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Documento 62006TJ0362

Acórdão do Tribunal Geral (Sexta Secção) de 27 de setembro de 2012.
Ballast Nedam Infra BV contra Comissão Europeia.
Concorrência ― Acordos, decisões e práticas concertadas ― Mercado neerlandês do betume rodoviário ― Decisão que declara uma infração ao artigo 81.° CE ― Coimas ― Prova da infração ― Gravidade da infração ― Imputabilidade do comportamento ilícito ― Direitos de defesa ― Dedução de fundamentos novos no decurso da instância ― Plena jurisdição.
Processo T‑362/06.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:T:2012:492

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

27 de setembro de 2012 ( *1 )

«Concorrência — Acordos, decisões e práticas concertadas — Mercado neerlandês do betume rodoviário — Decisão que declara uma infração ao artigo 81.o CE — Coimas — Prova da infração — Gravidade da infração — Imputabilidade do comportamento ilícito — Direitos de defesa — Dedução de fundamentos novos no decurso da instância — Plena jurisdição»

No processo T-362/06,

Ballast Nedam Infra BV, com sede em Nieuwegein (Países Baixos), representada inicialmente por A. Bosman e J. van de Hel e, em seguida, por Bosman e E. Oude Elferink, advogados,

recorrente,

contra

Comissão Europeia, representada por A. Bouquet, A. Nijenhuis e F. Ronkes Agerbeek, na qualidade de agentes, assistidos inicialmente por F. Wijckmans, F. Tuytschaever e L. Gyselen e, em seguida, por F. Wijckmans e F. Tuytschaever, advogados,

recorrida,

que tem por objeto, a título principal, um pedido de anulação da Decisão C (2006) 4090 final da Comissão, de 13 de setembro de 2006, relativa a um procedimento nos termos do artigo 81.o [CE] [Processo COMP/F/38.456 — Betume (Países Baixos)], na parte relativa à recorrente e, a título subsidiário, por um lado, um pedido de anulação parcial da referida decisão e de redução do montante da coima que lhe foi aplicada e, por outro lado, um pedido de anulação parcial dessa mesma decisão na parte em que esta fixa a duração da infração no que lhe diz respeito e de redução correlativa do montante da coima que lhe foi aplicada,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção),

composto por: M. Jaeger, presidente, N. Wahl e S. Soldevila Fragoso (relator), juízes,

secretário: J. Plingers, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 30 de junho de 2011,

profere o presente

Acórdão

Factos na origem do litígio

1

A recorrente, Ballast Nedam Infra BV, faz parte do grupo Ballast Nedam, que opera no setor da construção nos Países Baixos, e é dirigida pela Ballast Nedam NV, detentora de 100% do capital da recorrente. Através da aquisição das sociedades de construção rodoviária Eemsmond Wegenbouw BV e Bruil Infrastructuur BV, em 1995, o grupo tornou-se um ator importante do setor da construção rodoviária nos Países Baixos, centralizando as suas atividades na Ballast Nedam Grond en Wegen BV (a seguir «BNGW»), filial detida a 100% pela recorrente. A partir de 1 de outubro de 2000, as atividades de construção rodoviária do grupo foram exercidas diretamente pela recorrente. Desde 14 de fevereiro de 2003, a Ballast Nedam Nederland BV é a sociedade intermediária entre a Ballast Nedam e a recorrente.

2

Por carta de 20 de junho de 2002, a British Petroleum (a seguir «BP») informou a Comissão das Comunidades Europeias da existência de um possível cartel no mercado do betume rodoviário nos Países Baixos e apresentou um pedido com vista a obter imunidade em matéria de coimas, nos termos da comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis (JO 2002, C 45, p. 3).

3

Em 1 e em 2 de outubro de 2002, a Comissão procedeu a inspeções inopinadas nas instalações de determinadas sociedades. A Comissão enviou pedidos de informações a várias sociedades, entre as quais a recorrente, em 30 de junho de 2003, pedidos esses a que esta respondeu em 4 e em 12 de setembro de 2003.

4

Em 18 de outubro de 2004, a Comissão desencadeou o processo administrativo e aprovou uma comunicação de acusações, que foi enviada, no dia seguinte, a várias sociedades, entre as quais a recorrente. A recorrente respondeu em 20 de maio de 2005.

5

Em 13 de setembro de 2006, a Comissão adotou a decisão C (2006) 4090 final, relativa a um procedimento nos termos do artigo 81.o [CE] [Processo COMP/F/38.456 — Betume (Países Baixos)] (a seguir «decisão impugnada»), de que foi publicado um resumo no Jornal Oficial da União Europeia de 28 de julho de 2007 (JO L 196, p. 40) e que foi notificada à recorrente em 25 de setembro de 2006.

6

Na decisão impugnada, a Comissão referiu que as sociedades destinatárias da decisão tinham participado numa infração única e continuada ao artigo 81.o, n.o 1, CE, que consistiu na fixação conjunta e regular, durante os períodos em causa e para a venda e a compra de betume rodoviário nos Países Baixos, do preço bruto, de um desconto uniforme sobre o preço bruto para os construtores rodoviários que participaram no cartel (a seguir «W5» ou «grandes construtores») e de um desconto máximo reduzido sobre o preço bruto para os outros construtores rodoviários (a seguir «pequenos construtores»).

7

A recorrente e a Ballast Nedam foram consideradas culpadas desta infração relativamente ao período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 15 de abril de 2002. Com efeito, a Comissão presumiu que a recorrente tinha exercido uma influência determinante sobre a BNGW, que participou nas reuniões relativas ao cartel até 1 de outubro de 2000. A decisão impugnada refere que a própria recorrente participou nessas reuniões a partir dessa data e até ao final da infração. Foi aplicada solidariamente à recorrente e à Ballast Nedam uma coima de 4,65 milhões de euros.

Tramitação processual e pedidos das partes

8

Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal Geral em 5 de dezembro de 2006, a recorrente interpôs o presente recurso.

9

Com base no relatório do juiz-relator, o Tribunal Geral (Sexta Secção) decidiu dar início à fase oral e, no âmbito das medidas de organização do processo previstas no artigo 64.o do seu Regulamento de Processo, colocou questões escritas às partes. As partes responderam a estas questões no prazo fixado.

10

As partes foram ouvidas nas suas alegações e nas suas respostas às questões orais colocadas pelo Tribunal Geral na audiência de 30 de junho de 2011.

11

Uma vez que um dos membros da Sexta Secção ficou impedido, o presidente do Tribunal Geral designou-se a si próprio, em aplicação do artigo 32.o, n.o 3, do Regulamento de Processo do Tribunal Geral, para completar a Secção.

12

Por despacho de 18 de novembro de 2011, o Tribunal Geral (Sexta Secção), na sua nova composição, reabriu a fase oral do processo e as partes foram informadas de que seriam ouvidas por ocasião de nova audiência.

13

Por cartas, respetivamente, de 25 e de 28 de novembro de 2011, a Comissão e a recorrente informaram o Tribunal Geral de que renunciavam a ser novamente ouvidas.

14

Consequentemente, o presidente do Tribunal decidiu encerrar a fase oral.

15

A recorrente conclui pedindo que o Tribunal se digne:

a título principal, anular a decisão impugnada na parte que se lhe aplica;

a título subsidiário, anular o artigo 2.o da decisão impugnada, na parte que lhe diz respeito, ou, pelo menos, reduzir o montante da coima que lhe foi aplicada com base nesse artigo;

a título igualmente subsidiário, em alternativa, anular parcialmente o artigo 1.o da decisão impugnada, na parte que diz respeito à duração da infração até outubro de 2000 e, em consequência, reduzir o montante da coima que lhe foi aplicada com base no artigo 2.o, na parte que se lhe aplica;

condenar a Comissão nas despesas.

16

A Comissão conclui pedindo que o Tribunal se digne:

julgar o recurso improcedente;

condenar a recorrente nas despesas.

Questão de direito

17

Em apoio do seu recurso, a recorrente apresenta quatro fundamentos. O primeiro fundamento é relativo a uma violação do artigo 81.o CE e do Regulamento (CE) n.o 1/2003 do Conselho, de 16 de dezembro de 2002, relativo à execução das regras de concorrência estabelecidas nos artigos 81.° [CE] e 82.° [CE] (JO 2003, L 1, p. 1), o segundo, a uma violação do artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1/2003 e das orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do artigo 15.o, n.o 2, do Regulamento n.o 17 e do artigo 65.o, n.o 5, [CA] (JO 1998, C 9, p. 3, a seguir «orientações para o cálculo das coimas»), o terceiro, a uma violação do artigo 81.o CE que resulta da apreciação errada do exercício efetivo de uma influência determinante no comportamento comercial da BNGW e, o quarto, à violação do artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003 e dos direitos de defesa.

18

Antes de mais, há que analisar o quarto fundamento.

Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003 e dos direitos de defesa

Argumentos das partes

19

A recorrente sustenta que a Comissão violou os seus direitos de defesa, bem como o artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003, ao informá-la, na decisão impugnada, de que a considerava responsável pela infração cometida pela BNGW, sem que o tivesse referido na comunicação de acusações.

20

A Comissão recorda que, na comunicação de acusações, referiu que a recorrente se designava anteriormente BNGW e que a Ballast Nedam e a recorrente eram responsáveis pela participação no cartel desde 1995. Referiu igualmente que considerava que as sociedades-mãe de cada grupo podiam exercer efetivamente uma influência determinante no comportamento das suas filiais. Uma vez que, na sua resposta à comunicação de acusações, a recorrente referiu que era a sociedade-mãe da BNGW, não podia ignorar que seria considerada responsável pelo comportamento desta. Essa resposta, que indicava que a BNGW não era a antecessora da recorrente, mas sim sua filial detida a 100%, levou a Comissão a considerar a recorrente responsável pelo comportamento da sua filial. Além disso, após a comunicação de acusações, a recorrente apresentou igualmente a defesa da BNGW, que abrangia o período anterior a 1 de outubro de 2000. Por outro lado, ao não responder ao pedido da Comissão para que lhe facultasse um organograma do grupo Ballast Nedam anterior a 1 de outubro de 2000, a recorrente manteve a confusão quanto à sua relação com a BNGW antes dessa data.

Apreciação do Tribunal

21

O artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003 tem a seguinte redação:

«Antes de tomar as decisões previstas nos artigos 7.°, 8.° e 23.° e no n.o 2 do artigo 24.o, a Comissão dá às empresas ou associações de empresas sujeitas ao processo [por ela] instruído oportunidade de se pronunciarem sobre as acusações por ela formuladas. A Comissão deve basear as suas decisões apenas em acusações sobre as quais as partes tenham tido oportunidade de apresentar as suas observações. Os autores das denúncias são estreitamente associados ao processo».

22

Assim, de acordo com a jurisprudência, o respeito pelos direitos de defesa exige que a empresa interessada tenha tido a possibilidade, durante o processo administrativo, de dar a conhecer utilmente o seu ponto de vista sobre a realidade e a pertinência dos factos e circunstâncias alegados e sobre os documentos considerados pela Comissão em apoio da sua alegação de existência de uma infração (acórdãos do Tribunal de Justiça de 7 de junho de 1983, Musique Diffusion française e o./Comissão, 100/80 a 103/80, Recueil, p. 1825, n.o 10, e de 6 de abril de 1995, BPB Industries e British Gypsum/Comissão, C-310/93 P, Colet., p. I-865, n.o 67). De igual modo, de acordo com jurisprudência constante, tendo em conta a sua importância, a comunicação de acusações deve precisar, inequivocamente, a pessoa coletiva à qual poderão ser aplicadas coimas e deve ser dirigida a esta última (acórdãos do Tribunal de Justiça de 16 de março de 2000, Compagnie maritime belge transports e o./Comissão, C-395/96 P e C-396/96 P, Colet., p. I-1365, n.os 143 e 146, e de 2 de outubro de 2003, ARBED/Comissão, C-176/99 P, Colet., p. I-10687, n.o 21). Importa igualmente que a comunicação de acusações indique em que qualidade uma empresa é acusada dos factos alegados (acórdão do Tribunal de Justiça de 3 de setembro de 2009, Papierfabrik August Koehler e o./Comissão, C-322/07 P, C-327/07 P e C-338/07 P, Colet., p. I-7191, n.o 39).

23

No entanto, há que recordar que, de acordo com a jurisprudência, a decisão não tem necessariamente de ser uma cópia exata da comunicação de acusações (acórdão do Tribunal de Justiça de 29 de outubro de 1980, van Landewyck e o./Comissão, 209/78 a 215/78 e 218/78, Recueil, p. 3125, n.o 68). Por conseguinte, só se deverá julgar provada uma violação dos direitos de defesa se a decisão final imputar às empresas em causa infrações diferentes das referidas na comunicação de acusações ou tomar em consideração factos diferentes (acórdão do Tribunal de Justiça de 15 de julho de 1970, ACF Chemiefarma/Comissão, 41/69, Colet., p. 661, n.os 26 e 94, e acórdão do Tribunal Geral de 23 de fevereiro de 1994, CB e Europay/Comissão, T-39/92 e T-40/92, Colet., p. II-49, n.os 49 a 52). Não é esse o caso quando as alegadas diferenças entre a comunicação de acusações e a decisão final não sejam relativas a outros comportamentos que não aqueles sobre os quais as empresas em causa já se tenham pronunciado e que são, portanto, estranhos a qualquer acusação nova (acórdão do Tribunal Geral de 30 de setembro de 2003, Atlantic Container Line e o./Comissão, T-191/98, T-212/98 a T-214/98, Colet., p. II-3275, n.o 191).

24

A este respeito, há que salientar que, para alegarem que houve violação dos direitos de defesa relativamente às acusações constantes da decisão impugnada, as empresas em causa não podem limitar-se a invocar a mera existência de diferenças entre a comunicação de acusações e a decisão impugnada sem exporem, de forma precisa e concreta, de que modo cada uma dessas diferenças constitui, no caso concreto, uma acusação nova sobre a qual não tiveram a oportunidade de ser ouvidas (acórdão Atlantic Container Line e o./Comissão, referido no n.o 23, supra, n.o 192). Com efeito, de acordo com a jurisprudência, uma violação dos direitos de defesa deve ser analisada em função das circunstâncias específicas de cada caso concreto, uma vez que depende essencialmente das acusações tomadas em consideração pela Comissão para demonstrar a infração imputada às empresas em causa (acórdão do Tribunal Geral de 29 de junho de 1995, ICI/Comissão, T-36/91, Colet., p. II-1847, n.o 70).

25

A recorrente considera que, no caso em apreço, a Comissão não cumpriu as suas obrigações ao não referir na comunicação de acusações que presumia que a recorrente, além de ter participado diretamente na infração a partir de 1 de outubro de 2000, era também responsável em relação ao período entre 21 de junho de 1996 e 30 de setembro de 2000, pelo facto de ter exercido efetivamente uma influência determinante no comportamento comercial da BNGW.

26

Resulta da comunicação de acusações que, antes de mais, a Comissão recordou, de forma genérica, que cada grupo de sociedades em causa constituía uma única empresa e que a sociedade-mãe do grupo podia exercer efetivamente uma influência determinante no comportamento das suas filiais (n.o 324). Em seguida, no que diz respeito mais concretamente à recorrente, referiu que esta era a sucessora legal da BNGW (n.o 49 e nota de pé de página n.o 28) e que a Ballast Nedam, a Ballast Nedam Nederland, a recorrente e as várias outras filiais do setor da construção rodoviária faziam todas parte do grupo Ballast Nedam e constituíam uma única e mesma empresa (n.o 50). Por último, especificou que a recorrente (anteriormente BNGW) tinha participado diretamente na prática ilícita em causa (n.o 339). Por conseguinte, optou por dirigir a referida comunicação à recorrente, pela «sua participação (e das suas antecessoras) direta nos acordos colusórios», e à Ballast Nedam, «pela sua participação através do exercício de uma influência determinante no comportamento da sua filial ‘infraestruturas’, Ballast Nedam Infra […]» (n.o 342).

27

Assim, a Comissão dirigiu a comunicação de acusações à recorrente em razão da sua participação direta na infração, bem como da sua qualidade de sucessora da BNGW, que tinha também participado diretamente na infração antes de outubro de 2000. Em contrapartida, não fez qualquer referência à possibilidade de imputar à recorrente, na sua qualidade de sociedade-mãe da BNGW, a responsabilidade pela infração cometida por esta última.

28

Uma vez que, no n.o 17 da sua resposta à comunicação de acusações, a recorrente indicou que não era a sucessora legal da BNGW, a Comissão referiu, na decisão impugnada, que a participação nas reuniões do cartel até 1 de outubro de 2000 era feita através de um empregado da BNGW, filial detida a 100% pela recorrente. Por conseguinte, considerou a recorrente responsável pela infração cometida pela BNGW, no período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 30 de setembro de 2000, na sua qualidade de sociedade-mãe detentora a 100% daquela. Considerou-a igualmente responsável pela infração no período compreendido entre 1 de outubro de 2000 e 15 de abril de 2002 em razão da sua participação direta nessa infração (considerandos 293 e 294 da decisão impugnada).

29

Resulta de todos estes elementos que, no caso em apreço, a Comissão não referiu, na comunicação de acusações, em que qualidade a recorrente era acusada dos factos alegados. Por conseguinte, nos termos da comunicação de acusações, a recorrente não podia prever que, na sua decisão final, a Comissão pretendia imputar-lhe a infração com base no seu envolvimento direto nas atividades do cartel e na sua qualidade de sociedade-mãe a 100% da BNGW, devido à presunção de exercício efetivo de uma influência determinante no comportamento desta, que lhe cabia ilidir.

30

Uma vez que a comunicação de acusações não permitiu à recorrente tomar conhecimento da acusação relativa ao seu envolvimento indireto nas atividades do cartel, ela não teve possibilidade de assegurar utilmente a sua defesa a este respeito durante o procedimento administrativo.

31

O simples facto de, por um lado, a Comissão ter indicado, de forma genérica, na comunicação de acusações, que considerava as sociedades-mãe responsáveis pelo comportamento das suas filiais (n.os 324 e 278) e de, por outro lado, a recorrente saber que a BNGW era sua filial a 100%, e não sua antecessora legal, não basta para considerar que a Comissão cumpriu a sua obrigação de referir, na comunicação de acusações, em que qualidade a recorrente era acusada dos factos alegados.

32

Há que declarar, de resto, que a recorrente, na sua resposta à comunicação de acusações, embora tenha aduzido argumentos para demonstrar a inexistência de infração ao artigo 81.o CE, referindo-se sistematicamente à «BNGW e à BN Infra (após outubro de 2000)», não apresentou no entanto nenhum argumento para demonstrar a autonomia da BNGW em relação a si própria, a fim de ilidir a presunção de exercício efetivo de uma influência determinante, da sua parte, na política comercial daquela sociedade.

33

Por outro lado, a Comissão sustenta que o erro cometido na comunicação de acusações quanto à ligação que existia entre a BNGW e a recorrente é imputável a esta última, na medida em que ela não facultou o organograma da estrutura do seu grupo anterior a 1 de outubro de 2000, como lhe tinha sido pedido em 30 de junho de 2003. No entanto, este facto não exime a Comissão da sua obrigação de referir, na comunicação de acusações, em que qualidade a recorrente era acusada dos factos alegados, uma vez que, por um lado, se a Comissão tivesse sido clara quanto a este aspeto na comunicação de acusações, a recorrente teria podido apresentar a sua defesa relativamente a esta questão, fornecendo esse organigrama por iniciativa própria, e, por outro lado, o artigo 18.o, n.os 1 e 3, e o artigo 23.o, n.o 1, alínea b), do Regulamento n.o 1/2003 conferem à Comissão meios coercivos para obter esse tipo de informações.

34

Por último, uma vez que, na sua resposta à comunicação de acusações, a recorrente tinha referido que não era a sucessora legal da BNGW, cabia à Comissão adotar acusações complementares para poder imputar-lhe a responsabilidade pela infração cometida pela BNGW na sua qualidade de sociedade-mãe a 100% desta última (v., neste sentido, acórdãos do Tribunal de Justiça de 14 de julho de 1972, Geigy/Comissão, 52/69, Colet., p. 293, n.o 14, e de 7 de janeiro de 2004, Aalborg Portland e o./Comissão, C-204/00 P, C-205/00 P, C-211/00 P, C-213/00 P, C-217/00 P e C-219/00 P, Colet., p. I-123, n.o 192).

35

Por conseguinte, deve concluir-se que a recorrente não teve possibilidade de assegurar utilmente a sua defesa durante o procedimento administrativo no que diz respeito à sua participação na infração na qualidade de sociedade-mãe a 100% da BNGW.

36

Consequentemente, o Tribunal Geral deve, por um lado, anular o artigo 1.o, alínea a), da decisão impugnada na parte que diz respeito à imputação do comportamento da BNGW à recorrente no período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 30 de setembro de 2000 e, por outro lado, exercer a competência de plena jurisdição, que lhe é reconhecida pelo artigo 261.o TFUE e pelo artigo 31.o do Regulamento n.o 1/2003, a fim de, em conformidade com o pedido apresentado pela recorrente, retirar as consequências dessa anulação sobre o montante da coima que lhe foi aplicada. Estas serão analisadas nos n.os 136 e seguintes, infra.

Quanto ao primeiro fundamento, relativo à falta de prova da existência de uma infração ao artigo 81.o CE

Argumentos das partes

37

Embora o ónus da prova da existência de uma infração ao artigo 81.o CE incumba à Comissão, a recorrente considera que, no caso em apreço, esta não apresentou elementos de prova suficientes.

38

Assim, em primeiro lugar, a recorrente considera que a Comissão não demonstrou suficientemente o envolvimento dos grandes construtores na fixação do preço bruto do betume. A única prova apresentada pela Comissão a este respeito consistiu nas declarações de fornecedores de betume (a seguir «fornecedores»), que não eram credíveis. Por outro lado, a recorrente nega ter reconhecido o seu próprio envolvimento nesta matéria. Alega que os fornecedores fixavam o preço bruto do betume em reuniões preparatórias, comunicando-o, em seguida, aos grandes construtores quando reuniam com estes. Além disso, os fornecedores, que já tinham constituído um cartel sobre os preços do betume, não tinham qualquer motivo para partilhar este poder com sociedades de dimensão média e dependentes deles. Por último, o simples facto de os grandes construtores terem aceitado o nível de preço bruto fixado pelos fornecedores não pode ser qualificado de cartel.

39

Em segundo lugar, a recorrente alega que o W5 obtinha descontos maiores do que os concedidos aos pequenos construtores devido às quantidades adquiridas. Por outro lado, os pequenos construtores obtiveram, frequentemente, um desconto maior do que o concedido ao W5. O facto de um grande construtor pedir um desconto adicional ao tomar conhecimento de que um pequeno construtor obteve um desconto maior do que o seu, e não justificado pela quantidade adquirida, resulta de práticas comerciais normais e não deve ser considerado uma «sanção». Só uma vez foi negociado coletivamente pelos grandes construtores um desconto adicional. Por conseguinte, não há qualquer prova de que existia um mecanismo sancionatório que era imposto pelos grandes construtores sempre que os fornecedores concediam um desconto maior do que o deles a um pequeno construtor. Por outro lado, a recorrente acrescenta que o acordo relativo ao desconto-padrão concedido ao W5 não constitui uma infração ao artigo 81.o CE e que esse desconto era apenas um desconto mínimo que servia de ponto de partida nas negociações bilaterais.

40

Em terceiro lugar, a recorrente salienta que os grandes construtores não tinham interesse numa fixação do preço bruto com os fornecedores. Com efeito, os dois grupos tinham interesses opostos, uma vez que os grandes construtores procuravam a estabilidade dos preços, que os fornecedores não desejavam. Além disso, a recorrente rejeita a afirmação da Comissão de que os grandes construtores não tinham interesse na redução do preço do betume por causa do mecanismo de resolução dos riscos, que permitia repercutir os aumentos de preço sobre os donos de obra, uma vez que esse mecanismo era aplicável apenas a um número insignificante de projetos.

41

Em quarto lugar, a recorrente afirma que, de acordo com as orientações da Comissão sobre a aplicação do artigo 81.o [CE] aos acordos de cooperação horizontal (JO 2001, C 3, p. 2, a seguir «orientações sobre os acordos de cooperação horizontal»), ponto 116, a compra em grupo pode ser considerada favorável à concorrência. No entanto, a Comissão recusou-se a aplicar esta disposição sem ter investigado a estrutura do mercado e sem ter medido os efeitos dos acordos no mercado.

42

Por último, em quinto lugar, a recorrente acusa a Comissão de não ter verificado, como a jurisprudência exige, por um lado, se os comportamentos alegados tinham por objetivo ou efeito restringir a concorrência e, por outro lado, se os consumidores finais ficaram privados das vantagens da concorrência (acórdão do Tribunal Geral de 27 de setembro de 2006, GlaxoSmithKline Services/Comissão, T-168/01, Colet., p. II-2969, n.o 121).

43

A Comissão rejeita todos os argumentos da recorrente.

Apreciação do Tribunal

44

Há que recordar antes de mais que, nos termos do artigo 2.o do Regulamento n.o 1/2003 e da jurisprudência anterior (acórdãos do Tribunal de Justiça de 17 de dezembro de 1998, Baustahlgewebe/Comissão, C-185/95 P, Colet., p. I-8417, n.o 58, e de 8 de julho de 1999, Comissão/Anic Partecipazioni, C-49/92 P, Colet., p. I-4125, n.o 86), o ónus da prova de uma violação do artigo 81.o, n.o 1, CE incumbe à autoridade que a alega, sendo esta obrigada a apresentar os elementos de prova aptos a fazer prova bastante da existência dos factos constitutivos de uma infração. O juiz da União especificou, além disso, que a existência de uma dúvida no espírito do juiz deve beneficiar a empresa destinatária da decisão que declara uma infração (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de fevereiro de 1978, United Brands/Comissão, 27/76, Colet., p. 207, n.o 265) e que, em virtude da presunção de inocência, não pode pois concluir que a Comissão fez prova bastante da existência da infração em causa se subsistirem ainda no seu espírito dúvidas sobre essa questão, nomeadamente no quadro de um recurso de anulação de uma decisão que aplica uma coima (acórdão do Tribunal Geral de 8 de julho de 2004, JFE Engineering e o./Comissão, T-67/00, T-68/00, T-71/00 e T-78/00, Colet., p. II-2501, n.o 177). No entanto, cada uma das provas apresentadas pela Comissão não tem necessariamente de cumprir esses critérios relativamente a cada elemento da infração. Basta que o conjunto de indícios invocado pela instituição, apreciado globalmente, satisfaça essa exigência (acórdão JFE Engineering e o./Comissão, já referido, n.o 180). No âmbito da análise deste primeiro fundamento, cabe portanto ao Tribunal Geral verificar, à luz destes princípios, se a Comissão dispunha de provas suficientes da existência de factos constitutivos de uma infração ao artigo 81.o, n.o 1, CE.

45

Além disso, o Tribunal de Justiça especificou que, se a Comissão tiver conseguido reunir provas documentais da infração alegada e estas provas se revelarem suficientes para demonstrar a existência de um acordo de natureza anticoncorrencial, não é necessário verificar se a empresa acusada tinha um interesse comercial no referido acordo (acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de janeiro de 2007, Sumitomo Metal Industries e Nippon Steel/Comissão, C-403/04 P e C-405/04 P, Colet., p. I-729, n.o 46). Caso o Tribunal Geral considere que a Comissão fez prova da existência de acordos de natureza anticoncorrencial, não lhe cabe, portanto, responder ao argumento relativo ao interesse da recorrente no cartel.

46

Por outro lado, há que especificar que resulta do n.o 36, supra, que os elementos de prova que devem ser tomados em consideração pelo Tribunal Geral apenas respeitam ao período compreendido entre 1 de outubro de 2000 e 15 de abril de 2002, durante o qual a recorrente participou diretamente na infração. Além disso, é necessário apreciar os acordos celebrados entre o W5 e os fornecedores de forma global, uma vez que estes dizem respeito a três elementos, designadamente, o preço bruto, o desconto mínimo concedido ao W5 e o desconto máximo aplicável aos pequenos construtores.

– Quanto ao envolvimento dos grandes construtores na fixação do preço bruto

47

A recorrente sustenta que as declarações de antigos empregados dos fornecedores e a sua resposta à comunicação de acusações, bem como a de um outro grande construtor, são insuficientes para demonstrar o envolvimento dos grandes construtores na fixação do preço bruto do betume. Alega que o preço bruto do betume era fixado unicamente pelos fornecedores nas reuniões preparatórias.

48

Da resposta da recorrente à comunicação de acusações resulta que a recorrente, por um lado, admitiu que participou na concertação sobre o betume mas, por outro lado, contestou que o preço tivesse sido fixado em conjunto com os fornecedores, ainda que o W5 tivesse uma palavra a dizer relativamente aos descontos.

49

Com efeito, no n.o 105 da resposta à comunicação de acusações, a recorrente referiu o seguinte:

«A BN Infra (Ballast Nedam) reconhece que participou com outros grandes construtores numa concertação sobre o betume, na qual estavam representados os fornecedores (‘concertações sobre o betume’). No âmbito desta concertação, foi tratada a questão dos preços e dos descontos.»

50

No entanto, nos n.os 127 e 128 desse documento, a recorrente alega que «a ideia […] de que o montante do preço do betume padrão era fixado em conjunto pelos fornecedores coletivamente e pelos grandes construtores coletivamente na concertação sobre o betume, e de que os construtores definiam uma posição comum a esse respeito antes da concertação sobre o betume, não é correta» e que «as alterações de preço eram acordadas previamente pelos fornecedores, sem a presença dos grandes construtores, e, caso se verificasse uma concertação sobre o betume, essas alterações eram comunicadas e, de facto, impostas aos grandes construtores rodoviários». No n.o 106 da sua resposta, a recorrente declara o seguinte:

«[N]ão se tratava de uma verdadeira influência dos grandes construtores na formação do preço. Os preços do betume eram determinados pelos fornecedores antes da concertação. Mas, no que respeita aos descontos, os fornecedores estavam dispostos a discuti-los».

51

Para determinar se a recorrente participou, juntamente com o W5, na fixação dos preços e dos descontos, importa, antes de mais, analisar os outros elementos de prova constantes dos autos, relativos ao período compreendido entre 1 de outubro de 2000 e 15 de abril de 2002.

52

Em primeiro lugar, vários documentos citados na decisão impugnada confirmam a celebração de acordos entre os fornecedores e o W5 sobre o preço bruto, que não era unilateralmente fixado pelos fornecedores e imposto ao W5, como sustenta a recorrente.

53

Assim, um fax interno da Hollandsche Beton Groep (a seguir «HBG»), de 3 de outubro de 2000, e as notas de agenda da Heijmans Infrastructuur BV (a seguir «Heijmans»), relativas à reunião de 19 de outubro de 2000, referem que as partes «discutiram» um aumento dos preços (considerando 114 da decisão impugnada). Algumas notas da HBG e da Koninklijke Wegenbouw Stevin (a seguir «KWS»), relativas à reunião preparatória do W5 que antecedeu a concertação de 16 de fevereiro de 2001, mostram igualmente que o W5 propôs um preço para o betume, bem como um desconto para o W5 (considerando 115 da decisão impugnada). Além disso, algumas notas da HBG e da KWS referem-se a uma reunião ocorrida em 1 de março de 2001, na qual os fornecedores pretenderam baixar o preço bruto e o W5 achou preferível manter o preço bruto em vigor (considerandos 115 e 116 da decisão impugnada). Uma declaração da BP, de 12 de julho de 2002, refere igualmente que o preço do betume proposto pelos fornecedores não era sistematicamente aceite pelo W5 (considerando 61 da decisão impugnada e nota de pé de página n.o 156). Acresce que a declaração da Kuwait Petroleum (Nederland) BV (a seguir «KPN»), de 12 de setembro de 2003, mostra que os fornecedores propunham um determinado nível de preço, que era discutido com os grandes construtores, tal como o desconto que lhes era concedido. Por último, na sua resposta de 20 de maio de 2005 à comunicação de acusações, a KWS reconheceu que os fornecedores e o W5 tinham celebrado acordos a partir das propostas de preços brutos apresentadas pelos fornecedores (considerando 97 da decisão impugnada).

54

Em segundo lugar, a decisão impugnada faz referência a vários documentos que atestam que as negociações entre os fornecedores e o W5 incidiam igualmente sobre o desconto concedido ao W5. Assim, na sua resposta de 12 de setembro de 2003 a um pedido de informações da Comissão, a KWS indicou que as discussões entre os fornecedores e os grandes construtores incidiam simultaneamente sobre as «tabelas de preços» e os «descontos-padrão» (considerando 72 da decisão impugnada). Algumas notas da HBG e da KWS referem-se, por outro lado, à reunião de 1 de março de 2001, especificando o preço bruto acordado, o desconto concedido ao W5 e o desconto concedido aos pequenos construtores (considerando 116 da decisão impugnada). Uma nota interna da KWS, de 23 de maio de 2001, confirmada pela sua resposta de 12 de setembro de 2003 a um pedido de informações, faz igualmente referência ao preço bruto e ao desconto concedido ao W5 (considerando 119 da decisão impugnada). Por último, na sua resposta à comunicação de acusações, a KWS, citando um dos seus empregados, chegou mesmo a indicar que «os aumentos do preço-padrão não constituíam um problema desde que os descontos acompanhassem esses aumentos» (considerando 149 da decisão impugnada).

55

Em terceiro lugar, vários elementos da decisão impugnada confirmam a participação da recorrente na concertação sobre o betume. Assim, na sua resposta à comunicação de acusações, a recorrente reconhece que «participou com outros grandes construtores rodoviários numa concertação sobre o betume, na qual estavam representados os fornecedores», no âmbito da qual «foi tratada a questão dos preços e dos descontos» (considerando 56 da decisão impugnada e ponto 105 da referida resposta). De igual modo, a decisão impugnada refere que o diretor da BNGW, que em 2000 se tornou diretor da recorrente, tinha participado no cartel em representação do grupo Ballast Nedam, baseando-se nomeadamente em dois documentos apreendidos nas inspeções efetuadas nas instalações da KWS, na resposta da empresa Nynas de 2 de outubro de 2003 a um pedido de informações, bem como num documento apreendido nas inspeções efetuadas nas instalações da BAM NBM (considerando 77 da decisão impugnada). Outros documentos mostram igualmente que a recorrente participou na reunião do cartel de 16 de fevereiro de 2001, durante a qual foram discutidos o preço do betume e os descontos (considerando 115 e nota de pé de página n.o 291 da decisão impugnada). De igual modo, alguns documentos confirmam a participação da recorrente na reunião do cartel de 29 de janeiro de 2002 (considerando 122 da decisão impugnada).

56

Estes elementos permitem concluir que os acordos celebrados entre o W5 e os fornecedores incidiam simultaneamente sobre o preço bruto e sobre o desconto especial concedido ao W5. O facto, admitindo que seja demonstrado, de terem surgido divergências e conflitos nessas negociações entre os fornecedores e o W5 não basta para demonstrar que os fornecedores tinham imposto os aumentos do preço bruto ao W5.

57

De igual modo, o facto de os fornecedores terem realizado reuniões preparatórias para discutir os preços não basta para confirmar a tese da recorrente de que os grandes construtores não intervinham na questão do nível do preço bruto ou dos descontos. Neste contexto, importa salientar que o W5 realizava igualmente reuniões antes ou depois da concertação sobre o betume, nas quais os seus membros discutiam as tabelas de preços e os descontos-padrão que os fornecedores tinham manifestado a intenção de adotar ou tinham adotado, se fosse o caso, em conjunto com o W5 (resposta da KWS de 12 de setembro de 2003 a um pedido de informações e considerando 72 da decisão impugnada).

58

No que respeita ao argumento da recorrente de que as declarações dos fornecedores não bastam para demonstrar a participação dos grandes construtores no cartel, há que recordar que, por um lado, a Comissão não era obrigada a apresentar provas provenientes diretamente dos grandes construtores se outros elementos dos autos demonstrassem suficientemente a participação deles no acordo (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 13 de dezembro de 2006, FNCBV e o./Comissão, T-217/03 e T-245/03, Colet., p. II-4987, n.o 161) e, por outro lado, resulta, em todo o caso, dos n.os 53 a 55, supra, que a Comissão se baseou igualmente em elementos de prova provenientes dos próprios grandes construtores.

59

Além disso, no que respeita ao valor dos elementos de prova utilizados pela Comissão, o Tribunal Geral recorda que o único critério de apreciação nesta matéria reside na credibilidade destes e que, para apreciar o valor probatório de um documento, é necessário verificar a verosimilhança da informação nele contida, tomando em consideração, nomeadamente, a origem do documento, as circunstâncias da sua elaboração e o seu destinatário, bem como perguntar se, em função do seu conteúdo, esse documento se afigura razoável e fidedigno (acórdão do Tribunal Geral de 15 de março de 2000, Cimenteries CBR e o./Comissão, denominado «Cimentos», T-25/95, T-26/95, T-30/95 a T-32/95, T-34/95 a T-39/95, T-42/95 a T-46/95, T-48/95, T-50/95 a T-65/95, T-68/95 a T-71/95, T-87/95, T-88/95, T-103/95 e T-104/95, Colet., p. II-491, n.o 1838).

60

Quanto às declarações de um empregado da BP, que assistiu apenas às reuniões preparatórias dos fornecedores, importa salientar que o juiz da União considera que o facto de as informações serem fornecidas em segunda mão não lhes retira o seu valor probatório (acórdão do Tribunal Geral de 10 de março de 1992, Shell/Comissão, T-11/89, Colet., p. II-757, n.o 86). De qualquer modo, resulta dos n.os 53 a 55, supra, que a Comissão utilizou outros documentos para demonstrar o envolvimento dos grandes construtores na fixação do preço bruto.

61

Quanto às declarações do empregado da KPN, prestadas em 2003, no âmbito do seu pedido no sentido de beneficiar da comunicação da Comissão relativa à imunidade em matéria de coimas e à redução do seu montante nos processos relativos a cartéis, que continham algumas afirmações que, posteriormente, esse empregado reformulou no que respeita à participação da ExxonMobil no cartel, importa salientar que se revelaram exatas quanto a vários outros aspetos. O Tribunal considera, por isso, que essas declarações podem constituir um elemento de prova do envolvimento dos grandes construtores na fixação do preço bruto, desde que sejam corroboradas por outros indícios. Ora, resulta dos n.os 53 a 55, supra, que a Comissão utilizou outros elementos de prova para o efeito.

62

Por último, importa salientar que a eventual existência de outros cartéis entre os fornecedores, admitindo que seja demonstrada, não é incompatível com a existência de um cartel bilateral entre esses fornecedores e o W5.

63

Resulta das considerações que antecedem que a primeira parte do primeiro fundamento deve ser considerada improcedente.

– Quanto aos descontos concedidos ao W5 e ao mecanismo sancionatório

64

A recorrente alega que os descontos concedidos ao W5 eram comercialmente justificados em razão das quantidades adquiridas e que a Comissão não apresentou nenhuma prova de qualquer sanção imposta aos fornecedores por terem concedido um desconto maior aos pequenos construtores.

65

Em primeiro lugar, importa analisar as quantidades adquiridas individualmente por cada membro do W5, e não a quantidade global adquirida pela totalidade dos seus membros. Resulta assim da decisão impugnada que os pequenos construtores não beneficiavam do mesmo desconto que os membros do W5, embora adquirissem, por vezes, individualmente, maiores quantidades de betume do que os membros do W5. Assim, em declarações prestadas em 12 de julho de 2002, um empregado da BP indicou que os fornecedores desrespeitavam frequentemente os acordos celebrados com o W5, concedendo um desconto maior a determinados pequenos construtores que lhes adquiriam maiores quantidades de betume. Importa realçar que, no considerando 157 da decisão impugnada, a Comissão sublinhou, além disso, que os próprios grandes construtores tinham reconhecido que, em geral, negociavam um desconto suplementar em função das quantidades adquiridas individualmente. A Comissão tinha igualmente sublinhado que, mesmo admitindo, como afirma a recorrente, que esse mecanismo foi utilizado apenas uma vez, a existência de um mecanismo sancionatório para o caso de ser concedido aos pequenos construtores um desconto superior ao previsto nos acordos constituía um indício suplementar de que o desconto concedido ao W5 não era proporcional às quantidades adquiridas.

66

Estes elementos, bem como a importância atribuída pelo W5 ao nível do seu desconto nas reuniões do cartel (v. n.o 54, supra) permitem concluir que a Comissão considerou, corretamente, que a recorrente não demonstrou que o desconto concedido ao W5 dependia das quantidades adquiridas.

67

Em segundo lugar, importa realçar que, relativamente ao mecanismo sancionatório, a Comissão baseou-se em vários elementos concordantes que dão conta de sanções financeiras individuais ou, pelo menos uma vez, coletivas aplicadas pelo W5.

68

Assim, no que respeita ao período da infração em causa, a KWS e a BP revelaram a existência de uma multa coletiva aplicada, em 2000, a todos os fornecedores, na sequência da descoberta do desconto concedido à sociedade Krekel, um pequeno construtor (considerando 84 da decisão impugnada). Na sua declaração de 9 de outubro de 2003, a KPN confirmou igualmente a existência do mecanismo sancionatório (considerando 85 da decisão impugnada). A regularização dessa multa ocorreu em 2001, sob a forma de um desconto suplementar. Assim, o grupo Ballast Nedam enviou uma fatura à Nynas com o cabeçalho «redução concedida sobre o projeto, como acordado» e a BP concedeu-lhe um desconto suplementar (considerandos 112 e 113 da decisão impugnada).

69

Na sua resposta de 16 de setembro de 2003 a um pedido de informações, a BP declarou igualmente que a KWS tinha renunciado a abastecer-se na Veba em 2002, na sequência da descoberta da concessão de um grande desconto a um pequeno construtor (considerando 86 da decisão impugnada). Na sua declaração de 12 de setembro de 2003, a KPN confirmou que, se um fornecedor concedesse a um pequeno construtor um desconto superior ao fixado, o W5 ameaçava deixar de se abastecer nesse fornecedor (considerando 86 da decisão impugnada). Por último, num documento de 4 de maio de 2001, relativo à concertação, a KWS menciona igualmente uma multa aplicada à empresa Nynas devido à sua política de preços (considerando 117 da decisão impugnada), o que foi confirmado pela KPN na sua declaração de 12 de setembro de 2003 (considerando 118 da decisão impugnada).

70

O Tribunal Geral considera que estes documentos, ainda que apenas refiram especificamente o mecanismo da multa coletiva aplicada pelo W5 aos fornecedores no que respeita ao ano 2000, mostram no entanto, no seu conjunto, que existia um mecanismo individual ou coletivo de sanções em caso de desrespeito dos acordos do cartel durante toda a sua duração, o qual podia consistir na suspensão das encomendas ao fornecedor que tivesse infringido os referidos acordos ou na aplicação de uma coima ao fornecedor incumpridor ou a todos os fornecedores.

71

Por último, o facto de cada grande construtor negociar de forma bilateral um desconto suplementar em função das quantidades adquiridas individualmente não sana a natureza anticoncorrencial dos acordos em causa. Com efeito, ainda que esses acordos fossem seguidos de negociações bilaterais relativas aos descontos individuais para cada grande construtor, tinham como consequência, por um lado, limitar as incertezas da concorrência entre os grandes construtores e, por outro, limitar a concorrência num único elemento do preço, designadamente, um eventual desconto individual suplementar.

72

Resulta das considerações que antecedem que a segunda parte do primeiro fundamento deve ser considerada improcedente.

– Quanto à falta de interesse do W5 na fixação em conjunto do preço bruto

73

A recorrente sustenta que os grandes construtores não tinham interesse na fixação em conjunto do preço bruto, contrariamente aos fornecedores, e que a Comissão apreciou de forma errada o funcionamento das cláusulas de resolução dos riscos.

74

A título preliminar, importa recordar, em conformidade com o n.o 45, supra, que não é necessário verificar se a empresa acusada tinha um interesse comercial nos referidos acordos se a Comissão tiver conseguido reunir provas documentais da infração alegada e se essas provas forem suficientes para demonstrar a existência de um acordo de natureza anticoncorrencial (acórdão Sumitomo Metal Industries e Nippon Steel/Comissão, referido no n.o 45, supra, n.o 46). No caso em apreço, resulta da análise efetuada pelo Tribunal Geral (v. n.os 47 a 63, supra) que a Comissão fez prova bastante do envolvimento da recorrente na infração em causa. É portanto apenas a título subsidiário que o Tribunal analisa a questão da apreciação errada do interesse do W5 nos acordos.

75

No caso em apreço, a Comissão considerou que os fornecedores e o W5 tinham um interesse comum na existência de acordos sobre o preço bruto e sobre os descontos. A este respeito, importa recordar que o juiz da União já considerou que os participantes de um mesmo cartel podiam ter interesses económicos complementares (acórdão FNCBV e o./Comissão, referido no n.o 58, supra, n.o 322).

76

Consequentemente, importa analisar o funcionamento do CROW (Centro para a regulação e a investigação em matéria de engenharia civil e de tráfego), organismo sem fins lucrativos que estava incumbido, nomeadamente, de publicar mensalmente os preços do betume rodoviário desde os anos 70, a partir dos elementos dos autos (considerandos 25 e 26 da decisão impugnada).

77

A publicação do preço do betume rodoviário pelo CROW efetuava-se, até 1 de novembro de 1995, após consulta dos produtores de asfalto. Após essa data, o cálculo passou a ser efetuado pelo CBS (serviço central da estatística), organismo governamental, a partir de um estudo de mercado que abrangia diversas centrais de revestimento, ou seja, antes da aplicação de um eventual desconto aos construtores, e esse índice de preços, publicado pelo CROW (a seguir «índice CROW»), servia de referência para os contratos de construção rodoviária a longo prazo que incluíssem uma cláusula de resolução dos riscos. Com efeito, resulta dos autos que, no âmbito desses contratos, em caso de agravamento do índice CROW para além de um determinado limite (1000 florins neerlandeses), as entidades adjudicantes eram obrigadas a indemnizar os construtores. Inversamente, em caso de diminuição do índice CROW abaixo de um determinado limite, os construtores tinham de indemnizar as entidades adjudicantes. Os construtores não eram, portanto, prejudicados com os aumentos dos preços quando estes aumentavam simultaneamente, agravando assim o índice CROW. Em contrapartida, os construtores não tinham interesse numa baixa de preços, que, se implicasse uma diminuição do índice CROW, os obrigaria a reembolsar quem com eles contratara o diferencial de preços.

78

Por outro lado, a recorrente procura minimizar a importância do índice CROW, sustentando que esse índice dizia respeito apenas aos grandes projetos, que representavam apenas uma pequena parte da sua carteira de clientes, e que, por conseguinte, dava mais importância à estabilidade dos preços, que beneficiava os projetos mais pequenos. Sem que seja necessário determinar o número de projetos abrangidos pela referida cláusula, o Tribunal Geral realça que, na decisão impugnada, a Comissão refere um documento relativo ao período da infração, do qual decorre que essa questão foi discutida nas reuniões do cartel [considerando 115 (notas da HBG de 16 de fevereiro de 2001) da decisão impugnada], o que permite considerá-la um elemento das negociações.

79

Resulta do exposto que os fornecedores e o W5 tinham um interesse comum na existência de acordos sobre o preço bruto e sobre os descontos e que o interesse dos grandes construtores se explica tanto pelo mecanismo das cláusulas de resolução dos riscos nos contratos públicos como pelo desconto especial de que beneficiavam e que lhes conferia uma vantagem concorrencial em relação aos pequenos construtores na adjudicação dos contratos públicos.

80

Resulta do exposto que a terceira parte do primeiro fundamento deve ser considerada improcedente.

– Quanto à recusa da Comissão em aplicar o disposto nas orientações sobre os acordos de cooperação horizontal

81

A recorrente acusa a Comissão de se ter recusado a aplicar as orientações sobre os acordos de cooperação horizontal.

82

A título preliminar, o Tribunal recorda que resulta de jurisprudência constante que compete às empresas que solicitam o benefício de uma isenção ao abrigo do artigo 81.o, n.o 3, CE demonstrar, com base em provas documentais, que essa isenção se justifica. Nessa perspetiva, não se pode acusar a Comissão de não ter proposto outras soluções nem de não ter indicado o que considerava justificar a concessão de uma isenção (acórdão de Tribunal de Justiça de 17 de janeiro de 1984, VBVB e VBBB/Comissão, 43/82 e 63/82, Colet., p. 19, n.o 52). Compete unicamente à Comissão, a título da sua obrigação de fundamentação, mencionar os elementos de facto e de direito e as considerações que a levaram a tomar uma decisão que indefere o pedido de isenção, sem que a recorrente possa exigir-lhe que discuta todas as questões de facto e de direito que suscitou no decurso do procedimento administrativo (acórdão do Tribunal Geral de 21 de fevereiro de 1995, SPO e o./Comissão, T-29/92, Colet., p. II-289, n.os 262 e 263). Conclui-se portanto que cabe à recorrente demonstrar que a Comissão cometeu um erro de direito ou de facto ao recusar conceder-lhe uma isenção ao abrigo do artigo 81.o, n.o 3, CE.

83

No caso em apreço, a Comissão expôs, nos considerandos 162 a 168 da decisão impugnada, as razões pelas quais considerava que a participação do W5 nos acordos não constituía compras coletivas, na aceção das orientações sobre os acordos de cooperação horizontal. Assim, a Comissão recorda, no considerando 163 da decisão impugnada, que essas disposições não visam autorizar genericamente os acordos de cooperação horizontal, antes expõem os princípios que permitem a sua apreciação à luz das disposições do artigo 81.o CE, uma vez que esses acordos podem gerar problemas de concorrência. No caso em apreço, a Comissão especifica, no considerando 165 da decisão impugnada, que os acordos em causa tinham por objetivo restringir a concorrência e tinham repercussões para empresas não participantes (fixação dos preços para todos os construtores dos Países Baixos e determinação dos limites máximos de desconto para os pequenos construtores). Além disso, e de qualquer modo, como foi corretamente referido pela Comissão no considerando 166 da decisão impugnada, o W5 não procedeu a aquisições no âmbito dessas negociações com os fornecedores, as quais se destinavam apenas a fixar preços e descontos, comportamento que o ponto 124 das orientações sobre os acordos de cooperação horizontal qualifica de acordo dissimulado. Além disso, importa salientar que o W5 celebrou esses acordos com um grupo de vendedores que também tinha um comportamento colusório e que não o referiu às autoridades competentes. Por último, as disposições do artigo 81.o, n.o 3, CE não são, de qualquer modo, aplicáveis, uma vez que, de acordo com o ponto 133 das orientações sobre os acordos de cooperação horizontal, os acordos de compra não podem ser isentos se impuserem restrições não indispensáveis à realização dos benefícios económicos conferidos pelos acordos. Com efeito, no caso em apreço, os acordos em causa impunham restrições aos pequenos construtores sob a forma de descontos limitados, restrições essas que visavam terceiros e que não eram indispensáveis à realização das vantagens económicas pretendidas.

84

A recorrente acusa a Comissão de não ter procedido, como previam as orientações sobre os acordos de cooperação horizontal, a uma análise do poder de mercado dos membros do W5 para determinar se os acordos em causa podiam efetivamente restringir a concorrência. No entanto, importa salientar que, nos termos do disposto no ponto 18 das referidas orientações, não é necessário apreciar os efeitos reais sobre a concorrência e o mercado dos acordos que têm por objetivo restringir a concorrência através da fixação de preços, da limitação da produção ou da partilha dos mercados ou dos clientes, já que se presume que esses acordos produzem efeitos negativos no mercado. Como a Comissão considerou que os acordos em causa visavam, por natureza, restringir a concorrência (considerando 165 da decisão impugnada), não lhe cabia proceder a uma análise aprofundada do poder de mercado dos membros do W5.

85

Por conseguinte, a quarta parte do primeiro fundamento deve ser considerada improcedente.

– Quanto à inexistência de objetivo de restrição da concorrência

86

A recorrente acusa a Comissão de não ter verificado se os comportamentos alegados tinham por objetivo ou efeito restringir a concorrência, de não ter investigado se houve limitação da concorrência e de não ter verificado, em conformidade com a jurisprudência decorrente do acórdão GlaxoSmithKline Services/Comissão, referido no n.o 42, supra, se os consumidores finais ficaram privados das vantagens da concorrência.

87

Há que recordar que, para ser abrangido pela proibição enunciada no artigo 81.o, n.o 1, CE, um acordo deve ter «por objetivo ou efeito impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum». De acordo com jurisprudência constante, o caráter alternativo deste requisito, indicado pela conjunção «ou», torna necessário analisar, antes de mais, o próprio objetivo do acordo, tendo em conta o contexto económico no qual se integra. Contudo, se a análise das cláusulas deste acordo não revelar um grau suficiente de nocividade em relação à concorrência, há que analisar então os efeitos do acordo e, para que o mesmo possa ser objeto da proibição, exigir a reunião dos fatores que determinam que a concorrência foi de facto impedida, restringida ou falseada de forma apreciável (acórdão do Tribunal de Justiça de 20 de novembro de 2008, Beef Industry Development Society e Barry Brothers, C-209/07, Colet., p. I-8637, n.o 15, e acórdão do Tribunal Geral de 9 de julho de 2009, Peugeot e Peugeot Nederland/Comissão, T-450/05, Colet., p. II-2533, n.o 43). Para determinar se um acordo é proibido pelo artigo 81.o, n.o 1, CE, a apreciação dos seus efeitos concretos é, por conseguinte, supérflua quando se verifique que o acordo tem por objetivo impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum (acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de setembro de 2006, Nederlandse Federatieve Vereniging voor de Groothandel op Elektrotechnisch Gebied/Comissão, C-105/04 P, Colet., p. I-8725, n.o 125). Esta análise deve ser efetuada à luz do conteúdo do acordo e do contexto económico em que se inscreve (acórdãos do Tribunal de Justiça de 6 de abril de 2006, General Motors/Comissão, C-551/03 P, Colet., p. I-3173, n.o 66, e Beef Industry Development Society e Barry Brothers, já referido, n.o 16). Por último, este método de análise é de aplicação geral e não está reservado a uma categoria de acordos [acórdão do Tribunal Geral de 2 de maio de 2006, O2 (Germany)/Comissão, T-328/03, Colet., p. II-1231, n.o 67].

88

A recorrente não pode invocar o acórdão GlaxoSmithKline Services/Comissão, referido no n.o 42, supra (n.o 121), uma vez que, de acordo com o Tribunal de Justiça, «o artigo 81.o CE visa, a exemplo de outras regras de concorrência enunciadas no Tratado, proteger não apenas os interesses dos concorrentes ou dos consumidores, mas a estrutura do mercado e, deste modo, a concorrência em si mesma» e que, «por isso, a declaração da existência de objetivo anticoncorrencial de um acordo não pode ficar subordinada a que os consumidores finais fiquem privados das vantagens de uma concorrência eficaz em termos de aprovisionamento ou de preços» (acórdão de Tribunal de Justiça do 6 de outubro de 2009, GlaxoSmithKline Services e o./Comissão e o., C-501/06 P, C-513/06 P, C-515/06 P e C-519/06 P, Colet., p. I-9291, n.os 62 a 64).

89

Trata-se portanto de determinar, no caso em apreço, se os acordos em causa tinham um objetivo anticoncorrencial, como a Comissão considerou na decisão impugnada (considerandos 155 a 161).

90

O artigo 81.o, n.o 1, CE refere expressamente como acordo proibido o facto de «fixar, de forma direta ou indireta, os preços de compra ou de venda, ou quaisquer outras condições de transação» e de «aplicar, relativamente a parceiros comerciais, condições desiguais no caso de prestações equivalentes, colocando-os, por esse facto, em desvantagem na concorrência». Ora, no caso em apreço, resulta das considerações que antecedem, nomeadamente dos n.os 51 a 56, supra, que os acordos tinham por objetivo, por um lado, fixar os preços de compra e de venda do betume e, por outro, conceder um desconto preferencial aos membros do W5. A própria natureza desses acordos basta, assim, para considerar que tinham por objetivo impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum.

91

Resulta do exposto que a quinta parte e, consequentemente, o primeiro fundamento na sua totalidade devem ser considerados improcedentes.

Quanto ao segundo fundamento, relativo à determinação errada do montante de base da coima

Argumentos das partes

92

A recorrente considera que, no cálculo do montante de base da coima, em conformidade com o artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1/2003, a Comissão devia ter tomado em consideração a gravidade da infração tendo em conta a sua natureza e o seu impacto real no mercado.

93

Assim, a Comissão devia ter apreciado de forma diferente o comportamento dos grandes construtores e o dos fornecedores. De facto, a negociação coletiva, pelos grandes construtores, das suas condições de compra não deve ser comparada com a fixação do preço bruto pelos fornecedores. A Comissão devia igualmente ter tomado em consideração a situação de dependência dos grandes construtores em relação aos fornecedores, a inexistência de acordos secretos por parte dos grandes construtores, o facto de o desconto padrão representar apenas um desconto mínimo complementado por negociações individuais, bem como o facto de não ter ficado provada a existência de qualquer prejuízo para os pequenos construtores.

94

No que respeita à apreciação do impacto do cartel no mercado, a Comissão contentou-se em presumir que o acordo não podia deixar de ter impacto no mercado neerlandês, sem contudo aferir o seu impacto real. A Comissão tomou unicamente em consideração o facto de o preço do betume rodoviário nos Países Baixos ser superior ao praticado nos países vizinhos. Além disso, a Comissão interpretou, erradamente, as ações individuais de um grande construtor como um mecanismo sancionatório coletivo dos grandes construtores em relação aos fornecedores. Por último, o betume representava apenas uma pequena percentagem do custo total de uma construção e a vantagem relativa obtida era insignificante.

95

A recorrente considera que a Comissão não pode eximir-se da sua obrigação de analisar o impacto real dos pretensos acordos baseando-se unicamente na sua colocação em prática, uma vez que a jurisprudência invocada a este respeito (acórdão do Tribunal Geral de 14 de dezembro de 2006, Raiffeisen Zentralbank Österreich e o./Comissão, T-259/02 a T-264/02 e T-271/02, Colet., p. II-5169) é aplicável apenas aos cartéis horizontais clássicos em matéria de preços e não a uma concertação entre fornecedores e compradores sobre as condições de compra.

96

A recorrente conclui que a infração alegada pode ser qualificada, quando muito, de infração pouco grave e que o montante de base de três milhões de euros para o cálculo do montante da coima, que é, em todo o caso, desproporcionado tendo em conta o preço de compra do betume, devia ser reduzido para um milhão de euros.

97

A Comissão refuta todos os argumentos da recorrente.

Apreciação do Tribunal

– Quanto à qualificação de infração muito grave

98

Nos termos do disposto no ponto 1 das orientações de 1998, o montante de base da coima é determinado em função da gravidade e da duração da infração, sendo que a avaliação do grau de gravidade da infração deve ter em consideração a natureza da própria infração, o seu impacto concreto no mercado quando este seja quantificável e a dimensão do mercado geográfico de referência. As orientações de 1998 operam, assim, uma distinção entre as infrações pouco graves (restrições, frequentemente de caráter vertical, destinadas a limitar o comércio, mas cujo impacto no mercado é limitado), as infrações graves (restrições horizontais ou verticais cuja aplicação é mais rigorosa, sendo o seu impacto no mercado mais amplo) e as infrações muito graves (restrições horizontais do tipo «cartel de preços» e quotas de repartição dos mercados, ou outras práticas que afetam o bom funcionamento do mercado interno).

99

Em conformidade com jurisprudência assente, a gravidade de uma infração é determinada tendo em conta vários elementos, tais como as circunstâncias específicas do processo, o seu contexto e o caráter dissuasivo das coimas, relativamente aos quais a Comissão dispõe de um amplo poder de apreciação (acórdãos de Tribunal de Justiça de 28 de junho de 2005, Dansk Rørindustri e o./Comissão, C-189/02 P, C-202/02 P, C-205/02 P a C-208/02 P e C-213/02 P, Colet., p. I-5425, n.o 241, e de 10 de maio de 2007, SGL Carbon/Comissão, C-328/05 P, Colet., p. I-3921, n.o 43; acórdão do Tribunal Geral de 8 de outubro de 2008, Schunk e Schunk Kohlenstoff-Technik/Comissão, T-69/04, Colet., p. II-2567, n.o 153). Por outro lado, é jurisprudência constante que, na determinação do montante das coimas, há que tomar em consideração todos os elementos suscetíveis de entrar na apreciação da gravidade das infrações, tais como, nomeadamente, o papel desempenhado por cada uma das partes na infração e o risco que infrações deste tipo representam para os objetivos da Comunidade (acórdão Musique Diffusion française e o./Comissão, referido no n.o 22, supra, n.os 120 e 129, e acórdão do Tribunal Geral de 27 de julho de 2005, Brasserie nationale e o./Comissão, T-49/02 a T-51/02, Colet., p. II-3033, n.os 168 a 183). Quando uma infração tenha sido cometida por diversas empresas, há que apreciar a gravidade relativa da participação de cada uma delas (acórdãos do Tribunal de Justiça de 8 de julho de 1999, Hercules Chemicals/Comissão, C-51/92 P, Colet., p. I-4235, n.o 110, e Montecatini/Comissão, C-235/92 P, Colet., p. I-4539, n.o 207).

100

O juiz da União reconheceu igualmente a qualificação de infração muito grave, devido à sua própria natureza, em relação aos cartéis horizontais em matéria de preços e aos acordos que visam designadamente a repartição das clientelas ou a compartimentação do mercado comum (acórdãos do Tribunal Geral de 6 de abril de 1995, Tréfilunion/Comissão, T-148/89, Colet., p. II-1063, n.o 109; de 25 de outubro de 2005, Grupo Danone/Comissão, T-38/02, Colet., p. II-4407, n.o 147, e de 8 de julho de 2008, BPB/Comissão, T-53/03, Colet., p. II-1333, n.o 279). Assim, esses acordos são suficientes para qualificar a infração de muito grave, seja qual for a sua dimensão geográfica ou o seu impacto no mercado (acórdão Brasserie nationale e o./Comissão, referido no n.o 99, supra, n.o 178). Em contrapartida, um cartel horizontal que cubra todo o território de um Estado-Membro e que tenha por objetivo a partilha do mercado e a compartimentação do mercado comum não pode ser qualificado de pouco grave, na aceção das orientações de 1998 (acórdão Brasserie nationale e o./Comissão, referido no n.o 99, supra, n.o 181).

101

No caso em apreço, a Comissão entendeu, nos considerandos 312 a 317 da decisão impugnada, que a recorrente tinha cometido uma infração muito grave ao artigo 81.o, n.o 1, CE. Sublinhou que uma infração que consistia em fixar, direta ou indiretamente, os preços de venda e de compra e em aplicar, a parceiros comerciais, condições desiguais a prestações equivalentes, impondo-lhes assim uma desvantagem concorrencial, fazia parte das infrações mais graves devido à sua própria natureza. Além disso, indicou que os dois grupos envolvidos na infração deviam estar conscientes da natureza ilícita do cartel, já que os membros do W5 impuseram deliberadamente uma desvantagem concorrencial aos pequenos construtores. O caráter secreto dos acordos celebrados pelo cartel constituía, a este respeito, uma prova adicional da sua natureza ilícita.

102

Resulta dos n.os 52 a 54 e 64 a 66, supra, que os acordos em causa tinham, de facto, por objetivo fixar, direta ou indiretamente, os preços de venda e de compra e aplicar, a parceiros comerciais, condições desiguais a prestações equivalentes, impondo-lhes assim uma desvantagem concorrencial. Ora, os mecanismos assim descritos pela Comissão fazem parte das formas mais graves de infração à concorrência.

103

Para contestar a qualificação de infração muito grave efetuada pela Comissão, a recorrente sustenta que a Comissão devia ter apreciado de forma diferente o comportamento dos fornecedores e dos grandes construtores. Como já foi referido anteriormente (v. n.o 46, supra), importa no entanto tomar em consideração os acordos celebrados entre o W5 e os fornecedores de forma global, uma vez que estes dizem respeito ao preço bruto, ao desconto mínimo concedido ao W5 e ao desconto máximo aplicável aos pequenos construtores. Assim, as circunstâncias evocadas pela recorrente no caso em apreço não são de molde a pôr em causa a validade da apreciação que a Comissão fez da gravidade da infração. Daqui resulta que não pode ser validamente contestada a conclusão da Comissão de que os acordos e as concertações em causa constituíam, pela sua própria natureza, uma infração muito grave.

104

Além disso, a recorrente não pode alegar uma dependência dos grandes construtores em relação aos fornecedores. Com efeito, mesmo admitindo que tal facto seja demonstrado, o juiz da União considera que uma empresa não pode alegar que participou no cartel sob coação dos outros participantes, uma vez que podia denunciar as pressões de que fosse alvo às autoridades competentes e apresentar à Comissão uma denúncia nos termos do artigo 7.o do Regulamento n.o 1/2003, em vez de participar nas atividades em questão (v., neste sentido, acórdão Dansk Rørindustri e o./Comissão, referido no n.o 99, supra, n.os 367 a 370).

105

Importa, por outro lado, em conformidade com o n.o 71, supra, julgar improcedentes os argumentos da recorrente de que, por um lado, os descontos concedidos ao W5 eram justificados pelas quantidades adquiridas e que, por outro, a concorrência entre os construtores não era, na verdade, restringida porque os descontos-padrão eram apenas descontos mínimos, complementados por descontos individuais.

106

Por último, a recorrente contesta o caráter secreto dos acordos em causa no que diz respeito ao W5. Resulta no entanto da decisão impugnada que o W5 não enviava convites escritos para as reuniões do cartel e não estabelecia qualquer registo destas, e que a KWS desejava que as reuniões tivessem lugar antes da chegada do pessoal (considerandos 59, 73 e 76). Ora, é jurisprudência constante que, para determinar a gravidade da infração, a Comissão pode legitimamente ter em conta o facto de as empresas terem tomado muitas precauções para evitar que o cartel fosse descoberto (acórdão Schunk e Schunk Kohlenstoff-Technik/Comissão, referido no n.o 99, supra, n.o 154). De qualquer modo, a redação do considerando 313 da decisão impugnada revela que os elementos aí mencionados o foram a título subsidiário relativamente aos relatados no considerando 312 da decisão impugnada. Nestas condições, mesmo admitindo que a contestação, pela recorrente, da tomada em consideração do caráter secreto do cartel pudesse ser julgada procedente, esse facto não pode levar a pôr em causa a apreciação da Comissão relativa à natureza da infração, tal como resulta da fundamentação relevante e bastante que consta do considerando 312 da decisão impugnada (v., neste sentido, acórdão Schunk e Schunk Kohlenstoff-Technik/Comissão, referido no n.o 99, supra, n.o 157).

107

Resulta do exposto que, por um lado, a Comissão não cometeu qualquer erro de apreciação na qualificação da natureza da infração cometida pela recorrente e, por outro lado, o Tribunal Geral entende ser adequado considerar essa infração de particular gravidade. Não há portanto motivo para alterar o montante de base como a recorrente solicitou.

108

Por conseguinte, há que negar provimento à primeira parte do segundo fundamento.

– Quanto à apreciação errada do impacto do cartel no mercado

109

A recorrente acusa a Comissão de não ter avaliado o impacto do cartel no mercado quando fixou o montante de base da coima.

110

No considerando 314 da decisão impugnada, a Comissão refere que a determinação da gravidade da infração e do montante da coima não depende do impacto do cartel no mercado. Especifica que não é possível medir o impacto concreto do cartel devido à falta de informações sobre qual seria a evolução do preço do betume caso não houvesse acordos, mas que pode recorrer a estimativas da probabilidade dos efeitos do cartel. Para o efeito, salientou que os acordos celebrados foram efetivamente postos em prática, incluindo a aplicação de um desconto preferencial apenas aos membros do W5 e do mecanismo de sanções em caso de desrespeito dos acordos, criando assim condições de mercado artificiais. Além disso, referiu que o nível do preço bruto nos Países Baixos era superior ao que estava em vigor nos países vizinhos e que o desconto específico concedido ao W5 podia desempenhar um papel determinante na obtenção de contratos públicos.

111

Tal como foi recordado no n.o 98, supra, o ponto 1 das orientações de 1998 refere que a avaliação do grau de gravidade da infração deve ter em consideração o caráter da própria infração, o seu impacto concreto no mercado quando este seja quantificável e a dimensão do mercado geográfico de referência.

112

É jurisprudência constante que a Comissão não era obrigada a demonstrar o impacto concreto da infração no mercado, uma vez que a questão de saber em que medida a restrição da concorrência conduziu a um preço de mercado superior ao que se verificaria caso não existisse um cartel não é um critério determinante para a fixação do nível das coimas (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de novembro de 2000, Stora Kopparbergs Bergslags/Comissão, C-286/98 P, Colet., p. I-9925, n.os 68 a 77, e acórdão do Tribunal Geral de 19 de maio de 2010, KME Germany e o./Comissão, T-25/05, ainda não publicado na Coletânea, n.o 82).

113

Assim, o Tribunal de Justiça recordou que resultava das orientações de 1998 que o caráter da própria infração podia bastar para qualificá-la de «muito grave», independentemente do seu impacto concreto no mercado e da sua dimensão geográfica (v. n.o 100, supra, e acórdão do Tribunal de Justiça de 24 de setembro de 2009, Erste Group Bank e o./Comissão, C-125/07 P, C-133/07 P, C-135/07 P e C-137/07 P, Colet., p. I-8681, n.o 103). Esta conclusão é corroborada pelo facto de, apesar de a descrição das infrações «graves» mencionar expressamente o impacto no mercado e os efeitos em amplas zonas do mercado comum, a das infrações «muito graves», em contrapartida, não menciona nenhuma exigência relativamente ao impacto concreto no mercado nem aos efeitos numa zona geográfica particular (acórdãos Grupo Danone/Comissão, referido no n.o 100, supra, n.o 150, e KME Germany e o./Comissão, referido no n.o 112, supra, n.o 83). O Tribunal de Justiça recordou igualmente que resultava do ponto 1 A, primeiro parágrafo, das orientações de 1998, que esse impacto devia ser tomado em consideração apenas quando fosse quantificável (acórdãos de Tribunal de Justiça de 9 de julho de 2009, Archer Daniels Midland/Comissão, C-511/06 P, Colet., p. I-5843, n.o 125, e de 3 de setembro de 2009, Prym e Prym Consumer/Comissão, C-534/07 P, Colet., p. I-7415, n.o 74).

114

A este respeito, há que julgar improcedente o argumento da recorrente de que esta jurisprudência é aplicável apenas aos cartéis horizontais em matéria de preços e não a uma «concertação entre fornecedores e compradores sobre as condições de compra». Com efeito, resulta dos n.os 81 a 84 e 102, supra, que os acordos em causa tinham por objetivo, por um lado, fixar os preços de compra e de venda do betume e, por outro lado, conceder descontos preferenciais aos membros do cartel, e que, por conseguinte, a própria natureza desses acordos basta para considerar que tinham por objetivo impedir, restringir ou falsear a concorrência no mercado comum.

115

No caso em apreço, dada a natureza da infração em causa e o facto de a Comissão ter especificado, na decisão impugnada, que o impacto concreto da infração não era quantificável (considerandos 314 e 316), resulta da jurisprudência referida que a Comissão não era obrigada a proceder a uma apreciação desse impacto concreto no mercado para qualificar a infração de muito grave.

116

Além disso, tendo a Comissão referido claramente, na decisão impugnada, que o impacto concreto da infração não era tido em conta na determinação da gravidade da infração e do montante da coima, não pode ser censurada por ter especificado, no considerando relativo ao impacto concreto do cartel no mercado, que os acordos em causa tinham sido postos em prática. Por conseguinte, não será necessário verificar se os outros indícios que apresentou eram suficientes para demonstrar a influência efetiva que a infração teve na concorrência no referido mercado.

117

Por conseguinte, há que considerar improcedente a segunda parte do segundo fundamento.

– Quanto ao caráter desproporcionado do montante de base da coima

118

A recorrente alega que o montante de base de três milhões de euros para o cálculo da coima é desproporcionado, tendo em conta o preço de compra do betume.

119

Nos termos do disposto no ponto 1 A, sexto parágrafo, das orientações de 1998, no caso de infrações em que participem várias empresas, poderá ser conveniente ponderar, em certos casos, os montantes de base determinados dentro de cada categoria de infrações «a fim de ter em conta o peso específico e, portanto, o impacto real do comportamento ilícito de cada empresa na concorrência, nomeadamente se existir uma disparidade considerável em termos de dimensão das empresas que cometeram uma infração da mesma natureza». O sétimo parágrafo especifica, assim, que «o princípio da igualdade da sanção para um mesmo comportamento pode implicar, quando as circunstâncias o exijam, a aplicação de montantes diferenciados às empresas em causa sem que esta diferenciação se baseie num cálculo aritmético».

120

A Comissão referiu, nos considerandos 318 a 322 da decisão impugnada, que, para ter em conta a importância específica do comportamento ilícito de cada empresa envolvida no cartel e o seu impacto real na concorrência, distinguiu as empresas envolvidas em função da sua importância relativa no mercado em causa, medida pelas suas quotas de mercado calculadas com base no valor das vendas ou das compras de betume rodoviário nos Países Baixos em 2001, último ano completo da infração. Assim, classificou as empresas em seis categorias e colocou a recorrente na sexta categoria, que agrupa as empresas com quotas de mercado entre 3,9% e 4,2%, obtendo um montante de base de três milhões de euros para a recorrente. Por outro lado, no considerando 317 da decisão impugnada, referiu que, ainda que as infrações muito graves pudessem ser objeto de coimas superiores a 20 milhões de euros, tinha fixado esse montante em apenas 15 milhões de euros, pois a infração estava limitada ao betume rodoviário vendido num único Estado-Membro, o valor do mercado era relativamente baixo, designadamente, de 62 milhões de euros em 2001, e o número de participantes era elevado.

121

A jurisprudência especifica que a Comissão dispõe, no quadro do Regulamento n.o 1/2003, de uma margem de apreciação na fixação do montante das coimas, a fim de orientar o comportamento das empresas no sentido do respeito das regras de concorrência, e que incumbe ao Tribunal Geral verificar se o montante da coima aplicada é proporcionado em relação à gravidade e à duração da infração e ponderar a gravidade da infração e as circunstâncias invocadas pela recorrente (acórdão do Tribunal Geral de 21 de outubro de 2003, General Motors Nederland e Opel Nederland/Comissão, T-368/00, Colet., p. II-4491, n.o 189).

122

O juiz da União especificou também que, embora não prevejam que o montante das coimas seja calculado em função do volume de negócios global ou do volume de negócios pertinente, as orientações de 1998 não se opõem a que esses volumes de negócios sejam tomados em consideração na determinação do montante da coima, a fim de respeitar os princípios gerais do direito da União e quando as circunstâncias o exijam, e que a Comissão pode assim repartir as empresas em causa por várias categorias, baseando-se no volume de negócios realizado por cada empresa com os produtos em causa no processo (acórdão Schunk e Schunk Kohlenstoff-Technik/Comissão, referido no n.o 99, supra, n.os 176 e 177).

123

Este método que consiste em repartir os membros de um cartel por categorias para efeitos da realização de uma diferenciação na fase da fixação dos montantes de base das coimas, cujo princípio foi aprovado pela jurisprudência, embora acabe por ignorar as diferenças de dimensão entre empresas de uma mesma categoria, conduz a um nivelamento do montante de base fixado às empresas que pertençam a uma mesma categoria. Assim, a Comissão pode designadamente repartir as empresas em causa por várias categorias, procedendo, por exemplo, com recurso a parcelas de 5% ou de 10% de quotas de mercado. O juiz da União salienta no entanto que tal repartição deve respeitar o princípio da igualdade de tratamento e que o montante das coimas deve, pelo menos, ser proporcionado em relação aos elementos tidos em conta na apreciação da gravidade da infração, devendo o juiz da União limitar-se a fiscalizar se essa repartição é coerente e objetivamente justificada (acórdãos do Tribunal Geral de 8 de outubro de 2008, SGL Carbon/Comissão, T-68/04, Colet., p. II-2511, n.os 62 a 70, e de 30 de setembro de 2009, Hoechst/Comissão, T-161/05, Colet., n.os 123 e 124).

124

O Tribunal de Justiça especificou no entanto que a Comissão não é obrigada, na determinação do montante das coimas em função da gravidade e da duração da infração em questão, como é recordado no ponto 1 A, sexto parágrafo, das orientações de 1998, a efetuar o cálculo da coima a partir de montantes baseados no volume de negócios das empresas envolvidas. É certo que a Comissão pode ter em conta o volume de negócios da empresa em causa, mas não deve ser atribuída uma importância desproporcionada a esse volume em relação aos outros elementos de apreciação. Por conseguinte, a Comissão conserva uma certa margem de apreciação em relação à oportunidade de efetuar uma ponderação das coimas em função da dimensão de cada empresa. Assim, não é obrigada, na determinação do montante das coimas, a assegurar-se, no caso de serem aplicadas coimas a várias empresas envolvidas numa mesma infração, de que os montantes finais das coimas traduzem uma diferenciação entre as empresas em causa no que respeita ao seu volume de negócios global (acórdão do Tribunal de Justiça de 25 de janeiro de 2007, Dalmine/Comissão, C-407/04 P, Colet., p. I-829, n.os 141 a 144) ou ao seu volume de negócios no mercado do produto em causa (acórdão do Tribunal Geral de 29 de novembro de 2005, Union Pigments/Comissão, T-62/02, Colet., p. II-5057, n.o 159).

125

O Tribunal Geral considerou igualmente que o facto de o método de cálculo exposto nas orientações de 1998 não se basear no volume de negócios global das empresas envolvidas e permitir, por essa razão, que surjam disparidades entre as empresas no que diz respeito à relação entre o respetivo volume de negócios e o montante das coimas que lhes são aplicadas, não era relevante para se determinar se a Comissão tinha violado os princípios da proporcionalidade e da igualdade de tratamento, bem como da individualidade das penas (acórdão do Tribunal Geral de 6 de maio de 2009, Wieland-Werke/Comissão, T-116/04, Colet., p. II-1087, n.os 86 e 87).

126

Resulta das considerações que antecedem que a Comissão não estava obrigada a tomar em consideração o facto, admitindo que seja demonstrado, de os custos de aquisição do betume da recorrente terem sido de apenas 2,6 milhões de euros em 2001.

127

Além disso, tendo em conta as considerações que antecedem, nomeadamente a gravidade da infração e o objetivo de dissuasão da sanção, o Tribunal Geral considera que a fixação do montante de base da coima em três milhões de euros não é desproporcionada.

128

Por conseguinte, há que julgar improcedente a terceira parte e, portanto, o segundo fundamento na sua totalidade.

Quanto ao terceiro fundamento, relativo aos erros de direito e aos erros manifestos de apreciação na imputação à recorrente da responsabilidade pela infração cometida pela BNGW

Argumentos das partes

129

A recorrente considera que a Comissão, ao imputar-lhe o comportamento da BNGW com base unicamente no facto de a recorrente deter 100% do capital desta, cometeu um erro de direito, desrespeitou a jurisprudência e violou a presunção de inocência. Por outro lado, a recorrente afirma que não exerceu uma influência determinante no comportamento comercial da sua filial, sendo apenas detentora passiva do capital desta.

130

A Comissão refuta todos os argumentos da recorrente.

Apreciação do Tribunal Geral

131

Atendendo à resposta dada ao quarto fundamento, que tem como consequência a anulação do artigo 1.o, alínea a), da decisão impugnada na parte que diz respeito à imputação do comportamento da BNGW à recorrente no período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 30 de setembro de 2000, não há que analisar o terceiro fundamento.

Quanto ao montante da coima

Argumentos das partes

132

A recorrente sustenta que, caso a decisão impugnada venha a ser parcialmente anulada na parte respeitante ao período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 30 de setembro de 2000, a sua coima deve ser reduzida proporcionalmente para 1213650 euros.

133

Na audiência, a recorrente referiu, além disso, que uma vez que o Regulamento n.o 1/2003 atribui a mesma importância à gravidade e à duração da infração, a coima fixada devia refletir a duração da infração de forma proporcional, como previsto nas orientações para o cálculo das coimas aplicadas por força do n.o 2, alínea a), do artigo 23.o do Regulamento (CE) n.o 1/2003 (JO 2006, C 210, p. 2, a seguir «orientações de 2006»). Sublinhou que, em todo o caso, a Comissão devia respeitar o limite de 10% de aumento por ano previsto nas orientações de 1998.

134

A Comissão considera que, caso o Tribunal Geral acolha o quarto fundamento na medida em que diz respeito ao período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 30 de setembro de 2000, o montante inicial da coima deve ser de 3,45 milhões de euros, mantendo-se o montante de base de três milhões de euros e reduzindo-se a majoração relativa à duração da infração de 55% para 15%. De qualquer modo, a Ballast Nedam é responsável relativamente a todo o período da infração.

135

A Comissão considera, por outro lado, que os fundamentos suscitados pela recorrente na audiência, relativos ao desrespeito do limite de 10% de aumento por ano previsto nas orientações de 1998 e à necessidade de fixar uma coima estritamente proporcional à duração da infração constituem fundamentos novos e, portanto, inadmissíveis. Especifica, além disso, que a aplicação, pelo Tribunal Geral, das orientações de 2006 é contrária ao princípio da igualdade entre os participantes no cartel e que, de qualquer modo, importa tomar em consideração o facto de a recorrente ter retomado toda a atividade de construção do grupo.

Apreciação do Tribunal Geral

136

Resulta dos n.os 21 a 36, supra, que a recorrente não teve possibilidade de assegurar utilmente a sua defesa durante o procedimento administrativo no que diz respeito à sua participação na infração na qualidade de sociedade-mãe a 100% da BNGW e que, por conseguinte, o Tribunal Geral anulou o artigo 1.o, alínea a), da decisão impugnada na parte que diz respeito à imputação do comportamento da BNGW à recorrente no período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 30 de setembro de 2000. O Tribunal Geral considera que lhe compete retirar as consequências dessa anulação sobre o montante da coima aplicada à recorrente.

137

A título preliminar, há que recordar que resulta das disposições conjugadas do artigo 44.o, n.o 1, alínea c), e do artigo 48.o, n.o 2, do Regulamento de Processo que a petição inicial deve conter o objeto do litígio e a exposição sumária dos fundamentos do pedido e que é proibido deduzir novos fundamentos no decurso da instância, a menos que tenham origem em elementos de direito e de facto que se tenham revelado durante o processo.

138

No exercício do seu poder de plena jurisdição, o juiz da União deve no entanto poder acolher novos fundamentos ou argumentos desde que estes sejam de conhecimento oficioso e não se baseiem num fundamento de ilegalidade diferente dos invocados na petição (v., neste sentido, acórdão do Tribunal de Justiça de 14 de outubro de 1999, Atlanta/Comunidade Europeia, C-104/97 P, Colet., p. I-6983, n.os 27 a 29).

139

Por conseguinte, no que respeita à inadmissibilidade suscitada pela Comissão relativamente aos argumentos apresentados pela recorrente na audiência, há que declarar que, na petição, a recorrente limitou-se a pedir ao Tribunal Geral que reduzisse o montante da sua coima em consequência da anulação desta no que diz respeito ao período compreendido entre 21 de junho de 1996 e 30 de setembro de 2000, devido à violação dos seus direitos de defesa. Na réplica, a recorrente procedeu ao cálculo do novo montante, efetuando uma redução da coima estritamente proporcional à redução da duração da infração. Na tréplica, a Comissão contestou o cálculo efetuado pela recorrente e solicitou ao Tribunal Geral que, se fosse o caso, calculasse o novo montante da coima mantendo o montante de base de três milhões de euros e reduzindo a majoração da coima de 55% para 15% em razão da duração da infração, em conformidade com as orientações de 1998, utilizadas na decisão impugnada.

140

Portanto, os argumentos relativos, por um lado, ao método de cálculo proposto pela Comissão na tréplica, que desrespeita o limite de 10% de aumento por ano previsto nas orientações de 1998 e, por outro lado, à necessidade de fixar uma coima estritamente proporcional à duração da infração, em conformidade com as orientações de 2006, que não se baseiam num fundamento de ilegalidade diferente dos suscitados na petição, são operantes para efeitos da fixação do montante da coima pelo Tribunal Geral no âmbito do exercício da sua competência de plena jurisdição. Devem, por isso, ser considerados admissíveis.

141

Quanto ao mérito, no que diz respeito ao argumento de que o método de cálculo proposto pela Comissão na tréplica desrespeita o limite de 10% de aumento por ano previsto nas orientações de 1998, importa rejeitá-lo, recordando que a Comissão propôs, em conformidade com o ponto B das referidas orientações, e como consta da decisão impugnada (considerando 328), aumentar o montante de base da coima aplicada à recorrente, em razão da duração infração, em 10% por ano por cada ano completo e em 5% por qualquer período entre seis meses e um ano, ou seja, 15% pelo período compreendido entre 1 de outubro de 2000 e 15 de abril de 2002.

142

No que respeita ao argumento da recorrente relativo à necessidade de fixar o montante da coima num nível estritamente proporcional à duração da sua participação na infração, importa recordar que o direito da União não impõe tal exigência (acórdão do Tribunal Geral de 3 de março de 2011, Siemens Österreich e o./Comissão, T-122/07 a T-124/07, Colet., p. II -793, n.o 182). Com efeito, o artigo 23.o, n.o 3, do Regulamento n.o 1/2003 limita-se a prever que, quando se determinar o montante da coima, deve tomar-se em consideração a gravidade e a duração da infração.

143

No que respeita à possibilidade de o Tribunal Geral calcular o montante da coima aplicada à recorrente utilizando a metodologia das orientações de 2006 e não a das orientações de 1998, em vigor na altura da adoção da decisão impugnada, importa recordar que o Tribunal Geral não está vinculado pelos cálculos da Comissão nem pelas orientações desta quando se pronuncia ao abrigo da sua competência de plena jurisdição (v., neste sentido, acórdão do Tribunal Geral de 12 de dezembro de 2007, BASF e UCB/Comissão, T-101/05 e T-111/05, Colet., p. II-4949, n.o 213 e jurisprudência referida), antes deve efetuar a sua própria apreciação, tendo em conta todas as circunstâncias do caso em apreço. Contudo, o exercício de uma competência de plena jurisdição não pode implicar, na determinação do montante das coimas que lhes são aplicadas, uma discriminação entre as empresas que participaram num acordo ou numa prática concertada contrária ao artigo 81.o CE. Assim, se o Tribunal Geral pretender, em relação a uma empresa, afastar-se especificamente do método de cálculo utilizado pela Comissão tendo em conta o conjunto das empresas envolvidas, compete-lhe fundamentar a sua escolha (acórdão do Tribunal de Justiça de 16 de novembro de 2000, Sarrió/Comissão, C-291/98 P, Colet., p. I-9991, n.os 97 e 98).

144

No caso em apreço, a gravidade intrínseca significativa da infração cometida e o caráter proporcionado do montante de base considerado pela Comissão, tal como realçados nos n.os 107 e 127, supra, justificam uma redução da majoração da coima em conformidade com a metodologia das orientações de 1998.

145

À luz de todas as circunstâncias e considerações acima referidas, o Tribunal Geral, no exercício da sua competência de plena jurisdição, considera que se justifica reduzir a majoração da coima, em razão da duração da infração, de 55% para 15% e fixar o montante da coima aplicada solidariamente à recorrente em 3,45 milhões de euros.

Quanto às despesas

146

Nos termos do artigo 87.o, n.o 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Nos termos do artigo 87.o, n.o 3, primeiro parágrafo, do mesmo regulamento, se cada parte obtiver vencimento parcial, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas.

147

No caso em apreço, tendo a recorrente sido parcialmente vencida, faz-se uma justa apreciação das circunstâncias do processo, decidindo que cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL GERAL (Sexta Secção)

decide:

 

1)

O artigo 1. °, alínea a), da Decisão C(2006) 4090 final da Comissão, de 13 de setembro de 2006, relativa a um procedimento nos termos do artigo 81.o [CE] [Processo COMP/F/38.456 — Betume (Países Baixos)], é anulado na parte que diz respeito à participação da Ballast Nedam Infra BV na infração entre 21 de junho de 1996 e 30 de setembro de 2000.

 

2)

O montante da coima aplicada solidariamente à Ballast Nedam Infra no artigo 2.o, alínea a), da decisão referida no ponto 1), supra, é fixado em 3,45 milhões de euros.

 

3)

Cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

 

Jaeger

Wahl

Soldevila Fragoso

Proferido em audiência pública no Luxemburgo, em 27 de setembro de 2012.

Assinaturas

Índice

 

Factos na origem do litígio

 

Tramitação processual e pedidos das partes

 

Questão de direito

 

Quanto ao quarto fundamento, relativo à violação do artigo 27.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1/2003 e dos direitos de defesa

 

Argumentos das partes

 

Apreciação do Tribunal

 

Quanto ao primeiro fundamento, relativo à falta de prova da existência de uma infração ao artigo 81.o CE

 

Argumentos das partes

 

Apreciação do Tribunal

 

— Quanto ao envolvimento dos grandes construtores na fixaηγo do preηo bruto

 

— Quanto aos descontos concedidos ao W5 e ao mecanismo sancionatσrio

 

— Quanto ΰ falta de interesse do W5 na fixaηγo em conjunto do preηo bruto

 

— Quanto ΰ recusa da Comissγo em aplicar o disposto nas orientaηυes sobre os acordos de cooperaηγo horizontal

 

— Quanto ΰ inexistκncia de objetivo de restriηγo da concorrκncia

 

Quanto ao segundo fundamento, relativo à determinação errada do montante de base da coima

 

Argumentos das partes

 

Apreciação do Tribunal

 

— Quanto ΰ qualificaηγo de infraηγo muito grave

 

— Quanto ΰ apreciaηγo errada do impacto do cartel no mercado

 

— Quanto ao carαter desproporcionado do montante de base da coima

 

Quanto ao terceiro fundamento, relativo aos erros de direito e aos erros manifestos de apreciação na imputação à recorrente da responsabilidade pela infração cometida pela BNGW

 

Argumentos das partes

 

Apreciação do Tribunal Geral

 

Quanto ao montante da coima

 

Argumentos das partes

 

Apreciação do Tribunal Geral

 

Quanto às despesas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.

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