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Documento 62023CJ0067
Judgment of the Court (First Chamber) of 5 September 2024.#Criminal proceedings against S.Z.#Request for a preliminary ruling from the Bundesgerichtshof.#Reference for a preliminary ruling – Common foreign and security policy – Restrictive measures in respect of Burma/Myanmar – Prohibition on the import of goods originating in or exported from Burma/Myanmar – Regulation (EC) No 194/2008 – Article 2(2)(a) – Teak logs originating in Burma/Myanmar exported to and processed in Taiwan before being transported to the European Union – Regulation (EEC) No 2913/92 – Community Customs Code – Article 24 – Concept of ‘substantial processing or working’ – Teak logs that have been debranched, debarked, sawn into the shape of wooden cuboids or cut into sawn teak wood in Taiwan – Certificate of origin issued by the Taiwanese authorities – Value of that certificate for the determination, by the customs authorities of the Member States, of the origin of those teak logs.#Case C-67/23.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 5 de setembro de 2024.
Processo penal contra S.Z.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesgerichtshof.
Reenvio prejudicial — Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas aplicáveis à Birmânia/Mianmar — Proibição de importação de produtos originários ou exportados da Birmânia/Mianmar — Regulamento (CE) n.° 194/2008 — Artigo 2.°, n.° 2, alínea a) — Toros de madeira de teca originários da Birmânia/Mianmar exportados e transformados em Taiwan antes do seu transporte para a União Europeia — Regulamento (CEE) n.° 2913/92 — Código Aduaneiro Comunitário — Artigo 24.° — Conceito de “transformação ou operação de complemento de fabrico substancial” — Toros de madeira de teca podados, descascados, serrados ou cortados em tacos de madeira de teca serrada em Taiwan — Certificado de origem emitido pelas autoridades de Taiwan — Valor deste certificado para a determinação, pelas autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros, da origem destes toros de madeira de teca.
Processo C-67/23.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 5 de setembro de 2024.
Processo penal contra S.Z.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Bundesgerichtshof.
Reenvio prejudicial — Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas aplicáveis à Birmânia/Mianmar — Proibição de importação de produtos originários ou exportados da Birmânia/Mianmar — Regulamento (CE) n.° 194/2008 — Artigo 2.°, n.° 2, alínea a) — Toros de madeira de teca originários da Birmânia/Mianmar exportados e transformados em Taiwan antes do seu transporte para a União Europeia — Regulamento (CEE) n.° 2913/92 — Código Aduaneiro Comunitário — Artigo 24.° — Conceito de “transformação ou operação de complemento de fabrico substancial” — Toros de madeira de teca podados, descascados, serrados ou cortados em tacos de madeira de teca serrada em Taiwan — Certificado de origem emitido pelas autoridades de Taiwan — Valor deste certificado para a determinação, pelas autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros, da origem destes toros de madeira de teca.
Processo C-67/23.
Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral
Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2024:680
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)
5 de setembro de 2024 ( *1 )
«Reenvio prejudicial — Política externa e de segurança comum — Medidas restritivas aplicáveis à Birmânia/Mianmar — Proibição de importação de produtos originários ou exportados da Birmânia/Mianmar — Regulamento (CE) n.o 194/2008 — Artigo 2.o, n.o 2, alínea a) — Toros de madeira de teca originários da Birmânia/Mianmar exportados e transformados em Taiwan antes do seu transporte para a União Europeia — Regulamento (CEE) n.o 2913/92 — Código Aduaneiro Comunitário — Artigo 24.o — Conceito de “transformação ou operação de complemento de fabrico substancial” — Toros de madeira de teca podados, descascados, serrados ou cortados em tacos de madeira de teca serrada em Taiwan — Certificado de origem emitido pelas autoridades de Taiwan — Valor deste certificado para a determinação, pelas autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros, da origem destes toros de madeira de teca»
No processo C‑67/23,
que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal de Justiça Federal, Alemanha), por Decisão de 17 de novembro de 2022, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 8 de fevereiro de 2023, no processo penal contra
S.Z.,
sendo intervenientes:
W. GmbH,
Generalbundesanwalt beim Bundesgerichtshof,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),
composto por: A. Arabadjiev, presidente de secção, T. von Danwitz, P. G. Xuereb (relator), A. Kumin e I. Ziemele, juízes,
advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,
secretário: A. Calot Escobar,
vistos os autos,
vistas as observações apresentadas:
– |
em representação de S.Z., por G. Schwendinger, Rechtsanwalt, |
– |
em representação da W. GmbH, por K. Göcke, Rechtsanwältin, |
– |
em representação do Generalbundesanwalt beim Bundesgerichtshof, por P. Frank, na qualidade de agente, |
– |
em representação da Comissão Europeia, por M. Carpus Carcea, C. Hödlmayr e F. Moro, na qualidade de agentes, |
vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,
profere o presente
Acórdão
1 |
O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), do Regulamento (CE) n.o 194/2008 do Conselho, de 25 de fevereiro de 2008, que renova e reforça as medidas restritivas aplicáveis à Birmânia/Mianmar e revoga o Regulamento (CE) n.o 817/2006 (JO 2008, L 66, p. 1). |
2 |
Este pedido foi apresentado no âmbito de um processo penal instaurado contra S.Z. por violação da proibição de importar produtos originários ou exportados da Birmânia/Mianmar. |
Quadro jurídico
Direito da União
NC
3 |
A classificação aduaneira das mercadorias importadas na União Europeia é regulada pela Nomenclatura Combinada que figura no anexo I do Regulamento (CEE) n.o 2658/87 do Conselho, de 23 de julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum (JO 1987, L 256, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 1214/2007 da Comissão, de 20 de setembro de 2007 (JO 2007, L 286, p. 1) (a seguir «NC»), que se baseia no Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias (a seguir «SH»), instituído pela Convenção Internacional sobre o Sistema Harmonizado de Designação e Codificação de Mercadorias, celebrada em Bruxelas, em 14 de junho de 1983, no âmbito da Organização Mundial das Alfândegas (OMA), e aprovada, juntamente com o seu Protocolo de alteração de 24 de junho de 1986, em nome da Comunidade Económica Europeia, pela Decisão 87/369/CEE do Conselho, de 7 de abril de 1987 (JO 1987, L 198, p. 1). |
4 |
Segundo o artigo 3.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2658/87, a NC reproduz as posições e as subposições com seis algarismos do SH e só o sétimo e oitavo algarismos formam subdivisões próprias. |
5 |
As posições 4403 e 4407 da NC, que correspondem às mesmas posições do SH, denominam‑se, respetivamente, «Madeira em bruto, mesmo descascada, desalburnada ou esquadriada» e «Madeira serrada ou fendida longitudinalmente, cortada transversalmente ou desenrolada, mesmo aplainada, lixada ou unida pelas extremidades, de espessura superior a 6 mm». |
Código Aduaneiro Comunitário
6 |
O Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO 1992, L 302, p. 1, a seguir «Código Aduaneiro Comunitário»), foi revogado e substituído, a partir de 1 de maio de 2016, pelo Regulamento (UE) n.o 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de outubro de 2013, que estabelece o Código Aduaneiro da União (JO 2013, L 269, p. 1, e retificação no JO 2013, L 287, p. 90). No entanto, tendo em conta a data dos factos do litígio no processo principal, o Código Aduaneiro Comunitário continua a ser‑lhe aplicável. |
7 |
O título II do Código Aduaneiro Comunitário, intitulado «Elementos com base nos quais são aplicados os direitos de importação ou de exportação, bem como as outras medidas previstas no âmbito das trocas de mercadorias», continha um capítulo 1, intitulado «Pauta aduaneira das Comunidades Europeias e classificação pautal das mercadorias», do qual fazia parte o artigo 20.o deste código, que tinha a seguinte redação: «1. Os direitos legalmente devidos em caso de constituição de uma dívida aduaneira serão baseados na Pauta Aduaneira das Comunidades Europeias. […] 3. A Pauta Aduaneira das Comunidades Europeias compreende: […]
[…]» |
8 |
O capítulo 2 deste título II, intitulado «Origem das mercadorias», incluía uma secção 1, intitulada «Origem não preferencial das mercadorias», e uma secção 2, intitulada «Origem preferencial das mercadorias». |
9 |
Esta secção 1 continha o artigo 22.o do Código Aduaneiro Comunitário, que previa: «Os artigos 23.o a 26.o definem a origem não preferencial das mercadorias para efeitos de:
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10 |
O artigo 23.o deste código estabelecia: «1. São originárias de um país as mercadorias inteiramente obtidas nesse país. 2. Consideram‑se mercadorias inteiramente obtidas num país: […]
[…]» |
11 |
Nos termos do artigo 24.o do referido código: «Uma mercadoria em cuja produção intervieram dois ou mais países é originária do país onde se realizou a última transformação ou operação de complemento de fabrico substancial, economicamente justificada, efetuada numa empresa equipada para esse efeito e que resulta na obtenção de um produto novo ou represente uma fase importante do fabrico.» |
12 |
O artigo 26.o do mesmo código dispunha: «1. A legislação aduaneira ou outras legislações comunitárias específicas podem prever que a origem das mercadorias deva ser justificada mediante a apresentação de um documento. 2. Não obstante a apresentação deste documento, as autoridades aduaneiras podem, em caso de sérias dúvidas, exigir qualquer justificação complementar com vista a assegurar que a indicação da origem corresponde cabalmente às regras previstas na legislação comunitária na matéria.» |
Regulamento (CEE) n.o 2454/93
13 |
O Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de 2 de julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO 1993, L 253, p. 1), foi revogado pelo Regulamento de Execução (UE) 2016/481 da Comissão, de 1 de abril de 2016, que revoga o Regulamento (CEE) n.o 2454/93 que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO 2016, L 87, p. 24). No entanto, tendo em conta a data dos factos do litígio no processo principal, o Regulamento n.o 2454/93 continua a ser‑lhe aplicável. |
14 |
Este último regulamento continha um anexo 13A, aditado pelo Regulamento (UE) n.o 1063/2010 da Comissão, de 18 de novembro de 2010 (JO 2010, L 307, p. 1), que incluía uma parte II, intitulada «Lista de produtos e operações de complemento de fabrico ou de transformação que conferem a qualidade de produto originário», que previa, nomeadamente, o seguinte:
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Regulamento n.o 194/2008
15 |
O Regulamento n.o 194/2008 foi revogado, a partir de 3 de maio de 2013, pelo Regulamento (UE) n.o 401/2013 do Conselho, de 2 de maio de 2013, relativo a medidas restritivas tendo em conta a situação em Mianmar/Birmânia e que revoga o Regulamento (CE) n.o 194/2008 (JO 2013, L 121, p. 1). No entanto, tendo em conta a data dos factos do litígio no processo principal, o Regulamento n.o 194/2008 continua a ser‑lhe aplicável. |
16 |
Nos termos dos considerandos 6 e 7 do Regulamento n.o 194/2008:
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17 |
Incluído no capítulo 1 deste regulamento, sob a epígrafe «Definições», o artigo 1.o do referido regulamento dispunha: «Para efeitos do presente regulamento, entende‑se por:
[…]» |
18 |
Incluído no capítulo 2 do Regulamento n.o 194/2008, sob a epígrafe «Restrições à importação e aquisição», o artigo 2.o deste regulamento previa, nos seus n.os 1 a 3: «1. O anexo I inclui produtos das seguintes categorias:
2. É proibido:
3. A origem dos produtos será determinada em conformidade com as disposições aplicáveis do [Código Aduaneiro Comunitário].» |
19 |
O anexo I do referido regulamento intitulava‑se «[l]ista dos bens sujeitos a restrições de importação e aquisição a que se refere o artigo 2.o». No ponto A deste anexo, intitulado «Toros redondos, madeira e produtos da madeira», figuravam os produtos abrangidos pelas posições 4403 e 4407 da NC. |
Direito alemão
20 |
O § 34, n.o 4, ponto 2, da Außenwirtschaftsgesetz (Lei relativa ao Comércio Externo), na sua versão de 27 de maio de 2009 (a seguir «Lei relativa ao Comércio Externo»), dispunha: «É punido com pena de prisão de seis meses a cinco anos quem […]
|
21 |
O Regulamento n.o 194/2008, diretamente aplicável na República Federal da Alemanha, foi, no que respeita ao artigo 2.o, n.o 2, alínea a), em causa no litígio no processo principal, publicado no Bundesanzeiger em 22 de outubro de 2009. |
Litígio no processo principal e questões prejudiciais
22 |
S.Z. era o único gerente de uma sociedade com sede em Hamburgo (Alemanha), que tinha como atividade o comércio de madeira de teca originária da Birmânia/Mianmar (a seguir «sociedade em causa»). Esta madeira era principalmente utilizada na construção naval. Esta sociedade era a antecessora jurídica da W. GmbH (a seguir «W.»), que é a sociedade proprietária dos produtos objeto de perda e a parte interessada no procedimento de perda em causa no processo principal. |
23 |
Por Acórdão do Landgericht Hamburg (Tribunal Regional de Hamburgo, Alemanha) de 27 de abril de 2021, S.Z. foi condenado pela violação do § 34, n.o 4, ponto 2, da Lei relativa ao Comércio Externo a uma pena privativa de liberdade de um ano e nove meses. O Landgericht Hamburg (Tribunal Regional de Hamburgo) ordenou também a perda, pela W., de toros de árvores de teca (a seguir «produtos em causa») e de um montante de 3310902,98 euros, correspondente ao valor dos lucros obtidos com a infração. |
24 |
A este respeito, este órgão jurisdicional declarou que, por iniciativa de S.Z., a sociedade em causa continuou a importar e a comercializar madeira de teca da Birmânia/Mianmar entre outubro de 2009 e maio de 2011, ou seja, após a entrada em vigor do Regulamento n.o 194/2008, que proíbe a importação de produtos originários ou exportados da Birmânia/Mianmar. O fornecedor desta sociedade, estabelecido em Taiwan, cortava árvores de teca na Birmânia/Mianmar e, em seguida, transferia os toros destas árvores para Taiwan e transformava‑os em serrarias. |
25 |
Além disso, o referido órgão jurisdicional declarou que esses toros foram objeto de três tipos de operações de complemento de fabrico em Taiwan. Alguns deles foram simplesmente podados e descascados. Outros foram podados e descascados e depois serrados em tacos de madeira, isto é, cortados em forma de paralelepípedos. Por último, alguns toros foram cortados em tábuas ou em pranchas, ou seja, em madeira de teca serrada. Após estes complementos de fabrico, e munida de certificados de origem emitidos pelas autoridades de Taiwan, a madeira foi transportada por navio até Hamburgo, onde foi recebida pela sociedade em causa. |
26 |
O mesmo órgão jurisdicional considerou que a madeira de teca em causa era, em consequência das operações de complemento de fabrico de que tinha sido objeto em Taiwan, originária desse país, pelo que não tinha sido violado o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), do Regulamento n.o 194/2008, que proibia a importação de produtos originários da Birmânia/Mianmar. No entanto, considerou que, apesar do seu transporte para Taiwan e dos trabalhos de serração de que ali tinha sido objeto, esta madeira de teca não tinha perdido a qualidade de produto exportado da Birmânia/Mianmar, na aceção deste artigo 2.o, n.o 2, alínea a), ii), e que, por conseguinte, havia que declarar a existência de uma infração a esta última disposição. |
27 |
S.Z. e a W. interpuseram recurso de «Revision» do Acórdão do Landgericht Hamburg (Tribunal Regional de Hamburgo) de 27 de abril de 2021, no Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal de Justiça Federal, Alemanha), que é o órgão jurisdicional de reenvio. Em seu entender, por um lado, os toros em causa não foram simplesmente transportados da Birmânia/Mianmar para a Alemanha através de Taiwan, mas foram objeto, neste último país terceiro, de uma operação de complemento de fabrico ou de uma transformação que lhes conferiu uma nova origem, razão pela qual as autoridades de Taiwan emitiram certificados de origem nos quais Taiwan era indicado como país de origem. Por conseguinte, os produtos em causa não são madeira originária da Birmânia/Mianmar, mas produtos derivados da madeira de Taiwan, que foram importados para a Alemanha. Assim, a importação dos produtos em causa não viola o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), do Regulamento n.o 194/2008. Por outro lado, a madeira de teca em causa, introduzida no território da União, não foi exportada da Birmânia/Mianmar, na aceção deste artigo 2.o, n.o 2, alínea a), ii), mas sim de Taiwan. |
28 |
O Generalbundesanwalt beim Bundesgerichtshof (Procurador‑Geral do Supremo Tribunal de Justiça Federal, Alemanha) (a seguir «Procurador‑Geral») subscreveu a apreciação do Landgericht Hamburg (Tribunal Regional de Hamburgo). Considerou, em substância, que, no caso em apreço, a operação de complemento de fabrico de madeira de teca exportada da Birmânia/Mianmar apenas tinha implicado uma alteração da origem deste produto, sem, no entanto, o tornar num produto diferente. |
29 |
Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio indica, em primeiro lugar, que a importação dos produtos em causa constitui um facto punível, em aplicação do § 34, n.o 4, ponto 2, da Lei relativa ao Comércio Externo, lido em conjugação com o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), do Regulamento n.o 194/2008, se a operação de complemento de fabrico ou a transformação ocorrida em Taiwan não tiver sido suficiente para conferir uma nova origem à madeira de teca em causa, continuando esta a ser originária da Birmânia/Mianmar, na aceção do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), deste regulamento. |
30 |
O órgão jurisdicional de reenvio duvida, à luz dos Acórdãos de 26 de janeiro de 1977, Gesellschaft für Überseehandel (49/76, EU:C:1977:9), relativo à caseína, e de 23 de fevereiro de 1984, Zentrag (93/83, EU:C:1984:78), relativo à carne de bovino, que a operação de complemento de fabrico de que a madeira de teca cortada na Birmânia/Mianmar foi objeto em Taiwan, tenha sido de tal modo substancial que esta madeira se tenha tornado, nos termos do artigo 24.o do Código Aduaneiro Comunitário, num produto originário de Taiwan. No entanto, salienta que o facto de cortar madeira de teca em bruto para fazer madeira serrada implica uma alteração da posição no SH, uma vez que a madeira em bruto pertence à posição 4403 do SH e a madeira serrada de espessura superior a 6 mm à posição 4407 do mesmo. Ora, as operações que alteraram o acondicionamento da carne de bovino ou da caseína em causa nos processos que deram origem a estes acórdãos não provocaram nenhuma alteração de posição. Uma alteração de quatro dígitos da posição pautal pode constituir um indicador da existência de uma operação de complemento de fabrico substancial de um produto, uma vez que o SH é organizado de modo gradual, desde os produtos naturais e matérias‑primas aos produtos com graus de transformação cada vez mais elevados. |
31 |
Em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio salienta que, na hipótese de os trabalhos de serração, que ocorreram em Taiwan, terem implicado uma alteração da origem, a importação em causa constituiria um facto punível se os toros de madeira de teca em causa tivessem sido exportados da Birmânia/Mianmar, em violação do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), ii), do Regulamento n.o 194/2008. |
32 |
A este respeito, contrariamente ao Landgericht Hamburg (Tribunal Regional de Hamburgo) e ao Procurador‑Geral, o órgão jurisdicional de reenvio tende a considerar que há que interpretar a expressão «exportados da Birmânia/Mianmar», que figura nesse artigo 2.o, n.o 2, alínea a), ii), no sentido de que só estão abrangidos por esta expressão os produtos importados diretamente da Birmânia/Mianmar para a União e não os produtos que foram transportados para um país terceiro, no caso em apreço, Taiwan, e depois para a União, independentemente da questão de saber se foram objeto, nesse país terceiro, de uma operação de complemento de fabrico ou de uma transformação que lhes confira uma nova origem. Se esta interpretação fosse aceite, S.Z. não teria violado o referido artigo 2.o, n.o 2, alínea a), ii). |
33 |
Segundo o órgão jurisdicional de reenvio, a interpretação da referida expressão adotada pelo Landgericht Hamburg (Tribunal Regional de Hamburgo) e pelo Procurador‑Geral privaria o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), do Regulamento n.o 194/2008 de um âmbito de aplicação independente e teria por efeito sujeitar produtos provenientes de países terceiros, que foram produzidos a partir de matérias‑primas ou de produtos provenientes da Birmânia/Mianmar, à proibição de importação prevista nesse artigo 2.o, n.o 2, alínea a), o que não foi a intenção do legislador da União. |
34 |
Em terceiro e último lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pretende saber se certificados de origem, como os emitidos pelas autoridades de Taiwan, vinculam as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros quando examinam se a proibição de importação prevista no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), do Regulamento n.o 194/2008 foi violada. |
35 |
Nestas condições, o Bundesgerichtshof (Supremo Tribunal de Justiça Federal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:
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Quanto às questões prejudiciais
Quanto à primeira questão
36 |
Segundo jurisprudência constante, no âmbito do processo de cooperação entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça instituído pelo artigo 267.o TFUE, cabe a este dar ao juiz nacional uma resposta útil que lhe permita decidir o litígio que lhe foi submetido. Nesta ótica, incumbe ao Tribunal de Justiça, se necessário, reformular as questões que lhe são submetidas. Além disso, o Tribunal de Justiça pode ser levado a tomar em consideração normas de direito da União a que o juiz nacional não fez referência no enunciado das suas questões (Acórdão de 7 de setembro de 2023, Groenland Poultry, C‑169/22, EU:C:2023:638, n.o 47 e jurisprudência referida). |
37 |
No enunciado da sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio fez unicamente referência ao artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), do Regulamento n.o 194/2008. |
38 |
Esta disposição proíbe a importação dos produtos enumerados no anexo I deste regulamento se estes forem originários da Birmânia/Mianmar. O ponto A deste anexo diz respeito à categoria de «[t]oros redondos, madeira e produtos da madeira». |
39 |
Nos termos do artigo 2.o, n.o 3, do referido regulamento, a origem dos produtos será determinada em conformidade com as disposições aplicáveis do Código Aduaneiro Comunitário. No caso em apreço, a disposição pertinente deste código é o seu artigo 24.o |
40 |
Nos termos deste artigo 24.o«[u]ma mercadoria em cuja produção intervieram dois ou mais países é originária do país onde se realizou a última transformação ou operação de complemento de fabrico substancial, economicamente justificada, efetuada numa empresa equipada para esse efeito e que resulta na obtenção de um produto novo ou represente uma fase importante do fabrico». |
41 |
Por conseguinte, há que considerar que, com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), do Regulamento n.o 194/2008, lido em conjugação com o artigo 24.o do Código Aduaneiro Comunitário, deve ser interpretado no sentido de que a poda, o descasque, a serração em tacos de madeira ou a transformação em madeira serrada de toros de madeira de teca constituem transformações ou operações de complemento de fabrico que determinam a origem das mercadorias obtidas na sequência dessas operações. |
Quanto à admissibilidade
42 |
A W. põe parcialmente em causa a admissibilidade da primeira questão, alegando que a questão de saber se o facto de podar e descascar toros de madeira de teca pode provocar uma alteração da origem destas mercadorias não é pertinente, uma vez que, segundo as conclusões do Landgericht Hamburg (Tribunal Regional de Hamburgo), que vinculam o órgão jurisdicional de reenvio, estas mercadorias não foram importadas para a Alemanha no processo principal, tendo apenas sido importados toros de madeira de teca serrados em tacos de madeira e madeira de teca serrada. |
43 |
A este respeito, há que recordar que, no âmbito da cooperação entre o Tribunal de Justiça e os órgãos jurisdicionais nacionais instituída pelo artigo 267.o TFUE, o juiz nacional, a quem foi submetido o litígio e que deve assumir a responsabilidade pela decisão judicial a tomar, tem competência exclusiva para apreciar, tendo em conta as especificidades do processo, tanto a necessidade de uma decisão prejudicial para poder proferir a sua decisão como a pertinência das questões que submete ao Tribunal de Justiça. Por conseguinte, desde que as questões submetidas sejam relativas à interpretação do direito da União, o Tribunal de Justiça é, em princípio, obrigado a pronunciar‑se (Acórdão de 9 de março de 2023, Sogefinancement, C‑50/22, EU:C:2023:177, n.o 16 e jurisprudência referida). |
44 |
Daqui se conclui que as questões relativas ao direito da União gozam de uma presunção de pertinência. O Tribunal de Justiça só pode recusar pronunciar‑se sobre uma questão prejudicial submetida por um órgão jurisdicional nacional se for manifesto que a interpretação do direito da União solicitada não tem nenhuma relação com a realidade ou o objeto do litígio no processo principal, quando o problema for hipotético ou ainda quando o Tribunal não dispuser dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil às questões que lhe são submetidas (Acórdão de 9 de março de 2023, Sogefinancement, C‑50/22, EU:C:2023:177, n.o 17 e jurisprudência referida). |
45 |
No entanto, não é o que se verifica no caso em apreço. |
46 |
Com efeito, não resulta de forma manifesta da decisão de reenvio que a interpretação do direito da União solicitada não tenha nenhuma relação com a realidade ou com o objeto do litígio no processo principal. Além disso, há que constatar, por um lado, que a primeira questão prejudicial não é de natureza hipotética e, por outro, que o Tribunal de Justiça dispõe dos elementos de facto e de direito necessários para dar uma resposta útil à referida questão. |
47 |
Por conseguinte, há que decidir quanto à interpretação do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), do Regulamento n.o 194/2008, lido em conjugação com o artigo 24.o do Código Aduaneiro Comunitário, à luz dos três tipos de operações de complemento de fabrico enumerados na primeira questão. |
Quanto ao mérito
48 |
Resulta do artigo 24.o do Código Aduaneiro Comunitário que, quando dois ou mais países intervêm na produção de uma mercadoria, o critério determinante para a origem desta última é o da última transformação ou operação de complemento de fabrico substancial desta mercadoria (v., neste sentido, Acórdão de 20 de maio de 2021, Renesola UK, C‑209/20, EU:C:2021:400, n.o 38 e jurisprudência referida). |
49 |
Além disso, a determinação da origem das mercadorias deve basear‑se numa distinção objetiva e real entre produto de base e produto transformado, atendendo essencialmente às qualidades materiais específicas de cada um destes (Acórdão de 11 de fevereiro de 2010, Hoesch Metals and Alloys, C‑373/08, EU:C:2010:68, n.o 45 e jurisprudência referida). |
50 |
O Tribunal de Justiça já declarou que a expressão «última transformação ou operação de complemento de fabrico substancial», na aceção do artigo 24.o do Código Aduaneiro Comunitário, deve ser entendida no sentido de que remete para a fase do processo de produção durante a qual as mercadorias em causa adquirem a sua utilização, bem como propriedades e uma composição específicas que não possuíam anteriormente e que não sofrem mais tarde alterações qualitativas importantes (Acórdão de 20 de maio de 2021, Renesola UK, C‑209/20, EU:C:2021:400, n.o 38 e jurisprudência referida). |
51 |
Assim, as operações que afetem a apresentação de um produto para efeitos da sua utilização, mas que não impliquem uma alteração qualitativa importante das suas propriedades, não são suscetíveis de determinar a origem deste produto (Acórdão de 11 de fevereiro de 2010, Hoesch Metals and Alloys, C‑373/08, EU:C:2010:68, n.o 46 e jurisprudência referida). |
52 |
Por conseguinte, as operações de transformação de um produto que não impliquem uma alteração substancial das suas propriedades e da sua composição, por consistirem apenas numa repartição e numa alteração da sua apresentação, não constituem uma alteração qualitativa suficientemente caracterizada que permita que se considere que causou o fabrico de um produto novo ou que constitui uma fase de fabrico importante do referido produto (Acórdão de 11 de fevereiro de 2010, Hoesch Metals and Alloys, C‑373/08, EU:C:2010:68, n.o 47 e jurisprudência referida). |
53 |
Nestas condições, no que respeita ao primeiro tipo de operação de complemento de fabrico, a saber, a poda e o descasque dos toros de madeira de teca em causa, não resulta dos autos de que o Tribunal de Justiça dispõe que esta operação de complemento de fabrico tenha conferido a esses toros a sua utilização, bem como propriedades e uma composição específicas que não possuíam anteriormente e que não sofrem mais tarde alterações qualitativas importantes. Pelo contrário, este tipo de operação de complemento de fabrico parece ser, sob reserva de verificação pelo órgão jurisdicional de reenvio, uma operação de complemento de fabrico simples, que apenas afeta a apresentação da madeira. Ora, como recordado no n.o 52 do presente acórdão, não se pode considerar que tal operação tenha implicado o fabrico de um produto novo ou que constitua uma fase importante de fabrico das mercadorias em causa e, por conseguinte, que determine a sua origem. |
54 |
Quanto ao segundo tipo de operações de complemento de fabrico, a saber, a serração em tacos de madeira dos toros de madeira de teca em causa, anteriormente podados e descascados, isto é, o seu corte em forma de paralelepípedos, também não parece que, no caso em apreço, esta operação de complemento de fabrico tenha conferido a esses toros a sua utilização, bem como propriedades e uma composição específicas que não possuíam anteriormente e que não sofrem mais tarde alterações qualitativas importantes, na aceção da jurisprudência referida no n.o 50 do presente acórdão. Pelo contrário, como S.Z. e a W. salientaram, este segundo tipo de operação de complemento de fabrico constitui uma fase intermédia indispensável para a produção de madeira serrada. Por conseguinte, não se pode considerar este segundo tipo de operação de complemento de fabrico determinante da origem dos referidos toros. |
55 |
No entanto, S.Z. e a W. alegam que resulta do Acórdão de 10 de dezembro de 2009, HEKO Industrieerzeugnisse (C‑260/08, EU:C:2009:768), e do anexo 22‑03 do Regulamento Delegado (UE) 2015/2446 da Comissão, de 28 de julho de 2015, que completa o Regulamento (UE) n.o 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, com regras pormenorizadas relativamente a determinadas disposições do Código Aduaneiro da União (JO 2015, L 343, p. 1), que uma alteração de origem deve, em princípio, ser declarada quando a operação de complemento de fabrico ou a transformação da madeira em bruto conduza a um aumento substancial do valor da madeira, o qual deve geralmente ser admitido quando este excede 30 %. Ora, no caso em apreço, segundo S.Z. e a W., o valor dos toros de madeira de teca em causa aumentou mais de 30 % após a sua serração em tacos de madeira. Em todo o caso, mesmo que o valor destes toros não tenha aumentado 30 %, uma vez que a sua serração em tacos de madeira necessita de equipamentos especiais de serração e só pode ser realizada por profissionais especialmente formados para esse efeito, este tipo de operação de complemento de fabrico deve ser considerado determinante da origem dos referidos toros. |
56 |
A este respeito, há que salientar, em primeiro lugar, no que respeita ao valor que a serração em tacos de madeira dos toros de madeira de teca em causa lhes conferiu, que é certo que o Tribunal de Justiça declarou, quanto à questão de saber se uma operação de montagem de diversos elementos constitui uma transformação ou uma operação de complemento de fabrico substancial, que há situações em que a análise com base em critérios de ordem técnica pode não ser conclusiva para a determinação da origem de uma mercadoria e que, nesses casos, há que ter em consideração, a título subsidiário, outros critérios claros e objetivos, como o do valor acrescentado, que permite exprimir, relativamente às mercadorias de composição complexa, em que consiste a transformação substancial que determina a sua origem (v., neste sentido, Acórdão de 10 de dezembro de 2009, HEKO Industrieerzeugnisse, C‑260/08, EU:C:2009:768, n.os 30 e 31). |
57 |
No entanto, a operação em causa no processo principal não é uma operação de montagem de diversos elementos, que consiste na montagem de um grande número de peças para formar um novo conjunto coerente (v., neste sentido, Acórdão de 13 de dezembro de 1989, Brother International, C‑26/88, EU:C:1989:637, n.o 13), mas um corte de um produto de base. |
58 |
Por conseguinte, há que considerar que, no caso em apreço, o critério subsidiário do valor acrescentado, resultante da jurisprudência referida no n.o 56 do presente acórdão, não é aplicável. |
59 |
Em segundo lugar, no que respeita às indicações relativas aos produtos abrangidos pela posição 44 do SH mencionada no quadro que figura na parte II do anexo 22‑03 do Regulamento Delegado 2015/2446, nas quais S.Z. e a W. se baseiam, há que salientar que este regulamento delegado não é aplicável ratione temporis. Com efeito, é aplicável desde 1 de maio de 2016, tendo as importações em causa no processo principal ocorrido entre 2009 e 2011. No entanto, estas indicações são idênticas às que figuram no anexo 13A do Regulamento n.o 2454/93, aditado a este último pelo Regulamento n.o 1063/2010, que é aplicável desde 1 de janeiro de 2011 e, por conseguinte, às importações que ocorreram a partir dessa data. |
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Não obstante, basta salientar que este último anexo fixa unicamente as regras relativas à origem preferencial das mercadorias e não as regras relativas à origem não preferencial das mercadorias, que está em causa no caso em apreço. |
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Por último, quanto à circunstância invocada por S.Z. e pela W., de que a realização de toros de madeira de teca serrados em tacos de madeira necessita de equipamentos especiais de serração e só pode ser efetuada por profissionais especialmente formados, há que salientar que resulta da própria redação do artigo 24.o do Código Aduaneiro Comunitário que a realização de uma operação de complemento de fabrico numa empresa equipada para este efeito não basta para lhe conferir caráter substancial, na aceção deste artigo. |
62 |
Nestas condições, há que considerar que a serração em tacos de madeira dos toros de madeira de teca em causa não constitui uma transformação ou uma operação de complemento de fabrico que determine a origem dessas mercadorias. |
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Quanto ao terceiro tipo de operação de complemento de fabrico, a saber, o corte de toros de madeira de teca em madeira serrada, parece que, contrariamente ao que o Procurador‑Geral alega, este corte não constitui uma operação simples de corte, uma vez que comporta várias etapas, devendo os toros em causa ter sido podados, descascados e serrados em tacos de madeira antes de serem cortados em pranchas. |
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Além disso, os produtos provenientes deste tipo de operações de complemento de fabrico encontram‑se numa fase avançada do processo de fabrico de produtos destinados, como no caso em apreço, à construção naval. Com efeito, pode considerar‑se que a transformação em madeira serrada constitui a fase do processo de produção durante a qual as mercadorias em causa adquirem a sua utilização, bem como propriedades e uma composição específicas que não possuíam anteriormente e que não sofrem mais tarde alterações qualitativas importantes, na aceção da jurisprudência referida no n.o 50 do presente acórdão. |
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Esta conclusão é corroborada pelo facto de os toros de madeira de teca e os toros de madeira de teca serrados em tacos de madeira serem classificados na posição 4403 da NC, como madeira em bruto, ao passo que a madeira de teca serrada é classificada numa fase de operação de complemento de fabrico mais avançada, na posição 4407 da NC. |
66 |
Com efeito, resulta da jurisprudência que a alteração da posição pautal de uma mercadoria, causada pela operação de transformação desta, constitui uma indicação do caráter substancial da sua transformação ou da sua operação de complemento de fabrico (v., neste sentido, Acórdão de 21 de setembro de 2023, Stappert Deutschland, C‑210/22, EU:C:2023:693, n.o 58 e jurisprudência referida). |
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Por conseguinte, o terceiro tipo de operação de complemento de fabrico, que consistiu em transformar os toros de madeira de teca em causa em madeira serrada, pode ser considerado uma operação de complemento de fabrico que confere a estes toros a origem de Taiwan, em aplicação do artigo 24.o do Código Aduaneiro Comunitário. |
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Em face do que precede, há que responder à primeira questão, que o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), do Regulamento n.o 194/2008, lido em conjugação com o artigo 24.o do Código Aduaneiro Comunitário, deve ser interpretado no sentido de que:
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Quanto à segunda questão
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Com a sua segunda questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a expressão «exportados da Birmânia/Mianmar», que figura no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), ii), do Regulamento n.o 194/2008, deve ser interpretada no sentido de que só estão abrangidos por esta disposição os produtos diretamente importados da Birmânia/Mianmar para a União. |
70 |
A este respeito, em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, para interpretar uma disposição do direito da União, há que ter em conta não só os seus termos mas também o seu contexto e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que faz parte (Acórdão de 14 de maio de 2024, Stachev, C‑15/24 PPU, EU:C:2024:399, n.o 72 e jurisprudência referida). |
71 |
Primeiro, quanto à redação do artigo 2.o, n.o 2, alínea a), ii), do Regulamento n.o 194/2008, a expressão «exportados da Birmânia/Mianmar» é, na falta de precisão suplementar, suscetível de incluir os produtos importados tanto direta como indiretamente desse país. |
72 |
No entanto, no que respeita, segundo, ao contexto em que o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), do Regulamento n.o 194/2008 se inscreve, há que recordar que esta disposição contém duas proibições de importação da Birmânia/Mianmar, a saber, por um lado, a de importar produtos originários desse país, que figura nesse artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), e, por outro, a de importar produtos que tenham sido exportados do referido país, que figura no referido artigo 2.o, n.o 2, alínea a), ii). |
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O artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), do Regulamento n.o 194/2008 visava, precisamente, garantir que os produtos «originários da Birmânia/Mianmar» eram abrangidos pelo âmbito de aplicação deste regulamento mesmo que não fossem importados para a União diretamente da Birmânia/Mianmar, mas através de países terceiros. Ora, esta disposição seria supérflua se se interpretasse o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), ii), deste regulamento no sentido de que todos os produtos que se encontravam num determinado momento na Birmânia/Mianmar — ou seja, mesmo os produtos originários da Birmânia/Mianmar e que já não o são devido a uma transformação ou a uma operação de complemento de fabrico substancial num país terceiro — são abrangidos pelo âmbito de aplicação desta última disposição. |
74 |
Terceiro, resulta do considerando 6 do Regulamento n.o 194/2008 que o seu objetivo era, tendo em conta as graves e repetidas violações dos direitos fundamentais perpetradas pelo regime militar da Birmânia/Mianmar desde há longa data, contribuir, através da renovação e do reforço das medidas restritivas contra este país, para promover o respeito pelos direitos humanos e, assim, proteger a moral pública. Além disso, resulta do considerando 7 deste regulamento que as novas medidas restritivas previstas pelo referido regulamento se centram nos setores que representam fontes de receitas para esse regime militar, aplicando‑se à madeira e aos produtos da madeira. Ora, não resulta destes objetivos do Regulamento n.o 194/2008 que a intenção do legislador da União, quando adotou esse regulamento que visava a Birmânia/Mianmar, fosse sujeitar à proibição de importação prevista no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), do referido regulamento todos os produtos provenientes de países terceiros, produzidos a partir de produtos provenientes da Birmânia/Mianmar. |
75 |
Tendo em conta o que precede, há que responder à segunda questão, que a expressão «exportados da Birmânia/Mianmar», que figura no artigo 2.o, n.o 2, alínea a), ii), do Regulamento n.o 194/2008, deve ser interpretada no sentido de que só estão abrangidos por esta disposição os produtos diretamente importados da Birmânia/Mianmar para a União. |
Quanto à terceira questão
76 |
Com a sua terceira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), do Regulamento n.o 194/2008 deve ser interpretado no sentido de que, quando as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros examinam se esta disposição foi violada, estão vinculadas por certificados de origem emitidos por um país terceiro que indiquem que os produtos em causa são originários desse país. |
77 |
A este respeito, há que salientar que o Regulamento n.o 194/2008 não prevê a obrigação de apresentação de um documento para justificar a origem dos produtos abrangidos por este regulamento. O artigo 2.o, n.o 3, do mesmo dispõe apenas que a origem dos produtos deve ser determinada em conformidade com as disposições aplicáveis do Código Aduaneiro Comunitário. |
78 |
Conforme resulta do artigo 26.o do Código Aduaneiro Comunitário, embora a regulamentação da União disponha que a origem das mercadorias deve ser demonstrada pela apresentação de um documento, essa apresentação não obsta a que, em caso de dúvidas sérias, as autoridades aduaneiras exijam todas as provas complementares para se assegurarem de que a indicação da origem respeita efetivamente as normas aprovadas pela regulamentação da União na matéria. A esse respeito, o Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de que a finalidade da fiscalização a posteriori é verificar a exatidão da origem indicada no certificado de origem (Acórdão de 30 de junho de 2016, Selena România, C‑416/15, EU:C:2016:501, n.o 36 e jurisprudência referida). |
79 |
Daí resulta que o facto de as mercadorias serem acompanhadas de certificados de origem não é suscetível de se opor à cobrança dos direitos devidos pela importação destas mercadorias se, posteriormente a essa importação, esses certificados se tiverem revelado inexatos (Acórdão de 30 de junho de 2016, Selena România, C‑416/15, EU:C:2016:501, n.o 37 e jurisprudência referida). |
80 |
Decorre desta jurisprudência relativa ao artigo 26.o do Código Aduaneiro Comunitário que, mesmo quando existe uma obrigação de apresentação de um documento, como um certificado de origem, para justificar a origem das mercadorias em causa, as autoridades aduaneiras não estão vinculadas por este documento. Isto é tanto mais assim quando essa obrigação não existe. |
81 |
Tendo em conta o que precede, há que responder à terceira questão, que o artigo 2.o, n.o 2, alínea a), i), do Regulamento n.o 194/2008 deve ser interpretado no sentido de que, quando as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros examinam se esta disposição foi violada, não estão vinculadas por certificados de origem emitidos por um país terceiro que indicam que os produtos em causa são originários desse país. |
Quanto às despesas
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Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis. |
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara: |
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Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: alemão.