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Document 61992CJ0136

Acórdão do Tribunal de 1 de Junho de 1994.
Comissão das Comunidades Europeias contra Augusto Brazzelli Lualdi e outros.
Recurso - Funcionários - Remunerações - Juros de mora e compensatórios.
Processo C-136/92 P.

Colectânea de Jurisprudência 1994 I-01981

ECLI identifier: ECLI:EU:C:1994:211

61992J0136

ACORDAO DO TRIBUNAL DE 1 DE JUNHO DE 1994. - COMISSAO DAS COMUNIDADES EUROPEIAS CONTRA AUGUSTO BRAZZELLI LUALDI E OUTROS. - RECURSO - FUNCIONARIOS - REMUNERACOES - JUROS DE MORA E COMPENSATORIOS. - PROCESSO C-136/92 P.

Colectânea da Jurisprudência 1994 página I-01981


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


++++

1. Funcionários ° Remuneração ° Adaptação tardia ° Distinção entre juros de mora e compensatórios

(Estatuto dos Funcionários, artigo 65. , n. 2)

2. Funcionários ° Responsabilidade não contratual das instituições ° Condições ° Comportamento culposo da administração ° Prejuízo ° Nexo de causalidade

(Estatuto dos Funcionários, artigo 65. , n. 2)

3. Recurso ° Fundamentos ° Apreciação errada dos factos ° Inadmissibilidade ° Rejeição

(Tratado CEE, artigo 168. -A; Estatuto do Tribunal de Justiça CEE, artigo 51. )

4. Funcionários ° Remuneração ° Adaptação ° Retroactivos do vencimento ° Direito a juros de mora ° Inexistência na falta de um crédito certo e determinável

(Estatuto dos Funcionários, artigo 65. , n. 2)

5. Recurso ° Fundamentos ° Fundamento só apresentado no recurso ° Inadmissibilidade

(Estatuto do Tribunal de Justiça CEE, artigo 51. )

6. Recurso ° Fundamentos ° Apreciação errada de elementos de prova regularmente apresentados ° Apreciação errada da reparação adequada de prejuízo verificado ° Inadmissibilidade ° Rejeição

(Estatuto do Tribunal de Justiça CEE, artigo 51. )

7. Recurso ° Recurso subordinado ° Prazo de interposição

(Estatuto do Tribunal de Justiça CEE, artigo 51. ; Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, artigos 115. e 116. )

Sumário


1. É efectuada em direito comunitário a distinção entre juros de mora e juros compensatórios, nomeadamente em litígios relativos à regularização tardia de vencimentos dos funcionários.

2. No âmbito de um pedido de ressarcimento de danos apresentado por um funcionário, a responsabilidade da Comunidade pressupõe que se encontrem reunidas um conjunto de condições, concretamente, a ilicitude do comportamento imputado às instituições, a efectividade do dano e a existência de nexo de causalidade entre o comportamento e o dano.

3. De acordo com o artigo 168. -A do Tratado CEE, o recurso é limitado às questões de direito. Esta limitação é recordada no primeiro parágrafo do artigo 51. do Estatuto do Tribunal, que especifica os fundamentos de interposição de recurso, concretamente, incompetência do Tribunal de Primeira Instância, irregularidades processuais perante este Tribunal que prejudiquem os interesses dos recorrentes e violação do direito comunitário pelo Tribunal de Primeira Instância. O recurso só pode assentar em fundamentos relativos a violação de normas jurídicas, com exclusão de qualquer apreciação da matéria de facto, só sendo assim admissível na medida em que o Tribunal de Primeira Instância seja acusado na petição de, ao decidir, ter ignorado normas jurídicas cujo respeito lhe compete assegurar.

Assim, só o Tribunal de Primeira Instância tem competência para a apreciação da matéria de facto, excepto em casos nos quais a inexactidão material das suas conclusões resulte de peças dos autos que lhe foram apresentadas.

Em contrapartida, o Tribunal de Justiça é competente para exercer o controlo que lhe é imposto pelo artigo 168. -A do Tratado CEE, a partir do momento em que tenha havido qualificação jurídica e conclusões em matéria de direito dos mesmos factos.

4. Só pode considerar-se existente uma obrigação de pagar juros de mora no caso de o crédito principal ser de montante certo ou, pelo menos, determinado com base em elementos objectivos verificados. As competências do Conselho para adaptar as remunerações e pensões dos funcionários e dos outros agentes e para fixar os coeficientes de correcção que afectam tais remunerações e pensões, resultantes do artigo 65. do Estatuto, comportam um poder de apreciação. Não existe qualquer certeza quanto ao montante destas adaptações e fixações antes de o Conselho ter exercido as suas competências e aprovado o regulamento previsto. Assim, antes da data de aprovação do regulamento, o crédito dos funcionários não era certo nem determinável, não podendo assim começar a vencer juros de mora.

5. Os fundamentos apresentados pela primeira vez no âmbito do recurso para o Tribunal de Justiça devem ser rejeitados por inadmissibilidade. Com efeito, permitir a uma parte invocar perante o Tribunal de Justiça, pela primeira vez, fundamentos não apresentados ao Tribunal de Primeira Instância reconduzir-se-ia a permitir-lhe apresentar ao Tribunal de Justiça, cuja competência para julgar recursos em segunda instância é limitada, litígios mais latos do que os presentes ao Tribunal de Primeira Instância. Assim, no âmbito dos recursos em segunda instância, a competência do Tribunal de Justiça encontra-se limitada à apreciação da solução legal dada aos fundamentos debatidos em primeira instância.

6. Tal como não é competente para a apreciação de factos, o Tribunal de Justiça não tem também, em princípio, competência para examinar as provas que o Tribunal de Primeira Instância considerou determinantes no apuramento de tais factos. Com efeito, tendo as provas sido obtidas regularmente, tendo as normas e princípios gerais de direito em matéria de prova sido respeitados, bem como as regras processuais em matéria de produção de prova, compete exclusivamente àquele Tribunal a apreciação do valor a atribuir aos elementos que lhe foram submetidos.

Pelas mesmas razões, tendo o Tribunal de Primeira Instância verificado existirem danos, compete apenas a ele determinar, dentro dos limites do pedido, qual a reparação mais adequada.

7. Quando alguma parte apresente, em conclusões da resposta apresentada no âmbito de recurso para o Tribunal de Justiça, recurso subordinado no sentido de obter a condenação da outra parte ao pagamento de juros de mora que tinham pedido em primeira instância, mas que tinham sido recusados pelo Tribunal, o único prazo a que se encontra sujeito tal recurso subordinado é o do n. 1 do artigo 115. do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça quanto à apresentação de resposta, ou seja, dois meses a contar da notificação do recurso.

Partes


No processo C-136/92 P,

Comissão das Comunidades Europeias, representada por Gianluigi Valsesia, consultor jurídico principal, e Lucio Gussetti, membro do Serviço Jurídico, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no gabinete de Georgios Kremlis, membro do Serviço Jurídico, Centre Wagner, Kirchberg,

recorrente,

que tem por objecto um recurso em que se pede a anulação do acórdão proferido pelo Tribunal de Primeira Instância das Comunidades Europeias (Segunda Secção) em 26 de Fevereiro de 1992, nos processos apensos T-17/89, T-21/89 e T-25/89, em que foram partes Augusto Brazzelli e outros, Cleto Bertolo e outros e Helga Alex e outros, por um lado, e a Comissão das Comunidades Europeias, por outro (Colect., p. II-293),

sendo recorridos:

Augusto Brazzelli Lualdi e outros, funcionários e agentes da Comissão das Comunidades Europeias, representados por Giuseppe Marchesini, advogado na Corte di cassazione italiana, com domicílio escolhido no Luxemburgo no escritório de Ernest Arendt, 4, avenue Marie-Thérèse, que pedem, a título principal, a inadmissibilidade do recurso e, subsidiariamente, que seja julgado improcedente por falta de fundamento, e que o acórdão do Tribunal de Primeira Instância seja modificado no sentido de dar provimento integral aos pedidos formulados em primeira instância,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA,

composto por: O. Due, presidente, G. F. Mancini, J. C. Moitinho de Almeida, M. Díez de Velasco e D. A. O. Edward, presidentes de secção, C. N. Kakouris, R. Joliet (relator), F. A. Schockweiler, G. C. Rodríguez Iglesias, F. Grévisse, M. Zuleeg, P. J. G. Kapteyn e J. L. Murray, juízes,

advogado-geral: C. O. Lenz

secretário: R. Grass

visto o relatório do juiz-relator,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 5 de Outubro de 1993,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição que deu entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 28 de Abril de 1992, a Comissão das Comunidades Europeias apresentou, nos termos do artigo 49. do Estatuto CEE e das disposições correspondentes dos estatutos CECA e CEEA do Tribunal de Justiça, recurso do acórdão do Tribunal de Primeira Instância de 26 de Fevereiro de 1992, Brazzelli e o./Comissão (processos apensos T-17/89, T-21/89 e T-25/89, Colect., p. II-293, na medida em que a condenou a pagar a Brazzelli Lualdi e a 618 outros funcionários ou agentes das Comunidades Europeias (a seguir "funcionários") juros compensatórios para reparar o dano sofrido na liquidação de retroactivos da respectiva remuneração, devido à perda de poder de compra que sofreram entre 1 de Janeiro de 1984 e Novembro de 1988.

2 Na resposta apresentada em 31 de Julho de 1992, os funcionários pedem, a título principal, que o recurso seja julgado inadmissível, e, subsidiariamente e com base no artigo 116. do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, que seja dado provimento à totalidade dos pedidos formulados em primeira instância, os quais se destinavam a obter não só os juros compensatórios atribuídos pelo Tribunal, mas também juros de mora.

3 Resulta do acórdão do Tribunal de Primeira Instância (n. 1) que Brazzelli Lualdi e os outros recorrentes são todos funcionários ou agentes das Comunidades Europeias, afectos ao Centro Comum de Investigação de Ispra (Varese, Itália). O recurso perante aquele tribunal respeitava à adaptação das suas remunerações ao custo de vida do local de afectação.

4 De acordo com o primeiro parágrafo do artigo 63. do Estatuto dos Funcionários das Comunidades Europeias (a seguir "Estatuto"), a remuneração dos funcionários é expressa em francos belgas. O mesmo artigo acrescenta que é paga na moeda do país em que o funcionário exerça as suas funções.

5 A fim de que todos os funcionários beneficiem de poder de compra equivalente com a remuneração recebida, independentemente do local de afectação, o primeiro parágrafo do artigo 64. do Estatuto determina que "à remuneração do funcionário expressa em francos belgas... é aplicado um coeficiente de correcção superior, inferior ou igual a 100%, segundo as condições de vida dos diferentes lugares de afectação". O segundo parágrafo do mesmo artigo especifica que estes coeficientes são fixados pelo Conselho, sob proposta da Comissão.

6 Por outro lado, o artigo 65. do Estatuto acrescenta que

"1. O Conselho procede anualmente a um exame do nível de remunerações dos funcionários e dos outros agentes das Comunidades...

No decurso deste exame, o Conselho examina sobre a necessidade, no âmbito da política económica e social das Comunidades, de proceder a uma adaptação das remunerações...

2. Em caso de variação sensível do custo de vida, o Conselho decide, de comum acordo, num prazo máximo de dois meses, medidas de adaptação dos coeficientes de correcção e, se for caso disso, do seu efeito retroactivo."

7 Em aplicação destas disposições, o Conselho aprovou, em 1976, um primeiro método de adaptação das remunerações dos funcionários e outros agentes das Comunidades Europeias. Através da Decisão 81/1061/Euratom, CECA, CEE, de 15 de Dezembro de 1981, que altera o método de adaptação das remunerações dos funcionários e outros agentes das Comunidades (JO L 386, p. 6; EE 01 F3 p. 119), o Conselho adoptou um novo método. Nos termos do segundo parágrafo do ponto II, 1.1, do anexo da decisão, de cinco em cinco anos o Serviço de Estatística das Comunidades Europeias (a seguir "Serviço de Estatística") verifica, de acordo com os serviços estatísticos dos Estados-membros, se as relações entre coeficientes de correcção estabelecem correctamente as equivalências de poder de compra entre as remunerações pagas ao pessoal em serviço nas capitais dos Estados-membros. O terceiro parágrafo acrescenta que se procede a esta verificação relativamente aos outros locais de colocação quando elementos objectivos revelarem um risco de distorções importantes no que diz respeito aos dados constatados na capital do país em questão.

8 Para verificar se os coeficientes de correcção reflectiam correctamente a evolução do custo de vida verificada entre 1 de Janeiro de 1976 e 31 de Dezembro de 1980, o Serviço de Estatística procedeu a inquéritos em 1980 e 1981. Dado que não existiam números disponíveis relativos às rendas de casa pagas pelos funcionários europeus nas capitais, o custo de alojamento foi calculado com base nas rendas de casa pagas em 1 de Janeiro de 1981 pela população em geral em cada Estado-membro, considerado globalmente. Com base no resultado destes inquéritos, a Comissão elaborou uma proposta de regulamento para modificar os coeficientes de correcção, que submeteu ao Conselho em 17 de Julho de 1984. A fim de atenuar os riscos de erro resultante do cálculo do custo do alojamento, a Comissão sugeriu que só fossem alterados, para mais ou para menos, os coeficientes de correcção em relação aos quais a modificação excedesse 2,5%. A proposta previa ainda que os novos coeficientes de correcção produzissem efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1981.

9 Quando esta proposta foi discutida, o Conselho afirmou que lhe parecia ser contrário ao artigo 64. do Estatuto só adaptar os coeficientes de correcção em relação aos quais a modificação excedesse 2,5%. Recusou-se a aprovar aquela proposta.

10 A Comissão encarregou então o Serviço de Estatística de proceder a um inquérito sobre as rendas de casa pagas em 1 de Janeiro de 1981 pelos funcionários europeus nas diversas capitais. Efectuado este inquérito, submeteu nova proposta ao Conselho em 23 de Dezembro de 1985. Esta segunda proposta mantinha 1 de Janeiro de 1981 como data de entrada em vigor dos coeficientes de correcção.

11 Em 26 de Novembro de 1986, o Conselho aprovou o Regulamento (CEE, Euratom, CECA) n. 3619/86, que rectifica os coeficientes de correcção de que são afectadas na Dinamarca, na Alemanha, na Grécia, em França, na Irlanda, na Itália, nos Países Baixos e no Reino Unido as remunerações e pensões dos funcionários e outros agentes das Comunidades Europeias (JO L 336, p. 1, a seguir "Regulamento n. 3619/86").

12 Este regulamento afastou-se em dois pontos da segunda proposta da Comissão. Em primeiro lugar, ignorou os resultados do inquérito sobre as rendas de casa. Em segundo lugar, fixou a data de entrada em vigor dos novos coeficientes de correcção não em 1 de Janeiro de 1981, mas em 1 de Julho de 1986.

13 Por petição entrada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 15 de Janeiro de 1987, a Comissão pediu a anulação daquele regulamento, com base no primeiro parágrafo do artigo 173. do Tratado CEE.

14 Paralelamente a este recurso, Augusto Brazzelli Lualdi, Cleto Bertolo, Helga Alex e outros funcionários e agentes afectados a Ispra apresentaram três recursos, respectivamente, em 23 de Dezembro de 1986, 1 de Outubro de 1987 e 10 de Fevereiro de 1988, com a finalidade de obter a anulação de alguns das suas folhas de vencimento elaboradas em 1986 e 1987, na medida em que aplicavam o Regulamento n. 3619/86, e, por outro lado, a atribuição de juros de mora e compensatórios, para reparar os danos pecuniários que entendem ter sofrido devido ao atraso que, em seu entender, se verificou na adaptação dos coeficientes de correcção aplicáveis às suas remunerações.

15 A tramitação destes três recursos foi suspensa até que o Tribunal de Justiça se pronunciasse sobre o recurso apresentado pela Comissão.

16 Este acórdão foi proferido em 28 de Junho de 1988 (Comissão/Conselho, 7/87, Colect., p. 3401). Este anulou o Regulamento n. 3619/86, por violação do artigo 64. do Estatuto.

17 O Conselho aprovou então o Regulamento (CECA, CEE, Euratom) n. 3294/88, de 24 de Outubro de 1988, que rectifica, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 1981, os coeficientes de correcção aplicáveis na Dinamarca, na Alemanha, na Grécia, em França, na Irlanda, na Itália, nos Países Baixos e no Reino Unido, às remunerações e pensões dos funcionários e outros agentes das Comunidades Europeias (JO L 293, p. 1, a seguir "Regulamento n. 3294/88").

18 Tendo este regulamento feito justiça às pretensões dos funcionários relativas à adaptação dos respectivos vencimentos e tendo a Comissão procedido à regularização daqueles em Novembro de 1988, os funcionários desistiram do pedido de anulação das respectivas folhas de vencimento. Mantiveram, contudo, as suas pretensões relativamente ao pagamento de juros de mora sobre o período compreendido entre o momento em que os retroactivos das remunerações deviam ter sido pagos e aquele em que o foram efectivamente e, por outro lado, à reparação dos danos resultantes da perda de poder de compra resultante das condições de pagamento destes retroactivos.

19 O processo escrito tramitou integralmente perante o Tribunal de Justiça, o qual remeteu os três processos para o Tribunal de Primeira Instância, por despacho de 15 de Novembro de 1989.

20 Por despacho de 2 de Abril de 1990, o Tribunal ordenou que os processos fossem apensados para efeitos de tramitação oral e decisão.

21 No seu acórdão, o Tribunal de Primeira Instância começa por sublinhar que os funcionários apresentam um único fundamento em apoio do pedido de pagamento de juros de mora, o atraso no pagamento por parte da Comissão dos retroactivos das remunerações.

22 A este respeito, o Tribunal de Primeira Instância, nos n.os 23 a 26 do acórdão, começa por salientar que antes de 24 de Outubro de 1988, data da aprovação pelo Conselho do Regulamento n. 3294/88, nenhuma instituição comunitária sabia se os coeficientes de correcção em vigor seriam objecto de rectificação e, em caso afirmativo, quais seriam os novos coeficientes aplicáveis. Daqui retira o Tribunal as conclusões de que, antes daquela data, os recorrentes não tinham qualquer direito adquirido ao pagamento de retroactivos sobre as remunerações e, correlativamente, de que as instituições comunitárias não estavam sujeitas a qualquer dever de pagamento de tais retroactivos. Nestas condições, até àquela data não podia haver atraso no pagamento de uma prestação devida. Em segundo lugar, o Tribunal verifica que após a aprovação do Regulamento n. 3294/88, a Comissão procedeu à liquidação e pagamento dos retroactivos de remunerações devidos face àquele diploma, em Novembro de 1988. Daqui deduz que a Comissão cumpriu com diligência o dever de pagamento e que, deste ponto de vista, não lhe pode ser imputado qualquer atraso.

23 Em consequência, o Tribunal de Primeira Instância indeferiu os pedidos dos funcionários de atribuição de juros de mora.

24 De seguida, o Tribunal nota que, em apoio do pedido de reparação do dano resultante da perda de poder de compra, os funcionários apresentam dois fundamentos, por um lado, violação dos artigos 64. e 65. do Estatuto e, por outro, execução incorrecta do referido acórdão Comissão/Conselho.

25 A este respeito, o Tribunal entende, nos n.os 38 a 40 do seu acórdão, que o regulamento que rectifica os coeficientes de correcção devia ter sido aprovado, o mais tardar, em 1986, pois naquela época o Conselho dispunha de todos os elementos necessários. Contudo, entende que, mesmo que o Conselho tivesse aprovado tal regulamento em 1986, o processo prévio, ou seja, os inquéritos e propostas da Comissão ao Conselho, já teria sido excessivamente longo. Para o Tribunal tal regulamentação teria podido - e devia assim ter sido - aprovada desde 1 de Janeiro de 1984. Daqui retira o Tribunal a conclusão de que há um atraso indevido e que os recorrentes sofreram danos consistentes na perda de poder de compra correspondente ao atraso no pagamento dos retroactivos da remuneração, os quais deviam ter sido liquidados no decurso do primeiro trimestre de 1984, só o tendo sido alguns anos mais tarde. A este respeito sublinha que, ao apresentar estatísticas pertinentes, que não foram contestadas pela Comissão, os funcionários produziram prova suficiente da deterioração do seu poder de compra.

26 Nestas condições, o Tribunal de Primeira Instância condenou a Comissão a pagar aos funcionários juros compensatórios para reparação do dano sofrido em consequência da perda de poder de compra resultante do atraso de pagamento dos retroactivos das remunerações entre 1 de Janeiro de 1984 e Novembro de 1988. Acrescentou que o montante destes juros devia ser calculado com base nas estatísticas oficiais da Comunidade relativas à evolução do poder de compra nos diversos Estados-membros e, se possível, fixados de comum acordo entre as partes.

27 Para pedir a anulação daquele acórdão, a Comissão invoca três fundamentos, o primeiro, na errada interpretação pelo Tribunal de Primeira Instância do direito comunitário no que respeita aos juros de mora e compensatórios, o segundo, na insuficiência e contradição dos fundamentos constantes dos n.os 23 a 26 e 38 a 40 do acórdão e, o terceiro, na interpretação e aplicação erróneas do direito comunitário quanto à prova dos danos.

28 Os funcionários, por seu lado, afirmam na resposta, a título principal, que os fundamentos do recurso são inadmissíveis. Subsidiariamente, pedem a anulação do acórdão do Tribunal de Primeira Instância com base em dois pontos. O primeiro é baseado na violação de princípios gerais da indemnização de danos, o segundo é baseado na contradição entre os fundamentos e a parte decisória do acórdão, e violação do princípio da não discriminação.

29 Sublinhe-se neste momento que, na apreciação em segunda instância de recursos, o Tribunal de Justiça não deve conhecer do conjunto do litígio submetido ao Tribunal de Primeira Instância, mas apenas das partes do acórdão daquele criticadas no recurso. Por outro lado, só se pronuncia sobre tais partes do ponto de vista dos fundamentos invocados no recurso para obter a anulação do acórdão.

Quanto ao recurso da Comissão

Quanto ao primeiro fundamento da Comissão, baseado na errada interpretação do direito comunitário no que respeita aos juros de mora e compensatórios

30 No âmbito do primeiro fundamento, a Comissão sustenta que o Tribunal de Primeira Instância distinguiu indevidamente entre juros de mora e juros compensatórios em relação a juros devidos por liquidação tardia de remunerações de funcionários, não conhecendo a jurisprudência do Tribunal de Justiça tal diferença.

31 Segundo a Comissão, o Tribunal de Justiça elaborou um sistema de juros específico do direito comunitário para a reparação de danos causados pelo pagamento tardio de somas devidas. Estes juros só são devidos encontrando-se reunidas duas condições: em primeiro lugar, existência de comportamento faltoso por parte do devedor dos juros; em seguida, a sua colocação em mora pelo respectivo credor. Por outro lado, a Comissão considera que estes juros tomam implicitamente em conta a depreciação monetária.

32 Para os funcionários este primeiro fundamento é inadmissível por três motivos.

33 Antes de mais, a Comissão não foi vencida nas suas conclusões no que respeita aos juros de mora, como exige, enquanto condição de admissibilidade de recurso, o segundo parágrafo do artigo 49. do Estatuto CEE do Tribunal de Justiça, pois o pedido relativo a estes juros foi indeferido pelo Tribunal de Primeira Instância. Em seguida, este fundamento, que não se traduz em qualquer pedido de alteração da parte do acórdão relativa aos juros de mora, não tem conclusão, na acepção do artigo 113. do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça. Este fundamento, finalmente, não se apoia em violação de regras comunitárias ou de princípios gerais de direito, mas em contradição com a jurisprudência do Tribunal de Justiça. Dado que a jurisprudência em matéria de juros não é constante, esta contradição não é susceptível de dar lugar à interposição de recurso.

34 O primeiro fundamento da Comissão deve ser considerado admissível. Com efeito, dado que a Comissão impugna a distinção efectuada pelo Tribunal de Primeira Instância entre juros de mora e compensatórios, entendendo que, na sua interpretação da jurisprudência, em caso de atraso no pagamento de remunerações só são devidos juros sui generis, está de facto a criticar, de forma implícita mas segura, a parte decisória do acórdão que a condenou a pagar juros compensatórios.

35 Este primeiro fundamento, em contrapartida, carece de base. Com efeito, o próprio Tribunal de Justiça foi levado a distinguir entre juros de mora e juros compensatórios, nomeadamente em litígios relativos à regularização tardia de vencimentos dos funcionários (v. acórdãos de 15 de Janeiro de 1985, Roumengous Carpentier/Comissão, 158/79, Recueil, p. 39, n.os 8 a 14; Amesz e o./Comissão, processos apensos 532/79, 534/79, 567/79, 600/79, 618/79, 660/79 e 543/79, Recueil, p. 55, n.os 11 a 17; Battaglia/Comissão, 737/79, Recueil, p. 71, n.os 6 a 13; e acórdãos de 4 de Julho de 1985, Ammann e o./Conselho, 174/83, Recueil, p. 2133, n. 13; Allo e o./Comissão, 176/83, Recueil, p. 2155, n. 19), em particular, para decidir, devido a elementos processuais específicos destes processos, que os pedidos de juros compensatórios não eram admissíveis, enquanto os de juros de mora eram admissíveis mas sem fundamento. Nestas condições, não é possível considerar que a distinção feita pelo Tribunal de Primeira Instância não tenha a sua origem na jurisprudência do Tribunal de Justiça.

36 Nestes termos, o primeiro fundamento da Comissão deve ser julgado improcedente.

Quanto ao segundo fundamento da Comissão, baseado na insuficiência e contradição de fundamentos

37 No segundo fundamento, a Comissão afirma que a fundamentação do acórdão é insuficiente e contraditória. Subdivide este fundamento em três partes.

Quanto à primeira parte

38 A Comissão começa por defender que a fundamentação do acórdão relativa à distinção entre juros de mora e compensatórios é insuficiente e contraditória. Insuficiente, porque o Tribunal de Primeira Instância não explicou por que se afastou do conceito de juros elaborado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça. Contraditória por o Tribunal ter declarado nos n.os 23 e 26 do acórdão que, antes da aprovação do Regulamento n. 3294/88, as instituições comunitárias não estavam sujeitas a qualquer dever nem tinham a possibilidade de pagar os retroactivos das remunerações e que, após aquela aprovação, a Comissão procedeu diligentemente ao seu pagamento, entendendo em contrapartida, no n. 38, que se verificou um atraso indevido, pois a base legal da adaptação quinquenal deveria existir desde 1986, ou seja, desde o momento em que o Conselho dispôs de todos os elementos necessários para aprovar um regulamento conforme com as exigências do Estatuto.

39 Os funcionários replicam que esta primeira parte é inadmissível, pois a crítica respeita aos n.os 23 a 26 do acórdão, ou seja, à parte do acórdão relativa aos juros de mora, tendo o Tribunal de Primeira Instância dado razão à Comissão naquela parte do acórdão.

40 A primeira parte do segundo fundamento é admissível. Com efeito, e como foi já acima afirmado no n. 34, a crítica da Comissão incide sobre a distinção levada a cabo pelo Tribunal de Primeira Instância entre juros de mora e compensatórios, para daí deduzir que só são devidos juros sui generis. Nestas circunstâncias, as críticas da Comissão são dirigidas contra os fundamentos do acórdão do Tribunal que levaram este último a condená-la ao pagamento de juros compensatórios. A Comissão tem interesse em apresentar tais críticas.

41 A primeira parte carece, contudo, de fundamento.

42 Antes de mais, ao sublinhar, no n. 35 do acórdão, que, segundo jurisprudência constante, para que possam pedir a atribuição de juros compensatórios, os recorrentes terão que demonstrar a existência de comportamento faltoso da administração, de prejuízo efectivo certo e mensurável e de nexo causal entre o comportamento faltoso e o dano, o Tribunal de Primeira Instância não se afastou da jurisprudência do Tribunal de Justiça. Com efeito, no acórdão de 16 de Dezembro de 1987, Delauche/Comissão (111/86, Colect., p. 5345, n. 30), o Tribunal de Justiça entendeu, no âmbito de um pedido de ressarcimento de danos apresentado por um funcionário, que a responsabilidade da Comunidade pressupõe que se encontrem reunidas um conjunto de condições relativas à ilicitude do comportamento imputado às instituições, à efectividade do dano e à existência de nexo de causalidade entre o comportamento e o dano. Assim, a fundamentação do Tribunal de Primeira Instância não pode ser considerada insuficiente.

43 Por outro lado, a fundamentação não é contraditória. Com efeito, o Tribunal distinguiu claramente entre o tempo decorrido até à aprovação dos textos que regularizaram a remuneração dos funcionários, período considerado de duração excessiva e injustificada, constitutivo, assim, de comportamento faltoso (n. 39 do acórdão) e o tempo decorrido até ao pagamento daquelas remunerações na sequência da aprovação daqueles textos, período que considera normal (n. 26 do acórdão). Não é possível a este respeito afirmar que o acórdão recorrido esteja viciado de falta de fundamentação.

44 Nestas condições, a primeira parte do segundo fundamento deve ser julgada improcedente.

Quanto à segunda parte

45 Na segunda parte, a Comissão sustenta que o Tribunal de Primeira Instância indevidamente lhe imputou integralmente o atraso no pagamento dos retroactivos das remunerações, sem tomar em conta o facto de ter apresentado ao Conselho, desde 1986, resultados das verificações estatísticas necessárias para a revisão quinquenal, e de o atraso posterior a 1986 decorrer de ter apresentado recurso para o Tribunal de Justiça do regulamento aprovado pelo Conselho em contradição com a sua proposta. Entende que, nestas condições, os retroactivos das remunerações eram determináveis desde 1986, só sendo assim devidos juros de mora.

46 Para os funcionários este argumento é inadmissível. Com efeito, a censura formulada pelo Tribunal de Primeira Instância respeitava à importância do atraso imputável à Comissão na preparação da proposta de regulamento. Trata-se de uma apreciação de facto que não pode ser objecto de recurso.

47 Recorde-se a este respeito que, de acordo com o artigo 168. -A do Tratado CEE e com as disposições correspondentes dos Tratados CECA e CEEA, o recurso é limitado às questões de direito. Esta limitação é recordada no primeiro parágrafo do artigo 51. do Estatuto CEE e nas disposições correspondentes dos Estatutos CECA e CEEA do Tribunal de Justiça, que especificam os fundamentos de interposição de recurso, concretamente, incompetência do Tribunal de Primeira Instância, irregularidades processuais perante este Tribunal que prejudiquem os interesses dos recorrentes e violação do direito comunitário pelo Tribunal de Primeira Instância.

48 Recorde-se também que o recurso só pode assentar em fundamentos relativos a violação de normas jurídicas, com exclusão de qualquer apreciação da matéria de facto, só sendo assim admissível na medida em que o Tribunal de Primeira Instância seja acusado na petição de, ao decidir, ter ignorado normas jurídicas cujo respeito lhe compete assegurar (v. acórdãos de 1 de Outubro de 1991, Vidrányi/Comissão, C-283/90 P, Colect., p. 4339, n.os 11 a 13; de 8 de Abril de 1992, F./Comissão, C-346/90 P, Colect., p. 2691, n.os 6 e 7; e de 2 de Março de 1994, Hilti/Comissão, C-53/92 P, Colect., p. I-0000, n. 10).

49 Assim, só o Tribunal de Primeira Instância tem competência para a apreciação da matéria de facto, excepto em casos nos quais a inexactidão material das suas conclusões resulte de peças dos autos que lhe foram apresentadas. No presente caso, as conclusões do Tribunal sobre a série de eventos que precederam a aprovação do Regulamento n. 3294/88 (n. 11 do acórdão), que não são contestadas, não podem ser de novo postas em causa. Só aquele Tribunal, também, se pode pronunciar sobre aqueles factos. No presente caso, está em questão a sua conclusão de que a transmissão da Comissão ao Conselho da segunda proposta relativa aos coeficientes de correcção, em 23 de Dezembro de 1985, poderia ter sido feita de modo a que a regulamentação pudesse e tivesse que ser aprovada desde 1 de Janeiro de 1984 (n. 39 do acórdão). Em contrapartida, tendo o Tribunal de Primeira Instância conhecido de ou apreciado determinados factos, o Tribunal de Justiça é competente para exercer o controlo que lhe é imposto pelo artigo 168. -A do Tratado CEE, a partir do momento em que tenha havido qualificação jurídica e conclusões em matéria de direito dos mesmos factos. É o que acontece, no presente caso, com a conclusão do Tribunal de Primeira Instância de que a lentidão do processo preparatório constitui um comportamento faltoso (n. 39 do acórdão).

50 Nestes limites, a segunda parte deve ser considerada admissível.

51 Em contrapartida, carece de fundamento. Com efeito, o Tribunal de Primeira Instância entendeu que o comportamento faltoso da Comissão consistiu em só em 1986 ter transmitido ao Conselho uma proposta que poderia ter sido aprovada desde 1984 (n. 39). Ao qualificar desta forma o comportamento da Comissão, o Tribunal não cometeu qualquer erro de direito.

52 Deve contudo observar-se que o Tribunal de Primeira Instância não se pronunciou sobre o nexo de causalidade entre aquele comportamento faltoso e o dano sofrido pelos funcionários entre 1986 e 1988. Note-se, todavia, que a Comissão não invocou este fundamento no recurso. O Tribunal de Justiça não pode assim pronunciar-se sobre aquela circunstância. Assim, o fundamento da Comissão deve ser examinado sob o ângulo por ela abordado, concretamente, que comportamentos faltosos como o que o Tribunal de Primeira Instância concluiu ter existido só dão lugar ao pagamento de juros de mora.

53 Resulta a este respeito dos acórdãos de 30 de Setembro de 1986, Ammann e o./Conselho (174/83, Recueil, p. 2647, n.os 19 e 20), Culmsee e o./CES (175/83, Recueil, p. 2667, n.os 19 e 20), Allo e o./Comissão (176/83, Recueil, p. 2687, n.os 19 e 20), Agostini e o./Comissão (233/83, Recueil, p. 2709, n.os 19 e 20), Ambrosetti e o./Comissão (247/83, Recueil, p. 2729, n.os 19 e 20), e Delhez e o./Comissão (264/83, Recueil, p. 2749, n.os 20 e 21), que só pode considerar-se existente uma obrigação de pagar juros de mora no caso de o crédito principal ser de montante certo ou, pelo menos, determinado com base em elementos objectivos verificados. Os mesmos acórdãos precisaram que as competências do Conselho para adaptar as remunerações e pensões dos funcionários e dos outros agentes e para fixar os coeficientes de correcção que afectam tais remunerações e pensões, resultantes do artigo 65. do Estatuto, comportam um poder de apreciação. Não existe qualquer certeza quanto ao montante destas adaptações e fixações antes de o Conselho ter exercido as suas competências e aprovado o regulamento previsto.

54 No presente caso, nenhuma instituição comunitária sabia, antes da aprovação do Regulamento n. 3294/88, se os coeficientes correctores em vigor seriam objecto de rectificação e, em caso afirmativo, quais seriam os novos coeficientes aplicáveis, como foi a justo título salientado pelo Tribunal de Primeira Instância (n. 23 do acórdão). Assim, antes da data de aprovação do regulamento, o crédito dos funcionários não era certo nem determinável, não podendo assim começar a vencer juros de mora.

55 Assim, deve ser negado provimento à segunda parte do segundo fundamento da Comissão.

Quanto à terceira parte

56 Na terceira parte, a Comissão sustenta que o Tribunal de Primeira Instância a condenou indevidamente no pagamento de juros compensatórios devido a um atraso pelo qual é responsável o Conselho, segundo o mesmo Tribunal. Segundo a Comissão, os funcionários deviam ter pedido a reparação dos danos sofridos ao Conselho, nos termos do artigo 215. do Tratado CEE.

57 A este respeito, basta verificar que este fundamento não foi formulado perante o Tribunal de Primeira Instância pela Comissão, não sendo assim admissível.

58 Com efeito, nos termos do n. 2 do artigo 48. do Regulamento de Processo do Tribunal de Primeira Instância, é proibido deduzir novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo.

59 Permitir a uma parte invocar perante o Tribunal de Justiça, pela primeira vez, fundamentos não apresentados ao Tribunal de Primeira Instância reconduzir-se-ia a permitir-lhe apresentar ao Tribunal de Justiça, cuja competência para julgar recursos em segunda instância é limitada, litígios mais latos do que os presentes ao Tribunal de Primeira Instância. Assim, no âmbito dos recursos em segunda instância, a competência do Tribunal de Justiça encontra-se limitada à apreciação da solução legal dada aos fundamentos debatidos em primeira instância.

60 Nestas condições, a terceira parte do segundo fundamento da Comissão deve ser julgada improcedente.

Quanto ao terceiro fundamento da Comissão, baseada na errada interpretação e aplicação do direito comunitário em matéria de prova dos danos

61 No terceiro fundamento, a Comissão sustenta que o Tribunal de Primeira Instância fez errada interpretação e aplicação do direito comunitário no que respeita à prova dos danos.

62 A este respeito, o Tribunal de Primeira Instância considerou demonstrado, nomeadamente, que, em virtude do atraso indevido, os funcionários tinham sofrido danos constituídos pela perda de poder de compra relativo aos retroactivos das remunerações que deviam ter sido liquidados no decurso do primeiro trimestre de 1984, só o tendo sido vários anos mais tarde. Acrescentou que, nos presentes processos, não era necessário procurar provas de perdas individuais, mas verificar a existência de factos objectivamente demonstráveis com base em dados precisos e tornados públicos. Entendeu que ao apresentarem estatísticas pertinentes, que não foram contestadas pela Comissão, os funcionários apresentaram prova bastante da deterioração do respectivo poder de compra relativo aos retroactivos das remunerações durante o período em causa.

63 Ora, segundo a Comissão, esta formulação contraria os princípios gerais de direito relativos à reparação de danos. Com efeito, compete àqueles que desejam obter reparação demonstrar que sofreram danos individuais. Estes danos individuais não podem ser provados pela simples apresentação de estatísticas. Por outro lado, a reavaliação das somas devidas só pode resultar de acto do legislador comunitário, que não teve lugar no caso.

64 Para os funcionários, este terceiro fundamento respeita à apreciação da prova, matéria em que o Tribunal de Primeira Instância é soberano, não podendo ser alvo de controlo através de recurso para segunda instância.

65 Com efeito, o terceiro fundamento é inadmissível. Note-se a este respeito que o facto de os funcionários terem recebido em Novembro de 1988 retroactivos sobre as respectivas remunerações que lhes deviam ter sido pagos em 1984, de acordo com a apreciação soberana do Tribunal, é constitutivo de danos. Com efeito, o Tribunal salientou, no n. 30 do acórdão, que estes retroactivos tinham, por esta forma, perdido uma parte do seu valor real.

66 Tal como não é competente para a apreciação de factos, o Tribunal de Justiça não tem também, em princípio, competência para examinar as provas que o Tribunal de Primeira Instância considerou determinantes no apuramento de tais factos. Com efeito, tendo as provas sido obtidas regularmente, tendo as normas e princípios gerais de direito em matéria de prova sido respeitados, bem como as regras processuais em matéria de produção de prova, compete exclusivamente àquele Tribunal a apreciação do valor a atribuir aos elementos que lhe foram submetidos. Os fundamentos assentes na crítica àquela apreciação não podem ser acolhidos pelo Tribunal de Justiça. Pelas mesmas razões, tendo o Tribunal de Primeira Instância verificado existirem danos, compete apenas a ele determinar, dentro dos limites do pedido, qual a reparação mais adequada.

67 O terceiro fundamento da Comissão não pode, assim, ser acolhido.

68 Resulta do conjunto destas considerações que deve ser negado provimento ao recurso da Comissão.

Quanto ao recurso subordinado dos funcionários

69 A Comissão afirma que o recurso subordinado interposto pelos funcionários na resposta é inadmissível. Comecemos por analisar esta excepção.

Quanto à admissibilidade do recurso subordinado

70 A Comissão afirma que o recurso dos funcionários não respeita o disposto no artigo 49. do Estatuto CEE do Tribunal de Justiça, pois foi apresentado depois de ter expirado o prazo de dois meses a contar da notificação da decisão impugnada.

71 Este argumento não pode ser aceite. Com efeito, o n. 1 do artigo 116. do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça determina que:

"As conclusões da resposta devem ter como objecto:

- o indeferimento, total ou parcial, do recurso ou a anulação, total ou parcial, da decisão do Tribunal de Primeira Instância,

- o provimento, no todo ou em parte, dos pedidos apresentados em primeira instância, não sendo permitido formular pedidos novos."

72 No presente caso, as conclusões da resposta dos funcionários vão no sentido de obter a condenação da Comissão ao pagamento de juros de mora que tinham pedido em primeira instância, mas que lhes foram recusados pelo Tribunal. Tal pedido corresponde ao disposto no referido artigo 116. Daqui decorre que o único prazo a que se encontram sujeitos os recursos subordinados é o do n. 1 do artigo 115. do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça quanto à apresentação de resposta, ou seja, dois meses a contar da notificação do recurso.

73 Dado que no presente caso este prazo foi respeitado, o recurso subordinado é admissível. Devem assim ser examinados os dois fundamentos invocados pelos funcionários contra o acórdão, na medida em que este não lhes atribuiu juros de mora e não avaliou os prejuízos tomando em conta o ano de 1982.

Quanto ao primeiro fundamento dos funcionários, baseado na violação dos princípios gerais de indemnização de danos

74 Os funcionários sublinham que foram necessários mais de oito anos para obterem a liquidação efectiva dos retroactivos que lhes eram devidos. Afirmam que, na falta de juros de mora, não dispõem de quaisquer meios para reagir se as instituições retardarem a aprovação de determinados actos normativos para além de prazos razoáveis. Assim, aquelas podem ver-se tentadas a remeter para data indeterminada a aprovação de medidas na matéria, apesar do princípio enunciado no n. 2 do artigo 65. do Estatuto, que exige actuação em tempo útil. Aliás, a Comissão pagou juros do tipo referido a centenas de funcionários, na sequência do que estes desistiram do recurso.

75 Este argumento não pode ser acolhido. Com efeito, tal como já foi afirmado neste acórdão (n. 53), de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, os juros de mora só podem começar a correr a partir do momento em que o crédito dos funcionários é certo e determinável, ou seja, no caso concreto, a partir da aprovação do Regulamento n. 3294/88.

76 A circunstância de a Comissão ter pago juros de mora a certos funcionários, sem obrigação jurídica de o fazer, não é susceptível de alterar aquela conclusão.

77 Daqui decorre que o primeiro fundamento do recurso subordinado dos funcionários deve ser julgado improcedente.

Quanto ao segundo fundamento dos funcionários, baseado na contradição entre os fundamentos e a parte decisória do acórdão, bem como de violação do princípio da não discriminação

78 Os funcionários afirmam que, embora o Tribunal de Primeira Instância tenha reconhecido, no n. 39 dos fundamentos, que a Comissão já dispunha dos documentos necessários do Serviço de Estatística em Janeiro de 1982, na parte decisória do acórdão limitou o ressarcimento da perda de poder de compra ao período começado em 1984, recusando qualquer indemnização relativa aos três anos precedentes. Existe, assim, contradição entre os fundamentos e a parte decisória do acórdão. Para além disso, a recusa de atribuição de reparação pela perda de poder de compra sofrida durante um período tão longo viola o princípio da não discriminação entre funcionários da Comunidade remunerados em moedas diferentes.

79 Este argumento não pode ser aceite. Com efeito, o fundamento apresentado por esta forma limita-se a contestar a apreciação do Tribunal de Primeira Instância relativa à época durante a qual poderia ter sido aprovado o regulamento em causa. Como foi já decidido atrás (n. 49), tal apreciação respeita apenas a factos, não podendo assim ser impugnada em recurso.

80 Os funcionários afirmam ainda que o Tribunal de Primeira Instância não teve em conta o facto de os juros compensatórios destinados a ressarcir a perda de poder de compra entre 1984 e 1988 perderem eles próprios valor entre 1988 e a data em que sejam pagos em execução do acórdão.

81 Este argumento não pode ser aceite. Com efeito, e como foi já afirmado no n. 66, só ao Tribunal de Primeira Instância compete apreciar, nos limites do pedido, o modo e medida da reparação dos danos.

82 Assim, o segundo fundamento do recurso subordinado deve também ser julgado improcedente.

83 Resulta do conjunto das considerações precedentes que o recurso subordinado deve ser julgado improcedente.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

84 Nos termos do artigo 122. do Regulamento de Processo, nos litígios entre a Comunidade e os seus agentes, o artigo 70. do mesmo regulamento só é aplicável aos recursos interpostos pelas instituições. De acordo com esta disposição, as despesas efectuadas pelas instituições ficam a cargo destas, sem prejuízo do disposto no n. 3, segundo parágrafo, do artigo 69.

85 A Comissão deve assim ser condenada nas despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

decide:

1) É negado provimento aos recursos.

2) A Comissão é condenada nas despesas.

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