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Document 52007AE0999

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Flexigurança (dimensão da flexibilidade interna — a negociação colectiva e o papel do diálogo social enquanto instrumentos de regulação e de reforma dos mercados do trabalho)

JO C 256 de 27.10.2007, p. 108–113 (BG, ES, CS, DA, DE, ET, EL, EN, FR, IT, LV, LT, HU, MT, NL, PL, PT, RO, SK, SL, FI, SV)

27.10.2007   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 256/108


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Flexigurança (dimensão da flexibilidade interna — a negociação colectiva e o papel do diálogo social enquanto instrumentos de regulação e de reforma dos mercados do trabalho)»

(2007/C 256/20)

A futura Presidência portuguesa enviou ao Comité Económico e Social Europeu uma carta, datada de 13 de Fevereiro de 2007, solicitando a elaboração de um parecer sobre a proposta supramencionada.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania emitiu parecer em 18 de Junho de 2007 sendo relator Thomas JANSON.

Na 437.a reunião plenária de 11 e 12 de Julho de 2007 (sessão de 11 de Julho), o Comité Económico e Social Europeu aprovou, por 163 votos a favor, 2 votos contra e 5 abstenções, o presente parecer.

1.   Síntese e conclusões

1.1

O CESE saúda o pedido de elaboração de um parecer sobre flexigurança por parte da Presidência portuguesa, dado que, até ao momento, o debate sobre este tema se tem restringido principalmente ao aumento da flexibilidade externa e a formas de compensação desse aumento mediante o reforço das políticas do mercado de trabalho ou esquemas de segurança social. Em vez disso, dever-se-ia privilegiar outras dimensões permitindo a criação de situações vantajosas para todas as partes.

1.2

O CESE gostaria de sublinhar que o papel dos parceiros sociais deverá ser reforçado. Estes deveriam ser protagonistas em todos os debates sobre flexigurança e desempenhar um papel privilegiado nas consultas da Comissão Europeia. Assim, a Comissão deveria ter atribuído maior destaque à consulta dos parceiros sociais europeus sobre a definição comunitária do conceito de flexigurança.

1.3

Reforçar os sistemas de relações industriais tanto a nível comunitário como nacional é necessário em qualquer debate sobre flexigurança. É essencial criar um diálogo social forte e dinâmico, no qual os parceiros sociais participem activamente e possam negociar, influenciar e assumir responsabilidades na definição, nos componentes e na avaliação dos resultados da flexigurança.

1.4

A Comissão e os Estados-Membros deveriam procurar associar os debates que podem conduzir a reformas, baseadas no conceito de flexigurança, à modernização das relações laborais a todos os níveis. O CESE deseja ver um elo mais forte entre o debate sobre flexigurança, o reforço do diálogo social a todos os níveis e a negociação colectiva na medida adequada, respeitando os sistemas de relações industriais divergentes dos Estados-Membros. O conceito de flexigurança deve aumentar tanto a flexibilidade como a segurança de modo equilibrado. O conceito de flexigurança não significa a redução unilateral e ilegítima dos direitos dos trabalhadores, uma ideia que o CESE rejeita.

1.5

Tendo em conta o papel essencial dos parceiros sociais no desenvolvimento gradual das políticas comunitárias de flexigurança, o CESE considera que este debate não pode ser visto de forma independente do conteúdo nem da evolução do diálogo social europeu.

1.6

O CESE deseja realçar que a Comissão e os Estados-Membros deveriam dar mais atenção à igualdade entre homens e mulheres, bem como à solidariedade intergeracional no âmbito da flexigurança. Do ponto de vista da flexibilidade e da segurança, as mulheres, os trabalhadores mais velhos e os jovens encontram-se frequentemente em desvantagem no mercado de trabalho; dever-se-ia procurar melhorar a situação destes grupos.

1.7

O CESE deseja que os Estados-Membros e a Comissão avaliem o reforço da adaptabilidade através da flexibilidade interna tornando-a numa dimensão viável e aceitável de flexigurança. A flexibilidade interna pode desempenhar um papel-chave no aumento da produtividade, inovação e competitividade podendo contribuir desta forma para o cumprimento dos objectivos da Estratégia de Lisboa. Poderá igualmente desempenhar um papel importante assistindo os trabalhadores na conciliação do trabalho com outras actividades e responsabilidades e melhorando a qualidade do seu emprego. Tudo na condição essencial de ter como base um quadro de regulamentação que assegure a protecção no emprego e nos cuidados de saúde e forneça estabilidade e segurança aos trabalhadores. A protecção do emprego aliada a serviços eficazes de reinserção profissional e a políticas activas no mercado de trabalho é essencial para a capacidade de adaptação e para a segurança das empresas e dos trabalhadores.

1.8

No entender do CESE, deveria ser encontrado um equilíbrio entre a flexibilidade do tempo de trabalho e a protecção do trabalhador, o qual será melhor assegurado através de regulamentos estabelecidos por negociações colectivas e segundo as práticas nacionais. Tal negociação em torno da flexibilidade do tempo de trabalho exige um contexto sólido de direitos e instituições sociais que funcionem correctamente e sistemas de segurança social favoráveis ao emprego que possam suportá-la.

1.9

A flexibilidade de funções é, assim, um assunto-chave para a negociação colectiva entre os parceiros sociais. Através desta negociação, poder-se-á equilibrar e ajustar as necessidades das empresas e dos trabalhadores bem como definir uma compensação adequada para os trabalhadores que melhorem as suas capacidades.

1.10

A flexibilidade de funções exige uma constante actualização do conhecimento e das capacidades dos trabalhadores, bem como um sistema de educação e formação que funcione bem, de forma a suportar esta actualização. Apesar dos compromissos assumidos no passado no âmbito da aprendizagem ao longo da vida, muito se encontra por fazer na prática.

2.   Contexto

2.1

A Presidência portuguesa solicitou ao CESE a elaboração de um parecer exploratório sobre flexigurança integrando questões como:

1)

A dimensão da flexibilidade interna;

2)

A negociação colectiva e o papel do diálogo social enquanto instrumentos de regulação e de reforma dos mercados do trabalho.

2.2

O debate sobre flexigurança poderia ter por base vários aspectos das orientações para as políticas de emprego (2005-2008). O Conselho Europeu da Primavera de 2006 solicitou aos Estados-Membros que prestassem especial atenção ao desafio-chave da «flexigurança» (equilíbrio entre flexibilidade e segurança). Os Estados-Membros foram convidados, de acordo com a situação dos respectivos mercados de trabalho, a prosseguirem reformas do mercado de trabalho e das políticas sociais numa perspectiva integrada de «flexigurança».

2.3

Tal como sucedera nas Cimeiras Europeias de Dezembro de 2006 e Março de 2007, o tema da flexigurança foi debatido em duas cimeiras sociais.

2.4

A Comissão criou um grupo de trabalho de peritos responsável por propor «caminhos para a flexigurança», ou seja, um conjunto de dimensões de flexibilidade e segurança na vida profissional. Com base neste documento, a Comissão publicou uma comunicação sobre flexigurança, em Junho de 2007, que contém um feixe de princípios comuns. Em Dezembro de 2007, deverá ser incluído um conjunto de princípios comuns nas orientações revistas para o emprego de 2008. O Livro Verde Modernizar o direito do trabalho para enfrentar os desafios do século XXI  (1) também abrange a dimensão de flexigurança, sob o ângulo particular do contrato de trabalho, cujas recomendações se dão por reproduzidas.

2.5

O CESE gostaria de realçar o importante trabalho realizado pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho, que apresenta aspectos relevantes para a definição de flexigurança.

3.   Dimensões das estratégias de flexigurança

3.1

a)

As estratégias de flexigurança pretendem combinar, de forma equilibrada, vários tipos de flexibilidade e segurança do mercado de trabalho para promover a adaptabilidade dos trabalhadores e das empresas proporcionando-lhes, ao mesmo tempo, estabilidade e protecção contra riscos. A título de exemplo de tipos de flexibilidade e tipos de segurança poder-se-á citar:

Exemplos de flexibilidade

Flexibilidade externa numérica

Adaptação do volume de emprego mediante uma troca com o mercado de trabalho externo, envolvendo despedimentos, trabalho temporário e contratos a prazo.

Flexibilidade interna numérica

Adaptação temporária do volume de trabalho dentro da empresa, envolvendo medidas como horários de trabalho atípicos e esquemas de contagem de tempos.

Flexibilidade interna de funções

Organização da flexibilidade dentro da empresa através de formação, multi-tarefas e rotação de trabalho com base na capacidade dos trabalhadores de realizarem várias tarefas e actividades.

Flexibilidade salarial

Variação do salário de base e da remuneração adicional consoante o desempenho do trabalhador ou da empresa.

Exemplos de segurança

Segurança do posto de trabalho

Segurança proporcionada pela legislação de protecção do emprego, etc., reduzindo o poder do empregador de despedir à vontade.

Segurança do emprego

Adaptação das oportunidades de emprego mediante níveis altos de empregabilidade assegurados, por exemplo, pela formação e educação.

Segurança salarial

Protecção de níveis salariais adequados e estáveis.

Segurança de conciliação

Segurança do trabalhador quanto à conciliação da vida profissional com outras responsabilidades e compromissos não profissionais.

b)

Importa salientar a segurança jurídica do contrato de trabalho que o faz oponível a todos e perante os tribunais. Implica a subsistência do nexo de subordinação que produz entre outras todas as consequências no plano do direito à protecção social (mantida e aplicada) do assalariado.

3.2

Liderado pela Comissão Europeia e com base em certos aspectos do exemplo dinamarquês, o debate sobre flexigurança na Europa tem-se restringido principalmente ao aumento da flexibilidade externa e a formas de compensação desse aumento mediante o reforço das políticas do mercado de trabalho ou esquemas de segurança social. As opiniões dos sindicatos e das organizações de empregadores sobre as vantagens e desvantagens da flexibilidade externa são frequentemente díspares. Além disso, a OCDE (Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económicos) (2) declarou recentemente que a legislação de protecção do emprego não tem um impacto significativo na taxa total de emprego. Por outro lado, a OIT (Organização Internacional do Trabalho) demonstrou que há uma relação positiva entre a antiguidade num posto de trabalho e a produtividade (ver Anexo).

3.3

O presente parecer visa expandir o debate sobre flexigurança em três direcções. Primeiramente, pretende demonstrar que é preciso reforçar o papel dos parceiros sociais neste debate e nas reformas do mercado de trabalho em geral. Em segundo lugar, o CESE pretende realçar que o debate sobre flexigurança deveria dar mais atenção às diferenças entre homens e mulheres e, enquanto tal, à categoria dos jovens no mercado de trabalho. A igualdade entre homens e mulheres tem sido ignorada nesta discussão. Apesar da maioria das mulheres desejar formas de trabalho mais flexíveis, bem como garantir um maior equilíbrio entre a vida privada e o trabalho, em alguns casos, do ponto de vista da flexibilidade e da segurança, as mulheres poderão estar estão frequentemente em desvantagem no mercado de trabalho; dever-se-ia procurar igualar a sua situação à dos homens (3). Em terceiro lugar, o CESE considera importante alargar o debate explorando formas alternativas para atingir a adaptabilidade, facilitar a aprendizagem ao longo da vida, melhorar a produtividade e incentivar a inovação, dimensões essenciais do processo de Lisboa. O CESE abordou igualmente outros temas no seu parecer sobre as orientações para as políticas de emprego (4). Face ao exposto, este parecer não se dedica à temática da flexibilidade externa mas sim às possibilidades de aumentar a adaptabilidade através da flexibilidade interna.

3.4

A flexigurança tem especial relevância no universo das pequenas e médias empresas (PME), tendo em conta que estas empresas têm um peso esmagador em termos de emprego. Em consequência disto, as políticas dos Estados-Membros sobre flexigurança, deverão conter disposições que salvaguardem as necessidades das PME e dos seus assalariados

3.5

O CESE salienta que na base de qualquer modelo de flexigurança está a noção de um Estado providência capaz de garantir níveis altos de protecção social mediante assunção dos encargos por serviços públicos com meios suficientes, assentando também num quadro jurídico estável para a negociação colectiva e o diálogo social. Os sistemas de segurança social podem melhorar a mobilidade garantindo aos trabalhadores que não ficarão em desvantagem se confrontados com alterações no seu posto de trabalho. Um quadro estável para o diálogo social e a negociação colectiva cria oportunidades de acordo entre parceiros sociais fortes quanto a assuntos fundamentais do mercado de trabalho.

4.   Flexigurança e parceiros sociais

4.1

A flexigurança implica definir a distribuição equilibrada de direitos e obrigações entre empregadores e trabalhadores. O diálogo social e a negociação colectiva são instrumentos cruciais na concepção e execução de qualquer reforma do mercado de trabalho, incluindo a flexigurança. Assim, o Comité Económico e Social Europeu sublinha que os parceiros sociais são protagonistas no debate a qualquer nível sobre flexigurança. Os parceiros sociais deveriam ser, cada vez mais, os actores principais na definição do equilíbrio entre flexibilidade e segurança contribuindo, desta forma, para a melhoria das regras do mercado de trabalho.

4.2

No plano europeu, o CESE reconhece que a Comissão informou os parceiros sociais sobre o plano relativo a este debate. Porém, no que toca a este tema, o CESE considera que a Comissão deveria ter atribuído maior destaque à consulta, especialmente, dos parceiros sociais europeus sobre a definição comunitária do conceito de flexigurança. Sem um envolvimento forte dos parceiros sociais, será difícil executar qualquer tipo de estratégia de flexigurança.

4.3

O Comité Económico e Social Europeu declarou no seu parecer sobre o sistema dinamarquês de flexigurança (5) que «os parceiros sociais tiveram um papel fundamental no desenvolvimento da versão dinamarquesa de flexigurança, tanto no processo decisório como na aplicação das decisões em domínios como a política de formação e as reformas estruturais do mercado de trabalho. […] O papel dos parceiros sociais resulta […] do devir histórico […] O maior envolvimento e contributo dos parceiros sociais pode, assim, potenciar a capacidade da sociedade para competir e adaptar-se».

4.4

No parecer sobre o modelo social europeu (6), o CESE sublinhou que «no tocante à estrutura de base do modelo social europeu, não é possível avaliar adequadamente o papel fundamental dos parceiros sociais na política económica e social. Assim, o papel regulador das organizações sindicais e patronais é especialmente importante no quadro dos acordos colectivos e dos acordos salariais».

4.5

Assim, a agenda da flexigurança não deveria ser estabelecida do topo para a base, ou seja, definida pela Comissão e discutida pelos governos dos Estados-Membros. Os parceiros sociais têm de poder negociar, influenciar e assumir responsabilidades na definição, nos componentes e na avaliação dos resultados da flexigurança. Dado que a flexigurança se relaciona estritamente com o diálogo social e a negociação colectiva, a emergência do debate sobre flexigurança põe também em evidência deficiências destas dimensões, que deverão ser tratadas ao mesmo tempo em que se executa a agenda da flexigurança. Assim, o CESE pretende ver um elo mais forte entre a discussão sobre flexigurança, o reforço do diálogo social a todos os níveis e a negociação colectiva na medida adequada, respeitando os diversos sistemas de relações laborais dos Estados-Membros.

4.6

O diálogo social no plano europeu é um caso único no mundo, dado que os parceiros sociais desempenham funções de co-legisladores no campo social. Nos últimos anos, esta situação levou a que o diálogo social se tornasse mais autónomo. Os parceiros sociais têm o direito de tratar assuntos de interesse comum em prol de um mercado de trabalho europeu mais funcional. Tendo em conta o papel essencial dos parceiros sociais no desenvolvimento gradual das políticas comunitárias de flexigurança, o CESE considera que este debate não pode ser visto de forma independente do conteúdo nem da evolução do diálogo social europeu. No programa de trabalho plurianual, os parceiros sociais decidiram explorar aspectos da flexigurança e tomar medidas que contribuam para uma melhor percepção comum dos instrumentos europeus de diálogo social (7). O CESE desenvolveu a sua posição nesta matéria no parecer sobre «Empregabilidade e empreendedorismo — O papel da sociedade civil, dos parceiros sociais e das instâncias regionais e locais, numa perspectiva de género» (8) .

4.7

Nos Estados-Membros há múltiplos exemplos do papel importante que os parceiros sociais desempenham, a todos os níveis, no aumento da flexibilidade e segurança dos empregadores e trabalhadores. Os acordos colectivos per se não são apenas um factor de segurança para os empregadores e trabalhadores, mas permitem também uma flexibilidade negociada. Dado que comportam elementos de uma maior flexibilidade interna, a progressão na carreira e os direitos à aprendizagem ao longo da vida tornam-se mais evidentes num ambiente cada vez mais competitivo. Contudo, nos Estados-Membros em que o diálogo social é inadequado devido a sistemas frágeis de relações laborais, estes factores expõem demasiado os trabalhadores a forças do mercado de trabalho proporcionando-lhes frequentemente pouca protecção. Deste modo, o reforço e a modernização dos sistemas de relações laborais nos Estados-Membros deveria acompanhar, a par e passo, as discussões sobre flexigurança nos Estados-Membros.

4.8

Neste contexto, o CESE gostaria de realçar alguns exemplos de acordos entre parceiros sociais:

Os acordos de negociação colectiva na Dinamarca introduzem prazos de aviso prévio obrigatórios, possibilitando que os trabalhadores estejam mais bem preparados para assumir outro lugar de trabalho.

Na Suécia, os acordos colectivos no contexto laboral estabeleceram fundos de «transição de carreira» financiados pelo sector empresarial e co-geridos pelos parceiros sociais. Estes fundos fornecem acções de formação, assistência na procura de trabalho ou estágios remunerados noutras empresas aos trabalhadores que tenham recebido um aviso, mesmo durante o período de funções na empresa que os despediu.

O acordo tripartido de Espanha diz respeito à forma de limitação de contratos de trabalho a prazo. Este acordo segue o princípio segundo o qual uma quota demasiado elevada de trabalho a prazo não serve os interesses comuns do trabalho e das empresas.

Na Alemanha, os acordos colectivos, elaborados e aplicados mediante acordo dos grupos de interesses da empresa, prevêem flexibilidade no horário e na organização do trabalho dentro de um quadro limitado.

O CESE considera igualmente que os acordos celebrados pelos parceiros sociais europeus relativamente a, por exemplo, trabalho a prazo, licença parental, trabalho a tempo parcial e teletrabalho, integram o conceito de flexigurança, contribuindo para a segurança e a flexibilidade dos trabalhadores e empregadores.

4.9

Para que os parceiros sociais participem nas negociações sobre temas fundamentais do mercado de trabalho, visando alcançar um equilíbrio viável do ponto de vista social entre flexibilidade e segurança, terá de haver um quadro jurídico nacional incentivando os parceiros sociais a contribuírem e negociarem de forma eficaz, no âmbito dos assuntos de flexigurança. Com regulamentação da protecção do emprego e um sólido quadro normativo, os parceiros sociais podem negociar acordos que promovam os esforços e a cooperação dos trabalhadores, assim como a sua determinação em empreenderem actividades de formação, o que é positivo para o emprego total e para a eficiência económica. O contributo dos parceiros sociais garante que serão tidos em conta tanto os interesses das empresas como os dos trabalhadores. Além disso, a protecção do emprego aliada a serviços eficazes de reinserção profissional e a políticas activas no mercado de trabalho é essencial para a capacidade de adaptação e para a segurança das empresas e dos trabalhadores.

4.10

O contributo dos parceiros sociais poderia ter por objectivo aumentar a mobilidade protegida e tirar partido das transições. Os parceiros sociais podem ajudar na organização de um controlo colectivo e negociado das oportunidades e dos direitos do mercado de trabalho, o que, no entender do CESE, combateria a tendência para a segmentação e melhoraria a integração.

5.   Igualdade entre homens e mulheres, solidariedade intergeracional e flexigurança

5.1

A flexibilidade e segurança do mercado de trabalho afectam os homens e as mulheres de forma diferenciada. As mulheres têm frequentemente postos de trabalho mais precários e inseguros, caracterizados por uma flexibilidade excessiva. A flexibilidade excessiva, que, em alguns casos, pode levar a um posto de trabalho precário e inseguro, deve ser compensada por uma forma de segurança adequada. Por outro lado, tendo em conta a persistência dos papéis tradicionais desempenhados por homens e mulheres, as mulheres têm maiores responsabilidades relativamente aos cuidados com crianças e idosos enfrentando maiores dificuldades na conciliação das actividades profissionais e não profissionais. Além disso, não obstante a legislação de combate à discriminação, há uma disparidade salarial entre homens e mulheres, tendo estas frequentemente menos direitos em matéria de segurança social, incluindo no respeitante a pensões. Assim, as mulheres são afectadas mais frequentemente pelos aspectos negativos da flexibilidade.

5.2

O CESE sublinha que o debate sobre flexigurança deverá englobar uma dimensão significativa de igualdade entre homens e mulheres, que tem sido, até ao momento, ignorada neste debate. É importante melhorar a situação das mulheres no mercado de trabalho através da análise de questões de flexibilidade e segurança, como o aumento dos postos de trabalho seguros, a sua integração nos sistemas de segurança social e um melhor apoio das instituições à conciliação entre actividades profissionais e não profissionais. Além disso, a divisão de responsabilidades entre homens e mulheres relativas a cuidados e tarefas domésticas deveria integrar o debate. No parecer sobre o «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada», o CESE demonstrou, a pedido da Presidência portuguesa, a sua posição relativamente a estes assuntos (9).

5.3

Além da igualdade entre homens e mulheres, a flexigurança tem igualmente uma dimensão geracional. Em comparação com a mão-de-obra em geral, a taxa de emprego é mais baixa entre os trabalhadores mais velhos. Também os jovens de muitos Estados-Membros enfrentam mercados de trabalho instáveis caracterizados por uma taxa alta de desemprego, contratos de trabalho a prazo, cobertura insuficiente de segurança social e postos de trabalho abaixo das suas habilitações.

5.4

O CESE (10) indicou que o posto de trabalho deveria corresponder à formação e experiência profissional do trabalhador sem qualquer discriminação entre gerações e que todos os Estados-Membros deverão transpor e aplicar a directiva sobre igualdade de tratamento no emprego e na actividade profissional (2000/78/CE). Uma política a favor do emprego de qualidade orienta e forma gerações de cidadãos ao longo da sua carreira. O que implica uma intervenção dos parceiros sociais e de todos os actores económicos e sociais a nível local, nacional e europeu.

5.5

Os parceiros sociais europeus concluíram um quadro de acção sobre igualdade entre homens e mulheres susceptível de ser utilizado igualmente no debate sobre flexigurança. Neste quadro de acção os parceiros sociais identificaram quatro prioridades: análise do papel de homens e mulheres, promoção das mulheres na tomada de decisão, conciliação entre vida profissional e familiar e correcção das disparidades salariais entre homens e mulheres.

5.6

As considerações do parágrafo anterior e o diálogo entre os Parceiros Sociais devem dar igual relevância e importância ao problema dos trabalhadores com deficiência e dos jovens estudantes.

6.   Flexigurança e flexibilidade interna

6.1

A flexibilidade interna tem sido um aspecto insuficientemente desenvolvido no debate sobre flexigurança. A flexibilidade interna diz respeito à flexibilidade do tempo de trabalho e à flexibilidade de funções, servindo para reforçar a adaptabilidade. Tipicamente, os parceiros sociais têm uma ampla experiência na negociação de acordos colectivos nesta matéria, sendo os resultados positivos. A flexibilidade interna pode desempenhar um papel fundamental no aumento da produtividade, inovação e competitividade podendo contribuir, desta forma, para o cumprimento dos objectivos da Estratégia de Lisboa. Poderá igualmente desempenhar um papel importante assistindo os trabalhadores na conciliação do trabalho com outras actividades e responsabilidades e melhorando a qualidade do seu emprego. Tanto num caso como no outro, poderá aumentar a estabilidade e previsibilidade. Contudo, a flexibilidade interna pode também tornar-se excessiva, seja por conduzir a más condições de trabalho ou a situações de trabalho precário, seja por impedir o equilíbrio entre actividades profissionais e não profissionais, seja ainda pelos efeitos prejudiciais que é susceptível de ocasionar na qualidade dos bens e nas garantias de prestação de serviços aos consumidores. Assim, este tipo de flexibilidade é apenas viável quando resultante da negociação colectiva e com base num quadro de regulamentação que assegure a protecção no emprego e nos cuidados de saúde e forneça estabilidade e segurança aos trabalhadores. Neste contexto jurídico, a aposta na flexibilidade interna negociada é uma solução viável tendo por objectivo combinar a melhoria da competitividade com a melhoria da qualidade do emprego e da vida profissional.

6.2   Flexibilidade do tempo de trabalho

6.2.1

A flexibilidade do tempo de trabalho tem a ver com a distribuição do tempo de trabalho normal semanal, fixado em acordos colectivos ou na lei, por um período maior de tempo. As empresas podem beneficiar desta flexibilidade através de possibilidades de adaptação a flutuações da procura ou de pessoal e da utilização plena de investimentos de capital fazendo uso de horas extraordinárias, planificação flexível de horários de trabalho com base em calendários predefinidos, trabalho por turnos, etc. Desta forma, a flexibilidade do tempo de trabalho poderá fortalecer a produtividade e a competitividade.

6.2.2

A flexibilidade do tempo de trabalho pode igualmente consistir na distribuição do tempo de trabalho na vida profissional de cada um, bem como no equilíbrio entre a vida profissional e pessoal (mas não na duração do tempo normal de trabalho durante a semana). Estas formas de flexibilidade do tempo de trabalho poderão servir os interesses dos trabalhadores criando possibilidades para estes combinarem, de forma positiva, actividades e responsabilidades profissionais e não profissionais através do uso de sistemas de tempo flexível, contas de tempo de trabalho, licenças parentais ou para formação, opções para transitar entre trabalho a tempo inteiro e parcial, etc.

6.2.3

O CESE considera que se deverá evitar a expansão da flexibilidade do tempo de trabalho se esta favorecer somente os interesses das empresas não tendo simultaneamente em conta a necessidade de protecção dos trabalhadores (11). Por outro lado, a organização do tempo de trabalho deveria servir «[…] também o interesse dos trabalhadores em controlarem mais o seu tempo, bem como, em particular, numa maior compatibilidade entre trabalho e família, respeitando as necessidades da empresa de uma organização do tempo de trabalho mais flexível» (12).

6.2.4

Para esse efeito, na opinião do CESE, dever-se-ia procurar um equilíbrio entre flexibilidade do tempo de trabalho e protecção do trabalhador, o qual poderá ser mais bem garantido através de regimes estabelecidos por negociações colectivas. De facto, num parecer anterior, o CESE afirmou que «a concepção de regras aplicáveis ao tempo de trabalho nas convenções colectivas apresenta […] um interesse fundamental para os parceiros sociais, que têm grande competência e experiência nessas questões» (13).

6.2.5

A negociação sobre flexibilidade do tempo de trabalho exige um quadro de negociação apropriado e um contexto sólido de direitos e instituições sociais que possam suportá-lo. Este contexto implica a existência de regulamentação que proporcione estabilidade e protecção aos trabalhadores bem como protecção social aos assalariados com contratos a tempo parcial e que facilite esquemas de licença parental e estruturas para acolhimento de crianças e idosos. É essencial que a legislação seja flexível e neutra e que permita aos parceiros sociais encontrarem as soluções mais adequadas.

6.3   Flexibilidade de funções

6.3.1

A flexibilidade de funções consiste em tirar partido, sempre que necessário, da capacidade dos trabalhadores de realizarem diferentes tarefas através da rotação de postos de trabalho, alargamento do âmbito das tarefas e enriquecimento do trabalho. As empresas podem beneficiar desta flexibilidade, dado que lhes permite adaptarem o tipo de tarefas a realizar às flutuações de procura ou de pessoal bem como utilizarem, de forma mais produtiva, os recursos humanos e investimentos de capital. A flexibilidade de funções poderá também servir o interesse dos trabalhadores aumentando as suas oportunidades de desenvolvimento pessoal, aprendizagem, empregabilidade, satisfação profissional e aumentos salariais.

6.3.2

A flexibilidade de funções pode ser um factor-chave no cumprimento dos objectivos de Lisboa relativos ao aumento da produtividade, inovação e competitividade. Conforme demonstra a Fundação de Dublin, por exemplo, a flexibilidade de funções, associada à formação, tem um efeito positivo no desenvolvimento e manutenção de capacidades, influenciando positivamente a produtividade (14).

6.3.3

No entanto, a flexibilidade de funções exige empregos seguros, condições de trabalho dignas, responsabilização e formas de trabalho baseadas na cooperação. Como o CESE defendeu num parecer anterior, «a segurança do emprego, um ambiente de trabalho sadio e uma organização do trabalho que permita maior margem de manobra individual constituem, no seu conjunto, factores decisivos para o aumento do desempenho e, por conseguinte, da capacidade de inovação» (15). No mesmo parecer afirmava se que «as formas cooperativas de trabalho assentes em hierarquias “planas” e numa maior autonomia de decisão, como o trabalho em grupo ou em equipa, tornam possível tirar globalmente partido dos conhecimentos e capacidades das pessoas, tendo em conta as crescentes exigências de flexibilidade da economia. Boas condições de trabalho e formas cooperativas da sua organização constituem simultaneamente condições indispensáveis à melhoria da produtividade e ao reforço da capacidade de inovação das empresas» (16).

6.3.4

Contudo, a Fundação de Dublin chamou a atenção para o facto de a flexibilidade de funções poder conduzir a mais pressão de trabalho e stress. Assim, a Fundação sublinha que é importante «[…] alcançar um equilíbrio entre procura e controlo de emprego para prevenir o esgotamento dos trabalhadores» (17).

6.3.5

A aprendizagem ao longo da vida deveria ser um elemento fundamental das estratégias de flexibilidade de funções e de flexibilidade interna, em geral. O CESE realçou em diversos pareceres recentes (18) a importância da aprendizagem ao longo da vida para o aumento das capacidades dos trabalhadores, das oportunidades de carreira e da produtividade. A flexibilidade de funções exige uma constante actualização do conhecimento e das capacidades dos trabalhadores, bem como um sistema de educação e formação que funcione bem, de forma a suportar esta actualização. Apesar dos compromissos assumidos no passado no âmbito da aprendizagem ao longo da vida, muito se encontra por fazer na prática.

6.3.6

A flexibilidade de funções é, assim, um assunto-chave para a negociação colectiva entre os parceiros sociais. Através desta negociação, poder-se-á equilibrar e ajustar as necessidades das empresas e dos trabalhadores bem como definir uma compensação adequada para os trabalhadores que melhorem as suas capacidades.

Bruxelas, 11 de Julho de 2007.

O Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Dimitris DIMITRIADIS


(1)  Ver COM(2006) 708 final. «Livro Verde — Modernizar o direito do trabalho para enfrentar os desafios do século XXI». Parecer do CESE, de 30.5.2007, sobre «Modernizar o direito do trabalho» SOC/246 (relator D. Retureau) JO C 175 de 27.7.2007.

(2)  Perspectivas da OCDE para o emprego 2006: Impulsionar o emprego e os salários.

(3)  Pareceres em curso sobre o «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada» SOC/271 (sendo relator P. Clever) e SOC 273 «Empregabilidade e empreendedorismo — O papel da sociedade civil, dos parceiros sociais e das instâncias regionais e locais, numa perspectiva de género» (relator: L. M. Pariza Castaños).

(4)  Ver Parecer do CESE de 31.5.2005 sobre as «Orientações para as políticas de emprego 2005-2008» relator: H. MALOSSE, (JO C 286 de 17.11.2005).

(5)  Parecer do CESE, de 17.5.2006, sobre «Flexissegurança: o caso dinamarquês», relatora: A. VIUM, (JO C 195 de 18.8.2006).

(6)  Vide parecer do CESE, de 6.7.2006, sobre «Coesão social: dar conteúdo a um modelo social europeu», relator E. Ehnmark, CESE (JO C 309 de 16.12.2006).

(7)  O programa de trabalho plurianual dos parceiros sociais 2006-2008 inclui uma «análise conjunta dos principais desafios dos mercados de trabalho europeus».

(8)  SOC/273 «Empregabilidade e empreendedorismo — O papel da sociedade civil, dos parceiros sociais e das instâncias regionais e locais, numa perspectiva de género» (relator: L. M. Pariza Castaños).

(9)  Parecer em curso sobre o «Papel dos parceiros sociais na conciliação da vida profissional, familiar e privada» (relator: P. Clever).

(10)  Ver Parecer do CESE de 14.3.2007 sobre «O impacto económico e orçamental do envelhecimento», ECO/186 (relatora S. FLORIO), JO C 161 de 13.7.2007.

(11)  Cf. Parecer do CESE de 11.5.2005 sobre a Proposta de directiva que altera a Directiva 2003/88/CE relativa a determinados aspectos da organização do tempo de trabalho, ponto 3.4. relatora: Engelen-Kefer, (JO C 267 de 27.10.2005).

(12)  Ibid, ponto 3.6.

(13)  Parecer do CESE de 1.7.2004 sobre a Revisão da Directiva 93/104 relativa à organização do tempo de trabalho, ponto 2.2.6., relator: E. Hahr, (JO C 302 de 7.12.2004).

(14)  http://eurofound.europa.eu/ewco/2004/02/NL0402NU03.htm.

(15)  Parecer do CESE de 13.9.2006 sobre a «Qualidade da vida activa, produtividade e emprego no contexto da globalização e dos desafios demográficos», relatora: Engelen-Kefer, (JO C 318 de 23.12.2006, ponto 1.3).

(16)  Idem, ponto 1.4.

(17)  http://eurofound.europa.eu/ewco/2004/02/NL0402NU03.htm.

(18)  Parecer do CESE sobre a «Proposta de recomendação do Parlamento Europeu e do Conselho sobre as competências-chave para a aprendizagem ao longo da vida», relatora: Mária Herczog, (JO C 195 18.8.2006); e Parecer exploratório sobre «Formação e produtividade», relator: Koryfidis, (JO C 120 de 20.5.2005).


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