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Este documento é um excerto do sítio EUR-Lex

Documento 62019CJ0213

Acórdão do Tribunal de Justiça (Grande Secção) de 8 de março de 2022.
Comissão Europeia contra Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte.
Incumprimento de Estado — Artigo 4.o, n.° 3, TUE — Artigo 310.o, n.° 6, e artigo 325.° TFUE — Recursos próprios — Direitos aduaneiros — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Proteção dos interesses financeiros da União Europeia — Luta contra a fraude — Princípio da efetividade — Obrigação de os Estados‑Membros colocarem à disposição da Comissão Europeia recursos próprios — Responsabilidade financeira dos Estados‑Membros em caso de perdas de recursos próprios — Importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China — Fraude vasta e sistémica — Criminalidade organizada — Importadores inadimplentes — Valor aduaneiro — Subavaliação — Matéria coletável do IVA — Inexistência de controlos aduaneiros sistemáticos baseados numa análise de risco e efetuados antes da autorização de saída das mercadorias em causa — Inexistência de constituição sistemática de garantias — Método utilizado para calcular o montante das perdas de recursos próprios tradicionais relativas às importações que apresentam um risco significativo de subavaliação — Método estatístico baseado nos preços médios estabelecidos à escala da União — Admissibilidade.
Processo C-213/19.

Coletânea da Jurisprudência — Coletânea Geral

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2022:167

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção)

8 de março de 2022 ( *1 )

Índice

 

I. Quadro jurídico

 

A. Direito em matéria de recursos próprios

 

1. Decisões relativas ao sistema de recursos próprios

 

2. Regulamentos relativos aos métodos e ao procedimento para a colocação à disposição dos recursos próprios

 

3. Regulamento n.o 608/2014

 

4. Regulamento n.o 1553/89

 

B. Direito aduaneiro

 

1. Código Aduaneiro Comunitário

 

2. Código Aduaneiro da União

 

3. Regulamento de aplicação

 

4. Regulamento de Execução

 

C. Direito em matéria de IVA

 

II. Matéria de facto e procedimento pré‑contencioso

 

A. Factos na origem do litígio

 

B. Procedimento précontencioso

 

III. Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

 

IV. Quanto à ação

 

A. Quanto à admissibilidade

 

1. Quanto à violação dos direitos de defesa do Reino Unido durante o procedimento pré‑contencioso e no âmbito do processo no Tribunal de Justiça

 

a) Argumentos das partes

 

b) Apreciação do Tribunal de Justiça

 

2. Quanto à insuficiência da base factual e jurídica da acusação relativa a uma violação do direito da União em matéria de IVA, em especial, no que respeita ao regime aduaneiro 42

 

a) Argumentos das partes

 

b) Apreciação do Tribunal de Justiça

 

3. Quanto à violação dos princípios da proteção da confiança legítima, da segurança jurídica, do estoppel e da cooperação leal

 

a) Argumentos das partes

 

b) Apreciação do Tribunal de Justiça

 

4. Quanto à incompetência do Tribunal de Justiça, no âmbito de um processo por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, para conhecer de um pedido da Comissão destinado a ordenar a um Estado‑Membro que disponibilize um determinado montante de recursos próprios

 

a) Argumentos das partes

 

b) Apreciação do Tribunal de Justiça

 

5. Quanto ao caráter prematuro e à inadmissibilidade da petição no que respeita ao período compreendido entre 1 de maio de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive devido à emissão dos avisos C 18 Breach relativos a esse período

 

a) Argumentação das partes

 

b) Apreciação do Tribunal de Justiça

 

B. Quanto ao mérito

 

1. Quanto ao incumprimento das obrigações em matéria de proteção dos interesses financeiros da União e de luta contra a fraude, assim como das obrigações decorrentes do direito aduaneiro da União

 

a) Quanto à violação do artigo 310.o, n.o 6, TFUE e do artigo 325.o TFUE

 

1) Quanto às obrigações impostas aos Estados‑Membros por força do artigo 325.o TFUE

 

2) Quanto à violação das obrigações impostas pelo artigo 325.o TFUE

 

i) Observações preliminares

 

ii) Recapitulação das características essenciais da fraude por subavaliação em causa

 

iii) Quanto ao conhecimento pelo Reino Unido, desde o início do período da infração, das características essenciais da fraude por subavaliação em causa e das medidas eficazes para a combater

 

iv) Quanto à não conformidade com o artigo 325.o, n.o 1, TFUE do dispositivo de controlos aduaneiros aplicado pelo Reino Unido durante o período de infração para combater a fraude por subavaliação em causa

 

b) Quanto à violação das obrigações impostas pela regulamentação aduaneira da União

 

1) Observações preliminares

 

2) Quanto à violação das obrigações impostas pelo artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário e pelo artigo 46.o do Código Aduaneiro da União.

 

i) Argumentação das partes

 

ii) Apreciação do Tribunal de Justiça

 

3) Quanto à violação das obrigações impostas pelo artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e pelo artigo 244.o do Regulamento de Execução

 

4) Quanto à violação das obrigações impostas pelo artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário e pelo artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União

 

2. Quanto ao incumprimento das obrigações impostas pelo direito da União em matéria de disponibilização dos recursos próprios tradicionais constituídos pelos direitos aduaneiros

 

a) Quanto à acusação relativa à violação pelo Reino Unido da sua obrigação de princípio de disponibilização de recursos próprios tradicionais

 

1) Quanto ao princípio da responsabilidade do Reino Unido pelo não apuramento de perdas de recursos próprios tradicionais da União

 

2) Quanto à responsabilidade do Reino Unido pelas perdas de recursos próprios da União apuradas nos avisos C 18 Snake

 

b) Quanto à acusação relativa à violação pelo Reino Unido da sua obrigação de colocar à disposição determinados montantes de recursos próprios tradicionais

 

1) Quanto à argumentação do Reino Unido segundo a qual o Tribunal de Justiça deve começar por apreciar a sua estimativa das perdas de recursos próprios tradicionais

 

2) Quanto à estimativa efetuada pela Comissão dos montantes de perdas de recursos próprios tradicionais segundo o método OLAF‑JRC

 

3) Quanto à estimativa efetuada pelo Reino Unido dos montantes de perdas de recursos próprios tradicionais segundo o método da HMRC

 

4) Quanto à argumentação de caráter geral dirigida contra o método OLAF‑JRC

 

5) Quanto à estimativa do montante das perdas de recursos próprios tradicionais no que respeita ao período compreendido entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014

 

6) Quanto à estimativa do montante das perdas de recursos próprios tradicionais no que respeita ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive

 

i) Quanto à crítica dirigida contra o método OLAF‑JRC relativa ao facto de este conduzir a uma sobreavaliação do volume das importações que devem ser consideradas subavaliadas

 

ii) Quanto à crítica dirigida contra o método OLAF‑JRC relativa ao facto de este conduzir a uma sobreavaliação do valor das importações que devem ser consideradas subavaliadas

 

7) Quanto ao impacto dos avisos C 18 Breach na estimativa dos montantes das perdas de recursos próprios que a Comissão reclama no que respeita ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive

 

8) Quanto à taxa de câmbio que deve ser aplicada para calcular o montante das perdas de recursos próprios

 

9) Conclusão

 

3. Quanto ao incumprimento das obrigações decorrentes da regulamentação relativa ao IVA e às obrigações de colocar à disposição os recursos próprios correspondentes

 

a) Argumentação das partes

 

b) Apreciação do Tribunal de Justiça

 

4. Quanto ao incumprimento do dever de cooperação leal consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE

 

a) Argumentação das partes

 

b) Apreciação do Tribunal de Justiça

 

Quanto às despesas

«Incumprimento de Estado — Artigo 4.o, n.o 3, TUE — Artigo 310.o, n.o 6, e artigo 325.o TFUE — Recursos próprios — Direitos aduaneiros — Imposto sobre o valor acrescentado (IVA) — Proteção dos interesses financeiros da União Europeia — Luta contra a fraude — Princípio da efetividade — Obrigação de os Estados‑Membros colocarem à disposição da Comissão Europeia recursos próprios — Responsabilidade financeira dos Estados‑Membros em caso de perdas de recursos próprios — Importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China — Fraude vasta e sistémica — Criminalidade organizada — Importadores inadimplentes — Valor aduaneiro — Subavaliação — Matéria coletável do IVA — Inexistência de controlos aduaneiros sistemáticos baseados numa análise de risco e efetuados antes da autorização de saída das mercadorias em causa — Inexistência de constituição sistemática de garantias — Método utilizado para calcular o montante das perdas de recursos próprios tradicionais relativas às importações que apresentam um risco significativo de subavaliação — Método estatístico baseado nos preços médios estabelecido à escala da União — Admissibilidade»

No processo C‑213/19,

que tem por objeto uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, entrada em 7 de março de 2019,

Comissão Europeia, representada por L. Flynn e por F. Clotuche‑Duvieusart, na qualidade de agentes,

recorrente,

contra

Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte, representado, inicialmente, por F. Shibli, S. Brandon, Z. Lavery e S. McCrory, e, em seguida, por F. Shibli e S. McCrory, na qualidade de agentes, assistidos por J. Eadie, I. Rogers, QC, S. Pritchard, T. Sebastian e R. Hill, barristers,

recorrido,

apoiado por:

Reino da Bélgica, representado por J.‑C. Halleux, P. Cottin e S. Baeyens, na qualidade de agentes,

República da Estónia, representada por N. Grünberg, na qualidade de agente,

República Helénica, representada por M. Tassopoulou, na qualidade de agente,

República da Letónia, representada, inicialmente, por K. Pommere, V. Soņeca e I. Kucina, e, em seguida, por K. Pommere, na qualidade de agentes,

República Portuguesa, representada por P. Barros da Costa, S. Jaulino, L. Inez Fernandes e P. Rocha, na qualidade de agentes,

República Eslovaca, representada por B. Ricziová, na qualidade de agente,

intervenientes,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Grande Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente, L. Bay Larsen, vice‑presidente, A. Arabadjiev, A. Prechal (relatora), I. Jarukaitis, N. Jääskinen, I. Ziemele e J. Passer, presidentes de secção, J.‑C. Bonichot, T. von Danwitz, M. Safjan, A. Kumin e N. Wahl, juízes,

advogado‑geral: P. Pikamäe,

secretário: M. A. Gaudissart, secretário adjunto,

vistos os autos e após a audiência de 8 de dezembro de 2020,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 9 de setembro de 2021,

profere o presente

Acórdão

1

Com a sua petição, a Comissão Europeia pede ao Tribunal de Justiça que declare que:

ao não ter contabilizado os montantes corretos dos direitos aduaneiros e ao não ter colocado à disposição desta instituição os montantes corretos de recursos próprios tradicionais e de recursos próprios provenientes do imposto sobre o valor acrescentado (IVA) relativos a determinadas importações de têxteis e de calçado provenientes da China (a seguir «importações em causa»), o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força dos artigos 2.o e 8.o da Decisão 2014/335/UE, Euratom do Conselho, de 26 de maio de 2014, relativa ao sistema de recursos próprios da União Europeia (JO 2014, L 168, p. 105), dos artigos 2.o e 8.o da Decisão 2007/436/CE, Euratom do Conselho, de 7 de junho de 2007, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias (JO 2007, L 163, p. 17), dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento (UE, Euratom) n.o 609/2014 do Conselho, de 26 de maio de 2014, relativo aos métodos e ao procedimento para a colocação à disposição dos recursos próprios tradicionais e dos recursos próprios baseados no IVA e no RNB e às medidas destinadas a satisfazer as necessidades da tesouraria (JO 2014, L 168, p. 39), conforme alterado pelo Regulamento (UE, Euratom) 2016/804 do Conselho, de 17 de maio de 2016 (JO 2016, L 132, p. 85) (a seguir «Regulamento n.o 609/2014»), dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento (CE, Euratom) n.o 1150/2000 do Conselho, de 22 de maio de 2000, relativo à aplicação da Decisão 94/728/CE, Euratom relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades (JO 2000, L 130, p. 1), do artigo 2.o do Regulamento (CE, Euratom) n.o 1553/89 do Conselho, de 29 de maio de 1989, relativo ao regime uniforme e definitivo de cobrança dos recursos próprios provenientes do imposto sobre o Valor Acrescentado (JO 1989, L 155, p. 9), assim como do artigo 105.o, n.o 3, do Regulamento (UE) n.o 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de outubro de 2013, que estabelece o Código Aduaneiro da União (JO 2013, L 269, p. 1, a seguir «Código Aduaneiro da União»), e do artigo 220.o, n.o 1, do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário (JO 1992, L 302, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 648/2005 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de abril de 2005 (JO 2005, L 117, p. 13) (a seguir «Código Aduaneiro Comunitário»),

como consequência do incumprimento das obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE, do artigo 325.o e do artigo 310.o, n.o 6, TFUE, dos artigos 3.o e 46.o do Código Aduaneiro da União, do artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário, do artigo 248.o, n.o 1, do Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de 2 de julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento n.o 2913/92 (JO 1993, L 253, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 3254/1994 da Comissão, de 19 de dezembro de 1994 (JO 1994, L 346, p. 1) (a seguir «regulamento de aplicação»), do artigo 244.o do Regulamento de Execução (UE) 2015/2447 da Comissão, de 24 de novembro de 2015, que estabelece as regras de execução de determinadas disposições do Regulamento n.o 952/2013 (JO 2015, L 343, p. 558, a seguir «Regulamento de Execução»), do artigo 2.o, n.o 1, alíneas b) e d), dos artigos 83.o e 85.o a 87.o, assim como do artigo 143.o, n.o 1, alínea d), e n.o 2, da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (JO 2006, L 347, p. 1, e retificação no JO 2007, L 335, p. 60), conforme alterada pela Diretiva 2009/69/CE do Conselho, de 25 de junho de 2009 (JO 2009, L 175, p. 12) (a seguir «Diretiva 2006/112»),

ascendendo as correspondentes perdas de recursos próprios tradicionais que devem ser disponibilizados à Comissão, subtraídas das despesas de cobrança, a:

496025324,30 de euros em 2017 (até 11 de outubro de 2017 inclusive);

646809443,80 de euros em 2016;

535290329,16 de euros em 2015;

480098912,45 de euros em 2014;

325230822,55 de euros em 2013;

173404943,81 de euros em 2012;

22777312,79 de euros em 2011;

ao não lhe ter comunicado todas as informações necessárias para determinar os montantes das perdas de recursos próprios tradicionais e ao não lhe ter fornecido, como lhe tinha sido solicitado, o conteúdo do parecer jurídico do serviço jurídico da Her Majesty’s Revenue & Customs (Administração Fiscal e Aduaneira do Reino Unido, a seguir «HMRC») ou os fundamentos das decisões que anularam as dívidas aduaneiras apuradas, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE e do artigo 2.o, n.os 2 e 3, alínea d), do Regulamento (UE, Euratom) n.o 608/2014 do Conselho, de 26 de maio de 2014, que estabelece as medidas de execução do sistema de recursos próprios da União Europeia (JO 2014, L 168, p. 29).

I. Quadro jurídico

A. Direito em matéria de recursos próprios

1.   Decisões relativas ao sistema de recursos próprios

2

No que respeita ao período compreendido entre o mês de novembro de 2011 e 11 de outubro de 2017 inclusive (a seguir «período de infração»), em relação ao qual, no âmbito do presente processo, a Comissão imputa ao Reino Unido diferentes incumprimentos do direito da União, eram sucessivamente aplicáveis duas decisões relativas ao sistema de recursos próprios da União, a saber, a Decisão 2007/436 e, a partir de 1 de janeiro de 2014, a Decisão 2014/335.

3

Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, alíneas a) e b), da Decisão 2014/335, cuja redação é, em substância, idêntica à do artigo 2.o, n.o 1, alíneas a) e b), da Decisão 2007/436, constituem recursos próprios inscritos no orçamento da União as receitas provenientes, respetivamente, «[d]os recursos próprios tradicionais que consistem em […] direitos da Pauta Aduaneira Comum e outros direitos estabelecidos ou a estabelecer pelas instituições da União sobre as trocas comerciais com países terceiros», e «da aplicação de uma taxa uniforme, válida para todos os Estados‑Membros, à base tributável do IVA, determinada de maneira harmonizada segundo as regras da União».

4

O artigo 8.o, n.o 1, destas decisões prevê, no seu primeiro parágrafo, que os direitos da Pauta Aduaneira Comum, enquanto recursos próprios da União, são cobrados pelos Estados‑Membros em conformidade com as disposições legislativas, regulamentares e administrativas nacionais que, se necessário, são adaptadas às exigências da regulamentação da União, e, no seu terceiro parágrafo, que os Estados‑Membros devem colocar à disposição da Comissão os recursos previstos nas alíneas a) e c) do n.o 1 do artigo 2.o das referidas decisões.

2.   Regulamentos relativos aos métodos e ao procedimento para a colocação à disposição dos recursos próprios

5

No que respeita ao período de infração, foram sucessivamente aplicáveis dois regulamentos relativos à colocação à disposição dos recursos próprios da União, a saber, o Regulamento n.o 1150/2000 e, a partir de 1 de janeiro de 2014, o Regulamento n.o 609/2014.

6

Nos termos do artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014, cujo conteúdo é, em substância, idêntico ao do artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000:

«Para efeitos da aplicação do presente regulamento, um direito da União sobre os recursos próprios tradicionais a que se refere o artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da Decisão [2014/335], considera‑se apurado assim que se encontrem preenchidas as condições previstas na regulamentação aduaneira no que se refere ao registo de liquidação do montante do direito e à sua comunicação ao devedor.»

7

O artigo 6.o, n.os 1, e 3, primeiro e segundo parágrafos, do Regulamento n.o 609/2014, cujo conteúdo é, em substância, idêntico ao do artigo 6.o, n.os 1, e 3, alíneas a) e b), do Regulamento n.o 1150/2000, dispõe:

«1.   É mantida pelo Tesouro de cada Estado‑Membro ou pelo organismo designado por cada Estado‑Membro uma contabilidade dos recursos próprios, discriminada segundo a natureza desses recursos.

[…]

3.   Sem prejuízo do disposto no segundo parágrafo, os direitos apurados nos termos do artigo 2.o são lançados na contabilidade [correntemente denominada “contabilidade A”] o mais tardar no primeiro dia útil seguinte ao dia 19 do segundo mês após aquele em que o direito tiver sido apurado.

Os direitos apurados e não inscritos na contabilidade referida no primeiro parágrafo, por ainda não terem sido cobrados nem ter sido fornecida qualquer caução, são lançados numa contabilidade separada, no prazo previsto no primeiro parágrafo[, correntemente denominada “contabilidade B”]. Os Estados‑Membros podem proceder do mesmo modo nos casos em que os direitos apurados e cobertos por garantias sejam objeto de contestação e possam vir a sofrer variações na sequência de eventuais diferendos.

[…]»

8

Na sua redação inicial, o artigo 9.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 609/2014, cujo conteúdo era, em substância, idêntico ao do artigo 9.o, n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 1150/2000, dispunha:

«Segundo as regras definidas no artigo 10.o, cada Estado‑Membro inscreve os recursos próprios a crédito da conta aberta para o efeito em nome da Comissão junto do Tesouro ou do organismo por ele designado.»

9

Desde 1 de outubro de 2016, esta disposição tem a seguinte redação:

«Segundo as regras definidas nos artigos 10.o, 10.o‑A e 10.o‑B, cada Estado‑Membro inscreve os recursos próprios a crédito da conta aberta para o efeito em nome da Comissão junto do tesouro ou do banco central nacional. Sob reserva da aplicação de juros negativos a que se refere o terceiro parágrafo, esta conta só pode ser debitada mediante instruções da Comissão.»

10

Na sua redação inicial, o artigo 12.o, n.os 1 e 3, do Regulamento n.o 609/2014, cujo conteúdo era, em substância, idêntico ao do artigo 11.o, n.os 1 e 3, do Regulamento n.o 1150/2000, tinha a seguinte redação:

«1.   Qualquer atraso nos lançamentos na conta referida no artigo 9.o, n.o 1, implica o pagamento, pelo Estado‑Membro em causa, de juros de mora.

[…]

3.   Relativamente aos Estados‑Membros que não participam da União Económica e Monetária, a taxa é igual à taxa aplicada no primeiro dia do mês do vencimento em questão pelos Bancos Centrais respetivos às suas operações principais de refinanciamento, acrescida de dois pontos percentuais, ou, relativamente aos Estados‑Membros para os quais não se dispõe de taxa do Banco Central, é igual à taxa mais equivalente aplicada no primeiro dia do mês em questão no mercado monetário desses Estados‑Membros, acrescida de dois pontos percentuais.

Essa taxa é majorada de 0,25 pontos percentuais por cada mês de atraso. A taxa aumentada aplica‑se durante todo o período do atraso.»

11

Desde 1 de outubro de 2016, o artigo 12.o, n.o 5, do Regulamento n.o 609/2014, que substitui o artigo 12.o, n.o 3, do mesmo, dispõe:

«Relativamente aos Estados‑Membros que não participem na União Económica e Monetária, a taxa de juro é igual à taxa aplicada no primeiro dia do mês em questão pelos bancos centrais às suas principais operações de refinanciamento, ou a 0 %, consoante a que for mais elevada, acrescida de 2,5 pontos percentuais. Relativamente aos Estados‑Membros para os quais não está disponível a taxa do banco central, a taxa de juro é igual à taxa mais equivalente aplicada no primeiro dia do mês em questão no mercado monetário desses Estados‑Membros, ou a 0 %, consoante a que for mais elevada, acrescida de 2,5 pontos percentuais.

Essa taxa é majorada de 0,25 pontos percentuais por cada mês de atraso.

A majoração total a título do primeiro e do segundo parágrafos não pode exceder 16 pontos percentuais. A taxa majorada é aplicada ao período total do atraso.»

12

O artigo 13.o do Regulamento n.o 609/2014, sob a epígrafe «Montantes incobráveis», cujo conteúdo é, em substância, idêntico ao do artigo 17.o do Regulamento n.o 1150/2000, prevê:

«1.   Os Estados‑Membros tomam todas as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos apurados nos termos do artigo 2.o sejam colocados à disposição da Comissão nas condições fixadas pelo presente regulamento.

2.   Os Estados‑Membros são dispensados de pôr à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos apurados em conformidade com o artigo 2.o que se verifique serem incobráveis por uma das seguintes razões:

a)

Por razões de força maior;

b)

Por outras razões que não lhes sejam imputáveis.

Os montantes de direitos apurados são declarados incobráveis por decisão da autoridade administrativa competente que verifica a impossibilidade de cobrança.

Os montantes de direitos apurados são considerados incobráveis o mais tardar após um período de cinco anos a contar da data em que o montante foi apurado nos termos do artigo 2.o ou, em caso de recurso administrativo ou judicial, da data da decisão definitiva, da sua notificação ou da sua publicação.

[…]

3.   No prazo de três meses a contar da decisão administrativa a que se refere o n.o 2 do presente artigo ou do termo dos períodos a que se refere o mesmo número, os Estados‑Membros comunicam à Comissão um relatório com os elementos de informação relativos aos casos de aplicação do n.o 2 do presente artigo, na medida em que o montante dos direitos apurados ultrapasse 50000 [euros].

Esse relatório inclui todos os factos necessários para um pleno exame das razões referidas no n.o 2, alíneas a) e b), do presente artigo que impediram o Estado‑Membro em questão de pôr à disposição o montante em causa, bem como as medidas por ele tomadas para garantir a cobrança.

Esse relatório é apresentado de acordo com um modelo estabelecido pela Comissão. Para o efeito, a Comissão adota atos de execução. Esses atos de execução são adotados pelo procedimento consultivo a que se refere o artigo 16.o, n.o 2.

4.   A Comissão dispõe de seis meses, a contar da receção do relatório previsto no n.o 3, para enviar os seus comentários ao Estado‑Membro em questão.

Quando a Comissão considerar necessário solicitar informações complementares, o prazo de seis meses é contado a partir da data de receção das informações complementares solicitadas.»

3.   Regulamento n.o 608/2014

13

No que respeita à parte do período de infração que teve início em 1 de janeiro de 2014, o artigo 2.o do Regulamento n.o 608/2014, sob a epígrafe «Medidas de controlo e supervisão», dispõe:

«[…]

2.   Os Estados‑Membros tomam todas as medidas necessárias para que os recursos próprios referidos no artigo 2.o, n.o 1, da Decisão [2014/335] sejam colocados à disposição da Comissão.

3.   Caso as medidas de controlo e supervisão digam respeito aos recursos próprios tradicionais referidos no artigo 2.o, n.o 1, alínea a) da Decisão [2014/335]:

a)

Os Estados‑Membros procedem às verificações e inquéritos relativos ao apuramento e à colocação à disposição desses recursos próprios;

[…]

c)

Os Estados‑Membros associam a Comissão, a pedido desta, aos controlos que efetuarem. Caso seja associada a um controlo, a Comissão tem acesso, na medida em que a aplicação do presente regulamento o exija, aos documentos comprovativos relativos ao apuramento e à colocação à disposição dos recursos próprios, bem como a quaisquer outros documentos apropriados relacionados com esses mesmos documentos comprovativos;

d)

A Comissão pode proceder ela própria a verificações in loco. Os agentes mandatados pela Comissão para efetuar essas verificações têm acesso aos documentos tal como previsto para os controlos referidos na alínea c). Os Estados‑Membros devem facilitar essas verificações;

[…]»

4.   Regulamento n.o 1553/89

14

O artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1553/89 prevê:

«A base dos recursos IVA será determinada a partir das operações tributáveis referidas no artigo 2.o da [Sexta] Diretiva 77/388/CEE do Conselho, de 17 de maio de 1977, relativa à harmonização das legislações dos Estados‑[M]embros respeitantes aos impostos sobre o volume de negócios — [S]istem[a] comu[m] do Imposto sobre o Valor Acrescentado: matéria coletável uniforme [(JO L 145, p. 1)] […]»

15

Nos termos do artigo 3.o, primeiro parágrafo, deste regulamento:

«Para um ano civil determinado, e sem prejuízo do disposto nos artigos 5.o e 6.o, a base dos recursos IVA é calculada dividindo o total das receitas líquidas do IVA cobradas pelo Estado‑Membro nesse ano pela taxa à qual o imposto tenha sido cobrado durante o mesmo ano.»

B. Direito aduaneiro

1.   Código Aduaneiro Comunitário

16

O Código Aduaneiro Comunitário é aplicável às importações em causa que foram efetuadas durante a parte do período de infração anterior a 1 de maio de 2016.

17

O artigo 13.o deste código dispunha:

«1.   As autoridades aduaneiras podem, de acordo com as condições previstas nas disposições em vigor, realizar todos os controlos que considerem necessários para garantir a correta aplicação da legislação aduaneira e outra legislação que regule a introdução, saída, trânsito, transferência e utilização final de mercadorias que circulem entre o território aduaneiro da Comunidade [europeia] e países terceiros, bem como a presença de mercadorias que não tenham estatuto comunitário. Para efeitos da correta aplicação da legislação comunitária, os controlos aduaneiros podem ser realizados num país terceiro, quando tal estiver previsto num acordo internacional.

2.   Os controlos aduaneiros que não sejam controlos por amostragem devem basear‑se na análise de risco utilizando técnicas automatizadas de processamento de dados, com o objetivo de identificar e quantificar os riscos e criar as medidas necessárias para a sua avaliação com base em critérios definidos a nível nacional, comunitário e, sempre que possível, internacional.

O procedimento de comité será aplicado para determinar um quadro comum de gestão de risco e estabelecer critérios comuns e áreas de controlo prioritárias.

Os Estados‑Membros, em cooperação com a Comissão, devem instituir um sistema eletrónico para a implementação da gestão de risco.

3.   Sempre que forem efetuados controlos por autoridades que não sejam as autoridades aduaneiras […], esses controlos devem ser efetuados em estreita coordenação com as autoridades aduaneiras, sempre que possível, ao mesmo tempo e no mesmo local.

[…]»

18

O título II do referido código incluía um capítulo 3, sob a epígrafe «Valor aduaneiro das mercadorias», composto pelos artigos 28.o a 36.o deste código.

19

O artigo 29.o do mesmo código previa:

«1.   O valor aduaneiro das mercadorias importadas é o valor transacional, isto é, o preço efetivamente pago ou a pagar pelas mercadorias quando são vendidas para exportação com destino ao território aduaneiro da Comunidade, eventualmente, após ajustamento efetuado nos termos dos artigos 32.o e 33.o […].

[…]

2.   

a)

Para determinar se o valor transacional é aceitável para efeitos de aplicação do n.o 1, o facto de o comprador e o vendedor estarem coligados não constitui, em si mesmo, motivo suficiente para considerar o valor transacional como inaceitável. Se necessário, serão examinadas as circunstâncias próprias da venda e o valor transacional será admitido, desde que a relação de coligação não tenha influenciado o preço. […]

[…]

3.   

a)

O preço efetivamente pago ou a pagar é o pagamento total efetuado ou a efetuar pelo comprador ao vendedor, ou em benefício deste, pelas mercadorias importadas e compreende todos os pagamentos efetuados ou a efetuar, como condição da venda das mercadorias importadas, pelo comprador ao vendedor, ou pelo comprador a uma terceira pessoa para satisfazer uma obrigação do vendedor. […]

[…]»

20

Nos termos do artigo 30.o do Código Aduaneiro Comunitário:

«1.   Quando o valor aduaneiro não puder ser determinado por aplicação do artigo 29.o, há que passar sucessivamente às alíneas a), b), c) e d) do n.o 2 até à primeira destas alíneas que o permita determinar […]

2.   Os valores aduaneiros determinados por aplicação do presente artigo são os seguintes:

a)

Valor transacional de mercadorias idênticas vendidas para exportação com destino à Comunidade e exportadas no mesmo momento que as mercadorias a avaliar ou em momento muito próximo;

b)

Valor transacional de mercadorias similares, vendidas para exportação com destino à Comunidade exportadas no mesmo momento que as mercadorias a avaliar ou em momento muito próximo;

c)

Valor baseado no preço unitário correspondente às vendas na Comunidade das mercadorias importadas ou de mercadorias idênticas ou similares importadas totalizando a quantidade mais elevada, feitas a pessoas não coligadas com os vendedores;

d)

Valor calculado […]

[…]»

21

O artigo 31.o deste código tinha a seguinte redação:

«1.   Se o valor aduaneiro das mercadorias não puder ser determinado por aplicação dos artigos 29.o e 30.o, será determinado, com base nos dados disponíveis na Comunidade, por meios razoáveis compatíveis com os princípios e as disposições gerais:

do acordo relativo à aplicação do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994 [(JO 1994, L 336, p. 103), que consta do anexo 1 A do Acordo que institui a Organização Mundial do Comércio (JO 1994, L 336, p. 3)],

do artigo VII do Acordo Geral sobre Pautas Aduaneiras e Comércio de 1994,

das disposições do presente capítulo.

2.   O valor aduaneiro determinado por aplicação do n.o 1 não se baseará:

a)

No preço de venda, na Comunidade, de mercadorias produzidas na Comunidade;

b)

Num sistema que preveja a aceitação, para fins aduaneiros, do mais elevado de dois valores possíveis;

c)

No preço de mercadorias no mercado interno do país de exportação;

d)

No custo de produção, distinto dos valores calculados que foram determinados para mercadorias idênticas ou similares em conformidade com o n.o 2, alínea d), do artigo 30.o;

e)

Nos preços para exportação com destino a um país não compreendido no território aduaneiro da Comunidade;

f)

Em valores aduaneiros mínimos ou

g)

Em valores arbitrários ou fictícios.»

22

O artigo 68.o do referido código dispunha:

«Para a conferência das declarações por elas aceites, as autoridades aduaneiras podem proceder:

a)

A um controlo documental que incida sobre a declaração e os documentos que se lhe encontram juntos. As autoridades podem exigir do declarante a apresentação de qualquer outro documento com vista à conferência da exatidão dos elementos da declaração;

b)

A verificação das mercadorias, acompanhada de uma eventual extração de amostras com vista à sua análise ou a um controlo mais aprofundado.»

23

O artigo 71.o do mesmo código tinha a seguinte redação:

«1.   Os resultados da conferência da declaração servem de base à aplicação das disposições que regem o regime aduaneiro a que as mercadorias se encontram sujeitas.

2.   Caso não se proceda à conferência da declaração, a aplicação das disposições previstas no n.o 1 efetua‑se com base nos elementos da declaração.»

24

O artigo 217.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário previa:

«O montante de direitos de importação ou de direitos de exportação resultante de uma dívida aduaneira […] deverá ser calculado pelas autoridades aduaneiras logo que estas disponham dos elementos necessários e deverá ser objeto de uma inscrição efetuada por essas autoridades nos registos contabilísticos ou em qualquer outro suporte equivalente (registo de liquidação).»

25

Nos termos do artigo 218.o, n.o 1, primeiro parágrafo, deste código:

«Sempre que uma dívida aduaneira se constitui pela aceitação da declaração de uma mercadoria para um regime aduaneiro distinto da importação temporária com isenção parcial dos direitos de importação, ou de qualquer outro ato com os mesmos efeitos jurídicos dessa aceitação, o registo de liquidação do montante correspondente a essa dívida deve ser efetuado logo que o referido montante tenha sido calculado e, o mais tardar, no segundo dia seguinte àquele em que tiver sido dada a autorização de saída da mercadoria.»

26

O artigo 220.o, n.o 1, do referido código dispunha:

«Sempre que o registo de liquidação do montante de direitos resultante de uma dívida aduaneira não tenha sido efetuado em conformidade com o disposto nos artigos 218.o e 219.o ou tenha sido efetuado num nível inferior ao montante legalmente devido, o registo de liquidação do montante de direitos a cobrar ou da parte por cobrar deverá efetuar‑se no prazo de dois dias a contar da data em que as autoridades financeiras se tenham apercebido dessa situação e em que possam calcular o montante legalmente devido e determinar o devedor (registo de liquidação a posteriori). Este prazo pode ser prorrogado nos termos do artigo 219.o»

27

O artigo 221.o do mesmo código enunciava:

«1.   O montante dos direitos deve ser comunicado ao devedor, de acordo com modalidades adequadas, logo que o respetivo registo de liquidação seja efetuado.

[…]

3.   A comunicação ao devedor não se pode efetuar após o termo de um prazo de três anos a contar da data de constituição da dívida aduaneira. Este prazo é suspenso a partir do momento em que for interposto um recurso na aceção do artigo 243.o, até ao termo do processo de recurso.

4.   Sempre que a dívida aduaneira resulte de um ato que era, no momento em que foi cometido, passível de procedimento judicial repressivo, a comunicação ao devedor pode ser efetuada, nas condições previstas nas disposições em vigor, após o termo do prazo de três anos previsto no n.o 3.»

2.   Código Aduaneiro da União

28

O Código Aduaneiro da União é aplicável às importações em causa que tenham sido efetuadas durante a parte do período de infração que teve início em 1 de maio de 2016.

29

O artigo 3.o deste código dispõe:

«As autoridades aduaneiras são antes de mais responsáveis pela supervisão do comércio internacional da União, contribuindo deste modo para um comércio justo e aberto, para a aplicação da vertente externa do mercado interno, da política comercial comum e das outras políticas comuns da União relacionadas com o comércio, bem como para a segurança do circuito de abastecimento global. As autoridades aduaneiras devem instituir medidas que visem, especialmente:

a)

Proteger os interesses financeiros da União e dos seus Estados‑Membros;

b)

Proteger a União contra o comércio desleal e ilegal, apoiando simultaneamente as atividades económicas legítimas;

c)

Garantir a proteção e a segurança da União e dos seus residentes, bem como a proteção do ambiente, se for caso disso, em estreita cooperação com outras autoridades; e

d)

Manter um equilíbrio adequado entre controlos aduaneiros e facilitação do comércio legítimo.»

30

Nos termos do artigo 46.o do referido código, sob a epígrafe «Gestão do risco e controlos aduaneiros»:

«1.   As autoridades aduaneiras podem realizar os controlos aduaneiros que considerem necessários.

Os controlos aduaneiros podem, designadamente, consistir na verificação das mercadorias, na recolha de amostras, no controlo da exatidão e do caráter exaustivo das informações constantes de uma declaração ou notificação, e da existência, autenticidade, exatidão e validade dos documentos, na verificação da contabilidade dos operadores económicos e de outros registos, na inspeção dos meios de transporte, das bagagens e de outras mercadorias transportadas por pessoas ou em pessoas e na realização de inquéritos oficiais e outros atos similares.

2.   Os controlos aduaneiros que não sejam aleatórios devem basear‑se essencialmente na análise de risco utilizando técnicas de processamento eletrónico de dados, com o objetivo de identificar e avaliar os riscos e elaborar as contramedidas necessárias com base em critérios definidos a nível nacional ou da União e, se disponíveis, internacional.

3.   Os controlos aduaneiros devem ser realizados dentro de um quadro comum de gestão do risco, baseado no intercâmbio de informações sobre riscos e resultados de análises de risco entre administrações aduaneiras e que defina […] critérios e normas comuns de riscos, medidas de controlo e áreas de controlo prioritárias.

Os controlos baseados em tais informações e critérios são efetuados sem prejuízo de outros controlos efetuados nos termos do n.o 1 ou de outras disposições em vigor.

4.   As autoridades aduaneiras aplicam métodos de gestão de riscos com vista a diferenciar os níveis de risco associados às mercadorias sujeitas a controlos aduaneiros ou à fiscalização aduaneira e a determinar se as mercadorias serão objeto de controlos aduaneiros específicos, indicando, se for o caso, o local onde serão efetuados esses controlos.

A gestão de riscos inclui atividades como a recolha de dados e de informações, a análise e avaliação do risco, a recomendação e realização de ações e a monitorização e revisão regulares desse processo e dos seus resultados, com base em fontes e estratégias internacionais, da União e nacionais.

5.   As autoridades aduaneiras devem trocar informações sobre riscos e resultados de análises de risco caso:

a)

Os riscos sejam avaliados por uma autoridade aduaneira como significativos e exigindo um controlo aduaneiro, e os resultados desse controlo indi[que]m que o incidente que desencadeou os riscos se verificou; ou

b)

Os resultados do controlo não estabeleçam a ocorrência do incidente que desencadeou os riscos, mas a autoridade aduaneira em causa considere que a ameaça representa um risco elevado noutro local da União.

6.   Para efeitos do estabelecimento de critérios e normas comuns de risco, bem como das medidas de controlo e das áreas de controlo prioritárias referidas no n.o 3, deve ser considerado o seguinte:

a)

A proporcionalidade em relação ao risco;

b)

A urgência da aplicação necessária dos controlos;

c)

Os prováveis efeitos nos fluxos comerciais, nos diferentes Estados‑Membros e nos recursos afetados aos controlos.

7.   As normas e critérios comuns em matéria de risco referidos no n.o 3 incluem o seguinte:

a)

Uma descrição dos riscos;

b)

Os fatores ou indicadores de risco a utilizar para selecionar as mercadorias ou os operadores económicos sujeitos aos controlos aduaneiros;

c)

A natureza dos controlos aduaneiros a efetuar pelas autoridades aduaneiras;

d)

A duração de aplicação dos controlos aduaneiros referidos na alínea c).

8.   As áreas de controlo prioritárias devem abranger determinados regimes aduaneiros, tipos de mercadorias, itinerários, modos de transporte ou operadores económicos que, durante um certo período, devem ser sujeitos a análises de risco e controlos aduaneiros reforçados, sem prejuízo de outros controlos normalmente efetuados pelas autoridades aduaneiras.»

31

O artigo 53.o do mesmo código, sob a epígrafe «Conversão monetária», dispõe no seu n.o 1:

«As autoridades competentes publicam e/ou divulgam na Internet a taxa de câmbio aplicável se for necessário proceder a uma conversão monetária por uma das seguintes razões:

[…]

b)

Caso o contravalor do euro em moeda nacional seja necessário para determinar a classificação pautal das mercadorias e o montante do direito de importação e de exportação, incluindo os valores máximos na Pauta Aduaneira Comum.»

32

Os artigos 70.o e 74.o do Código Aduaneiro da União preveem as regras relativas à determinação do valor aduaneiro das mercadorias cujo conteúdo é, em substância, idêntico ao das regras previstas nos artigos 29.o a 31.o do Código Aduaneiro Comunitário.

33

O artigo 103.o do referido código, sob a epígrafe «Caducidade da dívida aduaneira», dispõe, nos seus n.os 1 e 2:

«1.   As dívidas aduaneiras não podem ser notificadas ao devedor após o termo de um prazo de três anos a contar da data de constituição da dívida aduaneira.

2.   Caso a dívida aduaneira seja constituída em resultado de um ato que, no momento em que foi praticado, era passível de procedimento judicial repressivo, o prazo de três anos fixado no n.o 1 é alargado para um prazo mínimo de cinco anos e máximo de 10 anos, de acordo com a legislação nacional.»

34

O artigo 105.o do mesmo código, sob a epígrafe «Prazo do registo de liquidação», enuncia no seu n.o 3:

«No caso de constituição de uma dívida aduaneira em circunstâncias não abrangidas pelo n.o 1, o registo de liquidação do montante dos direitos de importação ou de exportação devidos deve ser efetuado no prazo de 14 dias a contar da data em que as autoridades aduaneiras possam determinar o montante dos direitos de importação ou de exportação em questão e tomar uma decisão.»

35

O artigo 191.o deste código, sob a epígrafe «Resultados da conferência da declaração», dispõe:

«1.   Os resultados da conferência da declaração aduaneira servem de base à aplicação das disposições que regem o regime aduaneiro a que as mercadorias se encontram sujeitas.

2.   Caso não se proceda à conferência da declaração aduaneira, o n.o 1 é aplicável com base nos elementos constantes da declaração.

3.   Os resultados da conferência efetuada pelas autoridades aduaneiras têm a mesma força probatória em todo o território aduaneiro da União.»

3.   Regulamento de aplicação

36

O regulamento de aplicação é aplicável às importações em causa que tenham sido efetuadas durante a parte do período de infração anterior a 1 de maio de 2016.

37

Nos termos do artigo 181.o‑A deste regulamento de aplicação:

«1.   As autoridades aduaneiras não deverão determinar necessariamente o valor aduaneiro das mercadorias importadas, baseando‑se no método do valor transacional, quando, de acordo com o procedimento descrito no n.o 2, baseadas em dúvidas fundadas, não estejam convencidas de que o valor declarado é o preço efetivamente pago ou a pagar definido no artigo 29.o do Código [Aduaneiro Comunitário].

2.   Sempre que as autoridades aduaneiras tenham dúvidas tal como referido no n.o 1, poderão solicitar informações complementares de acordo com o n.o 4 do artigo 178.o Se essas dúvidas persistirem, antes de tomarem uma decisão definitiva e se tal lhes for solicitado, as autoridades aduaneiras deverão informar o interessado por escrito dos motivos sobre os quais essas dúvidas são fundadas e darem‑lhe uma oportunidade razoável para responder. A decisão final bem como os respetivos motivos serão comunicados ao interessado por escrito.»

38

O artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação dispõe:

«A concessão da autorização de saída implica a imediata liquidação dos direitos de importação calculados de acordo com os elementos constantes da declaração. Quando as autoridades aduaneiras considerarem que os controlos efetuados podem conduzir à determinação de um montante de direitos superior ao resultante dos elementos constantes da declaração, exigirão, além disso, a prestação de uma garantia suficiente para cobrir a diferença entre o montante resultante dos elementos da declaração e aquele em que as mercadorias podem em definitivo ficar sujeitas. Todavia, o declarante tem a faculdade de, em substituição da garantia, pedir a liquidação imediata do montante dos direitos a que as mercadorias podem em definitivo ficar sujeitas.»

4.   Regulamento de Execução

39

O Regulamento de Execução é aplicável às importações em causa que tenham sido efetuadas durante a parte do período de infração que teve início em 1 de maio de 2016.

40

O artigo 48.o deste Regulamento de Execução, sob a epígrafe «Disposições relativas à taxa de câmbio dos direitos pautais», prevê no seu n.o 1:

«O contravalor do euro, se necessário em conformidade com o disposto no artigo 53.o, n.o 1, alínea b), do Código [Aduaneiro da União], é fixado uma vez por mês.

A taxa de câmbio a utilizar é a taxa mais recente fixada pelo Banco Central Europeu [(BCE)] antes do penúltimo dia do mês e aplica‑se ao longo de todo o mês seguinte.

No entanto, caso a taxa aplicável no início do mês difira em mais de 5 % da taxa fixada pelo [BCE] antes do dia 15 do mesmo mês, esta última taxa é aplicável a partir do dia 15 e até ao final do mês em questão.»

41

O artigo 140.o do referido Regulamento de Execução, sob a epígrafe «Não aceitação de valores transacionais declarados», dispõe:

«1.   Sempre que as autoridades aduaneiras tenham dúvidas fundadas de que o valor transacional declarado representa o montante total efetivamente pago ou a pagar, referido no artigo 70.o, n.o 1, do Código [Aduaneiro da União], podem solicitar ao declarante que faculte informações adicionais.

2.   Se as suas dúvidas não forem dissipadas, as autoridades aduaneiras podem decidir que o valor das mercadorias não pode ser determinado em conformidade com o artigo 70.o, n.o 1, do Código [Aduaneiro da União].»

42

Nos termos do artigo 144.o do mesmo Regulamento de Execução, sob a epígrafe «Método “fall back”»:

«1.   Para a determinação do valor aduaneiro nos termos do artigo 74.o, n.o 3, do Código [Aduaneiro da União], pode utilizar‑se uma razoável flexibilidade na aplicação dos métodos previstos nos artigos 70.o e 74.o, n.o 2, do Código [Aduaneiro da União]. O valor assim determinado deve, em toda a medida do possível, basear‑se em valores aduaneiros determinados anteriormente.

2.   Quando o valor aduaneiro não puder ser determinado nos termos do n.o 1, devem ser utilizados outros métodos adequados. Nesse caso, o valor aduaneiro não pode ser determinado com base:

a)

No preço de venda, no território aduaneiro da União, de mercadorias produzidas no território aduaneiro da União;

b)

Num sistema em que seja utilizado o mais elevado de dois valores possíveis para determinar o valor aduaneiro;

c)

No preço de mercadorias no mercado interno do país de exportação;

d)

No custo de produção, distinto dos valores calculados que foram determinados para mercadorias idênticas ou similares nos termos do artigo 74.o, n.o 2, alínea d), do Código;

e)

Nos preços de exportação para países terceiros;

f)

Em valores aduaneiros mínimos;

g)

Em valores arbitrários ou fictícios.»

43

O artigo 244.o do Regulamento de Execução, sob a epígrafe «Prestação de uma garantia», artigo que visa dar execução ao artigo 191.o do Código Aduaneiro da União, prevê:

«Quando as autoridades aduaneiras considerem que a conferência da declaração aduaneira pode conduzir à determinação de um montante de direitos de importação ou de exportação ou de outras imposições mais elevado do que o resultante dos elementos da declaração aduaneira, a autorização de saída das mercadorias fica subordinada à prestação de uma garantia suficiente para cobrir a diferença entre o montante constante dos elementos da declaração aduaneira e o montante que pode, por fim, ficar em dívida.

Todavia, em vez de apresentar a garantia, o declarante pode pedir a notificação imediata da dívida aduaneira à qual as mercadorias podem, em última instância, ficar sujeitas.»

C. Direito em matéria de IVA

44

O artigo 2.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112 prevê:

«Estão sujeitas ao IVA as seguintes operações:

[…]

b)

As aquisições intracomunitárias de bens efetuadas a título oneroso no território de um Estado‑Membro:

i)

Por um sujeito passivo agindo nessa qualidade ou por uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo, quando o vendedor seja um sujeito passivo agindo nessa qualidade […];

[…]

[…]

d)

As importações de bens.»

45

Nos termos do artigo 83.o dessa diretiva:

«Nas aquisições intracomunitárias de bens, o valor tributável é constituído pelos mesmos elementos que os utilizados para determinar, em conformidade com o capítulo 2, o valor tributável da entrega desses mesmos bens no território do Estado‑Membro. Nomeadamente, nas operações assimiladas a aquisições intracomunitárias de bens referidas nos artigos 21.o e 22.o, o valor tributável é constituído pelo preço de compra dos bens ou de bens similares ou, na falta de preço de compra, pelo preço de custo, determinados no momento em que tais operações se realizam.»

46

O artigo 85.o da referida diretiva dispõe:

«Nas importações de bens, o valor tributável é constituído pelo valor definido para efeitos aduaneiros pelas disposições comunitárias em vigor.»

47

O artigo 86.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112 tem a seguinte redação:

«O valor tributável inclui os seguintes elementos, caso não estejam já incluídos:

a)

Os impostos, direitos aduaneiros, taxas e demais encargos devidos fora do Estado‑Membro de importação, e bem assim os que são devidos em virtude da importação, com exceção do IVA a cobrar;

b)

As despesas acessórias, tais como despesas de comissão, de embalagem, de transporte e de seguro, verificadas até ao primeiro lugar de destino dos bens no território do Estado‑Membro de importação, bem como as despesas decorrentes do transporte para outro lugar de destino no território da Comunidade, se este lugar for conhecido no momento em que ocorre o facto gerador do imposto.»

48

O artigo 87.o desta diretiva prevê:

«O valor tributável não inclui os seguintes elementos:

a)

As reduções de preço resultantes de desconto por pagamento antecipado;

b)

Os abatimentos e bónus concedidos ao adquirente e obtidos no momento em que se efetua a importação.»

49

Nos termos do artigo 138.o da referida diretiva:

«1.   Os Estados‑Membros isentam as entregas de bens expedidos ou transportados, para fora do respetivo território mas na Comunidade, pelo vendedor, pelo adquirente ou por conta destes, efetuadas a outro sujeito passivo ou a uma pessoa coletiva que não seja sujeito passivo agindo como tal num Estado‑Membro diferente do Estado de partida da expedição ou do transporte dos bens.

2.   Para além das entregas referidas no n.o 1, os Estados‑Membros isentam as seguintes operações:

[…]

c)

As entregas de bens que consistam em transferências com destino a outro Estado‑Membro e que beneficiariam das isenções previstas no n.o 1 e nas alíneas a) e b) se fossem efetuadas para outro sujeito passivo.»

50

O artigo 143.o da mesma diretiva dispõe:

«1.   Os Estados‑Membros isentam as seguintes operações:

[…]

d)

As importações de bens expedidos ou transportados a partir de um território terceiro ou de um país terceiro para um Estado‑Membro que não seja o de chegada da expedição ou do transporte, no caso de a entrega desses bens, efetuada pelo importador designado ou reconhecido como devedor do imposto por força do disposto no artigo 201.o, estar isenta em conformidade com o artigo 138.o;

2.   A isenção prevista na alínea d) do n.o 1 só se aplica nos casos em que a importação de bens é seguida da entrega de bens isenta ao abrigo do n.o 1 e da alínea c) do n.o 2 do artigo 138.o se, no momento da importação, o importador tiver prestado às autoridades competentes do Estado‑Membro de importação pelo menos as seguintes informações:

a)

O seu número de identificação para efeitos de IVA emitido no Estado‑Membro de importação ou o número de identificação para efeitos de IVA do seu representante fiscal, devedor do imposto, emitido no Estado‑Membro de importação;

b)

O número de identificação para efeitos de IVA do adquirente, a quem os bens são entregues nos termos do n.o 1 do artigo 138.o, emitido noutro Estado‑Membro, ou o seu próprio número de identificação para efeitos de IVA emitido no Estado‑Membro de chegada da expedição ou do transporte dos bens quando os mesmos são objeto de transferência nos termos da alínea c) do n.o 2 do artigo 138.o;

c)

A prova de que os bens importados se destinam a ser transportados ou expedidos do Estado‑Membro de importação para outro Estado‑Membro.

Todavia, os Estados‑Membros podem prever que a prova a que se refere a alínea c) seja apresentada às autoridades competentes apenas mediante pedido.»

II. Matéria de facto e procedimento pré‑contencioso

A. Factos na origem do litígio

51

A partir de 1 de janeiro de 2005, a União Europeia suprimiu todos os contingentes aplicáveis às importações de produtos têxteis e de vestuário provenientes de países membros da Organização Mundial do Comércio (OMC), incluindo da China.

52

Em 20 de abril de 2007, o Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF) enviou aos Estados‑Membros a mensagem de assistência mútua 2007/015 a fim de informar estes últimos do risco, nomeadamente, de subavaliação extrema de importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China que, na maioria dos casos, eram realizadas por empresas ditas «empresas de fachada» («shell companies»), registadas com o único objetivo de dar uma aparência de legalidade a uma operação fraudulenta, que, quando eram fiscalizadas, frequentemente não tinham sede no endereço que tinha sido indicado às autoridades aduaneiras. O OLAF precisou que, na maioria dos casos apreciados, os valores declarados eram muito inferiores a 0,50 dólar dos Estados Unidos (USD) por quilograma (kg) e até inferiores a 0,10 USD por quilograma. Tendo em conta este mecanismo de fraude (a seguir «fraude por subavaliação em causa»), o OLAF convidou todos os Estados‑Membros a vigiarem as suas importações de produtos têxteis e de calçado provenientes, nomeadamente, da China, para detetar eventuais indícios de importações subavaliadas, a efetuarem controlos aduaneiros adequados aquando do desalfandegamento de tais importações, para verificar os valores aduaneiros declarados e assegurar que estes refletem os valores de mercado reais, bem como a tomarem as medidas de salvaguarda adequadas em caso de suspeita de preços faturados de modo artificialmente baixo.

53

Para o efeito, o OLAF desenvolveu, com base em estudos científicos realizados pelo Centro Comum de Investigação (JRC) da Comissão, um instrumento de avaliação dos riscos baseado em dados à escala da União (a seguir «método OLAF‑JRC»).

54

Este método consiste, antes de mais, em calcular um «preço médio corrigido» («cleaned average price» ou «CAP») (a seguir «PMC»), igualmente designado «preço justo» («fair price» ou «fair value»), para cada código de oito algarismos da Nomenclatura Combinada constante do anexo I do Regulamento (CEE) n.o 2658/87 do Conselho, de 23 de julho de 1987, relativo à nomenclatura pautal e estatística e à pauta aduaneira comum (JO 1987, L 256, p. 1), conforme alterado pelo Regulamento de Execução (UE) 2016/1821 da Comissão, de 6 de outubro de 2016 (JO 2016, L 294, p. 1) (a seguir «NC»), e abrangido pelos capítulos 61 a 64 desta nomenclatura (a seguir «produtos em causa»).

55

Os PMC são calculados com base nos preços mensais da importação dos produtos em causa provenientes da China extraídos da Comext, a base de dados de referência para as estatísticas detalhadas do comércio internacional de bens gerida pelo Eurostat, por um período de 48 meses. Estes preços exprimem um valor por quilograma para cada um dos 495 códigos de produtos de oito algarismos da NC em causa, precisando o país de origem e o país de destino na União.

56

Em seguida, é calculada uma média para toda a União com base na média aritmética, ou seja, uma média não ponderada, dos PMC de todos os Estados‑Membros. Para calcular esta média aritmética, os valores extremos («outliers»), ou seja, os valores anormalmente elevados ou baixos, são excluídos, razão pela qual o preço médio é designado por «corrigido» ou «limpo» («cleaned»).

57

Por último, é calculado um valor correspondente a 50 % dos PMC, o qual constitui o «preço mínimo aceitável» («lowest acceptable price» ou «LAP») (a seguir «PMA»). O PMA, igualmente expresso em preço por quilograma, é utilizado como perfil ou limiar de risco que permite às autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros detetar os valores particularmente baixos declarados na importação e, por conseguinte, as importações que apresentam um risco significativo de subavaliação.

58

A mensagem de assistência mútua 2009/001, enviada pelo OLAF em 23 de janeiro de 2009, tinha por objeto a operação «Argus», uma operação com uma duração de seis meses no âmbito da qual o OLAF tinha vigiado o comércio dos produtos em causa provenientes de diferentes países terceiros, principalmente dos países asiáticos, e transmitido mensalmente aos Estados‑Membros uma lista das importações do mês anterior que tinha identificado como estando em risco em termos de valor aduaneiro. Através desta mensagem de assistência mútua, o OLAF pedia aos Estados‑Membros que lhe comunicassem, no prazo de quatro semanas, a criação de perfis de risco, que identificassem as importações que apresentassem um risco significativo de subavaliação e efetuassem verificações antes do desalfandegamento das mercadorias em causa, com base nas suas comunicações.

59

Durante o ano de 2011, na operação de controlo prioritário designada «Discount» (a seguir «ACP Discount»), coordenada pela Direção‑Geral da Fiscalidade e da União Aduaneira da Comissão e na qual participaram todos os Estados‑Membros, foram aplicados os PMA calculados segundo o método OLAF‑JRC, enquanto perfil de risco, segundo as recomendações que figuram nas orientações elaboradas para efeitos dessa operação, a fim de detetar e controlar as importações dos produtos em causa provenientes da China que apresentavam um valor aduaneiro estranhamente baixo a ponto de as tornar suspeitas. O Reino Unido participou na referida operação, sem, no entanto, aplicar esse perfil de risco.

60

Durante o ano de 2014, o OLAF coordenou a operação aduaneira conjunta designada «Snake» (a seguir «ODC Snake»), cuja fase operacional teve lugar entre 17 de fevereiro e 17 de março desse ano e na qual participaram todos os Estados‑Membros, bem como as autoridades aduaneiras chinesas. O envolvimento destas últimas visava a obtenção de declarações de exportação que permitissem verificar o valor aduaneiro declarado na importação para a União dos produtos em causa. No relatório final da ODC Snake, os Estados‑Membros eram convidados a prosseguir a utilização dos perfis de risco baseados nos PMA tais como estes tinham sido aplicados durante essa operação.

61

No termo dos controlos efetuados pelas autoridades do Reino Unido no âmbito da referida operação com base nesses perfis de risco, estas declararam a existência de direitos aduaneiros suplementares que deviam ser aplicados no que respeita a 24 operadores a título das suas importações realizadas durante um período de três anos compreendido entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014.

62

Entre o mês de novembro de 2014 e o mês de fevereiro de 2015, as autoridades do Reino Unido comunicaram os avisos de pagamento correspondentes aos operadores em causa através da emissão de 24 ordens de cobrança a posteriori, denominadas «avisos C 18» (a seguir «avisos C 18 Snake»). No entanto, durante o período compreendido entre o mês de junho e o mês de novembro de 2015, as referidas autoridades anularam esses avisos.

63

Em 16 de janeiro de 2015, o OLAF instaurou um inquérito dirigido especificamente a certos Estados‑Membros, entre os quais o Reino Unido, e que dizia respeito a um período iniciado em 2013.

64

Por outro lado, uma operação com a designação «Badminton» foi levada a cabo pela HMRC e pela polícia de fronteiras do Reino Unido entre o ano de 2013 e o ano de 2016. Esta operação, que incidia principalmente sobre uma fraude ao IVA, esteve na origem de um inquérito penal que visava quatro grandes operadores que importavam produtos têxteis provenientes da China no âmbito do regime aduaneiro que figura com o código 42 na lista dos regimes aduaneiros da União, nos termos do qual os direitos aduaneiros são pagos no momento da importação e o IVA deve ser pago posteriormente no Estado‑Membro de destino (a seguir «regime aduaneiro 42»).

65

Entre o mês de fevereiro de 2015 e o mês de julho de 2016, o Reino Unido participou em várias reuniões organizadas pelo OLAF, consagradas à fraude por subavaliação em causa.

66

Em 19 e 20 de fevereiro de 2015, o OLAF organizou uma primeira reunião bilateral com a HMRC a fim de fazer o ponto da situação sobre o acompanhamento da ODC Snake e da utilização dos PMC enquanto indicadores de risco de uma subavaliação aduaneira.

67

Nessa primeira reunião, o OLAF salientou que o volume das importações suscetíveis de serem fraudulentamente subavaliadas não tinha diminuído e que resultava das estatísticas que o Reino Unido atraía mais comércio fraudulento dos produtos em causa devido às medidas que tinham sido adotadas por outros Estados‑Membros contra a fraude por subavaliação em causa. Por sua vez, a HMRC indicou que tencionava enviar ordens de cobrança do IVA e dos direitos aduaneiros eludidos às empresas que tinham sido identificadas no âmbito da ODC Snake, bem como na sequência das suas próprias análises, num montante total superior a 800 milhões de libras esterlinas (GBP) (cerca de 939760000 euros).

68

Na reunião ad hoc de 25 e 26 de fevereiro de 2015, relativa à fraude por subavaliação em causa, reunião organizada pelo OLAF e na qual participaram as autoridades dos Estados‑Membros, o Reino Unido reiterou a sua intenção de proceder a essa cobrança. No decurso dessa reunião, o OLAF, ao mesmo tempo que explicou que a utilização das médias nacionais nos perfis de risco impedia a deteção dos casos evidentes de subavaliação, «recomendou fortemente», em particular, que os Estados‑Membros utilizassem perfis de risco adequados para identificar importações potencialmente subavaliadas, que exigissem a constituição de garantias para as importações identificadas como suspeitas a esse respeito e que realizassem inquéritos para determinar os valores aduaneiros reais das mercadorias em causa. O OLAF sublinhou igualmente que, embora o PMA seja um indicador de risco importante, deviam ser aplicadas as regras do direito da União em matéria de determinação do valor aduaneiro. Por outro lado, descreveu as potenciais perdas de recursos próprios tradicionais da União decorrentes das importações suscetíveis de serem subavaliadas, nomeadamente das importações em causa. No que respeita ao Reino Unido, fez referência, relativamente ao período compreendido entre o mês de maio de 2013 e o mês de março de 2015, a perdas potenciais de recursos próprios tradicionais num montante total de 589676121 euros para um volume de cerca de mil milhões e meio de quilogramas de produtos em causa.

69

Em 16 de junho de 2015, o OLAF enviou a mensagem de assistência mútua 2015/013, na qual pedia aos Estados‑Membros que tomassem todas as medidas de salvaguarda necessárias para proteger os interesses financeiros da União face à fraude por subavaliação em causa. Nesta mensagem, o OLAF reiterou as conclusões da reunião ad hoc de 25 e 26 de fevereiro de 2015.

70

No mês de maio de 2015, as autoridades do Reino Unido lançaram a operação designada «Breach», primeira operação realizada no território deste Estado destinada especificamente a combater a fraude por subavaliação em causa (a seguir «operação Breach»).

71

Segundo o Reino Unido, um dos objetivos desta operação, que ainda estaria em curso, era determinar, na sequência da anulação dos 24 avisos C 18 Snake, o valor aduaneiro das importações subavaliadas detetadas durante a ODC Snake e reclamar os montantes de recursos próprios tradicionais eludidos correspondentes.

72

A referida operação implicava, nomeadamente, controlos prévios e visitas a posteriori que incidiam sobre essas importações suspeitas, análises documentais, auditorias e inspeções, a apreciação do caráter comercial das vendas dos produtos em causa e das ligações existentes entre o importador, os transitários aduaneiros e outras empresas, bem como atividades de sensibilização dos importadores, destinadas a identificar as atividades fraudulentas. Foram igualmente realizadas cerca de trinta inspeções prévias no que respeita a treze remessas que foram objeto de controlos físicos com recolha de amostras. No âmbito da mesma operação, foram emitidas várias ordens de cobrança a posteriori de direitos aduaneiros (a seguir «avisos C 18 Breach»).

73

Em 28 de julho de 2015, o OLAF organizou uma segunda reunião bilateral com a HMRC, na qual esta indicou, nomeadamente, que estava a dar continuidade ao procedimento de cobrança de direitos aduaneiros de um montante superior a 800 milhões de GBP, sendo caso disso por via judicial, e que tinha constituído um grupo de ação pluridisciplinar no âmbito da operação Breach que tinha por objetivo apreciar a situação dos importadores envolvidos no comércio fraudulento. Todavia, segundo a HMRC, a utilização de indicadores de risco derivados dos PMC seria «contraproducente e desproporcionada» tendo em conta o volume das importações em causa. O OLAF indicou que a aplicação desses indicadores em alguns Estados‑Membros tinha resultado numa redução significativa do volume do tráfego fraudulento, ainda que este se tivesse deslocado para outros Estados‑Membros, em especial para o Reino Unido.

74

Em 3 de fevereiro de 2016, o OLAF organizou uma terceira reunião bilateral com a HMRC. Esta declarou que o Reino Unido tinha fiscalizado as dezasseis empresas identificadas no âmbito da ODC Snake. O OLAF recomendou novamente que a HMRC recorresse aos indicadores de risco à escala da União que os PMA constituem. Sublinhou que as importações em causa, consideradas subavaliadas e na origem de perdas importantes de direitos aduaneiros, representavam uma percentagem elevada.

75

Em 22 e 23 de março de 2016, o OLAF organizou uma quarta reunião bilateral com a HMRC. Reafirmou a utilidade de aplicar os indicadores de risco a nível da União enquanto medida prévia à importação e propôs meios práticos para a sua implementação progressiva pelas autoridades do Reino Unido. O OLAF fez novamente o ponto da situação, do qual resultou que as perdas de recursos próprios tradicionais no Reino Unido se intensificavam, principalmente devido ao recurso abusivo ao regime aduaneiro 42.

76

Numa reunião realizada em julho de 2016, o OLAF apresentou um relatório que demonstrava que as perdas de recursos próprios tradicionais no Reino Unido se acentuavam.

77

No decurso de uma reunião realizada nos dias 18 e 19 de setembro seguintes, as autoridades francesas apresentaram os resultados da operação designada «Octopus», operação que foi conduzida por estas autoridades com a participação de dez outros Estados‑Membros, entre os quais o Reino Unido, e o apoio do OLAF.

78

Resulta do relatório final relativo a esta operação que na origem das fraudes por subavaliação em causa estavam redes criminosas organizadas. O destinatário declarado nas declarações aduaneiras em questão era quase sempre uma empresa «fénix». A grande maioria das mercadorias transportadas, controladas em Calais (França) com base em critérios predefinidos, apresentava valores aduaneiros subavaliados, declarados de forma fraudulenta no Reino Unido no âmbito do regime aduaneiro 42.

79

No mês de outubro de 2016, as autoridades do Reino Unido levaram a cabo uma operação experimental, designada «Samurai», que visava as importações efetuadas por dois operadores que cessaram as suas atividades imediatamente após a HMRC ter contestado as suas declarações aduaneiras.

80

Em 1 de março de 2017, o OLAF encerrou o seu inquérito relativo à prática no Reino Unido da fraude por subavaliação em causa e apresentou o seu relatório (a seguir «relatório do OLAF»), nos termos do qual, nesse país, os importadores eludiram montantes elevados de direitos aduaneiros apresentando na importação faturas falsas, faturas fictícias e declarações incorretas.

81

Nesse relatório, o OLAF revelou um aumento significativo da amplitude da fraude por subavaliação em causa no Reino Unido durante o período compreendido entre o ano de 2013 e o ano de 2016. Este aumento significativo coincidia com a aplicação por outros Estados‑Membros de perfis de risco assentes no instrumento de avaliação dos riscos baseado nos PMA, segundo as recomendações do OLAF.

82

De acordo com esse relatório, durante o referido período, as importações fraudulentas no Reino Unido aumentaram de forma significativa, devido à inadequação dos controlos efetuados pelas autoridades aduaneiras deste Estado. No mesmo relatório, o OLAF salientou que, durante o ano de 2016, mais de 50 % dos produtos em causa importados para o Reino Unido provenientes da China foram declarados abaixo dos PMA e cerca de 80 % das perdas totais de recursos próprios tradicionais da União eram imputáveis à prática da fraude por subavaliação em causa no Reino Unido.

83

No mesmo relatório, o OLAF precisava, além disso, que as redes criminosas organizadas que operam em todo o território da União estavam na origem dessa fraude. A maior parte das importações em causa no Reino Unido, das quais grande maioria era efetuada recorrendo abusivamente ao regime aduaneiro 42, diziam respeito a produtos destinados ao comércio ilícito e clandestino no território de outros Estados‑Membros. Por conseguinte, o OLAF considerou, no seu relatório, que a fraude ao IVA era igualmente substancial no território dos Estados‑Membros de destino final das mercadorias em causa, nomeadamente na Alemanha, em Espanha, em França e em Itália.

84

Resulta do relatório do OLAF que, durante o ano de 2016, 87 % das importações dos produtos em causa de baixo valor com destino ao Reino Unido foram efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 42, ao passo que, durante esse ano, este regime apenas foi utilizado para 15 % das importações dos produtos em causa provenientes da China registadas no território de todos os Estados‑Membros. Segundo o OLAF, tal disparidade confirmava a deslocação para o Reino Unido de operações fraudulentas destinadas a outros Estados‑Membros.

85

Ainda segundo o referido relatório, o Reino Unido não aplicou perfis de risco baseados nos PMA, contrariamente às recomendações do OLAF, e não efetuou controlos aduaneiros adequados à importação, exceto durante um período de um mês, aquando da ODC Snake, ou seja, durante o período compreendido entre 17 de fevereiro e 17 de março de 2014.

86

Consequentemente, segundo o mesmo relatório, o Reino Unido introduziu em livre prática, sem proceder a controlos aduaneiros adequados, os produtos em causa provenientes da China que foram objeto da fraude por subavaliação em causa, pelo que uma parte substancial dos direitos aduaneiros devidos não foi cobrada nem colocada à disposição da Comissão.

87

No seu relatório, o OLAF calculou os montantes das perdas de recursos próprios tradicionais daí resultantes para o período compreendido entre 2013 e 2016. Fixou em 1987429507,96 de euros o montante total dessas perdas e dividiu esse montante da seguinte forma:

325230822,55 de euros no que diz respeito ao ano de 2013;

480098912,45 de euros no que diz respeito ao ano de 2014;

535290329,16 de euros no que diz respeito ao ano de 2015;

646809443,80 de euros no que diz respeito ao ano de 2016.

88

Os montantes das referidas perdas foram calculados mediante a determinação, para cada código do produto em causa da NC, da quantidade em quilogramas das mercadorias objeto das importações em causa, consideradas subavaliadas, designadamente, as mercadorias declaradas num valor inferior ao PMA em causa, e, em seguida, mediante a aplicação da taxa do direito aduaneiro em vigor ao resultado da diferença entre o valor assim declarado e o PMC do código do produto em causa.

89

Por último, no seu relatório, o OLAF recomendou à HMRC que adotasse todas as medidas adequadas para cobrar os direitos aduaneiros eludidos num montante de 1987429507,96 de euros e que aplicasse os indicadores de risco de uma subavaliação aduaneira.

90

No âmbito da aplicação do Regulamento n.o 608/2014, agentes da Comissão efetuaram, entre o mês de novembro de 2016 e o mês de outubro de 2018, cinco inspeções no Reino Unido relativas, nomeadamente, à fraude por subavaliação em causa.

91

Durante a missão de inspeção 16‑11‑1, que teve lugar entre 14 e 18 de novembro de 2016, a Comissão, tendo verificado que os montantes dos direitos aduaneiros que tinham sido retirados da contabilidade separada prevista no artigo 6.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 609/2014, correntemente designada por «contabilidade B» (a seguir «contabilidade B»), correspondiam às dívidas suplementares inicialmente reclamadas através da emissão dos 24 avisos C 18 Snake posteriormente anulados, convidou as autoridades do Reino Unido a determinar os valores aduaneiros correspondentes a todas as declarações de importação em causa, a recalcular os direitos adicionais devidos sobre esses valores, a lançar as dívidas correspondentes na contabilidade B e a cobrar os montantes em causa o mais rapidamente possível. Pediu igualmente às referidas autoridades que lhe fornecessem o parecer do serviço jurídico da HMRC que, segundo estas autoridades, tinha fundamentado a anulação desses avisos.

92

A Comissão também perguntou a essas autoridades se aplicavam o instrumento dos PMA desenvolvido pelo OLAF a fim de detetar as importações que apresentavam um risco significativo de subavaliação, se efetuavam controlos físicos no momento do desalfandegamento das mercadorias em causa e se pediam sistematicamente a constituição de uma garantia que cobrisse os direitos suscetíveis de serem exigidos, em conformidade com o artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação.

93

Durante a missão de inspeção 17‑11‑1, que teve lugar entre 8 e 12 de maio de 2017, a Comissão selecionou, para efeitos de uma verificação no local, doze declarações aduaneiras apresentadas no decurso do primeiro trimestre de 2017 e que continham valores particularmente baixos. A apreciação destas declarações confirmou que os doze lotes correspondentes tinham sido introduzidos em livre prática na União sem controlo e sem constituição de garantia. As autoridades do Reino Unido admitiram que não tinham implementado as medidas pedidas pelo OLAF no seguimento da ODC Snake em 2014, e posteriormente no relatório elaborado no termo da missão de inspeção 16‑11‑1. Explicaram que tal se devia principalmente ao parecer do seu serviço jurídico, segundo o qual não estava disponível nenhum método de avaliação aceitável. No entanto, as importações em causa seriam examinadas pelo grupo de ação estabelecido no âmbito da operação Breach. A Comissão pediu novamente às referidas autoridades que lhe fornecessem uma cópia do parecer do serviço jurídico da HMRC que, segundo estas autoridades, tinha fundamentado a anulação dos avisos C 18 Snake.

94

Durante a missão de inspeção 17‑11‑2, que teve lugar entre 13 e 17 de novembro de 2017, cinco declarações aduaneiras de valor particularmente baixo e relativas a importadores já identificados no âmbito da ODC Snake como potenciais autores de fraudes foram examinadas com base num dos avisos C 18 Snake, no que respeita a uma dívida aduaneira no montante total de 62003025,23 GBP (cerca de 73834954 de euros). Todavia, na falta do detalhe dos cálculos dessa dívida, revelou‑se impossível estabelecer uma ligação entre esta e as declarações aduaneiras em causa, o que, segundo a HMRC, justificava a anulação da referida dívida. Além disso, tendo os agentes da Comissão pedido novamente que as autoridades do Reino Unido lhe fornecessem uma cópia do parecer do serviço jurídico da HRMC que fundamentava a anulação dos referidos avisos, estas recusaram aceder a esse pedido com o fundamento de que esse documento era confidencial e estava sujeito à proteção das comunicações entre um advogado e o seu cliente.

95

Nessa missão, as autoridades do Reino Unido informaram os agentes da Comissão do lançamento, pela HMRC, da operação designada «Swift Arrow», em 12 de outubro de 2017.

96

Foi explicado que os perfis de risco utilizados no âmbito dessa operação se baseavam não nos limiares fixados em aplicação do método OLAF‑JRC, mas nos limiares ou perfis de risco nacionais determinados pela HMRC apenas com base nas importações no Reino Unido e que esses limiares ou perfis só eram aplicados a certos operadores previamente identificados como estando envolvidos em comércio ilícito e clandestino. Os contentores detetados pelos referidos limiares ou perfis de risco eram objeto de controlos físicos por parte das autoridades do Reino Unido no momento do desalfandegamento das mercadorias em causa. Se estas autoridades considerassem que o valor declarado dessas mercadorias não era justificado, exigiam a constituição de uma garantia antes da autorização de saída das mercadorias.

97

Na missão de inspeção 18‑11‑1, que teve lugar entre 16 e 20 de abril de 2018, 25 declarações aduaneiras de importação relativas ao período compreendido entre 12 de outubro de 2017, data de início da operação Swift Arrow, e 31 de dezembro de 2017, foram examinadas. Verificou‑se que apenas sete dessas declarações aduaneiras que apresentavam um valor extremamente baixo tinham sido identificadas pelos mesmos limiares ou perfis de risco e que os outros 18 contentores tinham sido introduzidos em livre prática sem que o valor aduaneiro em causa fosse contestado. As autoridades do Reino Unido indicaram que, desde o lançamento da operação Swift Arrow, os limiares ou perfis de risco da HMRC tinham sido ajustados para incluírem mais operadores, códigos da NC e pontos de entrada, pelo que, se as importações em causa tivessem ocorrido no mês de abril de 2018, esses limiares ou perfis de risco teriam permitido detetar onze declarações suplementares.

98

Além disso, segundo essas autoridades, vários dos operadores selecionados interromperam as suas importações assim que foram incluídos nos referidos limiares ou perfis de risco, foram objeto de controlos aduaneiros antes da autorização de saída das mercadorias em causa e foram obrigados a constituir garantias antes de essa autorização de saída ter sido concedida.

99

No entanto, as referidas autoridades recusaram comunicar à Comissão o detalhe do método de cálculo utilizado pela HMRC para determinar as garantias exigidas no âmbito da operação Swift Arrow e para emitir as ordens de cobrança a posteriori neste âmbito.

100

No mês de maio de 2018 foram emitidos e inscritos na contabilidade B oito avisos C 18 Breach no que respeita a importações efetuadas a partir de 1 de maio de 2015, consideradas subavaliadas, num montante total de cerca de 25 milhões de GBP (cerca de 30 milhões de euros).

101

Na missão de inspeção 18‑11‑2, que teve lugar entre 8 e 12 de outubro de 2018, as autoridades do Reino Unido mantiveram a recusa que já tinham pronunciado na missão de inspeção 18‑11‑1. Em contrapartida, confirmaram que tinham apurado, em abril de 2018, direitos adicionais relativamente a sete operadores, vários dos quais já tinham sido identificados durante a ODC Snake, num montante total de 19434197,73 GBP (cerca de 22829352 de euros).

B. Procedimento pré‑contencioso

102

Por cartas de 24 de março e 28 de julho de 2017, a Comissão pediu ao Reino Unido informações sobre o seguimento que este tinha dado ao relatório do OLAF. Indicou que não tinha recebido informações adicionais concretas desse Estado e que nada levava a pensar que este tinha adotado as medidas adequadas para prevenir a fraude por subavaliação em causa. Na falta de informações em contrário, a Comissão indicou que se via obrigada a pedir ao referido Estado que disponibilizasse um montante de recursos próprios tradicionais correspondente às perdas determinadas pelo OLAF, deduzidas as despesas de cobrança.

103

Numa das três cartas de 28 de julho de 2017, a Comissão pediu igualmente para ser informada do seguimento que as autoridades do Reino Unido tinham dado ao relatório da missão de inspeção 16‑11‑1, reiterando a esse respeito o seu pedido para poder dispor do parecer do serviço jurídico da HMRC que tinha conduzido à anulação dos 24 avisos C 18 Snake, bem como da lista dos registos relativos a cada um dos 24 processos, incluindo o detalhe dos cálculos efetuados para apurar as dívidas aduaneiras correspondentes.

104

Por cartas de 8 de agosto e 12 de outubro de 2017, o Reino Unido respondeu a essas cartas da Comissão.

105

No que respeita, antes de mais, ao relatório do OLAF, o Reino Unido salientou que tinham sido adotadas medidas para combater a fraude por subavaliação em causa, tais como o lançamento da operação Breach. O direito da União não impõe um tipo de controlo específico, pelo que compete a cada Estado‑Membro decidir a melhor forma de fazer aplicar esse direito. Medidas de controlo aduaneiro prévias à autorização de saída das mercadorias em causa, tais como a constituição de garantias, não são, além disso, mais eficazes do que medidas a posteriori, tais como as aplicadas pelo Reino Unido. O método OLAF‑JRC não é fiável nem adequado segundo o Reino Unido, uma vez que se baseia, nomeadamente, na aplicação de dados estabelecidos à escala da União. Por conseguinte, este método é criticável, razão pela qual o Reino Unido desenvolveu o seu próprio método que não contém as falhas do método recomendado pelo OLAF.

106

Em seguida, quanto ao seguimento que tinha sido dado ao relatório da missão de inspeção 16‑11‑1, o Reino Unido indicou que os 24 avisos C 18 Snake tinham sido anulados e os montantes correspondentes retirados da contabilidade B devido à impossibilidade de provar o montante dos valores reais das mercadorias importadas, mas que essa impossibilidade seria resolvida por um grupo de peritos no âmbito da operação Breach.

107

Por último, o Reino Unido reafirmou a sua posição segundo a qual é impossível dar seguimento ao pedido de comunicação do conteúdo do parecer do serviço jurídico da HMRC que conduziu à anulação dos 24 avisos C 18 Snake, invocando razões de confidencialidade e de proteção do segredo profissional entre um advogado e o seu cliente.

108

Em 9 de março de 2018, a Comissão enviou ao Reino Unido uma notificação para cumprir.

109

O Reino Unido respondeu à Comissão por carta de 22 de junho de 2018. Em anexo a essa carta, este Estado‑Membro pedia que lhe fosse transmitida uma versão completa do relatório do OLAF, uma vez que apenas dispunha de uma versão incompleta desse relatório, e que a Comissão lhe fornecesse respostas às suas questões detalhadas relativas ao método utilizado para calcular os montantes de recursos próprios tradicionais exigidos.

110

Em 24 de setembro de 2018, a Comissão enviou um parecer fundamentado ao Reino Unido (a seguir «parecer fundamentado»), no qual respondeu, nomeadamente, aos pedidos formulados por este Estado‑Membro em anexo à sua carta de 22 de junho de 2018. No parecer fundamentado foi fixado um prazo de resposta de dois meses.

111

Em 19 de dezembro de 2018, não tendo recebido resposta do Reino Unido ao parecer fundamentado nesse prazo, a Comissão decidiu intentar uma ação por incumprimento no Tribunal de Justiça, tendo previamente informado esse Estado‑Membro, em 18 de dezembro de 2018, da sua intenção de adotar tal decisão no dia seguinte.

112

A pedido das autoridades do Reino Unido e na sequência de diversos contactos informais entre essas autoridades e os serviços da Comissão, teve lugar uma reunião técnica entre as referidas autoridades e esses serviços em 9 de janeiro de 2019. Nessa reunião técnica, uma empresa de consultadoria apresentou as conclusões de um relatório cuja elaboração lhe tinha sido pedida pelo Reino Unido.

113

Em 11 de fevereiro de 2019, o Reino Unido transmitiu à Comissão a sua resposta ao parecer fundamentado, que incluía esse relatório, em anexo.

114

Em 7 de março de 2019, após ter examinado essa resposta, a Comissão intentou a presente ação por incumprimento.

III. Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

115

Por Decisão do presidente do Tribunal de Justiça de 26 de setembro de 2019, o Reino da Bélgica, a República da Estónia, a República Helénica, a República da Letónia, a República Portuguesa e a República Eslovaca (a seguir, considerados em conjunto, «Estados‑Membros intervenientes») foram autorizados a intervir em apoio dos pedidos do Reino Unido.

116

Por carta de 11 de abril de 2019, o Reino Unido pediu ao Tribunal de Justiça para obrigar a Comissão a responder às questões que lhe tinha colocado no seu designado pedido de informações «redefinido», constante da sua carta de 22 de março anterior, o qual alargava as questões constantes do pedido de informações que tinha dirigido a esta instituição através da carta de 22 de junho de 2018.

117

Por carta de 6 de junho de 2020, o Reino Unido apresentou um pedido de medidas de instrução ou de organização do processo com vista a que o Tribunal de Justiça obrigasse a Comissão a responder a uma série de questões, algumas das quais já tinham sido colocadas nos pedidos de informações acima referidos constantes das cartas de 22 de junho de 2018 e de 22 de março de 2019.

118

No âmbito da instrução do processo, o Tribunal de Justiça teve em consideração estes pedidos do Reino Unido para efeitos da formulação das questões para resposta escrita que dirigiu à Comissão e a este Estado através carta de 14 de outubro de 2020. Além disso, a pedido do Tribunal de Justiça, as respostas a estas questões foram, em seguida, objeto de debate contraditório na audiência.

IV. Quanto à ação

119

A título preliminar, importa recordar que, com a Decisão (UE) 2020/135, de 30 de janeiro de 2020, relativa à celebração do Acordo sobre a saída do Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte da União Europeia e da Comunidade Europeia da Energia Atómica (JO 2020, L 29, p. 1), o Conselho da União Europeia aprovou, em nome da União Europeia e da Comunidade Europeia da Energia Atómica (CEEA,) este acordo, o qual acompanha essa decisão (JO 2020, L 29, p. 7, a seguir «acordo de saída»).

120

Resulta do artigo 86.o do referido acordo que o Tribunal de Justiça continua a ser competente, nomeadamente, para conhecer dos processos instaurados contra o Reino Unido antes do termo do período de transição, na aceção do artigo 2.o, alínea e), do mesmo acordo, conjugado com o artigo 126.o deste, ou seja, antes de 1 de janeiro de 2021 (a seguir «período de transição»). Tendo a presente ação por incumprimento sido intentada em 7 de março de 2019, o Tribunal de Justiça continua, por conseguinte, a ser competente para dela conhecer.

121

Pode acrescentar‑se que, no que respeita à interpretação e à aplicação do direito da União em matéria de recursos próprios da União relativos aos exercícios financeiros até 2020, decorre dos artigos 136.o e 160.o do acordo de saída que o Tribunal de Justiça continua a ser competente, por força do artigo 258.o TFUE, após 31 de dezembro de 2020, e, por conseguinte, mesmo após o período de quatro anos subsequente ao termo do período de transição referido no artigo 87.o, n.o 1, do mesmo acordo, que está previsto para a propositura de uma nova ação ao abrigo do artigo 258.o TFUE, relativa a um incumprimento ocorrido antes do termo do período de transição.

A. Quanto à admissibilidade

122

Importa apreciar, em primeiro lugar, a argumentação invocada pelo Reino Unido para contestar total ou parcialmente a admissibilidade da presente ação por incumprimento.

1.   Quanto à violação dos direitos de defesa do Reino Unido durante o procedimento pré‑contencioso e no âmbito do processo no Tribunal de Justiça

a)   Argumentos das partes

123

O Reino Unido alega que a presente ação por incumprimento é inadmissível, uma vez que os seus direitos de defesa não foram respeitados nem durante o procedimento pré‑contencioso nem no âmbito do processo no Tribunal de Justiça.

124

Em primeiro lugar, os direitos de defesa do Reino Unido foram violados, uma vez que a Comissão não respondeu nem ao seu pedido de informações constante da carta de 22 de junho de 2018, nem ao seu designado pedido de informações «redefinido» constante da carta de 22 de março de 2019, apesar de se tratar de informações de que o Reino Unido necessitava para poder compreender o incumprimento que lhe era imputado, e para se poder defender.

125

Assim, não tendo obtido uma resposta a esses pedidos de informações, o Reino Unido não dispôs das informações necessárias para poder reconstituir o montante de recursos próprios tradicionais reclamado pela Comissão. Além disso, mesmo após as explicações fornecidas pela Comissão na réplica no que respeita ao cálculo desse montante, subsistem incertezas, nomeadamente no que respeita ao método utilizado para corrigir os preços médios ou à questão de saber se os dados não agregados de que este Estado dispõe correspondem aos dados agregados diários utilizados por esta instituição no âmbito do referido cálculo. Em todo o caso, mesmo admitindo que essas explicações incluem uma parte das informações pedidas, foram comunicadas tardiamente e, assim, em violação tanto dos direitos de defesa do referido Estado como do dever de cooperação leal que incumbe à referida instituição.

126

O Reino Unido alega que os seus direitos de defesa foram igualmente violados, uma vez que a Comissão recusou responder aos pedidos de informações constantes das cartas de 22 de junho de 2018 e de 22 de março de 2019, destinados a obter desta instituição informações relativas às medidas adotadas pelos outros Estados‑Membros a fim de combater a fraude por subavaliação em causa.

127

Ora, o Reino Unido necessitava dessas informações para se poder defender das alegações da Comissão segundo as quais medidas adequadas tinham sido adotadas noutros Estados‑Membros e tinham produzido resultados na luta contra essa fraude. Essas informações eram igualmente pertinentes para, por um lado, determinar se as medidas adotadas pelo Reino Unido estavam abrangidas pela sua margem de apreciação e constituíam, assim, uma abordagem razoável para combater a referida fraude e, por outro, invocar argumentos no que respeita ao nexo de causalidade existente entre o comportamento imputado ao Reino Unido e as perdas de recursos próprios tradicionais alegadas pela Comissão.

128

Em segundo lugar, o Reino Unido alega que os seus direitos de defesa foram violados, uma vez que a Comissão comprometeu a sua capacidade de aceder a todos os dados necessários à sua defesa, na medida em que as declarações aduaneiras anteriores ao ano de 2014 foram destruídas, pois apenas são conservadas durante quatro anos. O acesso a esses dados era necessário uma vez que a Comissão alargou o período de infração para além do indicado no relatório do OLAF, fazendo‑o correr a partir de 2011. Trata‑se de uma alteração de posição da Comissão e de um alargamento do âmbito da causa que violaram os direitos de defesa do Reino Unido.

129

Em terceiro lugar, o Reino Unido alega que a Comissão não respeitou os seus direitos de defesa na medida em que não apresentou provas relativas à natureza das mercadorias em causa e ao Estado‑Membro de destino dessas mercadorias.

130

A Comissão contesta a argumentação do Reino Unido.

b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

131

Resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que o procedimento pré‑contencioso tem por objetivo dar ao Estado‑Membro em questão a oportunidade, por um lado, de cumprir as obrigações que lhe incumbem por força do direito da União e, por outro, de apresentar utilmente os seus meios de defesa face às acusações formuladas pela Comissão. A regularidade desse procedimento constitui uma garantia essencial pretendida pelo Tratado FUE, não só para a proteção dos direitos do Estado‑Membro em causa mas igualmente para assegurar que o processo contencioso eventual terá por objeto um litígio claramente definido [Acórdão de 19 de setembro de 2017, Comissão/Irlanda (Imposto de matrícula), C‑552/15, EU:C:2017:698, n.os 28 e 29 e jurisprudência referida].

132

Além disso, decorre de jurisprudência constante relativa ao artigo 120.o, alínea c), do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça que qualquer petição inicial deve indicar com clareza e precisão o objeto do litígio e conter a exposição sumária dos fundamentos invocados, para permitir ao demandado preparar a sua defesa e ao Tribunal de Justiça exercer a sua fiscalização. Daqui resulta que os elementos essenciais de facto e de direito em que uma ação se baseia devem decorrer, de forma coerente e compreensível, do texto da própria petição e que os pedidos desta última devem ser formulados de forma inequívoca, a fim de evitar que o Tribunal de Justiça decida ultra petita ou não decida quanto a uma acusação (Acórdão de 31 de outubro de 2019, Comissão/Países Baixos, C‑395/17, EU:C:2019:918, n.o 52 e jurisprudência referida).

133

O Tribunal de Justiça declarou igualmente que, no âmbito de uma ação intentada nos termos do artigo 258.o TFUE, esta deve apresentar as acusações de forma coerente e precisa, para permitir ao Estado‑Membro e ao Tribunal de Justiça apreenderem exatamente o alcance da violação do direito da União imputada, condição necessária para que esse Estado possa apresentar utilmente os seus meios de defesa e para que o Tribunal de Justiça possa verificar a existência do incumprimento alegado (Acórdão de 31 de outubro de 2019, Comissão/Países Baixos, C‑395/17, EU:C:2019:918, n.o 53 e jurisprudência referida).

134

No caso em apreço, no que respeita, em primeiro lugar, à recusa da Comissão de fornecer ao Reino Unido determinadas informações que este lhe tinha pedido através das cartas de 22 de junho de 2018 e de 22 de março de 2019, sendo estas essenciais para a sua defesa, há que observar, antes de mais, que, nos n.os 301 a 326 do parecer fundamentado, a Comissão respondeu de forma adequada à crítica, formulada na carta de 22 de junho de 2018, segundo a qual a cópia do anexo 2 do relatório do OLAF, conforme anexada à notificação para cumprir, não estava completa por faltarem várias páginas deste anexo 2.

135

A Comissão explicou, em substância, nesses números do parecer fundamentado, que o referido anexo 2 tinha sido substituído pelo anexo 7 desse relatório, o qual estava disponível para as autoridades do Reino Unido e continha dois documentos técnicos nos quais estavam expostas informações detalhadas relativas ao método OLAF‑JRC, método que a Comissão utilizou igualmente para calcular os montantes de perdas de recursos próprios tradicionais no que respeita ao período de infração cuja disponibilização reclamou no parecer fundamentado e na petição.

136

Nestas condições, o facto de a cópia do anexo 2 do relatório do OLAF, tal como junto à notificação para cumprir, não estar completa não comprometeu a possibilidade de o Reino Unido apresentar utilmente os seus meios de defesa contra as acusações formuladas pela Comissão.

137

Em seguida, segundo o Reino Unido, os seus direitos de defesa foram violados uma vez que a Comissão recusou fornecer‑lhe, em resposta ao seu designado pedido de informações «redefinido» constante da carta de 22 de março de 2019, certas informações relativas ao detalhe do cálculo do PMC e do montante das perdas de recursos próprios tradicionais reclamado no parecer fundamentado, bem como na petição, sendo estas essenciais para a sua defesa. A este respeito, há que observar que, como salientou também, em substância, o advogado‑geral no n.o 126 das suas conclusões, a Comissão demonstrou, nos n.os 132 a 141 da réplica, que tanto os dados utilizados como o método aplicado para efetuar esse cálculo foram sempre conhecidos do Reino Unido e que, por conseguinte, este último dispôs sempre, tanto durante o procedimento pré‑contencioso como no âmbito do processo no Tribunal de Justiça, de todos os elementos necessários para poder reconstituir esse montante e, assim, opor‑se‑lhe.

138

Por outro lado, mesmo que o Reino Unido alegue que subsistem incertezas no que diz respeito a certos aspetos do referido cálculo, há que observar que, tanto durante o procedimento pré‑contencioso como no âmbito do processo no Tribunal de Justiça, este Estado aproveitou a oportunidade de criticar em pormenor este cálculo, bem como os dados e o método OLAF‑JRC do qual decorre o mesmo cálculo. As respostas fornecidas por este Estado às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça, nomeadamente as relativas ao impacto de certos ajustamentos do cálculo do PMC sobre os montantes das perdas dos recursos próprios tradicionais, confirmam, aliás, que este teve sempre um acesso integral a todas as bases de dados e aos documentos técnicos utilizados pela Comissão para efetuar esse cálculo.

139

Daqui resulta igualmente que, ao contrário do que o Reino Unido afirma, as informações fornecidas pela Comissão na réplica não constituem de modo algum novas informações, pelo que não se pode acusar esta instituição de ter sanado tardiamente uma falta de informações lesiva dos direitos de defesa desse Estado.

140

Deve concluir‑se que, no que respeita aos dados utilizados e ao método aplicado pela Comissão para calcular o PMC e o montante das perdas de recursos próprios tradicionais reclamado por esta instituição ao Reino Unido, este último dispôs, tanto durante o procedimento pré‑contencioso como no âmbito do processo no Tribunal de Justiça, de todos os elementos factuais necessários para poder apresentar utilmente os seus meios de defesa contra as acusações formuladas pela Comissão.

141

Por último, no que diz respeito ao facto de a Comissão ter recusado fornecer ao Reino Unido, em resposta às cartas de 22 de junho de 2018 e de 22 de março de 2019, informações relativas às medidas adotadas pelos outros Estados‑Membros para combater a fraude por subavaliação em causa, basta recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, um Estado‑Membro não pode justificar o incumprimento das obrigações que lhe incumbem por força do Tratado invocando o facto de outros Estados‑Membros também não cumprirem as respetivas obrigações. Com efeito, na ordem jurídica da União criada pelo Tratado FUE, a aplicação do direito da União pelos Estados‑Membros não pode estar sujeita a uma condição de reciprocidade. Os artigos 258.o e 259.o TFUE preveem os meios processuais adequados para fazer face aos incumprimentos pelos Estados‑Membros das obrigações que decorrem do Tratado FUE (Acórdão de 11 de julho de 2018, Comissão/Bélgica, C‑356/15, EU:C:2018:555, n.o 106 e jurisprudência referida).

142

A este respeito, mesmo admitindo que, como alega o Reino Unido, outros Estados‑Membros tenham disposto, durante o período da infração ou de parte desta, de um dispositivo de controlos aduaneiros destinado a combater a fraude por subavaliação em causa que, em certos aspetos, era semelhante ao que o Reino Unido aplicava nessa época, tal circunstância é, por si só, irrelevante para efeitos de determinar se o dispositivo desse Estado estava em conformidade com as disposições do direito da União em matéria de proteção dos interesses financeiros da União contra tal fraude, tais como o artigo 325.o TFUE.

143

Por outro lado, há que constatar que, como demonstram, nomeadamente, os diferentes documentos apresentados pelo Reino Unido em anexo à sua carta de 6 de junho de 2020, através da qual este Estado pedia ao Tribunal de Justiça para adotar certas medidas de instrução ou de organização do processo, o referido Estado tinha conhecimento das diferentes medidas tomadas, durante a totalidade ou parte do período de infração, por vários outros Estados‑Membros para combater a fraude por subavaliação em causa, nomeadamente, as que tinham sido adotadas em França, bem como da avaliação dessas medidas pela Comissão, nomeadamente no que diz respeito à sua conformidade com o direito da União, e que, de resto, utilizou essas informações nos articulados que apresentou para a sua defesa. Além disso, o Tribunal de Justiça colocou questões para resposta escrita à Comissão a este respeito. As respostas a estas questões confirmaram então as informações detalhadas de que o Reino Unido já dispunha.

144

Quanto, em segundo lugar, à argumentação do Reino Unido segundo a qual os seus direitos de defesa foram violados, uma vez que a Comissão comprometeu a sua capacidade de aceder a todos os dados necessários à sua defesa, na medida em que as declarações aduaneiras anteriores a 2014 tinham sido destruídas, por apenas serem conservadas durante um período de quatro anos, também não pode ser acolhida.

145

Com efeito, como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, no n.o 130 das suas conclusões, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que, no que respeita à parte do período de infração anterior a 2014 abrangida pela presente ação, infração que, como se verá no n.o 455 do presente acórdão, só incide sobre dívidas aduaneiras apuradas nas ordens de cobrança a posteriori que figuram nos avisos C 18 Snake, o Reino Unido apresentou, em anexo à tréplica, um quadro dos avisos C 18 Snake que emitiu no que diz respeito às importações efetuadas durante essa parte do período de infração, cópias desses avisos e os quadros que mostravam o detalhe dos cálculos que utilizou. Ora, estes quadros fazem referência às declarações aduaneiras relativas a essas importações. Além disso, o Reino Unido não contesta que dispõe dessas declarações aduaneiras, uma vez que as mesmas foram objeto de ordens de cobrança a posteriori que foram contestadas no âmbito de processos de revisão administrativos.

146

Em terceiro lugar, quanto à acusação do Reino Unido segundo a qual a Comissão não respeitou os seus direitos de defesa, na medida em que não apresentou provas relativas à natureza das mercadorias em causa e ao Estado‑Membro de destino dessas mercadorias, esta acusação não diz respeito à admissibilidade da presente ação por incumprimento, mas ao mérito da mesma, uma vez que incide sobre a questão de saber se a Comissão, a quem incumbe o ónus da prova dos incumprimentos que alega, demonstrou de forma juridicamente bastante que os fundamentos que invoca em matéria de estimativa do montante das perdas de recursos próprios tradicionais e de violação das disposições relativas aos recursos próprios provenientes do IVA são procedentes, atendendo, nomeadamente, à natureza e ao destino das referidas mercadorias.

147

Tendo em conta as considerações anteriores, há que julgar improcedente a exceção de inadmissibilidade relativa à violação dos direitos de defesa do Reino Unido durante o procedimento pré‑contencioso e no âmbito do processo no Tribunal de Justiça.

2.   Quanto à insuficiência da base factual e jurídica da acusação relativa a uma violação do direito da União em matéria de IVA, em especial, no que respeita ao regime aduaneiro 42

a)   Argumentos das partes

148

O Reino Unido alega que a Comissão não respeitou os seus direitos de defesa tanto durante o procedimento pré‑contencioso como no âmbito do processo no Tribunal de Justiça, uma vez que não lhe forneceu no parecer fundamentado e na petição informações suficientes relativas à base factual e jurídica do alegado incumprimento do direito da União em matéria de IVA e do direito da União em matéria de recursos próprios provenientes do IVA. Esta omissão não permitiu ao Reino Unido compreender, em especial, a acusação segundo a qual devia ser considerado responsável pela falta de cobrança integral do IVA devido noutro Estado‑Membro no que respeita a produtos importados para o seu território no âmbito do regime aduaneiro 42 e, assim, por não colocar à disposição dessa instituição recursos próprios provenientes desse imposto. Sem essas informações, o Reino Unido não podia apresentar utilmente os seus meios de defesa contra esta acusação.

149

A Comissão não invocou, em especial, qualquer elemento que demonstre que, na medida em que o Reino Unido não adotou as medidas adequadas para combater a fraude por subavaliação em causa, este Estado comprometeu a cobrança do IVA por outros Estados‑Membros ou, inclusivamente, impediu‑os de cobrarem esse imposto e de colocarem à disposição da Comissão os recursos próprios correspondentes.

150

Assim, não é reclamado qualquer montante a título de perdas de recursos próprios provenientes do IVA decorrentes da não cobrança do IVA e não foi fornecida qualquer informação no que respeita aos operadores em causa, aos Estados‑Membros de destino das mercadorias em causa, ao enquadramento por parte destes últimos desses operadores antes e após o envio dessas mercadorias ou às medidas tomadas, ou não, por esses Estados‑Membros de destino para cobrarem o IVA aos referidos operadores.

151

A Comissão contesta a argumentação do Reino Unido.

b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

152

Basta salientar que a argumentação invocada pelo Reino Unido tem por objeto a questão de saber se a acusação relativa a uma violação da Diretiva 2006/112 e das disposições do direito da União em matéria de colocação à disposição dos recursos próprios provenientes do IVA, visada pelos dois primeiros parágrafos do primeiro pedido da petição, assenta numa base jurídica e se a veracidade dos factos juridicamente pertinentes foi demonstrada de forma bastante pela Comissão no âmbito do presente processo. Ora, tal argumentação é relativa ao mérito desta acusação e não à sua admissibilidade.

153

Por conseguinte, a exceção de inadmissibilidade relativa à insuficiência da base factual e jurídica da acusação relativa à violação do direito da União em matéria de IVA, em especial, no que respeita ao regime aduaneiro 42, deve ser afastada.

3.   Quanto à violação dos princípios da proteção da confiança legítima, da segurança jurídica, do estoppel e da cooperação leal

a)   Argumentos das partes

154

O Reino Unido alega que a Comissão violou os princípios da proteção da confiança legítima, da segurança jurídica, do estoppel e da cooperação leal ao reverter determinadas garantias que tinha fornecido a este Estado quando intentou a presente ação por incumprimento, uma vez que esta ação abrange o período anterior ao fim do mês de fevereiro de 2015, pelo que, nessa medida, a referida ação deve ser julgada improcedente.

155

O Reino Unido invoca, a este respeito, determinadas declarações de agentes da Comissão ou do OLAF proferidas em reuniões realizadas em 2014 e em 2015 com a sua administração, em particular a HMRC, a propósito das medidas tomadas por esse Estado para combater a fraude por subavaliação em causa.

156

Decorre destas declarações que, até ao fim do mês de fevereiro de 2015, o referido Estado‑Membro podia legitimamente acreditar que a Comissão e o OLAF consideravam que o seu dispositivo de controlos aduaneiros, caracterizado pelo facto de se centrar em medidas a posteriori, como as ordens de cobrança, e não em medidas como a aplicação de limiares de risco antes do desalfandegamento das mercadorias em causa ou a constituição de garantias, estava em conformidade com o direito da União e que, por conseguinte, não seria objeto de um processo por incumprimento devido a esse dispositivo.

157

O Reino Unido refere‑se, em particular, a três garantias dadas por agentes do OLAF ou da Comissão durante o período de infração que, em seu entender, podiam fundar essa confiança legítima.

158

No que respeita, em primeiro lugar, à declaração que, segundo uma ata dos agentes do Reino Unido, foi proferida por um agente do OLAF numa reunião realizada em 13 de junho de 2014, segundo a qual este estava «satisfeito com os progressos realizados pelo Reino Unido, bem como com as medidas que já tinham sido adotadas nessa data e com as que estavam previstas», esta declaração constitui uma garantia inequívoca de que o OLAF não considerava que o Reino Unido estava a violar as obrigações de proteção dos interesses financeiros da União e de luta contra a fraude que lhe incumbiam.

159

No que respeita, em segundo lugar, à declaração proferida no mês de outubro de 2014 por um agente da Comissão, que informou o Reino Unido de que a sua participação na ACP Discount era «satisfatória» e de que as ações necessárias à boa execução dessa operação «[tinham sido] efetuadas em tempo útil e de forma efetiva», esta declaração constitui uma garantia clara e inequívoca de que o Reino Unido não incumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União no atinente à sua participação na referida operação.

160

No que respeita, em terceiro lugar, à declaração, proferida por um agente do OLAF na primeira reunião bilateral do OLAF com a HMRC, realizada em 19 e 20 de fevereiro de 2015, segundo a qual, nos termos da ata dessa reunião redigida pelos agentes do Reino Unido, «até então», esse Estado‑Membro tinha «feito o que havia que fazer», essa declaração constitui uma garantia relativa a todas as medidas tomadas «até então» pelo referido Estado‑Membro e não apenas no atinente à questão da emissão dos avisos C 18 Snake.

161

A Comissão contesta a argumentação do Reino Unido.

b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

162

Em primeiro lugar, importa recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o objetivo prosseguido pelo processo previsto no artigo 258.o TFUE é a verificação objetiva do desrespeito, por um Estado‑Membro, das obrigações que lhe são impostas pelo Tratado FUE ou por um ato de direito derivado e que esse processo também permite determinar se um Estado‑Membro violou o direito da União num caso concreto (Acórdão de 27 de março de 2019, Comissão/Alemanha, C‑620/16, EU:C:2019:256, n.o 40 e jurisprudência referida).

163

O Tribunal de Justiça declarou igualmente que os princípios da proteção da confiança legítima e da cooperação leal não podiam ser invocados por um Estado‑Membro para se opor à verificação objetiva do desrespeito, por parte do mesmo, das obrigações que lhe são impostas pelo Tratado FUE, uma vez que a admissão dessa justificação iria contra o objetivo prosseguido pelo processo previsto no artigo 258.o TFUE relativo a essa verificação objetiva (v., neste sentido, Acórdão de 6 de maio de 2010, Comissão/Polónia, C‑311/09, não publicado, EU:C:2010:257, n.o 18 e jurisprudência referida).

164

Admitir tal justificação seria igualmente contrário não apenas à exigência que incumbe à União de respeitar a igualdade dos Estados‑Membros perante os Tratados, prevista no artigo 4.o, n.o 2, TUE, mas também ao princípio, consagrado por jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, segundo o qual a Comissão dispõe de um poder de apreciação para decidir da oportunidade de agir contra um Estado‑Membro, para determinar as disposições por este violadas e para escolher o momento em que dará início ao processo por incumprimento contra esse Estado, não podendo as considerações que determinam essa escolha afetar a admissibilidade da ação [Acórdão de 19 de setembro de 2017, Comissão/Irlanda (Imposto de matrícula), C‑552/15, EU:C:2017:698, n.o 34 e jurisprudência referida].

165

Em segundo lugar, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que, para lá dos casos em que tais competências lhe são expressamente atribuídas, a Comissão não está habilitada a dar garantias quanto à compatibilidade com o direito da União de determinado comportamento e que a Comissão não dispõe, em nenhuma circunstância, do poder de autorizar comportamentos contrários ao direito da União (v., neste sentido, Acórdão de 15 de junho 2000, Comissão/Alemanha, C‑348/97, EU:C:2000:317, n.o 45 e jurisprudência referida).

166

Ora, há que observar que, mesmo admitindo que os agentes do OLAF e da Comissão tenham pretendido, com as declarações que o Reino Unido invoca e que são referidas nos n.os 158 a 160 do presente acórdão, dar garantias quanto à compatibilidade com o direito da União do dispositivo desse Estado destinado a combater a fraude por subavaliação em causa, a Comissão não dispunha, à data em que essas declarações foram proferidas, de qualquer competência para dar essas garantias, pelo que esses agentes não estavam habilitados, em nenhuma circunstância, a dar garantias nesse sentido que o referido Estado pudesse agora invocar para contestar a admissibilidade da presente ação por incumprimento.

167

Em terceiro lugar, importa recordar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o direito de invocar o princípio da proteção da confiança legítima pressupõe que as autoridades competentes da União tenham dado ao interessado garantias precisas, incondicionais e concordantes, provenientes de fontes autorizadas e fiáveis. Com efeito, este direito pertence a qualquer sujeito de direito no qual uma instituição, um órgão ou um organismo da União criou esperanças fundadas, ao fornecer‑lhe garantias precisas. Em contrapartida, ninguém pode invocar a violação deste princípio na falta dessas garantias (v., neste sentido, Acórdãos de 19 de julho de 2016, Kotnik e o., C‑526/14, EU:C:2016:570, n.o 62, assim como de 16 de julho de 2020, ADR Center/Comissão, C‑584/17 P, EU:C:2020:576, n.o 75 e jurisprudência referida).

168

Ora, à luz da jurisprudência recordada nos n.os 162 a 164 do presente acórdão, mesmo admitindo que as declarações invocadas pelo Reino Unido tenham podido fundar uma confiança legítima deste no que respeita à compatibilidade com o direito da União do seu dispositivo de controlos aduaneiros destinado a combater a fraude por subavaliação em causa, tal como aplicado antes de 1 de março de 2015, essas declarações não podem, em nenhuma circunstância, ser invocadas para impedir a Comissão de intentar uma ação por incumprimento, uma vez que esta instituição dispõe de um poder de apreciação para decidir da oportunidade de agir contra um Estado‑Membro. Estas declarações também não podem obstar à verificação objetiva pelo Tribunal de Justiça do incumprimento, por esse Estado‑Membro, das obrigações que lhe são impostas pelo Tratado FUE, em conformidade com o objetivo prosseguido pelo processo previsto no artigo 258.o TFUE.

169

Por outro lado, a eficácia do processo por incumprimento arriscava‑se a ficar gravemente comprometida se fosse permitido a um Estado‑Membro invocar uma confiança legítima na legalidade da sua ação, originada por algumas declarações proferidas por agentes da Comissão, para se subtrair a esse processo. Com efeito, como a Comissão observou com razão, os Estados‑Membros não podem eximir‑se, num sistema em que são responsáveis pela execução adequada da legislação aduaneira da União no seu território, da responsabilidade por uma violação do direito da União que possam ter cometido, pelo simples facto de o OLAF ou a Comissão não lhes ter imputado essa violação num determinado momento.

170

Por último, como o advogado‑geral também salientou no n.o 151 das suas conclusões, embora o Reino Unido invoque, além de uma violação do princípio da proteção da confiança legítima, uma violação dos princípios da segurança jurídica, do estoppel e da cooperação leal, este Estado não desenvolve nenhuma argumentação específica relativa a estes últimos princípios, pelo que a argumentação invocada pelo Reino Unido a este respeito deve ser rejeitada.

171

Tendo em conta as considerações anteriores, há que julgar improcedente a exceção de inadmissibilidade relativa à violação dos princípios da proteção da confiança legítima, da segurança jurídica, do estoppel e da cooperação leal.

4.   Quanto à incompetência do Tribunal de Justiça, no âmbito de um processo por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, para conhecer de um pedido da Comissão destinado a ordenar a um Estado‑Membro que disponibilize um determinado montante de recursos próprios

a)   Argumentos das partes

172

O Reino Unido invoca a inadmissibilidade do terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição, através do qual a Comissão pede para «colocar à disposição do orçamento da União» montantes determinados de recursos próprios tradicionais em relação a cada um dos sete anos do período de infração, ou seja, cerca de 2,7 mil milhões de euros no total, uma vez que, em primeiro lugar, segundo os Acórdãos de 14 de abril de 2005, Comissão/Alemanha (C‑104/02, EU:C:2005:219, n.os 48 a 51), e de 5 de outubro de 2006, Comissão/Alemanha (C‑105/02, EU:C:2006:637, n.os 43 a 45), no âmbito de uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, o Tribunal de Justiça não pode obrigar um Estado‑Membro a inscrever na conta aberta para o efeito em nome da Comissão montantes específicos de recursos próprios que não foram pagos devido a incumprimentos imputados a esse Estado‑Membro.

173

O Reino Unido contesta a argumentação da Comissão segundo a qual esta tinha «estruturado» cuidadosamente os pedidos da sua petição de modo a evitar o erro cometido nos processos que deram origem aos acórdãos referidos no número anterior e punido pelo Tribunal de Justiça nesses acórdãos através da declaração de inadmissibilidade dos pedidos em causa. Trata‑se de um «artifício» destinado a contornar a incompetência do Tribunal de Justiça, uma vez que a Comissão visa, na realidade, obter um resultado igual ao pretendido nesses processos.

174

Além disso, a abordagem da Comissão priva o Reino Unido da possibilidade que lhe é conferida pelo artigo 260.o TFUE de sanar qualquer violação verificada nos termos do artigo 258.o TFUE, e não respeita, por conseguinte, as competências respetivas desta instituição, do Tribunal de Justiça e dos Estados‑Membros por força dos Tratados.

175

Por outro lado, o presente processo distingue‑se do processo que deu origem ao Acórdão de 15 de novembro de 2005, Comissão/Dinamarca (C‑392/02, EU:C:2005:683). Embora nesse acórdão o Tribunal de Justiça tenha julgado procedente uma petição que tinha por objeto obter a declaração de que o Estado‑Membro em causa não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam ao recusar colocar à disposição recursos próprios de um determinado montante, há que salientar que, no processo que deu origem ao referido acórdão, como resulta do n.o 56 deste último, nem a existência de uma dívida aduaneira nem o montante das perdas de recursos próprios eram contestados.

176

Neste contexto, é igualmente pertinente o Acórdão de 31 de outubro de 2019, Comissão/Reino Unido (C‑391/17, EU:C:2019:919), uma vez que os n.os 118 e 119 desse acórdão sugerem que, se a Comissão apresentar um pedido destinado a determinar uma perda de recursos próprios especificamente quantificada, essa instituição deve provar cada elemento do seu pedido relativamente a cada importação que esteja na origem de tal perda, bem como o nexo de causalidade existente entre cada um desses elementos e essa perda.

177

Em segundo lugar, o Reino Unido alega que, na realidade, a presente ação tem por objeto a obtenção de uma indemnização por um dano sofrido e, por conseguinte, é inadmissível na medida em que a Comissão pede ao Tribunal de Justiça para se pronunciar sobre determinados montantes específicos que o Reino Unido deveria ter colocado à disposição da Comissão. Mesmo admitindo que o Tribunal de Justiça declare que essa ação é admissível, esse Estado considera que incumbe à Comissão provar que todos os requisitos da responsabilidade desse Estado estão preenchidos, ou seja, um ato ilegal, um prejuízo específico quantificado e um nexo de causalidade direto entre esse ato e esse prejuízo.

178

A título subsidiário, o Reino Unido alega que a petição é inadmissível, uma vez que a Comissão confunde as três etapas que devem ser seguidas para determinar o montante das perdas de recursos próprios. Com efeito, num primeiro momento, a Comissão estava obrigada a apresentar provas de que o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União, de um nexo de causalidade entre esse incumprimento e o montante determinado que reclama, bem como da admissibilidade do seu pedido de colocação à disposição de um montante determinado. Num segundo momento, embora a Comissão estivesse em condições de apresentar essas três provas, o Tribunal de Justiça deveria começar por apreciar a avaliação por parte do Reino Unido dos recursos próprios suplementares devidos. Só se esta avaliação fosse afastada por ser manifestamente desrazoável é que o Tribunal de Justiça podia apreciar, num terceiro momento, a estimativa das perdas invocada pela Comissão.

179

A Comissão contesta a argumentação do Reino Unido.

b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

180

No que respeita, em primeiro lugar, à argumentação do Reino Unido relativa aos Acórdãos de 14 de abril de 2005, Comissão/Alemanha (C‑104/02, EU:C:2005:219), e de 5 de outubro de 2006, Comissão/Alemanha (C‑105/02, EU:C:2006:637), há que recordar que, numa ação por incumprimento, a Comissão apenas pode pedir ao Tribunal de Justiça que declare a existência do alegado incumprimento tendo como objetivo a sua cessação. Assim, a Comissão não pode, por exemplo, pedir ao Tribunal de Justiça, no âmbito de uma ação por incumprimento, que ordene a um Estado‑Membro que adote um determinado comportamento com vista a dar cumprimento ao direito da União [Acórdão de 2 de abril de 2020, Comissão/Polónia, Hungria e República Checa (Mecanismo temporário de recolocação dos requerentes de proteção internacional), C‑715/17, C‑718/17 e C‑719/17, EU:C:2020:257, n.o 56 e jurisprudência referida].

181

Assim, o Tribunal de Justiça julgou inadmissíveis as petições apresentadas ao abrigo do artigo 258.o TFUE através das quais a Comissão lhe pedia para ordenar a um Estado‑Membro que efetuasse determinados pagamentos caso se concluísse que esse Estado‑Membro não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União, com o fundamento essencial de que essas petições não se destinavam a que o Tribunal de Justiça declarasse que o referido Estado‑Membro não tinha cumprido as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União, mas a que o Tribunal de Justiça ordenasse ao mesmo Estado‑Membro que adotasse determinadas medidas com vista a dar cumprimento ao direito da União (v., neste sentido, Acórdãos de 14 de abril de 2005, Comissão/Alemanha, C‑104/02, EU:C:2005:219, n.os 48 a 51, e de 5 de outubro de 2006, Comissão/Alemanha, C‑105/02, EU:C:2006:637, n.os 43 a 45 e jurisprudência referida).

182

Ora, no caso em apreço, embora o terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição inclua a expressão «[a]s perdas de recursos próprios tradicionais correspondentes que devem ser colocados à disposição do orçamento da União», não pode ser entendido no sentido de que constitui um pedido para que o Tribunal de Justiça ordene ao Reino Unido que pague os montantes desses recursos especificados no referido terceiro parágrafo. Pelo contrário, este último constitui um pedido destinado a obter a declaração, pelo Tribunal de Justiça, de um incumprimento das obrigações que incumbem a esse Estado

183

Com efeito, este pedido pecuniário não deve ser entendido de forma isolada, mas à luz do pedido mais geral e não quantificado que figura no primeiro parágrafo do primeiro pedido da petição, que convida o Tribunal de Justiça a declarar que, «ao não ter disponibilizado o montante correto dos recursos próprios tradicionais […] relativos [às importações em causa]», o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força de determinadas disposições do direito da União em matéria de recursos próprios.

184

Daqui resulta que no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição se pede que o Tribunal de Justiça declare que, ao não ter disponibilizado os montantes de recursos próprios tradicionais determinados relativos a cada ano incluído no período de infração, o Reino Unido não respeitou as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União.

185

Ora, a admissibilidade de tal pedido é incontestável, como resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça em matéria de recursos próprios, no âmbito da qual estavam igualmente em causa pedidos dessa natureza [v., nomeadamente, Acórdãos de 15 de novembro de 2005, Comissão/Dinamarca, C‑392/02, EU:C:2005:683, n.os 30 a 34, de 3 de abril de 2014, Comissão/Reino Unido, C‑60/13, não publicado, EU:C:2014:219, n.os 37 a 62, e de 11 de julho de 2019, Comissão/Itália (Recursos próprios — Cobrança de uma dívida aduaneira), C‑304/18, não publicado, EU:C:2019:601, n.os 48 a 77].

186

Contrariamente ao que o Reino Unido alega, esta jurisprudência não pode ser entendida no sentido de que tal pedido, na medida em que implica a declaração de um incumprimento que consiste na não disponibilização de um montante determinado de recursos próprios, só é admissível quando esse montante não é contestado pelo Estado‑Membro em causa.

187

Com efeito, o Tribunal de Justiça deferiu um pedido da Comissão que tinha por objeto a declaração de uma violação do direito da União, com o fundamento de que um determinado montante de recursos próprios não tinha sido disponibilizado, apesar de o Estado‑Membro em causa ter contestado a própria existência de um direito da União sobre esse montante [v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2019, Comissão/Itália (Recursos próprios — Cobrança de uma dívida aduaneira), C‑304/18, não publicado, EU:C:2019:601, n.os 48 a 77].

188

Mais importante ainda, resulta da jurisprudência que a faculdade de a Comissão submeter à apreciação do Tribunal de Justiça, no âmbito de uma ação por incumprimento, um diferendo que a opõe a um Estado‑Membro quanto à obrigação de este pôr um determinado montante de recursos próprios da União à disposição da referida instituição é inerente ao sistema destes recursos próprios, conforme atualmente concebido no direito da União (Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 68).

189

Com efeito, o contencioso em matéria de recursos próprios tem precisamente origem no facto de o Estado‑Membro em causa contestar o dever de disponibilizar os montantes pedidos pela Comissão. No âmbito de uma ação por incumprimento relativa aos recursos próprios, é, por conseguinte, absolutamente natural que estejam em causa obrigações pecuniárias e o direito da União não se opõe a que a inobservância dessas obrigações seja suscitada no âmbito do alegado incumprimento. No quadro desse procedimento incumbe à Comissão demonstrar de forma suficiente, no âmbito de um debate contraditório no qual o Estado‑Membro pode invocar os seus fundamentos, a exatidão dos montantes dos recursos próprios que considera serem devidos.

190

Além disso, contrariamente ao que o Reino Unido alega, a faculdade de a Comissão pedir ao Tribunal de Justiça para declarar que um determinado montante de recursos próprios tradicionais é devido não pode ser excluída pelo facto de essa diligência privar esse Estado da possibilidade que lhe é oferecida pelo artigo 260.o TFUE de sanar qualquer violação verificada nos termos do artigo 258.o TFUE e, por conseguinte, não respeitar as respetivas competências dessa instituição, do Tribunal de Justiça e dos Estados‑Membros ao abrigo dos Tratados.

191

Com efeito, embora a Comissão possa abster‑se de formular esse pedido pecuniário limitando‑se a pedir ao Tribunal de Justiça que declare, de modo geral, o incumprimento que consiste em não ter cobrado recursos próprios, sem determinar o montante destes, como fez, nomeadamente, no processo que deu origem ao Acórdão de 31 de outubro de 2019, Comissão/Reino Unido (C‑391/17, EU:C:2019:919), nada impede que essa instituição peça, na petição inicial, a declaração de uma violação do direito da União relativa à não disponibilização de um montante específico de recursos próprios, sempre que a referida instituição considere que esse montante é devido e consiga demonstrar a exatidão do mesmo.

192

No que respeita, em segundo lugar, à argumentação do Reino Unido segundo a qual a presente ação visa, na realidade, obter a indemnização de um dano sofrido e, assim, é inadmissível na medida em que a Comissão pede ao Tribunal de Justiça para se pronunciar sobre determinados montantes específicos que o Reino Unido deveria ter colocado à sua disposição, decorre do que precede que, no âmbito de uma ação por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, a admissibilidade de um pedido como o que figura no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição não pode ser posta em causa.

193

A este respeito, importa igualmente recordar que o Tribunal de Justiça declarou que uma ação pela qual a Comissão acusa um Estado‑Membro de não ter colocado à disposição um determinado montante de recursos próprios e os juros de mora correspondentes em violação do direito da União não constitui uma ação de indemnização não prevista pelos Tratados, uma vez que, através dessa ação, essa instituição pede ao Tribunal de Justiça para declarar que o Estado‑Membro em causa não cumpriu uma obrigação que lhe incumbe por força do direito da União e não para condenar esse Estado‑Membro no pagamento de uma indemnização (Acórdão de 15 de novembro de 2005, Comissão/Dinamarca, C‑392/02, EU:C:2005:683, n.os 31 a 34).

194

Por conseguinte, é efetivamente no âmbito de uma ação por incumprimento, e não de uma ação destinada a obter uma indemnização, que o pedido em causa se insere, ainda que este tenha um caráter pecuniário.

195

Daqui resulta que, contrariamente ao que o Reino Unido alega, embora a Comissão esteja obrigada a demonstrar o incumprimento que esse pedido visa constatar, essa instituição não tem de provar a existência de um dano nem de um nexo de causalidade entre esse incumprimento e esse dano.

196

No que respeita, em terceiro lugar, à argumentação do Reino Unido invocada a título subsidiário e relativa ao facto de a petição ser inadmissível, uma vez que a Comissão confunde as três etapas que, como foi exposto no n.o 178 do presente acórdão, deveriam ser seguidas para determinar o montante das perdas de recursos próprios, basta observar que esta argumentação diz respeito ao mérito da presente ação, em especial, ao mérito da primeira e segunda acusações que a Comissão formula, e não à sua admissibilidade.

197

Tendo em consideração o exposto, há que julgar improcedente a exceção de inadmissibilidade suscitada pelo Reino Unido relativa à incompetência do Tribunal de Justiça.

5.   Quanto ao caráter prematuro e à inadmissibilidade da petição no que respeita ao período compreendido entre 1 de maio de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive devido à emissão dos avisos C 18 Breach relativos a esse período

a)   Argumentação das partes

198

O Reino Unido alega que, no que respeita à parte do período de infração compreendida entre 1 de maio de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive, o pedido de colocação à disposição de recursos próprios tradicionais que figura no terceiro parágrafo do primeiro pedido formulado na petição é «prematuro e inadmissível» e, a título subsidiário, que este pedido deve ser considerado improcedente pelo facto de a Comissão não ter conseguido provar a sua alegação relativa à existência de perdas de recursos próprios antes da data de expiração do prazo para dar cumprimento ao parecer fundamentado.

199

Com efeito, embora a Comissão tivesse conhecimento, desde o mês de maio de 2018, dos oito avisos C 18 Breach emitidos e inscritos na contabilidade B durante esse mês e relativos a importações consideradas subavaliadas e efetuadas a partir de 1 de maio de 2015, num montante de cerca de 25 milhões de GBP, não contestou esses avisos nem no parecer fundamentado nem na petição e também não deduziu esse montante das perdas de recursos próprios tradicionais referidas no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição.

200

Assim, a Comissão não teve em conta os montantes que podiam ter sido cobrados na sequência da emissão dos avisos C 18 Breach nem o facto de o Reino Unido poder eximir‑se da obrigação de cobrança que lhe incumbia nos termos do artigo 13.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 609/2014 se os direitos apurados e lançados na contabilidade B se revelassem a final incobráveis.

201

A Comissão contesta a argumentação do Reino Unido.

b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

202

A argumentação do Reino Unido segundo a qual, no que respeita à parte do período de infração compreendido entre 1 de maio de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive, o pedido de colocação à disposição de recursos próprios tradicionais que figura no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição é «prematuro e inadmissível», uma vez que não tem em conta os oito avisos C 18 Breach emitidos no mês de maio de 2018 e relativos a importações subavaliadas efetuadas durante essa parte do período de infração, não pode ser acolhida.

203

Com efeito, como é recordado no n.o 164 do presente acórdão, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que a Comissão dispõe de um poder de apreciação para decidir da oportunidade de agir contra um Estado‑Membro, para determinar as disposições por este violadas e para escolher o momento em que dará início ao processo por incumprimento contra esse Estado, não podendo as considerações que determinam essa escolha afetar a admissibilidade da ação [Acórdão de 2 de abril de 2020, Comissão/Polónia, Hungria e República Checa (Mecanismo temporário de recolocação dos requerentes de proteção internacional), C‑715/17, C‑718/17 e C‑719/17, EU:C:2020:257, n.o 75 e jurisprudência referida].

204

Na medida em que, com esta argumentação, o Reino Unido contesta o pedido de colocação à disposição de recursos próprios tradicionais que figura no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição no que respeita à parte do período de infração compreendido entre 1 de maio de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive, pelo facto de a Comissão não ter conseguido provar a sua alegação relativa à existência das perdas de recursos próprios à data em que expirou o prazo para dar cumprimento ao parecer fundamentado, a referida argumentação não visa contestar a admissibilidade da ação, mas o mérito desta.

205

Por conseguinte, há que julgar improcedente a exceção de inadmissibilidade relativa ao caráter prematuro e à inadmissibilidade da petição no que respeita ao período compreendido entre 1 de maio de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive devido à emissão dos avisos C 18 Breach relativos a esse período e, assim, todas as exceções de inadmissibilidade invocadas pelo Reino Unido.

B. Quanto ao mérito

1.   Quanto ao incumprimento das obrigações em matéria de proteção dos interesses financeiros da União e de luta contra a fraude, assim como das obrigações decorrentes do direito aduaneiro da União

206

Com o primeiro fundamento, que tem por objeto as acusações que figuram no segundo parágrafo do primeiro pedido da petição, com exceção da relativa à violação da regulamentação da União em matéria de IVA, em particular de determinadas disposições da Diretiva 2006/112, a Comissão alega que, durante o período de infração, apesar dos repetidos avisos e pedidos da Comissão e do OLAF relativos ao risco de fraude por subavaliação que as importações em causa apresentavam, o Reino Unido não tomou medidas baseadas no risco destinadas a proteger os interesses financeiros da União. A não adoção dessas medidas constitui um incumprimento tanto das obrigações gerais que incumbem aos Estados‑Membros em matéria de proteção dos interesses financeiros da União e de luta contra a fraude, por força do artigo 310.o, n.o 6, e do artigo 325.o TFUE, como das obrigações específicas impostas aos Estados‑Membros por força da regulamentação aduaneira da União, desde logo, de adotarem medidas que protejam os interesses financeiros da União por força do artigo 3.o do Código Aduaneiro da União, conjugado com o artigo 4.o, n.o 3, TUE, em seguida, de efetuarem controlos com base numa análise de risco, por força do artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, e, por último, de exigirem a constituição de garantias nos termos do artigo 248.o, n.o 1, do Regulamento de aplicação e do artigo 244.o do Regulamento de Execução.

207

Por outro lado, uma vez que tem por objeto um alegado incumprimento do direito aduaneiro da União, há também que apreciar, no âmbito do primeiro fundamento, a acusação referida no primeiro parágrafo do primeiro pedido da petição, segundo a qual, durante o período da infração, o Reino Unido cometeu uma violação contínua do artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União, na medida em que, no que respeita às importações em causa, esse Estado não procedeu ao «registo de liquidação», na aceção do artigo 217.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 104.o do Código Aduaneiro da União, das dívidas aduaneiras que continuavam por cobrar a partir do momento em que as autoridades aduaneiras se aperceberam da situação que levou à verificação dessas dívidas.

a)   Quanto à violação do artigo 310.o, n.o 6, TFUE e do artigo 325.o TFUE

1) Quanto às obrigações impostas aos Estados‑Membros por força do artigo 325.o TFUE

208

No que respeita, em primeiro lugar, ao incumprimento imputado ao Reino Unido por não ter respeitado as obrigações que lhe incumbiam em matéria de proteção dos interesses financeiros da União e de luta contra a fraude por força do artigo 310.o, n.o 6, TFUE e do artigo 325.o TFUE, há que indicar, a título preliminar, que este deve ser apreciado apenas à luz do artigo 325.o TFUE, uma vez que, como observou igualmente o advogado‑geral, em substância, no n.o 170 das suas conclusões, o artigo 310.o, n.o 6, TFUE efetua uma simples remissão para o artigo 325.o TFUE e não impõe outras obrigações além das previstas por este último. Com efeito, o artigo 310.o, n.o 6, TFUE limita‑se a prever que «[e]m conformidade com o artigo 325.o [TFUE], a União e os Estados‑Membros combatem as fraudes e quaisquer outras atividades ilegais lesivas dos interesses financeiros da União».

209

O artigo 325.o, n.o 1, TFUE obriga os Estados‑Membros a combaterem as fraudes e quaisquer outras atividades ilegais lesivas dos interesses financeiros da União por meio de medidas dissuasivas e efetivas (Acórdão de 5 de junho de 2018, Kolev e o., C‑612/15, EU:C:2018:392, n.o 50 e jurisprudência referida).

210

Em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, da Decisão 2014/335, cujo conteúdo é, em substância, idêntico ao do artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da Decisão 2007/436, os recursos próprios da União abrangem nomeadamente os direitos da Pauta Aduaneira Comum. Por conseguinte, existe uma relação direta entre a cobrança das receitas provenientes destes direitos e a colocação à disposição dos recursos correspondentes. Qualquer falha na cobrança dessas receitas está potencialmente na origem de uma redução desses recursos (v., neste sentido, Acórdão de 5 de junho de 2018, Kolev e o., C‑612/15, EU:C:2018:392, n.o 51 e jurisprudência referida).

211

Assim, a fim de assegurar a proteção dos interesses financeiros da União em conformidade com o artigo 325.o, n.o 1, TFUE, incumbe aos Estados‑Membros adotar as medidas necessárias com vista a garantir a cobrança efetiva e integral dos direitos aduaneiros, o que exige que os controlos aduaneiros possam ser devidamente realizados (Acórdão de 5 de junho de 2018, Kolev e o., C‑612/15, EU:C:2018:392, n.o 52).

212

Assim, decorre das obrigações que lhes são impostas pelo artigo 325.o, n.o 1, TFUE que os Estados‑Membros devem prever, para esse efeito, a aplicação não só de sanções adequadas mas também de medidas de controlo aduaneiro eficazes e dissuasivas para combater de forma adequada as infrações à regulamentação aduaneira da União, desde que estas sejam suscetíveis de obstar à cobrança efetiva e integral dos recursos próprios tradicionais constituídos pelos direitos aduaneiros e, por conseguinte, possam lesar os interesses financeiros da União (v., neste sentido, Acórdão de 5 de junho de 2018, Kolev e o., C‑612/15, EU:C:2018:392, n.o 53).

213

É certo que, em conformidade com o artigo 325.o, n.o 1, TFUE, a fim de garantir a cobrança efetiva e integral das receitas afetadas aos recursos próprios da União, nomeadamente as constituídas pelos direitos da Pauta Aduaneira Comum, os Estados‑Membros dispõem de alguma latitude e liberdade de escolha quanto às medidas que devem ser tomadas no que respeita, nomeadamente, à maneira de utilizar os meios de que dispõem. No entanto, essa latitude ou essa liberdade de escolha é limitada, não só pelos princípios da proporcionalidade e da equivalência, como também pelo princípio da efetividade, que impõe que as medidas tomadas sejam eficazes e dissuasivas, sob reserva, porém, do necessário respeito pelos direitos fundamentais garantidos pela Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta») e dos princípios gerais do direito da União (v., neste sentido, nomeadamente, Acórdãos de 7 de abril de 2016, Degano Trasporti, C‑546/14, EU:C:2016:206, n.os 20 e 21, de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B., C‑42/17, EU:C:2017:936, n.os 33 a 36, e de 17 de janeiro de 2019, Dzivev e o., C‑310/16, EU:C:2019:30, n.os 27, 30 e 34, e jurisprudência referida).

214

A este respeito, importa sublinhar que, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o artigo 325.o, n.o 1, TFUE impõe aos Estados‑Membros obrigações de resultado precisas, que não estão subordinadas a nenhuma condição relativa à aplicação das regras que enuncia (Acórdão de 5 de junho de 2018, Kolev e o., C‑612/15, EU:C:2018:392, n.o 64 e jurisprudência referida).

215

Tendo em conta as considerações anteriores e contrariamente ao que o Reino Unido alega, não decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que os Estados‑Membros dispõem, por força do artigo 325.o, n.o 1, TFUE, de uma ampla margem de apreciação na escolha das medidas adotadas para combater uma fraude suscetível de lesar os interesses financeiros da União, pelo que apenas as medidas manifestamente inadequadas à luz de todas as circunstâncias do caso em apreço podem ser punidas ao abrigo desta disposição.

216

Além disso, esta jurisprudência não pode, contrariamente ao que o Reino Unido alega, fundamentar a tese segundo a qual a obrigação de garantir uma cobrança efetiva e integral dos recursos próprios não exige que se envidem esforços intensos para fiscalizar e cobrar os impostos que se insiram nesses recursos, mas simplesmente esforços razoáveis, nem a tese de que os Estados‑Membros apenas estão obrigados a fazer prova de diligência na cobrança dos referidos recursos. Pelo contrário, segundo os próprios termos desta jurisprudência, o artigo 325.o, n.o 1, TFUE impõe «obrigações de resultado precisas» aos Estados‑Membros e não apenas obrigações de meios.

217

Contrariamente ao que o Reino Unido alega, também não resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que só pode ser imputado a um Estado‑Membro um incumprimento das obrigações previstas no artigo 325.o, n.o 1, TFUE em situações em que a Comissão demonstre que a medida nacional em causa implica existia existência de um «risco evidente e grave de impunidade» ou que esta conduz a uma «inexistência de sanção» (Conclusões do advogado‑geral Y. Bot no processo M.A. S. e M.B., C‑42/17, EU:C:2017:564, n.o 83), ou ainda quando está em causa uma «negligência» ou um comportamento «arbitrário» do Estado‑Membro em causa (Acórdão de 16 de maio de 1991, Comissão/Países Baixos, C‑96/89, EU:C:1991:213, n.o 37, de 15 de junho de 2000, Comissão/Alemanha, C‑348/97, EU:C:2000:317, n.o 64, e de 18 de outubro de 2007, Comissão/Dinamarca, C‑19/05, EU:C:2007:606, n.os 18 e 35).

218

Com efeito, embora, na sua jurisprudência, o Tribunal de Justiça tenha concluído, em tais situações bem específicas, pela existência de uma violação do direito da União e, em particular, do artigo 325.o, n.o 1, TFUE, não decorre de forma alguma dessa jurisprudência que o âmbito de aplicação desta disposição está limitado a tais situações, tanto mais que os processos que deram origem a essa jurisprudência diziam respeito a sanções e procedimentos relativos a essas sanções e, por conseguinte, a medidas fundamentalmente diferentes das medidas dos controlos aduaneiros em causa no presente processo.

219

Além disso, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça relativa às exigências que o artigo 325.o, n.o 1, TFUE impõe, no atinente às sanções que visam punir as infrações à regulamentação aduaneira da União, que, embora os Estados‑Membros disponham, a este propósito, de liberdade de escolha no que diz respeito às sanções aplicáveis, as quais podem assumir a forma de sanções administrativas, de sanções penais ou de uma combinação de ambas, devem assegurar que os casos de fraude grave ou de outra atividade ilegal grave lesiva dos interesses financeiros da União em matéria aduaneira sejam passíveis de sanções penais que revistam natureza efetiva e dissuasiva (Acórdão de 5 de junho de 2018, Kolev e o., C‑612/15, EU:C:2018:392, n.o 54 e jurisprudência referida).

220

Daqui decorre que a natureza das medidas de controlo aduaneiro que devem ser tomadas pelos Estados‑Membros para dar cumprimento às exigências que o artigo 325.o, n.o 1, TFUE lhes impõe em matéria de luta contra a fraude ou qualquer outra atividade ilegal suscetível de lesar os interesses financeiros da União não pode ser determinada de modo abstrato e estático, uma vez que depende das características dessa fraude ou dessa outra atividade ilegal, as quais podem evoluir no tempo.

2) Quanto à violação das obrigações impostas pelo artigo 325.o TFUE

i) Observações preliminares

221

Antes de apreciar o incumprimento do artigo 325.o TFUE que a Comissão imputa especificamente ao Reino Unido, há que recordar que, no âmbito de uma ação por incumprimento ao abrigo do artigo 258.o TFUE, incumbe à Comissão, que tem o ónus de demonstrar a existência do incumprimento alegado, apresentar ao Tribunal de Justiça os elementos necessários para que este possa verificar a existência do referido incumprimento, não podendo fundar‑se numa qualquer presunção [Acórdão de 2 de abril de 2020, Comissão/Polónia, Hungria e República Checa (Mecanismo temporário de recolocação dos requerentes de proteção internacional), C‑715/17, C‑718/17 e C‑719/17, EU:C:2020:257, n.o 124 e jurisprudência referida].

222

Daqui resulta que, no caso em apreço, incumbe à Comissão demonstrar de forma juridicamente bastante que as medidas que o Reino Unido adotou, durante o período da infração, para combater a fraude por subavaliação em causa não garantiam uma cobrança efetiva e integral das receitas afetadas aos recursos próprios da União que os direitos da Pauta Aduaneira Comum constituem, em violação do princípio da efetividade consagrado no artigo 325.o, n.o 1, TFUE.

223

A este respeito, a Comissão alega, no essencial, que, tendo em conta as características da fraude por subavaliação em causa, conhecidas do Reino Unido durante todo o período da infração, as únicas medidas de controlo aduaneiro que permitem lutar contra essa fraude e proteger devidamente os interesses financeiros da União em conformidade com o princípio da efetividade consagrado no artigo 325.o, n.o 1, TFUE eram as que tinha recomendado juntamente com o OLAF, também ao longo de todo o período de infração, a saber, em substância, um dispositivo de controlos aduaneiros aplicado previamente ao desalfandegamento das mercadorias em causa e assente numa análise de risco.

224

A Comissão alega que, uma vez que o Reino Unido centrou o seu dispositivo de luta contra a fraude por subavaliação em causa em medidas aduaneiras aplicadas após o desalfandegamento das mercadorias em causa, tais como ordens de cobrança a posteriori de direitos aduaneiros, não tomou as medidas que o princípio da efetividade previsto no artigo 325.o, n.o 1, TFUE impunha.

ii) Recapitulação das características essenciais da fraude por subavaliação em causa

225

Antes de apreciar esta acusação, importa recordar as características essenciais da fraude por subavaliação em causa conforme resultam, nomeadamente, do relatório do OLAF e que, de resto, não são contestadas entre as partes.

226

Tratava‑se de uma fraude relativamente pouco sofisticada que envolvia valores aduaneiros declarados a níveis extremamente baixos pelas designadas empresas «fénix» ou «de fachada», ou seja, empresas constituídas com o único objetivo de cometer essa fraude, dotadas de recursos extremamente reduzidos e liquidadas ou extintas assim que a exatidão dos valores declarados era posta em causa pelas autoridades aduaneiras, o que tornava assim qualquer cobrança a posteriori de direitos aduaneiros improvável ou praticamente impossível na grande maioria dos casos.

227

A referida fraude era organizada por grupos criminosos que operavam em rede e utilizavam essas empresas para a executar. Tratava‑se de uma fraude móvel e muito reativa, no sentido de que esse comércio ilícito e clandestino era rapidamente deslocado para outro ponto de entrada do território aduaneiro da União assim que os controlos aduaneiros eram anunciados ou que sinais nesse sentido eram intercetados por esses grupos.

228

A mesma fraude implicava grandes volumes de produtos, o que a tornava mais ou menos rentável, incluindo para as referidas empresas, segundo o nível dos direitos eludidos. Era implementada em grande escala e afetava toda a União, apesar de nem todos os Estados‑Membros terem sido afetados na mesma medida, uma vez que tinha tendência para se deslocar para os Estados‑Membros com dispositivos de controlos aduaneiros menos estritos, pelo que estes podiam ser considerados os elos mais fracos do território aduaneiro da União a esse respeito. Na prática, os produtos afetados pela fraude por subavaliação em causa eram, na grande maioria dos casos, importados para o Reino Unido no âmbito do regime aduaneiro 42, o que implicava que esses produtos se destinavam, desde o início, a outros Estados‑Membros, como a República francesa ou a República italiana, e que o IVA devia ser pago nesses outros Estados‑Membros, o que, no entanto, em regra, não era o caso, uma vez que as mercadorias em causa eram tipicamente destinadas a um comércio ilícito e clandestino no território dos referidos Estados‑Membros.

iii) Quanto ao conhecimento pelo Reino Unido, desde o início do período da infração, das características essenciais da fraude por subavaliação em causa e das medidas eficazes para a combater

229

Embora, como salientou igualmente o advogado‑geral no n.o 185 das suas conclusões, o Reino Unido tenha admitido, por diversas vezes e tanto durante o procedimento pré‑contencioso como no âmbito do processo no Tribunal de Justiça, que tinha ocorrido uma fraude por subavaliação no seu território durante o período de infração, acrescentando que era a vítima da mesma, este Estado alega ter tomado as medidas que dele podiam razoavelmente ser esperadas para lutar contra tal fraude, tendo em conta os conhecimentos limitados que o referido Estado tinha, à data em que essas medidas foram tomadas, tanto da natureza e extensão dessa fraude como das medidas eficazes para a combater.

230

O Reino Unido alega que só no final de 2014, na sequência da ODC Snake, é que o OLAF e alguns Estados‑Membros em causa começaram a compreender corretamente os comportamentos fraudulentos a que deviam fazer face e que foi apenas na sequência da mensagem de assistência mútua 2015/013 que este Estado teve um conhecimento suficiente da fraude por subavaliação em causa e das medidas específicas necessárias para a combater.

231

Ora, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que todos os Estados‑Membros, incluindo, à época, o Reino Unido, tinham, pelo menos desde o início do período da infração, um conhecimento suficiente das características essenciais da fraude por subavaliação em causa e das contramedidas necessárias para a combater eficazmente que o OLAF e a Comissão lhe recomendavam adotar.

232

Com efeito, na mensagem de assistência mútua 2007/015, o OLAF tinha informado todos esses Estados‑Membros do risco, nomeadamente, de subavaliação extrema das importações de produtos em causa provenientes da China no território da União, na maioria dos casos, por empresas designadas «de fachada», em relação às quais se verificava frequentemente, na prática, após verificação, que a sede social não se encontrava no endereço indicado nas declarações aduaneiras, bem como do risco de deslocação dessa fraude para outros portos da União.

233

Tendo em conta estas características essenciais da fraude por subavaliação em causa, o OLAF convidava todos os referidos Estados‑Membros a analisar as importações de produtos em causa provenientes, nomeadamente, da China a fim de detetar eventuais indícios de importações subavaliadas, a proceder a controlos aduaneiros adequados no momento do desalfandegamento das mercadorias em causa a fim de verificar os valores declarados dessas mercadorias e garantir que estas refletiam os valores de mercado reais destas, bem como a tomar as medidas de salvaguarda adequadas em caso de suspeita de preços faturados artificialmente baixos.

234

Além disso, através da mensagem de assistência mútua 2009/001, o OLAF informou todos esses Estados‑Membros de que as suas análises relativas ao período compreendido entre o mês de janeiro e o mês de junho de 2009 tinham confirmado a existência de importações de produtos em causa provenientes da China em toda a União com valores declarados extremamente baixos. Face a esta constatação de uma «fraude por subavaliação séria» e fazendo referência às recomendações que já tinha formulado na mensagem de assistência mútua 2007/015, o OLAF pedia que os Estados‑Membros o informassem, no prazo de quatro semanas, da implementação de «filtros de risco (ajustados)». Além disso, pedia a todos os Estados‑Membros que «toma[ssem] medidas adequadas para lutar contra o fenómeno endémico da subavaliação» e que «identificassem os envios de alto risco», e recomendava que «verificassem a existência dos importadores».

235

Por outro lado, as orientações da ACP Discount incluíam a descrição de uma metodologia concreta, baseada nos «preços justos» do método OLAF‑JRC e aplicável antes do desalfandegamento das mercadorias em causa, sendo os Estados‑Membros encorajados a aplicar esta metodologia para combater a fraude por subavaliação em causa, nomeadamente no âmbito desta operação aduaneira. A constituição de garantias fazia parte das medidas cuja adoção o OLAF e a Comissão recomendavam.

236

Numa reunião do comité aduaneiro da Comissão de 9 de março de 2012, na qual participou um representante do Reino Unido, um representante desta instituição explicou que a ACP Discount tinha dado origem essencialmente a verificações no momento do desalfandegamento das mercadorias em causa a fim de garantir a efetividade da operação, na medida em que esta visava combater um comércio ilícito e clandestino que envolvia operadores «desaparecidos/fictícios» («missing traders»).

237

Importa igualmente recordar que, entre o mês de fevereiro de 2015 e o mês de julho de 2016, o Reino Unido participou em várias reuniões organizadas pelo OLAF, consagradas à fraude por subavaliação em causa, durante as quais o OLAF reiterou e atualizou as informações que já tinha fornecido no que respeita à extensão e à natureza dessa fraude, em particular o facto de esse comércio ilícito se desenvolver cada vez mais no Reino Unido, bem como sobre as contramedidas a adotar para combater de maneira eficaz a referida fraude. No decurso dessas reuniões o OLAF continuou a recomendar fortemente ao Reino Unido a implementação de limiares de risco para detetar remessas suscetíveis de serem subavaliadas e sujeitar essas remessas de risco a medidas de controlo aduaneiro antes da introdução em livre prática das mercadorias em causa, tais como controlos físicos, a recolha de amostras e a constituição de garantias, a fim de assegurar que os direitos aduaneiros sejam efetivamente cobrados com base no valor real dessas mercadorias.

238

Daqui resulta que, contrariamente ao que a República Portuguesa alega, não decorre da mensagem de assistência mútua 2015/013 que só após a ODC Snake é que os Estados‑Membros tiveram efetivamente conhecimento da fraude por subavaliação em causa. Por outro lado, e em todo o caso, essa mensagem de assistência mútua remetia expressamente para as mensagens de assistência mútua 2007/015 e 2009/001, bem como, por conseguinte, para as informações fornecidas pelo OLAF nestas últimas mensagens, resumidas nos n.os 232 e 234 do presente acórdão.

239

Contrariamente ao que alega a República Portuguesa, também não resulta da mensagem de assistência mútua 2015/013 e do n.o 83 do Relatório Especial n.o 24/2015 do Tribunal de Contas Europeu, com o título «Luta contra a fraude ao IVA intracomunitário: são necessárias mais medidas», que as autoridades aduaneiras do Reino Unido ignoravam a existência de uma prática generalizada de falsas declarações aduaneiras anterior à ODC Snake.

240

Com efeito, resulta da referida mensagem de assistência mútua e do n.o 83 do referido relatório especial que a ODC Snake tinha permitido constatar que, no que respeita ao regime aduaneiro com o código 40 na lista dos regimes aduaneiros da União, que prevê a introdução no consumo com introdução em livre prática simultânea de mercadorias que não são objeto de uma entrega isenta de IVA (a seguir «regime aduaneiro 40»), o risco de subavaliação estava avaliado em cerca de 20 % das importações em causa e que, no que respeita ao regime aduaneiro 42, esse risco estava avaliado em 40 % dessas importações.

241

Ora, não se pode considerar que tal indicação significa que a problemática da fraude por subavaliação em causa era um problema de que os Estados‑Membros só tinham tido conhecimento na sequência da ODC Snake.

242

Por conseguinte, a Comissão fez prova juridicamente bastante de que, desde o início do período de infração, o Reino Unido tinha um conhecimento suficiente das características essenciais tanto da fraude por subavaliação em causa, resumidas nos n.os 226 a 228 do presente acórdão, como das medidas que o OLAF e a Comissão lhe recomendavam adotar para combater eficazmente essa fraude, a saber, essencialmente, medidas de controlo aduaneiro aplicadas antes do desalfandegamento de envios detetados como sendo suscetíveis de serem subavaliados com base num instrumento de análise de risco como o dos limiares de risco que constituem os PMA fixados em aplicação do método OLAF‑JRC.

243

Esta conclusão não pode ser posta em causa pelo facto de, durante o período da infração, o conhecimento pelo Reino Unido da extensão e da natureza da referida fraude, bem como dos meios para a combater eficazmente, ter ainda melhorado tendo em conta, nomeadamente, o desenvolvimento das importações fraudulentas a preços extremamente baixos no seu território e perdas potenciais de recursos próprios tradicionais daí resultantes ou determinados aspetos da aplicação do método OLAF‑JRC enquanto instrumento de análise de risco.

iv) Quanto à não conformidade com o artigo 325.o, n.o 1, TFUE do dispositivo de controlos aduaneiros aplicado pelo Reino Unido durante o período de infração para combater a fraude por subavaliação em causa

244

Como referido no n.o 224 do presente acórdão, a Comissão alega que o dispositivo de controlos aduaneiros aplicado pelo Reino Unido durante o período da infração para combater a fraude por subavaliação em causa não estava em conformidade com o princípio da efetividade consagrado no artigo 325.o, n.o 1, TFUE, uma vez que este se limitava essencialmente às medidas de controlo aduaneiro aplicadas a posteriori, ou seja, após o desalfandegamento das mercadorias em causa, e, em particular, às cobranças de direitos a posteriori.

245

A Comissão alega, conforme salientado no n.o 223 do presente acórdão, que só um sistema de controlos aduaneiros essencialmente da mesma natureza que o recomendado pelo OLAF, ou seja, que inclua limiares de risco fixados a um nível pelo menos equivalente aos PMA e aplicados ex ante, bem como a constituição de garantias, era suscetível de permitir combater de forma eficaz a fraude por subavaliação em causa, tendo em conta características essenciais desta última, recordadas nos n.os 226 a 228 do presente acórdão, nomeadamente, uma fraude vasta, móvel, reativa aos controlos e cometida pelas designadas empresas «fénix». Segundo a Comissão, os controlos efetuados antes da autorização de saída das mercadorias em causa não faziam parte do dispositivo de controlos aduaneiros aplicado pelo Reino Unido até ao mês de outubro de 2017.

246

A Comissão alega que as medidas aplicadas a posteriori pelo Reino Unido estavam condenadas ao fracasso e eram manifestamente inadequadas para combater a referida fraude, uma vez que, como era do conhecimento deste Estado, esta fraude era praticada pelas designadas empresas «fénix», o que tornava qualquer cobrança a posteriori de direitos aduaneiros improvável ou mesmo praticamente impossível na grande maioria dos casos.

247

A este respeito, é pacífico que, antes do lançamento da operação Swift Arrow, as autoridades aduaneiras do Reino Unido só aplicaram medidas de controlo aduaneiro ex ante de maneira muito excecional e centraram a sua ação nas cobranças a posteriori de direitos. Assim, os controlos físicos das mercadorias em causa e a recolha de amostras com base nos perfis de risco do método OLAF‑JRC apenas foram efetuados durante o período operacional do ODC Snake, ou seja, um período de um mês, compreendido entre 17 de fevereiro e 17 de março de 2014, no âmbito da operação Samurai, que dizia exclusivamente respeito a dois operadores, bem como no âmbito da operação Breach, em relação a treze remessas. Além disso, resulta da resposta do Reino Unido a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça que, embora tenham sido exigidas garantias durante o período operacional da ODC Snake, o montante total destas apenas representava 0,4144 % do montante total dos direitos aduaneiros suplementares reclamados nos avisos C 18 Snake, tendo essas garantias sido, por outro lado, levantadas após a anulação desses avisos, pelo que não deram lugar a uma cobrança de direitos.

248

O Reino Unido alega que adotou a sua própria estratégia baseada numa análise de risco, que consiste essencialmente em aplicar um perfil de risco destinado a identificar e em seguida controlar a posteriori, mediante, se for caso disso, a emissão de ordens de cobrança de direitos, um grupo delimitado de operadores que importam regularmente mercadorias a preços muito baixos, qualificados de «importadores de alto risco», o que é legítimo tendo em conta a grande margem de manobra de que este Estado dispunha e o facto de o método OLAF‑JRC não ser vinculativo. Alega igualmente que, embora, por exemplo, no âmbito da ACP Discount, as suas autoridades aduaneiras não tenham aplicado os limiares de risco do método OLAF‑JRC ex ante, mas apenas a posteriori, o OLAF não o censurou. Pelo contrário, foram‑lhe fornecidas diferentes garantias por agentes do OLAF de que o seu sistema de controlos aduaneiros era compatível com o direito da União.

249

A este respeito, como recordado no n.o 169 do presente acórdão, em primeiro lugar, há que sublinhar que, num sistema em que os Estados‑Membros são responsáveis pela execução adequada da regulamentação aduaneira da União no seu território, esses Estados não podem eximir‑se da responsabilidade por uma violação do direito da União que possam ter cometido invocando o facto de que o OLAF ou a Comissão não lha censurou num determinado momento.

250

Em segundo lugar, nos n.os 162 a 169 do presente acórdão, o Tribunal de Justiça rejeitou a argumentação invocada pelo Reino Unido relativa ao facto de este Estado poder fundar uma confiança legítima em certas declarações dos agentes do OLAF segundo as quais o seu dispositivo de controlos aduaneiros era alegadamente compatível com o direito da União.

251

Em terceiro lugar, como foi recordado no n.o 220 do presente acórdão, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que a natureza das medidas de controlo aduaneiro que devem ser tomadas pelos Estados‑Membros para dar cumprimento às exigências que o artigo 325.o, n.o 1, TFUE lhes impõe em matéria de luta contra a fraude ou qualquer outra atividade ilegal suscetível de lesar os interesses financeiros da União, e, em particular, a obrigação de garantir a cobrança efetiva e integral dos recursos próprios da União constituídos pelos direitos aduaneiros no respeito necessário dos direitos fundamentais garantidos pela Carta e dos princípios gerais do direito da União, não pode ser determinada de modo abstrato e estático, uma vez que depende das características dessa fraude ou dessa outra atividade ilegal, que, de resto, podem evoluir ao longo do tempo.

252

Ora, como a Comissão sublinha, por um lado, quando, excecionalmente, as autoridades aduaneiras do Reino Unido efetuaram controlos ex ante, estes revelaram‑se imediatamente eficazes e dissuasivos. Assim, por exemplo, é pacífico que quando os controlos físicos eram anunciados, os contentores eram desviados do porto de Felixstowe (Reino Unido) para portos de outros Estados‑Membros e que os dois operadores que foram objeto dos controlos ex ante efetuados no âmbito da operação Samurai cessaram as suas atividades imediatamente após a HMRC ter contestado as suas declarações aduaneiras.

253

Por outro lado, durante todo o período da infração, o dispositivo de controlos aduaneiros aplicado pelo Reino Unido, na parte em que se centrava em medidas a posteriori como a cobrança de direitos, revelou‑se ineficaz para combater a fraude por subavaliação em causa, uma vez que esta era essencialmente caracterizada pelo facto de ser cometida por empresas designadas «fénix» em relação às quais uma cobrança de direitos estava excluída na grande maioria dos casos.

254

Neste contexto, importa referir uma reunião, realizada em 13 de junho de 2014, a respeito do acompanhamento da ODC Snake, na qual as autoridades aduaneiras do Reino Unido indicaram, segundo a ata dessa reunião elaborada por um agente desse Estado, que, embora nos casos em que não tivessem sido instaurados processos penais essas autoridades encarassem a possibilidade de aplicar procedimentos de cobrança a posteriori para efeitos de «dissuasão financeira», consideravam, «com base na experiência do passado e do que já foi observado nesse tipo de fraude» que era «improvável que alguma das dívidas [fosse] recuperada».

255

Além disso, há que salientar que tanto no que respeita às dívidas aduaneiras reclamadas nos avisos C 18 Snake como às dívidas aduaneiras reclamadas nos avisos C 18 Breach, o Reino Unido alega que está dispensado da obrigação de colocar à disposição da Comissão os recursos próprios tradicionais correspondentes a essas dívidas, uma vez que a impossibilidade de cobrá‑las não é imputável a esse Estado, já que os seus devedores são empresas «fénix». Ora, tal alegação, mesmo admitindo que seja procedente, tende a demonstrar que o dispositivo de controlos aduaneiros instituído pelo Reino Unido não permitia uma cobrança efetiva e integral das receitas afetadas aos recursos próprios da União.

256

Por outro lado, a Comissão alega, sem ser contestada neste ponto, que alguns dos operadores visados pelos controlos efetuados no âmbito da operação Breach já estavam abrangidos por uma ordem de cobrança constante de um dos avisos C 18 Snake, o que tende a confirmar que o dispositivo de controlos aduaneiros instituído no Reino Unido era, à época, insuficientemente dissuasivo.

257

Por conseguinte, mesmo que, como decorre da jurisprudência recordada no n.o 213 do presente acórdão, o artigo 325.o, n.o 1, TFUE confira aos Estados‑Membros uma certa latitude e liberdade de escolha quanto às medidas de controlo aduaneiro que devem ser tomadas para, nomeadamente, garantir a cobrança efetiva e integral dos recursos próprios da União constituídos pelos direitos da Pauta Aduaneira Comum, há que constatar que, no caso em apreço, tendo em conta as especificidades da fraude por subavaliação em causa e, em particular, o facto de essa fraude ser móvel, muito reativa aos controlos e essencialmente praticada por empresas inadimplentes ou insolventes em relação às quais qualquer cobrança a posteriori de direitos estava, na grande maioria dos casos, excluída desde o início, especificidades que, aliás, tinham sido conhecidas em tempo útil pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido devido à sua própria experiência, o dispositivo de controlos aduaneiros instituído por esse Estado durante o período de infração para combater a referida fraude, na medida em que, salvo raras exceções, se limitava a ações de cobrança de direitos a posteriori, não respeitava, manifestamente, o princípio da efetividade consagrado no artigo 325.o, n.o 1, do TFUE.

258

Tendo em conta as considerações anteriores, há que julgar procedente o primeiro fundamento, na medida em que é relativo a uma violação do artigo 325.o, n.o 1, TFUE.

b)   Quanto à violação das obrigações impostas pela regulamentação aduaneira da União

259

No que respeita, em segundo lugar, ao incumprimento imputado ao Reino Unido por não ter respeitado as obrigações que lhe incumbiam por força da regulamentação aduaneira da União, a Comissão acusa este Estado, em primeiro lugar, de não ter tomado medidas para proteger os interesses financeiros da União em violação do artigo 3.o do Código Aduaneiro da União, em conjugação com o artigo 4.o, n.o 3, TUE, em segundo lugar, de efetuar controlos aduaneiros com base numa análise de risco em violação do artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, em terceiro lugar, de exigir a constituição de garantias em violação do artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e do artigo 244.o do Regulamento de Execução bem como, em quarto lugar, de não ter tido em conta, em violação do artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União, as dívidas aduaneiras ainda por cobrar, a partir do momento em que as autoridades aduaneiras desse Estado se aperceberam da situação que levou à verificação dessas dívidas.

1) Observações preliminares

260

A título preliminar, há que salientar que a acusação relativa ao artigo 3.o do Código Aduaneiro da União, em conjugação com o artigo 4.o, n.o 3, TUE, não tem alcance autónomo em relação à acusação relativa à violação do artigo 325.o TFUE, que é apreciada nos n.os 208 a 258 do presente acórdão. Com efeito, esta acusação não é desenvolvida pela Comissão com base numa argumentação específica relativa às disposições em que se fundamenta.

261

Além disso, como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, no n.o 173 das suas conclusões, no que respeita às obrigações que incumbem aos Estados‑Membros para combater qualquer fraude ou qualquer outra atividade ilegal suscetível de lesar os interesses financeiros da União, o artigo 325.o, n.o 3, TFUE constitui uma manifestação específica do princípio geral da cooperação leal consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE. Daqui decorre que não é necessário efetuar uma apreciação distinta da referida acusação (v., neste sentido, Acórdão de 30 de maio de 2006, Comissão/Irlanda, C‑459/03, EU:C:2006:345, n.os 169 a 171).

262

Dito isto, há que apreciar se, como alega a Comissão, o Reino Unido violou, no âmbito da sua ação destinada a lutar contra a fraude por subavaliação em causa durante o período de infração, por um lado, o artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário e o artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, na medida em que este Estado não efetuou, antes do desalfandegamento das mercadorias em causa, controlos aduaneiros baseados numa análise de risco, como a do método OLAF‑JRC, que permitissem detetar as importações suscetíveis de serem subavaliadas e que devessem, por conseguinte, ser objeto de verificações no que diz respeito à exatidão do valor aduaneiro declarado e, por outro, o artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e o artigo 244.o do Regulamento de Execução, na medida em que o referido Estado não exigiu a constituição de garantias para as importações assim detetadas como potencialmente subavaliadas.

263

A este respeito, a Comissão deduz do Acórdão de 16 de junho de 2016, EURO 2004. Hungary (C‑291/15, EU:C:2016:455), que, quando as mercadorias são declaradas a valores aduaneiros extremamente baixos e, em particular, a valores inferiores em mais de 50 % ao preço médio estatístico, é possível ter dúvidas fundadas no que respeita à exatidão das declarações aduaneiras em causa, pelo que essas mercadorias não podem ser introduzidas em livre prática sem controlo prévio dos valores assim declarados. Refere igualmente o Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal (C‑23/10, EU:C:2011:160), para fundamentar o princípio segundo o qual, quando as autoridades aduaneiras dispõem de indicações concretas relativas à inexatidão das declarações aduaneiras, o que pode dar lugar à cobrança de direitos aduaneiros inferiores aos efetivamente devidos, essas autoridades são obrigadas a verificar essas declarações e a efetuar os controlos exigidos.

264

O Reino Unido, apoiado pelos Estados‑Membros intervenientes, alega que decorre da jurisprudência invocada pela Comissão que as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros só são obrigadas a proceder a controlos aduaneiros se dispuserem de indicações concretas relativas à inexatidão dos elementos constantes de uma declaração aduaneira. Em contrapartida, quando essas autoridades apenas têm dúvidas sobre a exatidão desses elementos, baseadas, por exemplo, na constatação de uma diferença superior a 50 % entre o preço declarado e o valor médio estatístico, as referidas autoridades têm somente a possibilidade de proceder a tais controlos, sem, no entanto, estarem obrigadas a fazê‑lo.

265

Ora, no caso em apreço, atendendo às informações de que dispunham, as mesmas autoridades não tinham indicações concretas de uma subavaliação das importações em causa, mas tinham, no máximo, dúvidas fundadas sobre a exatidão dos valores aduaneiros declarados, na aceção da jurisprudência, de modo que podiam ter efetuado os controlos aduaneiros, mas não estavam obrigadas a fazê‑lo. Da mesma forma, a constatação de que o valor aduaneiro declarado era inferior em mais de 50 % ao valor médio estatístico e, logo, inferior ao limiar do PMA do método OLAF‑JRC não constitui uma indicação concreta de subavaliação desse valor aduaneiro, mas, quando muito, uma razão para ter dúvidas fundadas quanto à sua exatidão, não obrigando, pois, as autoridades do Reino Unido a verificar a exatidão do referido valor aduaneiro.

266

A este respeito, basta indicar, nesta fase, que, por um lado, a fraude por subavaliação em causa constituía uma fraude vasta, que implicava importações num período relativamente longo em toda a União, e, em especial, no Reino Unido, de grandes volumes de mercadorias a valores declarados extremamente baixos e, logo, à primeira vista suspeitos, por empresas ditas «inadimplentes» que expõem, de forma evidente, a União a grandes riscos para os seus interesses financeiros em razão de perdas consideráveis de recursos próprios tradicionais em grande medida irrecuperáveis. Neste contexto, o conhecimento das autoridades aduaneiras do Reino Unido, na sequência, nomeadamente, de informações comunicadas pelo OLAF e pela Comissão, da extensão e das particularidades dessa fraude, bem como dos grandes riscos financeiros a que esta sujeitava a União, significava que essas autoridades dispunham de indicações suficientemente concretas sobre a inexatidão dos elementos constantes de um número significativo de declarações aduaneiras relativas ao valor dos produtos em causa provenientes da China, o que as obrigava, assim, a tomar medidas de controlo aduaneiro adequadas para verificar esse valor de modo sistemático no que respeita às importações em causa, a fim de assegurar, in fine, o pagamento integral e efetivo dos direitos aduaneiros devidos.

267

Por outro lado, nesse contexto de fraude, a informação que decorre para as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros da identificação de importações a preços muito baixos através de um perfil de risco como o dos PMA do método OLAF‑JRC como sendo suscetíveis de ser subavaliadas poderia fornecer indicações concretas a essas autoridades de que os elementos constantes das declarações aduaneiras para os produtos abrangidos por esse perfil de risco eram inexatos e, por conseguinte, deviam ser objeto de controlos aduaneiros antes do desalfandegamento das mercadorias em causa.

268

À luz destas considerações preliminares, importa, por conseguinte, apreciar as acusações referidas no n.o 259 do presente acórdão, com exceção da que é relativa a uma violação do artigo 3.o do Código Aduaneiro da União, em conjugação com o artigo 4.o, n.o 3, TUE.

2) Quanto à violação das obrigações impostas pelo artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário e pelo artigo 46.o do Código Aduaneiro da União

i) Argumentação das partes

269

No que respeita ao incumprimento imputado ao Reino Unido, relativo à violação do artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, a Comissão considera que, no âmbito da sua ação destinada a lutar contra a fraude por subavaliação em causa durante o período de infração, esse Estado não efetuou controlos aduaneiros antes do desalfandegamento das mercadorias em causa, baseados numa análise de risco como a do método OLAF‑JRC, que permite detetar as importações suscetíveis de serem subavaliadas e que, por conseguinte, devem ser objeto de verificações relativas à exatidão do valor aduaneiro declarado.

270

A este respeito, resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que a Comissão não acusa o Reino Unido de não ter aplicado o método OLAF‑JRC, mas sim de não ter tomado as medidas elementares recomendadas pelo OLAF, nomeadamente, controlos baseados em perfis de risco aplicados ex ante. A Comissão admite que este método não era juridicamente vinculativo para os Estados‑Membros e, mesmo que considerasse que era preferível aplicar perfis ou limiares de risco estabelecidos ao nível da União, como os PMA, fixados em aplicação do referido método, alega, sem ser, de resto, contraditada neste ponto pelo Reino Unido, que sempre aceitou que os Estados‑Membros aplicassem os seus próprios perfis ou limiares de risco desde que estes fossem comparáveis ou mais estritos do que os PMA.

271

O Reino Unido alega ter baseado os controlos aduaneiros que efetuou durante o período de infração para combater a fraude por subavaliação em causa numa análise de risco. Esta análise decorre essencialmente da aplicação de um perfil de risco destinado a identificar, e em seguida controlar, um grupo restrito de operadores que importam regularmente os produtos em causa a preços muito baixos, qualificados de «importadores de alto risco», e dá origem, eventualmente, à emissão de ordens de cobrança de direitos ex post, tais como os avisos C 18. Assim, no âmbito da operação Breach, que foi lançada no mês de maio de 2015 e que ainda está em curso, foram identificados 239 «importadores de alto risco» para efeitos de aplicação deste perfil de risco. Trata‑se de uma «estratégia legítima e razoável», uma vez que a prática demonstrou que a grande maioria das importações em causa provinha de apenas 129 operadores num total de 20000 operadores que importam os produtos em causa da China.

ii) Apreciação do Tribunal de Justiça

272

O artigo 13.o, n.o 2, do Código Aduaneiro Comunitário, aplicável à parte do período de infração que termina em 30 de abril de 2016, prevê, no seu primeiro parágrafo, que os controlos aduaneiros que não sejam controlos por amostragem devem basear‑se na «análise de risco utilizando técnicas automatizadas de processamento de dados», com o objetivo de identificar e quantificar os riscos e criar as medidas necessárias para a sua avaliação com base em critérios definidos a nível nacional, da União e, sempre que possível, internacional e, no seu segundo parágrafo, que um «procedimento de comité será aplicado» para determinar um «quadro comum de gestão de risco» e estabelecer «critérios comuns» e «áreas de controlo prioritárias».

273

Estas obrigações foram retomadas, segundo uma formulação alterada, no artigo 46.o, n.os 2 e 3, do Código Aduaneiro da União, aplicável à parte do período de infração que teve início em 1 de maio de 2016.

274

O artigo 46.o, n.o 2, do Código Aduaneiro da União prevê que os controlos aduaneiros que não sejam aleatórios «devem basear‑se essencialmente na análise de risco utilizando técnicas de processamento eletrónico de dados» com o objetivo de identificar e avaliar os riscos e elaborar as contramedidas necessárias com base em critérios definidos a nível nacional ou da União e, se disponíveis, internacional. O artigo 46.o, n.o 3, deste código dispõe que os controlos aduaneiros devem ser realizados «dentro de um quadro comum de gestão do risco», baseado no intercâmbio de informações sobre riscos e resultados de análises de risco entre administrações aduaneiras e que defina «critérios e normas comuns de riscos», «medidas de controlo e áreas de controlo prioritárias».

275

O artigo 46.o, n.o 4, do referido código obriga, além disso, as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros a aplicarem «métodos de gestão de riscos».

276

O artigo 46.o, n.os 6 e 7, do mesmo código enumera os elementos que devem ser tidos em conta aquando do estabelecimento, nomeadamente, dos «critérios e normas comuns de risco», e os elementos que esses critérios e normas devem conter.

277

É pacífico que, durante o período de infração, a Comissão não estabeleceu critérios ou normas comuns de risco sob a forma de um ato vinculativo imposto aos Estados‑Membros, mesmo que tenha adotado, em 21 de agosto de 2014, por via de uma comunicação, uma estratégia e um plano de ação sobre a gestão dos riscos em matéria aduaneira [Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho e ao Comité Económico e Social Europeu relativa à estratégia e ao plano de ação da UE sobre gestão dos riscos aduaneiros: enfrentar os riscos, reforçar a segurança da cadeia de abastecimento e facilitar o comércio (COM/2014/527 final)]. Como observou a República Portuguesa na audiência e como os n.os 13 e 15 do Relatório Especial n.o 04/2021 do Tribunal de Contas, sob a epígrafe «Controlos aduaneiros: harmonização insuficiente prejudica os interesses financeiros da UE», o confirmam, a Comissão adotou, em 31 de maio de 2018, uma primeira decisão vinculativa que estabelecia os critérios e as normas comuns em matéria de risco financeiro sob a forma de um documento «restrito da UE», a qual foi completada, no mês de dezembro de 2019, por um «documento de orientação» não vinculativo.

278

O método OLAF‑JRC, tal como foi recomendado pelo OLAF e pela Comissão aos Estados‑Membros e exposto, nomeadamente, nas orientações da ACP Discount para efeitos de uma aplicação no âmbito dessa operação, na medida em que contém, nomeadamente, uma descrição dos riscos e dos fatores ou indicadores de risco que devem ser utilizados para selecionar as mercadorias que devem ser submetidas a controlos aduaneiros e que especifica a natureza dos controlos aduaneiros que devem ser efetuados pelas autoridades aduaneiras, pode ser entendido no sentido de que aplica critérios comuns não vinculativos em matéria de riscos que se inserem no quadro comum de gestão de risco.

279

Importa sublinhar que, uma vez que os controlos aduaneiros visam, in fine, prevenir e combater as fraudes ao regime aduaneiro da União, qualquer medida comum não vinculativa que possa ser adotada ou ser recomendada relacionada com os critérios de análise e de gestão dos riscos, previstos no artigo 13.o, n.o 2, primeiro e segundo parágrafos, do Código Aduaneiro Comunitário e no artigo 46.o, n.os 2 e 3, do Código Aduaneiro da União, insere‑se necessariamente na luta contra a fraude prevista no artigo 325.o TFUE. Ora, resulta do artigo 325.o, n.os 1 e 3, TFUE que a luta contra a fraude implica uma cooperação estreita entre, por um lado, os Estados‑Membros e a União e, por outro, os próprios Estados‑Membros.

280

A este respeito, o quadro comum de gestão de risco no qual os controlos aduaneiros são efetuados, na medida em que se baseia, em conformidade com o artigo 46.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União, além de em critérios e normas comuns em matéria de risco, no intercâmbio de informações em matéria de risco e em resultados de análises de risco entre as administrações aduaneiras, bem como em medidas de controlo aduaneiro e em domínios de controlo prioritários, é uma manifestação específica do artigo 325.o, n.o 3, TFUE, que estabelece que os Estados‑Membros coordenarão as respetivas ações no sentido de defender os interesses financeiros da União contra a fraude, organizando, em conjunto com a Comissão, uma colaboração estreita e regular entre as autoridades competentes.

281

Por conseguinte, quando esses critérios comuns não vinculativos de análise e de gestão do risco são recomendados, os Estados‑Membros, embora não estejam, em princípio, formalmente vinculados por esses critérios, estão obrigados, por força desse dever de cooperação, a tê‑los devidamente em conta estes critérios, ou mesmo a segui‑los, caso não tenham desenvolvido critérios nacionais pelo menos tão eficazes como os recomendados pela União.

282

Daqui resulta que, em conformidade com as obrigações que lhe incumbiam por força do disposto no artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário e no artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, em conjugação com o artigo 325.o TFUE, o Reino Unido devia, pelo menos, no âmbito da definição, durante o período de infração, do seu sistema de análise e de gestão dos riscos, ter devidamente em conta, atendendo ao modo operacional e às características específicas da fraude por subavaliação em causa de que esse Estado tinha conhecimento, os perfis de risco e os tipos de controlos aduaneiros que o OLAF e a Comissão lhe recomendaram aplicar para combater essa fraude, não obstante o caráter não vinculativo dos critérios aplicados em matéria de risco.

283

Ora, há que observar que, apesar das recomendações renovadas do OLAF e da Comissão, o Reino Unido não efetuou, exceto durante o período operacional da ODC Snake, ou seja, o período compreendido entre 17 de fevereiro e 17 de março de 2014, controlos aduaneiros antes da autorização de saída das mercadorias em causa com base em perfis de risco como os limiares de risco do método OLAF‑JRC ou de outros perfis de risco com um grau de eficácia comparável.

284

Assim sendo, como resulta do n.o 281 do presente acórdão, o Reino Unido, numa situação caracterizada pela inexistência de medidas vinculativas da União, não era obrigado a seguir essas recomendações desde que os critérios de análise e de gestão dos riscos que adotou fossem pelo menos comparáveis, em termos de eficácia, aos recomendados pela União, ou mesmo mais eficazes que esses.

285

Ora, numa reunião realizada em 28 de julho de 2015, as autoridades aduaneiras do Reino Unido indicaram ao OLAF que a utilização de indicadores de risco baseados em preços médios seria contraproducente e desproporcionada tendo em conta o volume das importações no território desse Estado‑Membro.

286

O Reino Unido alega, nomeadamente, em resposta a questões colocadas pelo Tribunal de Justiça, que, uma vez que considerava que os perfis de risco do método OLAF‑JRC eram insuficientemente precisos, nomeadamente na medida em que davam lugar a falsos casos positivos no que respeita a importações legítimas efetuadas a preços muito baixos para grandes marcas bem conhecidas, preferiu desenvolver os seus próprios perfis de risco nacionais mais eficientes. O facto de estes acabarem por só estarem operacionais a partir de 12 de outubro de 2017, ou seja, a data do lançamento da operação Swift Arrow, é explicável pela complexidade deste exercício e dos grandes meios que lhe tiveram de ser dedicados.

287

Esta argumentação deve ser rejeitada.

288

Com efeito, há que sublinhar, por um lado, a gravidade e a extensão da fraude por subavaliação em causa, bem como os riscos financeiros significativos que esta manifestamente implicava para a União, os quais eram, de resto, do conhecimento do Reino Unido, que deles tinha sido reiteradamente avisado pelo OLAF e pela Comissão, e, por outro, o facto de o Reino Unido ser obrigado, pelo menos, a ter devidamente em conta, na elaboração do seu sistema de análise e de gestão dos riscos, os critérios em matéria de risco que o OLAF e a Comissão por diversas vezes lhe tinham recomendado aplicar, em particular limiares de risco como os PMA do método OLAF‑JRC aplicados antes do desalfandegamento das mercadorias em causa.

289

Nestas circunstâncias, o Reino Unido não podia, enquanto aguardava a finalização dos seus trabalhos destinados a implementar os seus próprios limiares de risco alegadamente mais eficientes, recusar aplicar qualquer perfil de risco que permitisse identificar, antes do desalfandegamento dessas mercadorias, importações a preços muito baixos que apresentassem um risco significativo de subavaliação para efeitos da aplicação de controlos aduaneiros antes da introdução em livre prática das referidas mercadorias.

290

A este respeito, importa recordar, por um lado, que a Comissão não acusa o Reino Unido de não ter aplicado corretamente os perfis de risco do método OLAF‑JRC mas de não ter aplicado, no âmbito do seu dispositivo de análise e de gestão do risco, antes do lançamento da operação Swift Arrow, nenhum perfil de risco antes do desalfandegamento das mercadorias em causa, quando só este método permitia detetar as importações suscetíveis de serem subavaliadas para efeitos de orientar os controlos aduaneiros antes da autorização de saída dessas mercadorias.

291

Por outro lado, resulta da análise do artigo 325.o TFUE efetuada nos n.os 208 a 220 do presente acórdão que, tendo em conta as características da fraude por subavaliação em causa, as contramedidas suscetíveis de permitir combater esta fraude de maneira eficaz e dissuasiva não se podiam limitar às cobranças a posteriori de direitos, uma vez que estas estavam, em regra, condenadas ao fracasso no que respeita a empresas inadimplentes, mas deviam incluir controlos aduaneiros antes da introdução em livre prática das mercadorias declaradas a preços extremamente baixos.

292

Ora, em conformidade com o artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário e com o artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, em conjugação com o artigo 325.o TFUE, o Reino Unido estava obrigado a efetuar, para assegurar uma luta eficaz e dissuasiva contra a fraude, a seleção das declarações aduaneiras que deviam ser objeto desses controlos ex ante com base numa análise de risco utilizando técnicas de processamento eletrónico de dados, o que não fez durante todo o período de infração, exceto no que respeita ao período operacional da ODC Snake, compreendido entre 17 de fevereiro e 17 de março de 2014.

293

Uma vez que a Comissão baseia a sua acusação apenas nesta omissão, não é necessário apreciar as diferentes acusações contra o método OLAF‑JRC, utilizado como instrumento de análise de risco, na medida em que estabelece limiares de risco arbitrários ou mesmo demasiado inclusivos, tendo em conta o elevado número de falsos casos positivos que gera e que dizem respeito a importações a baixo preço, mas legítimas, efetuadas por grandes marcas de venda a retalho.

294

Para todos os efeitos, é possível referir que, uma vez que resulta dos estudos anexos ao relatório do OLAF que os PMA, utilizados como limiares de risco no âmbito do método OLAF‑JRC, foram fixados a partir dos PMC com base em pesquisas científicas efetuadas pelo JRC que implicam a análise de histogramas e a distribuição, em termos de preços, de diferentes tipos de importações, afigura‑se que não são arbitrários, mas assentes em critérios objetivos e neutros.

295

Além disso, uma vez que os limiares de risco do método OLAF‑JRC constituídos pelos PMA se baseiam em preços médios estatísticos, ou seja, os PMC, e visam apenas identificar as importações que apresentam um risco significativo de subavaliação para que sejam verificados os valores aduaneiros declarados no que respeita a essas importações e não determinar se as referidas importações são efetivamente subavaliadas, estes implicam, pela sua própria natureza, uma certa taxa de falsos casos positivos.

296

Por conseguinte, contrariamente ao que o Reino Unido alega, a fiabilidade dos PMA enquanto perfil de risco não pode ser posta em causa pelo simples facto, mesmo admitindo que esteja provado, de 11,2 %, em termos de volume, das importações legítimas efetuadas por algumas grandes marcas bem conhecidas serem declaradas a valores inferiores a esses preços. Com efeito, essa taxa de falsos casos positivos afigura‑se razoável à luz do contributo útil dos PMA na deteção das fraudes por subavaliação em causa.

297

Por último, como salientou igualmente o advogado‑geral no n.o 209 das suas conclusões, a Comissão indicou, em resposta às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça e sem ser contraditada nesse ponto pelo Reino Unido, por um lado, que os PMA tinham sido introduzidos, e posteriormente aplicados como perfis de risco no âmbito da ACP Discount em 2011 e, em seguida, no âmbito da ODC Snake em 2014, após um debate aprofundado entre os Estados‑Membros e de maneira consensual entre estes, bem como, por outro, que a determinação dos PMA ao nível de 50 % dos PMC não tinha, enquanto tal, sido posta em causa por nenhum Estado‑Membro durante o período de infração.

298

Tendo em conta as considerações anteriores, há que julgar procedente o primeiro fundamento, na medida em que é relativo à violação, pelo Reino Unido, do artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, uma vez que, no âmbito da sua ação destinada a lutar contra a fraude por subavaliação em causa durante o período da infração, esse Estado não efetuou controlos aduaneiros baseados numa análise de risco antes do desalfandegamento das mercadorias em causa.

3) Quanto à violação das obrigações impostas pelo artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e pelo artigo 244.o do Regulamento de Execução

299

Conforme referido no n.o 259 do presente acórdão, a Comissão acusa o Reino Unido de não ter cumprido as obrigações previstas no artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e no artigo 244.o do Regulamento de Execução, uma vez que estas disposições obrigam as autoridades aduaneiras a exigir a constituição de uma garantia suficiente quando considerem que a conferência da declaração aduaneira pode dar lugar a um montante de direitos mais elevado do que o decorrente dos elementos da declaração aduaneira.

300

A este respeito, embora seja verdade, como o Reino Unido alega, que o artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e o artigo 244.o do Regulamento de Execução atribuem, devido à utilização do verbo «estimar», uma certa margem de apreciação às autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros quando decidem da necessidade de exigir a constituição de garantias, esta margem de apreciação é limitada, como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, no n.o 218 das suas conclusões, pelo princípio da efetividade, consagrado no artigo 325.o, n.o 1, TFUE, nos termos do qual deve ser assegurada uma proteção efetiva dos interesses financeiros da União contra qualquer fraude ou qualquer outra atividade ilegal suscetível de lesar esses interesses.

301

Conforme salientado nos n.os 220 e 251 do presente acórdão, o alcance do princípio da efetividade, na medida em que este é aplicável à obrigação específica que incumbe aos Estados‑Membros por força do artigo 325.o, n.o 1, TFUE, de garantir a cobrança efetiva e integral dos recursos próprios da União constituídos pelos direitos aduaneiros, não pode ser determinado de forma abstrata e estática, uma vez que depende das características da fraude ou da atividade ilegal em causa, as quais podem, aliás, evoluir no tempo.

302

No caso em apreço, há que recordar que a fraude por subavaliação em causa se caracterizava por importações, a preços extremamente reduzidos, de grandes volumes de produtos em causa provenientes da China pelas designadas empresas «fénix», constituídas especificamente para executar essa fraude, as quais apenas tinham ativos mínimos e desapareciam ou eram objeto de liquidação assim que eram controladas no que respeita à exatidão dos valores aduaneiros que tinham declarado, o que tornava imediatamente ilusória, na grande maioria dos casos, qualquer cobrança a posteriori de direitos.

303

Neste contexto de fraude, uma proteção efetiva dos interesses financeiros da União contra as perdas significativas de recursos próprios tradicionais suscetíveis de resultar da falta de cobrança de montantes significativos de direitos aduaneiros relativos a essas importações massivas e manifestamente subavaliadas de maneira fraudulenta exigia, além da criação de um perfil de risco que permitisse detetar de maneira automatizada as importações apresentavam um risco significativo de subavaliação e que, por conseguinte, deviam ser objeto de verificações no que respeita à exatidão dos valores aduaneiros declarados, um pedido sistemático de constituição de garantias para as referidas importações.

304

Ora, conforme referido no n.o 247 do presente acórdão, é pacífico que, durante o período da infração, o Reino Unido só exigiu a constituição de garantias de maneira muito excecional durante o período operacional da ODC Snake, num montante total que apenas representava 0,4144 % do montante total dos direitos aduaneiros suplementares reclamados nos avisos C 18 Snake, tendo estas garantias sido reembolsadas após a anulação dos avisos aos quais estas diziam respeito.

305

O Reino Unido contesta a existência deste incumprimento, alegando, em primeiro lugar, que, não dispondo as autoridades aduaneiras de dados que permitissem calcular o montante das garantias com base num valor de substituição fiável, estas eram suscetíveis de ser contestadas com sucesso no âmbito de recursos administrativos e jurisdicionais se fossem calculadas com base em PMC.

306

Esta argumentação deve ser rejeitada.

307

Com efeito, como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, no n.o 224 das suas conclusões, uma vez que o Reino Unido era responsável pela determinação correta dos valores aduaneiros declarados na importação para o seu território através da aplicação de controlos aduaneiros que, tendo em conta as especificidades da fraude por subavaliação em causa, deviam incluir verificações antes do desalfandegamento das mercadorias em causa, incumbia às autoridades aduaneiras do Reino Unido pedir aos operadores em causa para fornecerem informações relativas à qualidade dessas mercadorias e recolherem amostras no âmbito de verificações físicas, o que teria permitido a essas autoridades dispor dos dados necessários para determinarem um valor de substituição que podia ser utilizado para calcular o montante correto das garantias.

308

Neste contexto, embora, no âmbito da ODC Snake, o OLAF tenha tentado apoiar a ação dos Estados‑Membros solicitando às autoridades chinesas o fornecimento de preços de exportação que pudessem ser utilizados para determinar os valores de substituição das mercadorias cujas importações tinham sido subavaliadas, a circunstância de, em definitivo, relativamente poucos desses preços de exportação terem sido fornecidos por essas autoridades e de a utilização, no âmbito de processos judiciais, dos preços fornecidos estar sujeita, além disso, a limitações estritas não pode pôr em causa o facto de que incumbia ao Reino Unido, e não ao OLAF ou à Comissão, organizar o seu dispositivo de luta contra a fraude por subavaliação em causa de maneira a poder dispor de dados suficientes relativos ao valor das mercadorias em causa tais como os dados relativos à qualidade ou ao nível de acabamento destas.

309

Em segundo lugar, o Reino Unido contesta o incumprimento relativo à violação do artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e do artigo 244.o do Regulamento de Execução, com o fundamento de que a obrigação de constituir de maneira sistemática uma garantia afetaria injustificadamente o direito de propriedade dos importadores em causa e seria, por conseguinte, contrária ao artigo 17.o da Carta e ao artigo 1.o do Protocolo Adicional n.o 1 à Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinado em Paris em 20 de março de 1952.

310

A este respeito, conforme recordado nos n.os 220 e 251 do presente acórdão, decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça relativa ao artigo 325.o, n.o 1, TFUE que a obrigação de garantir a cobrança efetiva e integral dos recursos próprios da União constituídos pelos direitos aduaneiros impõe‑se no necessário respeito dos direitos fundamentais garantidos pela Carta e dos princípios gerais do direito da União.

311

No caso em apreço, a Comissão acusa o Reino Unido de não ter pedido de maneira sistemática a constituição de garantias antes do desalfandegamento das mercadorias em causa no que respeita apenas às importações cujo valor declarado era inferior a um limiar de risco e que apresentavam, por conseguinte, um risco significativo de subavaliação.

312

Por outro lado, há que observar, como salientou o advogado‑geral no n.o 222 das suas conclusões, que o Reino Unido não explica os motivos exatos pelos quais essa obrigação de constituir de maneira sistemática garantias para as importações detetadas por um perfil de risco como apresentando um risco significativo de subavaliação constitui uma violação do direito de propriedade dos operadores em causa.

313

Além disso, embora a obrigação de constituir de maneira sistemática garantias para essas importações possa comportar uma limitação do direito fundamental de propriedade, essa limitação afigura‑se justificada à luz dos requisitos estabelecidos no artigo 52.o, n.o 1, da Carta.

314

Com efeito, em conformidade com esta disposição, essa limitação está prevista por lei e respeita o conteúdo essencial do direito de propriedade e o princípio da proporcionalidade, uma vez que a referida limitação é necessária e corresponde efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União.

315

A este respeito, antes de mais, a obrigação de constituir de maneira sistemática uma garantia para as importações que apresentem um risco significativo de subavaliação responde efetivamente ao objetivo de interesse geral, reconhecido no artigo 325.o TFUE, de que sejam protegidos os interesses financeiros da União e, em particular, de que as autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros tomem para esse efeito as medidas de controlo aduaneiro adequadas para assegurar a cobrança efetiva e integral dos recursos próprios tradicionais constituídos pelos direitos aduaneiros.

316

Em seguida, tendo em conta o facto de que uma garantia é liberada assim que o importador em causa paga os direitos efetivamente devidos ou quando se constata, após verificação, que este declarou corretamente o valor aduaneiro das mercadorias em causa, a obrigação de constituir, mesmo de maneira sistemática, tal garantia tem um caráter estritamente temporário e respeita o conteúdo essencial do direito de propriedade, bem como o princípio da proporcionalidade.

317

Por último, o caráter proporcionado dessa obrigação deve‑se igualmente ao facto de a Comissão acusar especificamente o Reino Unido de não a ter imposto apenas no que respeita às importações que apresentam um risco significativo de subavaliação e são detetadas antes da autorização de saída dessas mercadorias com o auxílio de um perfil de risco automatizado.

318

Com efeito, no que respeita a tais importações, as autoridades aduaneiras devem, em conformidade com o artigo 181.o‑A do regulamento de aplicação e com o artigo 140.o do Regulamento de Execução, ter dúvidas quanto ao valor aduaneiro declarado, na medida em que não podem estar convencidas de que este último representa o montante total pago ou a pagar e, assim, estão obrigadas a considerar que a verificação das declarações aduaneiras em causa pode dar lugar a um montante exigível de direitos mais elevado do que o decorrente dos elementos dessas declarações aduaneiras, na aceção do artigo 248.o do regulamento de aplicação e do artigo 244.o do Regulamento de Execução.

319

Tendo em conta as considerações anteriores, há que concluir que o Reino Unido, na medida em que, no essencial, durante o período da infração, limitou o seu dispositivo de controlos aduaneiros destinado a combater a fraude por subavaliação em causa às medidas aplicadas após o desalfandegamento das mercadorias em questão, tais como ordens de cobrança de direitos a posteriori, e não integrou de maneira sistemática nesse dispositivo medidas aplicáveis antes desse desalfandegamento, em particular controlos aduaneiros das importações detetadas como apresentando um risco significativo de subavaliação por um perfil de risco automatizado, assim como a constituição sistemática de garantias para essas importações, não respeitou as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário, do artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, do artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e do artigo 244.o do Regulamento de Execução.

320

Esta conclusão decorre essencialmente da constatação da falta de efetividade e, no caso em apreço, da manifesta falta de efetividade do dispositivo de controlos aduaneiros aplicado pelo Reino Unido durante o período de infração para combater a fraude por subavaliação em causa, devido ao facto de esse dispositivo, na medida em que se centrava em controlos aplicados após o desalfandegamento das mercadorias em causa, não ser adaptado às características desta fraude, ainda que esse Estado tivesse um conhecimento suficiente da mesma desde o início desse período.

321

Como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, no n.o 227 das suas conclusões, esta conclusão relativa ao caráter, no caso em apreço, manifestamente inadequado e insuficiente dos controlos aduaneiros efetuados pelo Reino Unido durante o período de infração para combater a fraude por subavaliação em causa não é posta em causa pela argumentação, invocada por este Estado, segundo a qual este último participou em operações de controlos aduaneiros à escala da União, tais como a ACP Discount em 2011, a ODC Snake em 2014 ou a operação Octopus em 2016, e levou a cabo as suas próprias operações, tais como as operações Breach ou Samourai.

322

Com efeito, incumbe às autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros velar pela aplicação do direito aduaneiro da União e, em particular, efetuar controlos aduaneiros adequados para proteger, de maneira efetiva, os interesses financeiros desta. O cumprimento dessa missão exige, da parte dessas autoridades, um trabalho contínuo, coerente e sistémico que não se pode limitar a uma participação pontual em operações aduaneiras cujos efeitos podem ser apenas temporários. Além disso, é certo que as ações de controlos aduaneiros levadas a cabo ao nível da União visam apoiar os Estados‑Membros, mas não podem substituir a ação de controlo e de proteção efetiva dos interesses financeiros da União que lhes incumbe.

323

A este respeito, é pacífico que a operação Breach, lançada pelas autoridades do Reino Unido no mês de maio de 2015, foi a primeira ação de controlos aduaneiros do Reino Unido destinada especificamente a combater a fraude por subavaliação em causa, e que a operação Swift Arrow foi a primeira ação do Reino Unido que integra sistematicamente no dispositivo de controlos aduaneiros as verificações efetuadas antes do desalfandegamento das importações detetadas com o auxílio de um perfil de risco.

324

Como a Comissão alega, a manifesta falta de efetividade das medidas adotadas pelo Reino Unido durante o período da infração para combater a fraude por subavaliação em causa e, inversamente, a eficácia e o caráter dissuasivo de um dispositivo que integra de maneira sistemática controlos aduaneiros efetuados antes do desalfandegamento das mercadorias em causa e baseados num perfil de risco resultam igualmente dos dados estatísticos fornecidos pela Comissão.

325

Com efeito, esses dados estatísticos, que figuram nomeadamente em anexo às respostas desta instituição às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça, confirmam que, por um lado, durante o período da infração, o volume das importações declaradas na alfândega no Reino Unido a preços inferiores ao PMA (ou seja, 50 % do PMC), em particular, as declaradas a preços inferiores a 10 % do PMC, e, por conseguinte, a preços extremamente baixos, aumentou consideravelmente de ano para ano, ao passo que o volume das importações efetuadas a preços superiores ao PMA permaneceu relativamente estável.

326

Assim, o volume das importações efetuadas a preços inferiores a 10 % do PMC aumentou de 4189937 kg em 2011 para 314088517 kg em 2016. No que respeita ao período da infração, o volume das importações efetuadas a preços declarados inferiores ao PMA constituía 41 % do total das importações de produtos em causa provenientes da China. Relativamente a esse período, 69,5 % das importações efetuadas a preços declarados inferiores ao PMA diziam respeito a importações efetuadas a preços declarados inferiores a 10 % do PMC.

327

Além disso, enquanto, no mês de dezembro de 2012, 51 % das importações efetuadas a preços inferiores ao PMA eram declaradas a um preço inferior a 10 % do PMC, no mês de dezembro de 2016 essa percentagem passou para 85 %.

328

Por outro lado, os dados estatísticos fornecidos pela Comissão revelam de modo incontestável que, desde o lançamento da operação Swift Arrow, primeira operação das autoridades do Reino Unido que integra de maneira sistemática no dispositivo dos controlos aduaneiros as verificações efetuadas antes do desalfandegamento das importações detetadas como apresentando um risco significativo de subavaliação por um perfil de risco automatizado, as importações efetuadas a preços declarados inferiores ao PMA diminuíram imediatamente ao ponto de desaparecerem no espaço de alguns meses. Com efeito, estas importações subavaliadas diminuíram 90 % num período de apenas três meses.

4) Quanto à violação das obrigações impostas pelo artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário e pelo artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União

329

Conforme referimos no n.o 207 do presente acórdão, importa agora apreciar a acusação relativa a uma violação continuada das obrigações decorrentes do artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União, na medida em que, no que respeita às importações em causa, o Reino Unido não teve em conta as dívidas aduaneiras que continuavam por cobrar a partir do momento em que as autoridades aduaneiras se aperceberam da situação que levou à constatação dessas dívidas.

330

O Reino Unido contesta esta acusação, alegando, no essencial, que apenas devia ter efetuado o registo de liquidação das dívidas aduaneiras suplementares se estivesse obrigado a verificar as declarações aduaneiras em causa, uma vez que o cálculo dos direitos suplementares legalmente devidos só seria possível se essas declarações aduaneiras tivessem sido inicialmente verificadas. Ora, o Reino Unido não estava obrigado a verificar as referidas declarações aduaneiras cujo valor era inferior aos limiares fixados pelo OLAF e, de facto, não as verificou. Em todo o caso, esta obrigação de inscrever os direitos na contabilidade dos recursos próprios da União exigia que o Reino Unido dispusesse dos montantes precisos devidos cujo registo de liquidação não efetuou. Mesmo que o Reino Unido tivesse efetuado verificações, não dispunha dessas informações.

331

A este respeito, na medida em que, com a sua acusação relativa à violação do artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União, a Comissão acusa o Reino Unido, no que respeita às importações em causa efetuadas durante todo o período de infração, de não ter tido em conta a totalidade dos direitos aduaneiros devidos nos prazos previstos por essas disposições, resulta da análise do primeiro fundamento que, em violação do artigo 325.o, n.o 1, TFUE e do direito aduaneiro da União, as autoridades aduaneiras do Reino Unido não adotaram as medidas de controlo aduaneiro adequadas para verificar os valores aduaneiros declarados no que respeita a essas importações.

332

Daqui resulta que, em relação às referidas importações, essas autoridades aduaneiras não respeitaram a obrigação que lhes incumbia de assegurar, através de controlos aduaneiros adequados, que os valores aduaneiros eram corretamente determinados segundo as regras do direito aduaneiro da União.

333

Por conseguinte, ao calcularem, no que respeita às mesmas importações, os montantes dos direitos aduaneiros com base em valores incorretos, por serem manifestamente demasiado baixos, e, em seguida, ao terem procedido ao registo de liquidação desses montantes de direitos, as autoridades aduaneiras do Reino Unido, em violação do artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário e do artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União, não efetuaram de maneira efetiva o registo de liquidação da totalidade dos direitos aduaneiros devidos nos prazos previstos por estas disposições.

334

Em particular, não procederam ao registo de liquidação em tempo útil, em violação das referidas disposições, dos montantes correspondentes à diferença existente entre os direitos calculados com base nos valores incorretamente declarados e os direitos que teriam sido apurados se tivessem sido calculados com base nos valores reais das mercadorias em causa em conformidade com as regras do direito da União em matéria de determinação do valor aduaneiro.

335

Tendo em conta as considerações anteriores, há que julgar procedente o primeiro fundamento, na medida em que é relativo à violação, pelo Reino Unido, das obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 325.o, n.o 1, TFUE, do artigo 13.o e do artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário, do artigo 46.o e do artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União, bem como do artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação e do artigo 244.o do Regulamento de Execução.

2.   Quanto ao incumprimento das obrigações impostas pelo direito da União em matéria de disponibilização dos recursos próprios tradicionais constituídos pelos direitos aduaneiros

336

Com o segundo fundamento, relativo a algumas das acusações que figuram no primeiro parágrafo do primeiro pedido da petição, bem como à acusação única que figura no terceiro parágrafo desse primeiro pedido, em primeiro lugar, a Comissão acusa o Reino Unido de ter violado a legislação da União em matéria de recursos próprios e, em particular, os artigos 2.o e 8.o das Decisões 2007/436 e 2014/335, os artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000, bem como as disposições correspondentes dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento n.o 609/2014, uma vez que, no que respeita às importações em causa durante o período de infração, este Estado não colocou à disposição dessa instituição os recursos próprios tradicionais que eram devidos. Em segundo lugar, a Comissão alega que, de acordo com a sua estimativa, as perdas de recursos próprios tradicionais, subtraídas das despesas de cobrança, mas acrescidas dos juros de mora, que devem, por conseguinte, ser colocadas à sua disposição pelo Reino Unido em conformidade com estas disposições, correspondem aos seguintes montantes:

496025324,30 de euros no que diz respeito ao ano de 2017 (até 11 de outubro de 2017 inclusive);

646809443,80 de euros no que diz respeito ao ano de 2016;

535290329,16 de euros no que diz respeito ao ano de 2015;

480098912,45 de euros no que diz respeito ao ano de 2014;

325230822,55 de euros no que diz respeito ao ano de 2013;

173404943,81 de euros no que diz respeito ao ano de 2012;

22777312,79 de euros no que diz respeito ao ano de 2011.

a)   Quanto à acusação relativa à violação pelo Reino Unido da sua obrigação de princípio de disponibilização de recursos próprios tradicionais

337

Em primeiro lugar, a Comissão alega, por um lado, que uma vez que, conforme afirma no âmbito do primeiro fundamento, as autoridades aduaneiras do Reino Unido não efetuaram os controlos aduaneiros adequados, durante o período de infração, as mercadorias objeto das importações em causa não foram corretamente declaradas no que respeita ao seu valor aduaneiro, o que fez com que os direitos aduaneiros devidos por essas mercadorias não tivessem sido calculados corretamente, e que os montantes de recursos próprios correspondentes a esses direitos, que deviam ter sido apurados, não o tivessem sido, nem tivessem sido colocados à sua disposição no momento em que o deveriam ter sido.

338

Por outro lado, a Comissão critica o Reino Unido pelo facto de, no âmbito da ODC Snake, as suas autoridades aduaneiras terem anulado a partir do mês de junho de 2015 as dívidas aduaneiras que tinham anteriormente apurado nas ordens de cobrança a posteriori emitidas entre o mês de novembro de 2014 e o mês de fevereiro de 2015, nomeadamente, os avisos C 18 Snake relativos às importações em causa efetuadas entre o mês de novembro de 2011 e o mês novembro de 2014, e pelo facto de, assim, esse Estado, devido a erros administrativos imputáveis às suas autoridades aduaneiras, não ter colocado à disposição dessa instituição os recursos próprios tradicionais que eram devidos, no que diz respeito a essas importações.

1) Quanto ao princípio da responsabilidade do Reino Unido pelo não apuramento de perdas de recursos próprios tradicionais da União

339

A fim de apreciar as diferentes acusações da Comissão e a argumentação invocada pelo Reino Unido em sua defesa, importa, antes de mais, recordar as características do sistema de recursos próprios da União, conforme foram resumidas pelo Tribunal de Justiça na sua jurisprudência.

340

Resulta do artigo 8.o, n.o 1, das Decisões 2007/436 e 2014/335 que os recursos próprios da União a que se referem, respetivamente, o artigo 2.o, n.o 1, alínea a), da Decisão 2007/436 e o artigo 2.o, n.o 1, da Decisão 2014/335 são cobrados pelos Estados‑Membros e que estes têm a obrigação de pôr esses recursos à disposição da Comissão (Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 56 e jurisprudência referida).

341

Para esse efeito, os Estados‑Membros estão obrigados, nos termos do artigo 2.o, n.o 1, dos Regulamentos n.os 1150/2000 e 609/2014, a apurar um direito da União sobre os recursos próprios assim que se encontrem preenchidas as condições previstas na regulamentação aduaneira «no que se refere ao registo de liquidação do montante do direito e à sua comunicação ao devedor» e, logo, assim que as suas autoridades sejam capazes de calcular o montante dos direitos resultante de uma dívida aduaneira e determinar o devedor. Por conseguinte, os Estados‑Membros estão obrigados a lançar os direitos apurados nos termos do artigo 2.o desses regulamentos na contabilidade dos recursos próprios da União, nas condições previstas no artigo 6.o dos referidos regulamentos. A este respeito, importa recordar que, por força do artigo 6.o, n.o 3, alínea b), do Regulamento n.o 1150/2000 e do artigo 6.o, n.o 3, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 609/2014, um direito apurado que ainda não foi cobrado e em relação ao qual não foi prestada qualquer caução é inscrito na contabilidade B (Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 57 e jurisprudência referida).

342

Os Estados‑Membros devem, em seguida, pôr os recursos próprios da União à disposição da Comissão nas condições fixadas, de forma idêntica, nos artigos 9.o a 11.o do Regulamento n.o 1150/2000 e nos artigos 9.o, 10.o e 12.o do Regulamento n.o 609/2014, creditando‑os, nos prazos previstos, na conta aberta para o efeito em nome dessa instituição. Em conformidade com o artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000 e com o artigo 12.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014, qualquer atraso no lançamento nesta conta implicará o pagamento, pelo Estado‑Membro em causa, de juros de mora (Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 58).

343

Além disso, por força do artigo 17.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000 e do artigo 13.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014, os Estados‑Membros estão obrigados a tomar todas as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos apurados nos termos do artigo 2.o destes regulamentos sejam colocados à disposição da Comissão.

344

Por outro lado, por força do artigo 17.o, n.o 2, do Regulamento n.o 1150/2000 e do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014, os Estados‑Membros apenas são dispensados de pôr à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos apurados se a cobrança não pôde ser efetuada por razões de força maior ou quando se verificar que é definitivamente impossível proceder a essa cobrança por outras razões que não lhes sejam imputáveis.

345

Daqui decorre que, no estado atual do direito da União, a gestão do sistema de recursos próprios da União está confiada aos Estados‑Membros e é da exclusiva responsabilidade destes últimos. Assim, as obrigações de cobrança, de apuramento e de lançamento na conta desses recursos próprios tendo em vista a sua disponibilização à Comissão impõem‑se diretamente aos Estados‑Membros por força da legislação da União em matéria de recursos próprios, e, no caso em apreço, das Decisões 2007/436 e 2014/335, bem como dos Regulamentos n.os 1150/2000 e 609/2014 (v., neste sentido, Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 62 e jurisprudência referida).

346

Por último, uma vez que existe um nexo direto entre a cobrança das receitas provenientes dos direitos aduaneiros e a colocação à disposição da Comissão dos recursos correspondentes, incumbe aos Estados‑Membros, em conformidade com as obrigações que lhes são impostas por força do artigo 325.o, n.o 1, TFUE, proteger os interesses financeiros da União contra a fraude ou qualquer outra atividade ilegal lesiva desses interesses, tomar as medidas necessárias com vista a garantir a cobrança efetiva e integral desses direitos e, logo, desses recursos [v., neste sentido, Acórdão de 11 de julho de 2019, Comissão/Itália (Recursos próprios — Cobrança de uma dívida aduaneira), C‑304/18, não publicado, EU:C:2019:601, n.o 50 e jurisprudência referida].

347

Tendo em conta estas considerações relativas às características do sistema dos recursos próprios da União, há que observar, como o advogado‑geral salientou, em substância, no n.o 240 das suas conclusões, que, uma vez que, como se conclui no termo da apreciação do primeiro fundamento, as autoridades aduaneiras do Reino Unido não adotaram, durante o período de infração, em violação do artigo 325.o, n.o 1, TFUE e do direito aduaneiro da União, medidas suscetíveis de assegurar que sejam determinados ao seu nível justo os valores aduaneiros das importações em causa efetuadas durante esse período, tais como controlos efetuados antes do desalfandegamento das mercadorias em questão, com base numa análise de risco, e a obrigação de constituir garantias para as importações detetadas por um perfil de risco como apresentando um risco significativo de subavaliação, este Estado, no que respeita a essas importações, calculou as dívidas aduaneiras com base em valores incorretos, por serem, em regra, inferiores aos valores reais das mercadorias em causa. Assim, o referido Estado não efetuou o registo de liquidação de todos os direitos aduaneiros devidos e, por conseguinte, também não apurou, nem colocou à disposição da Comissão, em violação dos artigos 2.o e 8.o das Decisões 2007/436 e 2014/335, bem como dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000 e das disposições correspondentes dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento n.o 609/2014, a totalidade dos recursos próprios relativos às referidas importações no momento em que o deveriam ter sido.

348

O Reino Unido põe em causa esta conclusão. Segundo este Estado, na medida em que a presente ação pretende que o Tribunal de Justiça o condene a colocar à disposição da Comissão determinados montantes de recursos próprios, esta ação constitui uma ação de indemnização com fundamento numa violação do artigo 325.o TFUE e do direito aduaneiro da União, a qual se deve ao facto de as suas autoridades aduaneiras terem efetuado controlos inadequados sobre importações fraudulentamente subavaliadas.

349

Por conseguinte, em conformidade com os princípios que regem qualquer ação de indemnização, a Comissão está obrigada a demonstrar que existe um nexo de causalidade direto entre esses controlos e as perdas de recursos próprios que esta instituição reclama a título de indemnização.

350

No entanto, esse nexo de causalidade não existe. A este respeito, o Reino Unido alega que, em conformidade com esses princípios, deve colocar‑se a questão de saber o que teria acontecido se as medidas de controlo aduaneiro recomendadas pelo OLAF e pela Comissão tivessem sido adotadas para combater a fraude por subavaliação em causa, designadamente, no essencial, controlos efetuados antes do desalfandegamento das mercadorias em causa com base num perfil de risco.

351

Ora, segundo o Reino Unido, se tais medidas tivessem sido adotadas, as importações em causa simplesmente não teriam ocorrido, pelo que não teria sido causada qualquer perda para o orçamento da União. Com efeito, os operadores em causa não estariam dispostos a pagar os direitos aduaneiros devidos pelas importações em causa, uma vez que, nomeadamente, a sua remuneração dependia dos montantes de direitos aduaneiros eludidos.

352

Assim, o Reino Unido não pode ser acusado de não ter colocado à disposição da Comissão os recursos próprios tradicionais devidos a título das importações em causa, uma vez que este Estado foi, de resto, ele próprio a vítima. Por conseguinte, o referido Estado não pode ser considerado responsável por qualquer perda desses recursos próprios.

353

Esta argumentação deve ser rejeitada.

354

Antes de mais, há que recordar que, como exposto nos n.os 180 e seguintes do presente acórdão, a Comissão, no âmbito do presente processo, não pretende que o Tribunal de Justiça condene este Estado a pagar uma indemnização, pelo que a presente ação não constitui uma ação de indemnização e não é necessário demonstrar qualquer nexo de causalidade direto entre os controlos inadequados das autoridades do Reino Unido e as perdas de recursos próprios devido ao caráter alegadamente indemnizatório do presente processo.

355

De igual modo, contrariamente ao que o Reino Unido alega, a exigência de a Comissão demonstrar um nexo de causalidade direto entre uma violação do direito da União e as perdas de recursos próprios pelas quais um Estado‑Membro deve ser considerado responsável também não decorre do Acórdão de 31 de outubro de 2019, Comissão/Reino Unido (C‑391/17, EU:C:2019:919).

356

É certo que, nos n.os 121 e 122 desse acórdão, o Tribunal de Justiça utilizou a expressão «nexo de causalidade», entre uma ação irregular das autoridades aduaneiras de Anguila (território ultramarino do Reino Unido) e as perdas de recursos próprios resultantes de uma violação da Decisão 91/482/CEE do Conselho, de 25 de julho de 1991, relativa à associação dos países e territórios ultramarinos à Comunidade Económica Europeia (JO 1991, L 263, p. 1), para apreciar e, em seguida, rejeitar a argumentação invocada pelo Reino Unido, relativa à inexistência desse nexo. No entanto, resulta do n.o 120 do referido acórdão que essa expressão faz referência à questão de saber se dessa ação irregular «resultou, necessariamente, uma perda de recursos próprios», questão à qual o Tribunal de Justiça respondeu de forma afirmativa nesse n.o 120, com base na constatação de que a referida ação irregular tinha levado as autoridades italianas a autorizar a importação para a União de produtos provenientes de Anguila com isenção de direitos aduaneiros e a adotar decisões de dispensa de pagamento e de restituição de direitos aduaneiros.

357

Ora, no caso em apreço, há que constatar que a inexistência de controlos adequados, efetuados pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido, dos valores aduaneiros declarados no que respeita às importações em causa durante o período de infração fez com que os direitos aduaneiros correspondentes tivessem sido calculados e objeto de registo de liquidação com base em valores subavaliados e que, por isso, a importação para a União dos produtos em causa tivesse sido autorizada quando apenas uma fração dos direitos aduaneiros devidos tinha sido paga. Por conseguinte, esta falta de controlos adequados conduziu, seguramente, a perdas de recursos próprios da União.

358

Contrariamente ao que o Reino Unido alega, a questão que deve ser colocada a este título para determinar se as perdas de recursos próprios da União foram causadas devido ao caráter inadequado do dispositivo de controlos aduaneiros não é a questão de saber se as importações em causa teriam tido lugar na hipótese de os controlos aduaneiros recomendados pelo OLAF e pela Comissão terem sido efetuados, mas apenas a questão de saber quais teriam sido os montantes de direitos aduaneiros objeto de registo de liquidação e de recursos próprios da União apurados pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido se essas importações, em relação às quais é pacífico que tiveram efetivamente lugar em grandes quantidades no território desse Estado, tivessem sido objeto de verificações adequadas a fim de assegurar que os direitos aduaneiros eram calculados não com base em valores aduaneiros manifestamente subavaliados mas em valores aduaneiros corretamente estabelecidos, em conformidade com as regras do direito aduaneiro da União em matéria de determinação do valor aduaneiro.

359

A este respeito, decorre da jurisprudência recordada no n.o 346 do presente acórdão que, uma vez que existe um nexo direto entre a cobrança das receitas provenientes dos direitos aduaneiros e a colocação à disposição da Comissão dos recursos próprios tradicionais correspondentes, incumbe aos Estados‑Membros, por força do artigo 325.o, n.o 1, TFUE, tomar as medidas necessárias para garantir a cobrança efetiva e integral desses direitos e, logo, dos montantes correspondentes desses recursos.

360

Ora, no caso em apreço, como se concluiu no termo da apreciação do primeiro fundamento, o Reino Unido não tomou, durante o período da infração, as medidas necessárias para esse efeito.

361

Por conseguinte, os direitos aduaneiros relativos às mercadorias objeto das importações em causa foram calculados com base em valores que se podem considerar, na sua grande maioria, declarados fraudulentamente, na medida em que eram largamente inferiores ao seu valor real e, por conseguinte, não foram corretamente determinados.

362

Assim, o caráter inadequado destes controlos fez com que os montantes dos direitos aduaneiros e dos recursos próprios efetivamente devidos pelas importações em causa não tivessem sido efetiva e integralmente cobrados e colocados à disposição da Comissão pelo Reino Unido.

363

Com efeito, uma vez que esses montantes poderiam ter sido apurados corretamente logo aquando da realização das operações de importação e subsequente desalfandegamento se as autoridades do Reino Unido tivessem procedido às verificações necessárias, este Estado deve ser colocado, relativamente ao período de infração, numa situação equivalente àquela em que se encontraria se tivesse apurado corretamente os direitos aduaneiros correspondentes e os tivesse inscrito na contabilidade dos recursos próprios da União (v., por analogia, Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal, C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.o 63 e jurisprudência referida).

364

Além disso, como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, no n.o 265 das suas conclusões, embora, devido aos controlos inadequados que efetuaram, as autoridades aduaneiras do Reino Unido não tenham cobrado, em violação das obrigações que lhes incumbiam por força do artigo 325.o, n.o 1, TFUE e do direito aduaneiro da União, eventualmente por erros que cometeram, a totalidade dos direitos aduaneiros devidos pelas importações em causa, isso não é suscetível de pôr em causa a obrigação do Reino Unido de colocar à disposição da Comissão os recursos que teriam sido apurados se esses direitos tivessem sido objeto de um registo de liquidação correto.

365

Por último, uma vez que, durante todo o período da infração, quantidades maciças das mercadorias em causa foram objeto de importações subavaliadas no Reino Unido, sem que a exatidão dos valores declarados em conformidade com as regras do direito da União em matéria de determinação do valor aduaneiro tenha sido verificada antes da sua introdução em livre prática, este Estado criou uma situação irreversível que conduziu a perdas significativas de recursos próprios da União pelas quais este deve ser considerado responsável.

366

Uma reconstituição dos factos como aquela que o Reino Unido invoca, além de implicar um exercício especulativo que não cabe ao Tribunal de Justiça efetuar, para declarar que incumbe a um Estado‑Membro compensar as perdas de recursos próprios da União, não pode, em caso algum, pôr em causa a existência e a importância das perdas sofridas no que respeita às importações em causa.

2) Quanto à responsabilidade do Reino Unido pelas perdas de recursos próprios da União apuradas nos avisos C 18 Snake

367

Há que apreciar, em seguida, a acusação da Comissão segundo a qual o Reino Unido, em violação do artigo 13.o do Regulamento n.o 609/2014, não colocou à sua disposição os recursos próprios tradicionais que eram devidos no que respeita às importações em causa, efetuadas entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014, uma vez que as autoridades aduaneiras do Reino Unido, entre os meses de junho e novembro de 2015, anularam as decisões de cobrança a posteriori de direitos aduaneiros suplementares adotadas no âmbito da ODC Snake, em particular os 23 avisos C 18 Snake, emitidos entre o mês de novembro de 2014 e o mês de fevereiro de 2015, tendo em vista cobrar um montante total de direitos aduaneiros suplementares que ascendia, no final, segundo o Reino Unido, a 192568694,30 GBP.

368

É pacífico, a este respeito, que os direitos aduaneiros suplementares reclamados nos avisos C 18 Snake foram objeto de registo de liquidação e notificados aos seus devedores, que os montantes de recursos próprios correspondentes a esses direitos foram inscritos na contabilidade B, em conformidade com o artigo 6.o, n.o 3, dos Regulamentos n.os 1150/2000 e 609/2014, uma vez que se tratava de direitos apurados, mas que ainda não tinham sido cobrados e em relação aos quais não tinha sido prestada qualquer caução, e que as autoridades aduaneiras do Reino Unido, posteriormente, anularam esses avisos e retiraram a inscrição desses montantes dessa contabilidade.

369

O Reino Unido alega que a anulação dos avisos C 18 Snake se justificava uma vez que se tinha tornado definitivamente impossível proceder à cobrança dos direitos em causa por razões que não lhe podiam ser imputadas, pelo que, em conformidade com o artigo 13.o, n.o 2, alínea b), do Regulamento n.o 609/2014, tinha sido dispensado de colocar à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos apurados.

370

Segundo esse Estado, a cobrança dos direitos apurados por esses avisos tornou‑se definitivamente impossível, por um lado, devido ao facto, não imputável ao Reino Unido, de os devedores desses direitos serem as designadas empresas «fénix», ou seja, empresas inadimplentes ou insolventes, e, por outro, uma vez que resultava de decisões adotadas no âmbito da apreciação dos recursos interpostos desses avisos num serviço independente da HMRC que os direitos aduaneiros suplementares reclamados nos referidos avisos tinham sido calculados com base nos PMC e, por conseguinte, segundo uma «metodologia inaceitável e insuficientemente fundamentada».

371

A este respeito, há que recordar, antes de mais, que, por força do artigo 13.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014, os Estados‑Membros são obrigados a tomar todas as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos apurados nos termos do artigo 2.o deste regulamento sejam colocados à disposição da Comissão nas condições fixadas pelo mesmo regulamento.

372

No caso em apreço, como confirma o detalhe dos cálculos dos direitos aduaneiros suplementares reclamados nos avisos C 18 Snake, que o Reino Unido apresentou em anexo à tréplica, esses direitos suplementares foram calculados erradamente com base nos PMC.

373

Ora, trata‑se de um erro administrativo cometido pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido, uma vez que, como o OLAF sublinhou por diversas vezes no âmbito das reuniões com essas autoridades aduaneiras e como, de resto, resulta claramente das orientações da ACP Discount, os PMC só podiam ser utilizados como uma ferramenta de análise de risco, ou seja, uma ferramenta que permitia detetar com base em perfis de risco as importações suscetíveis de serem subavaliadas em relação às quais eram necessárias verificações, e não para determinar o seu valor aduaneiro.

374

Por conseguinte, a fim de cumprir as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 13.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014, o Reino Unido estava obrigado, enquanto medida necessária para que os montantes correspondentes aos direitos apurados em conformidade com o artigo 2.o desse regulamento fossem colocados à disposição da Comissão, a corrigir esse erro administrativo. Em particular, o Reino Unido devia determinar novamente o valor aduaneiro através da aplicação de um dos métodos previstos a este respeito pelo direito aduaneiro da União e, em especial, pelas regras sequenciais das disposições do direito da União em matéria de determinação do valor aduaneiro, como as previstas nos artigos 70.o a 74.o do Código Aduaneiro da União.

375

A este respeito, o Tribunal de Justiça declarou que os métodos de determinação do valor aduaneiro previstos por esses artigos apresentam um nexo de subsidiariedade, pelo que, quando tal valor não puder ser determinado por aplicação de uma determinada disposição, há que aplicar a disposição que vem imediatamente a seguir, na ordem estabelecida (v., neste sentido, Acórdão de 16 de junho de 2016, EURO 2004. Hungary, C‑291/15, EU:C:2016:455, n.o 29).

376

Resulta igualmente dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça, em particular da ata da reunião realizada em 20 de fevereiro de 2015 entre o OLAF e a HMRC, que as autoridades aduaneiras do Reino Unido se aperceberam rapidamente do erro que tinham cometido, mas decidiram anular os avisos de cobrança em vez de os reemitirem depois de os terem corrigido aplicando um dos métodos referidos no número anterior do presente acórdão para determinar corretamente o valor aduaneiro. Ora, essa decisão de não reemitir os avisos depois de os ter corrigido constitui igualmente um erro administrativo.

377

Neste contexto, o Reino Unido não pode invocar o facto de, apesar de o OLAF lhe ter prometido fornecer‑lhe dados provenientes das autoridades chinesas relativos aos preços de exportação, muito poucos desses dados acabaram por lhe ser fornecidos numa forma que permitisse a sua utilização para determinar o valor aduaneiro das mercadorias em causa em conformidade com as regras sequenciais das disposições do direito da União em matéria de determinação do valor aduaneiro. De igual modo, esse Estado não pode invocar o facto de não dispor de dados relativos ao valor dessas mercadorias que lhe permitissem determinar o valor aduaneiro em conformidade com essas regras.

378

Com efeito, uma vez que a aplicação do direito aduaneiro da União incumbe aos Estados‑Membros que por ela são exclusivamente responsáveis, o Reino Unido estava obrigado a aplicar as medidas adequadas, tais como controlos físicos, pedidos de informações e documentos ou a recolha de amostras, a fim de dispor de dados suficientes que permitissem assegurar que os valores aduaneiros em causa eram corretamente estabelecidos. Por conseguinte, este Estado não pode beneficiar da sua própria inação para justificar o facto de não ter colocado à disposição da Comissão os recursos devidos.

379

Daqui resulta que, na medida em que as autoridades aduaneiras do Reino Unido decidiram anular os avisos C 18 Snake em vez de os reemitir depois de os terem corrigido, substituindo os PMC por valores aduaneiros determinados em conformidade com os métodos sequenciais do direito aduaneiro da União, esse Estado não tomou, em violação do artigo 13.o, n.o 1, do Regulamento n.o 609/2014, as medidas necessárias para que os montantes correspondentes aos direitos apurados ou que deviam ser apurados nos termos do artigo 2.o deste regulamento fossem colocados à disposição da Comissão nas condições previstas pelo referido regulamento.

380

Em seguida, por força do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014, os Estados‑Membros só são dispensados de pôr à disposição da Comissão os montantes correspondentes aos direitos apurados se a sua cobrança não puder ser efetuada por razões de força maior ou quando se verificar que é definitivamente impossível proceder a essa cobrança por outras razões que não lhes sejam imputáveis.

381

A este respeito, um Estado‑Membro apenas pode invocar essa dispensa, por natureza excecional, com base numa razão que não lhe é imputável, se respeitar o procedimento previsto no artigo 13.o, n.os 3 e 4, do Regulamento n.o 609/2014.

382

Este procedimento é desencadeado pela comunicação à Comissão por parte do Estado‑Membro em causa, no prazo de três meses a contar da decisão da autoridade administrativa competente através da qual os montantes de direitos apurados são declarados incobráveis, dos elementos de informação relativos aos casos de aplicação do artigo 13.o, n.o 2, deste regulamento, na medida em que o montante dos direitos apurados ultrapasse 50000 euros. Estes elementos de informação devem incluir «todos os factos necessários para um pleno exame» das razões referidas no artigo 13.o, n.o 2, alíneas a) e b), do referido regulamento que impediram o Estado‑Membro em questão de disponibilizar o montante em causa, bem como as medidas tomadas por esse Estado para assegurar a cobrança. A Comissão dispõe então de um prazo de seis meses a contar da receção dessa comunicação para transmitir as suas observações ao Estado‑Membro em questão ou a contar da receção das informações complementares que esta instituição considere útil solicitar.

383

No caso em apreço há que constatar que o Reino Unido não respeitou este procedimento que inclui um diálogo iniciado com a Comissão e que assenta numa comunicação unívoca e circunstanciada das razões invocadas por este Estado que justificaram, do seu ponto de vista, que fosse dispensado de disponibilizar os recursos apurados nos avisos C 18 Snake, em aplicação do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014.

384

Com efeito, afigura‑se que as dívidas aduaneiras apuradas nos avisos C 18 Snake não foram declaradas incobráveis por uma decisão da autoridade administrativa competente que constata a impossibilidade de cobrança, na aceção do artigo 13.o, n.o 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.o 609/2014. De facto, as cartas pelas quais uma instância da HMRC anulou esses avisos no âmbito de processos de revisão administrativos não constituem uma tal decisão de inexigibilidade da dívida.

385

Além disso, é pacífico que o Reino Unido também não comunicou à Comissão, num prazo de três meses a contar da adoção dessa decisão, «todos os factos necessários para um pleno exame» das razões referidas no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014 que impediram esse Estado de colocar à disposição os montantes apurados nos avisos C 18 Snake, bem como as medidas tomadas por este último para assegurar a sua cobrança.

386

Assim, a Comissão também não estava em condições de transmitir as suas observações ou, eventualmente, de pedir informações complementares no prazo de seis meses que lhe foi fixado.

387

Importa acrescentar que, quanto ao mérito, o Reino Unido invoca como razões pelas quais lhe teria sido definitivamente impossível proceder à cobrança dos direitos apurados nos avisos C 18 Snake, o facto de, por um lado, os devedores desses direitos serem as designadas empresas «fénix», isto é, inadimplentes ou insolventes, e, por outro, de os referidos direitos terem sido calculados com base em PMC e de não existirem outros métodos para determinar o valor das mercadorias em causa na falta de dados suscetíveis de ser utilizados para esse efeito, tais como os preços de exportação prometidos, mas não fornecidos pelo OLAF.

388

Ora, as razões assim invocadas pelo Reino Unido não são suscetíveis de o dispensar de colocar à disposição da Comissão os recursos próprios derivados dos direitos aduaneiros apurados nos avisos C 18 Snake.

389

Com efeito, se esses direitos se revelaram incobráveis às empresas «fénix» em causa isso deveu‑se a um duplo erro administrativo cometido pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido, uma vez que, assim que estas se aperceberam do seu erro que consistiu em terem calculado os direitos com base nos PMC quando o OLAF tinha claramente indicado que esses preços só deviam ser utilizados no âmbito da análise de risco, preferiram anular os avisos C 18 Snake em vez de os reemitirem depois de os corrigirem em tempo útil com base num dos métodos sequenciais do direito da União em matéria de determinação do valor aduaneiro.

390

Além disso, a impossibilidade de cobrança dos direitos aduaneiros apurados nos avisos C 18 Snake decorre, em definitivo, da inexistência de controlos físicos efetuados antes do desalfandegamento das mercadorias em causa, acompanhados da recolha de amostras e aplicados de modo suficientemente sistemático. Com efeito, a inexistência de tais controlos fez com que as autoridades aduaneiras do Reino Unido não dispusessem, apesar da responsabilidade exclusiva que lhes incumbe a este respeito, dos dados necessários, nomeadamente dos dados relativos à qualidade dessas mercadorias, que permitissem determinar o valor destas em conformidade com as disposições do direito aduaneiro da União.

391

De igual modo, se, de facto, a cobrança a posteriori de direitos às designadas empresas «fénix» se revelou impossível, na grande maioria dos casos, devido à insolvência destas, tal situação podia e devia ter sido evitada se as autoridades aduaneiras do Reino Unido tivessem exigido, de maneira sistemática, como o OLAF e a Comissão lhe tinham reiteradamente recomendado, a constituição de garantias antes do desalfandegamento das mercadorias em causa.

392

Embora, após terem anulado os avisos C 18 Snake, as autoridades aduaneiras do Reino Unido não tenham reemitido esses avisos, com o fundamento de que não dispunham dos dados necessários para determinar o valor das mercadorias em causa com base nas regras do direito da União em matéria de determinação do valor aduaneiro, esse fundamento, na medida em que tem origem na violação pelo Reino Unido da responsabilidade exclusiva que lhe incumbia de assegurar que os valores aduaneiros tinham sido corretamente determinados com base em dados físicos e documentais suficientes, não pode em caso algum justificar o facto de este Estado ser dispensado de colocar à disposição da Comissão recursos relativos aos referidos avisos ao abrigo do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014.

393

Neste contexto, o Reino Unido não pode eximir‑se da responsabilidade que lhe incumbia de assegurar que os valores aduaneiros das mercadorias em causa tinham sido corretamente estabelecidos com base em dados obtidos para esse efeito pelas suas autoridades aduaneiras, alegando que muito poucos dados relativos aos preços de exportação provenientes das autoridades chinesas que o OLAF lhe tinha fornecido no âmbito da ODC Snake eram utilizáveis. Com efeito, esses preços podiam, quando muito, constituir um instrumento complementar para determinar o valor aduaneiro correto das importações em causa com base num dos métodos prescritos pelas regras do direito da União em matéria de determinação do valor aduaneiro. No entanto, não podiam em caso algum substituir os dados relativos ao valor dessas importações que incumbia às autoridades aduaneiras do Reino Unido obter no âmbito da aplicação de medidas de controlos aduaneiros implementadas antes do desalfandegamento das mercadorias em causa.

394

Deve daqui concluir‑se que, em conformidade com jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, uma vez que o Reino Unido, após ter apurado um direito da União sobre os recursos próprios, não colocou o montante correspondente à disposição da Comissão, sem que esteja preenchida uma das condições previstas no artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014, este Estado não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União, designadamente as decorrentes dos artigos 2.o e 8.o das Decisões 2007/436 e 2014/335 (v., neste sentido, Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 67 e jurisprudência referida).

395

Por conseguinte, como o advogado‑geral observou igualmente, em substância, no n.o 250 das suas conclusões, há que considerar que, devido à anulação dos 23 avisos C 18 Snake e à não colocação à disposição da Comissão dos respetivos recursos próprios tradicionais, em violação do artigo 13.o do Regulamento n.o 609/2014, esses recursos são devidos pelo Reino Unido relativamente ao período compreendido entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014.

396

Por último, no que respeita à violação do artigo 12.o do Regulamento n.o 609/2014 e da disposição correspondente do artigo 11.o do Regulamento n.o 1150/2000, na medida em que o Reino Unido não pagou os juros devidos em razão do atraso na inscrição na conta referida no artigo 9.o, n.o 1, desses regulamentos das quantias correspondentes às perdas de recursos próprios tradicionais que não foram colocadas à disposição da Comissão, há que salientar que a Comissão indicou claramente no parecer fundamentado (n.os 271 a 273, bem como dispositivo desse parecer) que, em conformidade com o disposto no artigo 12.o do Regulamento n.o 609/2014, os juros de mora eram devidos e seriam calculados assim que o montante principal fosse colocado à sua disposição. Nas conclusões do parecer fundamentado, também é expressamente referido um incumprimento desta última disposição. Por conseguinte, o Reino Unido alega erradamente que o pedido formulado pela Comissão na petição destinado ao pagamento de juros de mora nos termos do artigo 12.o do Regulamento n.o 609/2014 é inadmissível, uma vez que não foi formulado no parecer fundamentado.

397

Deve igualmente ser rejeitado o argumento do Reino Unido segundo o qual é prematuro e inadmissível alegar que este Estado não cumpriu qualquer obrigação de pagamento dos juros de mora na medida em que a referida obrigação só pode surgir numa data futura.

398

A este respeito, importa recordar que o Estado‑Membro que, não partilhando da posição da Comissão no que respeita à sua obrigação de pôr um montante de recursos próprios da União à disposição desta instituição, não proceda a essa disponibilização, se expõe a dever pagar juros de mora em caso de constatação, pelo Tribunal de Justiça, de um incumprimento das obrigações que lhe incumbem por força da regulamentação em matéria de recursos próprios (Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 69).

399

Com efeito, segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, existe um nexo indissociável entre a obrigação de apurar os recursos próprios da União, a de os inscrever na conta aberta para esse efeito em nome da Comissão nos prazos fixados e a de pagar juros de mora, sendo estes últimos exigíveis seja qual for a razão do atraso com que esses recursos foram creditados nessa conta (Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 59 e jurisprudência referida).

400

Assim, a obrigação de pagar juros de mora, em aplicação do artigo 11.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1150/2000, é acessória relativamente à obrigação de pôr à disposição da Comissão os recursos próprios da União nas condições fixadas nos artigos 9.o a 11.o deste regulamento, em especial nos prazos fixados pelo referido regulamento (Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 70).

401

Neste contexto, importa acrescentar que um Estado‑Membro pode evitar as consequências financeiras prejudiciais constituídas pelos juros de mora, cujo montante pode ser elevado, pondo à disposição da Comissão o montante exigido por esta, embora formulando reservas quanto ao fundamento das teses da mesma instituição (Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 72 e jurisprudência referida).

402

No caso em apreço, o Reino Unido optou, no entanto, por não colocar à disposição da Comissão, no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, o montante de recursos próprios reclamado nesse parecer, nem que fosse, sendo caso disso, com reservas, limitando‑se a contestar qualquer obrigação de disponibilização de um montante de recursos próprios a essa instituição, expondo‑se assim ao pagamento de juros de mora.

403

Daqui resulta que, uma vez que se concluiu que o Reino Unido não cumpriu a sua obrigação de colocar à disposição da Comissão recursos próprios da União no que respeita às importações em causa durante o período da infração, esse Estado, em violação do artigo 12.o do Regulamento n.o 609/2014 e da disposição correspondente do artigo 11.o do Regulamento n.o 1150/2000, também não respeitou a obrigação acessória que lhe incumbia de pagar os juros de mora relativos a esses recursos, até ao eventual limite de 16 % previsto no artigo 12.o, n.o 5, terceiro parágrafo, do Regulamento n.o 609/2014.

404

Tendo em conta todas as considerações anteriores, há que julgar procedente o segundo fundamento da Comissão, na medida em que este visa a acusação, que figura no primeiro parágrafo do primeiro pedido, segundo a qual o incumprimento do Reino Unido que consiste em não ter tomado as medidas de controlo aduaneiro necessárias para combater de forma efetiva a fraude por subavaliação em causa, em violação do artigo 325.o TFUE e do direito aduaneiro da União, provocou perdas de direitos aduaneiros e, assim, de recursos próprios tradicionais, pelo que o Reino Unido, ao não apurar e ao não colocar à disposição dessa instituição os recursos devidos pelos direitos aduaneiros que deviam ter sido objeto de registo de liquidação se o valor aduaneiro das importações em causa tivesse sido corretamente determinado, não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União em matéria de recursos próprios da União, nomeadamente as impostas pelos artigos 2.o e 8.o das Decisões 2007/436 e 2014/335, assim como pelos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000 e as disposições correspondentes dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento n.o 609/2014.

b)   Quanto à acusação relativa à violação pelo Reino Unido da sua obrigação de colocar à disposição determinados montantes de recursos próprios tradicionais

405

Importa apreciar, em segundo lugar, o segundo fundamento da Comissão na medida em que este visa a acusação, que figura no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição, de acordo com a qual o Reino Unido não cumpriu mais especificamente as obrigações que lhe incumbiam por força do direito da União em matéria de recursos próprios ao não ter colocado à disposição dessa instituição recursos próprios tradicionais num montante determinado para cada ano abrangido pelo período de infração, ou seja, um montante total bruto, deduzido das despesas de cobrança, relativamente a todo esse período, de 2679637088,86 de euros.

406

Para determinar esses montantes de perdas de recursos próprios tradicionais que, segundo a Comissão, o Reino Unido devia colocar à sua disposição, esta instituição baseou‑se, à semelhança do que o OLAF tinha feito no seu relatório para calcular os montantes das perdas de recursos próprios tradicionais no que respeita aos anos de 2013 a 2016, numa estimativa de natureza estatística baseada no método OLAF‑JRC que, originalmente, tinha sido desenvolvido e aplicado a partir da ACP Discount enquanto instrumento de análise de risco destinado a identificar as importações suscetíveis de serem subavaliadas e que devem ser objeto de verificações antes do desalfandegamento das mercadorias em causa.

407

O Reino Unido considera, baseando‑se no seu próprio método desenvolvido especificamente para calcular o montante das perdas de recursos próprios tradicionais (a seguir «método da HMRC»), que apenas é devedor desses recursos no que respeita ao período de infração num montante total máximo de 123819268 GBP (cerca de 145450494 de euros).

408

Na tréplica, o Reino Unido expõe o detalhe do cálculo que permite obter esse montante da seguinte forma. No que respeita à primeira parte do período de infração, designadamente, o período compreendido entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014, há que considerar como perdas de recursos próprios tradicionais o total das dívidas aduaneiras reclamadas nos 23 avisos C 18 Snake, ou seja, um montante de 192568694,30 GBP. Este montante deveria ser reduzido para um montante de cerca de 25 milhões de GBP em aplicação do método da HMRC, uma vez que essas dívidas foram erradamente calculadas segundo o método OLAF‑JRC e, em especial, com fundamento nos PMC. A este montante de cerca de 25 milhões de GBP deveria em seguida ser acrescentado, no que respeita à segunda parte do período de infração, designadamente, o período compreendido entre o mês de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive, um montante de 143115553 GBP (cerca de 168117840 de euros) que representa o montante das perdas de recursos próprios calculado segundo o método da HMRC. Por último, no que respeita às importações em causa durante esse segundo período, deveriam ser deduzidos os montantes reclamados nos avisos C 18 Breach já notificados a 34 operadores para um montante total revisto de 44296285,04 GBP (cerca de 52034846 de euros).

409

Daqui resulta que as estimativas muito diferentes da Comissão e do Reino Unido no que respeita à dimensão das perdas de recursos próprios tradicionais que os controlos inadequados das importações em causa implicaram decorrem dos métodos completamente diferentes que esta instituição e esse Estado utilizam para calcular essas perdas.

1) Quanto à argumentação do Reino Unido segundo a qual o Tribunal de Justiça deve começar por apreciar a sua estimativa das perdas de recursos próprios tradicionais

410

Importa apreciar, a título preliminar, a argumentação do Reino Unido segundo a qual o Tribunal de Justiça deveria apreciar, num primeiro momento, o cálculo das perdas de recursos próprios tradicionais tal como este foi efetuado por esse Estado com base no método da HMRC. Apenas no caso de esse cálculo dever ser afastado por ser manifestamente desrazoável é que o Tribunal de Justiça poderia apreciar, num segundo momento, a estimativa das perdas efetuada pela Comissão com base no método OLAF‑JRC.

411

Esta argumentação relativa à prevalência da estimativa das perdas de recursos próprios segundo o método da HMRC baseia‑se na competência exclusiva de que os Estados‑Membros dispõem para determinar, no âmbito da aplicação do direito aduaneiro da União, o valor aduaneiro que serve para calcular os direitos aduaneiros e para decidir, no âmbito da gestão do sistema de recursos próprios da União, os montantes de recursos que devem ser colocados à disposição da Comissão.

412

No que respeita, em primeiro lugar, à argumentação do Reino Unido relativa à repartição das competências entre a União e os Estados‑Membros no sistema aduaneiro da União, há que salientar que é verdade que, no âmbito deste sistema, tal como está atualmente concebido no direito da União, é da competência e da responsabilidade exclusiva dos Estados‑Membros assegurar que os valores aduaneiros declarados são fixados segundo as regras do direito da União relativas ao valor aduaneiro tal como previstas nos artigos 29.o a 31.o do Código Aduaneiro Comunitário ou segundo as disposições correspondentes dos artigos 70.o a 74.o do Código Aduaneiro da União e, em particular, em conformidade com um dos métodos sequenciais de determinação do valor aduaneiro previstos nesses artigos ou disposições.

413

No que respeita às importações em causa, incumbia, por conseguinte, às autoridades aduaneiras do Reino Unido, conforme foi declarado no âmbito da apreciação das outras acusações invocadas em apoio do primeiro e segundo fundamentos, tomar as medidas adequadas, tais como controlos físicos ou a recolha de amostras, a fim de assegurar que os valores aduaneiros declarados eram corretamente estabelecidos, em conformidade com essas regras do direito aduaneiro da União com base em dados físicos ou documentais suficientes relativos ao valor das mercadorias em causa, nomeadamente no que respeita às suas qualidades de acabamento.

414

Ora, conforme constatado no âmbito da apreciação do primeiro fundamento, as autoridades aduaneiras do Reino Unido, em violação do artigo 325.o, n.o 1, TFUE e do direito aduaneiro da União, não adotaram essas medidas de forma suficientemente sistemática, pelo que os valores aduaneiros em causa não foram corretamente determinados e essas autoridades também não recolheram esses dados físicos ou documentais relativos à qualidade dos produtos em causa.

415

Por conseguinte, importantes volumes de mercadorias objeto de importações manifestamente subavaliadas foram introduzidos em livre prática no mercado interno a partir do Reino Unido durante o período de infração em violação das regras do direito aduaneiro da União em matéria de determinação do valor aduaneiro.

416

Uma vez que as mercadorias em causa já não podiam ser recuperadas para efeitos de controlos físicos e não foram pedidos dados suficientes quanto ao seu valor real aos operadores em causa e, por conseguinte, também não foram fornecidos, já não é agora possível determinar, relativamente a cada declaração aduaneira em causa, o valor aduaneiro dos produtos em causa provenientes da China com base num dos métodos previstos nos artigos 70.o e 74.o do Código Aduaneiro da União, tal como o método «fall‑back», do artigo 74.o, n.o 3, deste código que consiste em determinar o valor aduaneiro com base nos «dados disponíveis» no respeito das condições previstas no artigo 144.o do Regulamento de Execução.

417

Nestas condições, o Reino Unido, apoiado pelos Estados‑Membros intervenientes, não pode acusar a Comissão de ter aplicado, para efeitos do cálculo do montante das perdas de direitos aduaneiros e, assim, de recursos próprios tradicionais resultantes da inexistência de controlos adequados das importações em causa, o método OLAF‑JRC, de natureza essencialmente estatística, que não procede de um dos métodos sequenciais previstos nos artigos 70.o e 74.o do Código Aduaneiro da União para determinar, relativamente a cada declaração aduaneira em causa, o valor aduaneiro das mercadorias em causa.

418

No que respeita, em segundo lugar, à argumentação do Reino Unido segundo a qual a prevalência da sua estimativa das perdas de recursos próprios tradicionais segundo o método da HMRC se impõe como o corolário da competência exclusiva dos Estados‑Membros para decidir da colocação à disposição da Comissão de recursos próprios, é verdade que, conforme o Tribunal de Justiça declarou, no estado atual do direito da União, a gestão do sistema de recursos próprios da União está confiada aos Estados‑Membros e é da exclusiva responsabilidade destes últimos. Assim, as obrigações de cobrança, de apuramento e de lançamento na conta desses recursos próprios tendo em vista a sua colocação à disposição da Comissão impõem‑se diretamente aos Estados‑Membros por força da legislação da União em matéria de recursos próprios, e, no caso em apreço, das Decisões 2007/436 e 2014/335 e dos Regulamentos n.os 1150/2000 e 609/2014, sem que à Comissão seja atribuído um poder decisório que lhe permita obrigar os Estados‑Membros a apurar e pôr à sua disposição montantes relativos a recursos próprios da União (Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 62 e jurisprudência referida).

419

No caso em apreço, o Reino Unido optou por não colocar à disposição da Comissão no termo do prazo fixado no parecer fundamentado o montante dos recursos próprios reclamado nesse parecer, nem que fosse, sendo caso disso, com reservas, limitando‑se a contestar o dever de inscrever na conta dessa instituição qualquer montante de recursos próprios.

420

Nestas condições, no exercício do poder discricionário de que está investida para decidir da oportunidade de instaurar o processo previsto no artigo 258.o TFUE e, de forma mais geral, no cumprimento da sua missão de guardiã dos Tratados que lhe é atribuída por força do artigo 17.o, n.o 1, TUE, que lhe impõe velar pela boa execução, pelos Estados‑Membros, das suas obrigações em matéria de recursos próprios da União, a Comissão não pode ser criticada por ter feito uso da faculdade inerente ao sistema de recursos próprios da União, tal como é atualmente concebido no direito da União, de submeter à apreciação do Tribunal de Justiça, no âmbito de uma ação por incumprimento, o presente diferendo que a opõe ao Reino Unido no que respeita à obrigação de este Estado de pôr um determinado montante de recursos próprios à disposição da Comissão (v., neste sentido, Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.os 65, 66 e 68).

421

Assim, contrariamente ao que o Reino Unido alega, uma vez que o litígio que o opõe à Comissão tem por objeto o montante dos recursos próprios que devem ser colocados à disposição desta instituição, este litígio está plenamente abrangido pela competência do Tribunal de Justiça por força do artigo 258.o TFUE.

422

Por conseguinte, não se pode exigir que a Comissão comece por intentar uma ação por incumprimento limitada à questão de princípio de saber se o Estado‑Membro em causa não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam, por força do direito da União, de colocar à disposição dessa instituição recursos próprios, sem os quantificar, antes de poder, em seguida, submeter ao Tribunal de Justiça um litígio relativo aos montantes exatos de recursos devidos no âmbito de um processo instaurado ao abrigo do artigo 260.o, n.o 2, TFUE, quando a Comissão considera que o Estado‑Membro em causa não tomou as medidas necessárias para dar execução ao acórdão do Tribunal de Justiça que declarou esse incumprimento, uma vez que não colocou à sua disposição esses montantes.

423

Assim sendo, conforme é recordado no n.o 221 do presente acórdão, no âmbito de uma ação por incumprimento ao abrigo do artigo 258.o TFUE, incumbe à Comissão, que tem o ónus de demonstrar a existência do incumprimento alegado, apresentar ao Tribunal de Justiça os elementos necessários para que este possa verificar a existência do referido incumprimento, não podendo fundar‑se numa qualquer presunção.

424

No caso em apreço, estes elementos devem incidir, nomeadamente, sobre o método que a Comissão seguiu para calcular o montante dos recursos próprios que reclama do Reino Unido.

425

Por conseguinte, importa apreciar a questão de saber se a Comissão demonstrou de forma juridicamente bastante, baseando‑se no método OLAF‑JRC, a exatidão dos montantes determinados de perdas de recursos próprios tradicionais que, segundo alega, devem ser colocados à sua disposição, sendo que, de resto, esta questão foi objeto de um debate contraditório entre as partes, tanto no decurso do procedimento pré‑contencioso como no Tribunal de Justiça.

2) Quanto à estimativa efetuada pela Comissão dos montantes de perdas de recursos próprios tradicionais segundo o método OLAF‑JRC

426

Antes de apreciar a referida questão, há que recordar sucintamente as características essenciais do método OLAF‑JRC, tal como foi utilizado pela Comissão para calcular os montantes de perdas de recursos próprios tradicionais que pediu ao Reino Unido para pôr à sua disposição, de maneira idêntica, no parecer fundamentado e na petição.

427

Como resulta dos n.os 53 a 57 do presente acórdão, o método OLAF‑JRC foi desenvolvido enquanto instrumento de análise de risco que pode ser utilizado pelas autoridades aduaneiras dos Estados‑Membros para identificar as importações que apresentam um risco significativo de subavaliação e que, por conseguinte, devem ser objeto de controlos no que respeita aos valores aduaneiros declarados. Consiste em calcular para cada um dos 495 códigos de produtos de oito algarismos da NC em causa abrangidos pelos capítulos 61 a 64 dessa nomenclatura um PMC e um PMA, o qual está uniformemente fixado em 50 % do PMC. Estes preços derivam da base de dados Comext a partir dos preços de importação dos produtos em causa provenientes de dados fornecidos por todos os Estados‑Membros e são, assim, estabelecidos a nível da União. O PMA constitui o perfil ou limiar de risco que serve para identificar as importações suscetíveis de serem subavaliadas e que, por conseguinte, devem ser objeto de controlos antes do desalfandegamento das mercadorias em causa quanto aos valores aduaneiros declarados para estas.

428

O método OLAF‑JRC, tal como foi utilizado pela Comissão para determinar os montantes de perdas de recursos próprios que reclama do Reino Unido, é um método de avaliação dessas perdas de natureza essencialmente estatística.

429

Num primeiro momento, procede‑se ao cálculo do volume das importações que devem ser consideradas subavaliadas com fundamento em dados recolhidos da base de dados Surveillance 2 durante um período de 48 meses. Para este efeito, são considerados, para cada um dos 495 códigos de produtos de oito algarismos da NC em causa, as importações de cada código de produto cujo valor agregado quotidiano seja inferior ao PMA do código de produto em causa.

430

Num segundo momento, as perdas relativas às quantidades consideradas subavaliadas são calculadas em termos de direitos aduaneiros suplementares devidos com base na diferença entre esse valor agregado quotidiano e o PMC.

431

Daqui resulta que, segundo o método OLAF‑JRC, o volume das importações subestimadas é calculado tendo em consideração as importações para o Reino Unido de produtos em causa provenientes da China cujo preço é inferior ao PMA (ou seja, a 50 % do PMC), ao passo que o valor das importações subavaliadas assim identificadas é calculado através da aplicação do PMC, entendendo‑se que estes dois preços são calculados à escala da União e não apenas ao nível do Reino Unido.

3) Quanto à estimativa efetuada pelo Reino Unido dos montantes de perdas de recursos próprios tradicionais segundo o método da HMRC

432

O Reino Unido critica o método OLAF‑JRC, alegando que este conduz a uma sobrestimação, devido às suas fragilidades e às suas inexatidões, tanto da quantidade das importações subavaliadas como do valor que lhes é atribuído.

433

O seu próprio método, o método da HMRC, consiste em calcular, para cada código de produto da NC com 10 algarismos em causa, um «limiar de conformidade» não com base num preço médio estabelecido a nível da União, mas unicamente em função dos valores declarados na importação no Reino Unido.

434

Como o Reino Unido explicou em resposta às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça, este método consiste em identificar, com base numa análise de histogramas relativos ao período de infração, para cada código de produto com dez algarismos da NC em causa, abrangido pelos capítulos 61 a 64 desta nomenclatura, simultaneamente uma «ponta», que inclui um grande volume de preços declarados comparativamente baixos, que se supõe serem quase exclusivamente subavaliados, e um ponto situado fora dessa ponta onde surgem os volumes de importações mais típicos e os preços declarados legítimos.

435

É fixado um limiar de conformidade para cada código de produto em causa ao nível do preço correspondente a esse ponto, situado fora da referida ponta onde surgem as importações legítimas e que, por isso, deve ser considerado um preço aceitável.

436

São assim consideradas subavaliadas segundo este designado método da «ponta» as importações cujo valor aduaneiro declarado é inferior a esse limiar de conformidade. No que respeita a essas importações, os direitos aduaneiros suplementares são calculados, para cada declaração aduaneira relativa a um produto em causa, com base na diferença entre o valor aduaneiro declarado e o referido limiar de conformidade.

437

Por conseguinte, o mesmo limiar de conformidade, tal como é utilizado para calcular os montantes de perdas de recursos tradicionais da União, é um valor de referência estabelecido com base em dados estatísticos relativos às importações dos produtos em causa provenientes da China para o Reino Unido, que serve simultaneamente para identificar as importações que podem ser consideradas subavaliadas e para determinar o valor que deve ser atribuído a essas importações para efeitos do cálculo dos direitos aduaneiros suplementares devidos e, logo, das perdas de recursos próprios tradicionais correspondentes que devem ainda ser colocadas à disposição da Comissão.

438

Além disso, resulta do relatório de uma empresa de consultadoria anexado pelo Reino Unido à sua resposta ao parecer fundamentado e à contestação que a diferença substancial entre a estimativa desse Estado das perdas e a estimativa da Comissão, sendo a primeira inferior a 10 % da segunda, se deve em cerca de 80 % ao facto de, segundo o método da HMRC, as importações supostamente subestimadas serem «reavaliadas» ao nível de um preço limiar, designadamente, o limiar de conformidade, que é um preço derivado apenas dos preços de importação para o Reino Unido ao passo que, segundo o método OLAF‑JRC, o valor é determinado não ao nível de um preço limiar como o PMA, ou seja 50 % do PMC, mas ao nível do «preço justo», ou seja 100 % do PMC, que é um preço derivado da média aritmética e, assim, não ponderada dos PMC de todos os Estados‑Membros, incluindo, à época, os do Reino Unido.

4) Quanto à argumentação de caráter geral dirigida contra o método OLAF‑JRC

439

Antes de apreciar as diferentes críticas específicas formuladas pelo Reino Unido, apoiado pelos Estados‑Membros intervenientes, a respeito das características essenciais do método OLAF‑JRC, utilizado como método para estimar os montantes das perdas de recursos próprios, há que apreciar a argumentação de caráter geral invocada por este Estado contra este método.

440

Segundo esta argumentação, uma vez que o referido método foi especificamente desenvolvido para poder ser utilizado pelos Estados‑Membros como perfil de risco que permite identificar importações que apresentam um risco significativo de subavaliação e que, assim, devem ser controladas, seria inadequado aplicar o mesmo método para calcular os montantes das perdas de recursos próprios correspondentes aos direitos aduaneiros que não foram cobrados no Reino Unido devido ao caráter inadequado dos controlos efetuados pelas suas autoridades aduaneiras.

441

Com efeito, trata‑se de um método essencialmente estatístico para determinar o valor aduaneiro das importações subavaliadas que não se encontra entre os métodos sequenciais previstos nos artigos 70.o e 74.o do Código Aduaneiro da União, como o método «fall‑back» previsto no artigo 74.o, n.o 3, desse código, que consiste em determinar o valor aduaneiro das mercadorias em causa com base nos «dados disponíveis» observando as condições impostas pelo artigo 144.o do Regulamento de Execução.

442

A este respeito, embora o método OLAF‑JRC seja um método de estimativa dos montantes das perdas de recursos próprios essencialmente estatístico que não visa determinar o valor aduaneiro das mercadorias em causa, em conformidade com os artigos 70.o e 74.o do Código Aduaneiro da União, tendo em conta cada declaração aduaneira em causa, a Comissão não pode ser criticada por ter utilizado esse método estatístico para estimar os montantes das perdas de recursos próprios nas circunstâncias do caso em apreço.

443

Com efeito, é pacífico que as importações em causa ocorreram em grande escala e que as mercadorias em causa foram introduzidas em livre prática, pelo que essas mercadorias já não podem ser recuperadas para efeitos de verificações tendo em vista determinar o seu valor real. Além disso, o Reino Unido, em violação do artigo 325.o, n.o 1, TFUE e da regulamentação aduaneira da União, não tomou as medidas necessárias, tais como controlos físicos, pedidos de informações ou de documentos ou ainda a recolha sistemática de amostras. Por conseguinte, na falta de dados suficientes relativos à qualidade das mercadorias já introduzidas em livre prática, deixou de ser possível, devido a essas omissões, determinar o valor dessas mercadorias com base num dos métodos de avaliação previstos nos artigos 70.o e 74.o do Código Aduaneiro da União, pelo que só um método estatístico pode ser utilizado para estimar o valor das referidas mercadorias.

444

Além disso, como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, no n.o 274 das suas conclusões, nas circunstâncias específicas do caso em apreço nada impedia, em princípio, o OLAF e a Comissão de utilizarem o método OLAF‑JRC, mesmo que este método tivesse sido inicialmente concebido para servir de instrumento de análise de risco para estimar os montantes das perdas de recursos próprios provocadas pelos controlos inadequados das autoridades aduaneiras do Reino Unido, uma vez que o referido método inclui um preço limiar, designadamente o PMA, que permite determinar os volumes das importações subavaliadas, e um preço de referência, designadamente o PMC, que permite atribuir um valor de substituição a essas importações para efeitos do cálculo do remanescente dos direitos aduaneiros devidos.

445

Por outro lado, como observou igualmente o advogado‑geral, em substância, nos n.os 276 a 278 das suas conclusões, na sua jurisprudência, o Tribunal de Justiça admitiu que, em circunstâncias semelhantes às do caso em apreço, a quantificação das perdas de recursos próprios pode basear‑se em dados estatísticos e não em dados diretamente relacionados com o valor das mercadorias em causa.

446

Com efeito, numa situação em que, na falta das mercadorias em causa, a impossibilidade de proceder a verificações era a consequência inelutável da não realização, pelas autoridades aduaneiras, de controlos destinados a verificar o valor real dessas mercadorias, que levaram à aceitação sistemática, por essas autoridades, dos valores aduaneiros declarados, quando sabiam que, em média, estas eram subavaliadas, o Tribunal de Justiça considerou que, em tal caso, não era inadequado quantificar os montantes das perdas de recursos próprios decorrentes de tal prática com base em dados relativos à diferença entre o peso médio standard declarado de mercadorias com a mesma natureza importadas num período posterior e o seu peso médio constatado em controlos que, devido à sua extensão, podiam ser considerados relevantes (v., neste sentido, Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal, C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.os 54, 63, 65 e 66).

447

Nas circunstâncias específicas do caso em apreço, as perdas de recursos próprios decorrem da prática das autoridades aduaneiras do Reino Unido que consistiu, no essencial, em aceitar sistematicamente, durante o período de infração, as declarações aduaneiras dos produtos em causa importados provenientes da China sem verificar os valores referidos nessas declarações, quando essas autoridades sabiam ou deviam razoavelmente saber que grandes quantidades desses produtos era importados de modo fraudulento a preços manifestamente subavaliados. Por conseguinte, os montantes dessas perdas podem ser determinados com base num método como o método OLAF‑JRC que assenta em dados estatísticos e não num método destinado a determinar o valor aduaneiro das mercadorias em causa com base em provas diretas, em conformidade com os artigos 70.o e 74.o do Código Aduaneiro da União. Com efeito, este último método deixa de poder ser aplicado na falta de elementos de prova diretos relativos a esse valor obtidos pelas referidas autoridades em quantidades suficientes.

448

Por outro lado, como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, na nota de rodapé n.o 277, inserida no n.o 274 das suas conclusões, o método da HMRC, que o Reino Unido propõe para estimar os montantes das perdas de recursos próprios, é igualmente uma metodologia que se baseia essencialmente em dados estatísticos, uma vez que os limiares de conformidade são derivados de valores estatísticos históricos.

449

Não obstante, há que determinar se, ao basear‑se no método OLAF‑JRC para calcular os montantes das perdas de recursos próprios tradicionais que alega, a Comissão fez prova juridicamente bastante da exatidão dos sete montantes reclamados para cada um dos anos que compõem o período de infração, em conformidade com o ónus da prova que lhe incumbe, segundo a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça recordada no n.o 423 do presente acórdão, num processo por incumprimento.

450

Neste contexto e tendo igualmente em conta o que foi declarado nos n.os 423 a 425 do presente acórdão, compete ao Tribunal de Justiça verificar se, na medida em que a Comissão invocou o método OLAF‑JRC enquanto método de cálculo para determinar os montantes das perdas de recursos próprios que não foram colocados à sua disposição em violação do direito da União, essa instituição forneceu elementos suficientes que demonstram a exatidão desses montantes e, por conseguinte, a procedência do incumprimento alegado, em conformidade com o ónus da prova que lhe incumbe.

451

Como o advogado‑geral observou igualmente no n.o 281 das suas conclusões, o Tribunal de Justiça não é, por conseguinte, obrigado a efetuar uma escolha entre as diferentes abordagens metodológicas propostas pelas partes, como o Reino Unido parece sugerir na contestação, mas apenas a apreciar o método OLAF‑JRC invocado pela Comissão em apoio da presente ação analisando as diferentes críticas efetuadas por este Estado, apoiado pelos Estados‑Membros intervenientes, contra esse método.

452

Há que precisar, a este respeito, que a apreciação efetuada pelo Tribunal de Justiça, no âmbito da presente ação por incumprimento, do método OLAF‑JRC deve destinar‑se essencialmente, como o advogado‑geral observou igualmente, em substância, no n.o 286 das suas conclusões, a verificar se esse método se justificava tendo em conta as especificidades das circunstâncias do caso concreto e se era suficientemente preciso e fiável, uma vez que se baseava, nomeadamente, em critérios que não são nem arbitrários nem distorcidos e que assentava numa análise objetiva e coerente de todos os dados pertinentes disponíveis, de modo a não conduzir a uma sobrestimação manifesta do montante dessas perdas.

453

Embora a verificação da exatidão dos diferentes montantes de perdas de recursos próprios tradicionais que figuram no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição deva, em teoria, como é indicado no n.o 449 do presente acórdão, ser efetuada no que respeita a cada um dos sete anos referidos nesse terceiro parágrafo, o Tribunal de Justiça, por razões de economia processual, procederá a essa apreciação no que respeita a dois períodos sucessivos incluídos no período de infração, designadamente, o período compreendido entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014 e o período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive.

5) Quanto à estimativa do montante das perdas de recursos próprios tradicionais no que respeita ao período compreendido entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014

454

No que respeita, em primeiro lugar, ao período compreendido entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014, resulta dos montantes que figuram no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição para os anos de 2011 a 2014 que a Comissão acusa o Reino Unido, relativamente a esse período, de não ter colocado à disposição desta instituição um montante total de recursos próprios tradicionais de 1001511991,60 de euros.

455

Ora, como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, nos n.os 293 a 297 das suas conclusões, resulta de modo unívoco dos fundamentos da petição e da réplica que, em relação ao referido período, devido, nomeadamente, às regras em matéria de caducidade da dívida aduaneira previstas no artigo 221.o, n.o 3, do Código Aduaneiro Comunitário e no artigo 103.o, n.o 1, do Código Aduaneiro da União, a Comissão pretendeu limitar o alcance do recurso às dívidas aduaneiras apuradas nas ordens de cobrança a posteriori que figuram nos 23 avisos C 18 Snake que foram emitidos entre o mês de novembro de 2014 e o mês de fevereiro de 2015 e que, após o seu registo de liquidação e notificação aos operadores em causa, foram anuladas entre o mês de junho e o mês de novembro de 2015. Por outro lado, esta intenção da Comissão é confirmada pelas acusações formuladas na notificação para cumprir e no parecer fundamentado.

456

Conforme se concluiu nos n.os 367 a 395 do presente acórdão, a anulação dos 23 avisos C 18 Snake é devida a erros administrativos cometidos pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido que não são justificáveis à luz do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014, pelo que este Estado não estava dispensado de colocar à disposição da Comissão os recursos relativos a esses avisos.

457

Na contestação, o Reino Unido indicou que os montantes reclamados nos avisos C 18 Snake eram calculados com base nos PMC do método OLAF‑JRC. Na réplica, a Comissão objeta que, durante o procedimento pré‑contencioso, tinha indicado ter compreendido, sem ser corrigida neste ponto pelo Reino Unido, que esses montantes eram calculados com base no PMA e, assim, segundo a Comissão, num nível manifestamente demasiado baixo para efeitos da estimativa dos montantes das perdas de recursos próprios, o que a levou a aplicar, na petição, o seu método de cálculo dessas perdas, incluindo para o período compreendido entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014, no que respeita à totalidade das importações efetuadas a um preço declarado inferior ao PMA durante esse período.

458

Ora, resulta claramente dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça e, em particular, da apresentação pelo Reino Unido em anexo à tréplica dos avisos C 18 Snake e do detalhe dos cálculos relativos a esses avisos, por um lado, que as dívidas aduaneiras suplementares reclamadas nos referidos avisos foram efetivamente calculadas, ainda que na sequência de erros administrativos, com base em PMC e não com base nas regras do direito aduaneiro da União em matéria de determinação do valor aduaneiro, e, por outro, que o montante total dessas dívidas era de 192568694,30 GBP.

459

Daqui resulta que existe uma incoerência entre os pedidos apresentados na petição e os fundamentos desta no que respeita ao montante dos recursos próprios que a Comissão reclama no âmbito do presente processo.

460

Com efeito, nos termos do terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição, a Comissão pede ao Tribunal de Justiça que declare que, relativamente ao período compreendido entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014, o Reino Unido não respeitou as obrigações que lhe incumbiam por força da legislação da União em matéria de recursos próprios, uma vez que este Estado não colocou à disposição da Comissão um montante total de 1001511991,60 de euros, montante calculado com base no método OLAF‑JRC e que tem em conta todas as importações subavaliadas efetuadas a preços inferiores ao PMA durante esse período, incluindo as de resto muito numerosas importações não abrangidas pelos avisos C 18 Snake.

461

Em contrapartida, resulta inequivocamente dos fundamentos da petição e da réplica, e é confirmado pela notificação para cumprir e pelo parecer fundamentado, que, no que respeita ao referido período, a Comissão pretendeu limitar a sua acusação relativa à não colocação à disposição pelo Reino Unido de recursos próprios da União aos recursos correspondentes às dívidas aduaneiras apuradas nos avisos C 18 Snake, o que significa que só reclama recursos em relação às importações subavaliadas efetuadas a preços inferiores ao PMA e mencionadas nesses avisos. Ora, o montante total dessas dívidas aduaneiras ascende, segundo o Reino Unido, com base em provas, a 192568694,30 GBP.

462

Nestas condições, deve concluir‑se que uma vez que subsistem grandes incertezas no que respeita à exatidão dos montantes dos recursos próprios que a Comissão reclama nos termos do terceiro parágrafo do primeiro pedido formulado na petição para o período compreendido entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014, esta instituição não fez prova juridicamente bastante da totalidade dos mesmos.

463

Por conseguinte, no que respeita ao primeiro período, compreendido entre o mês de novembro de 2011 e o mês de novembro de 2014, o segundo fundamento deve ser julgado improcedente na medida em que tem por objeto a acusação referida no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição, segundo a qual o Reino Unido não respeitou o direito da União, uma vez que este Estado não colocou à disposição da Comissão os montantes dos recursos que aí são enumerados no montante total de 1001511991,60 de euros.

6) Quanto à estimativa do montante das perdas de recursos próprios tradicionais no que respeita ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive

464

No que respeita, em segundo lugar, ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive, é pacífico que a Comissão determinou os montantes das perdas de recursos próprios tradicionais que reclama nos termos do terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição, ou seja, um montante total de 1678125097 de euros, com base no método OLAF‑JRC sem deduzir desses montantes aqueles que são reclamados pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido nas ordens de cobrança de direitos a posteriori que figuram nos avisos C 18 Breach relativos a esse período.

465

Por conseguinte, há que apreciar antes de mais, os diferentes argumentos invocados pelo Reino Unido, apoiado pelos Estados‑Membros intervenientes, contra o método OLAF‑JRC tal como foi utilizado pela Comissão para calcular o montante das perdas de recursos próprios que reclama para o referido período e, em seguida, o impacto que poderia ter sobre essa estimativa a tomada em consideração das ordens de cobrança que figuram nos avisos C 18 Breach relativos ao mesmo período.

i) Quanto à crítica dirigida contra o método OLAF‑JRC relativa ao facto de este conduzir a uma sobreavaliação do volume das importações que devem ser consideradas subavaliadas

466

Antes de mais, no que respeita às críticas dirigidas contra o método OLAF‑JRC, há que apreciar, em primeiro lugar, a crítica segundo a qual este método, na medida em que utiliza o PMA como critério para calcular o volume das importações subavaliadas, sobrestima esse volume, uma vez que se trata de um critério arbitrário e impreciso cuja aplicação tem por consequência incluir um volume não negligenciável de importações legítimas a preços muito baixos.

467

Quanto à crítica geral segundo a qual o PMA constitui um «critério arbitrário», há que recordar que a fixação dos PMA num nível de 50 % dos PMC se baseia em estudos de histogramas efetuados pelo JRC destinados a identificar, a partir de dados estatísticos, categorias de importações a preços muito baixos. Na medida em que resulta da análise de estatísticas relativas aos preços de importação, tal abordagem é comparável à seguida no quadro do método da HMRC para determinar o limiar de conformidade.

468

O Reino Unido critica o método utilizado pela Comissão para calcular o montante das perdas de recursos próprios, uma vez que, contrariamente ao método da HMRC, este resulta de dados agregados diários de importações no Reino Unido e não de dados ao nível do artigo em causa, ou seja, para cada declaração aduaneira, bem como de códigos de produtos com oito algarismos da NC e não de códigos de produtos com dez algarismos desta nomenclatura [códigos da pauta integrada da União Europeia (TARIC)].

469

A Comissão alega que procedeu assim uma vez que apenas dispunha desses dados agregados diários e de dados ao nível de códigos de produtos com oito algarismos. Alega igualmente que a utilização dos referidos dados agregados diários teve um efeito de sobrecompensação e que, por conseguinte, essa utilização tende a diminuir o volume de importações consideradas subavaliadas e é bastante favorável ao Reino Unido.

470

Alega que, se o método OLAF‑JRC fosse, por exemplo, aplicado aos dados relativos às importações do Reino Unido ao nível de cada declaração aduaneira para os segundo e terceiro trimestres de 2017, as perdas estimadas seriam superiores em cerca de 40 % às estimativas obtidas utilizando os mesmos dados agregados diários. Alega igualmente que, se fossem utilizados dados ao nível dos códigos TARIC, essa maior granularidade teria como única consequência aumentar o número de produtos de 495 para 677, pelo que não está demonstrado o impacto nos PMC.

471

Em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça, o Reino Unido afirmou que não podia calcular o impacto na estimativa do montante das perdas de recursos próprios da utilização de códigos de produto com dez algarismos da NC com uma maior granularidade, mas admitiu que um cálculo ao nível do artigo em causa e não com base nos dados agregados diários de importações no seu território aumentaria o montante das perdas que a Comissão alega relativamente ao segundo período, compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive, de 1678125097 para 1725981951 de euros, o que confirma que, neste ponto, o método OLAF‑JRC lhe é mais favorável do que o seu próprio método.

472

Por outro lado, em resposta a outra questão do Tribunal de Justiça, o Reino Unido sublinhou que era agora evidente, à luz das explicações entretanto fornecidas pela Comissão, que a única razão pela qual existe uma diferença tão grande entre a estimativa das perdas pela Comissão e a sua própria estimativa se deve ao facto de os PMC que essa instituição utilizou para «reavaliar» as importações consideradas subavaliadas segundo o método OLAF‑JRC serem muito mais elevados do que os preços correspondentes aos limites de conformidade do método da HMRC que, em seu entender, devem ser utilizados para reavaliar essas importações.

473

Além disso, respondendo a outra questão colocada pelo Tribunal de Justiça, o Reino Unido indicou que, se os preços correspondentes aos limiares de conformidade do seu próprio método de avaliação das perdas fossem aplicados para calcular o volume das importações subavaliadas em vez do PMA, isso levaria a que o montante das perdas de recursos próprios que a Comissão reclama em relação ao segundo período, compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive, diminuiria 4,4 % ou 4,7 %.

474

Embora, como o advogado‑geral também salientou no n.o 301 das suas conclusões, essa diferença entre o método utilizado pela Comissão e o método utilizado pelo Reino Unido para estimar o volume das importações subavaliadas aparentemente permaneça, enquanto tal, dentro de limites razoáveis, não deixa de ser verdade que se afigura que o PMA conduz a sobreavaliar em certa medida o volume das importações que devem ser consideradas subavaliadas.

475

A este respeito, há que recordar que esse preço foi inicialmente desenvolvido enquanto perfil de risco, o que significa que pode gerar um determinado número de falsos casos positivos constituídos, em particular, por importações legítimas de grandes marcas, como sublinhou o Reino Unido.

476

Conforme salientado no n.o 296 do presente acórdão, este Estado alega que 11,2 %, em termos de volume, das importações legítimas efetuadas por algumas grandes marcas bem conhecidas foram declaradas a valores inferiores ao PMA.

477

Caso essa proporção de falsos casos positivos não seja, por si só, suscetível de afetar a fiabilidade do PMA utilizado enquanto perfil de risco, uma vez que deve ser considerada razoável nesse contexto, deve ser tida em conta na análise e no cálculo do montante das perdas de recursos próprios a fim de determinar com um grau razoável de precisão o volume das importações que devem ser consideradas subavaliadas e causadoras de tais perdas.

478

Por conseguinte, o montante das perdas de recursos próprios tradicionais deve ser calculado, no caso em apreço, com base no facto de o Reino Unido ter referido, em resposta a uma questão colocada pelo Tribunal de Justiça, o «volume comum» das importações supostamente subavaliadas, isto é, o volume das importações que são consideradas subavaliadas independentemente da aplicação do método OLAF‑JRC ou do método da HMRC.

ii) Quanto à crítica dirigida contra o método OLAF‑JRC relativa ao facto de este conduzir a uma sobreavaliação do valor das importações que devem ser consideradas subavaliadas

479

No que respeita, em segundo lugar, às diferentes críticas formuladas contra o método OLAF‑JRC pelo facto de, quando este é utilizado como instrumento para determinar o montante das perdas de recursos próprios tradicionais, se basear nos PMC enquanto valor de referência para calcular o valor das importações subavaliadas, há que apreciar, antes de mais, a argumentação segundo a qual esse valor de referência devia ter sido calculado apenas com base nos preços de importação para o Reino Unido e não com base na média aritmética dos preços de importação de todos os Estados‑Membros.

480

No caso em apreço, esta escolha metodológica da Comissão justifica‑se devido a uma das características essenciais da fraude por subavaliação em causa, designadamente o facto, em si mesmo não contestado pelo Reino Unido, de a grande maioria das importações em causa ter sido efetuada no âmbito do regime aduaneiro 42 e ser, por conseguinte, necessariamente destinada a outros Estados‑Membros. Além disso, as importações em causa que foram efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 40 também podiam ser encaminhadas para outros Estados‑Membros uma vez efetuado o desalfandegamento das mercadorias em causa no Reino Unido.

481

A este respeito, resulta, por exemplo, do relatório do OLAF que, no que respeita ao ano de 2016, 87 % das importações para o Reino Unido de produtos em causa de baixo valor foram efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 42.

482

Daqui resulta que, como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, no n.o 304 das suas conclusões, a grande maioria das importações em causa durante o período da infração era dirigida para o mercado dos produtos em causa da União no seu conjunto.

483

Por conseguinte, a Comissão não pode ser criticada por ter aplicado, para efeitos da estimativa do valor dessas importações no âmbito da quantificação das perdas de recursos próprios, um valor de referência que reflete o nível dos preços de importação dos produtos em causa da União no seu conjunto.

484

Com efeito, há que recordar que essa abordagem se afigura coerente com o modo de operar da fraude por subavaliação em causa.

485

Além disso, a utilização dos preços médios de importação de todos os Estados‑Membros, sob a forma de uma média aritmética desses preços, justifica‑se igualmente tendo em conta a necessidade de reduzir o efeito de distorção nos preços de referência gerado pelo volume particularmente significativo de importações subavaliadas a preços muito baixos no Reino Unido durante o período da infração.

486

A este respeito, há que recordar, por um lado, que 78,1 %, em termos de valor, e 69,8 %, em termos de volume, das importações em causa durante o período de infração a preços inferiores ao PMA, ou seja, 50 % do PMC, se situavam num intervalo entre 0 % e 10 % do PMC, e que as importações a preços muito baixos incluídas nesse intervalo aumentaram gradual e consideravelmente durante o período de infração para se tornarem, com uma quota de cerca de 80 %, largamente maioritárias entre as importações subavaliadas. Por outro lado, embora a fraude por subavaliação em causa afetasse originariamente vários Estados‑Membros, dizia respeito, durante o período da infração, em primeiro lugar e, de forma cada vez mais significativa, ao Reino Unido, como os agentes da Comissão de resto indicaram em diferentes reuniões com as autoridades aduaneiras desse Estado. Durante essas reuniões, a existência das correspondentes crescentes perdas de recursos próprios foi reiteradamente levada ao conhecimento destas autoridades para que estas tomassem as medidas adequadas para pôr termo às mesmas.

487

Embora o objetivo de reduzir o efeito de distorção nos preços de referência gerado pelo volume particularmente significativo de importações subavaliadas a preços muito baixos no Reino Unido durante o período da infração pudesse, num plano teórico, ser alcançado através da aplicação de diferentes métodos, o método escolhido pela Comissão afigura‑se suficientemente preciso e fiável, uma vez que, nomeadamente, este método se baseia em critérios que não são arbitrários nem distorcidos e assenta numa análise objetiva e coerente do conjunto dos dados pertinentes disponíveis, de modo a não conduzir a uma subavaliação manifesta do montante das perdas de recursos próprios.

488

Neste contexto, a Comissão, como admitiu em resposta a uma questão que lhe foi colocada pelo Tribunal de Justiça, poderia, por exemplo, ter igualmente eliminado, para efeitos do cálculo da média aritmética dos preços dos Estados‑Membros, todas as importações efetuadas a preços inferiores ao PMA em todos os Estados‑Membros. No entanto, tal método teria prejudicado o Reino Unido, uma vez que teria resultado num aumento considerável do montante das perdas de recursos próprios.

489

Em seguida, há que apreciar a crítica segundo a qual a utilização, no âmbito da aplicação do método OLAF‑JRC, dos PMC enquanto valor de referência leva a sobreavaliar o nível das perdas de recursos próprios e, por conseguinte, não é legítima, uma vez que não tem em conta o facto de os produtos em causa que foram objeto da fraude por subavaliação em causa terem um valor e uma qualidade inferiores aos que foram os importados de forma legítima da China a preços superiores ao PMA ou mesmo ao limiar de conformidade do método da HMRC.

490

Além disso, as mercadorias em causa são, pela sua natureza, destinadas ao segmento inferior do mercado, uma vez que são importadas por organizações criminosas para serem objeto de comércio ilícito e clandestino no território de outros Estados‑Membros.

491

Por conseguinte, tendo em conta esta característica essencial do modo de operar da fraude por subavaliação em causa, o valor de referência que deve ser utilizado para determinar o valor das importações consideradas subavaliadas deve ser fixado ao nível do PMA.

492

Neste contexto, a Comissão alega que o Reino Unido não possui qualquer prova pertinente da repartição dos preços e da qualidade das importações em causa, uma vez que, antes do lançamento da operação Swift Arrow, este Estado‑Membro tinha optado por não efetuar controlos físicos e por não recolher amostras.

493

O Reino Unido invoca o relatório de uma empresa de consultadoria que analisa uma amostra principal de 94 artigos de produtos subavaliados dos quais 70 artigos recolhidos no âmbito da operação Swift Arrow, lançada após o período de infração, e compara essa amostra com uma amostra de controlo de artigos com preços muito baixos de um retalhista legítimo e bem conhecido no seu território de produtos de valor muito baixo, do qual resulta que a grande maioria dos artigos desta amostra principal eram de fraca qualidade e de qualidade inferior à dos artigos da amostra de controlo. Daqui decorre que o valor correto das mercadorias subavaliadas não pode exceder o preço mais baixo a que esses retalhistas importam artigos equivalentes.

494

A este respeito, mesmo admitindo que, como alega o Reino Unido, todas as amostras recolhidas no âmbito da operação Swift Arrow e analisadas nesse relatório possam ser tidas em conta no âmbito do presente processo, ainda que muitas pareçam dizer respeito a importações efetuadas após o período da infração, este Estado não demonstra que as amostras em causa podem ser consideradas representativas do conjunto dos grandes volumes das mercadorias em causa subavaliadas importadas para o seu território ao longo desse período.

495

Por conseguinte, na falta de dados suficientemente representativos relativos à qualidade das mercadorias que foram objeto das importações em causa durante o período da infração, uma vez que o Reino Unido não efetuou controlos aduaneiros adequados, a Comissão podia presumir que as mercadorias em causa eram de qualidade média e abrangiam, assim, todos os segmentos de mercado em proporções semelhantes às das mercadorias que supostamente não foram subavaliadas de forma fraudulenta.

496

Segundo o Reino Unido, o modo de operar da fraude por subavaliação em causa, tal como é descrito, por exemplo, no relatório do OLAF e não é contestado entre as partes, indica que as mercadorias em causa são, na sua maioria, de fraca qualidade e destinadas ao segmento de mercado de gama baixa, uma vez que foram importadas e comercializadas por organizações criminosas e se destinavam principalmente a um comércio ilícito e clandestino no território de Estados‑Membros distintos, à época, do Reino Unido, em particular no âmbito do regime aduaneiro 42, sem pagamento do IVA. A este respeito, há que indicar que o valor de referência utilizado para avaliar as importações em causa para efeitos do cálculo do montante das perdas de recursos próprios tradicionais é um valor estimado que deve ser aproximado do valor aduaneiro que teria sido apurado pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido se estas tivessem aplicado as medidas de controlo aduaneiro adequadas com base num perfil de risco que permitisse apreciar a natureza e a qualidade das mercadorias em causa.

497

Com efeito, o Reino Unido deve ser colocado, no que respeita ao período de infração, numa situação equivalente àquela em que se encontraria se as suas autoridades aduaneiras tivessem determinado corretamente os valores aduaneiros após terem aplicado os controlos aduaneiros adequados e, assim, tivessem apurado corretamente os recursos próprios que os direitos aduaneiros constituem antes de os inscreverem na contabilidade dos recursos próprios da União (v., por analogia, Acórdão de 17 de março de 2011, Comissão/Portugal, C‑23/10, não publicado, EU:C:2011:160, n.o 63 e jurisprudência referida).

498

Ora, como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, no n.o 306 das suas conclusões, em conformidade com os métodos sequenciais previstos pelo direito aduaneiro da União, o valor aduaneiro é determinado pela natureza e pela qualidade das mercadorias em causa, como um segmento de mercado num Estado‑Membro diferente do mercado de importação, e não pelo seu destino. Assim, para efeitos da determinação do valor aduaneiro, o destino dessas mercadorias é, por si só, irrelevante. Além disso, no momento do desalfandegamento das referidas mercadorias, o seu destino específico reveste, na falta de prova direta, um caráter largamente especulativo.

499

Assim, no caso em apreço, para determinar o montante das perdas de recursos próprios tradicionais, a Comissão teve razão em não estabelecer qualquer distinção em função do destino específico dos produtos em causa na União.

500

Por conseguinte, no que respeita às importações em causa, essa instituição podia razoavelmente aplicar os PMC enquanto valor de referência.

501

Tal abordagem justifica‑se tendo em conta as especificidades do caso em apreço e é suficientemente precisa e fiável, uma vez que, nomeadamente, se baseia em critérios que não são arbitrários nem distorcidos e assenta numa análise objetiva e coerente de todos os dados pertinentes disponíveis, de modo a não conduzir a uma sobreavaliação manifesta do montante dessas perdas.

502

Isto é confirmado pelo facto de, como salientou igualmente o advogado‑geral, em substância, no n.o 307 das suas conclusões, os PMC serem calculados com base nos valores aduaneiros efetivamente declarados e registados pelos Estados‑Membros na base de dados Surveillance 2 no que respeita a todas as importações em causa durante o período de infração, de tal modo que esses preços refletem a natureza e a qualidade de todos os produtos em causa.

503

A precisão e a fiabilidade da abordagem da Comissão que consiste em utilizar os PMC para estimar o valor das importações em causa são igualmente corroboradas pelo facto, sublinhado por esta instituição nas suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça e não contestado pelo Reino Unido, de os referidos preços terem integralmente em conta os preços das quantidades significativas de importações subavaliadas para o Reino Unido, de maneira a depreciar o «preço justo» dessas importações e, assim, a subestimar o montante das perdas de recursos próprios.

504

Por outras palavras, uma vez que o PMC consiste numa média dos preços declarados de todos os produtos em causa importados em todos os Estados‑Membros, incluindo aqueles, particularmente numerosos, fraudulentamente subavaliados e importados para o Reino Unido, este preço médio é depreciado por essas subavaliações fraudulentas, o que confirma a precisão e a fiabilidade da abordagem da Comissão.

505

Em conclusão, o método OLAF‑JRC podia, em princípio, ser aplicado pela Comissão para calcular o montante das perdas de recursos próprios tradicionais no que respeita ao segundo período, compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive, uma vez que esse método se justificava tendo em conta as especificidades do caso concreto e era suficientemente preciso e fiável, na medida em que, nomeadamente, se baseia em critérios que não são nem arbitrários nem distorcidos e assenta numa análise objetiva e coerente de todos os dados pertinentes disponíveis, de modo a não conduzir a uma sobreavaliação manifesta do montante das referidas perdas.

506

Por conseguinte, no que respeita a esse período, o volume das importações em causa podia ser determinado com base no PMA, entendendo‑se, no entanto, que esse volume deve ser limitado ao designado volume «comum», ou seja, o volume das importações que são consideradas subavaliadas em aplicação quer do método OLAF‑JRC quer do método da HMRC. Para determinar o valor desse volume comum das importações consideradas subavaliadas, a Comissão podia basear‑se nos PMC.

7) Quanto ao impacto dos avisos C 18 Breach na estimativa dos montantes das perdas de recursos próprios que a Comissão reclama no que respeita ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive

507

Em seguida, coloca‑se a questão do impacto que as ordens de cobrança de direitos referidas nos avisos C 18 Breach podem ter na estimativa dos montantes das perdas de recursos próprios que a Comissão reclama nos termos do terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição no que respeita ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive, em aplicação do método OLAF‑JRC.

508

A este respeito, o Reino Unido alega, na contestação, que, uma vez que a Comissão tinha conhecimento, desde o mês de maio de 2018, de oito avisos C 18 Breach, emitidos e inscritos na contabilidade B durante esse mês e relativos às importações consideradas subavaliadas e que foram efetuadas a partir de 1 de maio de 2015, num montante de cerca de 25 milhões de GBP, e não contestou esses avisos nem no parecer fundamentado nem na petição inicial, esta instituição devia ter deduzido esse montante dos montantes de perdas de recursos próprios tradicionais referidos no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição no que respeita aos anos de 2015 a 2017.

509

Na tréplica, o Reino Unido alega que, segundo os dados atualizados, deviam ser deduzidos das perdas de recursos próprios tradicionais os montantes reclamados nos avisos C 18 Breach já notificados a 34 operadores no montante total de 44296285,04 GBP.

510

Em anexo às suas respostas às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça, o Reino Unido atualizou novamente este montante total, fazendo figurar em documentos juntos todos os avisos C 18 Breach já notificados, bem como o detalhe dos respetivos cálculos. Segundo a tabela recapitulativa que figura nesse anexo, trata‑se, segundo os últimos dados disponíveis, de 64 avisos para um montante total de direitos aduaneiros suplementares reclamados de 50559159,89 GBP (cerca de 59391845 de euros).

511

Resulta igualmente desses cálculos e das explicações fornecidas pelo Reino Unido em resposta às questões colocadas pelo Tribunal de Justiça que esses direitos foram calculados com base em preços mínimos considerados legítimos e fixados segundo a designada metodologia da «ponta», ou seja, uma metodologia de natureza essencialmente estatística, comparável à utilizada no âmbito do método da HMRC para determinar os limiares de conformidade para efeitos do cálculo do nível das perdas de recursos próprios tradicionais, sendo que a diferença essencial entre estes métodos reside no facto de o período de referência utilizado ser distinto.

512

Segundo o Reino Unido, a cobrança das dívidas reclamadas nos avisos C 18 Breach continua a ser possível e, contrariamente aos avisos C 18 Snake, estes não foram anulados.

513

Embora a Comissão não conteste que os avisos C 18 Breach podiam dizer respeito a importações subavaliadas efetuadas durante o período de infração, alega que, uma vez que o Reino Unido sempre se recusou a comunicar‑lhe o detalhe dos cálculos relativos a esses avisos, ou seja, nomeadamente, as declarações aduaneiras em questão, os volumes em causa e os valores de substituição utilizados, não estava em condições de distinguir as importações abrangidas por esses avisos do volume total das importações relativamente às quais tinha calculado o montante das perdas de recursos próprios tradicionais com base nos dados agregados diários da base de dados Surveillance 2.

514

A este respeito, importa recordar que o Tribunal de Justiça declarou reiteradamente que resulta dos termos do artigo 258.o, segundo parágrafo, TFUE que, se o Estado‑Membro em causa não proceder em conformidade com o parecer fundamentado no prazo nele fixado, a Comissão pode intentar no Tribunal de Justiça uma ação por incumprimento ao abrigo desse artigo e que, assim, a existência de um incumprimento deve ser apreciada em função da situação do Estado‑Membro tal como se apresentava no termo desse prazo [Acórdão de 2 de abril de 2020, Comissão/Polónia, Hungria e República Checa (Mecanismo temporário de recolocação dos requerentes de proteção internacional), C‑715/17, C‑718/17 e C‑719/17, EU:C:2020:257, n.o 54 e jurisprudência referida].

515

No caso em apreço, o prazo concedido ao Reino Unido para dar cumprimento ao parecer fundamentado expirou em 24 de novembro de 2018.

516

A Comissão não contesta que tinha conhecimento, antes da comunicação do parecer fundamentado no Reino Unido, da existência de oito avisos C 18 Breach, emitidos no mês de maio de 2018 e relativos às importações dos produtos em causa provenientes da China efetuadas durante o período da infração, uma vez que as dívidas reclamadas nesses avisos tinham sido comunicadas aos seus devedores e tinham sido inscritas na contabilidade B no mês de maio de 2018. É igualmente pacífico que essas dívidas continuavam inscritas nessa contabilidade no termo do prazo fixado no parecer fundamentado e no momento da apresentação da petição.

517

Ora, há que observar que, no âmbito da petição, em particular no âmbito do cálculo dos montantes das perdas de recursos próprios tradicionais reclamados nos termos do terceiro parágrafo do primeiro pedido desta no que respeita aos anos de 2015 a 2017, a Comissão não teve em conta as dívidas reclamadas nos avisos C 18 Breach de que tinha tido conhecimento antes do termo do prazo fixado no parecer fundamentado.

518

Além disso, até à data, o Reino Unido não tomou uma decisão que declarasse a impossibilidade de cobrar essas dívidas e também não deu início ao procedimento previsto no artigo 13.o, n.os 3 e 4, do Regulamento n.o 609/2014 para ser dispensado de colocar à disposição da Comissão os montantes correspondentes às referidas dívidas por um dos fundamentos referidos no artigo 13.o, n.o 2, deste regulamento. As mesmas dívidas não foram anuladas e permanecem inscritas na contabilidade B. Também não resulta dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça e também não foi alegado que se trata de créditos prescritos, na aceção do artigo 103.o do Código Aduaneiro da União.

519

Por conseguinte, no termo do prazo fixado no parecer fundamentado, ainda não se podia considerar que esses créditos constituíam perdas de recursos próprios da União.

520

Isto não é posto em causa pela argumentação da Comissão segundo a qual se afigura pouco provável que as dívidas reclamadas nos avisos C 18 Breach em questão ou mesmo uma parte delas possam efetivamente ser recuperadas, uma vez que os seus devedores são, na sua maioria, as designadas empresas «fénix», que são insolventes e que foram colocadas em liquidação na sequência da notificação desses avisos, como aliás confirmou o Reino Unido, que, desde logo, invocou esta circunstância enquanto razão que justificaria a sua dispensa de colocar à disposição da Comissão os recursos correspondentes nos termos do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014.

521

Por conseguinte, na petição, a Comissão estava obrigada a deduzir dos recursos próprios tradicionais pedidos nos termos do terceiro parágrafo do primeiro pedido, no que respeita ao período compreendido entre 1 de janeiro de 2015 e 11 de outubro de 2017 inclusive, as dívidas reclamadas nos avisos C 18 Breach relativos às importações subavaliadas de produtos em causa provenientes da China efetuadas durante esse período que tinham sido inscritas na contabilidade B antes do termo do prazo fixado no parecer fundamentado e que, assim, eram do conhecimento dessa instituição.

522

Uma vez que, na petição, a Comissão não efetuou essa dedução, o pedido de colocação à disposição dos montantes de recursos próprios tradicionais que figura no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição no que respeita aos anos de 2015 a 2017 não pode ser acolhido.

523

Por conseguinte, há que julgar improcedente o segundo fundamento na parte em que se refere ao pedido da Comissão destinado a que o Tribunal de Justiça declare que o Reino Unido, em violação do direito da União, não colocou à disposição desta instituição os montantes de recursos próprios tradicionais que figuram no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição.

524

Neste contexto, como salientou igualmente o advogado‑geral no n.o 312 das suas conclusões, no âmbito de um processo por incumprimento nos termos do artigo 258.o TFUE, não incumbe ao Tribunal de Justiça substituir‑se à Comissão, calculando ele próprio os montantes exatos de recursos próprios tradicionais devidos pelo Reino Unido.

525

Com efeito, embora, no âmbito de tal processo, o Tribunal de Justiça possa julgar procedentes ou improcedentes, no todo ou em parte, os pedidos formulados na petição, não lhe incumbe, no entanto, alterar o alcance desses pedidos.

526

Assim sendo, há que precisar que, no âmbito do novo cálculo do montante dos recursos próprios tradicionais devidos pelo Reino Unido que a Comissão será chamada a efetuar em conformidade com o presente acórdão, esta instituição, como decorre do n.o 505 do presente acórdão, poderá aplicar, relativamente à totalidade ou a parte do período de infração, o método OLAF‑JRC para estimar esse montante. No entanto, deverá, nomeadamente, conforme exposto nos n.os 475 a 478 do presente acórdão, tomar como base de cálculo o «volume comum» das importações que devem ser consideradas subavaliadas independentemente da aplicação do método OLAF‑JRC ou do método da HMRC. Além disso, à luz do exposto nos n.os 517 a 519 do presente acórdão, a Comissão deverá ter em conta, em primeiro lugar, as dívidas reclamadas pelo Reino Unido nos avisos C 18 Breach que eram conhecidas da Comissão antes do termo do prazo fixado no parecer fundamentado, designadamente, 24 de novembro de 2018, e que ainda não podiam ser consideradas constitutivas de perdas de recursos próprios da União nessa data. Em seguida, deverá igualmente ter em conta eventuais outras dívidas reclamadas por esse Estado em ordens de cobrança a posteriori relativas às importações em causa e efetuadas durante o período de infração que também não podem ser consideradas constitutivas de perdas de recursos próprios da União no momento do novo cálculo destas que a Comissão será chamada a efetuar em conformidade com o presente acórdão. Por último, deverão ser tidas em conta nesse novo cálculo as dívidas relativas às importações em causa efetuadas durante o período de infração a respeito das quais o Reino Unido tomou a decisão que declara a impossibilidade de as cobrar e relativamente às quais este Estado está dispensado de colocar à disposição da Comissão os montantes correspondentes, nos termos do artigo 13.o, n.o 2, do Regulamento n.o 609/2014.

527

Neste contexto, importa recordar que o dever de cooperação leal com a Comissão, conforme previsto no artigo 4.o, n.o 3, TUE, implica que qualquer Estado‑Membro é obrigado a facilitar a esta instituição o cumprimento da sua missão que consiste, nos termos do artigo 17.o TUE, em velar, na qualidade de guardiã dos Tratados, pela aplicação do direito da União sob a fiscalização do Tribunal de Justiça. Em particular, uma vez que, a fim de velar pela boa execução, pelos Estados‑Membros, das suas obrigações em matéria de recursos próprios da União, a Comissão está largamente dependente dos elementos fornecidos pelos Estados‑Membros, estes são obrigados a pôr à disposição da Comissão os documentos justificativos e outros documentos úteis, em condições razoáveis, a fim de que esta última possa verificar se, e sendo caso disso, em que medida, determinados montantes revertem para o orçamento da União enquanto recursos próprios (v., neste sentido, Acórdãos de 7 de março de 2002, Comissão/Itália, C‑10/00, EU:C:2002:146, n.os 88 e 91, e de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 65).

528

Importa ainda acrescentar que, tendo igualmente em conta as disposições do acordo de saída recordadas nos n.os 119 a 121 do presente acórdão, o resultado do novo cálculo referido no n.o 526 do presente acórdão pode dar lugar a uma ação por incumprimento no termo da qual o Tribunal de Justiça pode ser chamado a determinar se o Reino Unido não cumpriu as suas obrigações decorrentes do direito da União ao não ter colocado à disposição do orçamento desta um montante de recursos próprios e os juros de mora correspondentes à totalidade ou parte do montante resultante do referido cálculo e cujo pagamento é exigido pela Comissão.

8) Quanto à taxa de câmbio que deve ser aplicada para calcular o montante das perdas de recursos próprios

529

Por último, no que respeita à taxa de câmbio que deve ser aplicada para calcular o montante das perdas de recursos próprios, o Reino Unido alega que, uma vez que presta contas dos recursos próprios da União em GBP, o único montante que lhe pode ser exigido é um montante, expresso em GBP, que teria sido pago no momento em que as quantias eram devidas à Comissão. Apenas é relevante a taxa de câmbio GBP‑euro aplicável à data em que as transações que constituem o crédito dessa instituição ocorreram e não a taxa aplicável à data em que o Reino Unido é considerado responsável, pelo Tribunal de Justiça, pelas perdas de recursos próprios. Daqui decorre que, na petição, a Comissão não podia reclamar um montante de recursos próprios expresso em euros, devendo tê‑lo expressado em GBP.

530

A Comissão alega que, uma vez que o seu cálculo do montante das perdas de recursos próprios se baseia nos dados transmitidos pelos Estados‑Membros, em seguida registados na base de dados Surveillance 2, os montantes assim transmitidos são automaticamente convertidos em euros através da utilização da taxa de câmbio mais recente fixada pelo BCE antes do penúltimo dia do mês em causa, em conformidade com o artigo 53.o, n.o 1, do Código Aduaneiro da União e com o artigo 48.o, n.o 1, do Regulamento de Execução.

531

Por conseguinte, a Comissão concorda com o Reino Unido no que respeita à consideração de que a taxa de câmbio pertinente não é a aplicável à data do presente acórdão, mas a que prevalecia no momento em que as diferentes importações em causa foram efetuadas, as quais deram origem, durante o período da infração, às perdas de recursos próprios.

532

Deve daqui concluir‑se que a Comissão não pode ser criticada por ter aplicado, em conformidade com o artigo 53.o, n.o 1, do Código Aduaneiro da União e com o artigo 48.o, n.o 1, do Regulamento de Execução, a taxa de câmbio aplicável no momento em que as importações em causa tiveram lugar, de maneira a converter em euros os montantes de direitos expressos em GBP. Com efeito, ao agir desse modo, não sobrestimou os montantes reclamados na petição a título das perdas de recursos próprios tradicionais em relação aos montantes que teriam sido reclamados se tivessem sido expressos em GBP. Por conseguinte, nada impedia a Comissão de expressar na petição esses montantes em euros em vez de GBP. Além disso, quando proceder ao novo cálculo do montante dos recursos próprios tradicionais devidos pelo Reino Unido, a Comissão poderá aplicar esse método de conversão.

9) Conclusão

533

Tendo em conta as considerações anteriores, há que julgar procedente o segundo fundamento, na parte em que visa o pedido que figura no primeiro parágrafo do primeiro pedido da petição e, por conseguinte, declarar que, ao não ter colocado à disposição o montante correto dos recursos próprios tradicionais relativos às importações em causa, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força dos artigos 2.o e 8.o das Decisões 2007/436 e 2014/335, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000, bem como dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento n.o 609/2014. Em contrapartida, há que julgar improcedente este fundamento na parte em que se refere ao pedido que figura no terceiro parágrafo do primeiro pedido da petição, destinado a que o Tribunal de Justiça declare que os montantes das perdas de recursos próprios tradicionais correspondentes que devem ser colocados à disposição da Comissão, deduzidos os custos de cobrança, são os seguintes:

496025324,30 de euros em 2017 (até 11 de outubro de 2017 inclusive);

646809443,80 de euros em 2016;

535290329,16 de euros em 2015;

480098912,45 de euros em 2014;

325230822,55 de euros em 2013;

173404943,81 de euros em 2012;

22777312,79 de euros em 2011.

3.   Quanto ao incumprimento das obrigações decorrentes da regulamentação relativa ao IVA e às obrigações de colocar à disposição os recursos próprios correspondentes

a)   Argumentação das partes

534

Com o terceiro fundamento, que visa algumas das acusações que figuram nos primeiro e segundo parágrafos do primeiro pedido da petição, a Comissão acusa o Reino Unido de não ter colocado à sua disposição o montante correto dos recursos próprios provenientes do IVA relativo às importações em causa efetuadas durante o período de infração, em violação dos artigos 2.o e 8.o das Decisões 2007/436 e 2014/335, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento n.o 609/2014, assim como do artigo 2.o do Regulamento n.o 1553/89, como consequência do incumprimento das obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 325.o TFUE, do artigo 2.o, n.o 1, alíneas b) e d), dos artigos 83.o e 85.o a 87.o, assim como do artigo 143.o, n.o 1, alínea d), e n.o 2, da Diretiva 2006/112.

535

No que respeita, em primeiro lugar, aos produtos em causa que foram importados para o Reino Unido durante o período de infração no âmbito do regime aduaneiro 40, a Comissão recorda que, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, alínea d), e com os artigos 85.o a 87.o da Diretiva 2006/112, no âmbito deste regime, o IVA é cobrado pelo Estado‑Membro de importação e que o valor tributável deste imposto inclui o valor aduaneiro, bem como os direitos aduaneiros e as despesas acessórias.

536

A Comissão alega que, uma vez que as autoridades aduaneiras do Reino Unido não asseguraram, em violação do artigo 325.o TFUE e da regulamentação aduaneira da União, que o valor aduaneiro das importações em causa efetuadas durante o período de infração tinha sido corretamente determinado, tendo em conta, essencialmente, a não implementação de medidas de controlo aduaneiro efetivas antes do desalfandegamento desses produtos, o valor tributável do IVA também não foi corretamente determinado por essas autoridades.

537

Por conseguinte, não foi cobrada a totalidade do IVA devido, o que fez com que, em violação dos artigos 2.o e 8.o das Decisões 2007/436 e 2014/335, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento n.o 609/2014, bem como do artigo 2.o do Regulamento n.o 1553/89, os montantes correspondentes também não tenham sido tomados em consideração na determinação da base dos recursos próprios provenientes do IVA e que estes recursos não tenham sido integralmente colocados à disposição da Comissão.

538

No que respeita, em segundo lugar, ao regime aduaneiro 42, a Comissão recorda que, segundo o relatório do OLAF, em 2016, 87 % das mercadorias em causa foram importadas para o Reino Unido no âmbito desse regime aduaneiro e que este se caracteriza pelo facto de os direitos aduaneiros serem devidos no Estado‑Membro de importação apesar de o IVA dever ser pago no Estado‑Membro de destino.

539

A Comissão alega que, uma vez que, no que respeita a essas importações, o valor tributável do IVA é constituído, em conformidade com o artigo 83.o da Diretiva 2006/112, pelo preço de compra dos bens ou de bens similares ou, na falta de preço de compra, pelo preço de custo determinado no momento da entrega, a determinação incorreta do valor aduaneiro das mercadorias em causa devido aos controlos aduaneiros inadequados efetuados pelas autoridades do Reino Unido levou a que o cálculo do IVA a cobrar sobre essas mercadorias pelo Estado‑Membro de destino também estivesse errado, pelo que não foi cobrada a totalidade do IVA, privando assim a União de uma parte dos recursos próprios provenientes deste imposto.

540

Segundo a Comissão, ao não adotar as medidas adequadas para assegurar a cobrança do IVA devido no âmbito do regime aduaneiro 42, o Reino Unido comprometeu a capacidade de as autoridades dos outros Estados‑Membros cobrarem esse imposto e impediu‑os de colocarem à disposição da Comissão os recursos próprios correspondentes provenientes do referido imposto.

541

O Reino Unido alega que, uma vez que os recursos próprios provenientes do IVA são calculados, em conformidade com o Regulamento n.o 1553/89, com base nas receitas líquidas desse imposto, o montante do IVA na importação ou na aquisição não dá lugar a uma alteração das receitas líquidas do referido imposto, uma vez que este é recuperável pelo contribuinte importador ou adquirente no momento da revenda dos produtos em causa.

542

No que respeita às importações em causa efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 42 durante o período da infração, não podem aí existir perdas de IVA uma vez que, no Estado‑Membro de destino final dos bens, o retalhista declara à Administração Fiscal desse Estado‑Membro a totalidade da contrapartida efetivamente paga pelo consumidor final.

543

Como confirma o relatório do OLAF, a fraude por subavaliação em causa não se deve ao facto de o montante do IVA pago e deduzido no Estado‑Membro em que as mercadorias em causa são introduzidas ao abrigo do regime aduaneiro 42 ser errado, mas ao facto de este imposto não ser pago no Estado‑Membro de destino dessas mercadorias por estas terem desaparecido e serem objeto de um comércio ilícito e clandestino.

544

Além disso, no que respeita às importações em causa efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 42 durante o período da infração, o Reino Unido alega que não existe qualquer base jurídica que permita responsabilizar um Estado‑Membro pelas perdas de recursos próprios provenientes do IVA sofridas noutro Estado‑Membro.

545

Além disso, o Reino Unido afirma que a alegação da sua suposta responsabilidade pelas perdas de recursos próprios provenientes do IVA não assenta em qualquer base factual. Assim, a alegação da Comissão segundo a qual o Reino Unido impediu outros Estados‑Membros de cobrarem esse imposto carece de base factual. Com efeito, além das medidas gerais adotadas pelo Reino Unido para lutar contra a fraude por subavaliação em causa, este Estado também tomou medidas específicas de luta contra o recurso abusivo ao regime aduaneiro 42, quer sozinho quer em colaboração com outros Estados‑Membros. A este respeito, o Reino Unido alega ter tomado, no âmbito das operações Badminton, Octopus, Samurai e Breach, medidas destinadas a prevenir a perda, noutros Estados‑Membros, de recursos próprios provenientes do IVA.

b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

546

Há que apreciar, em primeiro lugar, a alegação da Comissão segundo a qual, devido aos controlos aduaneiros ineficazes no Reino Unido, em violação do artigo 325.o TFUE e da regulamentação aduaneira da União, as autoridades desse Estado não determinaram corretamente a base de tributação para efeitos de IVA das importações em causa durante o período de infração, pelo que este imposto não foi integralmente cobrado nesse Estado.

547

A este respeito, no que se refere, em primeiro lugar, às importações em causa efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 40, que implicam que deviam ser cobrados no Reino Unido tanto os direitos aduaneiros como o IVA, há que salientar que, por força do artigo 2.o, n.o 1, alínea d), e dos artigos 85.o a 87.o da Diretiva 2006/112, quando o IVA é devido na importação, o valor tributável para efeitos desse imposto é definido como o valor aduaneiro ao qual devem ser acrescentados os direitos aduaneiros e os outros impostos, bem como as despesas acessórias.

548

Daqui resulta que um valor aduaneiro declarado a um nível inferior ao seu valor real implica necessariamente, se não for contestado pelas autoridades aduaneiras e determinado no seu nível correto, que o valor tributável para efeitos de IVA também não é corretamente determinado, pelo que a totalidade desse imposto não pode ser cobrada, em violação das disposições referidas no número anterior.

549

Assim, o caráter inadequado dos controlos aduaneiros efetuados pelas autoridades aduaneiras do Reino Unido conduziu a uma determinação incorreta tanto do valor aduaneiro das mercadorias em causa como do valor tributável das importações em causa para efeitos de IVA, pelo qual esse Estado deve ser considerado responsável.

550

Por conseguinte, no que respeita às importações em causa efetuadas durante o período de infração no âmbito do regime aduaneiro 40, deve ser declarado o incumprimento do artigo 2.o, n.o 1, alínea d), e dos artigos 85.o a 87.o da Diretiva 2006/112, alegado pela Comissão.

551

No que respeita, em segundo lugar, às importações em causa efetuadas durante o período de infração no âmbito do regime aduaneiro 42, que implicavam que, segundo o mecanismo de isenção previsto no artigo 138.o, n.os 1, e 2, alínea c), e no artigo 143.o, n.os 1, alínea d), e 2, da Diretiva 2006/112, apenas os direitos aduaneiros eram pagos no Reino Unido e que o IVA devia ser pago no Estado‑Membro de destino das mercadorias em causa, há que recordar que a grande maioria dos produtos em causa foram importados no âmbito desse regime, designadamente 87 % do volume total em 2016 segundo o relatório do OLAF, e que uma das características essenciais da fraude por subavaliação em causa consistia no facto de esses produtos serem, em regra, destinados a um comércio ilícito e clandestino, pelo que não era faturado qualquer IVA no Estado‑Membro de destino ao consumidor final e que, assim, este imposto continuava, em geral, por pagar.

552

No âmbito do regime aduaneiro 42, o valor tributável para efeitos de IVA não se baseia no valor aduaneiro das mercadorias em causa, como sucede no âmbito do regime aduaneiro 40, mas, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, alínea b), o artigo 83.o, o artigo 138.o, n.os 1 e 2, alínea c), e o artigo 143.o, n.os 1, alínea d), e 2, da Diretiva 2006/112, no preço de compra dessas mercadorias, conforme faturado no Estado‑Membro de destino final destas mercadorias.

553

No caso em apreço, incumbia, por conseguinte, às autoridades dos Estados‑Membros de destino das mercadorias em causa, e não às autoridades do Reino Unido, enquanto Estado‑Membro de importação, assegurar que o valor tributável para efeitos de IVA era corretamente determinado de modo a que a totalidade do IVA devido sobre as aquisições intracomunitárias em causa fosse paga.

554

Uma vez que, no âmbito do regime aduaneiro 42, não existe ligação entre o valor aduaneiro das mercadorias em causa e o valor tributável das importações em causa para efeitos de IVA, a eventual responsabilidade do Reino Unido, Estado‑Membro de importação, pela inexistência de cobrança efetiva e integral dos direitos aduaneiros resultantes do caráter inadequado das fiscalizações efetuadas pelas suas autoridades aduaneiras no que respeita à exatidão do valor aduaneiro declarado dessas mercadorias não pode, em princípio, ser alargada a título da inexistência de cobrança efetiva e integral do IVA no território de outro Estado‑Membro, nomeadamente no território de destino.

555

Além disso, a Comissão não alegou especificamente nem demonstrou, pois, que as autoridades aduaneiras do Reino Unido não tinham controlado adequadamente o cumprimento das obrigações de informação a que está sujeita a aplicação da isenção prevista no artigo 138.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112, por força do artigo 138.o, n.o 2, desta última.

556

No âmbito do regime aduaneiro 42, uma eventual insuficiência dos controlos destinados a assegurar a determinação correta do valor tributável das importações em causa para efeitos de IVA, caso fosse demonstrada, deveria, por conseguinte, ser imputada, em primeiro lugar, às autoridades aduaneiras do Estado‑Membro de destino final das referidas mercadorias.

557

Deve igualmente ser rejeitada a argumentação da Comissão segundo a qual, ao não adotar as medidas adequadas para assegurar a cobrança do IVA devido no âmbito do regime aduaneiro 42 segundo o mecanismo de isenção previsto no artigo 143.o, n.o 1, da Diretiva 2006/112, o Reino Unido impediu as autoridades dos outros Estados‑Membros de determinarem corretamente o valor tributável das importações em causa para efeitos do IVA e, assim, de cobrarem o pagamento da totalidade desse imposto.

558

Com efeito, mesmo admitindo que, como alega a Comissão, as diferentes medidas adotadas pelo Reino Unido no decurso das operações Badminton, Octopus, Samurai e Breach para prevenir as perdas, noutros Estados‑Membros, de recursos próprios provenientes do IVA, acabaram por apenas ter efeitos limitados na prevenção dessas perdas, daí não decorre, e em todo o caso a Comissão também não o demonstra, que este Estado impediu as autoridades dos Estados‑Membros de destino de calcularem corretamente o IVA devido e de cobrarem a totalidade desse imposto.

559

Embora, como resulta nomeadamente do relatório do OLAF, as organizações criminosas em causa se tenham dedicado a uma utilização fraudulenta do regime aduaneiro 42 para evitar, em grande escala, nos Estados‑Membros de destino das mercadorias em causa, o pagamento do IVA e isso tenha certamente dado origem a perdas financeiras consequentes tanto para os Estados‑Membros como para a própria União, o Reino Unido não pode ser considerado o único responsável pela insuficiência dos controlos que tornaram possível essa fraude e as perdas de IVA daí resultantes.

560

Como o advogado‑geral também salientou no n.o 351 das suas conclusões, tal fraude e as perdas financeiras daí decorrentes devem ser apreciadas no âmbito da bem conhecida problemática das insuficiências dos controlos desse regime aduaneiro, conforme foram aplicadas pelos Estados‑Membros, insuficiências essas que os autores da fraude exploraram plenamente e que o Tribunal de Contas denunciou várias vezes, nomeadamente no seu Relatório Especial n.o 24/2015.

561

Por conseguinte, no que respeita às importações em causa efetuadas durante o período de infração no âmbito do regime aduaneiro 42, a alegação da Comissão, segundo a qual o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 2.o, n.o 1, alínea b), do artigo 83.o, do artigo 138.o, n.os 1 e 2, alínea c), assim como do artigo 143.o, n.os 1, alínea d), e 2, da Diretiva 2006/112, deve ser rejeitada.

562

Em segundo lugar, há que apreciar a alegação da Comissão segundo a qual, uma vez que, devido às insuficiências dos controlos aduaneiros efetuados no Reino Unido sobre as importações em causa durante o período de infração, as autoridades aduaneiras desse Estado não determinaram corretamente, no que respeita às mercadorias em causa, o valor tributável dessas importações para efeitos de IVA e, assim, não cobraram a totalidade do imposto devido, o referido Estado não colocou à disposição desta instituição o montante correto dos recursos próprios provenientes do IVA, em violação dos artigos 2.o e 8.o das Decisões 2007/436 e 2014/335, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento n.o 609/2014, assim como do artigo 2.o do Regulamento n.o 1553/89.

563

Na medida em esta acusação se baseia na premissa de que o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam, por força do direito da União em matéria de IVA, de determinar corretamente o valor tributável das referidas importações para efeitos desse imposto e de cobrar a totalidade do IVA devido, deve ser apreciada apenas no que respeita às importações em causa efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 40, uma vez que decorre do exposto que essa premissa apenas se verifica para essas importações e não para as importações efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 42.

564

A este respeito, há que recordar, antes de mais, certas características do sistema de recursos próprios da União no que se refere especificamente aos recursos provenientes do IVA.

565

Em conformidade com o artigo 2.o, n.o 1, das Decisões 2007/436 e 2014/335, aplicáveis no caso em apreço, os recursos próprios da União incluem, além dos recursos próprios tradicionais, as receitas provenientes da aplicação de uma taxa uniforme à matéria coletável harmonizada do IVA, determinada segundo as regras da União.

566

Além disso, resulta do artigo 2.o, n.o 1, do Regulamento n.o 1553/89 que a base dos recursos próprios provenientes do IVA é determinada a partir das operações tributáveis referidas no artigo 2.o da Diretiva 2006/112.

567

Sem prejuízo de diversos ajustamentos previstos nas disposições desse regulamento, o seu artigo 3.o prevê que a base dos recursos provenientes do IVA é calculada dividindo o total das receitas líquidas de IVA cobradas pelo Estado‑Membro durante o ano pela taxa a que esse imposto foi cobrado durante esse mesmo ano, sendo que, se num Estado‑Membro forem aplicadas várias taxas de IVA, é fixada uma taxa média ponderada do IVA para efeitos dessa divisão (Acórdão de 15 de novembro de 2011, Comissão/Alemanha, C‑539/09, EU:C:2011:733, n.o 67).

568

O sistema de recursos próprios da União destina‑se, no que respeita aos recursos provenientes do IVA, a criar, a cargo dos Estados‑Membros, uma obrigação de pôr à disposição da Comissão, enquanto recursos próprios, uma parte dos montantes que cobram a título desse imposto (v., neste sentido, Acórdão de 15 de novembro de 2011, Comissão/Alemanha, C‑539/09, EU:C:2011:733, n.o 71).

569

Existe assim uma relação direta entre, por um lado, a cobrança das receitas do IVA no respeito do direito da União aplicável e, por outro, a colocação à disposição da Comissão dos recursos provenientes do IVA correspondentes, uma vez que qualquer lacuna na cobrança dessas receitas está potencialmente na origem de uma redução desses recursos (Acórdão de 15 de novembro de 2011, Comissão/Alemanha, C‑539/09, EU:C:2011:733, n.o 72).

570

O Tribunal de Justiça declarou igualmente que incumbe aos Estados‑Membros garantir uma cobrança efetiva e integral dos recursos próprios da União, entre os quais os provenientes do IVA, e que, a este título, estes Estados‑Membros devem proceder à cobrança das quantias correspondentes aos recursos próprios que, em razão de fraudes, foram subtraídas ao orçamento da União (v., neste sentido, Acórdão de 5 de dezembro de 2017, M.A.S. e M.B., C‑42/17, EU:C:2017:936, n.o 32).

571

No caso em apreço, no que respeita às importações em causa efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 40 durante o período de infração, é declarado no n.o 550 do presente acórdão que, uma vez que as autoridades aduaneiras do Reino Unido não efetuaram os controlos necessários para determinar o valor aduaneiro correto dos produtos em causa e, assim, não asseguraram uma cobrança efetiva e integral dos direitos aduaneiros devidos, a totalidade do IVA relativo a essas importações também não foi efetivamente cobrada, uma vez que o valor tributável das referidas importações para efeitos de IVA foi determinado com base em valores aduaneiros incorretos, pois eram inferiores ao valor real dos produtos em causa.

572

No entanto, como o advogado‑geral também salientou no n.o 344 das suas conclusões, importa observar que a Comissão não faz prova juridicamente bastante de que essa omissão das autoridades aduaneiras do Reino Unido de assegurarem a cobrança efetiva e integral do IVA nas mesmas importações gerou efetivamente perdas de recursos próprios provenientes desse imposto.

573

Com efeito, conforme salientado no n.o 567 do presente acórdão, o artigo 3.o do Regulamento n.o 1553/89 prevê que a base dos recursos provenientes do IVA é calculada, em substância, dividindo o total das receitas líquidas deste imposto cobradas pelo Estado‑Membro durante o ano pela taxa a que o referido imposto foi cobrado durante esse mesmo ano.

574

Ora, mesmo que, no que respeita às importações em causa efetuadas no âmbito do regime aduaneiro 40, os importadores não tenham pagado a totalidade do IVA, uma vez que o valor tributável dessas importações para efeitos de IVA era demasiado baixo, isso não significa necessariamente que as receitas líquidas do IVA foram afetadas.

575

Com efeito, tanto o importador como os outros operadores que intervêm a jusante na venda dos produtos em causa, antes de estes serem faturados ao consumidor final, podem recuperar o IVA que pagaram. A questão de saber se as receitas líquidas do IVA são afetadas pela subavaliação que teve lugar quando as referidas importações foram efetuadas depende, assim, do preço faturado ao consumidor final.

576

Por conseguinte, a mera constatação da subavaliação do valor aduaneiro dos produtos em causa não implica necessariamente uma redução da matéria coletável a partir da qual são calculados os recursos próprios provenientes do IVA.

577

Tendo em conta as considerações anteriores, há que julgar procedente o terceiro fundamento, na parte em que é relativo a um incumprimento do artigo 2.o, n.o 1, alínea d), bem como dos artigos 85.o a 87.o da Diretiva 2006/112, e julgá‑lo improcedente quanto ao restante.

4.   Quanto ao incumprimento do dever de cooperação leal consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE

a)   Argumentação das partes

578

Com a acusação formulada no segundo pedido da petição, a Comissão alega que, ao não lhe comunicar todas as informações necessárias para determinar o montante das perdas de recursos próprios tradicionais e ao não fornecer, conforme solicitado, o conteúdo do parecer do serviço jurídico da HMRC ou os fundamentos das decisões que anularam as dívidas aduaneiras apuradas, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE e do artigo 2.o, n.os 2 e 3, alínea d), do Regulamento n.o 608/2014.

579

A este respeito, em primeiro lugar, a Comissão acusa o Reino Unido de ter recusado fornecer uma cópia do parecer do serviço jurídico da HMRC ou qualquer outra indicação relativa ao conteúdo da avaliação jurídica que conduziu à anulação das dívidas aduaneiras apuradas durante a ODC Snake, pelo facto de essa avaliação jurídica ser confidencial e estar abrangida pela proteção das comunicações entre um advogado e o seu cliente.

580

Em segundo lugar, a Comissão alega que as autoridades aduaneiras do Reino Unido não forneceram as informações exigidas pelos seus serviços para determinar o montante das perdas de recursos próprios tradicionais devidos.

581

O Reino Unido responde que, conforme já indicou durante o procedimento pré‑contencioso, a anulação das dívidas apuradas nos avisos C 18 Snake não ocorreu na sequência de qualquer parecer jurídico, que não existiria, mas com fundamento em decisões tomadas pelo serviço independente da HMRC competente em matéria de apreciações e de recursos em matéria aduaneira. Este serviço anulou esses avisos pelos fundamentos indicados nessas decisões, os quais foram comunicados à Comissão.

582

Por outro lado, além desta alegação relativa à falta de comunicação à Comissão desse parecer jurídico inexistente, esta instituição não podia invocar, de modo geral, qualquer outra crítica em relação ao Reino Unido no que respeita ao seu dever de cooperação leal, pelo facto de não ter comunicado à referida instituição todas as informações necessárias para determinar o montante das perdas de recursos próprios tradicionais.

b)   Apreciação do Tribunal de Justiça

583

A título preliminar, há que observar que, embora, no segundo pedido da petição, a Comissão invoque, além de uma violação do artigo 4.o, n.o 3, TUE, uma violação do artigo 2.o, n.os 2 e 3, alínea d), do Regulamento n.o 608/2014, esta instituição não expôs na sua fundamentação em que medida o Reino Unido não cumpriu esta última disposição, pelo que a acusação que figura neste pedido apenas deve ser apreciada à luz do artigo 4.o, n.o 3, TUE.

584

Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, resulta do princípio da cooperação leal, consagrado no artigo 4.o, n.o 3, TUE, que os Estados‑Membros são obrigados a adotar todas as medidas adequadas para garantir o alcance e a eficácia do direito da União (Acórdão de 31 de outubro de 2019, Comissão/Reino Unido, C‑391/17, EU:C:2019:919, n.o 93 e jurisprudência referida).

585

Além disso, o Tribunal de Justiça declarou que, em conformidade com o papel de guardiã dos Tratados atribuído à Comissão por força do artigo 17.o, n.o 1, TUE, incumbe a esta instituição velar pela boa execução, pelos Estados‑Membros, das respetivas obrigações em matéria de recursos próprios da União (Acórdão de 9 de julho de 2020, República Checa/Comissão, C‑575/18 P, EU:C:2020:530, n.o 65) e que, por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE, os Estados‑Membros são obrigados a facilitar à Comissão o cumprimento desta missão de fiscalização (v., neste sentido, Acórdão de 7 de março de 2002, Comissão/Itália, C‑10/00, EU:C:2002:146, n.o 88).

586

Por outro lado, quando, como sucede no que respeita à fiscalização pela Comissão da boa execução, pelos Estados‑Membros, das suas obrigações em matéria de recursos próprios da União, essa instituição está largamente dependente dos elementos fornecidos pelos Estados‑Membros, estes devem pôr à disposição da referida disposição os documentos justificativos e outros documentos úteis, em condições razoáveis, a fim que esta última possa verificar se os recursos próprios da União foram corretamente postos à disposição no respeito dessas obrigações (v., neste sentido, Acórdão de 7 de março de 2002, Comissão/Itália, C‑10/00, EU:C:2002:146, n.os 88 e 91).

587

No caso em apreço, a Comissão acusa o Reino Unido de não ter cumprido o dever de cooperação leal conforme previsto no artigo 4.o, n.o 3, TUE, uma vez que não lhe forneceu em tempo útil, por um lado, todos os elementos de cálculo relativos às dívidas reclamadas nos avisos C 18 Snake que várias vezes lhe pediu para comunicar e que eram necessários para calcular o montante das perdas de recursos próprios tradicionais e, por outro, o parecer do serviço jurídico da HMRC ou os fundamentos das decisões que anularam os avisos C 18 Snake.

588

A este respeito, é pacífico que, ao longo do procedimento pré‑contencioso, o Reino Unido recusou fornecer um documento, qualificado várias vezes pelas suas próprias autoridades de «parecer jurídico», com o fundamento de que esse documento estava protegido pelo segredo profissional.

589

A Comissão explica que pediu a apresentação deste documento assim que percebeu que o mesmo continha uma análise jurídica das razões que levaram o Reino Unido a anular os avisos C 18 Snake.

590

No entanto, posteriormente e, em particular, durante a missão de inspeção 18‑11‑1 realizada no mês de abril de 2018, e na sua resposta de 22 de junho de 2018 à notificação para cumprir, o Reino Unido afirmou que esse «parecer jurídico» não existia e que as razões que o levaram a anular os avisos C 18 Snake eram as mencionadas nas decisões que anularam estes últimos, que foram tomadas por uma instância independente, designadamente, o serviço de apreciações e de recursos em matéria aduaneira da HMRC, no âmbito dos processos relativos aos recursos desses avisos. Segundo o Reino Unido, resulta destas decisões que os referidos avisos foram anulados essencialmente pelo facto de nenhum método de reavaliação satisfatória poder ser demonstrado no que respeita às importações em causa.

591

A Comissão alega que as cópias de 6 das 24 decisões de anulação dos avisos C 18 Snake, obtidas no decurso da inspeção 18‑11‑1, não lhe permitiram compreender as razões da anulação desses avisos.

592

Na contestação, o Reino Unido acrescentou que existia um parecer do serviço jurídico da HMRC, mas que este não dizia respeito às razões que o levaram a anular os avisos C 18 Snake, mas apenas aos processos de liquidação instaurados contra determinados operadores. No entanto, este parecer encontra‑se protegido pelo segredo profissional.

593

Importa igualmente salientar que, no procedimento pré‑contencioso, as autoridades aduaneiras do Reino Unido indicaram que a validade dos avisos C 18 Snake podia ser posta em causa, uma vez que, nesses avisos, o PMC tinha sido utilizado para determinar o valor aduaneiro dos produtos em questão e que os referidos avisos, tal como tinham sido notificados às empresas em causa, não permitiam estabelecer um nexo direto entre os direitos reclamados e as declarações aduaneiras individuais em causa.

594

Resulta igualmente dos autos submetidos ao Tribunal de Justiça que a Comissão pediu várias vezes ao Reino Unido para lhe comunicar o detalhe dos cálculos relativos às dívidas reclamadas nos avisos C 18 Snake, uma vez que esses dados eram necessários para verificar se essas dívidas refletiam devidamente os montantes das perdas de recursos próprios relativas às importações objeto desses avisos.

595

A Comissão explica que, não dispondo desses dados, presumiu, sem ter sido corrigida quanto a este ponto pelo Reino Unido durante o procedimento pré‑contencioso, que os direitos reclamados nos avisos C 18 Snake tinham sido calculados com base no PMA e, assim, tinham sido determinados a um nível manifestamente demasiado baixo. Isso levou‑a a reclamar na petição, no que respeita ao período compreendido entre novembro de 2011 e novembro de 2014, os montantes correspondentes às perdas de recursos próprios tradicionais calculados não a partir desses avisos, mas segundo o método OLAF‑JRC, tendo assim em conta todas as importações efetuadas a preços inferiores ao PMA e imputando‑lhes um valor igual ao PMC.

596

Explica que o detalhe dos cálculos das dívidas reclamadas nos avisos C 18 Snake foi finalmente fornecido pelo Reino Unido em anexo à tréplica, o que permitiu concluir que as importações em causa tinham sido reavaliadas com base não no PMA mas no PMC, e estabelecer um nexo direto entre os direitos reclamados e as declarações aduaneiras individuais em causa.

597

Interrogado a este respeito pelo Tribunal de Justiça, o Reino Unido explicou que as suas autoridades não tinham recusado comunicar o detalhe desses cálculos à Comissão na sequência da visita de inspeção do mês de novembro de 2017, mas não tinham tido a possibilidade de lhes aceder nessa ocasião. Estes cálculos foram «redescobertos» pouco antes da apresentação da contestação, em junho de 2019. Em seguida, analisar e tratar as grandes quantidades de informações obtidas no decurso do exercício de recolha exigiu muito tempo e recursos, pelo que o Reino Unido não os pôde fornecer antes da apresentação da tréplica.

598

À luz de todos estes elementos factuais e tendo em conta os princípios consagrados pela jurisprudência recordada nos n.os 584 a 586 do presente acórdão, há que concluir que o Reino Unido não cumpriu o dever de cooperação leal conforme estabelecido no artigo 4.o, n.o 3, TUE, uma vez que este Estado não forneceu em tempo útil, por um lado, todos os elementos de cálculo relativos às dívidas reclamadas nos avisos C 18 Snake que a Comissão várias vezes lhe pediu para comunicar e que eram necessários para calcular as perdas de recursos próprios tradicionais e, por outro, os fundamentos das decisões que anularam os avisos C 18 Snake que a Comissão também várias vezes lhe pediu para comunicar.

599

Em contrapartida, não é necessário decidir sobre a questão de saber se o Reino Unido violou o dever de cooperação leal ao recusar fornecer o parecer jurídico da HMRC. Com efeito, basta constatar que, com a utilização da conjunção coordenativa «ou» na segunda parte do segundo pedido da petição, o Reino Unido não cumpriu, em todo o caso, este dever ao não apresentar em tempo útil os fundamentos das decisões que anularam os avisos C 18 Snake.

600

Por conseguinte, sem prejuízo do que é declarado no n.o 599 do presente acórdão, há que julgar procedente a acusação formulada no segundo pedido da petição, na parte em que é relativa a uma violação do artigo 4.o, n.o 3, TUE.

601

Tendo em conta todas as considerações anteriores, há que concluir o seguinte:

ao não ter tido em conta os montantes corretos dos direitos aduaneiros e ao não ter colocado à disposição o montante correto dos recursos próprios tradicionais relativos às importações em causa, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força dos artigos 2.o e 8.o da Decisão 2014/335, dos artigos 2.o e 8.o da Decisão 2007/436, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento n.o 609/2014, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento n.o 1150/2000, assim como do artigo 105.o, n.o 3, do Código Aduaneiro da União e do artigo 220.o, n.o 1, do Código Aduaneiro Comunitário, como consequência do incumprimento das obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 325.o TFUE, do artigo 46.o do Código Aduaneiro da União, do artigo 13.o do Código Aduaneiro Comunitário, do artigo 248.o, n.o 1, do regulamento de aplicação, do artigo 244.o do Regulamento de Execução, assim como do artigo 2.o, n.o 1, alínea d), e dos artigos 85.o a 87.o da Diretiva 2006/112;

e ao não ter comunicado à Comissão todas as informações necessárias para determinar o montante das perdas de recursos próprios tradicionais e ao não ter fornecido, conforme solicitado, os fundamentos das decisões que anularam as dívidas aduaneiras apuradas, o Reino Unido não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE.

602

A ação é julgada improcedente quanto ao restante.

Quanto às despesas

603

Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Nos termos do artigo 138.o, n.o 3, deste Regulamento de Processo, se as partes obtiverem vencimento parcial, cada uma suportará as suas próprias despesas, a menos que, tendo em conta as circunstâncias do caso, o Tribunal decida que, além das suas próprias despesas, uma parte suportará uma fração das despesas da outra parte.

604

No caso em apreço, tendo a Comissão pedido a condenação do Reino Unido nas despesas e tendo este sido vencido no essencial dos seus pedidos, há que condenar o Reino Unido a suportar, além das suas próprias despesas, quatro quintos das despesas da Comissão. Esta suportará um quinto das suas próprias despesas.

605

Nos termos do artigo 140.o, n.o 1, do referido Regulamento de Processo, segundo o qual os Estados‑Membros que intervenham no litígio devem suportar as suas próprias despesas, o Reino da Bélgica, a República da Estónia, a República Helénica, a República da Letónia, a República Portuguesa e a República Eslovaca suportam as suas próprias despesas.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Grande Secção) decide:

 

1)

Ao não ter tido em conta os montantes corretos dos direitos aduaneiros e ao não ter colocado à disposição o montante correto dos recursos próprios tradicionais relativos a determinadas importações de produtos têxteis e de calçado provenientes da China, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força dos artigos 2.o e 8.o da Decisão 2014/335/UE, Euratom do Conselho, de 26 de maio de 2014, relativa ao sistema de recursos próprios da União Europeia, dos artigos 2.o e 8.o da Decisão 2007/436/CE, Euratom do Conselho, de 7 de junho de 2007, relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades Europeias, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 12.o e 13.o do Regulamento (UE, Euratom) n.o 609/2014 do Conselho, de 26 de maio de 2014, relativo aos métodos e ao procedimento para a colocação à disposição dos recursos próprios tradicionais e dos recursos próprios baseados no IVA e no RNB e às medidas destinadas a satisfazer as necessidades da tesouraria, conforme alterado pelo Regulamento (UE, Euratom) 2016/804 do Conselho, de 17 de maio de 2016, dos artigos 2.o, 6.o, 9.o, 10.o, 11.o e 17.o do Regulamento (CE, Euratom) n.o 1150/2000 do Conselho, de 22 de maio de 2000, relativo à aplicação da Decisão 94/728/CE, Euratom relativa ao sistema de recursos próprios das Comunidades, assim como do artigo 105.o, n.o 3, do Regulamento (UE) n.o 952/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de outubro de 2013, que estabelece o Código Aduaneiro da União, e do artigo 220.o, n.o 1, do Regulamento (CEE) n.o 2913/92 do Conselho, de 12 de outubro de 1992, que estabelece o Código Aduaneiro Comunitário, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 648/2005 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de abril de 2005, como consequência do incumprimento das obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 325.o TFUE, do artigo 46.o do Regulamento n.o 952/2013, do artigo 13.o do Regulamento n.o 2913/92, conforme alterado pelo Regulamento n.o 648/2005, do artigo 248.o, n.o 1, do Regulamento (CEE) n.o 2454/93 da Comissão, de 2 de julho de 1993, que fixa determinadas disposições de aplicação do Regulamento n.o 2913/92, conforme alterado pelo Regulamento (CE) n.o 3254/1994 da Comissão, de 19 de dezembro de 1994, do artigo 244.o do Regulamento de Execução (UE) 2015/2447 da Comissão, de 24 de novembro de 2015, que estabelece as regras de execução de determinadas disposições do Regulamento n.o 952/2013, assim como do artigo 2.o, n.o 1, alínea d), e dos artigos 85.o a 87.o da Diretiva 2006/112/CE do Conselho, de 28 de novembro de 2006, relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado, conforme alterada pela Diretiva 2009/69/CE do Conselho, de 25 de junho de 2009;

e ao não comunicar à Comissão Europeia todas as informações necessárias para determinar o montante das perdas de recursos próprios tradicionais e ao não fornecer, conforme solicitado, os fundamentos das decisões que anularam as dívidas aduaneiras apuradas, o Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte não cumpriu as obrigações que lhe incumbiam por força do artigo 4.o, n.o 3, TUE.

 

2)

A ação é julgada improcedente quanto ao restante.

 

3)

O Reino Unido da Grã‑Bretanha e da Irlanda do Norte é condenado em quatro quintos das despesas da Comissão Europeia e suporta as suas próprias despesas.

 

4)

A Comissão Europeia suporta um quinto das suas despesas.

 

5)

O Reino da Bélgica, a República da Estónia, a República Helénica, a República da Letónia, a República Portuguesa e a República Eslovaca suportam as suas próprias despesas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

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