desde que a lei os imponha ou o recurso a esses processos seja ordenado pelo tribunal.

A imposição de sanções como meio de promover o recurso à mediação verificase em 5 EstadosMembros. Na Hungria, estão previstas sanções para as partes que, após celebrarem um acordo de mediação, recorram, ainda assim, aos tribunais, ou não cumpram o acordado na mediação. Na Irlanda, aplicamse sanções às recusas injustificadas de ponderação da possibilidade de mediação. Em Itália, a parte vencedora num processo contencioso não pode ser reembolsada das custas se previamente tiver recusado uma proposta de mediação cujos termos fossem idênticos ao da decisão judicial. Estão igualmente previstas sanções para os casos em que a mediação é obrigatória e as partes a ela não recorrem, preferindo o tribunal. Na Polónia, se uma parte, que anteriormente concordara em recorrer à mediação, se recusar injustificadamente a nela participar, pode o tribunal ordenarlhe que pague as custas do processo, independentemente do sentido da decisão judicial. Na Eslovénia, se uma parte rejeitar injustificadamente a submissão do processo a mediação judicial, pode o tribunal condenála no pagamento da totalidade ou de parte das despesas judiciais da parte contrária.

É controversa a questão de saber se a mediação deve ser obrigatória ou não. Algumas partes interessadas concluem que a nãoobrigatoriedade da mediação impede a sua promoção 12 . Por outro lado, há quem considere que, para funcionar devidamente, a mediação só pode, por natureza, ser facultativa e que, se passasse a ser obrigatória, perderia a sua atratividade em relação aos processos judiciais.

Importa recordar que a mediação obrigatória afeta o exercício do direito ao recurso efetivo perante um tribunal, consagrado no artigo 47.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

A maioria das partes interessadas defende uma abordagem mais vinculativa nesta matéria. Porém, a maioria dos EstadosMembros e dos académicos tem posição contrária. Entre os que são a favor de uma abordagem mais vinculativa, um grupo de inquiridos defendeu o recurso obrigatório à mediação para determinadas categorias de casos (direito comercial, direito da família, direito do trabalho ou ações de pequeno montante). A posição a favor da mediação obrigatória em qualquer caso mereceu menor apoio.

De modo geral, a possibilidade de sancionar o nãorecurso à mediação não registou grande apoio, apesar de ter havido algum apoio à imposição dos custos às partes que recusam a mediação sem fundamento. De modo geral, mereceu maior apoio o incentivo para que as partes recorram à mediação. Entre os exemplos de incentivos úteis referidos pelos inquiridos contamse a redução das custas judiciais para as partes que tenham tentado a mediação antes de apresentarem o seu pedido, deduções fiscais interessantes e efetivas, mediação gratuita ou, pelo menos, apoio financeiro do Estado aos serviços de mediação.

O recurso a incentivos afigurase útil para motivar as partes a recorrerem à mediação. Os custos da resolução dos litígios são um fator importante para as partes quando decidem se devem optar pela tentativa de mediação ou pelo recurso ao tribunal. Por conseguinte, podem considerarse uma boa prática os incentivos financeiros que tornem economicamente mais atrativa para as partes a ponderação do recurso à mediação, em vez de recorrerem ao processo judicial. A imposição da mediação no âmbito de um processo judicial poderia ser considerada nos casos em que as partes possam, pela natureza da sua relação, ter razões para desentendimentos recorrentes ou para ação judicial, como em certas questões familiares (por exemplo, direito de visita dos filhos) ou litígios entre vizinhos. Importa salientar que, também nesses casos, deve ser respeitado o direito de acesso ao sistema judicial, que é assegurado pelo artigo 47.º da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

Tendo em conta o que precede, pode ser considerado adequado o artigo 5.º, n.º 2, da Diretiva «Mediação».

3.7.Executoriedade dos acordos obtidos por mediação (artigo 6.º)

Todos os EstadosMembros preveem a executoriedade dos acordos obtidos por mediação, em conformidade com a Diretiva «Mediação», tendo alguns superado os seus requisitos: a Bélgica, a República Checa, a Hungria e Itália não requerem expressamente o consentimento de todas as partes no litígio para o pedido de executoriedade do acordo obtido por mediação. Na Grécia e na Eslováquia, o pedido de executoriedade pode ser apresentado por uma das partes sem o consentimento expresso das outras. Nos termos da lei polaca, ao assinarem o acordo, as partes dão o seu consentimento ao pedido de aprovação pelo tribunal da execução do mesmo.

Pode haver exceções à executoriedade geral dos acordos obtidos por mediação; se, por exemplo, o acordo for contrário à ordem pública ou aos interesses dos filhos, em caso de litígios familiares.

A maioria das partes interessadas considera eficazes as práticas relativas à executoriedade dos acordos obtidos por mediação. Alegaram que muito raramente é necessário fazer executar um acordo obtido por mediação. Em sua opinião, a própria natureza da mediação reforça a possibilidade de as partes, uma vez obtida a sua aprovação, virem a cumprir o acordo. Alguns inquiridos, que consideram as práticas ineficazes, entendem que os acordos obtidos por mediação devem ter força executória, independentemente da vontade das partes. Com efeito, a fim de garantir a eficácia da mediação, a melhor prática poderia consistir em permitir que uma das partes peça a declaração de executoriedade do acordo, mesmo sem o consentimento expresso da outra.

3.8.Confidencialidade da mediação (artigo 7.º)

A confidencialidade da mediação é protegida em todos os EstadosMembros, em conformidade com a Diretiva «Mediação», pelo que esta tem sido corretamente aplicada. Alguns EstadosMembros superaram os requisitos da citada diretiva e estabeleceram normas mais rigorosas. Por exemplo, em Malta, os mediadores devem manter a confidencialidade quanto à eventualidade de ter sido alcançado um acordo durante o processo de mediação, pelo que essa informação só pode ser divulgada se as partes o tiverem autorizado expressamente e por escrito.

Um grande número de partes interessadas considera eficazes as práticas respeitantes à confidencialidade da mediação. No entanto, vários inquiridos mencionaram a questão de os mediadores não terem o direito geral de se recusarem a apresentar provas à semelhança do que sucede noutras profissões jurídicas, como a de advogado , embora tenham o dever de confidencialidade. Porém, em termos práticos, nada indica que o artigo 7.º não proteja suficientemente a confidencialidade da mediação.

3.9.Efeitos da mediação nos prazos de prescrição e de caducidade (artigo 8.º)

Todas as leis nacionais asseguram que as partes que optem pela mediação não fiquem impedidas de, posteriormente, instaurarem um processo judicial por terem expirado os prazos de prescrição ou de caducidade durante o processo de mediação. A Diretiva «Mediação» foi, por conseguinte, corretamente aplicada nesta matéria.

A suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade é particularmente importante em ações judiciais, quando se trate de prazos rigorosos, como, por exemplo, nos processos relativos ao regresso de filhos no âmbito de uma ação por rapto parental.

Um grande número de partes interessadas considera eficazes as práticas respeitantes à suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade durante o processo de mediação. Entre estas, algumas sublinharam que esta medida foi assegurada nas suas jurisdições devido à transposição da Diretiva «Mediação» para o direito nacional.

3.10.Informação do público em geral (artigo 9.º)

O dever de divulgação de informações sobre o processo de mediação está inscrito na lei de 13 EstadosMembros. Foram adotadas várias medidas para informar os cidadãos e as empresas sobre a mediação (por exemplo, informações nos sítios web dos organismos nacionais competentes, conferências abertas ao público, campanhas de promoção, anúncios na televisão, emissões radiofónicas, cartazes, etc.). As associações de mediadores, as ordens de advogados ou os próprios mediadores prestam, em todos os EstadosMembros, informações sobre as vantagens da mediação, bem como informações úteis e práticas sobre custos e procedimentos.

Contudo, o estudo revela que as pessoas não estão cientes da mediação, e que continua a continua a faltar informação destinada a eventuais partes interessadas. Estes factos prejudicam a eficiência dos serviços de mediação, facto confirmado por partes interessadas em 18 EstadosMembros. A falta de informação afeta não só as partes mas também os profissionais do direito, porquanto constitui mais um obstáculo à potencial generalização do recurso à mediação, pelo menos em 10 EstadosMembros. Na consulta, a maioria dos inquiridos considera que a prestação de informações ao público em geral não é eficaz. Entre os que consideram que é eficaz, muitos afirmaram que as informações publicadas na Internet pelos tribunais, ministérios, organizações de mediação e câmaras de comércio, por exemplo são mais eficazes. Outros mecanismos eficazes mencionados são os folhetos informativos, visitas privadas aos tribunais ou eventos informativos, como os dias dedicados à mediação.

A Comissão Europeia cofinancia projetos de promoção da mediação através do programa «Justiça». Além disso, no sítio web do Portal Europeu da Justiça 13 encontrase disponível um volume considerável de informação sobre os sistemas de mediação dos EstadosMembros e as entidades a contactar. Devem explorarse, através da Rede Judiciária Europeia em Matéria Civil e Comercial, outras formas de divulgação das informações disponíveis.

4.Conclusões

Com a Diretiva «Mediação» visavase facilitar o acesso à resolução alternativa de litígios, promover a sua resolução amigável e garantir que as partes que recorrem aos serviços de mediação possam confiar num quadro legal previsível. Este objetivo estratégico mantémse e manterseá válido: a mediação pode ajudar a evitar litígios desnecessários a expensas dos contribuintes, e reduzir o tempo e os custos inerentes às ações judiciais. A longo prazo, pode criar uma cultura não litigiosa, em que não existam vencedores nem vencidos, mas sim parceiros. A citada diretiva introduziu formas diferentes de promover a resolução amigável de litígios transfronteiriços em matéria civil e comercial, bem como um quadro europeu de mediação como forma de resolução alternativa, extrajudicial, dos litígios.

Com base no estudo, na consulta pública em linha e no debate com os EstadosMembros no âmbito da Rede Judiciária Europeia em Matéria Civil e Comercial, afigurase que a aplicação da Diretiva «Mediação» teve um impacto significativo na legislação de muitos EstadosMembros. Além de estabelecer alguns requisitos essenciais para o recurso à mediação em litígios transfronteiriços em matéria civil e comercial, aquela diretiva impulsionou a implantação da mediação também num contexto puramente nacional em toda a UE. Tal devese, em especial, ao facto de a maior parte dos EstadosMembros ter alargado o âmbito de aplicação das suas medidas de transposição da Diretiva «Mediação» para o direito nacional. Em geral, esta diretiva contribuiu com o valor acrescentado da UE, sensibilizando os legisladores nacionais para as vantagens da mediação, introduzindo sistemas de mediação ou desencadeando a expansão dos sistemas de mediação vigentes.

A dimensão do impacto da Diretiva «Mediação» nos EstadosMembros difere consoante o nível dos sistemas de mediação nacionais. Na prática, as dificuldades relativas ao funcionamento dos sistemas de mediação nacionais prendemse, sobretudo, com as tradições prevalecentes em muitos EstadosMembros, com o nível, frequentemente baixo, de conhecimentos sobre mediação e com o funcionamento dos mecanismos de controlo da qualidade.

A avaliação revela que, neste momento, não há necessidade de rever a Diretiva «Mediação», podendo, no entanto, ser aperfeiçoada a sua aplicação:

   Os EstadosMembros devem, sempre que necessário e adequado, intensificar os seus esforços de promoção da mediação e de incentivo ao seu recurso, fazendoo através dos vários meios e mecanismos previstos na directiva em apreço e referidos no presente relatório. Em especial, ao nível nacional, devem prosseguir os esforços para aumentar o número de casos em que os tribunais convidam as partes a recorrerem à mediação para resolverem o litígio. Podem ser consideradas exemplos de boas práticas neste domínio as seguintes medidas: dever das partes de declararem nas suas petições aos tribunais se foi feita qualquer tentativa de mediação, particularmente em sessões de informação obrigatórias em matéria de direito da família no âmbito de um processo judicial; dever dos tribunais de considerarem a possibilidade de mediação em todas as fases do processo judicial; incentivos financeiros que tornem economicamente mais interessante para as partes o recurso à mediação, em vez de recorrerem a processos judiciais; garantia de executoriedade do acordo, sem necessidade do consentimento de todas as partes envolvidas.

   A Comissão continuará a cofinanciar projetos relacionados com a mediação através do seu programa «Justiça». Em princípio, está igualmente disposta a conceder financiamento da UE para a elaboração, orientada pelas partes interessadas, de normas de qualidade europeias para a prestação de serviços de mediação. Além disso, a Comissão continuará a consultar a Rede Judiciária Europeia em Matéria Civil e Comercial e a promover o recurso à mediação, a fim de obter uma base de dados mais sólida sobre o recurso aos serviços de mediação e aumentar a sensibilização do público, tornandoo particularmente ciente da existência de informações disponíveis no sítio web do Portal Europeu de Justiça sobre os sistemas de mediação dos EstadosMembros.

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