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Document 62020CJ0530
Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 22 de dezembro de 2022.
« EUROAPTIEKA » SIA.
Reenvio prejudicial — Medicamentos para uso humano — Diretiva 2001/83/CE — Artigo 86.°, n.° 1 — Conceito de “publicidade dos medicamentos” — Artigo 87.°, n.° 3 — Utilização racional dos medicamentos — Artigo 90.° — Elementos publicitários proibidos — Publicidade a medicamentos não sujeitos a receita médica nem comparticipados — Publicidade ao preço — Publicidade a ofertas promocionais — Publicidade a vendas em conjunto — Proibição.
Processo C-530/20.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 22 de dezembro de 2022.
« EUROAPTIEKA » SIA.
Reenvio prejudicial — Medicamentos para uso humano — Diretiva 2001/83/CE — Artigo 86.°, n.° 1 — Conceito de “publicidade dos medicamentos” — Artigo 87.°, n.° 3 — Utilização racional dos medicamentos — Artigo 90.° — Elementos publicitários proibidos — Publicidade a medicamentos não sujeitos a receita médica nem comparticipados — Publicidade ao preço — Publicidade a ofertas promocionais — Publicidade a vendas em conjunto — Proibição.
Processo C-530/20.
Court reports – general – 'Information on unpublished decisions' section
ECLI identifier: ECLI:EU:C:2022:1014
Processo C‑530/20
«EUROAPTIEKA» SIA
[pedido de decisão prejudicial apresentado pela Latvijas Republikas Satversmes tiesa (Letónia)]
Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 22 de dezembro de 2022
«Reenvio prejudicial — Medicamentos para uso humano — Diretiva 2001/83/CE — Artigo 86.o, n.o 1 — Conceito de “publicidade dos medicamentos” — Artigo 87.o, n.o 3 — Utilização racional dos medicamentos — Artigo 90.o — Elementos publicitários proibidos — Publicidade a medicamentos não sujeitos a receita médica nem comparticipados — Publicidade ao preço — Publicidade a ofertas promocionais — Publicidade a vendas em conjunto — Proibição»
Aproximação das legislações — Medicamentos para uso humano — Diretiva 2001/83 — Publicidade — Conceito — Publicidade a medicamentos indeterminados — Inclusão
(Diretiva 2001/83 do Parlamento Europeu e do Conselho, conforme alterada pela Diretiva 2004/27, artigo 86.o, n.o 1)
(cf. n.os 32‑47, disp. 1)
Aproximação das legislações — Medicamentos para uso humano — Diretiva 2001/83 — Publicidade — Conceito — Critério da finalidade promocional da mensagem — Publicidade ao preço, a ofertas promocionais ou a vendas em conjunto — Inclusão
(Diretiva 2001/83 do Parlamento Europeu e do Conselho, conforme alterada pela Diretiva 2004/27, artigo 86.o, n.o 1)
(cf. n.os 52‑55, disp. 1)
Aproximação das legislações — Medicamentos para uso humano — Diretiva 2001/83 — Publicidade — Disposição nacional que proíbe a inclusão, na publicidade dos medicamentos não sujeitos a receita médica ou comparticipados, de elementos distintos dos indicados na diretiva — Proibição da publicidade ao preço, a ofertas promocionais ou a vendas em conjunto — Admissibilidade — Requisitos — Elementos suscetíveis de favorecer a utilização irracional e excessiva dos medicamentos — Objetivo essencial de proteção da saúde pública
(Diretiva 2001/83 do Parlamento Europeu e do Conselho, conforme alterada pela Diretiva 2004/27, artigos 87.°, n.o 3, e 90.°)
Resumo
A «EUROAPTIEKA» SIA é uma sociedade que exerce a atividade farmacêutica na Letónia. Faz parte de um grupo que possui uma rede de farmácias e de sociedades de distribuição de medicamentos a retalho nesse país. Em 2016, a Veselības inspekcijas Zāļu kontroles nodaļa (Serviço de Fiscalização dos Medicamentos da Inspeção da Saúde Pública, Letónia) proibiu a EUROAPTIEKA de difundir uma publicidade relativa a uma venda promocional que oferecia uma redução de 15 % sobre o preço de compra de qualquer medicamento no caso da aquisição de, pelo menos, três artigos. Esta decisão foi tomada com base numa disposição nacional que proíbe a inclusão, na publicidade junto do público a medicamentos não sujeitos a receita médica nem comparticipados, de informações que fomentem a compra do medicamento, justificando a necessidade da compra do medicamento com o seu preço, anunciando uma promoção especial ou indicando que o medicamento é vendido em pacote com outros medicamentos (mesmo a preço reduzido) ou produtos ( 1 ).
Chamado a pronunciar‑se, em 2020, sobre um recurso interposto pela EUROAPTIEKA contra esta disposição, a Latvijas Republikas Satversmes tiesa (Tribunal Constitucional, Letónia) interrogou o Tribunal de Justiça a título prejudicial sobre a interpretação da Diretiva 2001/83 ( 2 ).
No seu acórdão, o Tribunal de Justiça, reunido em Grande Secção, precisa o alcance do conceito de «publicidade dos medicamentos», na aceção desta diretiva, nomeadamente no que respeita a conteúdos que visam não um determinado medicamento, mas medicamentos indeterminados. Por outro lado, pronuncia‑se sobre a compatibilidade com a referida diretiva de uma disposição nacional que prevê proibições como as que estão em causa no processo principal, nomeadamente sobre a questão de saber se essas proibições visam favorecer a utilização racional dos medicamentos, na aceção da mesma diretiva.
Apreciação do Tribunal de Justiça
Em primeiro lugar, o Tribunal de Justiça declara que a difusão de informações que incentivam a compra de medicamentos, justificando a necessidade dessa compra pelo preço, anunciando uma oferta promocional ou fazendo referência a uma venda combinada com outros medicamentos, mesmo a preço reduzido, ou produtos, se enquadra no conceito de «publicidade dos medicamentos», na aceção da Diretiva 2001/83, mesmo quando essas informações dizem respeito não a um medicamento determinado, mas a medicamentos indeterminados.
Antes de mais, de um ponto de vista textual, o Tribunal de Justiça recorda que o artigo 86.o, n.o 1, desta diretiva, que contém o conceito de «publicidade dos medicamentos», faz sistematicamente referência aos «medicamentos», no plural. Além disso, esta disposição define este conceito de forma muito ampla, abrangendo «qualquer forma» de ação de informação, de prospeção ou de incentivo, incluindo, nomeadamente, a «publicidade dos medicamentos junto do público em geral».
Em seguida, de um ponto de vista contextual, o Tribunal de Justiça salienta que as disposições do título VIII da Diretiva 2001/83, das quais faz parte o artigo 86.o, enunciam as regras gerais e fundamentais relativas à publicidade dos medicamentos e que, portanto, são aplicáveis a qualquer ação destinada a promover a prescrição, o fornecimento, a venda ou o consumo de medicamentos.
Por último, quanto às finalidades prosseguidas pela Diretiva 2001/83, o Tribunal de Justiça considera que o objetivo essencial de proteção da saúde pública prosseguido por esta diretiva ficaria amplamente comprometido se uma atividade de ação de informação, de prospeção ou de incentivo destinada a promover a prescrição, o fornecimento, a venda ou o consumo de medicamentos sem fazer referência a um medicamento determinado não estivesse abrangida pelo conceito de «publicidade dos medicamentos», na aceção desta disposição, e, portanto, escapasse às proibições, às condições e às restrições previstas por esta diretiva em matéria de publicidade.
Com efeito, na medida em que uma publicidade a medicamentos indeterminados, como uma publicidade que visa uma categoria de medicamentos destinados a tratar a mesma patologia, pode igualmente dizer respeito a medicamentos sujeitos a receita médica ou a medicamentos comparticipados, a exclusão dessa publicidade do âmbito de aplicação das disposições da Diretiva 2001/83 em matéria de publicidade equivaleria a privar amplamente do seu efeito útil as proibições previstas nesta diretiva ( 3 ), na medida em que excluiria especificamente essas proibições de qualquer publicidade que não visasse especificamente um medicamento pertencente a essa categoria.
Além disso, o Tribunal de Justiça considera que a publicidade a um conjunto indeterminado de medicamentos não sujeitos a receita médica nem comparticipados pode, do mesmo modo que uma publicidade relativa a um único medicamento determinado, ser excessiva e irrefletida e, por conseguinte, prejudicar a saúde pública, incitando os consumidores a uma utilização irracional ou a um consumo excessivo dos medicamentos em causa.
O Tribunal de Justiça conclui que, não obstante o que foi afirmado no Acórdão A (Publicidade e venda de medicamentos em linha) ( 4 ) e no Acórdão DocMorris ( 5 ), o conceito de «publicidade dos medicamentos», previsto na Diretiva 2001/83, abrange qualquer ação de informação, de prospeção ou de incentivo destinada a promover a prescrição, o fornecimento, a venda ou o consumo de um determinado medicamento ou de medicamentos indeterminados.
O Tribunal de Justiça acrescenta que, uma vez que a finalidade da mensagem constitui a característica essencial deste conceito e o elemento determinante para distinguir a publicidade da simples informação, e que as atividades de difusão de informação visadas por uma disposição nacional como a que está em causa no processo principal parecem ter essa finalidade promocional, essas atividades estão abrangidas pelo referido conceito.
Em segundo lugar, o Tribunal de Justiça declara que as disposições da Diretiva 2001/83 ( 6 ) não se opõem a uma disposição nacional que impõe restrições não previstas nesta diretiva, mas que respondem ao objetivo essencial de proteção da saúde pública prosseguido pela referida diretiva, proibindo a inclusão, na publicidade junto do público feita a medicamentos não sujeitos a receita médica nem comparticipados, de informações que incentivam a compra de medicamentos, justificando a necessidade dessa compra pelo preço de tais medicamentos, anunciando uma promoção ou indicando que os referidos medicamentos são vendidos em pacote com outros medicamentos, mesmo a um preço reduzido, ou com outros produtos.
Em apoio desta interpretação, o Tribunal de Justiça recorda, em primeiro lugar, no que respeita à articulação entre o requisito de a referida publicidade fomentar a utilização racional dos medicamentos ( 7 ), e as restrições referidas na Diretiva 2001/83 sob a forma de uma lista de elementos publicitários proibidos ( 8 ), que o facto de esta diretiva não conter regras específicas relativas a um dado elemento publicitário não obsta a que, com o objetivo de impedir toda e qualquer publicidade excessiva e irrefletida a medicamentos, que poderia afetar a saúde pública, os Estados‑Membros proíbam ( 9 ) tal elemento, na medida em que este fomente o uso irracional de medicamentos.
Por conseguinte, e ainda que a Diretiva 2001/83 autorize a publicidade dos medicamentos não sujeitos a receita médica, os Estados‑Membros devem proibir, a fim de prevenir a ocorrência de riscos para a saúde pública em conformidade com o objetivo essencial de proteção desta, a inclusão, na publicidade junto do público em geral a medicamentos não sujeitos a receita médica nem comparticipados, de elementos suscetíveis de fomentar a utilização irracional de tais medicamentos.
Em segundo lugar, quanto à questão de saber se é esse o caso dos elementos visados por proibições como as que estão em causa no processo principal, o Tribunal de Justiça salienta que, tratando‑se de medicamentos não sujeitos a receita médica nem comparticipados, é frequente que o próprio consumidor final avalie, sem a assistência de um médico, a utilidade ou a necessidade de comprar tais medicamentos. Ora, este consumidor não dispõe necessariamente de conhecimentos específicos e objetivos que lhe permitam avaliar o seu valor terapêutico. A publicidade pode, portanto, exercer uma influência particularmente importante na avaliação e na escolha efetuadas pelo referido consumidor, tanto no que respeita à qualidade do medicamento como à quantidade a adquirir.
Neste contexto, elementos de publicidade, como os visados pela disposição nacional em causa no processo principal, são suscetíveis de incitar os consumidores a comprar medicamentos não sujeitos a receita médica nem comparticipados em função de um critério económico ligado ao preço desses medicamentos e, por conseguinte, podem induzir esses consumidores a comprar e a consumir os referidos medicamentos sem que se tenha procedido a uma avaliação objetiva baseada nas propriedades terapêuticas destes últimos e em necessidades médicas concretas.
Ora, segundo o Tribunal de Justiça, uma publicidade que desvie o consumidor de uma avaliação objetiva da necessidade de tomar um medicamento incita a utilização irracional e excessiva desse medicamento. Tal utilização irracional e excessiva dos medicamentos pode igualmente decorrer de uma publicidade que, à semelhança das referidas pela disposição nacional em causa no processo principal, relativas a ofertas promocionais ou a vendas em conjunto de medicamentos e de outros produtos, equipara medicamentos a outros produtos de consumo, que são geralmente objeto de descontos e de reduções de preços além de um certo nível de despesa.
O Tribunal de Justiça conclui que, na medida em que impedem a difusão de elementos de publicidade que incentivam a utilização irracional e excessiva dos medicamentos não sujeitos a receita médica nem comparticipados ‑ sem prejuízo da possibilidade de as farmácias concederem descontos e reduções de preços na venda desses medicamentos e de outros produtos de saúde ‑ uma disposição nacional como a que está em causa no processo principal cumpre o objetivo essencial de proteção da saúde pública e é, portanto, compatível com a Diretiva 2001/83.
( 1 ) Ponto 18.12 do Ministru kabineta noteikumi Nr. 378 «Zāļu reklamēšanas kārtība un kārtība, kādā zāļu ražotājs ir tiesīgs nodot ārstiem bezmaksas zāļu paraugus» (Decreto n.o 378 do Conselho de Ministros relativo às «Modalidades da publicidade dos medicamentos e modalidades segundo as quais um fabricante de medicamentos pode oferecer aos médicos amostras gratuitas de medicamentos»), de 17 de maio de 2011 (Latvijas Vēstnesis, 2011, n.o 78).
( 2 ) Mais precisamente, estão em causa os artigos 86.o, n.o 1, 87.°, n.o 3, e 90.o da Diretiva 2001/83/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 6 de novembro de 2001, que estabelece um código comunitário relativo aos medicamentos para uso humano (JO 2001, L 311, p. 67), conforme alterada pela Diretiva 2004/27/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004 (JO 2004, L 136, p. 34).
( 3 ) Artigo 88.o, n.o 1, alínea a), e n.o 3, da Diretiva 2001/83.
( 4 ) Acórdão de 1 de outubro de 2020, A (Publicidade e venda de medicamentos em linha) (C‑649/18, EU:C:2020:764, n.o 50).
( 5 ) Acórdão de 15 de julho de 2021, DocMorris (C‑190/20, EU:C:2021:609, n.o 20).
( 6 ) Mais precisamente, artigos 87.°, n.o 3, e 90.° da Diretiva 2001/83.
( 7 ) Requisito previsto no artigo 87.o, n.o 3, da Diretiva 2001/83.
( 8 ) Restrições enunciadas no artigo 90.o da Diretiva 2001/83.
( 9 ) Com base no artigo 87.o, n.o 3, da Diretiva 2001/83.