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Documento 62018CJ0826

Acórdão do Tribunal de Justiça (Primeira Secção) de 14 de janeiro de 2021.
LB e o. contra College van burgemeester en wethouders van de gemeente Echt-Susteren.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pelo Rechtbank Limburg.
Reenvio prejudicial — Convenção de Aarhus — Artigo 9.o, n.os 2 e 3 — Acesso à justiça — Inexistência de acesso à justiça de um público diferente do público envolvido — Admissibilidade do recurso subordinada à participação prévia no processo de tomada de decisão.
Processo C-826/18.

Identificador Europeu da Jurisprudência (ECLI): ECLI:EU:C:2021:7

 ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção)

14 de janeiro de 2021 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Convenção de Aarhus — Artigo 9.o, n.os 2 e 3 — Acesso à justiça — Inexistência de acesso à justiça de um público diferente do público envolvido — Admissibilidade do recurso subordinada à participação prévia no processo de tomada de decisão»

No processo C‑826/18,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo rechtbank Limburg (Tribunal de Primeira Instância de Limburgo, Países Baixos), por Decisão de 21 de dezembro de 2018, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 28 de dezembro de 2018, no processo

LB,

Stichting Varkens in Nood,

Stichting Dierenrecht,

Stichting Leefbaar Buitengebied

contra

College van burgemeester en wethouders van de gemeente Echt‑Susteren,

sendo interveniente:

Sebava BV,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Primeira Secção),

composto por: J.‑C. Bonichot (relator), presidente de secção, L. Bay Larsen, C. Toader, M. Safjan e N. Jääskinen, juízes,

advogado‑geral: M. Bobek,

secretário: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 30 de janeiro de 2020,

considerando as observações apresentadas:

em representação de LB, por A. Hanssen,

em representação da Stichting Varkens in Nood, da Stichting Dierenrecht e da Stichting Leefbaar Buitengebied, por M. H. Middelkamp,

em representação do College van burgemeester en wethouders van de gemeente Echt‑Susteren, por L. M. C. Cloodt, advocaat,

em representação do Governo neerlandês, por M. A. M. de Ree, M. Bulterman, C. S. Schillemans e J. M. Hoogveld, na qualidade de agentes,

em representação do Governo dinamarquês, por J. Nymann‑Lindegren, M. S. Wolff e P. Z. L. Ngo, na qualidade de agentes,

em representação da Irlanda, por M. Browne, G. Hodge e A. Joyce, na qualidade de agentes, assistidos por N. Butler, SC, e C. Hogan, BL,

em representação do Governo sueco, por H. Eklinder, C. Meyer‑Seitz, H. Shev, J. Lundberg e A. Falk, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por G. Gattinara, M. Noll‑Ehlers e L. Haasbeek, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 2 de julho de 2020,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 9.o, n.o 2, da Convenção sobre o Acesso à Informação, Participação do Público no Processo de Tomada de Decisão e Acesso à Justiça em Matéria de Ambiente, assinada em Aarhus (Dinamarca), em 25 de junho de 1998, e aprovada, em nome da Comunidade Europeia, pela Decisão 2005/370/CE do Conselho, de 17 de fevereiro de 2005 (JO 2005, L 124, p. 1) (a seguir «Convenção de Aarhus»).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de litígios que opõem, respetivamente, LB, uma pessoa singular, a Stichting Varkens in Nood, a Stichting Dierenrecht e a Stichting Leefbaar Buitengebied, associações de proteção dos direitos dos animais, ao College van burgemeester en wethouders van de gemeente Echt‑Susteren (Conselho Municipal de Echt‑Susteren, Países Baixos) (a seguir «Município de Echt‑Susteren») a respeito de uma autorização concedida por este município à Sebava BV para a construção de um edifício para a criação de suínos.

Quadro jurídico

Direito internacional

3

O décimo oitavo considerando da Convenção de Aarhus enuncia a pretensão de garantir ao público, bem como às organizações, o acesso a mecanismos judiciais eficazes por forma a proteger os seus interesses legítimos e a garantir a aplicação da lei.

4

O artigo 2.o desta convenção, sob a epígrafe «Definições», estipula, no seu n.o 4, que se entende por «[p]úblico»«uma ou mais pessoas singulares ou coletivas, bem como as suas associações, organizações ou agrupamentos de acordo com a legislação ou práticas nacionais».

5

Nos termos do n.o 5 deste artigo 2.o, entende‑se por «[p]úblico envolvido»«o público afetado ou suscetível de ser afetado pelo processo de tomada de decisões no domínio do ambiente ou interessado em tais decisões». Este n.o 5 precisa que, «para efeitos da presente definição, presumem‑se interessadas as organizações não governamentais que promovam a proteção do ambiente e que satisfaçam os requisitos previstos no direito nacional».

6

O artigo 3.o, n.o 5, da Convenção de Aarhus prevê que as disposições desta não afetarão o direito de as partes manterem ou introduzirem medidas que prevejam um acesso à informação mais lato, uma participação alargada do público no processo de tomada de decisões e um maior acesso à justiça no domínio do ambiente.

7

O artigo 6.o da Convenção de Aarhus, sob a epígrafe «Participação do público nas decisões referentes a atividades específicas», prevê, nos seus n.os 1 a 10:

«1.   Cada parte:

a)

Aplicará o disposto no presente artigo às decisões relativas à autorização das atividades propostas, constantes do anexo I;

[…]

2.   O público envolvido será informado de forma adequada, atempada e efetiva, na fase inicial de um processo de tomada de decisões em matéria ambiental, através de aviso público ou individualmente, designadamente:

a)

Da atividade proposta e do pedido relativamente ao qual será tomada uma decisão;

b)

Da natureza das eventuais decisões ou do projeto de decisão;

c)

Da autoridade pública responsável pela adoção da decisão;

d)

Do procedimento previsto, incluindo como e quando podem ser comunicadas:

i)

as informações sobre o início do processo,

ii)

as informações sobre as possibilidades de participação do público,

iii)

as informações sobre o momento e local de realização das audições públicas previstas,

iv)

a indicação da autoridade pública junto da qual seja possível obter a informação relevante e à qual esta informação tenha sido confiada para exame pelo público,

v)

a indicação da autoridade pública ou qualquer outro órgão oficial para o qual possam ser enviados comentários ou questões, assim como o prazo de apresentação desses mesmos comentários ou questões, e

vi)

a indicação da informação ambiental disponível relevante para a atividade proposta; e ainda

e)

Do facto de a atividade estar sujeita a um procedimento transfronteiriço de avaliação de impacto ambiental.

3.   Os procedimentos aplicáveis à participação do público estabelecerão prazos razoáveis para as diferentes etapas, prevendo períodos de tempo suficientes para informar o público de acordo com o disposto no n.o 2 e para permitir que o público se prepare e participe ativamente no processo de tomada de decisões do domínio do ambiente.

4.   Cada parte velará pela participação do público o mais cedo possível no processo, quando todas as opções estiverem em aberto e possa haver uma participação efetiva do público.

5.   Se necessário, cada parte encorajará os possíveis requerentes a identificar o público envolvido, a proceder a debates e a fornecer as informações relativas aos objetivos do seu pedido antes do pedido de autorização.

6.   Cada parte exigirá às autoridades públicas competentes que concedam ao público envolvido, mediante pedido, sempre que a legislação nacional assim o imponha, gratuitamente e assim que estejam disponíveis, o acesso para exame a todas as informações que estiverem disponíveis no momento do procedimento de participação do público e que sejam relevantes para o processo de tomada de decisões referido no presente artigo, sem prejuízo do direito de as partes recusarem a divulgação de determinadas informações em conformidade com o disposto nos n.os 3 e 4 do artigo 4.o A informação relevante deverá incluir, pelo menos, sem prejuízo do disposto no artigo 4.o:

a)

Uma descrição do local e das características físicas e técnicas da atividade proposta, incluindo uma estimativa dos resíduos e emissões previstas;

b)

Uma descrição dos efeitos significativos da atividade proposta a nível do ambiente;

c)

Uma descrição das medidas propostas para prevenir e/ou reduzir os efeitos, incluindo as emissões;

d)

Um resumo não técnico dos elementos acima referidos;

e)

Um esboço das principais alternativas estudadas pelo requerente; e

f)

De acordo com a legislação nacional, os principais relatórios, bem como o parecer dirigido à autoridade pública no momento em que, nos termos do disposto no n.o 2, o público envolvido deve ser informado.

7.   Os procedimentos aplicáveis à participação do público deverão prever a possibilidade de o público apresentar por escrito ou, se necessário, nas audições ou consultas públicas com o requerente, comentários, informações, análises ou pareceres que considere relevantes para a atividade proposta.

8.   Cada parte garantirá que, na decisão, seja tido em devida conta o resultado da participação do público.

9.   Cada parte assegurará que o público seja imediatamente informado da decisão adotada pelas autoridades públicas, de acordo com os procedimentos adequados. Cada parte facultará ao público o texto da decisão juntamente com os fundamentos e considerações em que aquela se baseia.

10.   Cada parte assegurará que, ao reconsiderar ou atualizar as condições de exploração de uma atividade referida no n.o 1, as autoridades públicas apliquem mutatis mutandis, se necessário, o disposto nos n.os 2 a 9 do presente artigo.»

8

O artigo 9.o da Convenção de Aarhus, sob a epígrafe «Acesso à justiça», dispõe, nos seus n.os 2 a 4:

«2.   Cada parte garantirá, nos termos da respetiva legislação nacional, que os membros do público em causa:

a)

Que tenham um interesse suficiente; ou, em alternativa,

b)

Cujo direito tenha sido ofendido, caso a lei de procedimento administrativo da parte o imponha como condição prévia, tenham acesso a um recurso junto dos tribunais e/ou de outra instância independente instituída por lei, para impugnar a legalidade material e processual de qualquer decisão, ato ou omissão sujeita às disposições previstas no artigo 6.o e, salvo disposição em contrário no direito interno, a outras disposições relevantes da presente convenção.

O interesse suficiente e a ofensa do direito serão determinados em conformidade com os requisitos do direito interno e com o objetivo de conceder ao público envolvido um amplo acesso à justiça nos termos da presente convenção. Para este fim, o interesse das organizações não governamentais que satisfaçam os requisitos mencionados no n.o 5 do artigo 2.o serão considerados suficientes para efeitos da alínea a). Presumir‑se‑á igualmente que tais organizações têm direitos suscetíveis de serem ofendidos para efeitos da alínea b).

O disposto no n.o 2 não exclui a possibilidade de interposição de recurso preliminar junto de uma autoridade administrativa e não prejudica o requisito do recurso judicial que consiste no esgotamento prévio dos recursos administrativos, caso tal requisito seja previsto no direito interno.

3.   Além disso, e sem prejuízo dos processos de recurso referidos nos n.os 1 e 2, cada parte assegurará que os membros do público que satisfaçam os critérios estabelecidos no direito interno tenham acesso aos processos administrativos ou judiciais destinados a impugnar os atos e as omissões de particulares e de autoridades públicas que infrinjam o disposto no respetivo direito interno do domínio do ambiente.

4.   Além disso, e sem prejuízo do disposto no n.o 1, os processos referidos nos n.os 1, 2 e 3 deverão proporcionar soluções eficazes e adequadas, incluindo, se necessário, a reparação injuntiva do direito, ser justos, equitativos, céleres e não exageradamente dispendiosos. […]»

9

O anexo I da Convenção de Aarhus, sob a epígrafe «Lista das atividades referidas no n.o 1, alínea a), do artigo 6.o», refere, no seu ponto 15, alínea c), as instalações para a criação intensiva de suínos, com espaço para mais de 750 bácoras.

Direito neerlandês

10

Nos termos do artigo 1:2 da Algemene wet bestuursrecht (Lei do Procedimento Administrativo; a seguir «Awb»), entende‑se por «interessado» qualquer pessoa «cujos interesses sejam diretamente afetados por uma decisão».

11

Resulta do artigo 3:10 da Wet Algemene bepalingen omgevingsrecht (Lei das Disposições Gerais Relativas ao Direito do Ambiente; a seguir «Wabo») que há que aplicar a secção 3.4 da Awb, relativa ao «procedimento preparatório público uniforme» (a seguir «procedimento preparatório»), para a adoção de uma autorização ambiental relativa a atividades de construção e de alteração de instalações, na aceção do artigo 2.1, n.o 1, alíneas a) e e), da Wabo.

12

No âmbito desse procedimento, o artigo 3.12 da Wabo prevê que qualquer pessoa pode apresentar observações sobre o projeto de decisão.

13

Nos termos do artigo 6:13 da Awb, apenas os interessados que tenham apresentado observações durante o procedimento preparatório podem interpor recurso da decisão adotada no termo desse procedimento, salvo se não puderem razoavelmente ser censurados por não terem participado. Além disso, só são admissíveis as acusações formuladas contra os mesmos aspetos da decisão impugnada relativamente aos quais foram apresentadas objeções durante o processo de adoção.

14

Resulta do artigo 8:1 da Awb que apenas os interessados podem interpor recurso das decisões administrativas para um órgão jurisdicional administrativo.

Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

15

Em 13 de outubro de 2016, a Sebava apresentou ao Município de Echt‑Susteren um pedido de autorização para a extensão e alteração de uma pocilga situada em Koningsbosch (Países Baixos), com vista a construir um novo estábulo para 855 porcas secas e prenhes, a substituir, nos estábulos existentes, 484 marrãs por 125 porcas parturientes e a construir um corredor coberto para porcas.

16

Este pedido foi sujeito ao procedimento preparatório, no âmbito do qual a autoridade competente adota um projeto de decisão sobre o pedido de autorização, a respeito do qual podem ser apresentadas observações.

17

Neste contexto, o Município de Echt‑Susteren decidiu que não era necessário um relatório de impacto ambiental.

18

Essa decisão e um exemplar do processo de notificação e de outros documentos anexos foram postos à disposição do público, para consulta, na sede do município. Foi publicado um aviso no Staatscourant van het Koninkrijk der Nederlanden (Jornal Oficial do Reino dos Países Baixos), onde se indicava que a referida decisão devia ser considerada um ato preparatório, na aceção do direito neerlandês, e que, consequentemente, não podia ser objeto de recurso administrativo ou jurisdicional, a não ser que prejudicasse diretamente os interesses de um «interessado». O pedido de autorização e o anúncio do projeto de autorização foram igualmente publicados no Gemeenteblad van Echt‑Susteren (Boletim Municipal de Echt‑Susteren).

19

Por Decisão de 28 de setembro de 2017, o Município de Echt‑Susteren concedeu a autorização ambiental pedida.

20

LB, a Stichting Varkens in Nood, a Stichting Dierenrecht e a Stichting Leefbaar Buitengebied interpuseram recursos de anulação dessa autorização no rechtbank Limburg (Tribunal de Primeira Instância de Limburgo, Países Baixos).

21

No que respeita ao recurso interposto por LB, o órgão jurisdicional de reenvio considera que este deve ser julgado inadmissível pelo facto de LB não satisfazer os requisitos para ser considerada um «interessado», na aceção do direito administrativo neerlandês, uma vez que não vive na proximidade do projeto em causa no processo principal, mas a cerca de 20 quilómetros, e, por conseguinte, não sofre pessoalmente os efeitos ambientais desse projeto. O órgão jurisdicional de reenvio refere que a profissão de veterinário de LB não basta para que possa ser reconhecida a existência de um interesse pessoal e que as outras atividades e qualidades que esta invocou foram alegadas tardiamente, após o termo do prazo de recurso.

22

O órgão jurisdicional de reenvio acrescenta que o recurso de LB pode igualmente ser julgado inadmissível pelo facto de a recorrente não ter apresentado objeções ao referido projeto durante o procedimento preparatório.

23

LB sustenta que lhe deve ser reconhecida a qualidade de «interessado», na aceção do direito neerlandês, e que não pode razoavelmente ser censurada por não ter apresentado observações durante o procedimento preparatório, tendo em conta as irregularidades cometidas ao longo do mesmo. Em especial, não foi indicado que o projeto dizia respeito à ampliação de uma pocilga e que só os «interessados» foram convidados a apresentar observações.

24

Neste contexto, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a conformidade com a Convenção de Aarhus da limitação do acesso à justiça exclusivamente aos «interessados», na aceção do direito nacional.

25

Questiona‑se, em especial, sobre se o artigo 9.o, n.o 2, dessa convenção deve ser interpretado no sentido de que exige que pessoas que, como LB, não são consideradas «interessados», na aceção do direito nacional, nem fazem parte do «público envolvido», na aceção da Convenção de Aarhus, possam, contudo, enquanto membros do «público», na aceção desta convenção, invocar em juízo eventuais violações dos direitos que lhes são conferidos pelo artigo 6.o, n.os 3 e 7 a 9, da mesma, que se referem ao «público» e não apenas ao «público envolvido».

26

No que respeita às associações de proteção do ambiente recorrentes nos processos principais, o órgão jurisdicional de reenvio considera que as mesmas são «interessados», na aceção do direito nacional, uma vez que o bem‑estar e a proteção dos animais fazem parte do seu objeto social e que ficou suficientemente demonstrado que exercem atividades concretas para esse fim.

27

No entanto, o referido órgão jurisdicional considera que o recurso dessas associações deve ser julgado inadmissível pelo facto de as mesmas não terem participado no procedimento preparatório.

28

O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se, contudo, sobre a questão de saber se esta condição de admissibilidade respeita o direito da União e, em especial, o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus.

29

Interroga‑se igualmente sobre a conformidade com esta disposição da regra do direito neerlandês que dispõe que são inadmissíveis as acusações que não têm por objeto os aspetos do projeto de decisão que foram contestados no âmbito do procedimento preparatório.

30

Foi nestas circunstâncias que o rechtbank Limburg (Tribunal de Primeira Instância de Limburgo) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Devem o direito [da União] e, em especial, o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus ser interpretados no sentido de que se opõem a que [o] público em geral (public) ([ou seja,] qualquer pessoa) [seja totalmente excluído do direito] de acesso à justiça, desde que esse público não [constitua] o público envolvido (public concerned) ([ou seja, os] interessados)?

Em caso de resposta afirmativa à [primeira questão]:

2)

Devem o direito [da União] e, em especial, o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus ser interpretados no sentido de que implicam que o público em geral (public) (qualquer pessoa) deve ter acesso à justiça em caso de uma suposta violação dos requisitos processuais e direitos de participação aplicáveis a esse público, conforme constam do artigo 6.o dessa convenção?

A este respeito, é relevante que, neste contexto, o público envolvido (public concerned) (interessados) goze do direito de acesso à justiça e [tenha], além disso, [legitimidade para impugnar a legalidade de um ato] em tribunal?

3)

Devem o direito [da União] e, em especial, o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus ser interpretados no sentido de que se opõem a que o direito de acesso à justiça do público envolvido (public concerned) (interessados) seja sujeito à condição de […] o direito de participação […], na aceção do artigo 6.o desta convenção, [ter sido exercido]?

Em caso de resposta negativa à [terceira questão]:

4)

Devem o direito [da União] e, em especial, o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus ser interpretados no sentido de que se opõem a uma disposição de direito nacional que exclui do direito de [impugnar uma decisão o] público envolvido (public concerned) (interessados) [que possa ser] razoavelmente [censurado por] não ter apresentado [objeções contra] um projeto de decisão [ou certos aspetos desse projeto]?

Em caso de resposta negativa à [quarta questão]:

5)

Cabe exclusivamente ao juiz nacional, com base nas circunstâncias do caso, [pronunciar‑se sobre] o que [significa a expressão] “[que] pode razoavelmente ser [censurado]” ou deve o juiz […] ter em conta, [a este respeito,] determinadas garantias consagradas no direito [da União]?

6)

Até que ponto [serão diferentes as respostas às terceira a quinta questões] se estiver em causa o público em geral (public) (qualquer pessoa) [por oposição ao] público envolvido (public concerned) (interessados)?»

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira e segunda questões

31

Com a primeira e segunda questões, que há que examinar em conjunto, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o direito da União e, em especial, o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus se opõem a que os membros do «público» referido no artigo 2.o, n.o 4, desta convenção não tenham acesso à justiça, enquanto tais, para impugnar uma decisão compreendida no âmbito de aplicação do seu artigo 6.o

32

A título preliminar, importa observar que o projeto em causa nos processos principais é abrangido pelo âmbito de aplicação da Convenção de Aarhus.

33

Com efeito, o órgão jurisdicional de reenvio refere‑se, com razão, ao artigo 6.o, n.o 1, alínea a), desta convenção, lido em conjugação com o seu anexo I, ponto 15, da mesma, que menciona as instalações para a criação intensiva de suínos, com espaço para mais de 750 bácoras, em cujo processo de autorização pode participar o «público envolvido».

34

Por força do artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus, cada parte assegurará, nos termos da respetiva legislação nacional e em conformidade com o objetivo de conceder ao «público envolvido» um amplo acesso à justiça, que os membros deste que tenham interesse ou, em alternativa, cujo direito tenha sido ofendido, caso o direito nacional o imponha como condição prévia, tenham acesso a um recurso junto dos tribunais ou de outra instância independente, para impugnar a legalidade de qualquer decisão compreendida no âmbito do artigo 6.o dessa convenção e, salvo disposição em contrário no direito interno, noutras disposições relevantes da mesma.

35

Os participantes na fase escrita no Tribunal de Justiça salientaram, com razão, que o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus refere exclusivamente o «público envolvido», que é definido no artigo 2.o, n.o 5, desta convenção como o público afetado ou suscetível de ser afetado pelo processo de tomada de decisões no domínio do ambiente ou interessado em tais decisões. Esta última disposição precisa que, para efeitos desta definição, presumem‑se interessadas as organizações não governamentais que promovam a proteção do ambiente e que satisfaçam os requisitos previstos no direito nacional.

36

Por conseguinte, o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus não tem por objetivo conferir ao público em geral um direito de recurso contra decisões e outros atos compreendidos no âmbito de aplicação do seu artigo 6.o, relativos aos projetos objeto de participação do público no processo de tomada de decisão, mas sim garantir esse direito exclusivamente aos membros do «público envolvido» que satisfaçam certos requisitos.

37

Esta interpretação é corroborada pela estrutura do artigo 9.o da Convenção de Aarhus, uma vez que o n.o 3 deste artigo prevê, por seu turno, um regime de acesso à justiça mais limitado para os membros do «público» em geral, refletindo, assim, o sistema previsto nesta Convenção, que estabelece expressamente uma distinção entre o «público» em geral e o «público envolvido» num ato ou numa operação.

38

Estão assim previstos direitos processuais específicos para os membros do público envolvido, que são, em princípio, os únicos chamados a participar no processo de tomada de decisão, por fazerem parte do círculo de pessoas, que compete aos Estados‑Membros determinar razoavelmente e em conformidade com o objetivo de conceder ao público envolvido um amplo acesso à justiça, afetadas ou suscetíveis de ser afetadas pelo ato ou pela operação previstos.

39

É certo que o artigo 6.o da Convenção de Aarhus emprega várias vezes o termo «público». Todavia, resulta de uma leitura de conjunto deste artigo que aquele só se aplica ao «público envolvido», ou seja, o único de quem se exige participação no processo de tomada de decisão.

40

Com efeito, embora as prescrições que figuram no artigo 6.o, n.o 2, alínea d), ii) e iv), dessa convenção se refiram especificamente a informações relativas ao «público», resulta expressamente deste artigo 6.o, n.o 2, primeiro parágrafo, que o direito de informação que consagra é garantido apenas ao «público envolvido».

41

Além disso, ao indicar que devem ser previstos prazos razoáveis para a informação ao público, na aceção do artigo 6.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus, e para a preparação e a participação ativa desse público no processo de tomada de decisões, o artigo 6.o, n.o 3, desta convenção confirma que as diferentes etapas do procedimento aplicável à participação do público são exclusivamente aplicáveis ao público envolvido.

42

Por outro lado, embora o artigo 6.o, n.os 4 e 7, da referida convenção também mencione o «público», estas disposições têm por único objetivo fixar as condições concretas do procedimento de participação, a saber, o momento em que este procedimento deve ser organizado e a forma precisa dessa participação, e não definir o alcance do direito de participação do público nos procedimentos em causa.

43

Esta análise é confirmada pelo facto de o direito de participar no processo de tomada de decisão não poder ser efetivo sem que o interessado disponha, além disso, do direito de ser informado do projeto e do procedimento previsto, bem como do direito de acesso aos documentos de informação, os quais, porém, são expressamente concedidos apenas aos membros do «público envolvido» no artigo 6.o, n.os 2 e 6, da Convenção de Aarhus.

44

De resto, há que salientar que uma leitura do artigo 6.o da Convenção de Aarhus diferente da mencionada no n.o 39 do presente acórdão teria como consequência, ao alargar necessariamente o acesso à justiça ao «público» no seu todo para que este invoque os direitos decorrentes deste artigo, privar de efeito útil a distinção entre os regimes de acesso à justiça previstos, respetivamente, nos n.os 2 e 3 do artigo 9.o desta convenção.

45

Tendo em conta todas estas considerações, há que concluir que o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus tem precisamente por objetivo garantir o acesso à justiça, com vista a impugnar um ato ou uma decisão compreendidos no âmbito de aplicação do artigo 6.o desta convenção, unicamente ao «público envolvido» que satisfaça certos requisitos.

46

Daqui resulta, sem prejuízo da verificação dos factos que incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio, que uma pessoa como LB, que não faz parte do «público envolvido», na aceção da Convenção de Aarhus, não pode invocar a violação do artigo 9.o, n.o 2, desta convenção pelo facto de não ter acesso à justiça no processo principal.

47

Todavia, o acesso dessa pessoa à justiça deve ser sujeito a um regime diferente se o direito nacional de um Estado‑Membro conceder ao público um direito mais amplo de participação no processo de tomada de decisão, em especial o direito de ser informado de um projeto de forma efetiva e atempada, como permitido pelo artigo 3.o, n.o 5, da Convenção de Aarhus, nos termos do qual as partes nesta última podem introduzir, no seu direito nacional, medidas mais favoráveis do que as previstas nesta Convenção, tais como medidas que prevejam uma participação alargada do público no processo de tomada de decisões visado no artigo 6.o da referida convenção.

48

Nesse caso, os recursos jurisdicionais interpostos com fundamento nessas medidas são abrangidos pelo n.o 3 do artigo 9.o da Convenção de Aarhus, que prevê que, sem prejuízo dos processos de recurso referidos nos n.os 1 e 2 desse artigo, cada parte nessa convenção assegurará que os «membros do público que satisfaçam os critérios estabelecidos no direito interno» tenham acesso aos processos administrativos ou judiciais destinados a impugnar os atos e as omissões de particulares e de autoridades públicas que infrinjam o disposto no respetivo direito interno do domínio do ambiente.

49

Por conseguinte, os recursos previstos no artigo 9.o, n.o 3, da referida convenção podem ser sujeitos a «critérios», donde se conclui que os Estados‑Membros podem, no âmbito da margem de apreciação que lhes é conferida a este respeito, fixar regras de direito processual relativas aos requisitos que devem estar cumpridos para interpor esses recursos (v., neste sentido, Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Protect Natur‑, Arten‑ und Landschaftsschutz Umweltorganisation, C‑664/15, EU:C:2017:987, n.o 86).

50

Ora, o Tribunal de Justiça já declarou que o direito de recurso previsto na referida disposição ficaria privado de efeito útil se, através da imposição de tais critérios, certas categorias de «membros do público» não pudessem exercer o direito de recurso (v., neste sentido, Acórdãos de 20 de dezembro de 2017, Protect Natur‑, Arten‑ und Landschaftsschutz Umweltorganisation, C‑664/15, EU:C:2017:987, n.os 46 e 48, e de 3 de outubro de 2019, Wasserleitungsverband Nördliches Burgenland e o., C‑197/18, EU:C:2019:824, n.o 34).

51

Daqui resulta que o artigo 9.o, n.o 3, da Convenção de Aarhus se opõe a que os membros do «público», na aceção desta, não possam de modo algum ter acesso à justiça para invocar direitos mais amplos de participação no processo de tomada de decisão, que são conferidos pelo direito interno do domínio do ambiente de um Estado‑Membro.

52

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à primeira e segunda questões que o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que os membros do «público» referido no artigo 2.o, n.o 4, desta convenção não tenham, enquanto tais, acesso à justiça para impugnar uma decisão compreendida no âmbito de aplicação do seu artigo 6.o Em contrapartida, o artigo 9.o, n.o 3, da dita convenção opõe‑se a que essas pessoas não possam ter acesso à justiça para invocar direitos mais amplos de participação no processo de tomada de decisão, que lhes são conferidos unicamente pelo direito interno do domínio do ambiente de um Estado‑Membro.

Quanto à terceira a sexta questões

53

Tendo em conta os litígios nos processos principais e a resposta dada à primeira e segunda questões, há que observar que a terceira a sexta questões têm por objeto um recurso de organizações não governamentais que fazem parte do «público envolvido» referido no artigo 2.o, n.o 5, da Convenção de Aarhus e que são abrangidas pelo artigo 9.o, n.o 2, desta, bem como um recurso de um membro do «público» referido no artigo 2.o, n.o 4, desta convenção e que está abrangido pelo artigo 9.o, n.o 3, da mesma.

54

Por conseguinte, há que considerar que, com as suas terceira a sexta questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 9.o, n.o 2, e o artigo 9.o, n.o 3, da Convenção de Aarhus se opõem a que a admissibilidade de recursos jurisdicionais interpostos, respetivamente, por organizações não governamentais que fazem parte do «público envolvido» e por um membro do «público», tendo em conta, no que respeita a essas organizações, o artigo 6.o desta convenção e, no que respeita a esse membro do «público», o direito interno do domínio do ambiente de um Estado‑Membro, esteja subordinada à participação destes no procedimento preparatório da decisão impugnada, salvo se não puderem razoavelmente ser censurados por não terem participado. O referido órgão jurisdicional pretende igualmente saber se essas disposições se opõem a que só sejam admissíveis as acusações formuladas contra os mesmos aspetos da decisão impugnada relativamente aos quais o recorrente tenha apresentado objeções nesse procedimento.

55

Resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que os membros do «público envolvido», na aceção da Convenção de Aarhus, devem poder interpor recurso jurisdicional dos atos a que se refere o artigo 9.o, n.o 2, desta convenção, seja qual for o papel que tenham tido na instrução do pedido, e que as partes nesta Convenção não podem, por conseguinte, prever a inadmissibilidade desse recurso pelo facto de o recorrente ter participado no processo de tomada de decisão da decisão impugnada e ter podido apresentar a sua opinião [v., neste sentido, no que respeita às disposições semelhantes da Diretiva 85/337/CEE do Conselho, de 27 de junho de 1985, relativa à avaliação dos efeitos de determinados projetos públicos e privados no ambiente (JO 1985, L 175, p. 40; EE 15 F6 p. 9), Acórdão de 15 de outubro de 2009, Djurgården‑Lilla Värtans Miljöskyddsförening, C‑263/08, EU:C:2009:631, n.os 38 e 39].

56

A participação no processo de tomada de decisão em matéria de ambiente nas condições previstas na referida convenção é, com efeito, distinta da interposição de um recurso jurisdicional e tem um objetivo diferente do deste último, podendo este recurso ser eventualmente interposto contra a decisão tomada no termo desse processo, pelo que essa participação não tem incidência nas condições de interposição do referido recurso (v., neste sentido, Acórdão de 15 de outubro de 2009, Djurgården‑Lilla Värtans Miljöskyddsförening, C‑263/08, EU:C:2009:631, n.o 38).

57

Além disso, no que respeita, em especial, às associações de proteção do ambiente, importa recordar que o artigo 9.o, n.o 2, segundo parágrafo, segundo e terceiro períodos, da Convenção de Aarhus prevê que se deve considerar que as organizações não governamentais que satisfaçam os requisitos mencionados no artigo 2.o, n.o 5, desta convenção têm quer um interesse suficiente quer direitos suscetíveis de serem ofendidos, consoante a legislação nacional recorra a uma ou a outra destas condições de admissibilidade.

58

Por último, há que observar que o objetivo que consiste em assegurar um «amplo acesso à justiça», previsto no artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus, e o respeito do efeito útil desta disposição não seriam garantidos por uma legislação que condicionasse a admissibilidade de um recurso interposto por uma organização não governamental ao seu eventual papel na fase de participação no processo de tomada de decisão, ainda que essa fase não tenha o mesmo objetivo que a interposição de um recurso jurisdicional e que a apreciação que essa organização faz de um projeto possa, além disso, evoluir em função do resultado desse processo (v., neste sentido, Acórdão de 15 de outubro de 2009, Djurgården‑Lilla Värtans Miljöskyddsförening, C‑263/08, EU:C:2009:631, n.os 38, 39 e 48).

59

Resulta do exposto que o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus se opõe a que a admissibilidade dos recursos jurisdicionais a que se refere, interpostos por organizações não governamentais que fazem parte do «público envolvido», na aceção da Convenção de Aarhus, esteja subordinada à participação destas no processo de tomada de decisão que levou à adoção da decisão impugnada.

60

A circunstância de esta condição não se aplicar, por força do direito nacional em causa nos processos principais, quando não se possa razoavelmente censurar essas organizações por não terem participado no referido processo, não pode justificar uma solução diferente, uma vez que o desrespeito da condição de participação prévia é, em princípio, suficiente para impedir o recurso jurisdicional das referidas organizações.

61

Em contrapartida, a solução seria diferente se o referido recurso fosse interposto por um membro do «público» com fundamento em direitos mais amplos de participação no processo de tomada de decisão, conferidos unicamente pelo direito interno do domínio do ambiente de um Estado‑Membro.

62

Nesse caso, como resulta do n.o 48 do presente acórdão, há que aplicar o artigo 9.o, n.o 3, da Convenção de Aarhus, que regula de maneira mais flexível a margem de manobra das partes nessa convenção.

63

Assim, resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça que esta disposição não se opõe, em princípio, no que respeita aos recursos a que se refere, a que a sua admissibilidade esteja subordinada à condição de o recorrente ter apresentado as suas objeções atempadamente logo no processo administrativo, uma vez que essa regra pode permitir identificar mais rapidamente os pontos controvertidos e, se necessário, resolvê‑los no âmbito do processo administrativo, de modo que já não seja necessário um recurso jurisdicional (v., neste sentido, Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Protect Natur‑, Arten‑ und Landschaftsschutz Umweltorganisation, C‑664/15, EU:C:2017:987, n.os 88 a 90).

64

Nestas circunstâncias, apesar de constituir, enquanto condição prévia para a interposição de um recurso jurisdicional, uma restrição ao direito a uma ação perante um tribunal na aceção do artigo 47.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir «Carta»), o Tribunal de Justiça considerou que esta condição pode ser justificada, de acordo com o artigo 52.o, n.o 1, da Carta, se estiver prevista na lei, respeitar o conteúdo essencial do referido direito e, na observância do princípio da proporcionalidade, for necessária e corresponder efetivamente a objetivos de interesse geral reconhecidos pela União Europeia ou à necessidade de proteção dos direitos e liberdades de terceiros (v., neste sentido, Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Protect Natur‑, Arten‑ und Landschaftsschutz Umweltorganisation, C‑664/15, EU:C:2017:987, n.o 90).

65

Ora, no caso em apreço, independentemente da questão de saber se há que aplicar o artigo 47.o da Carta a um recurso jurisdicional que apenas tem por objeto direitos mais amplos de participação no processo de tomada de decisão conferidos unicamente pelo direito nacional, afigura‑se que as condições enunciadas no número anterior do presente acórdão estão, em todo o caso, preenchidas.

66

Com efeito, resulta da decisão de reenvio que a condição de admissibilidade de um recurso baseada na participação prévia no processo de tomada de decisão está prevista por lei, na aceção do artigo 47.o da Carta. Além disso, esta condição respeita o conteúdo essencial do direito fundamental à tutela jurisdicional efetiva, conforme consagrado no referido artigo, uma vez que não põe em causa este direito enquanto tal, mas impõe apenas uma fase processual suplementar a fim de o exercer (v., neste sentido, Acórdão de 27 de setembro de 2017, Puškár, C‑73/16, EU:C:2017:725, n.o 64). Por outro lado, corresponde ao objetivo de interesse geral recordado no n.o 63 do presente acórdão e não se afigura haver uma desproporção manifesta entre esse objetivo e os eventuais inconvenientes causados pela obrigação de participar no procedimento preparatório da decisão impugnada (v., neste sentido, Acórdão de 27 de setembro de 2017, Puškár, C‑73/16, EU:C:2017:725, n.os 66, 67 e 69).

67

A circunstância de esta condição não ser aplicada quando não se possa razoavelmente censurar o recorrente por não ter participado no processo de tomada de decisão é, além disso, de molde a respeitar a exigência de proporcionalidade, uma vez que é apreciada em função das circunstâncias do processo.

68

Por último, não se afigura necessário determinar se o artigo 9.o, n.os 2 e 3, da Convenção de Aarhus se opõe a que só possam ser contestadas em juízo as acusações formuladas contra os mesmos aspetos da decisão impugnada relativamente aos quais os recorrentes tenham apresentado objeções nesse processo, uma vez que, de qualquer modo, os recorrentes nos processos principais não participaram no procedimento preparatório.

69

Tendo em conta as considerações precedentes, há que responder à terceira a sexta questões que o artigo 9.o, n.o 2, da Convenção de Aarhus deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que a admissibilidade dos recursos jurisdicionais a que se refere, interpostos por organizações não governamentais que fazem parte do «público envolvido» referido no artigo 2.o, n.o 5, desta convenção, esteja subordinada à participação dessas organizações no procedimento preparatório da decisão impugnada, mesmo que esta condição não se aplique quando aquelas não possam razoavelmente ser censuradas por nele não terem participado. Em contrapartida, o artigo 9.o, n.o 3, da dita convenção não se opõe a que a admissibilidade de um recurso jurisdicional a que se refere esteja subordinada à participação do recorrente no procedimento preparatório da decisão impugnada, salvo se, tendo em conta as circunstâncias do caso, o facto de não ter participado nesse procedimento não lhe possa razoavelmente ser censurado.

Quanto às despesas

70

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Primeira Secção) declara:

 

1)

O artigo 9.o, n.o 2, da Convenção sobre o Acesso à Informação, Participação do Público no Processo de Tomada de Decisão e Acesso à Justiça em Matéria de Ambiente, assinada em Aarhus (Dinamarca), em 25 de junho de 1998, e aprovada, em nome da Comunidade Europeia, pela Decisão 2005/370/CE do Conselho, de 17 de fevereiro de 2005, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a que os membros do «público» referido no artigo 2.o, n.o 4, desta convenção não tenham, enquanto tais, acesso à justiça para impugnar uma decisão compreendida no âmbito de aplicação do seu artigo 6.o Em contrapartida, o artigo 9.o, n.o 3, da dita convenção opõe‑se a que essas pessoas não possam ter acesso à justiça para invocar direitos mais amplos de participação no processo de tomada de decisão, que lhes são conferidos unicamente pelo direito interno do domínio do ambiente de um Estado‑Membro.

 

2)

O artigo 9.o, n.o 2, da Convenção sobre o Acesso à Informação, Participação do Público no Processo de Tomada de Decisão e Acesso à Justiça em Matéria de Ambiente, assinada em Aarhus, em 25 de junho de 1998, e aprovada, em nome da Comunidade Europeia, pela Decisão 2005/370, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a que a admissibilidade dos recursos jurisdicionais a que se refere, interpostos por organizações não governamentais que fazem parte do «público envolvido» referido no artigo 2.o, n.o 5, desta convenção, esteja subordinada à participação dessas organizações no procedimento preparatório da decisão impugnada, mesmo que esta condição não se aplique quando aquelas não possam razoavelmente ser censuradas por nele não terem participado. Em contrapartida, o artigo 9.o, n.o 3, da dita convenção não se opõe a que a admissibilidade de um recurso jurisdicional a que se refere esteja subordinada à participação do recorrente no procedimento preparatório da decisão impugnada, salvo se, tendo em conta as circunstâncias do caso, o facto de não ter participado nesse procedimento não lhe possa razoavelmente ser censurado.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: neerlandês.

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