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Documento 62020CJ0675
Judgment of the Court (Fourth Chamber) of 15 September 2022.#Colin Brown v European Commission.#Appeal – Civil service – Annex VII to the Staff Regulations of Officials of the European Union – Article 4(1)(a) and (b) – EU official who is a national of the United Kingdom of Great Britain and Northern Ireland and who during the 10 years before his entry into service habitually resided within the territory of the State in which he is employed – Withdrawal of the United Kingdom from the European Union – Acquisition by that EU official of the nationality of the State in which he is employed – Withdrawal of the entitlement to receive an expatriation allowance – Action for annulment.#Case C-675/20 P.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 15 de setembro de 2022.
Colin Brown contra Comissão Europeia e Conselho da União Europeia.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Função Pública — Anexo VII do Estatuto dos Funcionários da União Europeia — Artigo 4.°, n.° 1, alíneas a) e b) — Funcionário da União nacional do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte que residiu habitualmente no território do Estado do seu local de afetação nos dez anos que precederam a sua entrada em funções — Saída do Reino Unido da União — Aquisição por este funcionário da União da nacionalidade do Estado do seu local de afetação — Retirada do direito ao pagamento do subsídio de expatriação — Recurso de anulação.
Processo C-675/20 P.
Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 15 de setembro de 2022.
Colin Brown contra Comissão Europeia e Conselho da União Europeia.
Recurso de decisão do Tribunal Geral — Função Pública — Anexo VII do Estatuto dos Funcionários da União Europeia — Artigo 4.°, n.° 1, alíneas a) e b) — Funcionário da União nacional do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte que residiu habitualmente no território do Estado do seu local de afetação nos dez anos que precederam a sua entrada em funções — Saída do Reino Unido da União — Aquisição por este funcionário da União da nacionalidade do Estado do seu local de afetação — Retirada do direito ao pagamento do subsídio de expatriação — Recurso de anulação.
Processo C-675/20 P.
Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2022:686
ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)
15 de setembro de 2022 ( *1 )
«Recurso de decisão do Tribunal Geral — Função Pública — Anexo VII do Estatuto dos Funcionários da União Europeia — Artigo 4.o, n.o 1, alíneas a) e b) — Funcionário da União nacional do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte que residiu habitualmente no território do Estado do seu local de afetação nos dez anos que precederam a sua entrada em funções — Saída do Reino Unido da União — Aquisição por este funcionário da União da nacionalidade do Estado do seu local de afetação — Retirada do direito ao pagamento do subsídio de expatriação — Recurso de anulação»
No processo C‑675/20 P,
que tem por objeto um recurso de um acórdão do Tribunal Geral nos termos do artigo 56.o do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia, interposto em 11 de dezembro de 2020,
Colin Brown, residente em Bruxelas (Bélgica), representado por I. Van Damme, advocaat,
recorrente,
sendo as outras partes no processo:
Comissão Europeia, representada por T. S. Bohr e D. Milanowska, na qualidade de agentes,
recorrida em primeira instância,
Conselho da União Europeia, representado por M. Alver e M. Bauer, na qualidade de agentes,
interveniente em primeira instância,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),
composto por: C. Lycourgos, presidente de secção, S. Rodin, J.‑C. Bonichot, L. S. Rossi (relatora) e O. Spineanu‑Matei, juízes,
advogado‑geral: J. Kokott,
secretário: M. Longar, administrador,
vistos os autos e após a audiência de 2 de fevereiro de 2022,
ouvidas as conclusões da advogada‑geral na audiência de 7 de abril de 2022,
profere o presente
Acórdão
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1 |
Com o presente recurso, Colin Brown, funcionário da Comissão Europeia, pede ao Tribunal de Justiça que anule o Acórdão do Tribunal Geral da União Europeia de 5 de outubro de 2020, Brown/Comissão (T‑18/19, a seguir acórdão recorrido, EU:T:2020:465), pelo qual este negou provimento ao seu recurso de anulação da Decisão da Comissão de 19 de março de 2018 que lhe retirou o direito ao pagamento do subsídio de expatriação e, consequentemente, ao das despesas de viagem entre o seu local de afetação e o seu local de origem, a partir de 1 de dezembro de 2017, depois de ter adquirido a nacionalidade do Estado‑Membro do seu local de afetação (a seguir «decisão controvertida»). |
Quadro jurídico
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2 |
O artigo 1.o‑D, n.o 5, do Estatuto dos Funcionários da União Europeia, na versão aplicável ao litígio que deu origem ao recurso (a seguir «Estatuto»), enuncia: «Sempre que pessoas abrangidas pelo presente Estatuto se considerem lesadas por não lhes ter sido aplicado o princípio da igualdade de tratamento anteriormente enunciado e estabeleçam factos a partir dos quais se possa presumir que existia discriminação direta ou indireta, cabe à instituição o ónus da prova da inexistência de violação do princípio da igualdade de tratamento. […]» |
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3 |
O artigo 4.o do anexo VII do Estatuto dispõe: «1. O subsídio de expatriação do país igual a 16 % do montante total do vencimento‑base, bem como do abono de lar e do abono por filho a cargo, pagos ao funcionário, é concedido:
[…] 2. O funcionário que, não tendo e não tendo tido nunca a nacionalidade do Estado em cujo território esteja situado o seu local de colocação, não preencha as condições previstas no n.o 1 tem direito a um subsídio de residência no estrangeiro igual a um quarto do subsídio de expatriação. 3. Para efeitos de aplicação dos n.os 1 e 2, o funcionário que, pelo casamento, tiver adquirido oficiosamente, sem possibilidade de renúncia, a nacionalidade do Estado em cujo território esteja situado o seu local de colocação, é equiparado ao referido na alínea a), primeiro travessão, do n.o 1.» |
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4 |
O artigo 7.o, n.o 4, do anexo VII do Estatuto prevê que: «O local de origem do funcionário é determinado no momento do início de funções, tendo em conta o local do recrutamento ou, mediante pedido expresso e devidamente fundamentado, o seu centro de interesses. Esta determinação pode ser revista posteriormente, enquanto o interessado estiver em funções ou por ocasião da cessação de funções, através de uma decisão especial da entidade competente para proceder a nomeações. Todavia, enquanto o interessado estiver em funções, tal decisão só pode ter lugar excecionalmente e após apresentação pelo interessado de documentos que justifiquem devidamente o seu pedido.» |
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5 |
O artigo 8.o, n.o 1, do anexo VII do Estatuto enuncia: «Os funcionários que beneficiam do subsídio de expatriação ou de residência no estrangeiro têm direito, dentro dos limites previstos no n.o 2, ao pagamento anual de um montante fixo correspondente às despesas de viagem entre o local de afetação e o local de origem, tal como definidos no artigo 7.o, para si próprio e, no caso dos funcionários que beneficiam do abono de lar, para o cônjuge e pessoas a cargo na aceção do artigo 2.o» |
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6 |
O artigo 20.o, primeiro período, do Estatuto prevê: «O funcionário é obrigado a residir na localidade da sua afetação ou a uma distância tal que não cause estorvo ao exercício das suas funções. […]» |
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7 |
O artigo 85.o, primeiro parágrafo, do Estatuto dispõe: «Qualquer importância recebida indevidamente dá lugar a reposição se o beneficiário tiver tido conhecimento da irregularidade do pagamento ou se a mesma fosse tão evidente que dela não poderia deixar de ter conhecimento.» |
Antecedentes do litígio
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8 |
O Tribunal Geral, nos n.os 1 a 8 do acórdão recorrido, resumiu os factos que deram origem ao litígio, nos seguintes termos: «1. O recorrente, C. Brown, tinha, inicialmente, apenas a qualidade de nacional do Reino Unido [da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte], onde [viveu] até 1996. Estudou em Itália em 1996 e em 1997, depois na Bélgica, de setembro de 1997 a junho de 1998. Em seguida, o recorrente efetuou um estágio na Comissão […] de 1 de outubro de 1998 a 28 de fevereiro de 1999. Por último, trabalhou a tempo inteiro no setor privado na Bélgica de 1 de março de 1999 a 31 de dezembro de 2000. 2. O recorrente entrou em funções na Comissão em 1 de janeiro de 2001. O Serviço “Gestão e Liquidação dos Direitos Individuais” (PMO) da Comissão concedeu‑lhe o subsídio de expatriação ao abrigo do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto […]. 3. […] [O] primeiro‑ministro do Reino Unido, em 29 de março de 2017, notificou o Conselho Europeu da intenção deste Estado‑Membro de se retirar da União e da Comunidade Europeia da Energia Atómica (Euratom), em aplicação do artigo 50.o, n.o 2, TUE. 4. Em 27 de junho de 2017, o recorrente requereu a aquisição da nacionalidade belga, que obteve em 3 de novembro seguinte. Em 19 de janeiro de 2018, notificou esta alteração da situação ao PMO. 5. Em 23 de fevereiro de 2018, o recorrente foi informado, por um lado, de que o subsídio de expatriação lhe era retirado a partir de 31 de outubro de 2017, com o fundamento de que tinha obtido a nacionalidade belga, e, por outro, que perdia igualmente, consequentemente, o benefício do reembolso das despesas de viagem nos termos do artigo 8.o do anexo VII do Estatuto. 6. Na sequência de um pedido de explicação, o recorrente recebeu uma mensagem de correio eletrónico em 5 de março de 2018 da qual resultava que a retirada do subsídio de expatriação se justificava, nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto, pelo facto de residir na Bélgica desde 1997. 7. Em 19 de março de 2018, o PMO substituiu a Decisão de 23 de fevereiro de 2018 pela [decisão controvertida]. 8. Em 17 de junho de 2018, o recorrente apresentou uma reclamação, que foi indeferida por Decisão da Autoridade Investida do Poder de Nomeação […] de 15 de outubro de 2018.» |
Recurso para o Tribunal Geral e acórdão recorrido
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9 |
No âmbito do seu recurso para o Tribunal Geral, o recorrente pretendia, nomeadamente, obter a anulação da decisão controvertida e a condenação da Comissão na reposição do seu direito ao pagamento do subsídio de expatriação, previsto no artigo 4.o do anexo VII do Estatuto (a seguir «subsídio de expatriação»), e ao das despesas de viagem entre o seu local de afetação e o seu local de origem, conforme definido no artigo 7.o deste anexo VII, a partir de 1 de dezembro de 2017. |
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10 |
O recorrente invocou quatro fundamentos para os seus pedidos de anulação, os quais foram julgados improcedentes pelo Tribunal Geral. |
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11 |
No que respeita ao primeiro fundamento do recurso em primeira instância, relativo à violação do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto, o Tribunal Geral, por um lado, declarou, para rematar o raciocínio seguido nos n.os 35 a 51 do acórdão recorrido, que o PMO não tinha violado esta disposição do Estatuto, «ao considerar que a aquisição da nacionalidade do país de afetação [ao longo da sua] carreira devia conduzir ao reexame do direito ao subsídio de expatriação» (n.o 52 do acórdão recorrido). Por outro lado, o Tribunal Geral julgou improcedente a argumentação do recorrente segundo a qual o risco de este, enquanto nacional do Reino Unido, ser «automaticamente exonerado das suas funções» na sequência da saída deste Estado da União consubstanciar um caso de força maior que dispensava o PMO da obrigação de reexaminar a sua situação à luz da nacionalidade belga que tinha obtido (n.os 55 a 71 do acórdão recorrido). |
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12 |
A este respeito, o Tribunal Geral constatou, em substância, que não se pode deduzir da redação do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto, lido à luz da génese desta disposição e do objetivo que prossegue, que a administração é obrigada a continuar a pagar mensalmente o subsídio de expatriação quando ocorre um evento que altera substancialmente a situação da pessoa que dele beneficia tendo em conta as suas condições de atribuição. Ora, a aquisição pelo funcionário em questão da nacionalidade do Estado do seu local de afetação, posteriormente à sua entrada em funções, constitui esse tipo de alteração substancial suscetível de conduzir à retirada do direito ao pagamento desse subsídio. |
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13 |
Quanto ao segundo fundamento invocado em primeira instância pelo recorrente, relativo à violação do princípio da igualdade de tratamento e da não discriminação resultante do reexame da sua situação face aos requisitos previstos no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto, este foi julgado improcedente pelo Tribunal Geral após a análise apresentada nos n.os 75 a 106 do acórdão recorrido. |
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14 |
Mais precisamente, o Tribunal Geral declarou, em substância, que o respeito por esse princípio se impunha não apenas à data da entrada em funções do interessado, mas também no momento do reexame da existência do seu direito ao pagamento do subsídio de expatriação, na sequência de uma alteração da sua situação pessoal. Ora, o Tribunal Geral considerou que, a partir da data em que o recorrente adquiriu a nacionalidade belga, este devia ser tratado da mesma maneira que qualquer outro nacional ou antigo nacional belga, cuja residência habitual na Bélgica, ainda que de curta duração, durante o «período decenal de referência» que precedeu a entrada em funções, bastava para excluir o direito ao pagamento desse subsídio, em aplicação do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto. |
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15 |
No que se refere ao terceiro fundamento invocado em primeira instância, pelo qual o recorrente censurava a Comissão por esta ter violado o princípio da igualdade de tratamento e da não discriminação ao adotar a interpretação que tinha dado, na decisão controvertida, ao artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto, o Tribunal Geral sublinhou, nos n.os 112 e 113 do acórdão recorrido, que a interpretação preconizada pelo recorrente era incompatível com a própria redação desta disposição e com o seu alcance, pelo que só podia ser julgada improcedente. |
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16 |
Extraindo as devidas consequências destas considerações, o Tribunal Geral também julgou improcedente o quarto fundamento invocado em primeira instância pelo recorrente, a título subsidiário, relativo à exceção de ilegalidade do artigo 4.o, n.o 1, do anexo VII do Estatuto, e julgou improcedentes os outros pedidos apresentados e, por conseguinte, negou, na íntegra, provimento ao recurso (n.os 123 a 132 do acórdão recorrido). |
Pedidos das partes e tramitação do processo no Tribunal de Justiça
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17 |
Com o presente recurso, o recorrente pede ao Tribunal de Justiça que:
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18 |
A Comissão e o Conselho da União Europeia concluem pedindo que seja negado provimento ao recurso e que o recorrente seja condenado nas despesas. |
Quanto ao presente recurso
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19 |
O recorrente invoca dois fundamentos de recurso. O primeiro fundamento é relativo à interpretação errada do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto. O segundo fundamento é relativo à discriminação injustificada que resulta da aplicação pelo Tribunal Geral do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto. |
Quanto ao primeiro fundamento, relativo à interpretação errada do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto
Argumentação das partes
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20 |
O recorrente sustenta que o Tribunal Geral cometeu um erro de direito na interpretação do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto, ao considerar que esta disposição permite ou exige a supressão do direito de um funcionário ao pagamento do subsídio de expatriação pelo facto de este ter obtido a nacionalidade do Estado do seu local de afetação, sem que se tenha verificado uma mudança de Estado. |
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21 |
O recorrente começa por alegar que subscreve plenamente a premissa do raciocínio do Tribunal Geral, exposta nos n.os 47 a 50 do acórdão recorrido, no que diz respeito ao objetivo do subsídio de expatriação, que consiste em compensar os inconvenientes e os encargos que um funcionário sofre devido à distância entre o Estado do seu local de afetação e o Estado do seu local de origem. |
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22 |
A necessidade de prover uma compensação ao longo da carreira de um funcionário, no Estado em que assumiu funções, é evidente, uma vez que os custos e inconvenientes subsistem mesmo que esse funcionário tenha estado expatriado durante toda a sua carreira e tenha criado vários tipos de laços com o Estado do seu local de afetação. Pelo contrário, como indicou o Tribunal Geral no n.o 47 do acórdão recorrido, esses custos e inconvenientes são até suscetíveis de se agravar. |
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23 |
Segundo o recorrente, a ligação entre o Estado do local de origem do funcionário em questão aquando do seu recrutamento e o direito ao pagamento do subsídio de expatriação explica por que razão é que a redação do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto, por um lado, assenta unicamente nos períodos que precedem a entrada em funções desse funcionário e não sobre os acontecimentos que podem ocorrer após essa entrada em funções e, por outro lado, utiliza o presente do conjuntivo na expressão «não tenha e não tiver tido nunca a nacionalidade do Estado do local de afetação», o que implica que a nacionalidade do referido funcionário à data da sua entrada em funções deve ser tomada em consideração. |
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24 |
O erro de direito que vicia o acórdão recorrido decorre do facto de o Tribunal Geral ter conduzido, pelo seu raciocínio, a um resultado que é incompatível com a razão de ser do subsídio de expatriação, como foi exposto nos n.os 47 a 50 do acórdão recorrido, ou seja, que esse subsídio deve ser atribuído com base nas circunstâncias existentes à data da entrada em funções do funcionário em questão e que o direito ao seu pagamento não pode ser retirado em seguida, salvo se o interessado mudar de local de afetação. |
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25 |
O Tribunal Geral admitiu, aliás, nos n.os 36 e 50 do acórdão recorrido, que a integração do funcionário em questão no Estado do seu local de afetação, após a sua entrada em funções, não é pertinente para o direito ao pagamento do subsídio de expatriação. |
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26 |
Na opinião do recorrente e contrariamente ao que o Tribunal Geral declarou no n.o 51 do acórdão recorrido, foi deliberadamente que o legislador da União não abordou a questão da mudança de nacionalidade após o recrutamento do funcionário em questão. Ora, a única conclusão a retirar daí, tendo em conta a razão de ser do subsídio de expatriação, é que a aquisição de uma nova nacionalidade após a entrada em funções do interessado não pode constituir um motivo para retirar o direito ao pagamento do subsídio de expatriação se este preencher inicialmente as condições exigidas. |
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27 |
Tal interpretação é, além disso, confirmada pela conclusão do Tribunal Geral, constante do n.o 49 do acórdão recorrido, segundo a qual o subsídio de expatriação tem por objetivo incitar o recrutamento numa base geográfica tão ampla quanto possível. Este subsídio não pode, portanto, ser reexaminado após a entrada em funções do interessado. |
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28 |
O recorrente acrescenta, na réplica, fazendo referência ao termo «ficção», utilizado no n.o 85 do acórdão recorrido, que o artigo 4.o, n.o 1, do anexo VII do Estatuto deve ser interpretado de modo a evitar a aplicação de tal «ficção», que consiste em considerar que a mudança de nacionalidade de um funcionário ocorreu retroativamente na data da sua entrada em funções. Com efeito, à data da adoção do artigo 4.o, n.o 1, do anexo VII do Estatuto, o legislador da União tinha perfeita consciência das situações de dupla nacionalidade ou de aquisição de uma nova nacionalidade. No entanto, não previu expressamente que o direito ao pagamento do subsídio de expatriação fosse retirado nessas circunstâncias. |
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29 |
Além disso, o recorrente estima que, se os critérios previstos no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto fossem aplicados após a entrada em funções do funcionário em questão, a duração da residência no Estado do local de afetação deveria então ser tomada em consideração. Ora, na medida em que uma mudança de residência do interessado após a sua entrada em funções — sendo o requisito de residência o mais importante dos dois requisitos para avaliar a necessidade de subsídio, sendo secundário o requisito da nacionalidade — não implica uma reavaliação da necessidade de subsídio, o mesmo deveria acontecer com uma mudança de nacionalidade do interessado. Segundo o recorrente, ou um funcionário teve de deixar o Estado do seu local de residência para entrar em funções ou aí pôde permanecer. Assim, os requisitos de atribuição do direito ao pagamento do subsídio de expatriação baseiam‑se inteiramente na situação que precede a entrada em funções do interessado. |
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30 |
A Comissão, apoiada pelo Conselho, considera que o primeiro fundamento de recurso deve ser julgado improcedente. |
Apreciação do Tribunal de Justiça
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31 |
A título preliminar, importa salientar que o recorrente não criticou o raciocínio seguido nos n.os 55 a 73 do acórdão recorrido, após o qual o Tribunal Geral julgou improcedente a argumentação de que o recorrente teria sido obrigado a requerer a nacionalidade belga na perspetiva da eventual saída do Reino Unido da União. |
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32 |
Daqui resulta que o exame do primeiro fundamento de recurso deve partir do postulado de que o recorrente, tendo tido apenas a nacionalidade britânica à data da sua entrada em funções na Comissão em 2001, adquiriu voluntariamente a nacionalidade do Estado do seu local de afetação ao longo da carreira, em novembro de 2017. |
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33 |
Há que recordar que o subsídio de expatriação previsto no artigo 4.o, n.o 1, do anexo VII do Estatuto, que é calculado, nomeadamente, tendo como referência o montante do vencimento de base do funcionário em questão, constitui um elemento da remuneração deste, pago mensalmente. |
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34 |
A atribuição, no quadro do direito da Função Pública da União, de tal elemento de remuneração não pode criar direitos adquiridos de modo que exclua a sua eventual revogação (v., neste sentido, Acórdão de 9 de março de 1978, Herpels/Comissão, 54/77, EU:C:1978:45, n.o 39). Por conseguinte, foi acertadamente, sem que tal seja aliás contestado pelo recorrente, que o Tribunal Geral declarou, em substância, no n.o 38 do acórdão recorrido, que não resulta de modo nenhum das disposições do Estatuto, em especial do artigo 4.o, n.o 1, do anexo VII, que a atribuição do direito ao pagamento do subsídio de expatriação constitua um direito adquirido. |
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35 |
Foi também corretamente que, no n.o 37 do acórdão recorrido, o Tribunal Geral deduziu do acórdão citado no número anterior que, uma vez que o subsídio de expatriação é pago mensalmente, a administração não pode continuar a pagá‑lo quando ocorre um evento que modifica substancialmente a situação da pessoa que dele beneficia, na medida em que esse acontecimento tem incidência nos requisitos a que está sujeita a atribuição do direito ao pagamento desse subsídio. |
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36 |
Sem criticar formalmente o mérito desta constatação, o recorrente alega, porém, que o Tribunal Geral considerou erradamente que a aquisição, ao longo da carreira, por um funcionário, da nacionalidade do Estado do seu local de afetação tem incidência sobre os requisitos de atribuição do direito ao pagamento do subsídio de expatriação, previstos no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto. Segundo o recorrente, estes requisitos, excetuando a hipótese da mudança de Estado do lugar de afetação do interessado, têm apenas de estar preenchidos antes da entrada em funções deste. |
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37 |
A este respeito, importa recordar que, segundo o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto, o subsídio de expatriação é atribuído ao funcionário, nos termos do primeiro travessão desta disposição, «que não tenha e não tiver tido nunca a nacionalidade do Estado em cujo território está situado o local da sua afetação» e, conforme o seu segundo travessão, «que não tenha, habitualmente, durante um período de cinco anos expirando seis meses antes do início de funções, residido ou exercido a sua atividade profissional no território europeu do referido Estado». |
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38 |
À luz da redação do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto, o direito ao subsídio de expatriação só é atribuído ao funcionário que preencha os dois requisitos cumulativos negativos previstos nesta disposição (Despacho de 6 de julho de 2021, Karpeta‑Kovalyova/Comissão, C‑717/20 P, não publicado, EU:C:2021:542, n.o 11), em que o primeiro, que figura no primeiro travessão, exige que esse funcionário não tenha, e nunca tenha tido, a nacionalidade do Estado em cujo território está situado o seu local de afetação. |
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39 |
Se, como alega o recorrente, o requisito segundo o qual o funcionário em questão que «não tenha e não tiver tido nunca a nacionalidade» do Estado do seu local de afetação devesse ser apreciado unicamente na data da entrada em funções do interessado, e não ao longo da sua carreira, esta disposição, na qual é utilizado o presente do conjuntivo e que diz respeito a um elemento da remuneração desse funcionário pago mensalmente, teria necessariamente sido redigido de maneira diferente, como o Tribunal Geral corretamente referiu no n.o 45 do acórdão recorrido. |
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40 |
Assim, a redação da referida disposição não se limitou a fazer referência à data da «entrada em funções» do interessado unicamente para efeitos da apreciação do preenchimento do segundo requisito, igualmente negativo, de aplicação do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto, a saber, a inexistência de residência habitual ou de atividade profissional no território do Estado do local de afetação do interessado durante o «período quinquenal de referência» que expira seis meses antes dessa data. Pelo contrário, foi feita, necessariamente, referência a esta data a fim de examinar o preenchimento do primeiro requisito, segundo o qual o funcionário em questão não deve ter a nacionalidade desse Estado. |
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41 |
A redação das outras disposições do artigo 4.o do anexo VII do Estatuto e a economia deste artigo corroboram a análise segundo a qual este primeiro requisito, relativo a não ter a nacionalidade do Estado do local de afetação, não se limita a visar a nacionalidade que o funcionário em questão tinha antes da sua entrada em funções. |
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42 |
Com efeito, por um lado, por força do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), deste anexo, o direito ao pagamento do subsídio de expatriação também pode ser atribuído ao funcionário «que tendo ou tendo tido a nacionalidade» do Estado do seu local de afetação preencha os outros requisitos desta disposição. Além disso, há que salientar que o subsídio de residência no estrangeiro, referido no artigo 4.o, n.o 2, do referido anexo, só é atribuído ao funcionário «que não tenha nem tiver tido nunca a nacionalidade do Estado em cujo território está situado o local da sua afetação» e que não preencha os outros requisitos previstos para beneficiar do subsídio de expatriação. Assim, nenhuma destas disposições sugere que o requisito relativo a ter ou não ter a nacionalidade do Estado do local de afetação do funcionário em questão se refere unicamente à nacionalidade desse funcionário à data da sua entrada em funções nas instituições da União. |
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43 |
Por outro lado, quanto à economia do artigo 4.o do anexo VII do Estatuto, importa salientar que, por força do artigo 4.o, n.o 3, deste anexo, o funcionário que, por casamento, tiver adquirido oficiosamente, sem possibilidade de renúncia, a nacionalidade do Estado em cujo território esteja situado o seu local de afetação, «é equiparado» ao referido na alínea a), primeiro travessão, do n.o 1 do referido anexo. Este artigo 4.o, n.o 3, inserido no Estatuto na sequência dos Acórdãos de 20 de fevereiro de 1975, Airola/Comissão (21/74, EU:C:1975:24), e de 20 de fevereiro de 1975, Van den Broeck/Comissão (37/74, EU:C:1975:25), neutraliza assim os efeitos da aquisição oficiosa, pelo casamento, da nacionalidade do Estado do local de afetação do funcionário em questão quando este último não pode renunciar ao mesmo. |
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44 |
Ora, o artigo 4.o, n.o 3, do anexo VII do Estatuto ficaria privado de efeito útil se a disposição para a qual remete se referisse apenas à aquisição da nacionalidade do Estado do local de afetação do funcionário em questão antes da entrada em funções deste. Com efeito, sendo o objeto do artigo 4.o, n.o 3, deste anexo, com o objetivo de garantir o respeito pelo princípio da não discriminação, evitar que a um funcionário seja retirado o direito ao pagamento do subsídio de expatriação pela administração na sequência da aquisição, pelo casamento, da nacionalidade do Estado do seu local de afetação sem renúncia possível, esta disposição, tal como o artigo 4.o, n.o 1, alínea a), primeiro travessão, do anexo VII do Estatuto para o qual remete, deve ser aplicável mesmo quando essa nacionalidade tenha sido adquirida após a entrada em funções do interessado. |
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45 |
Por outro lado, acolher as críticas do recorrente contra a interpretação do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto, adotada no acórdão recorrido, equivaleria, em caso de aquisição pelo funcionário em questão da nacionalidade do Estado do seu local de afetação após a sua entrada em funções, a considerar a nacionalidade de origem desse funcionário como sendo a única «nacionalidade efetiva» deste, o que foi expressamente afastado pelo Tribunal de Justiça no Acórdão de 14 de dezembro de 1979, Devred/Comissão (257/78, EU:C:1979:294, n.o 14). |
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46 |
É certo que a integração do funcionário em questão no Estado do seu local de afetação, após a sua entrada em funções, é indiferente no que diz respeito à aplicação do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), segundo travessão, do anexo VII do Estatuto. É também verdade que, como o Tribunal de Justiça tem repetidamente afirmado, o subsídio de expatriação se destina a compensar os encargos e as desvantagens especiais resultantes da entrada em funções nas instituições da União de funcionários que, por este facto, são obrigados a transferir a sua residência (v., neste sentido, Acórdão de 15 de setembro de 1994, Magdalena Fernández/Comissão, C‑452/93 P, EU:C:1994:332, n.o 20, e Despacho de 6 de julho de 2021, Karpeta‑Kovalyova/Comissão, C‑717/20 P, não publicado, EU:C:2021:542, n.o 4). |
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47 |
Todavia, estas considerações não significam que, mesmo que o requisito relativo à nacionalidade do funcionário em questão seja considerado a título secundário (v., nomeadamente, neste sentido, Acórdão de 15 de janeiro de 1981, Vutera/Comissão, 1322/79, EU:C:1981:6, n.o 6), a aplicação deste requisito deva necessariamente abstrair‑se de acontecimentos tais como a mudança de nacionalidade ocorrida após a entrada em funções do funcionário em questão. |
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48 |
É também exato, como o Tribunal Geral salientou no n.o 47 do acórdão recorrido, que os encargos e desvantagens resultantes da entrada em funções nas instituições da União são suscetíveis de perdurar para os funcionários que, à semelhança do recorrente, adquiriram voluntariamente, ao longo da carreira, a nacionalidade do Estado do seu local de afetação. |
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49 |
Não deixa de ser verdade que o Estatuto não ignora tal situação, uma vez que o subsídio de expatriação não é automaticamente excluído para o futuro nessa hipótese. Com efeito, apesar da alteração substancial da situação pessoal do funcionário em questão, decorrente da aquisição da nacionalidade do Estado do seu local de afetação, o Estatuto permite que esse funcionário conserve, sob determinados requisitos, o direito a esse subsídio, já não com fundamento no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII, mas em aplicação do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), deste. |
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50 |
Embora seja verdade, como o recorrente alega e como, aliás, sublinhou o Tribunal Geral no n.o 76 do acórdão recorrido, que os requisitos de aplicação do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto são interpretados pelo juiz da União de maneira mais restritiva do que os do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), segundo travessão, deste, importa salientar que o recorrente não formulou, porém, nenhuma crítica a essa diferença, tal como não critica o Tribunal Geral por ter julgado improcedente, nos n.os 125 a 127 do acórdão recorrido, a exceção de ilegalidade do artigo 4.o, n.o 1, do anexo VII do Estatuto, que deduziu, a título subsidiário, em primeira instância. |
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Por conseguinte, foi corretamente que o Tribunal Geral interpretou o artigo 4.o, n.o 1, do anexo VII do Estatuto no sentido de que um funcionário que, após a sua entrada em funções, adquire a nacionalidade do Estado do seu local de afetação, perde, no futuro, o direito ao subsídio de expatriação que lhe tinha sido atribuído com base no artigo 4.o, n.o 1, alínea a), do anexo VII do Estatuto, o que implica que o direito ao pagamento desse subsídio desse funcionário seja reexaminado pela administração, como o Tribunal Geral declarou no n.o 52. |
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52 |
Daqui decorre que o primeiro fundamento do recurso deve ser julgado improcedente. |
Quanto ao segundo fundamento, relativo à discriminação injustificada que resulta da aplicação pelo Tribunal Geral do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto
Argumentação das partes
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O recorrente alega que o Tribunal Geral não examinou corretamente a argumentação que tinha invocado em primeira instância, segundo a qual a aplicação do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto aos funcionários que adquiriram, após a sua entrada em funções, a nacionalidade do Estado do seu local de afetação, é discriminatória. |
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Na opinião do recorrente, o Tribunal Geral não analisou corretamente, por um lado, as diferentes situações em presença e, por outro, a questão de saber se a discriminação que devia ter identificado podia ser objetivamente justificada. |
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Tendo em conta o objetivo do subsídio de expatriação, o recorrente sustenta que os funcionários que adquirem a nacionalidade do Estado do seu local de afetação ao longo da carreira e os funcionários que tinham essa nacionalidade à data da sua entrada em funções, conforme identificados nos n.os 87 e 89 do acórdão recorrido, constituem duas categorias de funcionários bem distintas. Estas duas categorias de funcionários são, com efeito, afetadas de maneira diferente pelo afastamento do seu local de origem. |
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Ora, o Tribunal Geral não abordou, em nenhuma fase da sua análise, a existência das referidas duas categorias de funcionários nem considerou as consequências de um tratamento idêntico destas. O Tribunal Geral limitou‑se a equiparar erradamente, nos n.os 87 a 89 do acórdão recorrido, a categoria dos funcionários que adquiriram a nacionalidade do Estado do seu local de afetação depois da sua entrada em funções com a dos funcionários que tinham, ou tinham tido, essa nacionalidade antes da sua entrada em funções. |
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Se o Tribunal Geral tivesse distinguido estas duas categorias de funcionários, teria constatado que, com base na «ficção» adotada na decisão controvertida, estas eram tratadas da mesma maneira e estavam sujeitas à mesma «presunção iuris tantum» da existência de laços estreitos com o local de afetação nos dez anos que precederam a sua entrada em funções, presunção que só pode ser ilidida se for demonstrada a inexistência de qualquer período de residência habitual no Estado do local de afetação do funcionário em questão durante esses dez anos. |
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Segundo o recorrente, o acórdão recorrido está, assim, viciado por uma violação do princípio da igualdade de tratamento, uma vez que a categoria dos funcionários que não adquiriram a nacionalidade do Estado do seu local de afetação antes ou durante os referidos dez anos é injustamente sujeita a esta «presunção iuris tantum». |
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O recorrente acrescenta, na réplica, que a interpretação e a aplicação do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto não deve decorrer de uma «ficção», que consiste em que a mudança de nacionalidade do funcionário em questão seja considerada como tendo ocorrido retroativamente à data de entrada em funções do interessado. Tal abordagem não teria sentido, pois equivaleria a verificar, para a atribuição do direito ao pagamento do subsídio de expatriação, se esse funcionário quebrou, durante esses mesmos dez anos, qualquer vínculo com o Estado de que não tinha a nacionalidade. Ora, por definição, um vínculo que não existia não pode ser quebrado. |
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Acresce que, esta «ficção» implica uma «deslocação das categorias». Por outras palavras, em resposta à argumentação do recorrente relativa à violação do princípio da igualdade de tratamento, o Tribunal Geral, à semelhança da Comissão, «deslocou o recorrente de uma categoria para outra». Ora, segundo o recorrente, nenhuma crítica relativa a discriminação poderia vingar se fosse possível, à semelhança do Tribunal Geral no acórdão recorrido, alterar ficticiamente uma categorização com vista a suprimir a diferença de tratamento entre as categorias em apreço. |
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61 |
No entender do recorrente, a diferença de tratamento posta assim em evidência não pode ser justificada pelo objetivo subjacente à atribuição do direito ao pagamento do subsídio de expatriação, apesar de esse objetivo ter sido corretamente recordado nos n.os 47 a 50 do acórdão recorrido. |
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A este respeito, o facto de, como o Tribunal Geral indicou no n.o 86 do acórdão recorrido, o subsídio de expatriação poder ser pago durante todo o período de exercício das funções não é pertinente. Sem contestar a exatidão desta afirmação, o recorrente alega que há que distinguir o gozo de uma vantagem estatutária da base jurídica em que esta assenta. Uma vez que o direito ao pagamento do subsídio de expatriação foi determinado com base nas circunstâncias existentes durante o período que precedeu a entrada em funções do funcionário em questão, foi a avaliação desse período e a decisão relativa à recusa de atribuir o direito ao pagamento desse subsídio que estiveram na origem da discriminação. O n.o 86 do acórdão recorrido é, aliás, incoerente com a afirmação feita, nomeadamente, no n.o 47 desse acórdão, segundo a qual o referido subsídio é pago para compensar o afastamento do interessado do seu lugar de origem, o que se mantém ao longo de toda a carreira do funcionário em questão. |
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Ao não analisar o objetivo do subsídio de expatriação quando apreciou a crítica relativa à violação do princípio da igualdade de tratamento, o Tribunal Geral cometeu um erro de direito. De resto, o exame das estatísticas comunicadas pelas instituições da União, efetuado nos n.os 93 a 97 do acórdão recorrido, é, a este respeito, desprovido de pertinência do ponto de vista jurídico. |
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Foi também erradamente que o Tribunal Geral não aplicou o artigo 1.o‑D, n.o 5, do Estatuto e que, portanto, decidiu que não cabia à Comissão cumprir a obrigação de justificar qualquer diferença de tratamento. |
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A Comissão e o Conselho alegam que o segundo fundamento de recurso deve ser julgado improcedente. |
Apreciação do Tribunal de Justiça
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Cabe salientar que, segundo jurisprudência constante, o princípio da igualdade de tratamento exige que situações comparáveis não sejam tratadas de maneira diferente e que situações diferentes não sejam tratadas de maneira igual, a menos que esse tratamento seja objetivamente justificado (Acórdão de 25 de março de 2021, Alvarez y Bejarano e o./Comissão, C‑517/19 P e C‑518/19 P, EU:C:2021:240, n.o 52 e jurisprudência referida). |
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Nos termos do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto, o subsídio de expatriação é pago «ao funcionário que tendo ou tendo tido a nacionalidade do Estado em cujo território está situado o local da sua afetação, tenha, habitualmente, durante um período de dez anos expirando à data do início de funções, residido fora do território europeu do dito Estado, por motivo diferente do exercício de funções num serviço de qualquer Estado ou organização internacional». |
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Por conseguinte, quando um funcionário «que [tenha] ou [tenha] tido» a nacionalidade do Estado do seu local de afetação, deve, para beneficiar do subsídio de expatriação, preencher os requisitos previstos no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto. |
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69 |
É certo que, no caso de um funcionário que, como o recorrente, adquiriu voluntariamente a nacionalidade do Estado do seu local de afetação ao longo da carreira, a aplicação destes requisitos equivale a verificar, como o recorrente indica com razão, se, durante o período de dez anos que precedeu a entrada em funções do interessado, este residia habitualmente fora do território europeu desse Estado. |
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70 |
Com efeito, o artigo 4.o, n.o 1, do anexo VII do Estatuto não prevê nenhuma outra situação em que um funcionário que tem ou teve a nacionalidade do Estado do seu local de afetação, na aceção da alínea b) desta disposição, tenha o direito de obter o pagamento do subsídio de expatriação. |
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71 |
Dito isto, por um lado, como foi precisado no n.o 50 do presente acórdão, o recorrente não contesta a apreciação, que figura no n.o 76 do acórdão recorrido, segundo a qual, no que respeita aos funcionários que têm a nacionalidade do Estado do seu local de afetação, a circunstância de aí terem mantido ou estabelecido a sua residência habitual, ainda que por um período muito curto durante o «período decenal de referência», é suficiente para implicar a recusa ou a perda do benefício do subsídio de expatriação. |
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72 |
Por outro lado, importa precisar que, para efeitos da apreciação do seu direito de beneficiar deste subsídio, o recorrente só foi equiparado aos funcionários que têm a nacionalidade do Estado do seu local de afetação a partir da data em que ele próprio adquiriu, voluntariamente, essa nacionalidade, e não antes dessa data. |
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73 |
Todavia, o recorrente alega que, mesmo a partir da referida data, se encontra numa situação objetivamente diferente da de um funcionário que tem, antes mesmo da sua entrada em funções, a nacionalidade do Estado do seu local de afetação, na medida em que o seu local de origem permanece fixado na Escócia. |
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74 |
Tal argumentação equivale a ignorar que, enquanto, por força do artigo 7.o, n.o 4, do anexo VII do Estatuto, o local de origem do funcionário em questão é determinado na data do recrutamento do interessado e que a alteração desse local só pode ocorrer, enquanto o interessado estiver em funções, a título excecional, mediante pedido devidamente fundamentado deste, a atribuição do direito ao pagamento do subsídio de expatriação responde a critérios diferentes e que este direito deve, na hipótese de uma alteração substancial de circunstâncias ocorrida posteriormente à entrada em funções do interessado, ser reexaminado pela administração, independentemente de um pedido deste. |
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75 |
As disposições do Estatuto relativas à determinação e à alteração do local de origem não são, consequentemente, pertinentes para distinguir objetivamente a situação do recorrente da de outro funcionário que tem ou teve a nacionalidade do Estado do seu local de afetação antes da sua entrada em funções, no quadro da aplicação do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto. |
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76 |
Portanto, para efeitos da apreciação do seu direito a beneficiar do subsídio de expatriação e como o Tribunal Geral constatou, em substância, no n.o 87 do acórdão recorrido, a única categoria de funcionários com a qual o recorrente pode ser objetivamente comparado, após ter adquirido a nacionalidade belga, é com a dos funcionários que já têm esta nacionalidade. |
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77 |
Com efeito, continuar, após a sua naturalização no Estado do seu local de afetação, a equiparar o recorrente, como este pretende, aos funcionários que não têm e nunca tiveram a nacionalidade desse Estado, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, alínea a), primeiro travessão, do anexo VII do Estatuto, equivaleria a ignorar as categorias concretas estabelecidas no artigo 4.o deste anexo VII, entre as quais a prevista no artigo 4.o, n.o 3, do referido anexo. |
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A situação do recorrente é, definitivamente, comparável à de um funcionário que, apesar de ter tido a possibilidade de fazer uso da faculdade de renunciar à nacionalidade do Estado do seu local de afetação, adquirida oficiosamente na sequência do seu casamento com um nacional desse Estado, decidiu voluntariamente manter essa nacionalidade, o que leva a aplicar a esse funcionário os requisitos previstos no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto (v., neste sentido, Acórdão de 14 de dezembro de 1979, Devred/Comissão, 257/78, EU:C:1979:294, n.os 12 e 14) |
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79 |
Por conseguinte, não aplicar o artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto à situação do recorrente a partir da data em que este adquiriu a nacionalidade belga conduziria a tratá‑lo, sem justificação objetiva, mais favoravelmente do que os funcionários que, apesar de terem podido renunciar à nacionalidade do Estado do seu local de afetação, adquirida oficiosamente pelo casamento, optaram por conservar essa nacionalidade ou, como o Tribunal Geral observou no n.o 87 do acórdão recorrido, tratá‑lo de maneira mais favorável do que os cidadãos belgas por nascimento, que entraram em funções numa instituição da União com sede na Bélgica, que tiveram de preencher os requisitos rigorosos impostos por esta disposição para poderem beneficiar do subsídio de expatriação ao longo da sua carreira. |
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Além disso, importa recordar que a reapreciação da situação pessoal de um funcionário, como a do recorrente, em aplicação do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto, a partir da data em que o interessado adquiriu a nacionalidade do Estado do seu local de afetação, não implica automaticamente a retirada do seu direito ao pagamento do subsídio de expatriação para o futuro. Com efeito, na sequência dessa reapreciação, esse funcionário só deixa de receber esse subsídio se se constatar que residiu habitualmente no território europeu desse Estado durante o período de dez anos que precedeu a sua entrada em funções. |
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81 |
Ora, embora o recorrente, ao longo de todo o processo contencioso, nunca tenha alegado que não tinha efetivamente residido habitualmente na Bélgica, pelo menos, em relação a uma parte do «período decenal de referência», afigura‑se que, de maneira geral, o segundo requisito previsto no artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto será mais facilmente preenchido por um funcionário naturalizado ao longo da sua carreira do que por um funcionário que tenha a nacionalidade do Estado do seu lugar de afetação desde o seu nascimento ou que a tenha adquirido antes da sua entrada em funções e que se possa presumir que manteve laços múltiplos e estreitos com este Estado. |
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82 |
Por conseguinte, ao concluir, em substância, no n.o 97 do acórdão recorrido, que o recorrente deve, para continuar a ter direito ao subsídio de expatriação a partir da data em que adquiriu voluntariamente a nacionalidade do Estado do seu local de afetação, preencher os requisitos do artigo 4.o, n.o 1, alínea b), do anexo VII do Estatuto, à semelhança de qualquer funcionário que tem essa nacionalidade, o Tribunal Geral não violou o princípio da igualdade de tratamento. |
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83 |
Daqui decorre que o segundo fundamento deve ser julgado improcedente. |
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84 |
Tendo em conta todas as considerações precedentes, dado que nenhum dos fundamentos de recurso foi julgado procedente, deve ser negado provimento ao recurso, na íntegra. |
Quanto às despesas
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85 |
Por força do artigo 184.o, n.o 2, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, se o recurso for julgado improcedente, o Tribunal de Justiça decide sobre as despesas. |
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86 |
Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, deste regulamento de processo, aplicável aos processos de recursos de decisões do Tribunal Geral por força do artigo 184.o, n.o 1, deste, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. |
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87 |
No caso em apreço, tendo o recorrente ficado vencido, há que condená‑lo a suportar, além das suas próprias despesas, nas despesas da Comissão, em conformidade com o requerido por esta. |
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88 |
Por força do artigo 184.o, n.o 4, do referido regulamento de processo, quando um interveniente em primeira instância não tenha ele próprio interposto o recurso da decisão do Tribunal Geral, só pode ser condenado nas despesas do processo de recurso se tiver participado na fase escrita ou oral do processo no Tribunal de Justiça. Quando participe no processo, o Tribunal de Justiça pode decidir que essa parte suporte as respetivas despesas. |
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89 |
No presente caso, tendo o Conselho, interveniente em primeira instância, participado no processo no Tribunal de Justiça, sem ser o autor do recurso, importa decidir que suportará as suas próprias despesas. |
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Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) decide: |
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Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: inglês.